Texto escrito originalmente no formato folhas com o intuito de ser publicado numa terceira edição do Livro Didático Público de Filosofia da Secretaria de Educação do Estado do Paraná. Juliano Orlandi é professor da rede estadual de ensino deste mesmo estado.
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AS NARRATIVAS MÍTICAS – Juliano Orlandi hegemônico de acesso ao saber. Escutemos um
(retirado de www.seed.pr.gov.br/portals/folhas) mito grego e procuremos descobrir as características citadas acima. Os povos da antiguidade tinham o hábito de “Aborrecido com seus companheiros por não elaborar histórias sobre deuses, heróis e criaturas acreditarem em sua origem divina, Faetonte, fantásticas que eram repassadas de uma geração para seguindo o conselho da mãe mortal Climene, outra nos rituais religiosos, nas festividades ou procurou o pai Apolo em seu palácio dourado simplesmente nas conversas diárias. Essas histórias, em busca de um sinal pelo qual todos soubessem comumente chamadas de mito, são consideradas hoje que pertencia à raça dos deuses. Embora Apolo absurdas e fantasiosas, mas continuam fascinando tenha prometido, sob juramento pelo Estige, tanto jovens quanto adultos. Em semelhança a esses conceder qualquer pedido que Faetonte lhe povos, os gregos antigos também formularam fizesse, desgostoso ficou ao ouvir o desejo do histórias sobre deuses, heróis e criaturas fantásticas. filho imprudente: conduzir por um dia a O que ocorreu especificamente com este povo foi carruagem do Sol. Alertou-o que a incumbência que, a partir do séc. VI a.C., o modo mítico de era excessiva para um mortal, visto que, entre os produzir discurso foi criticado e lentamente deuses do Olimpo, apenas ele próprio estava substituído por uma nova modalidade de discurso: a destinado a suportar tão penoso trabalho. O filosofia. Quais são, contudo, as características do atrevido rapaz, no entanto, teimou em sua mito que o tornam diferente dos discursos audaciosa pretensão e não se deixou convencer filosóficos? pelas súplicas paternas. Ao subir na obra-prima de Hefesto, o carro 1. O MITO GREGO dourado salpicado de pedras preciosas e aliado Os mitos eram narrativas fantásticas aos corcéis de fogo, exaltou-se o rapaz com a transmitidas na Grécia antiga (séc. XX – VI a.C.) de felicidade de ser seu dono durante um dia. Tal forma oral pelos poetas e cantores da época: os euforia, entretanto, logo deu lugar ao sentimento rapsodos e os aedos. Neles eram relatadas as de impotência diante da dificultosa tarefa, pois aventuras e lutas das divindades como Zeus, Apolo, assim que os cavalos perceberam que suas Afrodite e dos heróis como Héracles, Teseu e rédeas estavam em mãos sem prática, passaram Odisseu. As narrativas míticas explicavam os mais a escolher o caminho à revelia. Ao invés de se variados aspectos da realidade grega e constituíam, manter em seu trajeto habitual, o Sol se assim, a visão de mundo dominante entre os helenos. precipitava para baixo, destruindo a face amável Os mitos remontam à época em que ainda não da natureza e as obras do homem. A relva havia escrita na Grécia e, por essa razão, eram murchou, as searas foram queimadas e os difundidos por meio da palavra falada. O vocábulo bosques desfizeram-se em fogo e fumo. Nesse grego mýthos, do qual se origina o termo português dia, um pedaço da terra transformou-se num “mito”, compartilha o mesmo radical do verbo grego deserto de areia, onde nem homens nem animais mýtheomai, cujo significado é “dizer”. Assim, mito podem se desenvolver. Perturbado pela significa, em sua acepção mais primitiva, “palavra balbúrdia de Faetonte, Zeus-pai acordou de sua falada”, “o que foi dito”. Os grandes representantes sesta e lançou um raio na descontrolada desse tipo de narrativa, os poetas Homero e Hesíodo, carruagem do Sol. Arrancado do carro, o jovem viveram, na verdade, em seu período mais tardio; no presunçoso se precipitou em direção ao solo qual a escrita é redescoberta pela cultura grega e com o cabelo em chamas, como uma estrela permite, assim, o registro das antigas narrativas. As