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Tradue de: La po feu 1. Plosoia ances. tga de Ana Aos mortais convém Falar com recato dos deuses. Se, a0 lusco-fusco, ‘Uma vez te aparecer uma verdade, la metamorfose transcreve-a; Contudo, sempre inexpressa, tal como €, inocente, tal ela deve permanecer. HOLDERLIN O nome do arco € vida; sua obra, a morte. Quem se esquivaré do fogo que nao se apaga? MAURICE BLANC har, 0 hom: et cet ’ 0 homem assim é feito, ele em v6. Suportar, sore hese nem VE. Suporar,sofrer € disso que ele precisa 6 © FRACASSO DE BAUDELAIRE Yer um nome paraogue Ihe mais caro, eno neleas pal setomam flores” Eem Grand 2m Epedoktes:ra personal no seio da maior paixao, reliza-se o encontro dos extremos esta paixiio é apenas um momento que desaparece com a 1 seu longo estudo, publicado como prefiicio aos Escritos Sartre faz de Baudelaire um retrato sem complacé llaire evocou um dia, com relagao a Edgar Poe, um infeliz, a testa levava a tatuagem: sem sorte. De Baudelaire também BYOB, ‘decspan podemos dizer que o destino o marcou com um anatema singular. ei: aoe ecendo, cies a0 maximo o sen Mas Sartre mostra que cle mereceu seu constante infortinio: desde arc arso de Sao nese desaparesiment.Impogs Itante consetho judicirio, passando pelo suplicio de uma Posts qucclnseaprostesss ea cui dace ¢ ivel ¢ a contrariedade de ser ignorado, até a cla ropra ereximasseao mximo da inexistncia. Fol quem faz sua desgraca, ele achama ndo, antes de submer; mento, apareceu como possiveh do a encontra Feit corpo pails ae se afirmar no canto, ‘A demonstracio de Sartre é impressionante e, no conjunto, Se ica nen Pronunciado por ums vor mort parcial. F, portant, verdade: Baudelaire tevea vida que mere- Mcspcclde de enn es a sabi , vida sérdida em seu requinte, conformista em suas revoltas, ead polo desert Senate A amb o expo ntirosa na franqueza com que a mantinha, vida falsificada so nfo porgus 0 mais alto €trevas cassada, todos esses julgamentos mio so sujitos a reserva 2 Toda 20 Te nenateneestrigadoasuaperda, mas Porém, se 08 aceitamos, como devemos, precisamos aceitar um rar o obscuro deve busca fond din herp ae a outro, que Sartre ignora: Baudelaire também mereceu As flores do olhar o dia, tornar-se dia J, essa vida, responsavel por sua macaca, também é responsavel por essa chance insigne, uma das maiores do século, Certamente isto é estranho. Ea lacuna de Sartre sublinha essa estranheza. A vida de Baudelaire, como ele 0 prova, & apenas a téria do seu fracasso. E, no entanto, essa vida é também um sucesso absoluto. Sucesso nao fortuito, mas premeditado, © que nfo se acrescenta ao fracasso, ¢ sim encontra suarazio de ser nese fracasso, glorifica esse fracasso, tora incrivelmente fecunda a poténcia, tira a verdade mais resplandecente de uma impostura fundamental. Por que Baudelaire fe grandeza postica, talvez, ah Morte fi a tentagdo de Empédoces. Mas para Holder para.o poeta, a morte é o poema. E na poesia que ele deve atin fo extremo da oposigo, o momento em que ele é leva Enigme est le pur jaillissement de d lissement de ce qui jaillit Profondeur qui tout ébrante, la venue di jour, I ach igma € 0 puro brotar do que brota, /P & © puro broar do que brota, / Profundeza que tudo abala, palavra “sagrada” de Holderlin m grande poeta? De que maneira tal ji concebida por essa falta de maior, MAURICE BLANCHOT grandeza, de eficiéncia, de verdade e, fato mais notivel ai essa falta na intengdo criadora que levou o poeta a tanto, metimento e abandono? Pois é evidente que para explicat sorte de Baudelaire nao poderiamos invocar sua genialida como Sartre nao desejaria explicar sua vida miserdvel pela dade do seu caréter. E é ainda evidente que a mesma escol explica essa existéncia fracassada exp! da, que amesma premeditagiio que. levou anf ser nem real ivre nem realmente revoltada levou-a a realizar um dos mi movimentos de libertagao poética do mundo, como se ali of homem fraqueja a literatura tomasse o seu impulso, como ‘onde a existéncia se torna temerosa a poesia se tornasse intrg ‘Observemos agora: nesses julgamentos nio se trata de o derar os valores em cujo nome poderiamos definir 0 que fracasso € 0 que no o foi, ignorando o ideal q Baudelaire se propds. Nao foi apenas em de sua época que esse homem marginal fracassou ¢ fraquej Certamente, para Villemain, para Sainte-Beuve mesmo, ass como para Ancelle ou para sua mae, ele foi apenas um fracassi um semimaniaco, desonrado por sua devassidio e justament punido com seu horrivel fim. Mas ele fracassou mais profundae mente, pois fracassou diante de si mesmo, e sua existéncia nio fo} infeliz porque conheceu um ridiculo fracasso diante da Academiy atutela de personagens que ele desprezava ea miséria,a indiferene sae a esterilidade, e sim muito mais por ter desejado a glor académica, tirado seu orgulho dos falsos elogios de um Saintes Beuve e buscado a protepdo da sociedade, di pretendia se afirmar na solidao de uma independéncia intratavel sem ter recebido dela o