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VITÓRIA
2009
RAYANI RAMPINELLI LOUREIRO
VITÓRIA
2009
Loureiro, Rayani Rampinelli.
159 f.
COMISSÃO EXAMINADORA
__________________________________________________
Profª Msª Andréa Monteiro Dalton
Universidade Federal do Espírito Santo
Orientadora
___________________________________________________
Profª Msª Juliana Iglesias Melin
Universidade Federal do Espírito Santo
__________________________________________________
Vanessa Ferreira Lopes
Assistente Social do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) de
Vitória/ES
AGRADECIMENTOS
À Deus, que me deu toda a sabedoria, trilhou os meus caminhos e me fez encarar
as dificuldades e os desafios frente a mais uma conquista da minha vida.
À meus pais, Regina Aparecida Rampinelli Loureiro e Joceilton Rocha Loureiro, que
são os grandes amores da minha vida, que sempre estiveram ao meu lado em todas
as situações, momentos de alegria, de tristeza, conquistas e incertezas, que
confiaram em meu potencial e nunca desistiram de lutar pela minha felicidade.
À Joyce Caroline, pessoa muito importante na minha vida que se fez presente e não
mediu esforços para me ajudar nessa fase de conclusão de curso. Sou grata a essa
grande mulher por acreditar na minha capacidade, por sua compreensão e toda
atenção dispensada a mim.
À minha amiga, Thatiane Trajano da Silva, que sempre esteve ao meu lado, desde o
primeiro período do curso, me incentivando e me levantando nos momentos mais
difíceis. Que nossa amizade se perpetue.
À Profª Msª Andréa Monteiro Dalton, que me orientou neste trabalho de conclusão
de curso com toda atenção necessária e confiança. Considero-a uma excelente
profissional que realiza seu trabalho na Universidade com muita competência e
dedicação.
Por fim, a todos aqueles que fizeram parte e contribuíram para minha formação
profissional e pessoal durante a graduação.
ME - Ministério do Esporte
MS - Ministério da Saúde
UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância (em inglês United Nations
Children's Fund)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................13
6 REFERÊNCIAS....................................................................................................146
APÊNDICES.............................................................................................................150
ANEXO.....................................................................................................................153
INTRODUÇÃO
O sistema capitalista, no qual estamos inseridos, é pautado no modelo neoliberal de
Estado. Tal sistema, objetivando a manutenção do capital, adota expressamente a
chamada reestruturação produtiva que trás em seu bojo mudanças na organização
do mundo do trabalho.
Tendo em vista tais questões, o presente trabalho trata-se de uma análise sobre o
processo de trabalho do Serviço Social a partir de um estudo do Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) do Município de Vitória-ES.
O estudo proposto neste trabalho, além de contribuir para analisar como vem se
desenvolvendo a atuação profissional dos assistentes sociais frente aos limites que
são postos ao profissional em seu processo de trabalho, contribuirá bastante para
um debate acadêmico mais acentuado no que se refere à prática profissional do
Assistente Social no âmbito da Política de Atendimento da Criança e do
Adolescente.
Tal pesquisa contribuirá, também, para os profissionais de Serviço Social que atuam
na área da criança e adolescente e, principalmente, para os que atuam no Programa
de Erradicação do Trabalho infantil do Município de Vitória. Com isso a pesquisa
será válida a estes profissionais para se pensar estratégias de atuação em meio aos
limites postos ao processo de trabalho e, elevação das possibilidades no intuito de
se aperfeiçoar o trabalho tendo em vista a efetivação da Política de Atendimento da
Criança e do Adolescente preconizada pelo ECRIAD.
Isso posto, poderá ser observado, no primeiro capítulo deste trabalho, que somente
com o advento do ECRIAD no Brasil, sendo este resultado de diversas lutas e
movimentos em prol da defesa e conquista de direitos da criança e do adolescente
em âmbito nacional e internacional, notou-se um novo direcionamento para a
proteção deste segmento da sociedade que passou a ser visto enquanto sujeitos de
direito. Além disso, com o avanço jurídico, da proteção integral, a criança e o
adolescente passaram a ser vistos, também, como sujeito em situação especial.
Neste capítulo poderá ser observado, que inicialmente o Serviço Social possuía um
cunho conservador de trabalho e com o decorrer da sua formulação, acompanhando
as transformações societárias a nível econômico, político e social, o Serviço Social
foi se reformulando e, assim como as políticas voltadas a área da criança e do
adolescente, foi sendo direcionado a realização de um trabalho coerente
considerando os sujeitos enquanto possuidores de direitos.
Neste sentido, este capítulo abordou a análise das entrevistas da pesquisa realizada
em dezembro de 2008 e abril de 2009 com os sujeitos da pesquisa. Estes se
constituem enquanto Assistentes Sociais em nível de secretaria, coordenação,
gerência e profissional técnico de atuação direta com os usuários do Programa.
Para a utilização das falas das entrevistas, sendo estas, objeto de análise do quarto
capítulo, foi feito menção às profissionais enquanto Entrevistada A, B, C, e D no
sentido de preservar a identidade das entrevistadas.
A população brasileira, nos primeiros anos após a descoberta do Brasil por Portugal,
era constituída principalmente por indígenas. Com a colonização portuguesa, os
povos indígenas passaram a ser doutrinado pelos portugueses, através dos padres
jesuítas, que pertenciam a Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada por Inácio
de Loyola (DALTON et al., 2005, p.16).
Nota-se, então, que as crianças nesse contexto histórico eram dominadas pelos
colonizadores na imposição cultural européia. Isso posto, fez-se das crianças,
consideradas fáceis de manipular, objeto de exploração para o trabalho.
Neste sentido, o governo Português juntamente com a Igreja Católica impôs seu
poder para que as crianças indígenas passassem a fazer parte do processo de
exploração e colonização do Brasil. No entanto, os portugueses não obtiveram os
resultados esperados, pois o choque cultural não permitiu o completo domínio dos
indígenas pelos portugueses, ou seja, os povos indígenas possuíam seu modo de
vida e uma cultura bem enraizada, e mesmo submetidos a adotar parte da cultura
portuguesa, eles resistiram a dominação dos portugueses. Por esse motivo os povos
indígenas foram considerados, pelos portugueses, enquanto preguiçosos, frágeis
para o trabalho e de difícil controle (DALTON et al., 2005, p.17).
Portanto, não havia qualquer tipo de atenção voltada aos filhos dos escravos. Estes
seriam submetidos à exploração e a condições indignas de vida desde o
nascimento.
A comercialização das crianças escravas se dava a partir dos 12 anos, pois a partir
desta idade eles eram considerados aptos para a realização do trabalho escravo,
como escravos em idade adulta (DALTON et al., 2005, p.18).
Considerando a Lei do Ventre Livre, cabe ressaltar, que com o advento dessa Lei
não houve muitas alterações para a vida das crianças e dos adolescentes neste
período. Portanto,
Isso posto, considera-se que a Lei do Ventre Livre contribuiu pouco para a situação
das crianças e adolescentes no Brasil durante o período em questão. Além disso,
houve forte presença de ações meramente caritativas e filantrópicas voltadas a este
segmento da sociedade.
Isso posto, considera-se, que assim como a Lei do Ventre Livre, a Roda dos
Expostos não sucumbiu as necessidades e a atenção devida as crianças e
adolescentes desse período uma vez que a política de assistência se dava pelo viés
da caridade e da filantropia.
Ressalta-se que, como classe dominante no século XIX, a aristocracia rural também
criada na Bahia em 1726. A Roda dos Expostos foi implantada pelas Santas de Casa de Misericórdia,
segundo modelo vigente nos países católicos da Europa.
custeou a política de assistência à criança e ao adolescente que era realizada
através de doações aos asilos que recolhiam crianças enjeitadas, pobres,
abandonadas e bastardas (DALTON et al., 2005, p.22).
A mão-de-obra infantil foi muito usada na indústria, pois o salário das crianças e
adolescentes significava uma ajuda para os baixos salários de suas famílias
(PILOTTI, 1995, p. 61).
Constatada a necessidade de intervenção do Estado, frente ao aumento das
expressões da questão social neste período, o Estado sente-se pressionado pela
população e cria políticas para a área da infância. No entanto, de acordo com Pilotti
(1995, p. 49):
Neste sentido, Pilotti (1995, p. 50), afirma que a articulação do político com o
econômico se referiu ao processo de valorização e desvalorização da criança
enquanto mão-de-obra e se colocou enquanto uma estratégia de encaminhamento
de crianças e adolescentes pobres para o trabalho naturalizando a desigualdade
social, ou seja, aos pobres a função era de trabalhar. Neste sentido, os discursos e
as práticas referentes às políticas para a infância eram voltados aos “desvalidos”
considerados enquanto força de trabalho na qual sua sobrevivência e preparação
profissional ou escolar estariam apenas ao nível da subsistência.
