O Grande Evangelho de João – Volume VIII Jakob Lorber
34. A NATUREZA DE SATANAZ
1. Aproxima-se um escriba, convertido em Emaús, e diz: “Senhor e Mestre! Sabemos a causa da obsessão e quem, no fundo, são os espíritos maus. Na Escritura fala-se de demônios reais, de seu príncipe, chamado Lúcifer, que fora atirado ao eterno fogo do inferno, com inúmeros outros anjos. 2. Além disto, consta ter ele, como serpente, levado à queda o primeiro casal, e Deus dele usou para tentar o devoto Job. Que relação tem a Escritura com Tua Boa Nova? Quem é e onde está Satanaz? Quem são os demônios?” 3. Digo Eu: “Muita coisa foi por Mim esclarecida a respeito, e Meus apóstolos sabem do que se trata; como és novato, justifica-se a pergunta; portanto, ouve! Tudo que o Espaço infinito comporta como matéria achase em julgamento, portanto, fixado pela Força de Vontade de Deus. Se assim não fosse, não existiriam Sol, Lua, Terra e seres, e Deus seria o Único na contemplação de Seus Pensamentos e Idéias, imensos. 4. Desde eternidades Deus externou Seus Pensamentos e lhes deu corpo através de Sua Onipotência. Tais Pensamentos e Idéias não são propriamente corpos, mas elementos fixos e invólucros destinados à maturação para uma existência independente, criações designadas a subsistir ao Meu lado, o Criador visível, como que possuindo força própria. 5. Toda criação, como elemento espiritual fixado, é ainda impuro, comparado ao elemento puro e livre, podendo ser considerado mau e nocivo, ao lado do espiritualmente puro. 6. Na expressão “Satanaz”, deves entender, de modo geral, a Criação em sua totalidade, e um “demônio”, suas tendências isoladas. 7. Quando o homem nesta Terra vive dentro da Vontade revelada por Deus, ele se liberta da prisão criadora, passando à liberdade original de Deus. 8. Quem não quiser acreditar em Deus, nem pretende aplicar a Sua Vontade revelada, submerge cada vez mais profundamente na Criação material, tornando-se espiritualmente impuro, mau e condenado pela maldade – um demônio. Toda criação e fixação material é, como já disse, impura, má e perversa frente ao puro espírito incriado, não pela suposição de que Deus tivesse projetado algo impuro, mau e nocivo, mas porque: primeiro, é necessário existir a Criação dotada de inteligência e força de ação, e, no homem, incluindo o livre arbítrio; segundo, por ser designada a transformar o efeito da Criação a fim de atingir a possível independência como elemento individual. 9. Perante Deus, nada existe de impuro, mau e nocivo; pois ao puro, tudo o que Deus criou é puro e bom; portanto, não existe para Deus, Satanaz, diabo nem inferno. Somente a Criação o é, enquanto tiver que existir como tal, e finalmente resolver conquistar a vontade livre. 10. Se consta na Escritura ter Satanaz, em figura de serpente, seduzido o primeiro casal, quer dizer que ele, muito embora conhecendo Deus e Sua Vontade, deixou-se tentar pelo prazer do mundo material, de sorte que o desejo de sua carne condenada externou-se dizendo: Veremos o resultado da infração contra a Vontade Divina! Deus Mesmo nos outorgou a ação, portanto nada perderemos no conhecimento, mas lucraremos! Deus conhece a conseqüência de nossa ação livre, – mas nós a ignoramos! Ajamos a nosso gosto, para experimentarmos aquilo que só Deus sabe! 11. Assim, ambos saborearam o fruto da árvore do Conhecimento, por meio da experiência, afundando um grau na matéria que, frente à vida livre do espírito, pode ser classificado como “morte”. 12. Reconheceram, em seguida, que em sua carne localizaram-se condenação e morte, capazes de enterrar igualmente a alma no julgamento e prisão. Assim perderam o Paraíso, que consistia na completa união da alma com o espírito, sem reencontrá-lo inteiramente. Sua alma havia sido ferida pelo espinho da matéria e muito teve que lutar para se manter o mais afastado possível do julgamento surgido do imperativo projetado, conforme ora acontece a todas as criaturas, razão pela qual Eu vim a este mundo para demonstrar-lhes o Caminho da Vida e entregarlhes novamente o Paraíso, através de Minha Doutrina. 13. O mesmo se deu com Job. Era materialmente muito feliz e proprietário de grandes bens, sábio e devoto a Deus, vivendo estritamente dentro da Lei. Sua abastança excepcional despertou cada vez mais a sensualidade, fazendo grandes exigências ao espírito. 