apaziguamento. O fracasso de Baudelaire € 0 de um homem que teve a revelagao da liberdade e rorizado por essa liberdade. Por esta razio ¢ infe do como desgraa os fracassos que s6 0 sfo aos olhosde um mundo nho: ele busca-os cada vez mais, procura-os ao mesmo tempo ‘A PARTE DO FOGO 13 {0 punire para desafid-loseneles sucumbesem mesmotertido Writo de sempre softer por eles. ade Napoledo condena As flores do mal, mas As flores lenam Baudelaire, a quem essa justiga impressiona € indo, aceita seus prinefpios. Mais ainda: ele age de tal \ca deveria té-las escrito, no maximo deveria té-las mo sonho, entrevé-las, no semitorpor da sua vida como uma falta liieida coroando o descrédito dessa JW. © fracasso de Baudelaire & sem remissio. Ele quer viver mente, mas recua diante das eonseqiiéncias dessa decisdo, jue © privaria da facilidade dos dias e da ajuda de una moral wel. Assim, ele aceita viver também fora da poesia, isto é, cer, mas, se acolhea esperanga de um sucesso social, s6 acolhe a possibilidade de perdé-lo, para se dar um ideal preciso e m nome do qual apreciar ¢ sentir sua impoténeia para fo. 1 um lado infiel poesia, para a qual no existe meia- idade, por outro o inimigo do mundo que s6 reconhece como gos aqueles que o excluem completamente, assim ele dé ia uma vida jé comprometida e a0 sucesso do mundo um ito em busea do fracasso. Do lado da poesia, ha 0 fracasso 1ue hd aquiescéncia com uma certeza nio-poética. Edo lado do \do, o fracasso chama-se miséria, erro, decadéncia, pottica de Baudelaire tem sua origem numa falta, © .cZo aos valores que a poesia contesta, inte da poesia, numa falta de poesia. Nao é estr 10 & mais estranho ainda que justamente com esse Baudelaire, vida é to gravemente maculada de infidelidade postica, a ia no se contente em se afirmar em poemas escritos, obra .cerrada na pureza de um livro, mas como experiéneia e movi~ ito da propria vida? Em suma, & como se a poesia precisasse 1re faltar-se a si propria, 6 como se ela s6 fosse purae profunda razfio do seu proprio defeito, que ela porta em si como o vazio que a aprofunda, a purifica e sempre a impede de ser, salva de ser, por essa razao a irrealiza e, irrealizando-a, torna-a ao mesmo tempo possivel e impossivel, possivel porque elaainda nao¢, seel aa partir do que a faz fracassar, ¢ impo 134 MAURICE BLANCHOT A PARTE DO FOGo 13s nem capaz da ruina completa, que the daria a base ha seu abismo, movendo-se com ele /~ Ai de mim! tudo ees ao, deseo, sonho,/ Palavale sobre meus pels, que W/Noalt, Esse paradoxo exige ser observado em detalhe. §| ‘Muitas vezes pelo medo, sent passar o vento . Sartre, Baudelaire era um homem que, ao tero profundo set todapateaprounders aie, /Osienci,oesaso to do carater gratuito, injustificado, injustificavel da sua inte... Sobre o fundo de minbas n so Deseniia um pesadelo multiforme sem trégua /Tenho cia, do abismo que representava a existéncia livre, no a bio Deseiaum pesdelomutormessem regu Teo de frente para essa liberdade, mas ora. limitava estab ‘orror, levando nto se sabe aonde; /S6 vejo 0 infinito por todas do-a num universo hierarquizado, ora a encarnava num Jas, / E meu espitito, sempre pela vertigem obcecado, / seguro, valido para os outros, e para ele mesmo incontestiv dade. /- Ah! nunca sair dos Nimeros exemplo, seus poemas), ora trapaceava com ela, devotandos Mal pelo édio ao Bem, mas na danagio de que se of reconhecendo implicitamente a soberania do que o dana ¢ 6 10s aqui esse texto conhecido para mostrar a que ponto a dendo-se a esperanga de uma possivel salvagtio com a satis Jerminologia filos6fica do comentario inova pouco sobre aatitude orgulhosa de rejeitar essa salvagao. {que cle comenta, e em conseqiigncia nfo saberia trai-la, Nesse Em resumo, Baudelaire recua diante do que chama de abi Jpoema reconhecemos a maioria dos movimentos a partir dos quais € Sartre chama de existéncia, ¢ busca garantias do lado de jyvidae obra de Baudelaire podem ser compreendidas. Sentimento verdade ou de uma autoridade objetiva, moral, social ou religi do abismo, consciéncia de que o abismo ¢ tudo, exatamente tudo, © que Sartre e Baudelaire chamam ambos de ser. Debate { Todo, ¢ abismo, esse tudo que a poesia busca e que s6 pode nguém pode pensar em desculpar, pois ele proprio o descr Jar e encontrar no abismo. Consciéncia de que a existéncis num poema que prevé de maneira precisa as anilises de S: abismo tornou insustentavel, nao deixara de se eludir, de que Ce er tela encontrar duas saidas, uma tonduzindo a seguranga objetiva do ser, aoutra ao nada ea todos os seus sucedaneos, indiferenga do Pascal avait son gouffre, avec lui se mouvant, ©, desapego do dandi, todas as formas de salvagao pela = Hélas! tout est abtme, — action, désir, réve, Impoténcia e esterilidade, Consciéncia, j4 mais obscura, de que 0 Parole et peor Ou ie cost dean Se rele no tenta se tornar visivel fazendo-se passar pela obra sibia de Mainte fols de la Pew je sens passer le vent. Deus e pela ilusdo de um pesadeto. Finalmente, sentimento