3
Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Conven%C3%A7%C3%A3o_Internacional_sobre_os_Direitos_da_Crian%C
3%A7a. Acesso em: 19 de junho 2009
4
Disponível em: www.oitbrasil.org.br/inst/index.php. Acesso em: 26 out. 2008.
permitiu que “os menores adultos” pudessem realizar serviço remunerado, caso não
ocorresse prejuízo no processo de educação e desenvolvimento físico destes
(COELHO, 1998, p. 106).
Neste sentido, segundo Pilotti (1995, p. 62), em 1923 (Decreto 16. 272) o Presidente
da República aprovou a regulamentação da proteção e da assistência aos menores
delinqüentes e abandonados, porém o Código de Menores só foi promulgado, em
forma de Decreto (17. 943-A), em 12 de outubro de1927, assinado por Washington
Luis.
Tendo em vista, portanto, o que foi exposto até então, conclui-se que as primeiras
formas de assistência e atenção à criança e ao adolescente foram voltadas àqueles
considerados carentes, abandonados, infratores, ou seja, a atenção e intervenção
voltava-se apenas para determinados seguimentos da população infantil. Essa
lógica se perpetuou por muitos anos, como será observado através dos Códigos de
Menores de 1927 e 1979.
A discussão referente aos Códigos de Menores, que se constituíram enquanto
Doutrina Legal de assistência e proteção à infância e à adolescência será explicitada
nos itens que se seguem.
Esse Código desponta como alternativa pouco eficaz no que diz respeito à
assistência das crianças e dos adolescentes uma vez que os classificava
por situação econômica e portando dicotomizava a infância mais uma vez,
entre os pobres e os abastados. Fica claro o poder dos juizes de intervir
nas situações envolvendo famílias pobres e que pudessem oferecer risco a
ordem pública, segundo os preceitos da época (DALTON et al., 2005, p.25).
5
Disponível em: http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/dh/cc/3/crianca/marco.htm. Acesso em: 20 abr.
2009.
Apesar de um avanço para a época, quanto a área da infância, o Código de
menores de 1927 é lançado com meios ineficazes para a assistência das crianças e
dos adolescentes, pois a assistência a partir dessa lei permanece direcionada aos
segmentos dos “menores” em situação de miséria.
Salienta-se que neste período fazia-se, “[...] uma fusão entre as crianças e
adolescentes vítimas do empobrecimento de suas famílias, com as crianças e
adolescentes que por ventura fossem autores de atos infracionais [...]”. As famílias,
na maioria das vezes, eram punidas pela situação de “desviança” e de rua na qual
se encontravam as crianças (DALTON et al., 2005, p. 26).
Neste sentido, a prática dos Juízes de Menores, (voltada para aqueles considerados
excluídos da produção e das normas dominantes, considerados suspeitos e
perigosos) voltava-se para o controle da ordem social. Os Juízes viam a internação
em instituições como a única solução para o problema da infância abandonada e da
miséria (PILOTTI, 1995, p. 73).
De acordo com Coelho (1998, p. 100), o país, nos anos trinta, estava passando por
um processo de industrialização tardia em comparação com a Inglaterra no século
anterior. Assim, não querendo ver a reincidência de cenas de crianças trabalhando
nas fábricas, sujeitos a todas as formas de abusos, foi delimitado que as crianças
deveriam, antes de tudo, atingir maturidade intelectual e física.
6
Que são: Legião Brasileira de Assistência (LBA): uma agencia nacional de assistência social voltada
inicialmente para o apoio aos combatentes na II Guerra Mundial e suas famílias e, posteriormente, á
população carente de modo geral;
Fundação Darcy Vargas :organismos de cooperação financeira que apoiava a implantação de
hospitais e serviços de assistência materno-infantil em diversos pontos do país;
Casa do Pequeno Jornaleiro: programa de atenção a meninos de famílias de baixa renda baseado no
trabalho informal (venda de jornais) e no apoio assistencial e socioeducativo;
Casa do Pequeno Lavrador: programa de assistência e aprendizagem rural para crianças e
adolescentes filhos de camponeses;
Casa do Pequeno Trabalhador: programa de capacitação e encaminhamento ao trabalho de crianças
e adolescentes urbanos de baixa renda;
Casa das Meninas: programa de apoio assistencial e socioeducativo a adolescentes do sexo feminino
com problemas de conduta.
Portanto, quanto ao trabalho e à educação, Pilotti (1995, p. 67) sinaliza que o
Governo estabeleceu, para os denominados menores, um sistema nacional, com
integração do Estado e de instituições privadas. Neste sentido, a ação do setor
público foi conduzida pelo “[...] Conselho Nacional de Serviço Social (1938),
Departamento Nacional da Criança (1940), o Serviço Nacional de Assistência a
Menores (SAM, 1941) e Legião Brasileira de Assistência (LBA, 1942) [...]”.
A implantação do SAM, segundo Pilotti (1995, p. 68), teve mais a ver com a questão
da ordem social que da assistência. O SAM, que tinha o dever de orientar a política
pública para a criança, foi redefinido em 1944 (Decreto Lei n. 6865). Tal instituição,
vinculada ao Ministério da Justiça e aos juizados de menores, tinha como
competência:
Tal Constituição, em seu inciso IX, colocou a norma de proibição do trabalho aos
menores de 14 anos e do trabalho de menores de 18 anos em indústrias insalubres
e em trabalho noturno. Como última norma de proteção à criança, na Constituição
de 1946, determinou-se, no art. 164, a obrigação de dar assistência à infância e à
adolescência, e, também, amparo às famílias constituídas por um grande número de
pessoas (COELHO, 1998, p. 106).
No ano de 1950, foi instalado o primeiro escritório do UNICEF (Fundo das Nações
Unidas para a Infância) no Brasil, em João Pessoa, na Paraíba. Ressalta-se, que
seu primeiro projeto foi destinado às iniciativas de proteção à saúde da gestante e
da criança, em alguns estados do nordeste no Brasil (MILANEZI, 2004, p. 14).
Pilotti (1995, p. 80), afirma que, o “novo” Código de Menores adotou notoriamente a
doutrina da situação irregular, na qual os menores seriam assistidos quando se
encontrassem em estado de patologia social, definida por lei. Assim, o Código de
1979 definiu como situação irregular:
Tendo em vista as direções postas por essa Lei, segundo Milanezi (2004, p. 16), “[...]
a concepção política social implícita no Código de Menores, era a de um
Instrumento de controle social dirigido às vítimas de omissão e transgressões da
família, da sociedade e do Estado [...]”.
Quanto ao contexto, marcado pelo militarismo, é importante ressaltar que:
Pilotti (1995, p. 86) destaca algumas ações do governo surgidas no início dos anos
1980. Segundo o autor,
Mesmo com aparatos legais em torno da criança e ao adolescente nos anos 1980,
Pilotti (1995, p. 86), chama atenção para a crise econômica, que agravou a situação
da criança neste período. Segundo ele, a visibilidade da miséria da infância
apareceu nas ruas em destaque para “a figura do Menino e da Menina de Rua”,
principalmente nos grandes pólos.
Tendo por foco as ações de articulação clientelista do governo nos anos 1980,
observa-se a criação de um programa de encaminhamento de crianças para o
trabalho. Tal política denominou-se por “Programa Bom Menino” (foi instituído pelo
Decreto-lei 2.318/86 e regulamentado pelo Decreto 94.338/87) que foi destinada à
iniciação ao trabalho do menor assistido com idade de 12 a 18 anos. Para tanto,
criou-se uma bolsa de trabalho e a obrigação da freqüência na escola. As empresas
com mais de 5 empregados, deviam possuir 5% do quadro técnico com esta
condição de contrato, “[...] com jornada máxima de 4 horas e remuneração de meio
salário mínimo, sem que gere vínculo empregatício ou encargos previdenciários ou
do FGTS para as empresas [...]” (PILOTTI, 1995, p. 87).
Pode-se observar, então, que com a adesão ao projeto neoliberal nos anos de 1990,
o Governo brasileiro voltou-se necessariamente aos interesses econômicos e
restringiu sua atuação no âmbito social, mesmo com o conhecimento dos direitos
conquistados pela sociedade até então.
Isso posto, o Estatuto coloca a proteção diferenciada por impor uma diferença entre
o tratamento que se deve dar à minoridade e à maioridade, considerando a
minoridade sendo um processo de desenvolvimento pessoal da criança e do
adolescente. Delibera sobre a proteção especializada, pois tal proteção destina-se a
todas as crianças e aos adolescentes sem exceção. E, por fim dispõe sobre a
proteção integral, uma vez que a atenção às crianças e aos adolescentes deve se
realizar sem qualquer discriminação (MILANEZI, 2004, p. 22 e 23).
Como visto anteriormente, até meados de 1980 o trabalho infantil foi tolerado pelo
governo e pela sociedade. O problema era praticamente ignorado ou aparecia
diluído em meio às questões sobre crianças que estavam à mercê da sociedade.
