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Aprender a inovar: primeiro busca-se o equilíbrio, depois

se quer voar

O atual cenário em que as empresas atuam, onde a competitividade e a


concorrência dão a tônica, acaba tornando difícil a sobrevivência de um grande
número de empresas. Pesquisas do SEBRAE mostram que cerca de 56% das
empresas fecham suas portas antes de completarem três anos de idade. Uma das
formas da empresa assegurar sua sobrevivência ao longo de tempo é escolher
intencionalmente atividades diferentes daquelas praticadas pela concorrência, ou
ainda praticar as mesmas atividades mas com outros procedimentos ou técnicas.
Daí advém a necessidade de inovar.

O presente artigo tem como objetivo discutir o processo de incorporação da


inovação nas empresas, o qual foi dividido em quatro etapas:
mobilização/conscientização, descobertas, arquitetura e institucionalização. Para
tanto, será utilizada ao longo do trabalho uma metáfora, comparando-se o
processo de incorporação da inovação com o processo de evolução de um ciclista.

MOBILIZAÇÃO/CONSCIENTIZAÇÃO: APRENDENDO A PEDALAR

Imaginemos que nos foi proposta a tarefa de ensinar uma criança a andar de
bicicleta. Poderíamos iniciar o aprendizado mostrando à criança como funciona
uma bicicleta: poderíamos desmontá-la e montá-la, explicar peça por peça, depois
mostrar um vídeo de como aprender a se equilibrar nela, quando se deve acionar
o freio e assim por diante. Com certeza nossa tarefa resultaria em um grande
fracasso. Não é à toa que não vem manual nas caixas das bicicletas! Agora,
vamos nos lembrar de quando os pais ajudam seus filhos nos primeiros
movimentos de dominar aquele troço de duas rodas. As “rodinhas adicionais” às
duas rodas maiores ajudam, mas tanto o pai quanto o filho sabem que um dia elas
serão retiradas. Tudo funciona na base da tentativa e erro. Na prática!

Com a inovação ocorre o mesmo: primeiro se pedada, depois cai, depois levanta,
depois começa de novo. A inovação requer a prática, muita prática. Os pais põem
a mão no banco de trás para ajudar o filho a se equilibrar e o filho acredita nisso.
Ele acredita que pode ir em frente porque alguém que ele confia está com ele. E
isso ocorre até o momento que os pais percebem que o filho ganhou confiança e
pode seguir por sua própria conta. Então o pai continua próximo, correndo ao lado
do menino e de sua bicicleta,às vezes até dizendo que está segurando o banco,
quando não está mais. E não está porque de repente pai e filho perceberam que
um não precisa mais do outro. O aprendizado foi incorporado.

O que de fato esta em jogo nessa pequena história são duas palavras singelas e
ao mesmo tempo complexas – autoconfiança e segurança. Um exemplo real de
empresa que criou um sistema de proteção para liberar a criatividade de seus
funcionários é o da Brasillata. Conforme explica Antonio Carlos Teixeira,
superintendente da Brasilata, “um trapezista só vai se arriscar a dar um salto
inédito se contar com uma rede de segurança. O que fazemos é estender uma
enorme rede embaixo dos funcionários, dizendo que ninguém vai ser punido por
um erro bem intencionado. A partir daí, liberamos a imaginação das pessoas”.

Profissionais experientes, jovens recém-formados, executivos lapidados em


cursos de gurus mundiais, gente de planejamento, finanças e produção estão
descobrindo as possibilidades de aumentar o desempenho de sua área e da
companhia, assumindo, cada qual e à sua maneira, a capacidade de transformar o
conhecimento em prática gerencial que crie algum tipo de valor ao cliente final.

Alguns líderes se apressam para equipar seus times a dominarem a inovação,


promovendo movimentos de conscientização e mobilização em torno do tema. A
Embrapa criou uma gincana envolvendo seus dois mil pesquisadores espalhados
pelo Brasil, os quais tinham que responder questões para receber prêmios. “Tudo
estava relacionado com o Plano Diretor da empresa. Isso teve um impacto
impressionante, porque todo mundo estudou, todo mundo leu o Plano Diretor, todo
mundo sabia aquilo “na ponta da língua”, então o conceito de missão, de visão, de
valores, de negócios, de mercado e as políticas foram incorporados, todo mundo
colocou aquilo na cabeça de uma maneira muito fácil. Acho que foi o exercício
mais interessante que nós fizemos”, explica o presidente da Embrapa Alberto
Duque Portugal.

DESCOBERTAS: ESCOLHER UMA DIREÇÃO PARA PEDALAR

Imaginemos agora que a nossa criança dos parágrafos anteriores já aprendeu a


pedalar e agora é um adolescente. Provavelmente o adolescente vai querer
começar a sair em grupo, pedalar com os amigos, começar a praticar alguns
esportes radicais em cima da bike, etc. etc. O que fazer (ou pra onde ir) depois
que se aprende a pedalar?