da En haut, en bas, partout, la profondeur, la gréve, bigiiidade do abismno, “terrivel ¢ cativant Le silence, l'espace affreux et captivant... ‘Sur le fond de mes nuits Dieu de son doigt savant Dessine un cauchemar multiforme er sans tréve. — Hélas! tout est abime, — action, désir, réve, Parolel. tudo € abismo ~ agao, desejo sonho, / Palavral. J'ai peur du sommeil comme on a peur d'un grand trou, wae Tout plein de vague horreur, menant on ne sait oii; Je ne vois qu 'infini par toutes les fenéires, Que a palavra possa ser abismo, eis 0 que abre a Baudelaire 0 inho da criagdo poética. Escrever poemas, respondendo a um nal, escrevernovelas, romances, pegasdetteatro, mo convém a um verdadeiro homem de letras, eis o que ele quer, 1u objetivo. Porém, nesse mesmo Baudelaire, realizado se sse a gléria de um Gautier, vive também a revelagdo de que Et mon esprit, toujours du vertige hanté, Jalouse du néant I’insensibilité. — Ah! ne jamais sortir des Nombres et des Etres! 136 MAURICE BLANCHOT tudo é abismo e de que “tudo € abismo” é o fundo da palavra, movimento a partir do qual esta pode realmente falar. Como isto épossivel? Que sentido tal revelagiio podeter para um homem cuja principal atividade é escrever e que, apesar de toda a distingao do seu espirito, preocupado com obras raras, nao pretende escrever em vao? Niio dizemos que essa questtio encontra em Baudelaire @ ito mais conveniente para esclarecé-la porque esse espi esta justamente muito ligado 4 estética, muito capaz de esclarecer a arte aprofundando-a teoricamente, € no relacionando-a a ele Um problema desses no pode penetrar na consciéncia de um criador pedindo respostas gerais. S6 pode ser, passageira e super= ficialmente, objeto de consideragdescriticas. E.0 proprio problema que & critico, que faz.a critica do criador. E certo que Baudelaire sempre teve uma elevada opiniao sobre aarte, maseletambém sempre considerou oexercicio daartecomo uma atividade normal, realizando-se segundo regras ¢ nao provo- cando necessariamente debates insuperdveis. Gautier, perfeito homem de letras, mestre em matéria de lingua e estilo, parece-Ihe © poeta por exceléncia. Pela mesma razfo, tem confianga na retérica, em que nao vé pressdes arbitrérias, mas regras providen- is em acordo com 0 movimento poético profundo. “E evidente que as retéricas e as prosédias nao sAo tirani riamente, mas sim uma colegao de regras reclamadas pela propria organizagao do ser espiritual. E jamais as prosédias ¢ as ret6ricas nei + originalldade dese redux dixntaments,O contd retérica, Sartre reconhece a necessidade de uma autoridade disfargada de razio, essa mesma necessidade que levao enteado do sr. Aupick a desejar viver como uma eterna erianga sob a guarda incontestavel. Mas sigamos. Aaite poética de Bai ito conhecida. Ela se baseia ‘em certa idéia da imaginacao. A imaginagao baudelairiana é uma forga muito complexa, essencialmente destinada a ultrapassar 0 que é, aesbogar um movimento infinito e, ao mesmo tempo, capaz de retornar a uma realidade ordenada, a da linguagem, em que ela representa e encama esse movimento. Segundo os habitos do seu. ‘A PARTE DO FoGo 137 lo, Baudelaire fala da imaginagio como de uma faculdade, 's esta expresso nao significa que o homem encontre nela um sirumento jé fabricado que the bastaria pér em movimento. Quando imagina, 0 homem é inteiramente imaginagao. Quando imagina, ele nio & nem imaginagdo: esta em vias de imaginasio, esforgo e tensio para imaginar. Para Baudelaire, a imaginagdo é, sob todas as suas formas, equilibrio em perpétuo desequilibrio. Movimento sem fim de iperagao, ela esta sempre akém do que indica, devaneio que nao descansa, Além disso, se sempre quer outra coisa, se nada do que énnatureza pode satisfazé-la,é porque ela busca alcangara natureza em seu inteiro, em que se encontram tanto o mundo estranko 20 artista quanto o artista que vé 0 mundo e se vé através do mundo e que tenta com um ato magico fazer surgir, a partir de sie de sua arte, pela imaginagao, a totalidade inatingivel do universo que 0 contém. ‘Baudelaire expressou-odamaneiramaisnitida: “O queéaarte pura segundo a concepgo moderna? F criar uma magia sugestiva contendo ao mesmo tempo o objeto € o sujeito, o mundo exterior a0 artista e o proprio artista.” Quando critica o naturalismo, ele 0 critica porque essa teoria pretende reduzir a arte a transcrigio de um fato natural (“E um grande destino o da poesia... Ela contradiz sempre ofato, ja por nfo ser.” Pierre Dupontem L'Artromantique) ¢ também principalmente, porque acredita alcangar a natureza, quando na verdade s6 a alcangamos realmente se a atingimos em seu inteiro, se “conhecemos ‘oda a natureza”. Baudelaire, como todos aqueles para quem a palavra poesia tem um sentido, sabe que a poesia é uma experiéncia vivida pela cexisténciaepela linguagem, experiéncia que tendeacriarosentido de todas as coisas juntas, de maneira que, a partir desse se cada coisa € mudada, aparece tal como ela & propria c na realidade do