Neste sentido, considera-se que, assim como o Brasil possui uma legislação própria
sobre os direitos da criança e do adolescente (e está é comparada como uma das
mais avançadas e complexas do mundo) possui, em contrapartida, uma realidade
totalmente excludente, a qual impede a criança, o adolescente e a maioria da
população brasileira o acesso e a garantia de seus direitos (MILANEZI, 2004, p. 25).
Portanto, nota-se um forte agravamento das expressões da questão social na
realidade social brasileira condicionada pela lógica neoliberal, que rebate
diretamente na condição de vida de crianças e adolescentes de classe pobre
principalmente. Neste viés, considera-se que:
Portanto, pode-se dizer que a questão da infância culturalmente está enraizada nas
correlações de forças sociais e governamentais tratada na perspectiva do
autoritarismo e clientelismo e não numa perspectiva de uma sociedade e de um
Estado de direitos, pois mesmo com advento da Constituição de 1988 e
posteriormente do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, notam-se
enormes lacunas da sociedade e do Governo no que diz respeito ao atendimento e
às ações voltadas à cidadania da criança e adolescente no Brasil na busca da
efetivação de seus direitos e acesso aos mesmos.
Neste sentido, a questão social é entendida aqui como a contradição entre capital e
trabalho, isto é, a contradição entre a riqueza socialmente produzida e a sua divisão
desigual.
Isso posto, explicita-se que Serviço Social no Brasil se desenvolveu pela influencia
da Igreja católica, que manteve por um longo período o domínio da formação dos
agentes sociais, de sua doutrina e ideologia. Além disso, tal profissão se
desenvolveu no momento em que a Igreja se articulava para a recuperação e defesa
de seus próprios interesses, bem como para sua reafirmação na sociedade
(IAMAMOTO; CARVALHO, 2005, p. 213).
Após seu surgimento, atrelado a Igreja católica, o Serviço Social passou a ser
requisitado pelo Estado para intervir junto às classes trabalhadoras, no
enfrentamento das expressões da questão social, através das políticas
assistencialistas, implementadas pelo Estado. Sustentando tal afirmação considera-
se, pois, que:
Influenciado pela Igreja católica, em seu período inicial, portanto, o Serviço Social
possuía um componente técnico-operativo formado a partir da incorporação de
instrumentos específicos das formas de assistência tradicionais, aliados às
orientações técnicas e doutrinárias de origem religiosa católica. No entanto, com a
incorporação do Serviço Social na divisão sócio-técnica do trabalho a
instrumentalidade do Serviço Social sofreu alterações para se enquadrar nas
determinações da dinâmica social de acordo com as ideologias capitalistas de
Estado (TRINDADE, 2001, p. 27).
Nesta fase, por sua postura acrítica, o profissional de Serviço Social não
questionava e nem compreendia a influência do sistema sobre o indivíduo.
Além do Juízo de Menores no Rio de Janeiro, em São Paulo uma ampla instituição
de Serviço Social, naquele momento, – Departamento de Serviço Social do Estado
do São Paulo –, introduziu assistentes sociais que atuaram como comissários de
menores no “Serviço Social de menores” (menores abandonados, menores
delinqüentes, menores sob tutela da Vara de Menores, exercendo atividades no
Instituto Disciplinar e no Serviço de Abrigo e Triagem) com a procuradoria de Serviço
Social, do Departamento de Serviço Social, no espaço da Assistência Judiciária com
o objetivo de reajustar indivíduos ou famílias cuja causa de desadaptação social se
colocava como uma questão de justiça civil (IAMAMOTO; CARVALHO, 2005, p.
191).
Neste sentido, no final dos anos 1940 e nos anos 1950, com implantação do Serviço
Social nos Juizados de Menores de São Paulo, ressalta-se que a intervenção do
Serviço Social era a de casos individuais. A direção teórico-metodológica do “Serviço
Social de casos individuais” pautava-se, ainda, no referencial ideológico conservador
da doutrina social da igreja católica. Neste período a “[...] metodologia operativa
nessa época era influenciada pelo Serviço Social norte-americano, cuja intervenção
junto a “casos individuais” referenciava-se em estudos de natureza psicosocial [...]”,
isto é, abordava sobre fatores internos e sociais dos indivíduos (FÁVERO, 2004, p.
22, apud KFOURI, 1969, p. 07).
Com estas abordagens de trabalho, nota-se – como citado anteriormente – que não
havia, por parte dos profissionais, o questionamento do sistema enquanto um agente
influenciador e provocador da manifestação das expressões da questão social.
Neste sentido, de acordo com Iamamoto (2005, p. 310), o Serviço Social se colocou
em meio ao aparelho de Estado e às grandes instituições assistenciais, porém
assegurou as suas características fundamentais. O Serviço Social manteve sua
ação doutrinária e educativa de “enquadramento” e de controle da população cliente.
Portanto, a crescente demanda por uma intervenção técnica, sendo esta organizada
e planejada, desencadeada nas instituições de prestação de serviços sociais, se
articulou às exigências colocadas pelas mudanças na configuração da questão
social brasileira e, também, às conseqüentes medidas governamentais formuladas
para enfrentar as expressões da questão social. Neste sentido, as ações
filantrópicas e espontâneas não seriam mais suficientes para atender à
racionalidade exigida pelo Estado, nas décadas de 1930 e 1940 (TRINDADE, 2001,
p. 28).
Explicita-se aqui que durante a década de 1940 e até a metade da década seguinte,
1950, a economia nacional apresentou uma elevação das taxas de crescimento.
Esse período, de elevação positiva da economia, foi designado de ideologia
desenvolvimentista no Brasil (IAMAMOTO; CARVALHO, 2005, p. 340). Neste
sentido, tal ideologia,
[...] se define, assim, por meio da busca da expansão econômica, no sentido
de prosperidade, riqueza, grandeza material, soberania, em ambiente de
paz política e social, e de segurança – quando todo o esforço de elaboração
de política (política econômica) e trabalho são requeridos para eliminar o
pauperismo, a miséria, elevando-se o nível de vida do povo como
conseqüência do crescimento econômico atingido (IAMAMOTO;
CARVALHO, 2005, p. 341).
Isso posto, foi a partir do período desenvolvimentista que o Serviço Social aumentou
seu espaço de atuação, pois neste período evidenciou-se o cunho de
desenvolvimento comunitário no país e o profissional de Serviço Social foi chamado
a intervir nessa lógica.
Portanto, quando o Serviço Social passou a atuar nos processos de
desenvolvimento de comunidade, foi possível identificar mudanças em seu eixo de
intervenção profissional, ou seja,
Netto (2006, p. 128), afirma que o Serviço Social no Brasil, até a primeira metade da
década de sessenta, “mostrava uma relativa homogeneidade” no seu fazer
interventivo, “carecia de uma elaboração teórica significativa”, colocava-se enquanto
uma categoria profissional que possuía uma intervenção sem questionamentos e
problematização. Segundo o autor, a ruptura com este cenário tem suas bases na
laicização do Serviço Social. Tal laicização, – desvinculamento da profissão aos
preceitos religiosos –, constituída pela “[...] diferenciação da categoria profissional
em todos os seus níveis e a conseqüente disputa pela hegemonia do processo
profissional em todas as suas instâncias [...]”, isto é, projeto de formação,
paradigmas de intervenção, órgãos de representação entre outras, constituiu em um
dos elementos caracterizadores da renovação do Serviço Social.
De acordo com Netto (2006, p. 129), a classe burguesa instaurou condições para
essa renovação do Serviço Social. No entanto, seu objetivo era de renovar o Serviço
Social criando um campo onde houvesse meios de desenvolver e aplicar alternativas
aos procedimentos profissionais que ela demandava de acordo com suas
necessidades e interesses.
A Renovação do Serviço Social no Brasil foi composta por três direções que serão
tratadas ao longo desde texto de acordo com os períodos de manifestação de cada
uma.
Essa nova exigência posta ao Serviço Social esteve, portanto, sintonizada com o
padrão técnico-burocrático de gestão do desenvolvimento capitalista do período,
advindo da racionalização do processo produtivo e da gerência da força de trabalho,
assim como das políticas estatais. Neste sentido, o assistente social passou a fazer
parte do conjunto de profissionais cuja formação foi colocada a serviço do projeto de
modernização do capitalismo monopolista brasileiro (TRINDADE, 2001, p. 32 e 33).
Netto (2006, p. 161), ressalta que, numa primeira caracterização desta perspectiva,
ela conservou suas características dominantes de oposição ao Serviço Social
tradicional.
Segundo Netto (2006, p. 163), não seria possível pensar a intenção de ruptura sem
a hegemonia cultural das correntes de esquerda e as correntes progressistas até
1968/1969, e, também, sem o desenvolvimento do “marxismo acadêmico”.
