You are on page 1of 4

Wellington killer passou o cerol na escola

Todo o conteúdo deste blog está assegurado sob uma licença Criative Commons

Escola
-Presídio: Rede de deseducação pública
A Escola-Presídio (modelo evidente da educação pública no Brasil) cada vez será mais
um monstro a assombrar o futuro da nossa sociedade analfabeta de consciência social.
O modelo obedece, infelizmente, às regras de exclusão social muito renitentes e
arraigadas em nossa sociedade, ideologicamente ainda pré-abolicionista.

Os prolixos e irrealizáveis ‘projetos político pedagógicos’ das escolas de nossa rede


pública não entram neste pormenor, mas basta olhar as grades dos corredores e o look
da maioria das professoras e diretoras, ora arrogantemente vestidas de ‘louras burras’,
sexys madames de meia idade, maquiadas, chacoalhando as pulseiras e o molho de
chaves das grades com que controlam os seus ‘feudos’ de crianças prisioneiras ou, já
com a ‘ficha caída’, trêmulas senhoras pudicas, em pânico, ameaçadas de morte por
algum aluno bandido, mais rebelde e vingativo.
A necessidade cada vez maior de medidas de segurança interna em escolas da rede
pública (câmeras, ronda de guardas municipais, etc.) não reflete, de modo algum como
se imagina a princípio, a gravidade dos problemas externos às escolas, as mazelas
sociais da rua, que solertemente teriam invadido o puro ambiente das escolas com um
serial killer armado com dois revólveres. Antes fosse apenas a eclosão do ápice da
loucura de um jovem casto e perturbado.

Mas não. A violência está dentro da escola. A escola é que não é casta, nem pura. A
escola é suja, cínica e infiel para com seus alunos. Esta violência ‘adúltera’ desta escola
amada amante do inimigo das criancinhas, é que é ruminada dentro dos muros, como
húmus, esterco de horta comunitária compostando maldades, na fermentação de uma
deseducação das massas, meticulosamente planejada.

Visite uma escola destas só para ver. Siga o cinegrafista amador e veja o que ele vê.

Um conflito eminente entre corpo docente e o discente parece estar sempre prestes a
eclodir, professores versus alunos ou vice versa, um conflito de natureza marcadamente
social (os alunos são muito pobres e, em sua maioria negros, as professoras são de
classe média e, majoritariamente brancas).

Siga o vídeo do cinegrafista amador e observe: Os acesos entre os andares e, não raro
entre as dependências de um mesmo andar já são controlados por câmeras e grades,
cujos cadeados são abertos segundo a programação do fluxo de alunos para as salas. As
dependências onde são acondicionados os mantimentos da merenda, as salas de
informática, etc., são protegidas por portas de ferro ou grades, do mesmo modo bem
trancadas com cadeados poderosos.

Todo este aparato de segurança – muito semelhante ao de um presídio como disse


acima, visa literalmente conter os alunos, obrigá-los a permanecer no espaço escolar (a
educação, como se sabe, é um serviço ao qual o Estado está obrigado a fornecer por lei)
sem que este Estado necessite cumprir de forma decente os procedimentos, as
metodologias pertinentes que deveriam ser, obrigatoriamente eficientes em suas
finalidades mais evidentes: Dar, realmente educação de qualidade para toda a
população.

A tensão, como não podia deixar de ser, é crescente. Não tem sido raro professoras e
diretoras de escolas da rede pública solicitarem aposentadoria ou licença especial depois
de terem sido ameaçadas por alunos, muitas vezes de morte. Em muitos casos as verbas
terceirizadas, voltadas para a aplicação de políticas suplementares de educação, as
chamadas atividades ‘extra-curriculares’, financiadas pelo governo, são interceptadas,
surrupiadas mesmo por instituições mafiosas (milícias e escritórios de políticos
clientelistas, por exemplo) articuladas em ongs de fachada, mancomunadas com
diretores, agentes e gestores de programas de educação pública.

Outro aspecto muito preocupante é que, com a falência do sistema das chamadas
‘medidas sócio educativas’ (Degases, Criams e Febems), já estão sendo
irresponsavelmente criados pelas autoridades estaduais e municipais, alguns canais de
articulação entre estes falido sistema de repressaõ ‘educativa’, reformatorial para
menores infratores e a rede pública convencional de ensino, contaminando cada vez
mais o sistema de educação pública com o já explosivo problema da exclusão social de
jovens no Brasil, marcado pelo galopante consumo e venda de crack, etc. e outras
mazelas mundocaninas adicionais.