conjunto. A propésito de Delacroix, ele escreve: “Edgar Poe diz, nao sei mais onde, que resultado do épio para os sentidos & revestir a natureza inteira de um interesse sobrenatural que da a cada objeto um sentido mais profundo, mais voluntério, mais despético.” A poesia ea arte querem realizar essa lusio do épio. Cada palavra étestemunha: €a natureza inteiraque 6 transformada e, por essa razio, nos inferessa, nos importa como MAURICE BLANCHOT no sendo mais a natureza, mas a natureza superada, realizada) sua superagiio, a supernatureza, €, no entanto, esse interesse nid um movimento no vazio, estranho ao real; ao contrario, ele m remete a cada objeto que assim aparece na luz do movimento qi © supera e, longe de se perder numa subjetividade dissolvente, afirma tal como é, com o sentido despotico — teimoso, dir Sart — das coisas que sto em si mesmas e nio mudam. Esta é a verdadeira significagdo da palavra supernaturalismo, que Baudelaire fez sua e foi repetida de qualquer maneira, O supernaturalismo nao visaa uma regido acima do real, menosainda a. um mundo verdadeiro, diferente do mundo onde os homeng existem,e sim trata doreal em seu inteiro, odo omundo, quer dizer, apossibilidade de as coisas serem apresentadas umas com as outrag e cada qual em sua existéncia total, possibilidade que as muda mostrando-as como siio, presenga que ¢ a propria imaginagaio, Sabemos que papel Baudelaire atribuiu a teoria das correspon déncias, da analogia universal. Nao nos estenderemos em mostrar Papel esta, evidentemente, implicito nessa idéia da imaginagao. Sea analogiae as metéforas soos recursos essenciais do ser que imagina, é porque nas metaforas e nas imagens ele encontra ao mesmo tempo esse movimento de superagiio queo leva para outracoisa (“Para esses privilegiados—os artistas eas criangas — uma imagem representa outra coisa.” [Anos de Bruxelas] e também o sentido verdadeiro de cada objeto tal comoo faz retornar a experiéncia do todo. Certamente Baudelaire se viu bastante tentado a reconhecer nessa teoria das correspondéncias uma chave do mundo, ena analogia universal, o sinal de uma ordem superior, misteriosa, sim, mas verdadeira e definitiva. Essa tentagdo respon. de & sua necessidade” de nao sair dos Nimeros e dos Seres”; responde também ao seu gosto pelas idéias gerais e pelos proble- mas estéticos, tendéncia que se expressa pela mesma preocupagiio em racionalizar 0 abismo, torné-lo suportavel transformando-oem objeto de problema, Para Baudelaire, a imagem talvez seja uma teoria explicativa, mas primeiro € paixio. A observagio de Meu coracéo posto a nu tem uma verdade manifesta: as imagens so para ele sua grande, sua tinica, sua primitiva paixdo. E ele persegue-as, vive-as como se vive uma paixfo, porque Ihe repre- sentam 0 caminho acessivel para um fim inacessiv ‘A PARTE DO FOGO 139 Baudelaire diz ainda de Delacroix: “E o infinito no finito.” Portanto, nao basta o esforgo contraditério para o qual nosempurra ‘essa “ponta afiada que € o infinito”. Levando a0 mais alto grau a radigdo, & preciso, com esse movimento sempre inacabado, ido todo termo, todo repouso, realizar um objeto finito, lo, perfeito. Sabemos, por Baudelaire, que a irregularidade principal da beleza, mas também sabemos que o belo néo passar de uma forma harmoniosamente regrada. O belo é 0 wesperado € a espera do ritmo, algo vago e que nunca pode ser hado, algo ausente e como privado de si~e também o que ha is exato, o acorde justo de um projeto rigorosamente realiza- “A maior honra do poeta: realizar justamente o que projetou ver”). Lembrar que Baudelaire fez da frieza, do sonho de pedra, ideal cujo culto propos é lembrar apenas um dos termos da logica dos contrérios com a qual, disse ele por ocasidio de Poe, “se opera iagao”. Frieza, mas na paixo, paixfo sem limites, mas nos mites mais firmes, a maior loucura da sensibilidade afirmando- imaginagdo se anuncie, é prec extremes "quemaream esmalssidosgnios™ estar apaixonadax ‘mente enamorado da paixdo, e frie ene determinadoa buscar os le expressar a paixiio da maneira mais visivel. sea posi deta claramente paroer ax cotadiges que supde, a experiéncia de sua impossibilidade nfo poderia ser feita, € 0 tormento poético seria sem valor. Mas é na ambigitidade que a poesia se torna criagdo. E, quando nela nfo vemos nada senao dilaceramento e paixdes contraditérias, nesse momento, omomen- da maior difieuldade, descobrimos também a facilidade que concilia tudo. Assim, 0 acabado de Baudelaire, que é primeiro 0 principio de contestagao do infnito, o trabalho desesperador pelo qual osonho deve superar-se, transformar-se, a fim dese tornarreal sem, todavia, nada perder de sua espontancidade, tornar-se a certeza da palavra esr, as rears que a fixam, a ventura de uma or jorosa, tradicionalmente admitida, | ens, ‘© movimento de tensio sem fim para uma totalidade sempre inacabada aparece como um esforgo trgico, ¢ a seguir também como a benevoléncia da inspiragéo, a providéncia do sono. E 0 infinito no finito