Professional Documents
Culture Documents
Rebelión y ~esistencia
en e1 Mundo ~ i s p á n i c o $&.\
-.? d6 >
Foi Pdrez Viddl, depois do pioneiro estudo de Elias Serra Rãfols2, quem
evidenciou a importância da comunidade portuguesa no arquipblago das
Canárias. De acordo com as suas investigaçihs podemos definir dois
momentos dessa presença lusfada : um primeiro, demarcado pdas acgies
polfticas da coroa e do Infante Dom Henrique, que teve o seu epflogo em
1479 com o tratado de Alcáçovas; um segundo, apõs isso, de iniciativa
particular em que os impulsos individuais se sobrepbem ao interesse
iniciativa oficial.
No último momento, que se alarga ate 1640, a comunidade portuguesa
ganhou plena forma, afirmando-se nos vários aspectos da vida do
arquipelago. Mas foi tambem a partir dai que surgiram as primeiras
dificuldades que levaram ao corte quase total deste relacionamento no
perlodo de 1 W a 1665. Esta época foi precedida de outra, entre 158&1W,
dehida por uma acentuada afirmação da interdependgncia destas ilhas
atlbticas. Por isso os principais reflexos remanescentes das represáiias da
Restauração de lá40 e da guerra de fronteiras fizeram-se sentir no corte
abrupto das conexOes humanas e comerciais. Os efeitos nefastos desta
situação foram mais evidentes para o arquip6lago canariano.
Os contactos entre os arquipelagos da Madeira e Canárias foram uma das
dominantes do procaso histórico destas ilhas, a partir da primeira metade do
século XV. Eiitre elas estabeleceu-se uma complementaridade de ordem
econdmica e social, sedimentada com o porvir dos tempos. A Madeira
encontrou nas f i a s de Tenerife, Fuerteventura e Lanzarote um dos mais
importantes celeiros capaz de suprir as necessidades frumentárias da cidade
do Funchal3. Tudo isto acontecerã no decurso da segunda metade do século
dezasseis e primeiras décadas do seguinte, momento em que surgem
dificuldades com o seu suprimento obrigatbrio nas ilhas açorianas4.
A conjuntura cereaiifera das ilhas Canárias no ultimo momento foi
definida por assfduas quebras da produção, o que veio a tornar cada vez mais
difícil a manutençb desta rota de abastecimento do mercado madeirense. Daí
resultou a busca de outras soIuções, com o recurso a novos mercados, como
a Europa, a Berberia e a América do Norte. Deste modo em 1641 as
autoridades canarianas ao estabelecerem, como represália 2 Restauração de
1640, medidas proibitivas do comércio com a Madeira, os seus efeitos quase
não se fizeram sentir no porto do Funchal. O bnico prejudicado foi o
arquipdiago das Canárias que perdeu, ainda que momentaneamente, este
importante mercado e porto de escala para as suas navegações com a
península.
A conjuntura política, definida pela união das duas coroas, sedimentou este
interhbio. Os contactos e a familiaridade entre os vizinhos de ambos os
arquipdlagos eram tão evidentes, que o processo de passagem dos poderes
para a nova coroa filipina deveria ser obrigatoriamente pacífica. Diferente fui
o caso dos Açores, onde a importgncia geo-estratggica do arquipelago fez
com que os açorianos fossem vitimas dos interesses dos franceses, ingleses e
castelbanos. Por isso D. Antbnio Prior do Crato, com o apoio da França e
Inglaterra, teve aí o seu dltimo reduto.
No arquipelago açoriano as hostil idades aos novos soberanos foram
sangrentas e demorou três anos o processo de pacificaçáo8. Na Madeira não
houve esse processo, sendo a expedição do Conde de Lanzarote de prevenção
e apenas justificada pelo temor de uma possível ameaça de ingleses ou
franceses9. Acresce, ainda, que os madeirenses nunca haviam sido adeptos de
Dom Antdnio, uma vez que ele s6 fora aclamado como rei na ilha do Porto
Santolo e no município da Ponta de Sol. Os representantes da coroa filipina
d se tiveram que haver com um grupo restrito de personalidades afatas a
D. António, uma vez que a maioria destes se havia juntado Zis suas hostes na
ilha Terceira 11.
Foi este temor de uma possivel ocupação da ilha por parte da armada
franco-inglesa, surgida a 24 de Julho de 1S82I2, que levou Filipe Ií a
ordenar em 19 de Março de 1582 a D. Agustin de Herrera que fosse defender
a ilha com uma armada de 300 homens. O desembarque no Funchd teve
lugar a 29 de Maio, com a maior quietação para evitar qualquer alvoroço. No
dia imediato, na presença de todas as autoridades e povo, fez-se juramento de
fidelidade ao novo rei.
