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38 ALQUIMIA, PRECURSORA DA QU{MICA NAGIB CHAIB Fundacéo Bratileia para @ Dasenvolvimanto do Entino de Cincias FUNBEC Instituto Brasileiro de Educaedo, Cidncia @ Cultura iwece Sabemos por papiros, inscrigBes e pecas arqueolégicas, que os caldeus, babilénios sumerianos e, principalmente, os antigos eg{pcios conheclam metais, ligas metélicas, cerémica, vidro, corantes e muitas operacées quimicas. Entretanto, tais conhecimentos estavam situados ao nvel pura- mente técnico; atendiam a necessidades imediatas de construco de uten- sflios, armas @ objetos art(sticos, nfo tendo conduzido aqueles povos & pesquisa cientifica. A. fusio desses conhecimentos préticos com 0 pensamento m{stico oriental e @ especulacdo filoséfica dos gregos, particularmente a de Aristételes, deu origem a uma atividade nova, com caracteristicas muito peculiares, que velo a ser conhecida como Alquimia. Em geral, 6 pelos historiadores que Alexandria, situada no delta do Nilo, Egito, foi o bergo da Alquimia, nos primeiros séculos depois de Cristo. ‘A palavra chemeia (kemela ou Khymeia) epa- feceu_num édito do Imperador Diocleciano, em 296 D.C., no qual se ordenava fossem queimados, em Alexandria, todos os livros egipcios que tratas- sem de “chemeia”. Nesse édito, 2 palavra é usede para designar a arte de “fazer” — possivelmente imitar — ouro e prata. Entretanto 2 palavre che- meia, de origem copta, ‘designer 0 Egito e significave “pats “A forma chemia, mencionads pelo por volta do ano 100 tarde 0 artigo érabe al, mia; com esta forma, foi ra ver no Tratedo de Astrolegle de J. Firms, no século IV denossaera A antiga tradicSo egipcia atribula 2 origem de todos os conhecimentos, inclusive os conhecimen- 10s préticos que deram origem & Alquimia, 20 deus Thoth. Os autores de Alexandria atribulem as ori- gens da arte da chemela ou }2.um lendério personagem, Hermes reverenciado como a fonte de = © nome Hermes referéncias @ assuntos térios, fechados © mantinha 0 segredo” A Alquimia nhecimentos Por exigir co aproximave-se cientifica, como 8 tas ou, pelo cao de metais mercirio) em constituiam etapas aperfeicoamento a imortalidade. ‘Representagio do lendério Hermes de Trimegisto, fundedor da Alquimie Eglocia. 0 quadro resume os princ{pios das transformapbes quimicas: 0 Sol é 0 pai e » Lue, a mée, sendo Terra, a nutriz. dissolugo, filtracdo, fustio, calcinaggo, cristalize- G0, sublimac&o, etc. Descreviam também diferen- tes processos de aquecimento: o aquecimento dire- to a0 fogo, por meio de chamas de dleo; e o aque- cimento indireto, por banho-maria e banho de areia. A ALQUIMIA ARABE Por volta do ano 640 D.C., alguns anos apés @ morte do profeta Maomé, os drabes iniciaram sua expansio pela Asia, norte da Africa e Europa. Foi do Egito que absorveram a erudicdo grega ¢ os conhecimentos sobre Alquimia, incorporando-hes informagbes provenientes da Mesopotamia, da In- dia e da China. Ao atingirem, no século VII! D. a Peninsula Ibérica, transformaram Cérdova, na atual Espanha, no mais importante centro da civi- lizago mugulmena da Europa. 39 Na Espanha érabe, que se tornou conhecida como al-Andalus, nasceram e viveram, nos anos @ séculos seguintes, grandes médicos, gedgrafos, astronomos, mateméticos, artesos e alquimistas de ascendéncia frabe. Estes nfo s6 divulgaram a Alquimia como a desenvolveram, inventando ‘novos aperelhos quimicos e imprimindo-Ihe novos rumos. Entretanto, dentre os alquimistas que mais se destacaram, alguns nasceram e viveram na propria Asia, como Jabir ibn Hayyan Al-Azdi (720-817 D.C.) e Muhammad ibn Zekariya Al-Razi (865- 925 D.C). Jabir ibn Hayyan Al-Azdi ou, simplesmente, ibn Hayyan, natural de Kufa, a oeste do Rio Eufrates, atual territério do Iraque, viveu em Bagdé, durante 0 califado de Harum al-Raxid. A existéncia de Jabir ibn Hayyan foi, durante séculos, posta em davida por muitos historiadores da Qufmica, mas a tendéncia moderna é admiti- -la como incontestével, pois, na cidade de Kuta, ‘onde nasceu, foi descoberto 0 laboratério que Ihe pertencia. Como outros alquimistas, Jabir sofreu influén- cia de Aristételes, tendo elaborado uma teoria so- bre a origem e constitui¢go dos metais, baseada na iii ‘CONGUESTAS MUGULMANAS NO TEMPO DE MAcM mero ss.Amico 40 presenga do enxofre e do merciirio. De fato, Aris- tOteles admitia que os metais eram compostos de mercirio e enxofre, formando-se a partir