no é certamente algo facil, mas, se M40 MAURICE BLAN inal que 0 inesperado, lon, de se opor espera do ritmo, s6 ésensivel nessa espera, que 0 V se pde de acordo com a palavra mais exata, como a obscuridade: sonho, para se expressar, encontra o que pr da linguagem, de maneira que se torna ni elogiar a poesia de Edgar Poe nestes termos: 10 bem e que, se sua escolha o criago poética, é porque precisamente a criagiio podt no equivoco. Todo poeta tem em seu j pode fazer nada, mas com perder. Porém é preciso ainda ver em que condigdes. A poesia é um meio de pOr-se em perigo sem se arriscar, um -deixa lugar comodat mbremos disso, tura, ¢ na verdade esta s6 tem sentido e valor impostura da qual ele se sente cimplice. Mas, quando comegamog idade do poeta, perdemos também o direitode , de estabi da ambi ied. Enquanto se realiza vel jogo da impostura, que recusa engajar-see arriscar-se realment Nesse sentido, a ma-fé de Baudelaire, tio bem analisada por Sartre, étambém sua moralidade superior de poeta, essa moralidade que © conduz ao disfarce, do dandismo, Nesse novo subi . inda uma saida para a sua impossibilidade poética, mas ao mesmo tempo serve-se A PARTE DO FoGo MI Je para denunciar esse outro subterfiigio, satisfatorio demais, 10 no importa em sua historia, ¢ Hinguém melhor do que ele julgou o fraco alcance desse e {jue ele se encontrava junto com muitos dos seus contempordneos, que em relagio acastas s6 podia igo ndo-eserita ites de tudo a necessidade ardente de se lade, contida nos limites exteriores das conveniénci da vida moderna). Julgamento que mostra que, se ele ‘contou com essa moda para afirmar sua liberdade, niio contudo, ilusdes sobre a sinceridade desse jog! écarts de vida tiveram para Baudelaire a importincia de prova, anédina em suas caracteristicas, mas capital por seus 5, eS5eI ivre” tampouco se onsagrado artista na aparéneia e na cond parecen despr 1u gostaria que criassem um que fabricassem uma palavra destinada a macular wsagrado... Nao notaram que muitas vezes nada iga, a vida de desordem que ele levava (ou que pei sempre 0 cansavam, longe de the parecer um ideal estético admirdvel. Seria por causa do seu secreto conformismo? justamente acontece o seguinte: nessa existén essa vida de tempo perdido, ho estragado, fatal a su Iquebra, mais 0 retém pris sentir a aproximagiio do abismo onde ele teme se perder. por Ihe tornar sempre mais dificil 0 consolo da ‘convir perfeitamente e por 1a MAURICE BLANCHOT ele o colocar acima de tudo, o engajava em complacéncias pel sas para a propria ambigtiidade poética. Devemos observar qi dogma da esterilidade que o nome de Baudelaire liga ao ideal arte ¢ 0 exemplo de Baudelaire que se impoe apés sua morte, ele proprio invejava ao maximo os grandes criadores fecundosy Balzac, os Delacroix, os Gautier. Seu sonho nao era eser alguns versos eternos, mas uma obra infinitamente variada, muitos romances, pegas de teatro, uma imensa obra de homem letras. Dai tantos projetos que ele arrastava, que nfo realizava,e por qué, pouco a pouco, imagens de suas trangiilas esperangas) outrora o obcecavam como sinal do desespero a que ele nao mi escaparia, Se tivesse amado apenas o devaneio, se desde o principio, consciente de que a palavra é 0 abismo, tivesse acreditado que @ silencio est’ mais perto da autenticidade do que os mais belos poemas, ele teria novamente se safado com sua preguiga e suit impoténeia. Mas precisamente ~ e talvez gracas a sua fraqueza conformista — ele nao podia dispensar o finito; a exigéncia poética sempre Ihe foi a exigéncia de uma palavra regrada, ordenada, trabalhada, refletida, tao licida quanto possivel, eo sonho puronao conseguia jamais dissimular aos seus olhos 0 defeito que o torna possivel nem o engodo que ele representa, Lembremo-nos do Quarto duplo: “Um quarto que se parece com um devaneio, um quarto verdadeiramente espiritual.” Este quarto é i ‘Nas paredes, nenhuma abominagao art ivamente ao sonho puro, a impressio sada, a arte definida, a arte positiva € uma blasfémia udo tem a suficiente claridade e a deliciosa obscuridade da m, 0 absoluto, a suficiéncia poética: o tempo esta parado, a eternidade reina. Mas de repente, batem & porta. “Um terrivel golpe, pesado, soow... e, como nos sonhos infernais, pareceu-me receber um golpe de picaretano estémago.” © Quarto espiritual se revela entao tal como é, um pardieiro, um mundo feio, tacanho, onde a eternidade € apenas o tempo que afirma: “Eu sou a Vida, a insuportavel, a implacavel Vida... Vive, portanto, maldi- to.” Logo, 0 sonho puro ndo é mais que impureza. Seu duplo é a banalidade sempre presente que somente a ilusdo dissimula. O que importa, dira o poeta complacente, se eu mesmo me engano com [A PARTE DO FOGO 143 ernidade que néo é outra coisa sendo 0 esquecimento Hempo? Sim, mas a condigao poética o quer: assim que comega Aisfagio, o zolpe, comandando o despertar, soa, e é a propria esse golpe pesado, terrivel, ¢ que mostra 0 que é 0 ho: hipocrisia, nada.” INiio seguiremos todas