Jovens infratores, a maioria deles ligada ao tráfico de drogas, após o cumprimento de


medidas sócio educativas, cumpridas literalmente em prisões juvenis (para quem não
sabe o sistema Degase mantêm três colégios-presídios no Rio: Padre Severino, João
Luiz Alves e Santos Dumont), quando não possuem família ou parentes responsáveis,
são transferidos em grande medida para uma rede de abrigos municipais e,
posteriormente matriculados como manda a lei, nestas escolas públicas convencionais,
sem nenhum procedimento de adaptação, sem nenhum objetivo aparente que não seja o
de usar a rede pública como mais um dispositivo de controle, exclusão e, agora
repressão, meros depósitos de retenção e contenção de crianças pobres ‘em seu lugar’,
em ultima análise.

O ‘lugar destas crianças da zona oeste (onde fica Realengo) a julgar, grosso modo por
este meu raciocínio ainda emocionado, são bairros muito pobres ou miseráveis, quase
favelas, dominados por milícias armadas, uma cultura de submissão à violência
cotidiana de um grupo articulado com as autoridades constituídas, que lhes dão respaldo
e proteção, ambiente ao qual este jovem assassino, esquizofrênico ou não, sempre
esteve exposto, desde menino.

A educação e a cultura da violência formam então bandidos e assassinos frios,


enlouquecem alguns, os emocionalmente mais vulneráveis. Pelo menos é o que a
incrível perícia do jovem assassino com armas de fogo imediatamente nos sugere.

Não é preciso estar ligado ao sistema de educação pública brasileiro para se perceber
que algo de muito grave pode estar prestes a ocorrer.

Todas estas mazelas de nossa educação pública são antigas e já haviam sido detectadas,
avaliadas desde os anos 1950, gerando uma série promissora de projetos, entre os quais
os dirigidos pelo prof. Anísio Teixeira (Escolas-Parque) foram os mais inovadores.

Também nos anos 1980, durante os governos de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, estas
idéias de Anísio Teixeira foram retomadas e reformadas, gerando um programa
experimental caracterizado por escolas de uma rede pública, conjugado a políticas e
metodologias de inclusão social de crianças (Cieps) revolucionário em grande medida
porque era baseado, principalmente numa rede especial de escolas de horário e
atendimento integral, habilitadas a lidar também com questões sociais mais emergentes
como, por exemplo, a quantidade enorme de meninos de rua e crianças órfãs, que
perambulavam pelas ruas do Rio de Janeiro e que, a partir de então passou a ser
absorvida num programa paralelo de abrigamento humanizado, denominado ‘Mãe
social’, com os lares-abrigos integrados às próprias escolas.

Estas assaz promissoras iniciativas –embora discutíveis e aperfeiçoáveis em alguma


medida – no entanto, foram sempre descontinuadas – quando não simplesmente
descartadas – por governos subsequentes, descontinuidade esta apoiada inclusive por
laudos, pesquisas e furibundas campanhas de doutores especialistas em educação,
encastelados em cátedras universitárias, numa corrente de reacionarismo e elitismo,
embora recorrente no Brasil, sem precedentes e, em nossa opinião grande responsável
por este estado de coisas atual, já que são das faculdades de educação que saem, em
última análise, todos os agentes e gestores do sistema de educação, responsáveis pelas
políticas e não políticas em voga nas décadas seguintes.

Não é fortuito, portanto considerar que nas entrelinhas da delirante carta daquele jovem
serial killer suburbano, possam ser inseridas diversas outras explicações menos
sensacionalistas e prosaicas, menos individualistas enfim, trazendo à luz uma psicopatia
muito mais coletiva, muito mais social do que esta que se está lançando sobre as costas
de um jovem pirado que odiava meninas, seres impuros e mulheres adúlteras.

Não me parece também uma coincidência macabra ele ter invadido a escola onde talvez
tenha tido a sua única experiência escolar, palco evidente de suas desditas
esquizofrênicas. Quem sabe se Wellington não estava na verdade tentando matar a tiros
a sua ex-escola?

Quem pode saber se ele não pretendia assassinar aquela instituição que em vez de curá-
lo, reforçou a sua loucura, acentuou e agravou o seu delírio de, ao se tornar uma
celebridade internacional, entrar para o reino dos céus levando consigo as 12 mais belas
virgenzinhas de Realengo?

Pelo menos este ex-aluno da escola-presídio, conseguiu escapar do inferno.

Moral da história: No Brasil o diabo é o mais assíduo professor.

———————

Deu no G1:

“Está difícil de assimilar que um garoto da minha sala, uma pessoa que eu passei dois
anos, vendo quase todo dia, fez uma coisa dessa. Ontem, em frente à escola, um colega
nosso, colega de turma, bateu no meu ombro e falou ‘lembra que eu falei, brincando,
para ele (Wellington): um dia você ainda vai matar muita gente?’

“…O diretor (Luiz Marduk) não vê a escola como motivação para o ataque. “Não
consigo enxergar nenhuma relação com a escola com o que ele fez. Ele só escolheu este
lugar para desenvolver a loucura dele”

Spirito Santo

Abril 2011

You might also like