Considera-se, portanto, que:
Neste sentido, no esforço por essa “validação teórica da profissão”, houve uma
abertura para a conquista de um espaço no envolvimento com os problemas e com
as disciplinas das ciências sociais que, na questão intelectual, contribuiu bastante
para oferecer um contrapeso à subalternidade da profissão de Serviço Social
(NETTO, 2006, p. 132).
É importante ressaltar, que na passagem dos anos 70 para os anos 80, em meio ao
projeto de ruptura, o clima político de discussão e de luta pela redemocratização do
país possibilitou e favoreceu a cultura crítica assumida pelos profissionais de Serviço
Social. A conjuntura marcada pela ditadura, nos anos 70, tinha posto inúmeras
dificuldades políticas à perspectiva de ruptura, assim somente com a abertura
política é que foi possível a emersão dos novos propósitos profissionais advindo
deste projeto (TRINDADE, 2001, p. 35).
Tal postura foi assumida pela categoria, também, como conseqüência do III
Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, de 1979, que ficou denominado de
“Congresso da Virada” no qual foi questionado o conservadorismo da profissão pela
categoria. Neste sentido, no Congresso da Virada houve o rompimento emblemático
com o conservadorismo e a afirmação de novas reflexões sobre a formação e o
exercício profissional com a introdução do marxismo – pois este foi reconhecido
como compatível com a ruptura do conservadorismo político –, o estabelecimento de
uma maturidade teórica e o enriquecimento do debate filosófico cujas características
ao caráter conservador da prática profissional marcaram a década de 1980 quando
a categoria se vinculou aos movimentos sociais desta década (MIRANDA;
CAVALCANTI, p. 08, acesso em: 12 abr. de 2009).
Portanto, a luz de Trindade (2001, p. 37), nota-se que para a realização dos
objetivos profissionais de ruptura exigiu-se dos profissionais de Serviço Social a
superação dos modelos interventivos formais e abstratos. Colocava-se cada vez
mais a necessidade dos profissionais serem críticos e realista capazes de notarem
as contradições e possibilidades contidas na dinâmica das políticas sociais, uma vez
que estas se constituíam no espaço ocupacional privilegiado de intervenção.
Portanto, considera-se, que:
Neste sentido, em meio ao contexto dos anos 80, período caracterizado pela intensa
mobilização e avanços dos direitos no Brasil, houve, por parte da categoria, a
criação deste Código de Ética que constituiu um importante marco para a profissão.
No entanto, apesar do Código de Ética de 1986 constituir-se como um avanço,
recusar a neutralidade da prática profissional, reconhecer a dimensão histórica e
política da profissão - esta em favor da classe trabalhadora - e das relações de
força, superando a análise do objeto sob a perspectiva da anormalidade, e de
reconhecer também o historicismo da moral, a ética foi tomada apenas em sua
dimensão política (MIRANDA; CAVALCANTI, acesso em: 12 abr. de 2009).
É no cenário dos anos 1990 [...] que tem sentido pensar ações que possam
reverter no fortalecimento de um projeto político profissional que, desde a
década de 1980, vem sendo coletivamente construído pela categoria dos
assistentes sociais [...] [no Brasil]. [Um] Projeto profissional comprometido
com a defesa dos direitos sociais, da cidadania, da esfera pública no
horizonte da ampliação progressiva da democratização da política e da
economia na sociedade.
Portanto, na década de 1990, após grandes conquistas sociais por direitos, como
visto no capítulo anterior com a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da
Criança e do Adolescente, a categoria profissional de Serviço Social passou a
pensar no fortalecimento de seu projeto ético-político profissional.
[...] o que é novo, portanto, não é a atuação dos assistentes sociais junto às
formas coletivas de organização da população, mas o contexto e a
configuração dessas formas organizativas. Trata-se de uma nova
experiência que nem é a participação outorgada dos anos da ditadura, nem
é a mobilização e organização de movimentos populares independentes das
estruturas institucionais. O fato dos Conselhos, fazerem parte das
instituições de políticas sociais, coloca o trabalho de mobilização e
organização num patamar diferenciado. E não só os Conselhos, pois
também podemos citar a atuação dos assistentes sociais nos processos de
elaboração dos “orçamentos participativos”, também uma experiência
própria dos anos 90 (TRINDADE, 2001, p. 38).
Ressalta-se, segundo Iamamoto (2007, p. 51), que no cenário dos anos 1980, no
contexto de ascensão dos movimentos sociais, das mobilizações em torno da
elaboração e aprovação da Carta Constitucional de 1988, entre outras
manifestações, que a categoria dos assistentes sociais foi sendo questionada pela
prática política de diferentes segmentos da sociedade. Neste cenário, o trabalho de
Serviço Social e a formação profissional se solidificaram tornando possível, portanto,
um avanço qualitativo na análise sobre a profissão na contemporaneidade. Isso
posto a autora sustenta que,
Tendo em vista estas questões, Iamamoto (2007, p. 20), sustenta que “[...] para
garantir uma sintonia do Serviço Social com os tempos atuais, é necessário romper
com uma visão endógena, [...] focalista [...] do Serviço Social [...]”. Neste sentido, a
autora afirma que:
O Código afirma como “valor ético central”, o compromisso com a liberdade, expõe
sobre a autonomia profissional, a plena expansão e emancipação dos indivíduos
sociais, o que gera, portanto, repercussão no modo de se realizar o trabalho
profissional. No entanto, a grande questão vista enquanto desafio ao profissional de
Serviço Social, é fazer efetivar seus princípios éticos em seu trabalho cotidiano
(IAMAMOTO, p. 77).
Portanto, a partir dessa Lei, o profissional de Serviço Social, no ano de 1993, tem
sua profissão regulamentada e suas devidas competências sinalizadas.
Tal Lei, nº 8.662 (1993), assim como delimitou as competências do profissional de
Serviço Social, delimitou o que constituiria atribuições privativas deste profissional
em seu artigo 5°. Tais atribuições constituem em:
7
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/TRABIN3.HTM. Acesso em: 27 abr.
2009.
Em seu art. 2º a LOAS, estabelece que a assistência social tem por objetivos dentre
outros: I) a proteção à família, à infância e à adolescência; II) o amparo às crianças e
adolescentes carentes. Isso posto, salienta-se que as ações de assistência social
não se dirigem ao universo da população infanto-juvenil, mas a um segmento
específico que delas necessita por se encontrar em estado de carência, exclusão ou
risco pessoal e social. 8
8
Ibid.
obstruindo a esfera pública, a dimensão ética da vida social pela recusa as
responsabilidades e obrigações sociais do Estado. É isso que se verifica no
trabalho cotidiano do Serviço Social.
Neste sentido, Iamamoto (2007, p. 39), afirma que o “[...] desemprego, flexibilização
do trabalho e terceirização estão na base da sustentação da exploração do trabalho
infantil, aliadas às políticas de ajuste, de corte dos gastos sociais [...]”, pois a
contratação da mão-de-obra infantil reduz o custo da força de trabalho levando,
portanto, ao desemprego dos adultos e aumento do trabalho infantil.
Isso posto, segundo Iamamoto (2007, p. 40),
Neste sentido, pode-se notar, portanto, que após várias conquistas profissionais e,
também, de direitos – na área da criança e do adolescente com o ECRIAD, por
exemplo, – parcelas de profissionais de Serviço Social se colocam na
contemporaneidade com um novo perfil. Perfil este, investigativo, comprometido,
crítico e disposto a melhoria de sua prática interventiva.
Portanto, com o advento do ECRIAD nos anos 1990, o profissional de Serviço Social
passou a ser solicitado para trabalhar no sentido de dar aplicabilidade ao Estatuto.
Isso posto, aos profissionais de Serviço Social, cabe assumir a luta para o
fortalecimento e concretização do Estatuto da Criança e do Adolescente para que as
crianças e adolescentes possam ter garantidos seus direitos fundamentais
(COMISSÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 2003, p. 74).
Para finalização deste capítulo, ressalta-se, como exposto, que a década de 1990 foi
marcada, para a área da criança e da adolescência, por grandes avanços. O
principal deles foi a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Destaca-
se, pois, que a partir da implantação desta Lei, para lhe dar aplicabilidade, houve a
criação de inúmeros programas sociais de atendimento à criança e ao adolescente
no Brasil. Estes Programas voltam-se ao atendimento de crianças e adolescentes
vítimas de abuso e exploração sexual, em situação de trabalho infantil, em conflito
com a lei, em situação de rua, crianças e adolescentes que tiveram seus laços
familiares rompidos ou enfraquecidos, entre outros.
Isso posto, nota-se que crianças e adolescentes são obrigados a trabalhar por várias
razões, sendo a pobreza o principal fator que desencadeia essa expressão da
questão social. Muitos governos ao enfrentarem crises econômicas não priorizam o
social: saúde, educação, moradia, saneamento básico, programas de geração de
renda, treinamento profissional, entre outros. Sendo assim a vida para as famílias de
baixa renda se torna uma luta diária pela sobrevivência. Dessa forma, as crianças
são forçadas a assumir responsabilidades, ajudando em casa para que os pais
possam trabalhar, ou indo elas mesmas trabalhar para ganhar dinheiro e
complementar à renda familiar (OIT, 2001).