A pergunta requer uma escolha da liderança: aonde se quer estar? Quais os


mercados aonde se quer competir? Que clientes buscar? Com quais
competências atendê-los? As capacidades existem ou terão de ser formadas,
desenvolvidas ou adquiridas?

A jornada da inovação dentro das empresas precisa de foco e de metas claras, ou


seja, as regras do jogo têm que chegar aos ouvidos de todos que vão junto nessa
caminhada. A comunicação e os feedbacks devem ser constantes. É mais ou
menos como reunir seu time para um passeio de fim de semana, em grupo. Antes
de partir é preciso definir pra onde ir, qual o roteiro, se há mapa pra todos, o que
fazer se alguém se perder, se algum equipamento quebrar, se chover...
Esse é o lado racional e disciplinado da inovação. Funcionários tornam-se
consultores internos , auxiliados ou não por especialistas externos, atuam com
coaching, mentoring e facilitação, permitindo a todos os colaboradores
desenvolver capacidades e alcançar autonomia ao fim de um projeto. Esse lado
racional, formal, que tem processo, fluxo, gargalos, funil, precisa de método.

A Multibras, empresa do grupo Whirpool, criou um roadmap de inovação para


gerenciar o fluxo de idéias de seus funcionários. Definiu fatores para verificar
quais idéias deveriam se tornar iniciativas comerciais e quais não iriam adiante.
Elaborou cenários para entender os condicionantes do mercado. Estudou métodos
de produção mais econômicos, no Brasil e exterior, enfim ela planejou suas
inovações em todo o ciclo de desenvolvimento de produto ou serviço, que alcança
desde a concepção da idéia bruta até sua comercialização e satisfação de quem
será seu consumidor.

A idéia, nesta etapa, é aproveitar o engajamento dos funcionários na fase de


mobilização para instrumentalizá-los. Ter o domínio sobre o processo de cada
iniciativa de inovação da empresa é uma obrigação, não apenas um ato desejável.
Como é impossível prever quando e de quem uma idéia revolucionária vai nascer,
ajusta-se o foco, dá- se uma direção (produto, processo, gestão, conceito ) e
libera-se a criatividade.

O curioso desse processo é que uma vez vivenciado ele pode ser repetido por
vários outros grupos, em várias situações, datas e lugares. O interessante é que
cada ator passa a adaptar uma forma de inovar que melhor se encaixa às suas
condições. O pessoal de tecnologia cria um e-group, o da manufatura reserva uma
hora todas as sextas-feiras e vai para um bar, os cientistas criam fóruns de
discussões e convidam especialistas para ouvir vozes de fora do problema...

ARQUITETURA: DE APRENDIZ PARA CICLISTA

Ao se aperfeiçoar na arte de pedalar descobre-se que algumas atividades podem


ser realizadas com menos esforço. É fato: quanto mais se domina o equipamento,
menos energia desnecessária se gasta. Já imaginou você subindo uma ladeira
sem saber qual a melhor marcha que a bicicleta oferece para esse esforço? Com
a ótica da inovação impregnada por toda a empresa, amparada por instrumentos
que os funcionários dominam fica mais fácil ir sofisticando as ferramentas.
Ciclistas não compram bicicletas em lojas. Eles montam aquelas que melhor se
adaptam ao seu corpo, à sua musculatura, ao seu desempenho, em resumo, o
equipamento é que serve o atleta e não o inverso.

As empresas têm procurado transferir conhecimentos para seus funcionários em


um processo de aprendizagem, aonde todos possam se envolver intensamente
em projetos desde sua preparação até os resultados. Alinhar estrutura, conhecer
recursos, integrar iniciativas de baixo pra cima e de cima pra baixo na hierarquia
das empresas ainda parecem ser os maiores obstáculos que muitos líderes
enfrentam. Fazer várias áreas da empresas trabalharem juntas é muito difícil!

Pesquisa realizada com diretores de RH, realizada pelas consultorias Pieracciani e


Panelli Motta Cabrera Amrop Hever, apontou que a sistematização do processo de
gestão da inovação ainda é o maior desafio a ser vencido. Na opinião de Ilenor
Zingler, executivo do Banco do Brasil, “a inovação é hoje uma das variáveis
determinantes da competitividade da empresa. É necessário ter um ambiente para
se discutir a questão da inovação, não apenas com um enfoque teórico, mas
principalmente sob o enfoque prático, analisando e diagnosticando casos e
práticas de sucesso. O grande desafio que se coloca é poder antever uma forma
de gerir processos de inovação, que acontece hoje de forma isolada em muitas
empresas sem que haja uma continuidade”.

Empresas somente asseguram uma vantagem competitiva de longo prazo se


definirem um posicionamento de mercado distinto e coordenarem seus processos
de negócio e suas estratégias. Segundo Michael Porter, renomado professor de
Harvard, o posicionamento estratégico não ocorre até que uma empresa escolha
intencionalmente atividades diferentes daquelas praticadas pela concorrência, ou
ainda pratique as mesmas atividades mas com outros procedimentos ou técnicas.
Daí advém a necessidade de inovar.

