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HAT | A TEORIA DO DISCURSO DE LACLAU E MOUFFE: EM DIRECAO A NOGAO DE SIGNIFICANTE VAZIO Daniel de Mendonca presente artigo tem por objetivo introduzir « Teoria do Discurso de Emesto Laclau ¢ Chantal Mouffe a partir da apresentaco de suas principais categorias te6rico-analiticas. Nesse sentido, no primeiro momento, serd realizada uma breve retomada da origem ¢ das influéncias teéricas dos autores para apés, serem apresentadas suas principais nogdes: pritica articulatéria, discurso, sobredeterminagdo, pontos nodais, limites, antagonismo, l6gicas da diferenga ¢ da equivaléncia e significante vazi Palavras Chaves: Emesto Laclau, Chantal Mouffe, Teoria do Discurso, prética articulatéria, discurso, antagonismo e significante vazio. ‘The aim of this article is to introduce some of the main concepts of the Ernesto Laclau ‘and Chantal Mouffe’s Discourse Theory. Therefore, there are two main parts in this article. The first part presents briefly the origins and the theorical influences of these authors, "The second one presents the notions of practice of articulation, discourse, overdetermination, nodal points, limits, antagonism, equivalence, difference, and empty signifier. Keywords: Emesto Laclau, Chantal Mouffe, Discourse Theory, practice of articulation, discourse, antagonism, and empty signifier. 1 Introdugio presente artigo tem por oh tivo apresentar as principais nogGes do pensamento filoséfico e politico de Emesto Li au e Chantal Mouffe. Apesar da importincia que a Teoria do Discurso j& vem exercendo em circulos académicos norte-americanos & europeus desde meados da década de 1980, suas teses ainda sAo muito pouco conhecidas no Brasil. Somado a esse quase completo desconhecimento de suas obras, justificamos a importincia da divulgago desta teoria em nosso pafs, tendo em vista que suas categorias analiticas podem servir como importantes ferramentas teGricas para anélises de socidlogos ¢ cientistas politicos brasileiros. Antes de propriamente tratarmos das categorias do pensamento de Laclau e Mouffe, apresentaremos, em linhas gerais, as origens e as influéncias dessa proposta te6rica. Inicialmente € importante tencionarmos que a Teoria do Discurso tem como ponto de partida a publicagio de Hegemony & socialist strategy: towards a radical democratic politics em 1985. A partir desta obra, oS autores inscrevem-se numa perspectiva te6rica diferente da assumida no primeiro livro de Emesto Laclau, 0 tinico até agora publicado no Brasil, denominado Politica e ideologia na teoria marxista (Laclau, 1978). Em Politica e ideologia na teoria marxista, apesar de jé estabelecer ctiticas ao que chamou de “situagio insatisfat6ria para a teoria marxista” (Laclau, 1978, jicamente anélise simplista do “reducionismo de classe” p. 14), que se resumia b: (Laclau, 1978, p. 16), Laclau seguia ainda seus escritos sob a influéncia declarada do pensamento marxista recente, de Della Volpe a Althusser: |A pritica te6rica foi em grande medida prejudicada pelos dois obsticulos tencionados: a articulagdo conotativa dos conceitos ao nivel do discurso do senso comum, € sua articula¢do racionalista em paradigmas essenciais. Os censaios. que integram este livro foram escritos na convicgdo de que esses ‘obstéculos se combinaram para gerar uma situagdo insatisfat6ria para a teoria rmarxista, Foram escritos também, na certeza de que 0 pensamento marxista ‘mais recente, de Della Volpe a Althusser, comegou a criar as condigdes para ‘uma interpretago cientifica do marxismo que nos permitiré superar essa situagdo critica (Laclau, 1978, p. 14). ‘Cumpria, dessa maneira, a0 projeto te6rico de Emesto Laclau, a partir da influéncia de um pensamento marxista académico, principalmente althusseriano, criar condigdes para uma interpretago cientifica do marxismo, isenta, portanto, do mero reducionismo essencialista de classes existente que, segundo Laclau, estava presente em diversas andlises desta tradigao. Dessa forma, a nogo althusseriana de sobredeterminagao é, conferme Laclau & Mouffe (1985), um instrumento tedrico importante para auxiliar nas andlises sociol6gicas ou politicas, sem que se caia no reducionismo econdmico. Tal nogao traz a idéia de que niio hé nada social que nao esteja sobredeterminado, ou seja, o social se constitui numa ordem simbélica. A constituigaio dessa ordem simbélica dé-se a partir da que segundo Althusser & “uma ‘representagdo’ da relaglo imaginéria dos individuos com suas condigdes reais de existéncia” (Althusser, 1985, p. 85). A sobredeterminagio pressupde, ainda, relagdes sociais desprendidas de qualquer lei imanente ou essencial, tendo em vista estas serem sempre contingentes e precéirias. Tal nogdo althusseriana, conforme Laclau & Mouffe (1985), abre a possibilidade para a teoria marxista romper definitivamente com o determinismo € 0 essencialisme classista, ‘uma vez que torna possfvel a elaboragio de um conceito de articulagdo! que tenha por pressuposto o carter