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Este artigo, escrito por Yoichi Kawata, Vice-presidente da Soka Gakkai, foi publicado em três partes. A versão
completa apareceu pela primeira vez sob o titulo de "Budismo e Ciência Médica: Para o Estabelecimento de uma
Perspectiva Correta da Morte e o Renascimento" (Buppo to Igaku: Shieseikan no Kakuritsu no Tame ni) no
periódico Kyogaku Kenya Koza, vol. 6 (Instituto de Filosofia Oriental de Tokyo, 1.985).
1.- Visibilidade: No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "O corpo provisional é visível só para outras
existências intermediárias do mesmo tipo. Se uma pessoa obtém, mediante um esforço tenaz, o mais puro olho
divino, será capaz de vê-lo. Mas o olho com o qual temos sido dotados pela natureza não pode discerni-lo
devido à extrema sutileza desse corpo".
Esta passagem explica que o corpo provisional é extremadamente sutil; portanto, não é visível pelo olho
comum. Porém, as existências intermediárias podem ver-se umas às outras e afirma-se também que os seres
humanos que obtiveram uma visão clarividente ou outros poderes semelhantes podem vê-las.
No que respeita ao fato de que as existências intermediárias podem ver-se umas às outras, no volume 17
do Daibibasha Ron afirma-se o seguinte: (a) Entre as existências intermediárias dos Seis Caminhos, aquelas que
encontram-se num caminho particular podem ver às que estão no mesmo caminho. Por exemplo, as
existências intermediárias que encontram-se no estado de inferno podem discernir a outras que se acham no
mesmo estado; as existências intermediárias que encontram-se no estado de Alegria podem ver todas as
existências intermediárias que acham-se no mesmo estado, e assim sucessivamente. (b) Além disso, as
existências que encontram-se nos Seis Caminhos podem perceber às que encontram num estado inferior. Quer
dizer, aquelas que se encontram no estado de inferno só podem ver às outras existências intermediárias que
acham-se no mesmo estado, mas aquelas que encontram-se no estado de Alegria podem ver todas as
existências intermediárias que acham-se nos Seis Caminhos.
2.- Poder para movimentar-se. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "A existência intermediária, esta
dotada do poder sobrenatural, derivado do seu carma, de viajar com a máxima velocidade. Nem sequer os
Budas podem detê-lo, devido a que está investido do poder do carma.
Esta passagem explica que, devido à força do seu carma, o corpo provisional pode movimentar-se
livremente através do espaço e nem sequer um Buda é capaz de detê-lo.
3.- Possessão de órgãos dos sentidos. No volume 9 de Kusha Ron afirma-se: "As existências
intermediárias estão, em todos os casos, dotadas dos cinco órgãos dos sentidos". Estos órgãos dos sentidos
são aqueles possuídos pelo "corpo sutil".
4.- Capacidade de atravessar qualquer obstáculo. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "O corpo
provisional é coextensivo. Nem sequer um diamante é impenetrável para o corpo provisional. Portanto chama-
se-lhe coextensivo". Como o movimento do corpo provisional não pode ser bloqueado nem sequer por algo
tão duro como o diamante, diz-se que não pode ser obstruído. Quer dizer, que pode passar livremente através
da matéria mais densa.
5.- Destino imutável. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "Uma vez que surge o corpo provisional,
destinado a um certo renascimento, nenhum poder pode desviá-lo desse destino. Uma existência intermediária
humana não deixará de ser tal para converter-se numa existência intermediária de nenhum outro tipo.
O mesmo é certo com respeito às existências intermediárias dos outros caminhos. O corpo provisional
existe com o fim de movimentar-se para seu destino e somente pode movimentar-se nessa direção, nunca
outra.
Esta passagem indica que as circunstâncias nas quais renascerá a existência intermediária já estão
determinadas pelas suas ações de existências anteriores.
Por exemplo, se enquanto estava viva uma pessoa tem criado o carma para renascer no estado de
Tranqüilidade, só poderá renascer nesse estado e não no de inferno ou qualquer outro. Depois da morte,
nenhum poder pode alterar seu destino cármico (com exceção do poder das orações oferecidas pelos
falecidos, que serão explicadas depois).