cadente, para ir apagar-se no rio Erídano. Os principais obras desses autores, a Ilíada e a Odisséia, corcéis do Sol, sem condutor, procuraram sua no caso de Homero, e a Teogonia e Os Trabalhos e cocheira no céu; e por uma vez caiu a noite os Dias, no caso de Hesíodo; fornecem-nos o mais sobre a Grécia em pleno meio-dia.”1 remoto testemunho da antiga cultura helênica. Ao ____________________ longo da história, os mais diversos interesses, GLOSSÁRIO Apolo – filho de Zeus com Leto e irmão de Ártemis. Era o deus continuamente, voltaram seus olhos para as obras de da luz e do Sol e era identificado com o arco e a flecha, a Homero e Hesíodo na perspectiva de aprendizagem e poesia, música e a verdade. Estige – é um dos rios do mundo conhecimento. Na perspectiva de compreender o mítico dos mortos, o Hades. Para os gregos, um juramento pelo surgimento da filosofia, entretanto, três Estige não pode ser desrespeitado nem pelos deuses. características se destacam: a função de explicação e imprudente – irrefletido, precipitado. incumbência – missão, organização da realidade, o apelo ao divino ou 1 Adaptado de MONCRIEFF, A. R. H. Mitologia Clássica: sobrenatural e, finalmente, a revelação como modo Guia Ilustrado. Lisboa: Editorial Estampa, 1997. 2 encargo. penoso – doloroso, fatigante. audaciosa – ousadia, como as sentia poderosas e sofria seu predomínio, atrevimento. súplica – oração, pedido, prece. salpicado – confessou a estas suas dependências; rezou-lhes e manchado, espalhado em partículas. euforia – bem-estar, felicidade. revelia – rebelde, esquivo. relva – terreno coberto adorou-as; e dessas coisas construiu os deuses” de erva. seara - campo que tem cereais semeados. balbúrdia – (Ibidem, p. 128). confusão, desordem. Zeus – é o chefe dos deuses gregos, Podemos chamar esse processo pelo nome de identificado ao raio e ao trovão. presunçoso – presumido, “deificação das forças da natureza”. Ele se vaidoso. Erídano – é um dos rios do mundo mítico dos mortos, caracteriza, basicamente, oferecer explicações o Hades. cocheira – local onde se alojam cavalos e carruagens. corcéis – cavalos. místicas ou religiosas para os eventos que ocorrem entre os homens e para os quais não há outra 2. A FUNÇÃO DE EXPLICAÇÃO E explicação disponível. Ele não se esgota, contudo, na ORGANIZAÇÃO DA REALIDADE explicação dos fenômenos da natureza, mas pretende A principal característica das narrativas explicar e organizar fenômenos políticos ou sociais míticas, que se apresenta a partir de uma breve e, até mesmo, fenômenos psicológicos. É o que leitura do Mito de Faetonte, é a função de explicar e ocorre, por exemplo, com a guerra de Tróia, evento organizar a realidade. Todos os mitos pretendem político-social ocorrido aproximadamente por volta tornar inteligível um ou mais fenômenos que de 1250 a.C. Segundo o relato homérico, ela influenciam a vida humana. Assim, os eventos que aconteceu por causa de um concurso de beleza entre ocorriam diariamente espantavam as pessoas e as deusas Afrodite, Atena e Hera, no qual o juiz exigiam explicações. O mito é, nesse sentido, a troiano, Páris Alexandre, recebeu como suborno a primeira resposta que os gregos antigos ofereceram capacidade de seduzir a mais bela das mulheres: para as perguntas que surgiam de seu contato com os Helena. Ela, no entanto, era casada com Menelau, rei fenômenos da realidade. de Esparta; que uma vez ultrajado, reuniu, com a No mito de Faetonte, por exemplo, é possível ajuda de seu irmão Agaménon, os exércitos aqueus e perceber constantemente essa preocupação. Logo no partiu em direção à Tróia para recuperar sua esposa. início, o mito apresenta uma explicação para a Nesse caso, o fenômeno explicado pelo mito não é natureza do fenômeno do Sol e para o seu da ordem natural, mas pertence à ordem humana. Os movimento aparente. Segundo essa explicação, ele é mitos têm, portanto, a pretensão de oferecer uma carruagem de fogo puxada por cavalos explicações para toda a realidade humana, seja ela flamejantes. Um pouco adiante, a narrativa de natural ou “artificial”. Faetonte explica