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A IMAGEM E O SOM DAS ABERTURAS DA TV

GLOBO E A RELAÇÃO ESPAÇO-TEMPO NA


CONTEMPORANEIDADE

Rogério Abreu
Especialização Art Direction - PLI / The Institute of Vancouver – Canadá
Mestre em Design (Comunicação e Cultura) - PUC-Rio de Janeiro

Resumo
As aberturas são, através da imagem e som, carregadas de intencionalidade. A partir do
momento em que elas se tornam familiares, atribuem-se significado àquilo que se ouve. Embora
possuam uma grande experimentação artística (uma vez que existe muita liberdade quanto às
imagens, som, fontes ou técnicas utilizadas), as aberturas da TV Globo também expressam claras
motivações comerciais, estando comprometidas com a indústria cultural, persuasiva e a
autopromoção da emissora. As aberturas da teledramaturgia da TV Globo estão diretamente
relacionadas com a decorrência da compressão do espaço e do tempo na contemporaneidade, com a
valorização da imagem e som em detrimento da mercadoria, elevando o significante em relação ao
significado. Fica evidente o uso do som e imagem com objetivos persuasivos e mercadológicos,
transmitindo uma composição de associação direta com o telespectador, onde envolve, cultura,
natureza, arte, cotidiano e magia.

Abstract
The openings are, through the image and sound, loaded of intentions. From the moment
where they become familiar, they are attributed meant what one hears. Although they possess great
experimentation artistic (a time that exists much freedom how much to the images, sound, used
sources or techniques), the openings of the TV Globo also express clear commercial motivations,
being compromised with the cultural, persuasive industry and the self promotion of the sender. The
openings of the soap opera of the TV Globo directly are related with the result of the compression
of the space and the time in the actually, with the valuation of the image and sound in detriment of
the merchandise, raising the significant one in relation to the meaning. The use of the sound and
image with persuasive and marketing objectives is evident, transmitting a composition of direct
association with the viewer, where it involves, culture, nature, art, daily and magic.

1
Percebemos a relação espaço-tempo uma constante mutação com o passar do dos anos.
Hoje em dia a computação gráfica e as imagens geradas pelos recursos tecnológicos já chegaram
nos mais diferentes lugares, colaborando com a rapidez informacional e a vivência simultânea nas
mais diferentes culturas e sociedades, reduzindo as longas distâncias. A notoriedade que as imagens
geradas pela computação gráfica vêm recebendo pela crítica é reveladora acerca da questão
tecnológica, e abre espaço para a discussão relacionada às conseqüências da precária administração
das novas tecnologias sobre a sociedade.

A primeira grande crise do capitalismo, resultado da super acumulação de bens de


consumo1 no final da década de 1840, desencadeou uma crise de representação, proveniente de um
reajuste radical do sentido de tempo e espaço na vida econômica, política e cultural2. Assim como a
literatura, a arte também podia evitar questões como o internacionalismo, a sincronia, a
temporalidade insegura e a tensão entre o sistema financeiro e sua base monetária3. A arte de Manet,
Monet, e os romances de Flaubert, passou a proporcionar “sinais de uma radical ruptura do
sentimento cultural que refletia um intenso questionamento do sentido do espaço e do lugar, do
presente, do passado e do futuro, num mundo de insegurança e de horizontes espaciais em rápida
expansão”4.

Entretanto, fatores como a expansão das estradas de ferro, o aparecimento do telégrafo, o


desenvolvimento da navegação a vapor, os primórdios da comunicação pelo rádio e a possibilidade
das viagens de automóvel também contribuíram para mudar radicalmente o sentido do espaço e do
tempo. A viagem em balões e a fotografia aérea alteraram as percepções da superfície da Terra, ao
mesmo tempo em que novas tecnologias de impressão e reprodução mecânica permitiram a
disseminação de dados, informação e cultura em classes cada vez mais vastas da população5. Tais
inventos, sua utilização e desenvolvimento constituíram novos estilo de discorrer acerca do tempo e
o espaço e da convivência, diminuindo as distâncias e motivando a acelerarão do tempo.

Os artistas foram do mesmo modo entusiasmados pela tecnologia. Assim, além do


conteúdo da mensagem e sua composição, observamos que o engenho tecnológico propriamente
dito, sofre como causador de resultado no receptor. Avaliando a procura contemporânea pela

1
Nesse período, a produção foi muito superior ao consumo, causando estagnação da economia.
2
HARVEY, 2004. p.237
3
HARVEY, 2004. p. 239
4
HARVEY, 2004. p. 239
5
HARVEY, 2004. p. 240

2
novidade, uma técnica atual é valorizada por si só na representação, de seu emprego num artefato
gráfico, uma melhoria6.