6.- Uso de odores como alimento. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: Alimentam-se ou não as
existências intermediárias no mundo do desejo? (10) Sim, mas alimentam-se só de odores... Aquelas que não
têm acumulado boa sorte só se alimentam de odores desagradáveis, enquanto que as que têm acumulado boa
sorte fazem dos odores agradáveis seu alimento.
De acordo com esta passagem, as existências intermediárias subsistem usando odores como alimento.
Além disso, devido a que os órgãos dos sentidos (neste caso, o sentido do olfato) são muito sutis, também o
são os odores dos que alimentam-se. Quer dizer, a o sentido do olfato possuído pelo corpo provisional
permite perceber odores de uma natureza sutil.
Além disso, o texto afirma que aqueles que têm acumulado boa sorte podem alimentar-se de odores
agradáveis, enquanto que os que não têm acumulado, quer dizer, os que têm acumulado carma negativo,
somente podem alimentar-se de odores desagradáveis.
7.- Duração. Existem várias opiniões referentes à duração da existência intermediária. Aqui gostaria de
citar quatro explicações que encontram-se no volume 17 do Daibibasha Ron.
1) "Pergunta: Durante quanto tempo mora a existência intermediária nesse estado? Resposta: Só durante
um curto período de tempo, porque busca rapidamente o renascimento.
De acordo a esta primeira explicação, a existência intermediária somente dura um curto período. Devido a
que as condições externas necessárias são harmonizadas pela energia cármica da vida que encontra-se em
estado provisional, sua estadia nesse estado é muito breve.
2) O Venerável Shamadatta afirma: "A existência intermediária dura somente sete períodos de sete dias.
Antes de transcorridos 49 dias, o renascimento fica definitivamente garantido. "Esta opinião estima a duração
da existência intermediária em sete semanas, ficando o renascimento definitivamente assegurado depois de
transcorrido esse período.
3) O Venerável Vasumitra afirma o seguinte: "A existência intermediária dura, quanto muito, sete dias,
porque o corpo provisional é extremadamente sutil e não pode existir por muito tempo". Esta terceira
explicação estima a duração da existência intermediária numa semana, devido à fragilidade do corpo
provisional que não lhe permitirá persistir durante um período muito longo.
4) "O Buda, o Homem de Grande Virtude, tem afirmado: Não existe duração fixa (para a existência
provisional). Quer dizer, que quando as condições para o renascimento concretizam-se rapidamente, o corpo
provisional durará somente um curto período de tempo. Mas se depois de transcorrido um longo período, as
condições não estiverem completas ainda, esse corpo provisional persistirá durante um tempo considerável.
"De acordo com esta quarta opinião o intervalo entre a morte e o renascimento não é fixo. Para alguns, as
condições necessárias para o renascimento manifestam-se rapidamente, enquanto que para outros a
materialização destas condições requer de um tempo maior.
8.- Certeza do renascimento. (Este tema será tratado mais adiante)
9.- Forma de locomoção. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "As existências intermediárias destinadas
ao estado de Alegria movimentam-se para cima com a cabeça para o alto, como ao levantar-nos de um
assento. As destinadas aos estados de Tranqüilidade, Fome ou Animalidade movimentam-se para a frente,
horizontalmente. As destinadas ao Inferno têm suas cabeças para baixo e seus pés para o alto, e assim caem
nas profundezas".
Esta descrição reflete a noção de um céu localizado acima do mundo humano e um inferno que acha-se
por abaixo do mesmo. Os destinados ao céu movimentam-se para cima com a cabeça nessa direção, enquanto
que aqueles destinados ao inferno caem no mesmo de cabeça. Os corpos provisionais daqueles destinados ao
estado de Tranqüilidade, Animalidade ou Fome têm suas cabeças para cima e seus pés para abaixo,
movimentando-se como o fazem os seres humanos.
Ao ler estas passagens, devemos lembrar que o Kusha Ron e o Daibibasha Ron são tratados Hinayana, e
como tais, estão profundamente influenciados pelo ponto de vista filosófico Hinayana, que afirma que os
dharmas, ou componentes básicos de todas as coisas, existem na realidade. Portanto, referem-se ao corpo
provisional como algo que tem existência real e substancial, mas ao revisar nossa compreensão dos mesmos à
luz do Budismo Mahayana, encontramos dados importantes relativos à forma em que existe a vida após da
morte.