a ocorrência de um incêndio que devastou as florestas e as plantações. Explicam-se 3. O APELO AO DIVINO OU SOBRENATURAL também o fenômeno da estrela cadente, do raio e de A segunda característica que podemos perceber um eclipse solar. A história de Faetonte nos mostra a partir da leitura do mito de Faetonte e que está claramente a preocupação da narrativa mítica em intrinsecamente ligada à primeira é o apelo ao divino oferecer explicações para os diversos fenômenos que ou sobrenatural. Ela constitui a estrutura de ocorriam entre os homens gregos. explicação da realidade utilizada nas narrativas Segundo Coulanges (2000, p. 127), nos míticas e, por essa razão, repete-se nos diversos primeiros tempos, “[...] os costumes da vida acontecimentos e personagens dos mitos antigos. Ela civilizada ainda não haviam estabelecido uma se manifesta, exemplarmente, na personagem separação entre natureza e homem”. Os gregos central, Faetonte. Segundo a terminologia primitivos estavam de tal modo submetidos à força mitológica, ele é um semideus, isto é, ele é da natureza que sentiam, constantemente, suas parcialmente divino e parcialmente humano, pois é fraquezas e limitações diante de tudo aquilo que lhes filho do deus Apolo com uma mortal: Climene. Por cercava. Assim, esperavam ansiosamente pela chuva sua ascendência divina, realiza ações que extrapolam de que dependia sua colheita, receavam as a vida dos homens comuns. Nesse sentido, ele é tempestades e secas pelo seu poder de destruição, divino. Por outro lado, em função de sua ascendência espantavam-se com o desaparecimento repentino do materna, ele não tem poder suficiente para realizar as Sol no momento de um eclipse. “O homem ações que os deuses realizam. Portanto, ele é experimentava em si, perpetuamente, um misto de humano. Essa diferença entre humano e divino, veneração, de amor e de terror, perante a poderosa mortal e imortal, natural e sobrenatural ou ordinário natureza” (Ibidem, p. 127-128). e extraordinário constitui o modo próprio através do Julgando as forças naturais em semelhança qual os mitos gregos explicavam e organizavam os consigo, o grego primitivo reconheceu-lhes o fenômenos da realidade. O jovem grego é capaz, pensamento, a vontade, os sentimentos; “[...] e, segundo o mito, de realizar coisas que são absolutamente proibidas aos demais mortais. Ele 3 pode procurar o pai num palácio divino, assumir terra à água misturar e aí pôr humana voz e temporariamente as funções de um deus, utilizar-se força, e assemelhar de rosto às deusas imortais de artefatos divinos, etc. Em todos os casos, Faetonte esta bela e deleitável forma de virgem; e a Atena não leva uma vida comum e banal como os outros ensinar os trabalhos, o polidedáleo tecido tecer; homens. Pelo contrário, sua vida é extraordinária. Se, e à áurea Afrodite à volta da cabeça verter graça, entretanto, ele pode ir até o palácio paterno, por terrível desejo e preocupações devoradoras de outro lado, esta não é a sua morada. Se ele pode ter membros. um pedido concedido por um deus, ele é, no entanto, Aí pôr espírito de cão e dissimulada conduta desencorajado a fazê-lo. Se ele assume uma função determinou ele a Hermes Mensageiro Argifonte. divina, ele não é, contudo, capaz de concluí-la. Assim disse e obedeceram a Zeus Cronida Rei. Faetonte personifica uma distinção e uma tensão [...] entre o divino e o humano que constitui para os o arauto dos deuses aí pôs e a esta mulher chamou gregos antigos a estrutura de organização e Pandora, porque todos os que têm olímpia morada explicação da realidade. Todos os eventos naturais, deram-lhe um dom, um mal aos homens que comem os fenômenos políticos e os estados psicológicos, e pão. não apenas as personagens, estão, aos olhos dos [...] gregos do mito, imbuídos dessa tensão entre o divino e o humano. Explicar os acontecimentos da realidade (HESÍODO, 1996, p. 25-29). significa nesse contexto descobrir as causas ____________________ sobrenaturais ou divinas dos fenômenos naturais ou GLOSSÁRIO Afrodite – deusa grega do amor e da beleza. Agrega-nuvens – humanos. No