O Conde permaneceu na ilha com as suas tropas enquanto duraram as
hostilidades na ilha Terceira. Com a batalha decisiva de conquista da ilha a
26 de Julho de 1582, por D. Alvaro Bazán, festejada no Funchal a I de
Setembro, ele recebeu a 2 de Setembro autorização para abandonar a ilha,
ficando em seu lugar, como chefe do presfdio, D.Juan de Aranda, com uma
guarnição de 500 Homens.
As granda dificuldades porque passaram as forças ocupanta da ilha,
mais conhecida por tropa do presfdio, não derivaram tanto do possível
afrontamento da população local, mas sim dos problemas surgidos com o seu
aba~tecimento~~. A cidade debatia-se jB com esta situação, vendo-a agora
agravada com a presença de mais 500 homens. A conjuntura foi deveras
diffcil no período de 1589 e 1637 e gerou alguma instabilidade, mer& da
falta de meios para sustentar esta guarnição, manifesta nos motins (1600,
1602, 1623, 1626, 1627)14. Por isso as primeiras décadas do século XVII
foram pautadas por momentos de aflição e insegurança. Esta situação
. repercutiu-se no relacionamento institucional entre o capitão do presldio e o
municfpio ou provedor da fazenda, principais responsãveis pelo
abastecimento da mpal5.
D. Agustfn de Herrera, conde de ~anzarotel~, ao assumir em 1582 a
posse, ainda que temporariamente, do governo da ilha veio a permitir mais
assíduos contactos entre a Madeira e Lanzarote. Aliás o próprio conde
promocionou esta situação atravb de vínculos familiares com o casamento da
sua filha bastarda, Doiia luana de Herrera, filha de Dona Bernaldina, com
Francisco Acciouli, fdho de Zen6bio Acciouli, um dos mais destacados
mercadora e terratenentes italianos, estabelecidos na ilha desde 151517. O
exemplo foi seguido por muitos dos militares que o ammpanharam18. Por
isso no perbdo de 1580 a 1600 os castelhanos adquiriram uma posição
maioritária na imigram madeireme, como se poderá verificar pelos registos
de casamento da SB do Funchallg.
Com a morte do Marquês, devido h peste que apanhou no Funchd,
sucedeu-lhena casa senhorial a sua mulher Dona Mariana Enrfquez Manrique
de La Vega, exercendo um governo implacãvel, que acabou por molestar os
interesses dos Acciouli em Lanzarote, gerando um diferendo pela divisa do
patrirn6ni0~~.Este surgiu quando a viiiva pretendia ludibriar a enteada com
documentos falsos sobre os réditos do senhorio. Mais tarde, em 1621, o
conflito é retomado pelo próprio Zen6bio Aciauoli, sem qualquer efeito,
arrastando-se at6 1640, altura em que a conjuntura política propiciou o
sequestro dos referidos bens.
Notas
restauração na ilha Terceira (1641-1642). Cerco e tomada do castelo de São Filipe do Monte
Brasil dos terceirenses", Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira, 18 (1960) 38-116.
23 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1329, fls.7-9;
A.A. Sannento, História Militar da Madeira (FunchaI1912) 6.
24 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1329, tIs.IOv°-13;
Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal,
registo geral, tomo IV, tI. 202.
25 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal,
nO. 980, tIs. 411-411vo, 24 de Janeiro.
26 Confronte-se Santiago de Luxan Melendez, "Los soldados dei presidio de la Madera que
fueron desechados a Lanzarote en 1641: contribución ai estudio de la coyuntura
restauracionista portuguesa en Canarias", in : N Jornadas de Estudios de Lanzarote y
Fuerteventura (Arrecife 1989).
27 A.A. Sannento, A Madeira e as praças de Africa. Dum caderno de apontamentos (Funchal
1932).
28 José António Gonçalves de MeIo, João Fernandes Vieira. Mestre-de-Campo do terço da
Infantaria de Pernambuco, 2 vols (Recife 1956).
29 João Cabral do Nascimento, "Gente das ilhas nas guerras da Restauração", Anais da
Academia Portuguesa de História, Ia série, VII (1942) 427-458; Ernesto Gonçalves, "Os
madeirenses na Restauração de Portugal", Das Artes e da História da Madeira, VIII 37
(1967).
30 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1329, tIs. 24vo-26.
31 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1217, tomo VI, tI. 53,
registada a 15 de Fevereiro de 1642.
32 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, registro geral, tomo VI,
nO. 1217, tI. 55vo; Idem, Camara Municipal de Machico, nO. 85, tIs. 92-93vo.
33 Arquivo Regional da Madeira, Obitos-Sé, nO. 73, tI. 163.
34 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1217, tIs. 49-51, auto
da querela entre Manuel Homem da Câmara e o governador Luis de Miranda Henriques,
15 de Abril de 1641; Arquivo Histórico Ultramarino, Madeira e Porto Santo, nO. 4846,
p. 307; Sannento, História Militar da Madeira, 7.
