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le atirou-me um beijo.

Inesperadamente.

E eu… Bem eu, apressei-me a agasalhar o beijo.

O beijo sentiu-se tão bem acolhido, e tão abrigado


do ventinho que soprava, que se deixou ficar e
aconchegou-se muito acanhadinho até passar a
fazer parte de mim.

Ele chamava-se Armor.

Eu chamava-me Felicidade.

Era Verão. A praia, de um lado, recebia o toque


suave da ria; do outro lado, o ímpeto e a turbulência
do mar. Por perto, sempre um ventinho que trazia o
cheiro a maresia.

Naquela altura do ano, como já vinha sendo hábito,


grande parte do areal estava ocupado por um
grande acampamento. Muita gente que eu conhecia,
como o Solano e a Luana - de quem era muito amiga
-, e outra que viera de fora. Alguns, de muito longe.
Entre eles o Armor. Quando chegaram, e começaram
a montar as tendas, reparei logo nele. Não passava
facilmente despercebido. Atenta, descobri que, ao
começo da tarde, ele gostava de ir até à ria e quase
sempre se detinha no pequeno cais onde
descansavam ancorados os barcos.

Nessa tarde, como se fosse um acaso, eu já estava


no cais quando ele chegou. Sentei-me no banco
tosco feito de tabuinhas. As palavras que tínhamos
trocado eram poucas, os olhares muitos (deixavam-
me num alvoroço…). E foi exactamente sem recorrer
às palavras, mas com um gesto, que aquilo
acontece. Ele olhou-me e, com a mão, mandou-me
um beijo.

E eu agasalhei o beijo.

E eu senti-me beijada.

Que iria acontecer? Que iria acontecer?

Então, também inesperadamente, foi-se embora.


Sem mais.

Como se tivesse sido uma ilusão.

Excerto do Livro Fala-me de Amor, de Graça Gonçalves, Edições Gostar

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