mito de Faetonte, por exemplo, todas que reúne as nuvens. Aprazer – agradar. Arauto – mensageiro. explicações encontradas para os fenômenos Argifonte – mensageiro rápido. Atena – deusa grega da supracitados são de ordem sobrenatural ou divina: o sabedoria, inteligência e guerra. Áurea – de ouro, da cor de Sol é uma carruagem de fogo conduzida por um ouro. Cronida – filho de Cronos, um dos seis titãs. Curvo- deus, o incêndio é causado pela aproximação da tramar – astuto, de intenções ocultas. Deleitável – que dá prazer. Encolerizado – enfurecer. Férula – espécie de planta carruagem à terra, o raio é manifestação da vontade utilizada na conservação e transporte do fogo. Frui-raios – que de Zeus, a estrela cadente é Faetonte caindo com está na posse do raio. Ínclito – famoso, ilustre. Jápeto – um cabelo em chamas e, finalmente, o eclipse solar é o dos seis titãs. Lograr – burlar. Olímpia – relativo ao monte retorno precoce da carruagem à cocheira. Todos Olimpo, morada dos deuses. Pandora – na mitologia grega, a esses casos organizam seus elementos sobre a primeira mulher. Polidedáleo – muito complexo, intrincado. Prometeu – filho do titã Jápeto. Titãs – divindades gregas mesma estrutura de sentido: a tensão entre o humano anteriores aos deuses olímpicos. e o divino e, assim, expressam o modo específico de explicação da realidade das antigas narrativas 4. A REVELAÇÃO COMO MODO míticas. HEGEMÔNICO DE ACESSO AO SABER ________________ Se as narrativas míticas relatam, referindo-se Oculto retêm os deuses o vital para os homens; ao mundo dos deuses, o surgimento da realidade e senão comodamente em um só dia trabalharias dos diversos fenômenos humanos; então elas para teres por um ano, podendo em ócio ficar; constituem a forma de “conhecimento” própria dos [...] gregos arcaicos. A concepção de saber que lhe Mas Zeus encolerizado em suas entranhas ocultou, determina as características é, contudo, bastante pois foi logrado por Prometeu de curvo-tramar; particular e merece, por essa razão, um tratamento por isso para os homens tramou tristes pesares: minucioso. ocultou o fogo. E de novo o bravo filho de Jápeto No Proêmio ao poema Teogonia, diz Hesíodo roubou-o do tramante Zeus para os homens mortais (2001, p. 107): em oca férula, dissimulando-o de Zeus frui-raios. Então encolerizado disse o agrega-nuvens Zeus: Elas [Musas] um dia a Hesíodo ensinaram belo “Filho de Jápeto, sobre todos hábil em suas tramas, canto apraz-te furtar o fogo fraudando-me as entranhas; quando pastoreava ovelhas ao pé do Hélicon divino. grande praga para ti e para os homens vindouros! Esta palavra primeiro disseram-me as Deusas Para esses em lugar do fogo eu darei um mal e Musas olimpíades, virgens de Zeus porta-égide: todos se alegrarão no ânimo, mimando muito esse 'Pastores agrestes, vis infâmias e ventres só, mal”. sabemos muitas mentiras dizer símeis aos fatos Disse assim e gargalhou o pai dos homens e dos e sabemos, se queremos, dar a ouvir revelações'. deuses; Assim falaram as virgens do grande Zeus verídicas, ordenou então ao ínclito Hefesto muito velozmente 4 por cetro deram-me um ramo, a um loureiro sobrenatural ou divina, a qual o homem, em virtude viçoso30 de sua natureza mortal, não tem acesso. Para colhendo-o admirável, e inspiraram-me um canto descobrir,portanto, as causas dos fenômenos naturais divino para que eu glorie o futuro e o passado, ou humanos; ele necessita de alguma forma de impeliram-me a hinear o ser dos venturosos sempre mediação com o sobrenatural. As Musas exercem, vivos para os gregos do período mítico, esse papel e, e a elas primeiro e por último sempre cantar. assim, revelam aos limitados mortais o que ocorre no [...] mundo dos deuses. ____________________ Sem a evocação das Musas, portanto, as GLOSSÁRIO Musas – as nove divindades gregas que presidem todas as narrativas míticas perdem sua força argumentativa e formas de manifestação espiritual. Hélicon – monte da Grécia a legitimidade característica dos discursos gregos Central. Olimpíades – relativo ao monte Olimpo. Porta-égide arcaicos. A tensão entre uma