Nesse contexto, desenvolver métricas e indicadores de inovação é outro desafio


que auxilia as empresas na arquitetura de seu sistema de inovação. Nesse ponto,
uma proposição interessante seria a incorporação da perspectiva da INOVAÇÃO
na famosa ferramenta criada por Norton e Kaplan, o Balanced Scorecard. O
conceito de Balanced Scorecard divide a estratégia da empresa em processos
operacionais de negócio e permite que ela seja executável por toda a organização.
O Balanced Scorecard provê uma plataforma para que se aloque os recursos da
empresa de acordo com suas estratégias. Ele permite atribuir pessoas
responsáveis para cada objetivo.

As perspectivas tradicionais do Balance Scorecard cobrem a essência empresarial


tradicional: Clientes, Processos, Aprendizado e Finanças. Contudo há outra
perspectiva que diz respeito à capacidade de empreender das organizações, e
que neste século deverá ser um elemento chave de transformação e mesmo de
sobrevivência. A capacidade de empreender, de criar novos negócios, novos
produtos, novos processos, novas tecnologias e novas maneiras de gestão está
intrinsecamente relacionada à capacidade de inovar.

A Inovação como perspectiva atua como uma lente pela qual passa a se executar
e mesmo a definir estratégias e objetivos de maneira diferenciada da
concorrência, conquistando vantagem competitiva. Gary Hamel propôs ver a
Inovação como uma capacidade, uma habilidade sistematizável que as empresas
podem desenvolver e implantar. Pois bem, um dos maiores desafios para
implantar inovação é fazê-lo de forma estruturada e integrada com as atividades
da empresa. As estratégias de inovação devem ‘conversar’ com as outras
estratégias da empresa, numa relação de causa e efeito. De acordo com o
conceito defendido pela 3M, inovar é agir por resultados.

Não raro se encontra inovação associada à perspectiva de aprendizado e


crescimento. A inovação em um sentido mais amplo, o de capacidade de criar
nova riqueza a partir de mudanças na empresa, no setor e na sociedade, não é
coberta pela perspectiva de processos internos, somente. O processo de pesquisa
e desenvolvimento é um dos meios para se atingir a inovação, mas não é o único.
E a inovação, neste sentido mais geral, não é apenas um processo interno. Na
verdade, a inovação é cada vez menos um processo interno e mais externo à
empresa. A inovação está cada vez mais apoiada na cadeia de valor, no
relacionamento com clientes, fornecedores, parceiros e com a sociedade.

Gary Hamel e C.K. Prahalad, no livro “Competindo pelo Futuro”, defendem a


criação de uma arquitetura estratégica para guiar a empresa no caminho do futuro.
Além da arquitetura estratégica, entretanto, as empresas precisam de uma “cola”
que faça essa arquitetura se materializar nas ações cotidianas. As premissas do
Balance Scorecard podem ser usadas para esse fim.

INSTITUCIONALIZAÇÃO: COMPETIR TORNA-SE UM HÁBITO E A BUSCA


PELA EXCELÊNCIA UM DESAFIO CONSTANTE

Há um momento em que o ciclista deixa de competir com os outros e passa a


competir com ele próprio. O que está jogo é a superação dos seus próprios limites.
Até onde ele pode inovar para atingir esses propósitos? Tornar a inovação um
processo institucionalizado é ser capaz de inovar continuamente. É um dos
maiores desafios enfrentados por empresas de todos os setores da economia.

A capacidade de inovar envolve três fatores básicos:

• Estratégia - pensamento estratégico e competências essenciais

• Processos - fluxos de geração e gestão de idéias e oportunidades

• Cultura e Clima Organizacional - práticas de gestão e habilidades


organizacionais e pessoais

Tais fatores precisam estar alinhados para produzir resultados – desde inovações
incrementais em uma linha de produtos e serviços até inovações que modifiquem
o modelo de negócio da empresa. Chegar a esse processo institucionalizado é um
caminho longo e seguramente difícil. Inovar mexe com a inércia organizacional,
mexe com status, poder, pessoas, cargos e estruturas. Inovação incomoda muita
gente, mas os resultados aparecem e, esteja certo, são compensadores!

Para florescer no mercado da imaginação humana as empresas devem ter em


mente uma forte convicção: aprender a inovar requer prática com disciplina para
orquestrar o desenvolvimento de habilidades de inovação em pessoas e equipes;
a preparação de times para a geração, desenvolvimento e implantação de novas
idéias; o desenho e implementação de processos de inovação; a formulação e
implementação de estratégias para desenvolvimento de novos produtos e
negócios; a elaboração de planos para alavancagem de iniciativas existentes; a
identificação de novas oportunidades de negócio em setores maduros e
alinhamento estratégico e operacional para o ingresso em setores emergentes.

Não espere o amanhã chegar, aprenda a pedalar hoje, inove. Quando o futuro
chegar, os ciclistas sairão na frente.

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