35 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1217, tomo VI,
tI. 61vo; publicado por A. A. Sannento, Documentos & notas sobre a época de D. João N na
Madeira. 1640-1656 (FunchaI1940) XXXIV-XXXV.
36 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1217, registo geral,
t. VI, tI. 65. Apresentou-se em câmara a 1 de Dezembro de 1644.
37 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal,
nO. 965A, tIs. 183vo-184°, 4 de Setembro.
38 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal,
n° 965A, tIs. 231vo-233, 20 de Julho de 1657.
39 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal,
nO. 966, tIs. 38-48vo.
40 Sannento, Ensaios históricos, 11,5-6.
41 Sannento, Fasquias e ripas da Madeira (Funchal 1951) 40-48. Esta situação deverá ser
enquadrada no diferendo que se arrastava desde a morte do Marqués e teria mais a ver com a
legitimidade ou não desta sucessão. Sobre isto veja-se Elisa Torres Santana, "Las relaciones
OS ARQUlPELAGOS DA MADEIRA E CANARIA.S 121
comerciales entre Madeira y Ias Canarias orientales en el primer cuarto dei siglo XIII", pp.
306-307.
'42 Archivo Histórico Provincial de Las Palmas, Protocolos, nO. 2748, fls. 421-422.
43 Archivo Histórico Provincial de Las Palmas, Protocolos, nO. 2725, fls. 77-77vo.
44 Archivo Histórico Provincial de Las Palmas, Protocolos, nO. 2729, fls. 7vo-8, nO. 2761,
fls. 93-94.
45 Luis Alberto Anaya Hernández e Francisco Fajardo Spínola, "Relaciones de los
archipiélagos de Azores y de Ia Madera, segun Ias fuentes inquisitoriales (siglos XVI e
XVII)", in Actas do 11Colóquio Internacional de História da Madeira (Funchal 1990) 874-
875.
46 Alberto Vieira, "O comércio de cereais das Canárias para a Madeira nos séculos XV-
XVII", in : VI Colóquio de História Canario-Americana (Las Palmas 1984); Idem, "O
comércio de cereais dos Açores para a Madeira no século XVII", in : Os Açores e o Atlântico
(séculos XIV-XVII) (Angra do Heroismo 1978) 663-665.
47 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal,
nO. 396, fl. 31, 18 de Maio de 1662.
48 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Convento de Santa Clara, nO. 19, ssem folio.
49 Rupert Croft-Cooke, Madeira (Londres 1961) 26-28; André L. Simon, "Introduction" e
"Notes on Portugal Madeira and the Wines of Madeira", in : The Bol1onLellers. Lellers of an
English merchant in Madeira 1695-1714, vol. I (Londres 1928); confronte-se, ainda, Agustín
Guimerá Ravina, Burgues(a extrangera y comercio atkintico. La empresa comercial irlandesa
en Canarias (1703-1771) (S.C. de Tenerife 1985) 320.
50 A. Bethencourt Massieu, "Canarias e Inglaterra. EI comercio de vinos (1650-1800)", in :
Anuario de Estudios Atkinticos, 2 (1956) 195-308 : Idem, "Canarias y el comercio de vinos
(siglo XVII)", in : Historia General de las islas Canarias, vol. III (Las Palmas 1977) 266-273.
51 E. Steckley, "La economía vinícola de Tenerife en el siglo XVII : relación anglo-espanola
en un comercio de lujo", Aguayro, 138 (1981) 29.
52 A. Millares Cantero, "Canarias en Ia edad Moderna (circa 1500-1850)", in : Historia de
Los Pueblos de Espana. Tierrasfronterjzas, I : Andalucia Canarias (Madrid 1984) 319, 321.
53 Citado por A. Lorenzo-Cáceres, Malvasia y Flastaff. Los vinos de Canarias (La Laguna
1941) 19.
54 André L. Simon, "Notes on Portugal", 11(FunchaI1960) 3-7.
55 A coroa insistiu nesta nova situação, recomendando às autoridades madeirenses que
publicitassem o que foi feito por meio de um bando a 8 de Maio. Veja-se Arquivo Regional da
Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1215, fls. 37vO-38.
56 Arquivo Regional da Madeira, Câmara Municipal do Funchal, nO. 1215, fls. 58-58vo,
17 de Dezembro de 1672.
57 Steckley, "La economía vinícola", 25-32; Agustín Guimerá Ravina, Burgues(a extranjera.
58 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Convento de Santa Clara, nO. 19.
59 Simon, "Notes on Portugal" (Tradução publ. in António Aragão, A Madeira vista por
estrangeiros. 1455-1700 (FunchaI1981). O vol. 11saiu em 1960 numa edição policopiada da
responsabilidade de Graham Blandy.
60 Alberto Vieira, "A Madeira e o Novo Mundo Atlântico sécs. XV-XVII", in : Actas do
Colóquio Internacional de História Atlântica (sécs. XV-XVI), Ponta Delgada, 4-9 de
Novembro de 1991.