Sob o ponto de vista do Budismo Mahayana, podemos afirmar que a vida depois da morte existe no
estado de vazio ou não substancialidade (ku), dissolvendo-se de novo no grande cosmos e fluindo com a vida
cósmica. Dito em outras palavras, o corpo provisional não é, de fato, outra cosa que, a consciência alaya, a
estrutura da existência individual que transmigra de uma vida à seguinte, contendo dentro de si mesma o
potencial de todas as funções físicas e mentais na forma de "sementes”.
O chamado "corpo provisional" existe no estado de vazio ou não substancialidade, no qual funde-se com
a grande vida do cosmos, enquanto mantém um estado latente, quer dizer, como sementes na consciência
alaya, as funções que fazem que os cinco componentes tomem forma e se unam.
As passagens provenientes do volume 9 do Kusha Ron que temos citado anteriormente podem
interpretar-se adequadamente como uma descrição da forma em que as sementes dos cinco componentes
existem de maneira latente na consciência alaya; que encontra-se, por sua vez, no estado de vazio,
representado isto como algo que tivesse existência substancial e manifesta.
Porém, embora a vida no estado de não-substancialidade, vazio ou ku dissolva-se de novo no próprio
cosmos, isto não significa que perca seu caráter ou personalidade individual. Em outras palavras, mesmo
quando se torne um com o grande cosmos, mantém simultaneamente sua identidade como indivíduo. Esta
forma de existir é o estado de ku, que não pode ser entendido nem como existência nem como não-existência.
Os fatores que determinam esta individualidade encontram-se impressos na consciência alaya, achando-
se contidos dentro das mesmas como "sementes".
As sementes do carma, desempenham um papel importante a este respeito (11).
Durante o processo posterior à morte o "eu" subjetivo de cada existência individual é influenciado pelas
sementes, especialmente as do carma, contidas na consciência alaya. Em outras palavras, enquanto encontra-se
fundido com a vida cósmica, o "corpo provisional" ou eu subjetivo experimenta a força latente do seu carma e
outras sementes e, enquanto recebe prazer ou sofrimento, percebe diversas imagens.
As sensações ou imagens reais que uma vida individual recebe no estado de existência intermediária
forma a "paisagem interior" dessa vida depois da morte e corresponde às descrições existentes em várias
escrituras budistas, relativas à "viagem através da existência intermediária". O próprio Nitiren Daishonin
descreve esta viagem detalhadamente numa das suas primeiras escrituras, "Em louvor aos dez Reis" (japonês:
Juo Santan Sho). Agora gostaria considerar o que experimenta a vida depois da morte, segundo o descrito
neste Gosho.
SEGUNDA PARTE: A VIAGEM ATRAVÉS DA EXISTÊNCIA
INTERMEDIÁRIA
Durante o trigésimo quinto dia após sua morte, a pessoa falecida chega ao palácio do Rei Emma. Na
China, chama-se a Emma Rei Hsi-cheng ("aquele que cala os protestos"), o que quer dizer que silencia as
objeções da pessoa falecida relativas a um tratamento injusto.
Afirma-se que o palácio do Rei Emma tem quatro entradas, para o norte, sul, leste e oeste,
respectivamente. À direita e esquerda de cada entrada encontram-se uns postes, como as usadas para os
estandartes, na parte superior dos quais se posa um deus com a forma de uma cabeça humana. Às vezes
chama-se a estes deuses "mensageiros celestes" e identificados geralmente a Dosho ("mesmo nascimento") e
Domyo ("mesmo nome"), deuses que, segundo se afirma, acompanham às pessoas desde o momento do seu
nascimento e tomam nota das suas boas e más ações. Quando o Rey Emma pronuncia uma sentença, informa
ao falecido o seguinte:
“Estes mensageiros celestes nasceram no mesmo momento que o senhor, e desde então o
acompanharam como uma sombra acompanha o corpo, jamais separando-se de sua pessoa por um momento
sequer. Como eles anotaram todas as suas ações em suas tábuas, não pode haver nenhuma margem a erro”.
