A sutil implantação do
totalitarismo
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✽ de protestar ou fazer greves de
MARCO ANTONIO
ROCHA
É
preciso “respeitar
adeterminação da
Justiça e do gover-
nocubanodepren-
der as pessoas em
razão da lei de
Cuba”, Lula disse.
Àluzdessatemívelofensaver-
bal às famílias dos presos políti-
cos de Cuba, e de todos os paí-
ses, às famílias dos ex-presos po-
líticos brasileiros, entre os quais
Lula figurou por ameno perío-
do, é possível até pensar que o
nosso presidente apenas dese-
joutornarinalcançáveisosdesti-
nos que os áulicos vêm vatici-
nando para quando ele estiver
desempregado. A saber: o de se-
cretário-geral da ONU ou o de
ganhador do Prêmio Nobel da
Paz. E, ao que tudo indica, afas-
tou também, para desconsolo
do seu chanceler, a possibilida-
de de o Brasil conquistar um as-
sento permanente no Conselho
de Segurança da ONU.
Indo além do que já era, em si,
pasmoso, Lula acrescentou a
comparação absurdamente de-
sastrada de que também os ban-
didospresosnascadeiasbrasilei-
ras ali estão de acordo com as
leis e a Justiça brasileiras. Quem
dera,pois, que começassema fa-
zer greves de fome para serem
libertados...
Poderíamos, de nossa parte,
lembrar ao presidente, sem re-
ceio de errar, que também as
pessoasaglomeradas em Ausch-
witz, à espera da marcha para o
“banho” de gás e para os fornos,
no início dos anos 40, ali se en-
contravam por determinação
da Justiça e do governo alemão
da época. Não caberia ao mun-
do protestar, como ainda hoje
protesta,contraaquelasbarbari-
dades, assim como não lhes ca-
bia, aos prisioneiros, o direito
fome, uma vez que tudo se pro-
cessava no cumprimento das
leis da época, assinadas por um
líder cujo apreço pela democra-
cia, pelo contraditório, pelas
oposições,epelodevido proces-
so legal era semelhante ao que
nutre, hoje, o senhor autocrata
e soberano de Cuba.
O raciocínio subjacente àque-
la ominosa declaração parece-
me do seguinte teor: 1) a demo-
cracia é o regime das leis; 2) por-
tanto, desde que certas leis se-
jam protocolarmente aprova-
das, está aberto o caminho para
arbitrariedades sem limites, sob
um verniz democrático, e nin-
guémterá o direito de contestar.
Os candidatos modernos a di-
tadores descobriram que não é
mais necessário organizar gol-
pes de Estado, revoluções, guer-
rilhas urbanas e rurais, como se
fazia antigamente, em meio a ti-
roteios e matanças, para se im-
plantar um totalitarismo mode-
lar. Ele pode vir de mansinho,
comaaprovaçãodeleisquesutil-
Ditaduras modernas
precisam se escorar em
leis aparentemente
democráticas
menteacobertemosatosditato-
riais. Quem protestar estará exi-
bindo sua propensão à insubor-
dinação e à subversão e será en-
carcerado ou fuzilado ou enfor-
cado, na forma da lei.
Ora, um governante que dis-
ponha de sólida e fiel maioria
num Congresso acuado por seu
imenso prestígio popular e pe-
las prebendas que distribua cri-
teriosamente aos bons compa-
nheiros tem facilidade para ir
obtendo a aprovação de leis
que, de modo sutil, vão refor-
çando o poder e reprimindo fe-
rozmente a insubordinação.
Oposição é sempre insubordi-
nação, no pensar das ilumina-
das cabeças de esquerda – e lu-
gar de opositor é na cadeia ou
no cadafalso.
A fórmula do novo modelo de
implantação de ditaduras veio
da Venezuela, da Bolívia e do
Equador – embora fracassando
em Honduras e na Colômbia.
De modo que, quem acompa-
nha com atenção certas propos-
taslegislativasdo governopetis-
ta ao Congresso Nacional pode
ligar “a” com “b” e perceber que
os estrategistas do partido nun-
ca desistiram dos propósitos –
anteriores ao “Lulinha, paz e
amor”– de mudar tudo o que aí
está, a pau, se necessário. As-
sim,sorrateiramente vãoenxer-
tando naquelas propostas algu-
masferramentaslegaisque,sele-
tivamente manejadas, propi-
ciam a cobertura para qualquer
desmando.
Felizmente, a opinião pública
tem conseguido barrar as inicia-
tivas mais afrontosas nesse ter-
reno, como a proposta de “con-
trole social dos meios de comu-
nicação”,agorareprisadanopro-
grama nacional de defesa dos di-
reitos humanos. A embalagem é
oportuna, pois ninguém é con-
tra os direitos humanos. Esta-
mos vendo também, na área da
atividadeeconômica,esseproje-
to de autêntico terrorismo fis-
cal, apresentado sob o pretexto
de combate à sonegação. É claro
que torna esse combate muito
mais rigoroso (o que não quer
dizer mais eficaz), mas abre es-
paçoparamuitascoisasmais,co-
mo tornar qualquer empresário
oucontribuintesujeitoaarbitra-
riedades que os agentes fiscais
queiram, ou sejam induzidos, a
praticar – o que, evidentemente,
retira o ânimo para protestos ou
críticas ao governo.
Caso alguém insista, o gatilho
da repressão estará armado – na
forma da lei.
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MARCO ANTONIO ROCHA É JORNA-
LISTA. E-MAIL: MARCOANTONIO.
ROCHA@GRUPOESTADO.COM.BR