14. O elemento condenado da carne sugeriu à própria alma: Quero ver se consigo afastar-te de Deus por todas as minhas alegrias e dores, esgotar-te a paciência e subjugar-te à minha lei condenadora! 15. Isto valeu grande luta para Job; dispunha de todas as alegrias terrenas, as quais gozava sem dominarem a sua alma, que continuava em união com o espírito. 16. O elemento pernicioso da matéria nada conseguindo com a alma, foi ela experimentada por toda sorte de atribulações físicas, descritas na Bíblia. Job suportou-as com paciência, embora, às vezes reclamasse de sua aflição; no final, porém, confessava Deus lhe ter dado tudo, mas lhe tirara tudo. Todavia, poderia agraciá-lo de novo, e até muito mais, em virtude da fusão de alma e espírito. Se assim foi, – quem era Satanaz que tanto experimentou o beato Job? O elemento condenado de sua carne, isto é, seus variados apetites! 17. Jamais houve um Satanaz individualizado, e demônios personificados só existiam na matéria telúrica de espécie variada. Os antigos sábios representavam Satanaz e os diabos sob quadros horrendos, isto porque a alma deveria ter noção, sob vários aspectos, do sofrimento de uma existência livre, quando se deixa novamente aprisionar dentro da matéria.
35. SATANAZ COMO PERSONALIDADE
1. (O Senhor): “Eu Mesmo fiz com que Satanaz aparecesse em figura,
e Meus discípulos se apavoraram. O mesmo aconteceu várias vezes aos patriarcas; naquela época, não houve explicação do acontecimento, pois eles entenderam o sentido da aparição por meio da interpretação espiritual, razão por que diziam: Horrível é cair-se nas Mãos da Justiça Divina. Isto quer dizer: Para uma alma que já tenha atingido a plena consciência, horrendo é deixar-se aprisionar pela Lei categórica da Onipotência, dentro da matéria. 2. Prova isto a experiência com um moribundo que não tenha alcançado o renascimento espiritual. Por que o temor da alma diante da morte de seu corpo? Porque julga morrer com ele, através da Lei categórica que a prende à matéria. Podeis fazer tal observação nos que descrêem na sobrevivência da alma, por encontrar-se ela enterrada na matéria, em parte ou totalmente, sentindo a morte até que dela seja separada pela Minha Vontade. 3. Espero tenhais compreendido a verdadeira situação de Satanaz e seus demônios, de sorte a perceberdes a mesma relação no inferno: é, como Satanaz, a eterna condenação, ou seja, o mundo e sua matéria. 4. Por que se denomina Satanaz o príncipe da treva e da mentira? Por não ser a matéria o que parece, e quem dela se apegar pelo amor, encontra-se, evidentemente, no reino da mentira e – em confronto com a Verdade – no reino da treva. 5. Quem, por exemplo, aprecia os ditos tesouros do reino da matéria inerte, considerando-os pelo que parecem e não pelo que são na realidade, acha-se no reino da mentira, porque seu amor, base da vida, nela se enterrou cegamente e mui dificilmente se poderá elevar de tal escuridão à Luz da Verdade plena. 6. Quem considerar o ouro apenas como manifestação correspondente ao Bem surgido do Amor em Deus, assim como a prata, a Verdade da Sabedoria em Deus, – conhecerá o verdadeiro valor de ouro e prata, encontrando-se no Reino da Verdade; sua alma não será sufocada pelo brilho enganador e por sua condenação. 7. Deste modo, somente os patriarcas e profetas davam o verdadeiro valor ao ouro, prata e pedrarias; não tinham apreciação como matéria; portanto, não se tornavam perigosos à alma. Pela justa noção do valor da matéria, rapidamente descobriram sua utilidade natural, tirando o proveito verdadeiro. 8. Quando, posteriormente, as criaturas começaram a apreciar a matéria em virtude de seu brilho e apresentação, caíram no julgamento dela e se tornaram espiritualmente cegas, duras, ávidas, mesquinhas, mentirosas, rixentas, traiçoeiras, orgulhosas, más, com tendências dominadoras e bélicas deixando-se atrair ao paganismo, portanto, ao inferno, do qual não podiam ser libertadas sem Mim. 9. Por isto, tive que vestir a própria matéria e, com ela, o julgamento, e terei que rompê-la, a fim de Me tornar a Porta para a Vida Eterna para todos os prisioneiros, caso queiram passar por ela. Eis por que Sou a Porta para a Vida, e a Própria Vida. Quem não ingressar por Mim, não chegará à Vida na Luz da Verdade Eterna e à Liberdade, ficando preso no julgamento da matéria. 