sobredeterminado das relagGes sociais. A categoria de articulagio, ou pratica articulatéria, € central na proposta te6rica de Emesto Laclau € Chantal Mouffe como veremos a seguir. Ocore que a anélise althusseriana nZo rompeu definitivamente com a “determinag&io econémica” do marxismo. Apesar da nogao de sobredeterminagiio, que pressupde uma complexizago do social e, portanto, de sua andlise, Althusser, conforme Laclau & Mouffe (1985), ainda manteve em sua estrutura tedrica 0 reducionismo por eles criticado: Althusser escorrega no mesiio defeito que critica: ha um objeto universal abstrato, a ‘economia’, © qual produr efeitos concretos (determinagio em ‘iltima instancia aqui e agora); hé outro objeto igualmente abstrato (condigées de existéncia), cujas formas variam historicamente, mas que esto unificadas por uum pré-cstabelecid papel essencial de assegurar a reprodugio da ‘economia; Finalmente, comio a economia e a sua centralidade so invaridveis, ‘em qualquer arranjo social possivel, abre-se a possibilidade de se estabelecer uma definigsio da sociedade, Aqui a andlise completa um circulo completo. Se a economia é tun objeto que pode determinar qualquer tipo de sociedade fem diltima instincia, isso significa que, ao menos com referéncia a esta instincia, nos estamos frente a uma simples determinagio © no a uma sobredeterminagio (Laclau & Mute, 1985, 9. 99). Portanto, Hegemony & socialist strategy rompe definitivamente com a tentativa anterior de “criar condig6es pars: uma interpretacZo cientifica do marxismo”. Laclau & Mowffe adotaram, a partir dessa obra, uma linha critica A teoria marxista que eles mesmos denominam de pés-marxismo: “reler a teoria marxista & luz dos problemas contempordneos necessariamente envolve desconstruir as categorias centrais dessa teoria, Isto € 0 que nés chamamos de pés-marxismo" (Laclau & Mouffe, 2001, p. ix). £ importante ressaltarmos, contudo, que o “p6s-marxismo” de Laclau & Mouffe nfo significa necessariamente 0 abandono de todas categorias da tradigao marxista. 2 Todas as tradugdes de citagdes de artigos publicados em Ifngua estrangeira (ingles, francés ¢ espanhol) sio de responsabilidade do autor € para uso exclusivo neste artigo, Nogées como as de sobredeterminagdo, de Althusser, de guerra de posicdes, bloco histérico, vontade coletiva, hegemonia, lideranca moral e intelectual, de Gramsci, conforme Laclau & Mouffe (2001), representa o ponto de partida de suas reflexes em Hegemony and socialist strategy. No entanto, a Teoria do Discurso recebe ainda aporte de outras correntes tedricas como do desconstrutivismo de Derrida e da psicanilise de Lacan: © pés-estruturelismo € 0 terreno no qual nés temos encontrado a fonte principal de nosca reflexto teGrica e, juntamente do campo p6s-estruturalista, ‘a desconstrugio e a ‘eoria lacaniana tém sido de importincia decisiva na formulacio da nossa sbordagem sobre hegemonia (Laclau & Mouffe, 2001, xi). ‘A Teoria do Discurso teve continuidade com as obras Nuevas reflexiones sobre a revolucion de nuestro tiempo (Laclau, 1993) ¢ Emancipacién y diferencia (Laclau, 1996). Em 2000, em conjunto co: Judith Butler e Slavoj Zizek, Laclau publicou seu livro mais recente, Contingency, hegemony, universality. J Chantal Mouffe, em 1993, ie return of the political ¢, mais recentemente, The democratic paradox (2000). As categorias te6ricas fundamentais destas obras, mais as constantes em Hegemony and socialist strategy scrGo tratadas a partir da préxima segio, inicialmente com a apresentagio das nogdes de «-ticulagio ¢ discurso. 2 Articulagao e discurso Para Laclau & Mouffe (1985), um discurso, ou uma totalidade estruturada relacional, € uma prética articulat6ria e significativa que constitui e organiza relagées sociais. Prética articulatéria, por sua vez, consiste na: Construgio de pontos rodais que fixayn parcialmente sentidos; 0 carter parcial dessa fixago procede da sbertura do social, resultante, por sua vez, de lum constante tansbordameato de todo discurso pela infinitude do campo da discursividade (Laclau & Mouffe, 1985, 113). Duas conseqiiéneias so produzidas a partir das nogdes de discurso e de pratica articulat6ria: a primeira resulta que toda produgdo de sentido depende de uma estrutura discursiva; a segunida & que todo discurso possui um cardter material. Como enunciamos, a primeita conseqiiéncia é que toda e qualquer possibilidade de fixacao’ de sentido depende inexoravelmente de um sistema discursivo. Tal sistema representa o estabelecimento de uma ordem frente a uma situaco anterior de desordem, ou seja, 0 discurso articula elementos diferentes, constituindo-os em elementos ‘equivalentes. Isso quer dizer que um discurso organiza identidades que anteriormente no estavam relacionadas entre si. A segunda conseqiiéncia € a afirmagio de que o discurso néo tem um cardter meatal, mas maierial. Nesse sentido, a nogdo de discurso deve ser ampliacta para aquilo que articula “todo o tipo de ligagdo entre palavras e agdes, formando assim