Além disso, quando o falecido chega à corte do Rei Shoko, durante o décimo quarto dia após sua morte,
afirma-se que alí também encontram-se os postes, à esquerda e direita, sobre cada uma das quais pousa-se de
maneira similar uma deidade em forma de cabeça humana. A da esquerda é masculina; a da direita é feminina.
O Juo Santan Sho diz o seguinte: “O deus da esquerda registra todos os maus atos, sem esquecer a menor
ofensa. A deusa da direita registra todos os atos virtuosos, sem esquecer o menor bem. Juntos, formam o par
de divindades dos mastros. Com suas cabeças humanas, elas podem ver todas as atividades humanas tão
claramente quanto as palmas das próprias mãos”.
Além disso, na corte do Rei Emma encontra-se um salão separado, chamado o Salão do Brilho da Luz.
Neste salão acha-se pendurado o espelho johari, conhecido também como o espelho do carma. Quando uma
pessoa culpada de uma falta tem sido enviada à corte de Emma o rei procede a interrogá-lo. Indica que,
enquanto se achava-se no mundo saha, o falecido tem se comportado de maneira silenciosa e cruel, carecendo
de benevolência. Ajudou-lhe a riqueza que tem acumulado com tanta avareza na viagem da morte?, pergunta-
lhe Emma. Tomariam seu lugar os filhos que amou tão ternamente, vendo o seu estado atual? E assim continua
interrogando o falecido.
Esta descrição significa que a riqueza, autoridade, posição e amor da esposa e os filhos que uma pessoa
desfruta neste mundo não servem de ajuda alguma durante a existência intermediária.
De maneira similar, a imagem dos falecidos despojados de suas vestimentas pelos dois demônios no rio
das três travessias ilustra o fato de que inclusive os que têm acumulado incontáveis riquezas no mundo,
possuindo muitas vestimentas elegantes para usar de acordo com a ocasião, e dispondo de numerosos
serventes e conhecidos, serão no final despojados de tudo, e terão que vagar sozinhos durante a viagem da
existência intermediária.
Depois o Rei Emma lê ao falecido o conteúdo das tábuas de ferro sobre as quais os mensageiros celestes
têm tomado nota de suas ações. Ao ouvir isto, o falecido protesta, afirmando que, embora lembrando algumas
das faltas que lhe foram lidas, o restante é certamente um erro da parte dos mensageiros celestes.
“Mesmo aqui, após a morte, continuaras com tuas faltas, mentindo?”, pergunta-lhe Emma. "Não temos
acrescentado sequer uma simples falta no seu registro. O senhor está recebendo simplesmente o efeito das
suas próprias ações". Desta maneira, repreende à pessoa falecida. Além disso, para demostrar a essa pessoa
que o registro mantido pelos mensageiros celestes não contém erro algum, faz com que a mesma olhe no
espelho johari, onde refletem-se todas as ações da sua vida. Em termos modernos, seria algo parecido a assistir
uma gravação de vídeo.
Perante isto, a pessoa falecida pára de discutir com o Rei Emma. Afirma-se que ele passa unicamente a
esperar pelas orações da sua esposa, filhos e dos conhecidos ainda vivos, para sua iluminação. No Juo Santan
Sho afirma-se o seguinte:
“No final, o que determina se a pessoa falecida irá levantar-se ou cair são as orações oferecidas para ela.
Contemplando estes princípios, o indivíduo é estimulado a aprofundar a sua fé e a oferecer orações pelas seis
espécies de parentes. São particularmente importantes as orações do trigésimo quinto dia em memória ao
falecido, quando este passa por grandes sofrimentos na corte do rei Emma. Se uma pessoa praticar a virtude
(de oferecer orações ao falecido) nessa ocasião, tudo se refletirá no espelho e então o rei Emma e seus oficiais
alegrar-se-ão. E a satisfação do transgressor, ao receber essas orações, não terá limites”.
Quer dizer que, ainda quando o falecido devesse, de outra forma, estar destinado a cair no inferno, se
forem oferecidas orações por ele, então, de acordo à quantidade e profundidade dos benefícios provenientes
das mesmas, pode atingir imediatamente a iluminação, renascer nos reinos celestial ou humano, ou ser
enviado ao seguinte rei com sua sentença protelada.