Elevar o passado cresce a medida em que a tecnologia seriada de reprodução em massa


se desenvolve. Se na Antigüidade a cópia era avaliada como forma singular de difusão do
conhecimento, a partir da produção em massa de simulacros tal sentido submergiu e a repetição
seriada passou a perder seu valor.

Entretanto, acerca das modificações ocorridas no método de transmissão do


conhecimento, certamente apreendemos diversas coincidências no que diz respeito ao trabalho
liberal da contemporaneidade e o do passado.

Na produção artesanal, a concepção e a realização estão ligadas e coordenadas pelo


coletivo. O fato de que o processo pode ser feito por um único indivíduo oculta sua
complexibilidade, oferecendo uma grandeza humana e aparente naturalidade permitindo a
experimentação do artesão e receptor como uma unidade inteligível. Acerca da transformação nas
condições da produção industrial, pesquisas em design apontam certa constância da unidade
localizada na memória artesanal, mostrando a prática do design como uma relação independente
entre designer e produto7.

O sentido mutante do espaço e do tempo, maquinado pelo próprio capitalismo, inventou


a necessidade de eternas reavaliações das representações do mundo na vida cultural, influenciando
diretamente o surgimento do modernismo. O nascimento de tecnologias, como a computação
gráfica e máquinas revolucionárias, resultou em um novo conjunto e compressão de experiências do
espaço e do tempo, possibilitando considerar o pós-modernismo como uma espécie de resposta a
esta nova realidade8.

Em conseqüência, a pós-modernidade trouxe a acentuação da volatilidade e efemeridade dos


produtos. O comando da racionalidade instrumental afastou a fronteira imposta pela moral, pela
religião ou por regras tradicionais das corporações a fim de privilegiar unicamente o princípio da
produção lucrativa.

As imagens se tornaram mercadorias e o capitalismo passou a focar predominantemente


a produção de signos, imagens e sistemas de signos, e não as próprias mercadorias. A efemeridade e
a comunicabilidade instantânea no espaço tornaram-se virtudes a ser exploradas e apropriadas pelos

6
Gruszynski, p.152
7
HESKETT, 1998. p. 7
8
HARVEY, 2004. p. 256

3
capitalistas para seus próprios fins. A competição no mercado da construção de imagens passa a ser
um aspecto vital da concorrência entre as empresas9.

Essa realidade fica evidente na propaganda e do design. No universo do design criado


para a televisão, onde as aberturas de programas veiculadas na TV Globo são fundamentais, fica
ainda mais evidente o uso da imagem com objetivos persuasivos e mercadológicos, transmitindo
uma composição imagética de associação direta com o telespectador, onde envolve, cultura,
natureza, arte, cotidiano e magia.

A TV Globo, no final dos anos 70 com a criação do videographics (departamento de


design da CGCOM - Central Globo de Comunicação), foi pioneira na implantação do design criado
para a TV, e com o desenvolvimento da computação gráfica, consegue detectar e implantar os novos
estilos da contemporaneidade. Um desses traços é a intensa exploração da imagem e sua relação
com a música, seguindo uma tendência das grandes emissoras mundiais: a de oferecer magia
tecnológica das mais diversas formas, como mulheres se transformam em rochas, plantas,
dançarinas que voam, pessoas inseridas em ambientes virtuais e desenhos animados. O homem
contemporâneo utiliza a computação gráfica para experimentar o improvável, o impossível, uma
espécie de superação de limites. Associando sensações.

Sinestesia (do grego ¨união¨ou ¨junção¨ (esthesia) ¨sensação¨) é a relação de planos


sensoriais diferentes: por exemplo, o gosto como o cheiro, ou a visão como o olfato. O termo é
usado para descrever uma figura de linguagem e uma série de fenômenos provocados por uma
condição neurológica. (wikipédia).

O estímulo dos sentidos provoca uma percepção automática em outro sentido. Na sinestesia da
audição, por exemplo, a percepção de um som pode provocar uma experiência visual.