totalidades significativas” (Laclau, 2000, p. 10). Nao hé, portanto, nessa perspectiva tedrica, a diferenciagio entre discurso e pratica, tendo em vista que todas as préticas individuais ou sociais so j4 consideradas atos discursivos tomados pelos agentes ou pelos grupos sociais a partir de suas prdprias leituras sobredeterminadas (ideol6gicas) da realidade {que os cerca. Tal materialidade do discurso € de fundamental compreensdo, pois rechaca outra idéia corrente de discurso, ou seja, a que estabclece a distingdo entre ideal e real, a qual Laclau e Mouffe rejeitam. Tal distincao entre ideal ¢ real é impossivel, segundo os autores, tendo em vista que no ha nada no social que nao esteja sobredeterminado, ou seja, todos os objetos, tudo o que damos nome, concebemos € conhecemos, constitui-se numa ordem simbélica. Assita, as relagdes entre os individuos, de fato, sio reais, materiais. No entanto, a’ leitura do real nunca é imediata, mas sempre mediada pela sobredeterminayao, pelo filiro da ideologia, que faz com que ocorram diferentes interpretagdes exn decorréncia do mesmo fato social © conceito da sobredeterminaedo esté constituide no campo do simbélico & nfo tem nenhum sentido fora dele. Conseqientemente, 0 mais profundo sentido potencial desse estatuto de Althusser de que tudo que existe no social cesté sobredeterminado; € a afirmagio de que o social se constitui como uma ‘ordem simblica. O simbélico — i. e., © sobredeterminado ~ cariter das relag6es sociais, dessa forma, implica que elas carecem de uma literalidade iiltima, a qual pudessem reduzi-las a momentos necessérios de uma lei imanente. Nao hé dois planos, um das esséncias e outro das aparéncias, desde ‘que niio haja possibilidade de fixago de um sentido literal Gltimo para o qual (0 simbélico seria um segundo e derivado plano de signiticagdo. A sociedade ‘© 08 agentes sociais perdem qualquer esséncia e suas regularidades consistem meramente em formas relativas e precérias de fixagdo as quais acompanham ‘ estabelecimento de uma certa ordem (Laclau & Mou, 1985, p. 97-98). Como vimos na citagio acima, nao hé dois planos, um das esséncias e outro das aparéncias, no qual, o simbélico seja apenas um plano derivado de uma esséncia real e definitiva de existéncia independente. A nogdo de sobredeterminagao impossibilita, Portanto, a dissociagao entre o real e 0 ideal, entre o discursivo e o no discursivo, tendo em vista que todos os objetos conhecidos so necessariamente sobredeterminados e, portanto, fazem parte de uma ordem discursiva. Tendo em vista que o discurso é a tnica possibilidade de significacdo; que esse 6, 2 mesmo tempo, 0 estabelecimento de nina orem frente a uma situagdo prévia de desordem; que 0 discurso tem um caréier material ¢ no mental; que & impossivel estabelecer uma distingo entre real ¢ ideal, verificaremos a seguir, a partir da perspectiva de Laclau & Mouffe, como se articula usna cadeia discursiva. Nas palavras dos autores: No contexto dessa discuss0, nds chamaremos articulagéo qualquer prética que estabeleca tuma relagdv entre elementos tal que suas identidades sejam ‘modificadas' como wm resuliado da prética articulatéria. A totalidade estruturada resultante da prética articulatéria chamaremos de discurso. AS Posigées diferencias, nx medida em que elas aparegam articuladas num discurso, chamaremos de momentos. Por contraste, denominamos elemento, qualquer diferenga que nfo esteja discursivamente articulada. (Laclau & Mouffe, 1985, p. 105) De acordo com a passagem acima, articulagiio é uma prética que se estabelece entre elementos que, num primeiro momento, néo esto articulados entre si. Podemos dizer, portanto, que no momento anterior 20 da articulagdo, esses elementos esto imersos numa l6gica complexa’, ou seja, esto dispersos, uns em relago ao outros, de * A l6gica complexa é chamada por Laclau & Moutfe, como veremos a seguir, de I6gica da diferenca Essa ldgica & complexa em relagiio exclusiva ao discurso analisado, uma vez que 0s elementos de fora nfo estio sendo significados por essa cadeia discursiva, Entretanto, a légica complexa no quer dizer a forma aleat6ria, no campo da discursividade. A prética articulatoria agrega esses elementos transformando-os em momentos. Portanto, um elemento quando ingressa na articulagio e em relagio a essa, deixa seu status de elemento ¢ assume a condigao de momento diferencial. A articulagio entre esses momentos diferenciais resulta necessariamente na modificago de suas identidades, on melhor, numa alteragio semiintica de seus contetidos particulares anteriores. ao ingresso na pratica articulat6ria, O resultado da prética articulatéria € © discurso*. Duas conseqiiéncias resultam da articulagao. A primeira delas refere-se a forma de como sdo produzidos sentidos por um sistema discursivo; a segunda é a possibilidade de identificarmos a identidade de cada elemento/momento discursivamente articulado. Como mericionaios, a primeira conseqiiéncia da articulagio refere-se & produgio de