Como se ilustra simbolicamente no Juo Santan Sho mediante as imagens do Rei Emma e sua corte, as
circunstâncias do renascimento de uma pessoa falecida são determinadas só pelas boas e más ações que ela
mesma realizou quando estava viva. Ou seja, a pessoa falecida escolhe efetivamente um renascimento
correspondente às sementes cármicas que encontram-se na sua consciência alaya, de acordo com a lei de
causalidade cármica, o princípio que o indivíduo colhe os efeitos das suas próprias ações. O papel simbólico
dos dez reis é o de julgar se a pessoa falecida tem reconhecido genuinamente suas faltas, e se está aplicando-
se corretamente ou não a lei da causalidade cármica.
Em outras palavras, o julgamento dos dez reis descrito no Juo Santan Sho e outros textos parece ser uma
imagem percebida por uma vida que encontra-se na fase intermediária, simbolizando o rigor da lei causal que
não pode admitir exceção alguma.
Os implementos que o Rei Emma usa para emitir uma sentença, são as tábuas de ferro sobre as quais os
mensageiros celestes anotam as boas e más ações do falecido, e o espelho johari, chamado também o espelho
do carma.
Os mensageiros celestes simbolizam a função mediante a qual registram-se sem exceção todos nossos
pensamentos, palavras e ações na consciência alaya. O espelho johari pode ser considerado um reflexo preciso
do carma, armazenado na consciência alaya durante a existência intermediária.
De acordo com a descrição que encontra-se no Juo Santan Sho, o quadragésimo nono dia marca quase a
última oportunidade para o "ser" que se encontra na fase da existência intermediária, escolher seu
renascimento de acordo com as causas cármicas que encontram-se na consciência alaya. Afirma-se que
durante este dia, o falecido comparece perante o rei Taissan. No Gosho afirma-se o seguinte: “Quando
aparecem diante desse rei, todos os pecadores têm os locais de renascimento determinados”.
Em casos excepcionais, o falecido pode ser enviado ao seguinte rei, com as circunstâncias do seu
renascimento ainda por decidir, mas na grande maioria dos casos, o local onde o falecido renascerá é
determinado neste momento. Portanto, esta ocasião é chamada "a realização dos cinco componentes da
existência intermediária".
Ante a corte do Rei Taissan encontram-se seis portas, levando cada uma delas a um dos seis sendeiros. De
acordo com suas causas cármicas, quer dizer, sua tendência vital, o falecido passa por uma ou outra destas
portas.
O momento no qual a pessoa falecida passa por uma das portas corresponde ao seu seguinte
renascimento. Neste momento acaba a viagem através da existência intermediária, e nasce num ou outro dos
seis sendeiros. Parece que entre as quatro opiniões mencionadas anteriormente, concernentes à duração da
fase de existência intermediária segundo se estabelece no Kusha Ron e o Daibibasha Ron, o Juo Santan Sho
segue geralmente a segunda, que afirma que os cinco componentes da existência intermediária persistem
durante sete semanas.
Mas, o Kusha Ron afirma que nenhum poder pode alterar o carma do falecido formado na sua existência
anterior. E, de fato, é verdade que o carma de uma vida na fase da existência intermediária não pode ser
alterado por poder algum tal como a autoridade, a posição social, a riqueza ou o afeto e preocupação dos
parentes que a pessoa falecida tem deixado para trás. O Juo Santan Sho esclarece, que nem sequer a
benevolência dos dez reis pode alterar o carma do falecido ou mudar o local no qual está destinado a nascer.
Porém, de acordo com o Gosho, a transferência, por parte dos vivos, dos benefícios conquistados mediante a
prática budista, ou seja, as orações pelo falecido, são o único poder que pode efetuar uma mudança no carma
deste, e inclusive alterar as circunstâncias do nascimento ao qual está destinado.