A música certamente atua no inconsciente do público; o que caracteriza o investimento


na criatividade estética das aberturas na televisão é agradar. Ao agradar, ela faz o efeito e cumpre os
seus objetivos. Ferraretto10 afirma que a música e os efeitos exploram a sugestão, criando imagens
na mente, A música desempenha um papel relativo a estimulação emocional, daí sua importância na
composição das vinhetas. Ela, articula com a imagem, seguindo certos princípios, pode representar
um elemento unificador, pode acentuar um efeito, sugerir um movimento e criar uma atmosfera. A
música-tema é mais característica das aberturas de telenovelas. Percebemos a identificação, o

9
HARVEY, 2004. p. 260
10
FERRARETTO, 2000 p. 286
11
KOELLREUTTER, 1987 p. 65

4
sentido e a afinidade entre imagem e som. Assim a TV Globo utiliza aberturas capazes de fazer o
público identificá-las, não só pelo visual, mas também pela audição.

Koellreutter afirma que a música é um meio de comunicação, um veículo para a


transmissão e difusão de idéias e de pensamentos, daquilo que foi pesquisado e descoberto ou
inventado em nossa época; um meio de comunicação e de difusão que faz uso de um sistema de
sinais sonoros. A TV Globo cria em suas aberturas um discurso sonoro que, pela repetição,
normalmente de oito meses, período de veiculação da novela, é facilmente identificável. A música
na contemporaneidade, acerca de seu poder em relação as emoções e a sua ação dentro de seus
limites sensoriais, é empregada para os mais diversos fins. Ao colaborar para formar uma imagem
mental no receptor, a música estabeleceu-se como um elemento indispensável na construção das
peças de comunicação de sentido persuasivo. Nas aberturas das telenovelas da TV Globo a escolha
da música é tão importante quanto o design, e o sincronismo destes dois elementos é sempre fator
de investigação no processo criativo.

Para exemplificar, relembramos músicas-tema que consagraram aberturas como a


inesquecível Tieta, música com o mesmo título eternizada na voz de Luiz Caldas; ¨Blue Moon¨
versão da banda The Marcells para O Beijo do Vampiro. Composição de Rita Lee e Roberto de
Carvalho gravada pelo grupo Metrô para Tititi. O cantor Ednardo, na década de 70, torna-se
nacionalmente conhecido com a canção ¨Pavão Misterioso¨ em Saramandaia. Ao recordarmos o
trecho da música ¨Abra suas asas, solte suas feras, caia na gandaia, entre nesta festa...¨é impossível
não associar e relembrar as imagens e mais especificamente as meias de cores vibrantes das
bailarinas em close, da abertura de Dancin´Days, composto por Nelson Motta e gravado pelas
Frenéticas, o sucesso foi tanto que se tornou hino nas discotecas de 70 e lembrada até hoje. A
abertura de Pai Herói comoveu o Brasil com a emoção de ¨Pai¨ sucesso na voz de Fábio Jr.
¨Brasil¨de Cazuza interpretado por Gal Costa em Vale Tudo, consagrou este jovem artista como um
grande poeta e compositor. ¨Me chama que eu vou¨ cantada por Sidney Magal para a Rainha da
Sucata, virou hit e projetou o ritmo da lambada no Brasil e exterior. ¨Querida¨ de Tom Jobim em O
Dono do Mundo forma uma perfeita harmonia na integração imagem e som. E ¨Tormento d´amore¨,
composta por Marcelo Barbosa e interpretada por Agnaldo Rayol em Terra Nostra, sintetiza a
emoção de uma super produção que aborda a imigração italiana no Brasil.

Estes são alguns exemplos de trilhas musicais, que associadas às imagens, contribuíram
para a consagração de aberturas da TV Globo, tornando a música determinante para o sucesso das
mesmas.

5
Assim, as aberturas são, através da imagem e som, carregadas de intencionalidade. A
partir do momento em que elas se tornam familiares, atribuem-se significado àquilo que se ouve.

Embora possuam uma grande experimentação artística (uma vez que existe muita
liberdade quanto às imagens, som, fontes ou técnicas utilizadas), as aberturas da TV Globo também
expressam claras motivações comerciais, estando comprometidas com a indústria cultural,
persuasiva e a autopromoção da emissora.

Assim, as aberturas da teledramaturgia da TV Globo estão diretamente relacionadas


com a decorrência da compressão do espaço e do tempo na contemporaneidade, com a valorização
da imagem e som em detrimento da mercadoria, elevando o significante em relação ao significado.

BIBLIOGRAFIA:

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