sentido. Para Laclau e Mouffe, como vinios, qualquer produgio de sentido ocorre obrigatoriamente a partir do articulago de momentos no interior de um sistema diseursivo, ou seja, a prética articulatéria é uma pritica autorreferenciada’ porque todos os momentos da construgao discursiva so internos ao préprio discurso. Isso quer dizer, texisténcia do “nao discursivo", tima vez que tais elementos encontram-se dispostos no campo da discursividade articulados com outros elementos e/ou outros discursos. * Quando dizemos que 0 resultado da pritica articulat6ria é 0 discurso no estamos de forma alguma afirmando que esse resultado seja permanente, tendo em vista principalmente as categoria filos6ficas de contingéncia e precariedade, adotadas por Emesto Laclau e Chantal Moutfe. Tais categorias Fazem com ‘que sentidos de um discurso sejam sempre parciais e, portanto, tendentes a se alterarem em meio a pritica articulat6ria incessante na ordem discursiva. 3 Emesto Laclau niio faz ceferéncia direta ao carster autorreferente de um sistema discursivo. A autorreferéneia € ates uma inferéncia que realizamos em outro momento, quando estahelecemos a ‘comparagio entre eategorias da Teoria do Discurso com categorias oriundas de outra matriz te6rica, a da ‘Teoria dos Sistemas Sociais, de Niklas Luhmann. Esta segunda perspectiva tebrica afirma, com todo rigor, ue todos os sistemas socias, ineluindo também os discursivos, possuem caracteristicas autopoiéticas € autorreferentes. Urs Stahaeli realizou também aproximagbes entre essas. duas perspectivas tedricas por dbvio, que 0 que esté além dos limites do sistema discursivo néo pode produzir qualquer sentido nesse sistema. © que esté além dos limites do discurso, na designagao de Laclau ¢ Moutfe, € elemento, ou seja, uma diferenga que nfo esté discursivamente articulada. Outra conseqiiéncia fundamental da pratica articulatoria € a possibilidade de, a partir dela, especificarmos separadamente a identidade de cada elemento/momento discursivamente articulado. A compreensdo desse ponito é decisiva para 0 entendimento da riqueza e da complexidade da categoria da articulagao. Afirmar que podemos discernir elementos/momentos numa avticulago 6 sypormos primeiramente que a pritica articulatéria nao é um comipiexo dado e necessério. Esta nfo € também a simples soma de elementos qué, articulados entre si, se tornam momentos. Se admitirmos que a pritica articulatécia € um complexo dado e necessirio e 0 resultado de uma simples soma dos seus elementos/momentos consticuintes, ela simplesmente torna-se impossfvel, uma vez (que se esté retirando dela sua caracteristica de constantemente autorreferenciar-se © de incessantemente construir novos sentidos. Para tornarmos mais claro -sse ponto, tomemos a afirmagio categorica dos autores: numa pritica articulatéria « transformagio de elementos em momentos nunca é completa” (Laclau e Mouffe, 1° , p. 121). Se a transformagaio de elementos em momentos nunca se completa, qu lizer logicamente que a articulagio também nunca semelhantes ax que nfs fizemos ref 4 anteriormente, Sobre ambas as aproximagoes entre as perspectivas tetricas de Ernesto Laclau. fas Luhmann, ver Mendonca (no prelo) e Stahaeli (1996), preenche um sentido tiltimo. Se a articulagao entre os momentos diferenciais néo alcanga uma literalidade tiltima, a estrutura discursiva fixa somente sentidos parciais, 0 que possibilita a flutuagdo de diferencas. As identidades, quando assumem a condigao de momentos diferenciais, na relago articulatéria, anulam completamente seus sentidos particulares em relagio a0 discurso que as une. Entretanto, isso nfo quer dizer absolutamente que as identidades deixam de existir como elementos diferentes entre sie diferentes também da prépria articulagdo. Dizer que um elemento nao se transforma completamente em momento presume a conclusdo de que a prética articulat6ria se da a partir de diferengas que, num determinado momento, uniram-se a um ponto nodal, que expressa um sentido comum. Contdo, se esses elementos nao forem diferentes, nfio haveria uma articulagao, mas uma simples igualdade. Vimios que 4 estrutura discursiva ¢ o resultado de uma pritica articulatéria que orguiliza elementos diferentes. Precisamos, porém, avangar no argument de Laclau ¢ Moufie e especificar o que motiva essa articulagio de elementos diferenciais. Desta forma, ® seguir apresentaremos as nogdes de pontos nodais ¢ de limites do sistema discursivo. limites do discurso e antagonismo Pontos nodais, limites do discurso ¢ antagonismo sao categorias responsiveis pela “motivagio discursiva”. Precisamos, contudo, fazer uma importante observagdo para 12 evitar qualquer mal entendido nesse ponto. Categoricamente: nfo é possivel concebermos uma teleologia stricto sensu aos discursos. Os pontos nodais, que estabelecem a unio entre os momentos diferenciais, ¢ os limites do sistema discursivo, que estabelecem a fronteira entre 0 que est e 0 que nio est discursivamente articulado, sto categorias