Nos anos 1990, ressalta-se, pois, que o Brasil ratificou a Convenção Internacional
dos Direitos da Criança. Com relação ao trabalho infantil, o país participa, desde
1992, do Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC) da
Organização Internacional do Trabalho, que se propõe a apoiar os países
participantes a combater progressivamente o trabalho Infantil, objetivando a
erradicação deste (CAMPOS, 1999, p. 11).
Portanto, vale destacar que o trabalho infantil foi condenado pela Organização
Internacional do Trabalho e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF),
sendo considerado um trabalho escravo. Diante disso, a OIT e a UNICEF, após
aprovação da maioria dos países, assinaram tratados e convenções a favor da
erradicação do trabalho infantil no mundo. Os governos brasileiros assinaram todos
os tratados e convenções, mas só quando foi formado o Fórum Nacional de
Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil é que o tema ganhou maior visibilidade
(BONFIM, 2000. p. 07).
Tendo em vista todas as legislações e convenções visando o combate ao trabalho
infantil e, principalmente, as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente
que visa sobre a Proteção Integral e sobre Políticas de Atendimento de crianças e
adolescentes no Brasil lance-se mão, em 1995, da criação de um Programa
específico de combate ao trabalho infantil fruto, também, da luta de movimentos
sociais que nos anos 1990 colocaram em pauta a erradicação do Trabalho Infantil no
Brasil.
9
O sisal é uma planta utilizada para fins comerciais. O A. sisalana é cultivado em regiões semi-
áridas. No Brasil, os principais produtores são os estados da Paraíba e da Bahia. Do sisal, utiliza-se
principalmente a fibra das folhas que, após o beneficiamento, é destinada majoritariamente à indústria
de cordoaria (cordas, cordéis, tapetes etc) (Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sisal. Acesso
em: 01 de junho de 2009).
emprego e renda. Reconhece-se a relevância da mediação da família no
uso do trabalho infantil e, conseqüentemente, no processo de sua
erradicação Assim, as famílias atingidas apresentam elevado grau de
incorporação ao Programa, efetuando-se de maneira constante a
substituição do trabalho infantil pela escola na vida das crianças e dos
adolescentes.
6. A definição da erradicação do trabalho infantil como uma das estratégias
de intervenção do Governo Federal no desenvolvimento social, através da
área de justiça, compondo um conjunto de programas e ações
estabelecidos como prioritários, com recursos que foram previstos, para o
ano de 1996, de forma a eliminar o trabalho escravo ou perigoso de 60 mil
crianças nas carvoarias, no sisal e setor sucro-alcooleiro (CAMPOS, 1999,
p. 17, 19, 20 e 21).
Portanto, estes seis itens são as bases para o desenvolvimento das ações para o
combate ao trabalho infantil através do PETI. Em síntese, tais bases ressaltam: o
envolvimento da sociedade e do governo no combate ao trabalho infantil; a criação
estratégica de condições para a vivência escolar das crianças e adolescentes; a
importância da compreensão do trabalho infantil no contexto das atividades
econômicas; envolvimento dos setores empresariais no combate ao trabalho infantil;
a aliança estratégica com a família das crianças e adolescentes em situação de
trabalho infantil; e, erradicação do trabalho infantil como uma das estratégias de
intervenção do Governo Federal no desenvolvimento social.
Para que os Municípios participem do PETI, respaldado por tais bases, é necessário,
portanto, que existam casos de trabalho infantil. Esse levantamento é feito pelos
estados e Municípios, por meio de seus órgãos gestores de assistência social. Neste
sentido, é importante destacar que para que o PETI seja implantado em qualquer
Estado, exige-se a existência das Comissões Municipais e Estaduais de Erradicação
do Trabalho Infantil (CMETI). As atribuições delegadas ao CMETI são:
[...] na Constituição Federal de 1988 que em seu Artigo 227 elegeu a criança
e o adolescente como prioridade absoluta e em seu Art. 7º, inciso XXXIII,
modificado pela Emenda Constitucional nº 20, de 16/11/1998, proíbe o
trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer
trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a
partir de quatorze anos; na Lei nº 8.069/90 - Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), que em seu Art. 60, ratifica a proibição do trabalho
infantil e que em seu Art. 62 considera que a condição de aprendiz diz
respeito à formação técnico-profissional, ministrada segundo as diretrizes e
bases da legislação em vigor; no estabelecido no Parágrafo II do Art. 2º da
Lei nº 8.742/93 - Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que tem como
objetivo o amparo às crianças e aos adolescentes; na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB), nº 9.394/96, que em seu Art. 89, § 5º,
estabelece que serão conjugados todos os esforços objetivando a
progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental
para o regime de escolas em tempo integral; nas Convenções nº 138 e 182
da Organização Internacional do Trabalhos (OIT), ratificadas pelo Governo
Brasileiro, que estabelecem, respectivamente, a priorização de erradicação
do trabalho infantil nas suas piores formas, bem como a idade mínima de 16
anos para ingresso no mercado de trabalho; no previsto na Política Nacional
de Assistência Social, aprovada pela Resolução CNAS nº 207, de
16/12/1998, que tem como uma de suas diretrizes: a efetivação de amplos
pactos entre Estado e sociedade, que garantam o atendimento de crianças,
adolescentes e famílias em condições de vulnerabilidade e exclusão social;
na Resolução nº 7, de 17/12/1999, da Comissão Intergestora Tripartite –
SEAS/MPAS; na Resolução nº 5, de 15/02/2000, do Conselho Nacional de
Assistência Social-CNAS (BRASIL, 2001).
Através da Portaria nº 458, foi definido que o objetivo geral do PETI seria erradicar,
em parceria com os diversos setores governamentais e da sociedade civil, o trabalho
infantil nas atividades perigosas, insalubres, penosas ou degradantes nas zonas
urbana e rural. Os objetivos específicos seriam: possibilitar o acesso, a permanência
e o bom desempenho de crianças e adolescentes na escola; implantar atividades
complementares à escola - Jornada Ampliada; conceder uma complementação
mensal de renda - Bolsa Criança Cidadã, às famílias; proporcionar apoio e
orientação às famílias beneficiadas; promover programas e projetos de qualificação
profissional e de geração de trabalho e renda junto às famílias (BRASIL, 2001).
O público alvo, a partir da Portaria nº 458, caracterizou-se por ser famílias com
renda per capita de até ½ salário mínimo, com crianças e adolescentes em idade
inferior a dezesseis anos, atendendo as diversas situações de trabalho (BRASIL,
2001).
Quanto à centralidade na família, a Portaria nº 458 expôs que as ações
desenvolvidas no âmbito do PETI devem ter como lócus de atenção a família, a qual
se trabalharia por meio de ações sócioeducativas e de geração de trabalho e renda,
que visem garantir a sua proteção e inclusão social, promovendo melhoria na sua
qualidade de vida (BRASIL, 2001).
10
O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda com
condicionalidades, que beneficia famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, de acordo com
a Lei 10.836, de 09 de janeiro de 2004 e o Decreto nº 5.209, de 17 de setembro de 2004. (Disponível
em: www.mds.gov.br/bolsafamilia/o_programa_bolsa_familia/o-que-e - 45k - acesso dia 01 de
junho de 2009)
11
Disponível em: http://www.mds.gov.br/programas/rede-suas/protecao-social-especial/programa-de-
erradicacao-do-trabalho-infantil-peti. Acesso em: 22 de janeiro de 2009.
12
Disponível em: http://www.mds.gov.br/programas/rede-suas/protecao-social-especial/programa-de-
erradicacao-do-trabalho-infantil-peti. Acesso em: 22 de janeiro de 2009.
É importante destacar que este processo de integração objetiva a garantia da
especificidade e do foco de cada programa. Neste sentido, tal processo possibilita
que ambos os Programas continuem atingindo seus principais propósitos, com a
diferença, no entanto, de promover a potencialização das ações, a unificação das
condicionalidades entre os dois Programas e a universalização do acesso. 13
Portanto, o luta em enfrentar o trabalho infantil conta com vários atores estratégicos,
além do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), que são:
Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério da Educação (MEC), Ministério do
Trabalho e Emprego (TEM), Ministério do Esporte (ME), Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério da Cultura, Ministério da Saúde (MS),
Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil, Organização Internacional do Trabalho
(OIT), e todos que participam de atividades intersetoriais de enfrentamento ao
trabalho infantil. 18
17
Disponível em: http://www.mds.gov.br/programas/rede-suas/protecao-social-especial/programa-de-
erradicacao-do-trabalho-infantil-peti. Acesso em: 22 de janeiro de 2009.