Em outras palavras, a suprema boa sorte inerente à iluminação, oferecida pelos vivos mediante suas
orações, penetra a consciência alaya da pessoa falecida e efetua um câmbio nessa vida num nível muito
fundamental. Por exemplo, mesmo quando uma vida encontra-se submetida aos sofrimentos dos três maus
caminhos na fase da existência intermediária, se os vivos enviam a essa vida a grande boa sorte do estado de
iluminação, seus sofrimentos se converterão imediatamente em prazer, e poderá encaminhar-se para um
renascimento mais feliz baseado numa condição de vida repleta de boa sorte.
Devido a isto, Nitiren Daishonin indica repetidamente no Juo Santan Sho a importância do oferecimento
de orações pelos falecidos. Por exemplo, ao descrever o que acontece na corte do Rei Shoko, afirma o seguinte
nesse Gosho:
“A todo instante, o pecador espera que a sua esposa e os filhos enviem orações em sua memória, mas isso
é exatamente o que eles não fazem. Pelo contrário, seus filhos sobreviventes desentendem-se com as riquezas
que ele deixou, cometendo muitos maus atos, e o falecido sofre ainda mais... Observando isso, o rei diz: ‘Seus
filhos são ingratos. Agora, não há esperanças’. E o falecido cairá no inferno. Entretanto, se os vivos oferecerem
orações em sua memória e por eles recitarem a Lei Mística que reverte a calúnia e proporciona salvação, o
falecido pode atingir o estado de Buda. E então o rei exultará, e o prazer do falecido não conhecerá limites”.
Além disso, ao descrever o que ocorre durante o quadragésimo segundo dia na corte do Rei Henjo, o
Gosho refere-se aos três tipos de devoção filial.
Prover nossos pais de alimentos e vestimentas, representa o primeiro nível de devoção filial. Servi-los,
cumprindo com sua vontade, representa o segundo nível. E afirma que o nível mais elevado de devoção filial
consiste em oferecer a nossos pais os benefícios conquistados mediante a prática budista. Afirma ademais que,
dado que oferecer a nossos pais os benefícios de nosso Daimoku quando ainda estão em vida, constitui uma
forma superior de devoção filial, a forma mais elevada desta consiste em oferecer os benefícios de nosso
Daimoku aos pais que já faleceram. Portanto, o Daimoku oferecido ao falecido constitui a oferenda suprema de
benefícios para ele, e tem o poder de permitir que uma vida que vaga através da existência intermediária
alcance a Iluminação. Os magníficos efeitos do Daimoku podem eliminar o sofrimento e tornar realidade a
iluminação, inclusive no caso de uma vida que tenha caído no inferno dos incessantes sofrimentos.
Com relação a isto, no Ongui Kuden (Registro dos Ensinos Transmitidos Oralmente) Daishonin afirma o
seguinte:
“Agora, quando Nitiren e seus seguidores oferecem orações pelos falecidos, recitando o Sutra de Lótus e
o Nam-myoho-rengue-kyo, a luz do nosso Daimoku alcança o inferno dos incessantes sofrimentos e lhes
possibilita a atingir o estado de Buda em suas formas presentes. Vem daí o conceito de ‘transferência de
benefícios’. Mesmo que um indivíduo não creia no Sutra de Lótus e caia no inferno dos incessantes
sofrimentos quando um filho dedicado lhe envia a luz do Daimoku, oferecendo sua orações em sua memória,
como devoto do Sutra de Lótus, como poderia o falecido deixar de atingir a iluminação?”. (Gosho Zenshu, pág.
712)
Aqui termina nossa explicação da existência intermediária; mas antes de passar ao assunto do
renascimento, devemos referir-nos a uma passagem importante do Juo Santan Sho concernente àqueles que,
depois da morte, não passam pela fase da existência intermediária. Na passagem em questão afirma-se o
seguinte: “À parte destes, quem realizou o extremo mal ou o extremo bem não experimenta a existência
intermediária. Aqueles que realizaram o supremo bem atingem imediatamente o estado de Buda, enquanto os
que cometeram o supremo mal caem imediatamente nos maus caminhos. Assim, em casos de extremo bem ou
mal, não há existência intermediária”.
Aqueles que cometem o supremo mal de caluniar o Sutra de Lótus, depois de passar pelas agonias da
morte, não podem evitar cair de imediato no inferno dos incessantes sofrimentos. Devido à clareza da natureza
maligna dos seus atos, não há necessidade de esperar a sentença dos dez reis.