inerentes ao sistema discursivo e, pottanto, dio presumem nenhuma relagio finalistica a priori. ‘A nogio de discurso é incompativel cont qualquer teleologia ou escatologia, tendo em vista seu cardter sempre precério € contingente como ja fizemos referéncia. O discurso € uma prtica articulatéria que no possui um plano de constituigao @ priori, como podemos perceber nésta passagem: Poderia argumentar-se que, nesse caso, a unidade discursiva é a unidade teleolégica de uum projeto, mas isto ndo é assim, O mundo objetivo esti estruturado em seqincias relacionais as quais nfo necessariamente possuem tum sentido Finalistico e que, em muitos casos, na realidade, ndo requerem ‘qualquer sentido. E suficiente que certas regularidades estabelecam posigdes dliferenciais para estarmos aptos para falar numa formagio discursiva (Laclau e Moutfe, 1985, p. 109). Nao podemos, portanto, atribuir um sentido teleol6gico stricto sensu a qualquer formagio discursiva. Os pontos nodais ¢ 0s limites de um discurso so categorias que diferenciam uma formagao discursiva de outros discursos ¢ também dos elementos que no esttio discursivamente articulados no campo da discursividade. Se néo podemos inferir nenhuma teleologia discursiva stricto sensu, podemos ainda sim nos perguntar, por que um discurso constitui-se como um discurso? Para 3 respondermos esta questio, que introduziré as nogdes de pontos nodais ¢ de limites de ‘um sistema discursivo, precisaremos a nogao de campo discursivo. © campo discursivo € 0 espago no qual um conjunto de formagées discursivas esta em relagio de concorréncia, O campo discursivo “nfo € uma estrutura estratégica, mas ‘um jogo de equilibrios instdveis entre diversas forgas (..). Um campo nao é homogéneo: hd sempre dominantes e dominados, posicionamentos centrais e periféricos” do discurso com 0 campo discursivo, 0 primeiro (Maingueneau, 2000, p. 19). Na relay tenta constantemente impor significagdes no busca de adeptos a essas significagbes. Um discurso, portanto, constitui-se com a intengo de dominar 0 campo da discursividade, para reter 0 fluxo de diferengas, para constituir o “centro” (Laclau e Mouffe, 1985). A constituig&o desse “centro” nos remete imediatamenie a idéia de pontos nodais, ‘Os pontos nodais® sio fundamentais para a prética articulatéria, pois, por serem polos discursivos privilegiados, eles possuem a capacidade de fixar, ainda que de forma parcial ¢ precdria, a prépria articulago (Laclau ¢ Mouffe, 1985). Os pontos nodais representam, portanto, o préprio sentido de uma pratica articulatsria. Vejamos o seguinte exemplo: A é diferente de B e B é diferente de C. Portanto no hd nada entre A, Be C que, num primeiro momento (M1) os relacione necessariamente © A nogio de ponto nodal ¢ oriunda da psicandlise lacaniana, a partir do conceito de “points de capiton”, traduzido para 0 portugués como “pontos-de-estofo”, Joél Dor, explicando essa nogdo afinna que, “para Lacan, 0 ponto-de-estofo é antes de qvalquer coisa, a operagio pela qual o ‘significante detém 0 deslizamento, de outea forma indetermin: lo e infinito, da significacdo’. Em outras palavras, é aquilo por ‘meio do qual 0 signiticante se associa a0 + gnificado na cadeia discursiva” (Dor, 1989, p. 39). entre si. Num momento seguinte (M2), surge o elemento D que estabelece li A, com B e com C. Portanto, em M2, D consegue ser 0 ponto nodal das posigdes A, Be C.D, portanto, criou uma “ordem”, ou uma relagao articulatéria, entre os trés elementos que em M1 mantinham completa independéncia entre si. Além dos pontos nodais, é conditio sine qua nom para a existéncia de um sistema discursive estabelecimento de seus limites. A esse ponto, Laclau e Mouffe argumentam que se néo existissem limites, a articulagao seria impossfvel, j4 que todo elemento seria ex definitione momento (Leclau e Mouffe, 1985), uma vez que no havet nada que delimitasse umn discurso em relago aos outros e em relagdo também aos elementos no campo da discursividade. Neste ponto, voltamos a nossa argumentagdo anterior sobre o discurso ser tina totalidade estruturada autorreferenciada. Isso porque “a l6gica relacional do discurso é levada até suas tllimas conseqiiéncias sem a limitagdo por nenhum exierior”” (Laclau e Moufie, 1985, p. 110). Isso quer dizer logicamente que todas as ielagées articulatérias so internas ao préprio discurso, inclusive suas suturas* jentes da relago com outros discursos. 