realidade humana e – que carrega o escudo, protetor, defensor. Símeis – outra realidade divina impõe a necessidade de uma semelhantes, iguais. mediação, que ocorre nos mitos gregos por força da concessão do poder das Musas aos aedos e rapsodos. Assim como todos os poemas da Grécia Em função desta estrutura interna, o mito expressa a arcaica, a Teogonia de Hesíodo se inicia com a concepção mítica de que a sabedoria só é obtida por estrutura da evocação das Musas. Elas são filhas de meio da revelação divina. Zeus-pai com a deusa Mnemósine (Memória) e foram criadas para que louvassem todas divindades 5. O ALCANCE DO MITO com o canto. Quando, porém, são evocadas no início Os mitos constituíam, portanto, uma de um poema grego, cumprem o importante papel de modalidade discursiva de explicação da realidade inspirar o poeta (“colhendo-o admirável, e que predominou entre os gregos antigos até o séc. VI inspiraram-me um canto / divino para que eu glorie o a.C. Seu modo próprio de entender os fenômenos futuro e o passado”, v. 31-32). estava fundado na tensão entre o divino e o humano Essa inspiração promovida pelas Musas deve, e, assim, ele encontrava para todos os eventos entretanto, ser entendida num sentido mais forte do naturais ou sociais causas divinas ou sobrenaturais. que o corriqueiro. Ela não constitui um mero Por força dessa estrutura de explicação, as causas entusiasmo que anima a atividade do poeta, mas dos fenômenos ordinários estavam distantes dos expressa a concessão do poder divino de canto a homens comuns e o único modo de conhecê-las era Hesíodo. O cetro mencionado no verso 30 é, entre os através da mediação de uma divindade. Por isso, gregos, símbolo de poder e competência, quer nas todos os poemas míticos se iniciavam com a reuniões dos reis, quer nos círculos de ouvintes dos estrutura de evocação das Musas. A partir do séc. VI aedos. a.C., no entanto, os gregos passaram a desenvolver Nesse poema, o símbolo do poder concedido a uma nova forma de discurso que pretendeu, Hesíodo é o loureiro, árvore relacionada ao deus explicitamente, superar as antigas narrativas míticas. Apolo, que junto às Musas preside as artes e a Embora o predomínio da poesia tenha sido música. Ao oferecer o loureiro viçoso como cetro, as enfraquecido em função dessa novidade e também Musas “[...] lhe [Hesíodo] outorgam o poder que em função das diversas mudanças sociais que lhe são elas próprias, – ou, dito de outro modo, mais acompanharam, a estrutura mítica de explicação dos usual e menos nítido, o poder de que elas são fenômenos jamais deixou de povoar e influenciar a detentoras” (TORRANO, 2001, p. 27). relação intelectual dos homens com o mundo. Por As Musas não só concedem o poder de cantar essa razão, é possível percebê-la em épocas mais ao poeta grego, mas também lhe ensinam qual canto recentes da história. É possível inclusive perceber deve ser celebrado (“Elas um dia a Hesíodo sua presença na época atual. Nesse sentido, a ensinaram belo canto” v. 22). O objeto dos seus explicação mítica dos fenômenos não deve jamais versos, assim como de qualquer outro poema grego ser considerada primitiva ou atrasada, porque ela do período arcaico, é sempre o mesmo: as façanhas ainda determina o modo como nós apreendemos a dos deuses imortais (“impeliram-me a hinear o ser realidade. dos venturosos sempre vivos” v. 33). No próprio título da obra já pode se perceber a natureza divina de seu tema: da união de “theós”, cujo significado é “deus”, e “génos”, que significa “nascimento”; resulta “teogonia”, “o nascimento dos deuses”. Esse conteúdo pertence, entretanto, à dimensão 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APOCALIPSE. In: Bíblia Sagrada: edição pastoral. São Paulo: Paulus, 1990. BURCKHARDT, J. The Civilization of the Renaissance in Italy. New York: The New American Library, 1961. CORNFORD, F. M. 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O Conhecer e o Educar em Platão: A Anamnesis Apresentada No "Menôn" Como Condição de Possibilidade Da Paidéia Apresentada Na "República" - Por André Ferreira - UFPE