Por outro lado, aqueles que têm realizado o supremo bem, quer dizer, aqueles que em vida recitaram
Daimoku e estabeleceram o estado vital da iluminação, uma vez que têm passado pelo momento da morte,
são recebidos de imediato pelos Budas, Bodhisattvas e divindades benevolentes, e podem ir de imediato à
Terra Pura do Pico da Águia.
Em várias das suas escrituras, Nitiren Daishonin descreve a "paisagem interior" que apresenta-se depois da
morte de alguém que, em vida, fez surgir continuamente o estado de Iluminação mediante a fé na Lei Mística.
Por exemplo, em "A Herança da Lei Última da Vida" afirma-se o seguinte:
“Para aquele que concentra sua fé e recita Nam-myoho-rengue-kyo com a profunda visão de que agora é
o último momento da vida, o sutra proclama: ‘Após seu falecimento, mil Budas estenderão suas mãos para
livrá-los de todo o temor e evitar que ele caia nos maus caminhos’. Como nos seria possível reter as lágrimas
com a inexpressável alegria de saber que não apenas um ou dois, nem somente uma ou duas centenas, mas
tantos quantos mil Budas virão receber-nos de braços abertos”. (MW-1, pág. 22)
De maneira semelhante, em "Sobre a Prática dos Ensinos do Buda", afirma-se:
“Mesmo que alguém esteja a ponto de cortar nossas cabeças com uma serra, empalar-nos com lanças ou
algemar nossos pés para furá-los com uma verruma, enquanto estivermos vivos devemos continuar recitando
Nam-myoho-rengue-kyo, Nam-myoho-rengue-kyo. Então se recitarmos até o exato momento da morte,
Sakyamuni, Taho e todos os outros Budas do universo virão instantaneamente, exatamente como prometeram
durante a cerimônia no Pico da Águia. Tomando nossas mãos e colocando-nos sobre os seus ombros levar-
nos-ão ao Pico da Águia. Os dois santos, os dois deuses celestes e as Dez Deusas nos protegerão, enquanto
todos os deuses budistas erguerão uma cúpula sobre nossas cabeças e desfraldarão bandeiras ao alto. Eles nos
acompanharão, sob sua proteção, até o Pico da Águia”. (MW-1, págs. 106 e 107)
E no Gosho intitulado "As Catorze Calúnias"; Nitiren Daishonin descreveu ao Lorde Matsuno a Terra Pura
do Pico da Águia a ser experimentada depois da morte, encorajando-o assim a manter uma fé forte até o
último momento da sua vida:
“Continue sua prática sem se abalar até o último momento da sua vida e, quando chegar o momento, veja
cuidadosamente! Quando subir à montanha da maravilhosa iluminação e contemplar ao redor em todas as
direções, para seu assombro verá que todo o universo é a Terra da Luz Tranqüila. O chão será de lápis-lazúli, e
os oitos caminhos estarão separados por cordas de ouro. Quatro espécies de flores cairão dos céus, e a música
ressoará no ar. Todos os Budas e bodhisattvas estarão presentes em total alegria, acariciados pelas brisas da
eternidade, felicidade, verdadeiro eu e pureza. Aproxima-se rapidamente o momento em que nós também
estaremos entre eles. Porém, se tivermos fraqueza na fé, jamais chegaremos a esse lugar maravilhoso”. (MW-3,
págs. 216-217)
NOTAS
(1) Raymond A. Moody, Jr., Life after Life: The Investigation of a Phenomenon – Survival of Bodily Death (Covington, Georgia:
Mockingbird Books 1975; reprint ed., New York: Bantam Books, 1976).
(2) Ibid., p.32.
(3) Ibid.
(4) Ibid.
(5) Kenneth Ring, Life at Death: A Scientific Investigation of the Near-Death Experience (New York: Quill, 1982), p.53
(6) Ibid., p. 55.
(7) Os cinco componentes, chamamos também os cinco agregados o SKANDHAS, são as categorias de elementos físicos e psíquicos
que unem-se temporariamente para formar um ser vivo individual. A forma é o aspecto físico da vida, que possui cor e forma e inclui os
cinco órgãos dos sentidos.