7 Sobre o exterior, Laclau & Mouffe (1985) argumentam que ndo estio mencionando a existéncia da categoria do extradiscursivo, cuja impossibilidade jé referimos anteriormente. Sutura é outra categoria extraida por Laclau e Mouffe da psicandlise lacaniana, a qual Barrett designa como sendo “a jungo das duas bordas de um ferimento”. Isso quer dizer que uma pele cortada, quando costurada altera sua identidade, uma vez que a ferida que sara estabelece a existéncia de uma diferenga {que anteriormente 20 corte nfo estava dada. O sistema discursivo é suturado quando altera suas caracteristicas a partir de sua relagio com outros discursos no campo da discursividade. Barrett continua: “Laclau e Mouffe nos apresentam um corpo politico cuja pele est4 permanentemente dilacerada, exigindo tum plantéo intermindvel na sala de emergéncia por parte dos cirurgides da hegemonia, cuja sina ¢ tentar fechar os cortes, temporariamente e com dificuldade, (Esse paciente nunca chega a sala de recuperagio)" (Barrett, 1996, p. 249), ‘A nogio de antagonismo parte da impossibilidade da objetivagdo de qualquer identidade, ou seja, da impossibilidade de tratarmos, num nivel analitico, relagGes entre identidades plenas. Antagonismo, desta forma, representa o “limite de toda a objetividade”. Nas palavras dos autores: No caso do antagonismo, encontramos uma situagdo diferente: a presenga do outro me impede de ser totalmente eu mesmo. A relaglo ndo surge de identidades plenas, mas cla impossibilidade da constituigio das mesmas (Laclau e Mouffe, 1985, p. 125). Disso decorre que, numa pritica articulat6ria, nada € pleno de sentido, pois todas as identidades esto relacionadas entre si e seus significados séo constantemente “suturados”, ou seja, ha uma subverso continua de sentidos. Dizer que algo possti um sentido pleno significa dizer que este néo esté nurna légica articulatoria. Ao contrério, dizer da impossibilidade de uma identidade elcangar uma literalidade Gltima é afirmar a constante subversio de seu significado, uma vez que esta esta permeada pela relagio antagénica’ ° Bm “Nuevas :eflexiones sobre la revol _i6n de nuestro tiempo”, Laclau enfatiza o sentido que deve ser entendido a categoria de antagonismo: * ponto fundamental € que 0 antagonismo € 0 limite de toda a objetividade. {sto deve ser entendido en ou sentido mais literal: como afirmagao de que 0 antagonismo ‘Ago tem um sentido objetivo, de sorte ¢ & aquilo que impede a constituigdo da objetividade como tal” (Laclau, 1993, p. 34), 4 Légica da diferenga, I6gica da equivaléncia e hegemonia Conforme Laclau e Mouffe (1985), a l6gica da equivaléncia € a légica da simplificagao do espaco politico, enquanto que a l6gica da diferenga é a da expansio da complexizagao do mesmo. ise. Un movimento pela democratizagao de Tomemos um exemplo para nossa an: um pais que passa por um regime autoritério consegue articular, como elementos equivalentes, grupos de libersis, socialistas, feministas, cat6licos, protestantes, movimentos populares, trabalhadores, dentre outros. Perante este movimento de democratizagio, todas essas identidades cancelam suas diferengas numa cadeia de equivaléncias. AS identidades, que anteriormente operavam sob a légica da diferenga (que é a I6gica da complexidade), a pa:tir desse movimento politico, passaram a assumir a Iogica da equivaléncia (que € a I6gica dla simplificagao do social). E58 exemplo apresenta como légica da equivaléncia a articulagao de identidades a partir de um ponto nodal “movimento pela democratizagaio”. Como légica da diferenga, apresenta 0 momento imediatamente anterior A formaco do “movimento pela democratizago”, no qual essas identidades estavam dispersas na complexidade do social. J4 0 campo de emergéncia da hegemonia é o das praticas articulatérias, ou seja, um campo em que os elementos ndo se constituem completamente em momentos diferenciais numa cadeia de equivaléncias. Isso quer dizer, por Sbvio, que a nogdo de hegemonia pressupde um cardter aberto e incompleto do social. Uma posigao hegeménica é, portanto, uma posigao precéria'” e contingente'. es po m1 8 Conforme Laclau e Mouffe (1985), entretanto, nao basta a ocorréncia de priticas articulatérias para que a relagiio hegem@nica se concretize. E necessério que se configure © enffentamento discursive de diferentes préticas articulat6rias no campo da dticas articulat6rias sejam, em dltima discursividade. E necessdrio, portanto, que cssas anilise, préticas antagOnicas. incompletas, constantemente subvertidas em sentido devido & presenga de outras. Na relacilo antagénica, os limites dos sistemas discursivos em relagio aos demais sistemas antagénicos sio frégeis e inst4veis. Dessa forma, ocorre uma constante troca de significados e, mnitas vezes, 0 compartilhamento de sentidos comuns. Esse € 0 terreno fértil pora a emergéncia da relagdo hegem@nica. Nesse sentido, hegemonizar significa preencher um vazio existente entre diferentes, sistemas discursivos numa situagio anterior de desordem: “a ordem est presente como * A nogao de precariedade est intimamente ligada 8 de contingncia. A precariedade refere-se a idéia de «que todo processo hegemenico nunca constitu-se como uma vitériaabsoluta de um grupo identi. No que se retere a relagdo de contingéncia, nao podemos deixar de considerar que 0 processo de signficago & van luta constante enue diversos grupos sociais para transformar suas demandas particulares em deinandas gerais da sociedade. Como 0 processo de significagdo é wma luta permanente, Info podemos detenninar a priori que particulardade conseguiré universalizar suas demandas. Nas palavras de Laclau: “que demanda particular, ou sétie de demandas, vai exercer esta fungio de representagdo universal € algo que no pode ser determinado por razdes a priori” (Laclau, 1996, p. 106) aquilo que esta ausente; passa a ser um significante vazio, o significante dessa auséncia” (Laclau, 1996, p. 84). Isso significa dizer que, numa situacao hegeménica, objetivos inicialmente tidos como de um grupo particular, portanto objetivos particulares, passam a set identificados como objetivos gerais de uma determinada formagio discursiva ou até mesmo de um determinado campo discursivo. 