10. Todavia, segue-se a seguinte pergunta: Neste caso, não existem Satanaz e demônios personificados? Respondo: Claro, os há aqui encarnados e muito mais no Além, constantemente empenhados em exercerem sua influência sobre a Terra. Primeiro, pelos elementos brutos da Natureza que jazem na matéria em virtude da maturação determinada, e, além disto, indiretamente, por certas insinuações e tentações. Percebem fraquezas e tendências das criaturas, apossam-se das mesmas, incitandoas a paixões violentas. 11. Quando uma fraqueza se tiver desenvolvido a tal ponto, a criatura se acha em estado de julgamento da matéria e de seus maus elemen tos, e será difícil libertar-se. 12. Satanaz é o conglomerado do julgamento da matéria total, e quanto à sua personalidade, não existe; todavia, perfaz uma sociedade de diabos de toda a espécie, não só da Terra, mas de todos os mundos do Infinito, assim como todos os inúmeros universos-ilhas representam o Grande Homem Cósmico. 13. Em escala menor, o agrupamento de todos os demônios de um planeta é um Satanaz, e, em menor proporção, cada diabo de per si. 14. Antes que houvesse criaturas num corpo cósmico, também não existiam diabos personificados, mas, apenas espíritos não sazonados e condenados na própria matéria telúrica; dela faz parte tudo o que percebeis pelos sentidos. 15. Uma coisa é certa: não há, em outros mundos, diabos mais perversos e maus, que nesta Terra. Se tivessem permissão, muito prejudicariam o planeta e seus habitantes. A fim de impedi-los, são acometidos com cegueira e tolice completas, e seus núcleos assemelham-se aos manicômios, onde se enclausuram loucos e desvairados, para não prejudicarem os outros. Por esta explicação, podeis perceber, pelo raciocínio e intelecto claros, qual a situação de Satanaz e dos demônios. Compreendeste tudo, escriba?” 36. LOCALIDADE DOS DEMÔNIOS PERSONIFICADOS
1. Responde o escriba: “Sim, Senhor e Mestre, à medida que meu
entendimento o assimila, porquanto o simples conhecimento não faculta percepção penetrante. Tendo revelado assuntos tão complexos, acrescenta mais a localidade dos diabos personificados, para podermo-nos precaver!” 2. Digo Eu: “Julgas mui materialmente! Que importa certo local, onde poderiam encontrar-se demônios em pessoa?! A tua alma, tornando- se pura e forte por Mim, poder-se-á encontrar nos piores agrupamentos diabólicos, que nenhum dano sofrerá. Uma alma pura e forte pode, não obstante rodeada por inúmeras legiões de diabos, encontrar-se no Reino dos Céus, que não existe alhures, com pompa externa, mas no coração da alma perfeita; deste modo, ela se torna criadora de seu reino, semelhante a Mim, no qual jamais um demônio poderá penetrar. 3. Por isto, a localidade menor ou maior de diabos personificados lhe é inteiramente indiferente; ela, para onde for, leva o Céu consigo, assim como o diabo personificado carrega inferno ou julgamento. 4. Mas, falando a respeito, classificarei suas moradas especiais. Observai as casas de comércio e negócios, inclusive o Templo; são localidades especiais para inúmeros diabos personificados. Igualmente o são os antros nos quais se pratica impudicícia e adultério; montanhas e cavernas perfuradas pelos homens com avidez e cobiça de ouro, prata e pedrarias; florestas e grutas onde se ocultam ladrões, assaltantes e assassinos; campos de guerra; estradas de caravanas; rios, lagos e mares nos quais se comercia. 5. Além disto, territórios e bens de raiz, campos, pastos, vinhas e matas de pagãos inclementes; as possessões de judeus ricos e avarentos, – são habitações apreciadas por demônios; inclusive o ar naquelas localidades, o fogo, nuvens, chuva, todos os templos pagãos e seus oráculos. Eles também se localizam em grande número onde se apresenta luxo excessivo e orgulho subseqüente. 6. Locais não habitados e não vilipendiados pelos pecados humanos não são por eles procurados, a não ser que ali passe uma caravana gananciosa. Assim, recebeste esclarecimentos nesse ponto.