as formas que esse debate assume em e: seria preciso um longo estudo. Queremos simples- Wiile marcar que a contestago, se vai nele de subterfiagios, de yiypromissos em compromissos, porque nunca para, também no ‘Wos permite denunciar esses compromissos ¢ esses subterfiigios; © ‘além disso, esse movimento, longe de ser uma maneira habil fransformar 0 desequilibrio em um recurso de equilibrio, 0 para uma queda da qual cle aprofundaa gravidade sem dela citar. il esquecé-lo: 0 escritor que deposita uma grande parte do valor poético no trabalho é também aquele que, nao conseguin- alhar, descobre uma forma de atividade, mais profunda do 1 trabalho, de onde em parte sua obra se origina ¢ da qual € tha, Temos 0 hibito de ver nele apenas 0 te6rico do finito 1 estranhamente o papel da inspiragao. E, no entanto, & claire quem declara: “Na arte, coisa pouco observada, a parte ‘ada a vontade do homem é bem menor do que se pensa.” E Baudelaire quem recomenda a escrita sem arrependimentos, rasuras, € € 0 primeiro a buscar 0 automatismo. “Nao sou idrio da rasura, ela perturba 0 espelho do pensamento. ia é necessaria, ela o € para que a .gem do sonho seja nitidamente traduzida; que ela seja muito ida, para que nada se perca da impressio extraordinéria que mpanha essa concepgio.” E sem diivida, & medida que a ossibilidade de trabalharse acentua, cle multiplica os apelos a0 ho para reencontrar sua inspiragao.“Quanto maissetrabalha, hor se trabalha e mais se quer trabalhar... Trabalhar seis dias descanso.” Mas, estando diante do trabalho como diante de outro abismo, ele deve retornar ao seu “raciocino demais” ao seu ‘comegar logo a escrever”, pelos quais ele tenta entrar em contato n a vida imediata e as revelagdes prOprias dessa vida (ver por :mplo acartaa Asselineau, em que eletranscreve tao admiravel- a4 MAURICE BLANCHOT mente um dos seus sonhos, um dos mais surrealistas vividos primeira mao) Gragas a esse mal-estar que 0 leva a solugSes igual praticaveis, igualmente fecundas, trabalho rotineiro, passivi de absoluta, ele chega a momentos desesperados cuja significt pottica é imensa. Descobre os impulsos misteriosos e desconlh dos que transportam para a ago o horror agdo. “E uma espe de energia que brota do tédio e do devaneio”, energia pela qual, di ele ainda, o homem se torna capaz.de provocar, de tentar 0 desting, de por a prova a extremidade da vida arriscanido-a e jogando com ela—experiéncia no sentido mais profundo do termo, que, em raz neo, num homem subterréneo. ve: “E preciso estar sempre embria- sade, 4 nisso: & a tinica questo”, devemos pereeber 0 cariter literdrio dessa recomendagao: embriaguez esta ai para efeito de palavras. “preciso que se embriaguem sem descanso.. de qué? De vinho, de poesia ou de virtude, & vontade.” Mas acontece que essa embriaguez, proposta de mé-fé, como uma meta superior’ poesia (de mé-fé, ja que finalmente com 0 embriaguem- se elenio faz mais do que um poema), acontece quecess ga na embriaguez,levada a0 pé da let dificil embriaguez poética, aquela que leva a obras hicidas. Nesse momento, a desgraga pode bem aparecer como o castigo que ele desejou secretamente, que desejou esperando dele se esquivar, tirar 0 corpo fora; mas, a partir do momento em que o alcanga, a partir de quando dele se aproxima, tornando-se cada dia mais ameagadora, ela também acarreta esse duplo resultado notive revalorizar a poesia da palavra, consolo que agora é apenas um eterno tormento; desacred poesia da existéncia por-Agua-abaixo, a qual Ihe seri se. Por essa razio, Foguetes, Meu coragdo posto a mu, em que Sartre vé um aglomerado de pensamentos sem novi profundidade, assumem uma inerivel importineia e se tomam, para a poesia do futuro, um sinal tragico, sobre o qual muitos espiritos irdo fixaros olhos. O que ele esereve ai? “Tanto no moral ‘A PARTE DO FOGO 14s 5 no fisico, sempre tive a sensagdo do abismo, néo apenas do Ibismo do sono, mas também do abismo da agao, do sonho, da Jombranca, do desejo, da queixa, do remorso, do belo, do niimero vei minha histeria com forgae terror. Agora sempre tenho ,em ¢ hoje, 23 de janeiro de 1862, tive uma singular advertén- i passar por mim 0 vento da asa da imbecilidade. mo vemos, Baudelaire nao fala mais aqui da palavra como Esquecimento dramatico. Na hora em que a palavra vai se Je esse vazio que, como ele reconheceu antes, vivida Vertigem, se perde na auséncia que ela contém, nesse to, pois, cle evita denuncié-la, como se quisesse guardar si esse refiigio, como se nele o poema, tornado impossivel, perasse, exigisse ser feito a partir da impossibilidade onde ele o Pois devemos esclarecer que a imbecilidade, esse mal pior {que 0 Mal, nao oferece a Baudelaire o termo em que Ihe seria radével e em suma meritério, apds tantos aborrecimentos, tampouco ela se mostra a ele, agora que esti smente & sua disposigo, como o avatar supremo ‘eligéncia poética. Em muitas épocas da sua vida, a morte, 0 dio, onada foram sua tentagao, tentagao. qual freqiientemente tava seriedade, com