5 A nogio de significante vazio Para introduzirmos a nogio de significante vazio, tomemos as proprias palavras de Laclau: “um significante vazio é urn significante sem significado” (Laclau, 1996, p. 69).. Vejamos as conseqiiéncias resultantes desse aparente paradoxo. Voltemos a0 nosso exemplo anterior que designava D como 0 ponto nodal de uma cadeia de equivaléncias formada pelos elementos A, B e C. Em MI, A era diferente de B e B diferente de C. Nao havia, portanto, em M1 nada entre A, B e C que os relacionasse entre si. Provocamos a exisiéncia de um segundo momento, M2, no qual surgiu 0 elemento D que estabeleceu ligagdes com A, com B e com C. Portanto, em M2, D conseguiu ser 0 ponto nodal dos elementos A, B e C. Estabeleceu-se, dessa forma, uma cadeia de equivaléncias. Essa é a idéia da contingéncia, ou sejs. vada necessariamente € ou tem de ser, 0 que € ou 0 que seri, poderi ser como também poderd nio ser ‘Como vimos, D é um ponto nodal que unifica A, B e C. Antes de D, os elementos A, B eC eram identidades nfo relacionadas entre si. Em M2, D passou a representar um sentido comum a essas identidades, unificando-as, alterando suas especificidades ¢ ampliando seus préprios limites de significagtio. D constituiu uma cadeia de equivaléncias, na qual as diferengas entre A, B e C perante D desapareceram. D significa algo que suporta os trés elementos em questo, ou seja, D significa mais do que a singularidade de cada elemento na cadeia de equivaléncias. Até aqui vimos o funcionamento da prética articulat6ria na légica da equivaléncia, Os sentidos até aqui produzidos s4o possiveis de serem apreendidos, tendo em vista serem especificos, ou seja, Dé um ponto nodal que suporta A, B e C e que, como sistema discu:sivo, possti unt conjunto de sentidos definidos. Entreianto, D pode articular muito mais sentidos do que os dessa limitada cadeia de equivaléncias formada por A, B e C. D pode ser um elemento de convergéncia de tanias identidades a ponto de perder seu significado especifico e tormar-se um significante sem significado, um significante vazio'?. Jon Simons (1997), analisando a comogao dos briténicos em torno da morte da princesa Diana, caracterizou, com muita propriedade, a nogio de significante vazio. "2 Em relagio a essa perda de significagio especifica de um sistema discursivo que leva a uma situagio de de uum signiticante vazio, realizamos pesquisa que nos conduziu a essa conclusio quando 3 a cammpanha das * ria eleitoral e posterior falecimento de Tancredo Neves no contexto final do regime militar brasileiro. Assim, para uma aplicagio prética da nogio de significante vazio, bem como de outras categorias de Ernesto Laclau, ver Mendonga (2001). Segundo esse autor, a morte da princesa de Gales representou um momento hegeménico, ‘no qual a comogdo de sua morte gerou miltiplas identificagées entre a populagdo: Diana significa diferentes coisas para diferentes pessoas e é, nesse sentido, {que ela pode ser considerada como unt significante vazio. Nicci Gerard. captura isso quando escreve que Diana foi tudo 0 que se segue: Cinderela, a garota anoréxica, a esposa trafda, a divorciada, a mle solteira, a garota da cidade, a princesa rock ‘n’ roll, a educadora, a vitima, a mulher forte, a estrela assediada, a mae adored (Simons, 1997, p. 1). ‘Tomemos outro exemplo, desta vez na Srea da politica, para exemplificarmos novamente a nogao de significante vazio. ‘A. democracia liberal se constitui em uma cadeia de equivaléncia com: liberdade de expressio; igualdade perante a lei; eleigdes dos governantes e represcnianics, na qual a deirocracia liberal € © termo que permite ‘equiveléncia. Ora, a parti das lutas da Uévada de 60, este termo vai ganhando cada vez mais equivaléncias © perdendo cada vez mais contedidos particulares. Compéem esta cadeis de direitos impensaveis antes da 11 ‘Guerra, tais como: voto universal (homens/mulheres/analfabetos), diteito das ia de democracia participativa, direitos sociais, etc. A umente se torna um significante vazio (Pinto, 1999, p. Na situago apresentada por Pinto, temos, num primeiro momento, a “democracia liberal” como um termo que permite equivaléncias entre “liberdade de expresséo”, “igualdade perante a lei” e “eleigdes dos governantes e representantes”. Nesta situagao 1, portanto, a “democracia liberal” é um significante com um significado bem delimitado e definido. Entretanto, o