18
Ibid.
19
Disponível em: http://www.mds.gov.br/programas/rede-suas/protecao-social-especial/programa-de-
erradicacao-do-trabalho-infantil-peti. Acesso em: 22 de janeiro de 2009.
trabalho infantil considerado perigoso, penoso, insalubre e degradante como era no
início de sua implantação. 20
20
Ibid.
21
A Rede Criança, criada em 1999, é um sistema que articula instituições governamentais (poder
público) e não-governamentais (sociedade civil) da cidade de Vitória, Espírito Santo. Todas as
entidades e instituições de atendimento à criança e ao adolescente formam a chamada Rede de
Atendimento. A Rede integra programas, projetos e ações desenvolvidos por diversos atores. Sua
filosofia baseia-se na participação e superação de ações isoladas, iniciativas pontuais e medidas
aleatórias, que determinavam a rotina de muitas ações. Tudo isso na verdade é a consolidação do
que está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Disponível em:
http://www.redecria.es.gov.br/oquee/. Acesso dia 27 de abril de 2009)
ONG’s, nos Cajuns (Projeto Caminhando Juntos), em Escolinhas de Esportes e
Clubes, de forma a despertar o potencial destas crianças e adolescentes para um
caminhar mais crítico e participativo na sociedade (VITÓRIA, 2006).
Isso posto, de acordo com uma das entrevistadas da pesquisa realizada, o PETI
vitória, ainda este ano, além de localizado na Gerência de Proteção da Criança e do
Adolescente (GCA) da Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMAS) contará
com equipes, também nos CREAS’s (Centros de Referência Especializados da
Assistência Social) que serão instalados no Município. A implantação dos Centros
Referencia Especializados da Assistência Social visa a melhoria dos serviços de
média complexidade prestados a população. Isso implica um melhor
desenvolvimento do trabalho quanto ao enfrentamento do trabalho infantil no
Município de vitória.
Isso posto, a categoria trabalho do Serviço Social será aqui compreendida como
processo social de transformação que objetiva atender as necessidade sociais de
reprodução dos indivíduos, ou seja:
Neste sentido, considera-se, segundo Iamamoto (2008, p. 420), que “[...] o trabalho
humano é expressão da atividade humana num contexto de alienação e a divisão do
trabalho é a expressão econômica do caráter social do trabalho dentro da alienação
[...]”.
Portanto, sendo o assistente social um trabalhador assalariado ele vende sua força
de trabalho especializada aos empregadores que a conduzirão. Neste sentido,
O assistente social é proprietário de sua força de trabalho especializada. Ela
é produto da formação universitária que o capacita a realizar um “trabalho
complexo”, nos termos de Marx (1985). Essa mercadoria força de trabalho é
uma potência, que só se transforma em atividade –, em trabalho –, quando
aliada aos meios necessários à sua realização, grande parte dos quais se
encontra monopolizado pelos empregadores: recursos financeiros, materiais
e humanos necessários à realização desse trabalho concreto, que supõe
programas, projetos e atendimentos diretos previstos pelas políticas
institucionais (IAMAMOTO, 2008, p. 421).
De acordo com Iamamoto (2008, p. 422), o sujeito que trabalha não tem o poder de
livremente estabelecer suas prioridades, seu modo de operar, acessar todos os
recursos necessários, direcionar o trabalho exclusivamente segundo as suas
intenções, pois existe o poder institucional. No entanto, deve-se considerar que o
assistente social tem como base social de sustentação de sua relativa autonomia, ou
seja, a possibilidade de redirecionar o seu trabalho para rumos sociais distintos
daqueles esperados pelos seus empregadores. Para tanto, na defesa de sua relativa
autonomia, no âmbito dos espaços ocupacionais, o assistente social leva em
consideração a sua qualificação acadêmico-profissional especializada, com a
regulamentação de funções privativas e competências.
Pode-se notar na fala de uma das entrevistadas um pouco desse percurso que o
Serviço Social incorpora no Brasil em relação à profissão propriamente dita e em
relação à área da infância e adolescência no que tange ao trabalho infantil e
surgimento do PETI:
Mas, assim, eu acho que talvez a gente tenha que entender que o PETI,
nasceu numa conjuntura dos anos 90. Nos anos 90 a política de atenção à
criança foi muito forte porque o Estatuto da Criança e da Adolescência
entrou em vigor em 1990 e ai, então foi uma década de grande mobilização
pelos direitos da criança. Naqueles anos de 1990, o Brasil e o mundo quase
todo levantou a bandeira do trabalho infantil, acho que é preciso resgatar
um pouco essa história. Teve a marcha global contra o trabalho infantil e
nós fizemos em Vitória um seminário para fortalecer a idéia da marcha que
era para denunciar o trabalho infantil [...] o trabalho infantil ganhou muita
visibilidade [...] e ai então, o mundo inteiro se mobilizou e o Brasil também,
e em resposta a esta mobilização mundial o Governo Brasileiro criou o
Programa de Erradicação do Trabalho infantil com a proposta do repasse da
bolsa às famílias e da jornada ampliada [...] e, ai, então, também, assim
como o Brasil colocou em pauta a questão da exploração sexual, o turismo
sexual. [...] ai então, a Lei Orgânica para a Assistência Social foi aprovada
em 1993 e a partir daí ela começa e ser discutida, debatida, implementada
e já nos anos 2000 quando o Presidente Lula chega ao Governo que lança
o Bolsa Família, que se delibera pela implantação do SUAS com uma lógica
da baixa, da média e da alta complexidade dentro dessa lógica, então isso
agora nos impõe a um novo desafio que é compatibilizar esses Programas
dentro dessa nova lógica do SUAS. Então, isso que é importante para a
gente estar entendendo, que o PETI está, certamente num processo de
reformulação, de se repensar, de se ajustar ao SUAS e a política de
transferência de renda que o Governo vem fazendo, no caso a Bolsa
Família. Então, está ai um ajuste e uma adaptação. [...] Também, naqueles
anos 90 o Brasil assinou a convenção que proíbe o trabalho até 15 anos, e
ai o Estatuto fala que é possível de 14 a 16 na condição de aprendiz e o
Brasil então, preferiu ficar com a opção do Estatuto até 16 e na condição de
aprendiz de 14 à 16. Ai o Brasil também definiu com outros países as piores
formas do trabalho infantil, existe essa resolução da OIT. Então, tudo isso
foi feito nos anos 90. Foram anos de muita ênfase e de muita força, o
trabalho infantil reduziu muito, mas ele sempre corre o risco de voltar. Sobre
trabalho infantil, nunca vamos poder dizer que acabou, porque a cada
conjuntura de crise o primeiro membro da família, que sente o desemprego
do pai e a falta de opção de trabalho, é a criança. Então, o que faz a família:
bota o filho para vender coisa na rua. Por sua vez, a gente fala que por trás
de uma criança que está trabalhando na rua sempre tem um adulto que
agencia essa criança, que organiza o trabalho dessa criança. [...] é muito
perigoso este tipo de trabalho, a exposição da criança, principalmente
vendendo balas a noite na sociedade” (ENTREVISTADA D).
Estou no Programa desde 2005, têm três anos que eu estou no Programa,
minha carga horária de vínculo empregatício é de seis horas na Prefeitura,
sou efetiva, porém, eu fico mais, eu faço mais do que isso. Por quê? Porque
a coordenação do PETI não é só coordenação do PETI, é coordenação de
média complexidade incluindo as ações de enfrentamento à violência,
abuso sexual e o enfrentamento ao conflito com a lei, então, são três ações
de média que faz parte dessa coordenação conforme está no organograma
da GCA, [Gerencia de Proteção a Criança e ao adolescente], e da SEMAS,
[Secretaria Municipal de Assistência Social] (ENTREVISTADA A).
Sou Secretária desde 2005, Gestora do PETI desde 2005, como Secretária.
Minha carga horária é a de Secretária. Eu sou Secretária, e, portanto eu sou
gestora de todos os Programas da Secretaria [SEMAS] (ENTREVISTADA
C).
Através das falas, pôde-se notar que os profissionais de Serviço Social possuem
vínculos empregatícios diferentes com cargas horárias distintas. A entrevistada A
relatou que sua carga horária é de seis horas, pois é efetiva, no entanto como é
sobrecarregada com coordenações de outras duas ações além do PETI, ela trabalha
mais que isso. Isso mostra o quanto o profissional inserido na lógica capitalista é
explorado e precarizado no seu fazer profissional. Outro exemplo dessa
precarização encontra-se na fala da entrevistada B, que está no Programa a três
anos e já passou por dois tipo de vinculação empregatícia para continuar atuando no
PETI. Um vínculo por contratação temporária e, atualmente, por carteira assinada
através de uma instituição conveniada com a Prefeitura de Vitória.