a qual ele brincava, de maneira que temos razio em vernisso um modo prudente de satisfazer simbolicamen- ‘aviver. Quando quis escrevera Jules Janin, 0 homem ‘Nunea teve desejo de ir embora, a0 menos para ‘Tenho sérias razdes para lamentaraquele que ‘0 ama a morte”, devemos lamenté-lo, também a ele, por nfo lenciar um desejo que ele nunca satisfaz e que s6 leva 4 carta do 30 de junho de 1845 ¢ a essa estranha confissiio: “Eu me mato oeque me creio imortal e tenho esperanga.” Confissio estranha. O ‘queesperacle? E qual éo sentido dessa imortalidade que oconvida a morrer? Certamente nada que se parega com a imortalidade de .ziosa, nada também que possa aparecer comouma lesafio feito em nome do Mal, além da ‘morte, 20 Bem, pela ittima vez insultado. ‘oisa impressionante, Baudelaire nunca teve confianga no ndo sentimento de que o horror de viver no pode ser consolado pela morte, de que nao encontra um nada que ‘o esgote, de que esse horror de existir que é 2 existéncia tem como 146 MAURICE BLANCHOT principal significagao o sentimento de que nfo se deixa de nfo se sida existncia, existimos e sempre exstiemos 0 lo por esse prdprio horror. : revelado proprio horror. © que Ihe ensina O esq Voulez-vous (d'un destin trop dur Epouvantable et clair embléme) Montrer que dans la fosse méme Le sommeil promis n'est pas stir; Qu'envers nous le Néant est traitre; Que tout, méme la Mort, nous ment, Et que sempiternellement, : Hélas! il nous faudra peut-étre Dans quelque pays inconnu Ecorcher la terre revéche Et pousser une lourde béche ‘Sous notre pied sanglant et nu? use (wn destino severe, /Apavornt lao enema) Nostaravesénacoa/Ovona rome i er: Qua nono Nad ico Que uo ate Mor, sme, Ee mptmanrte/ I es! ns ar presale Em lh pats desconhecid /Escavara terra dspeta/E empurrr pesada pi / Sob nosso pé ensangiientado e nu? = ag tmatevas eave deseobrecle? As trevas?O vazio? Oescuro? fio, e sim o sentido etemamente renascente, a partir do ser desaparecido, de 6 , de um ser ao qual o préprio desay re ui o sentido e a existéncia. _— Comme tu me plairais, 6 Nuit! sans ne paiva ces étoiles Dont la lumiére parle wi langage connu! Car je cherche le vide, et le noir, et le nu! Mais les ténébres sont elles-mémes des toiles Oivvivent,jaillssant ce mon eil par milirs Des étres disparus aux regards familiers! ‘A PARTE DO FOGO 7 Como me agradarias, 6 Noite! sem essas estrlas / Cuja luz fala uma lingua eonhecidal / Pois busco 0 vazio, 0 escuro ¢ o nul If Mas as proprias trevas sfo telas / Onde vivem, brotam do meu ofho aos Inilhares, / Seres desaparecidos aos olhares familiares! Portanto, nfo se deve contar com o nada para terminar, pois, indo entramos na existéncia, entramos numa situaglo que tem ‘o caracteristica essencial o fato de ndio se terminar com ela. O ser-para-a-morte” de Heidegger, longe de caracterizar a possibi- Wiade auténtica, s6 representaria, entéio, para Baudelaire uma postura a mais. Nao temos diante de nds a morte, ¢ sim a txisténcia, que, por mais que avancemos, esté sempre na frente €, undo que mergulhemos, esti sempre maisembaixoe, por realmente nosafirmemos (porexemplo, naarte), infesta lade de uma auséneia de realidade que é ainda a pormais = Mais pourquoi pleure-t-elle? Elle, beauté parfaite Qui metirait a ses pieds le genre humain vaincu. Quel mal mystériewx ronge son flanc athlete? ~ Elle pleure, insensé, parce que'elle a véeu! Etparce qu'elle vit! Mais ce qu'elle déplore ‘Surtout, ce qui la fait frémir jusqu'awx genowx C'est que demain, hétas! il faudra vivre encore! Demain, aprés-demain et (oujours! ~ comme nous! rfeita / Que poria aos seus pés Mas porque chora ela? Ela, beleza: suflanco de ‘ogénero humano vencido. / Quemal misterioso cor stleta? ! - Ela chora, insensato, porque viveu! /E porque vive! Mas fo que ela deplora /Sobretudo, o que a faz tremer até os joelhos,/ E {que ammanbé, ai dela! terd de viver aindal / Amanba, depois de aman e sempre! ~ como nds! ‘Assim, arte ea obra de arte (que nesses versos ¢ representada pela estitua de Christophe) afirmam, por tris da esperanga de cobreviver, o desespero de existir sem fim na dissolugdo de toda forma e de toda existéncia, a qual, sendo ainda e sempre forma e existéncia, faz continuar, além de toda a vida, a ambigtidade e a mpostura que arrastaram nossa vida. MAURICE BLANCHOT a experiéncia que torna auténtica a palavra atroz, o jaudelaire qualificou seus poemas, ¢ & ela que da importaneia a imagem, no fundo banal, do abismo. Poi que poderia ter fe oa menos tirar © pri lores, ela o eng: ai , sajou numa contestagao sem fim e no the deb nema eperangaoum epowons meron aonada Pel sill o horror de existr Ihe mostra na existéncia o que ja estéabaix morte, além de eu proprio im ena Je donada” pseudo-idéia e uma falsa esperanga. O tenho esperanca de 25 Janeio de 1845 respondea esse sentiment de que no se a exitnsiapelamors,maso enh experancarespondetanbem jovimento de esquivanga e de fuga de onde resulta 0 dogma dit imoralidade or esse dogma, ohorrde sempre