exemplo avanga e apresenta a situagao 2. A partir da década de 1960, a “democracia liberal” passa a incorporar mais termos em sua cadeia de equivaléncias a tal ponto dessa ndo poder mais ser significada com um minimo de exatidio, Isso ocorre porque o termo “democracia liberal” passa a nfo possuir mais 2 contetidos especificos delimitéveis; esta se tora, assim, um significante vazio, um universal, um lugar vazio"®. Apesar de um significante vazio ser um significante sem significado em fungo de uma polissemia de sentidos que faz com que este esvazie seus contetidos espectificos, & possivel, ainda sim, percebermos seus limites. Os limites de um discurso buscam sempre subverter seus significados, sendo, portanto, negativos 3 constituigao desses. Por outro lado, aquilo que esté além da fronteira de exclusio que detimita 0 cespago comunitério ~ v poder repressivo ~ contaré menos como instrumento de represses particulares diferenciais e expressaré. mais a pura anticornunidace a pura negatividade e 0 mal. A comunidade criada por essa expansiio equivatencial serd, pois, a pura idéia de uma plenitude comunitéria (S est ausente como resultado da auséncia do poder repressivo (Laclau, 1996, p. 79-80). ‘Ao mesmo tempo em que os limites de um significante vazio impedem sua expanstio significativa e ameacam sua exisiéncia, esses servem também para afirmar a propria existéncia dessa cadeia discursiva e para unir ainda mais as diferengas por ela agregadas, tendo em vista que o limite antag6nico é idéntico a todas as identidades constituidoras do significante vazio, gerando, pois, a unidio dessas diferengas em torno de uma luta comum: contra algo que, de uma forma ou outra, impede a constituigiio de todos os elementos dessa cadeia de equivaléncias. Pinto, tomando a democracia como um significante vazio, exemplifica os limites desse regime politico: 4 expressio “lugar vazio” € utilizada por Laclau (1996), para caracterizar as nogdes de universal ¢ de significante vazio, 2 A nogio de democracia como um processo sempre em construgdo, que, por sua natureza, tem potencialidades muito alargadas de incorporagio © incluso, apenas com um limite fundamental e constituidor: (..) a democracia, para ndo perder a razio de existir, ndo pode incorporar a sua negagdo, isto é, discursos que pretendam legitimar a exclusio (Pinto, 1999, p. 97. Laclau, num artigo intitulado “A morte ¢ a ressurreigo da Teoria da Ideologia” reafirma os limites de um significante vazio: Uma cadeia de equivaléncias pode, em _princfpio _expandir-se indefinidamente, mas, uma vez que um conjunto de relagdes centrais esté estabelecido, essa expansdo é limitada, Certas novas relagdes seriam simplesmente incompaiivcis com as particularidades integrantes da cadeia (Laclau, 2000, p. 140-141), Além dos limites de um “significante vazio”, duas outras conseqiténcias devem ser destacadas. A primeira diz respeito & fungzio dos signifieantes vazios — esses renunciam suas identidades diferenciais (evidentemente que no de forma completa) para serem pontos nodais para one convergem diversas identidades que anteriormente no estavam organizadas entre si. Outra conseqliéncia diz respeito & conclusao légica de que quanto mais ¢stendida for a cadeia de equivaléncias de um determinado significante vazio, menor serd a capacidade de cada ‘uta conereta permanecer fechada em sua demanda particular. 2 6 Consideragoes finais Um dos aspectos mais fundamentais do pensamento de Laclau e Mouffe € que suas teses podem servir como importantes ferramentas para anélises que pretendam escapar de armadilhas essencialistas ¢ deterministas, sauitas vezes nem percebidas, que infelizmente caem alguns cientistas sociais no Brasil, O social, segundo Laclau e Movffe, esti permeado por discursos, cujas fixagdes de sentidos so sempre precérias e contingentes, mesmo considerando que cada sistema — e de forma initil - dominé-lo. Tradigées discursivo busque incessantemente intelectuais que nao levam em consideracao a precariedade e a contingéncia das relagdes sociais tém, eitt nossa anilise, sérias dificuldades ¢ resisténcias de encarar os paradoxos da conteriporaneidade. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ALTHUSSER, Louis. Aparethos ideoldgicos do Estado. 6* ed. Rio de Janeiro: Edig6es Graal, 1985. 128 p. BARRETT, Michele. Ideologia, politica e hegemonia: de Gramsci a Laclau e Mouffe. In: ZIZEK, Slavoj (org.). Um mapa da ideologia, Rio de Janeiro: Contraponto, 1996, p. 235-264. DOR, Joél. O valor do signo lingiifstico € o ponto-de-estofo em Lacan, In: Introdugao @ leitura de Lacan: 0 inconsciente estruturado como linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989, 36-40 p. LACLAU, Emesto. Politica e ideologia na teoria marxista: capitalismo, fascismo populismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. 204 p. Nuevas reflexiones sobre la revolucién de nuestro tiempo. Buenos Aires: ‘isién. 1993, 267 p, Nueva, . 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