Portanto, assim como citado no último tópico do segundo capítulo deste trabalho,
tendo como referência Iamamoto (2007), a reestruturação produtiva do sistema
capitalista de produção condiciona uma grande parcela da população, inserida no
mercado de trabalho, à trabalhos precarizados, temporários e subcontratados. Tais
características, deste modelo de produção, refletem significativamente no trabalho
do Serviço Social no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil de Vitória.
Tal fragilidade pode ser observada, também, na resposta obtida quanto a questão da
organização do trabalho do Serviço Social no PETI-Vitória, no que se refere a
elaboração e execução de projetos. Nesta questão a entrevistada B enfatizou que:
O que aconteceu este ano de novo foram as oficinas, [de cidadania nas
escolas] não deixa de ser um projeto que foi elaborado a partir de algumas
demandas percebidas, ou seja, em relação a necessidade de a gente
aproximar das escolas, de levar esta reflexão, de trabalhar numa
perspectiva de prevenção [...] [No entanto não houve sistematização desse
trabalho, ou seja, a realização das oficinas foi por via da execução sem
elaboração de um projeto de fato] [...] se pensa e se elabora de uma forma
meio que superficial, ainda é uma fragilidade do Serviço Social dentro do
Programa, em algumas ações que poderiam ser sistematizadas em um
projeto, mas não é [...] planeja-se, se executa, mas não de uma forma
detalhada [...] muitas vezes devido o decorrer do dia a dia e a urgência de
desenvolver essas ações [...] leva-se a realização do planejamento das
ações, porém não de forma detalhada, em forma de projeto [...] exatamente
pela carência de profissionais dificulta um pouco [a elaboração de fato dos
projetos das ações desenvolvidas e conclusão de projetos elaborados
como, por exemplo, a pesquisa referente ao trabalho infantil nas feiras livres
de vitória que teve um projeto elaborado e foi aplicada, porém não
concluída][...] as ações acabam sendo eventuais. Falta muito, falta muito
planejamento [...].
Portanto, nota-se que há abertura para propor novas ações. No entanto, a maioria
das ações acaba sendo eventuais com planejamentos superficiais sem que haja, de
fato, sistematização em forma de projetos.
Projeto específico dentro do nosso trabalho nós não temos. Nós temos um
Programa maior que é o que determina as diretrizes nacionais e nós
trabalhamos ali dentro. Para cada ação existe um projeto escrito? Não. Para
cada ação existe uma referência e o seu objetivo. Então, nós trabalhamos
em cima do Programa, tanto que o Programa chama-se Programa, então
nós não temos projetos específicos ali dentro.
Observa-se na fala da entrevistada que não há, por parte dos profissionais de
Serviço Social no Programa, um projeto específico por escrito sobre o Serviço Social
no PETI, o que ele desenvolve, quais as demandas postas a este profissional, os
objetivos de seu trabalho no Programa e outros. O que existe são as diretrizes do
Programa com as quais o profissional direciona seu trabalho.
A gente atende uma normativa que vem do governo Federal, mas com
certeza absoluta aqui a gente trabalha para a erradicação do trabalho
infantil. Mas, temos um desafio muito grande de trabalhar e enfrentar a
questão cultural que se tem na cidade, não só na cidade de Vitória, mas no
Brasil inteiro, essa questão da cultura do trabalho infantil que é legitimada.
Então é um desafio neste sentido. Na medida em que os profissionais da
psicologia, do serviço social e os estagiários trabalham com as famílias e
em outros espaços de discussão, também os Conselhos Municipais, tanto
da Assistência quanto do Conselho Municipal da criança, esse debate vem
a tona no sentido de dizer: escuta, o trabalho infantil não deve acontecer, o
lugar de criança é na escola (ENTREVISTADA D).
[...] um dos principais objetivos, também, que a gente pode colocar, – assim
como coloca a Política de Assistência social, no qual o PETI está inserido,
na média complexidade –, é a centralidade na família que também é um
objetivo do PETI (ENTREVISTADA D).
Nota-se, portanto que a maioria das profissionais expôs com clareza os objetivos do
Programa seguindo suas diretrizes em nível nacional.
Neste sentido, os serviços prestados diretamente pelo PETI e pelo Serviço Social no
programa sofrerão alteração e serão diferenciados a partir da implementação dos
CREAS’S, possivelmente até julho deste ano.
Portanto, quanto a implantação dos CREAS’S, sendo estes de orientação nacional,
a entrevistada D, ressaltou que o Município possui dados que possibilitou propor tal
implantação. Segundo ela:
[...] esses serviços nos dá elementos para que a gente possa fazer políticas
públicas e elaborar políticas públicas neste sentido. E, ainda nesta
elaboração de políticas públicas, não é a Prefeitura que trabalha nesta
questão, mas é uma questão que a gente, e aí eu sou membro do
Conselho, representando o Governo, bem como a Secretária representa o
Governo, no Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente
que tem como responsabilidade a formulação de políticas públicas. É um
Conselho paritário, onde tem governo e sociedade civil que se articula e que
faz um plano de trabalho, um plano de ação onde se elabore Programas,
Projetos e indicações, enfim, que se elabore, formule políticas públicas para
que o município realmente execute políticas em direção a crianças e
adolescentes de modo geral, em direção a média complexidade
(ENTREVISTADA D).
[...] o que tem nos ajudado muito é a Política Nacional de Assistência, que já
tem o eixo que nos orienta (ENTREVISTADA D).
[...] o processo de trabalho [do Serviço Social] vai ser mais rico, mais
interessante, mais ousado quando da implantação dos CREAS’S, porque aí
vão ter mais pessoas, vai ter uma possibilidade maior porque é a integração
dos serviços em diferentes lugares, então acho que vai facilitar. Não vai um
pouco ao isolamento do PETI na erradicação do trabalho infantil, claro que
ele não é isolado, mas ele cai no micro.
Tendo nas expressões da questão social a base das demandas ao Serviço Social,
no que se refere ao Programa de Erradicação do Trabalho Infantil constataram-se
como principais: a exigência de acompanhamentos mais constante, visitas
domiciliares, encaminhamentos para atividades sócio-educativas de acordo com o
interesse da criança e adolescente. Além destas, também se tem demandas
voltadas para a área de habitação, e da saúde.
[...] outra demanda também, que nós sentimos necessidade, foi a realização
de uma pesquisa nas feiras livres de Vitória [a fim de constatar entre outras
questões], quantas crianças e adolescentes estão trabalhando nas feiras
(ENTREVISTADA A).
A partir das falas das entrevistadas, nota-se que o Serviço social no PETI busca
efetivar suas ações em parceria com outros programas e instituições que se
preocupam com a defesa e garantia dos direitos da criança e do adolescente, ou
seja, o Serviço Social no PETI visa se articular com a rede de proteção para suprir
as demandas dos usuários quanto à escola, jornada ampliada, profissionalização e
outros.
[...] na visita de inclusão [que faz parte da rotina de trabalho] nós vamos
divulgar o Programa, falar da situação, do enquadramento da família,
detectar se a família tem o perfil de elegibilidade, uma vez a família sendo
incluída, a família assina o termo de adesão e essa família passa a ser
acompanhada. Se a família se enquadrar em todos os pré-requisitos ela vai
receber o benefício [de transferência de renda do PETI, caso não receba
nenhum outro, e o acompanhamento psicossocial recebendo ou não
benefício específico do PETI] [...]. A maior parte das famílias é incluída,
recebendo o benefício e tendo ciência do acompanhamento das
condicionalidades, uma vez não cumprindo as condicionalidades elas são
excluídas ou suspensas do Programa [...] (ENTREVISTADA A).
Pode-se observar nas falas das entrevistas que o “leque” de atividades que
compreende a rotina de trabalho no Programa é bastante intenso o que exige,
portanto, muito trabalho à equipe. Como já exposto, a intensificação do trabalho, a
intensificação das atividades imposta aos profissionais é característica do modelo
capitalista pautado na reestruturação produtiva que exige e atribui cada vez mais
atividades ao trabalhador em sua rotina de trabalho.
4.10 NÚMERO E SUFICIÊNCIA OU NÃO DE PROFISSIONAIS DE
SERVIÇO SOCIAL
Nesta fala, pode-se observar que há grande demanda de trabalho aos profissionais
do Programa ao ponto de muitas vezes surgirem demandas que não se previam.
Sabe-se que é necessário que o profissional de Serviço Social tenha a compreensão
e clareza das demandas que a ele são postas ou que podem lhe ser demandadas.
No entanto, a rotina de trabalho, a insuficiência de profissionais são alguns fatores
que o impede de perceber tais questões no seu fazer profissional cotidiano.
A grande demanda posta ao Serviço Social pode ser explicada, como exposto em
capítulos anteriores, pelo agravamento das expressões da questão social diante dos
rebatimentos do sistema capitalista, que estabelece o projeto neoliberal e a
reestruturação produtiva como modelos de sustentação do capital. Neste sentido, os
rebatimentos do neoliberalismo e da reestruturação produtiva afetam o social,
aumentando a procura pelos serviços sociais, e afetam o trabalho do profissional de
Serviço Social, que trabalha de forma precarizada e diante de limites postos pelo
sistema.