se dissolve a xisténcia tomou-se a esperanca de ser sempre, ave video sr do além pr coslin (ail audelairenéose matouna tou naquele dia em que teve esper mote Ev ge a mnt enti, ge 0a ea Tce proximou-se da imbecilidade, ta ‘ ‘i , tampouco sem reconhee satisfat6rio para superar as trangqiilas facilidades razodveis, Lo perden o.uso das palavras. Sua desgrapa foi completa. Or OF aconteceu? Esse fim, podemos afirmélo com S ome ceu,emerecer querd me respond 2 ponto de vista do préprio Baul io sr. Villemain, para quem oespetaculo de um homem e desruido mum et de hospital no ps entio devemos en se acusa Baudelaire, consagr: roe da qua ole 0 responsivel, esse fin 0 desc {go sem se arissar dee escolhido cir em queda € mesmo de ter amado dears Som pdr sofia Plo menos nest onto, a posta nfo the pode ser imputad. A. mistiiayio a em verdade, e a ruina simbélica, representada ness poemas tomas bastunte real impée sun seredade 4 jaturalmente, podemos pensar qu nao desej isonet pensar que Baudelaire nfo desejou vide au wlavam sua terrivel caracteri 1 pouco importa, e,a partir do momento em que o fazemos ‘A PARTE DO FOGO 19 responsavel pelo desastre que ele nfio preparou, devemos também, hae mil decisées de mé-fé que o levaram a tatear a desgraca, reencontrar a implacdvel seriedade da tragédia final. Nko hanada fortuito numa existéncia, ‘sabemos disso, Se Baudelaire morre no eccdndalo eno dilaceramentodo seu génio devastado, éporque,em sua propria vida, ele no se contentou em tatear 0 esciindalo eo Sofrimento ao longo de excessos gratuitos ou simbélicos, neles ‘aeeitando engajar-se a fundo, pelo menos por um dia, pelo menos por um gesto "Assim decidiu a verdade poética. O desmoronamento de Baudelaire, sua luta dos tltimos meses com as palavras que 0 tnganavam, todo esse desespero que millares de doentesatacados do mesmo mal compartilharam com ele sem comover a historia teriria, parece o termo herdico da contestago em que se unem, durante alguns instantes, 0 tudo é abismo da palavra € os poemas ‘seguros, calmos e belos que a levaram; sacrificio final pelo qual o poeta, sem o saber, é levado a se perder para realizar ¢ tomar presente a poesia sempre por vir, sempre por set Feit Eo mais estranho acontece entdo: as obras escritas ao abrigo desse drama, que ndo participam nem da sua gravidade nem dasua seriedade, que so notaveis pelo artificio ou seguranga formal, tudo o que ele escreveu, sonhou em eserever, faltou escrever, tudo o que ele fez, suas concessdes ao mundo, suas revoltas de timido, suas tristes metas académicas, tudo isso é transformado: pela tragédia do diltimo momento e reeebe dela o sentido de um destino realizado, porque nao Ihe faltou a contestagio do fim. S justo? Estando ¢a questo. Agora que Baudelaire esta morto na, glériada vergonha final, seus minimos papéis, os minimos atos de sua vida, Mao iluminados por uma nova luz que os transforma, e cada um de nos aprende a lé-los ‘as avessas, a decifra-los por tras do siléncio que o desaparecimento definitivo estendeu sobre eles. Dessa maneira, 0 fracasso yerdadeiro da wltima hora reflui sobre toda uma vida, que foi talvez ment sa, transformando-a em vida poeticamente verdadeira. E através desse fracasso que @ “mbigtiidade de uma existéncia que poderia tomar nomes degra- dantes se declara como experiéncia bem-sucedida porque levada fté o fim, em que mesmo as fraquezas tém seu valor, em que & ‘eneontra seu Iigar nas traides ¢ infidelidades. Doravante, ; representam tal J ‘entreviu e temeu, Nesse ponto, se ei responsivel pelo fracasso de sua vida, também cea sivel elo sucesso d vida. Um ae sobrevida. Um homem que quis ser grande sd. tudo o que Ihe faltou para perma O SONO DE RIMBAUD ‘As Obras completas de Rimbaud, publicadas na Coleyao da Piéiade, dio-nos toda a satisfagdio que podemos esperar dese género de edigao, Durante muito tempo essas obras, tio poucas, foram maltratadas tanto pelos editores quanto por seu autor. Hipocrisia, zelo intempestivo, facécia contribuiram para torné-las duvidosas. No ental alguns anos, trabalhos do sr. de Bouillane de Lacoste, os mais belos textos se tornaram exatos. O st. Rolland de Renéville—com 0 st. Mouquet w continuiot esse trabalho de retificagio. As Obras completas nos dao uma melhor verso das Iluminacdes. Consagram a aut dade do Album ziitico (enriquecido por dois inéditos, O co embriagado e Oanjinho maldito), que era considerada discutivel ‘Atribuem também definitivamente a Rimbaud Um coragdo sob a 10s por André Breton e Louis Aragon. yetos das Stupra. Finalmente reiinem pela primeira vez 0 maior nimero de cartas numa versio corrigida fe completa. Todos esses textos so esclarecidos enas faltam as interpretagdes e comen de da edi¢a0, itores observam que os mal- centendidos doutor Jean Fretet, muitas vezes bet mente, nfio parece capaz de diminuir esses mal-entendi- nenhum inconveniente em dar histo- aud uma interpretacdo psicopatolgica. em interpretar; quer explicar.

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