A percepção é o processo pelo qual percebemos a informação captada mediante os seis órgãos dos sentidos (os cinco órgãos dos
sentidos mais a mente, que integra as impressões recebidas pelos cinco sentidos).
A Concepção significa as idéias ou noções formadas a respeito do que foi percebido. A volição é a vontade ou impulso de atuar em
relação com o que o indivíduo tem percebido e sobre o qual tem formado um conceito.
A Consciência é a função da vida que permite discernir, a qual pode emitir juízos de avaliação, distinguir entre o bom e o ruim, etc.
Também integra os outros quatro componentes.
(8) A sexta consciência integra as impressões recebidas pelos cinco sentidos e emite juízos a respeito do mundo externo. A consciência
mano é a função da mente que ocupa-se do pensamento abstrato e discerne o mundo interior. Serve de ponte entre os estados
consciente e inconsciente.
Afirma-se que o amor próprio e a consciência de nós mesmos são funções da consciência mano. A consciência alaya, chamada
também o depósito do carma, encontra-se abaixo do nível de percepção consciente e armazena as impressões de todas as ações
mentais, verbais ou físicas como causas latentes que possuem o potencial de manifestar os correspondentes efeitos do futuro.
Considera-se que a consciência alaya é a que está submetida ao ciclo do renascimento. As consciências mano e alaya são,
respectivamente, a sétima e oitava das oito consciências postuladas pela escola Somente-Consciência, e das nove consciências
postuladas pelas escolas Tien-tai e Hua-yen (Kegon).
(9) A existência intermediária é uma das quatro fases que repetem-se no ciclo do renascimento: nascimento, existência contínua (até o
momento da morte), morte e existência intermediária (entre a morte e o renascimento).
(10) O mundo do desejo é a primeira divisão do mundo tríplice, o âmbito no qual transmigram os seres não iluminados. Compreende
os estados de inferno, fome, animalidade, ira, tranqüilidade e as primeiras seis divisões do êxtase. Chama-se assim porque aqueles que
o habitam estão dominados por vários desejos.
(11) O termo "sementes" refere-se às causas ou impressões latentes armazenadas na consciência alaya, que possuem potencial de
manifestar os correspondentes efeitos. O pensamento da escola Somente-Consciência distingue entre as "sementes do carma", que
podem ser boas ou más e as sementes de natureza neutra.
(12) Nova Edição Crítica das Escrituras de Nitiren Daishonin, Período Showa (jap. Showa Shintei Nichiren Daishonin Gosho) (Taiseki-ji,
1966; reedição, 1979), vol. 1, págs. 52-78.
(13) Quer dizer, que Nanjo Goro estará protegido na morte devido a que, quando estava vivo, abraçou o Sutra de Lótus, rejeitando os
ensinamentos provisórios.
(14) As descrições dos dez reis diferem ligeiramente de acordo com o texto. Por exemplo, em algumas versões, o oitavo rei é o Rei
Toshi, cuja verdadeira identidade é a do Buda Ashuku e o décimo rei, Godotenrin, afirma-se que é uma manifestação do Buda Amida.
(15) Os "seis tipos de parentes" são pai, filho, irmão mais velho, irmão mais novo, esposo e esposa ou, de acordo a outra versão, pai,
mãe, irmão mais velho, irmão mais novo, esposa e filho.
(16) Pratyekabudas: Um dos dois tipos de sábios Hinayana, sendo o outro o dos Shravakas (shomon em japonês), ou aqueles que
escutam as vozes. Considera-se um pratyekabuda como (a) "aquele iluminado às causas e condiciones" (engaku), ou seja, aquele que
percebe a verdade da origem dependente do sofrimento, ou (b) "aquele iluminado independentemente" (dokkaku), alguém que busca
a iluminação sem um mestre, por exemplo, num mundo onde não existe um Buda, mediante a observação dos fenômenos naturais e a
meditação sobre os mesmos. Entre os Dez Estados, o pratyekabuda corresponde ao da Compreensão (Absorção).
(17) Terra da Luz Tranqüila: lugar onde mora um Buda. Também indica o estado de iluminação.