4.13 APRIMORAMENTO INTELECTUAL E CAPACITAÇÃO
PROFISSIONAL
Segundo a entrevistada D:
Claro que há, nós temos preocupação sim, mas a gente, também, tem
muito que aprender ainda a fazer pesquisa. E eu acho que a gente tem que,
na verdade, fazer as vezes o que Marilda fala, incorporar a conduta
investigativa no seu dia-a-dia profissional. Eu acho que é bem possível você
incorporar, você caminhar, tanto exercendo o seu trabalho profissional e ao
mesmo tempo sistematizando o conhecimento que você tem ao trabalhar. E
eu acho que o nosso profissional não faz isso com muita freqüência não,
por exemplo, você pode trabalhar a partir dos cadastros que você faz,
sistematizar dados a partir dos cadastros que você faz, você pode colher as
representações das crianças e das famílias para entender porque as
famílias as vezes, preferem tirar seus filhos da escola e botar no trabalho.
Então, você entender a importância de você estar atenta ao que a família
diz, como a família significa o trabalho, como ela significa a escola [...] você
pode muito bem conciliar o seu trabalho com procedimentos investigativos
que te permitam sistematizar conhecimento. Só que nosso profissional, ele
se debate no dia-a-dia com as exigências da prática, como se a prática
fosse desvinculada da teoria, ele ainda não compreendeu a riqueza que é a
sua inserção na prática, o quanto essa prática, essa experiência, esse
contato com o usuário te dá de possibilidades de você sistematizar o
conhecimento a partir dessa prática. Nós fizemos uma pesquisa com
meninos que trabalham nas feiras fazendo frete [...] mas os resultados
dessa pesquisa não foram divulgados, então ninguém sabe, então não
gerou conhecimento para a gente tomar decisão política, isso é muito ruim.
Então, consideramos extremamente importante, extremamente necessário.
Não há como fazer gestão sem a avaliação, a pesquisa, a sistematização
de dados, de resultados. Você tem que se orientar com isso, mas nós ainda
não fazemos isso de uma forma satisfatória. Por sua vez, as monografias
ficam nas prateleiras e a gente também não sabe, não conhece. Então, eu
acho que é preciso fazer um esforço maior.
Assim como nas falas das demais, nota-se na fala da entrevistada C que existe a
preocupação em incorporar a dimensão investigativa na prática. No entanto, ela
expõe com clareza que há no profissional do PETI uma deficiência em incorporar a
prática investigativa em seu cotidiano. De acordo com a entrevistada, é importante
destacar que falta no profissional a compreensão da riqueza que é o
desenvolvimento do seu trabalho no cotidiano, pois é a partir da prática cotidiana
que se abrem as possibilidades do profissional sistematizar o conhecimento.
Há. Nós temos, no caso da SEMAS, cinco conselhos ligados a nós. Então,
com certeza há sim. Nós temos muitos conselhos, Vitória tem 21 conselhos
em todas as áreas, conselhos de políticas sociais e conselhos de direitos.
Só que, por exemplo, a questão do trabalho da criança e do adolescente ela
muitas vezes fica sub-representada dentro do Conselho de Direitos da
Criança não sendo tão focada [...] há muitas fragilidades, há muitas
necessidades, às vezes você não dá conta de tudo. O PETI tinha um
Conselho Municipal, um Fórum, FEPETI (Fórum Estadual do Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil) mais não se manteve estruturado, portanto
ficou perdido e precisaria estar sendo resgatado (ENTREVISTADA C).
Acho que tem aquele Fórum que discute a questão do trabalho infantil, o
FEPETI, porém, ele deu uma baixa muito grande inclusive do Município,
tanto do Estado quanto do Município. São canais que realmente estão
murchos e acho que devem ser revitalizados, que precisam ser repensados,
mas, assim, não especialmente só na questão do trabalho infantil, mas
entendendo todo o seu serviço da média complexidade. Acho que são
canais de mobilização, podem ser também só do trabalho infantil, pode e
deve ter canais só para isso, mas fazendo articulação com outros serviços
da média complexidade e que deve ser provocado novamente a voltar a
provocar as entidades para participar. O Conselho Municipal é o vigilante
nessa questão, mas também precisa realmente de maior fortalecimento, os
Conselhos e os Fóruns (ENTREVISTADA D).
Portanto, pode-se notar nas falas das entrevistadas que existe um comprometimento
com a participação, ou seja, nota-se que existe a visão por parte dos profissionais
que é importante que se participe desses espaços – tanto eles quanto a sociedade
civil no geral. No entanto, a própria conjuntura fragiliza, enfraquece os espaços de
participação. Neste sentido, percebe-se que o CMETI e o FEPETI, que constituem
espaços de participação no que se refere à discussão da temática acerca do
trabalho infantil, estão enfraquecidos e esquecidos necessitando de retomar a
articulação nestes espaços. Entre tantos outros desafios, este seria mais um para o
profissional de Serviço Social no PETI-Vitória.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a pesquisa, concluiu-se que há, por parte dos profissionais de Serviço Social
do PETI, a preocupação quanto ao aprimoramento intelectual, capacitação
profissional e dimensão investigativa. No entanto, a efetivação dessas diretrizes de
trabalho, assim como a participação política e controle social, ocorre com algumas
limitações e não se realiza como é esperado pelos profissionais de Serviço Social no
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil do Município de Vitória.
Considera-se que, para trabalhar diante de tantos entraves, o profissional deve ter
em mente a realidade na qual se insere e se colocar no desafio de atuar diante de
todos os empecilhos, já citados, impostos pela conjuntura. Para tanto, o profissional
deve atuar segundo seu projeto ético-político na direção de uma mudança societária
a favor das classes subalternas e da defesa dos direitos dessas.
Diante da realidade inserida, o profissional tem o desafio de se posicionar contra os
ditames que dificultam seu fazer profissional. Cabe a ele ser comprometido com seu
projeto ético-político e cabe a ele acompanhar as mudanças societárias, a realidade
na qual se insere para, a partir de então, propor novos direcionamentos para sua
prática cotidiana junto a seus usuários que são sujeitos de direitos. Direitos estes,
conquistados frente muitas lutas e dificuldades em vários períodos históricos e que
não devem deixar de se efetivar.
Este estudo foi relevante para acentuar o debate acadêmico acerca da prática
profissional do Assistente Social, pois nota-se que tal discussão tem sido pouco
problematizada nos trabalhos de conclusão de curso.
Com a realização do estudo proposto neste trabalho, observou-se como vem se
desenvolvendo a atuação profissional dos assistentes sociais, de um determinado
Programa do Governo Federal, frente aos limites e desafios que são postos ao
profissional em seu processo de trabalho.
6 REFERÊNCIAS
3 BONFIM, José. Texto: Trabalho Infantil: o drama de quem tem que deixar a
escola (publicado originalmente no Jornal A TARDE, 18 jan. 2000). Revista: Visão
Mundial Transformação; Ano XII, nº 03, Dez. 2000; Tiragem: 12.000.
29 NETTO, José Paulo. Ditadura e serviço social: uma análise do serviço social no
Brasil pós-64. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2006.
14. Há relações entre a sociedade civil organizada por via de conselhos de direito,
fóruns ou outros?
Por este documento você está sendo convidado (a) a participar da pesquisa: Limites e
Possibilidades do Processo de Trabalho do Serviço social no Programa de Erradicação
do Trabalho Infantil do Município de Vitória - ES . O propósito desse trabalho é analisar
quais são os limites e as possibilidades do processo de trabalho do serviço Social no Programa
de Erradicação do Trabalho Infantil do Município de Vitória no período correspondente ao
ano de 2006 a 2008. Pretende-se com esta pesquisa levantar aspectos referentes à prática
profissional do Serviço Social no PETI.
No que tange as técnicas de coleta de dados, serão aplicados questionários com perguntas
abertas e fechadas, que serão respondidas individualmente e posteriormente analisadas pelo
pesquisador.
O presente termo assegura os seguintes direitos:
a) Garantia de esclarecimentos antes e durante o curso da pesquisa, sobre todos os
procedimentos empregados em sua realização;
b) Liberdade de se recusar a participar ou retirar seu consentimento em qualquer
fase da pesquisa;
c) Garantia de sigilo quanto aos dados confidenciais envolvidos na pesquisa,
assegurando absoluta privacidade;
d) Opção de solicitar que determinadas falas e/ou declarações não sejam incluídas
em nenhum documento oficial, o que será prontamente atendido.
Você receberá uma cópia desse termo em que constará o telefone dos
pesquisadores, podendo tirar suas dúvidas a qualquer momento sobre o projeto e
sua participação.
____________________________________
Assinatura do Declarante
ANEXO