deles 1o interior da Terra. Merece especial destaque @ importincia que es- te alquimista deu 20 método experimental. E ele quem nos diz: “O primeiro passo essencial na Al- quimia consiste em realizar © trabalho pritico e conduzir os experimentos; porque aquele que no realiza trabalhos préticos nem faz experiéncias jamais atingiré 0 menor grau de conhecimento. Mas voo8, 6 meu filho, faca as experiéncias para poder adquirir 0 conhecimento”. (*) (*) = Extreido de: MATHIAS, Simla, “O Alquimists Jabir ion ‘Hayyan ~ Um Poronagem sind Mirena” Circle @ eutture, vel 29 (10) 1977. ‘Al-Razi (Rhazes, para os latinos), originério de Pérsia, atual 1rd, mais célebre como médico do que como alquimista, desenvolveu seus trabalhos de alquimia na mesma linha de preocupacdo com © rigor experimental, tendo desenvolvido métodos @ técnicas que podemos considerar como funda- mentos da Quimica moderna, Dividia os minerais em seis classes: (1) Corpos (os metais); (2) Esp/ri- tos (enxofre, arsénico, merctrrio e sal amon‘aco); (3) Pedras (marcassita, magnésia, etc); (4) Vitr/olos (4cido sulférico, sulfato de s6dio, etc.); (5) Bére- ces (bérax, nétron ou soda, cinza vegetal); (6) Sais {sal comum, potessa, ‘sal de ovos"’ — provavelmen- te 0 salitre usado na China em fogos de artificio). 4 Dentre as indmeras obras de Rhazes, hé 23 li- vros de Alquimia que nos foram transmitidos por um dos maiores sSbios do Oriente, Abu al Rayhan Muhammad ibn Ahmad Al-Biruni (973-1048 D.C.) que viveu na regio correspondente aos atuais Ir, Usbesquistio, Afeganistéo, Paquistéo e norte da India. Al-Biruni acumulou um conjunto impressionante de conhecimentos — foi fisico, astronomo, matemético, botanico, gedgrafo, gedlo- 90, historiador, filésofo, lingdista e criador da Farmacopéia. Na histéria da Alguimia, deve ser citado como um dos que n&o acreditavam na trans- mutago dos metais, 0 que ngo 0 impedia de ser tolerante para com os que se dedicavam a esse tipo de atividade. Na mesma regio e na mesma época, viveu outro grande sébio, Abu Ali al-Husayn Ibn Sine (980-1036 .C.), conhecido na Europa como Avicena, que se destacou sobretudo como médico, fil6sofo © tedlogo, mas se interessou também pela Alquimia. Escreveu um tratedo de Alquimia e Mineralogia onde afirma ser imposs(vel admitir Cientificamente a transmutacéo dos meteis. Essa foi citada em trabalhos do século XIII e posteriores, mesmo pelos que acreditavam naquela possibilidade. ‘A ALQUIMIA NA EUROPA A influéncia do IsI& sobre al-Andalus irradiou- -se para outros pafses da Europa, mediante tradu- ‘Ges latinas e espanholas de obras érabes, no s6 de Alquimia mas também de outros campos do saber. Dentre os alquimistas europeus, so referidos abaixo alguns dos mais importantes. Muitos deles pertenciam & Igreja que, nessa época, aceitava e estimulava os trabalhos nesse campo. Alberto Magno (1193-1280), natural da Bavie- ra, tornou-se dominicano e, depois, bispo de Ratisbona, também na Baviera, na atual Alemenha ‘Ocidental. Com 0 consentimento do Papa, renun- cciou a seu cargo para dedicar-se &s préticas e estu- dos de Alquimia. Descobriu muitas fraudes e con- tradigdes dos alquimistas. Sofreu grande influéncia das obras de Avicena. Outro fervoroso alquimista, também influen- ciado por Avicena, foi Roger Bacon (1214-1292 D.C.), Franciscano, estudou em Oxford e lecionou na Universidade de Paris. Dividiu a Alquimia em especulativa, voltada para a formacdo das coisas, a partir dos elementos, dos metals, sais, etc.; e ope- rativa, que se ocupava em como obter as coisas artificialmente, assim como 0 ouro, drogas, etc. 42 Bacon afirmou, muito antes de Peracelso, que a Medicina poderia utilizar medicementos forneci- dos pela Quimica, e sugeriu que esta era uma Ciéncia intermediéria entre a Fisica Aristotélica ea Biologia. Arnaldo Villanova (1240-1311 D.C.), médico € alquimista, nasceu em Veléncia, Espanha. Foi também um tradutor do érabe e exerceu influ- Encia sobre os médicos e alquimistas dos séculos seguintes. Raimundo Lilio (1232-1316 D.C.), nascido em Palma de Msiorca, Espenha, cultivou Teologia, Filosofia, Literatura, Matemética, Fisica, Alquimia € se especializou no érabe, I{ngua em que traduzia eescrevia, z F Apsreihos utilizados pelos slquimistas, segundo desenhos ‘que constam de manuscritos gregos de Zézimo e outros ‘autores. Os menuscritos encontrenrse na Bibliothaque ‘Nationale, Paris. A. B. Ce F sto aparelhos de destilapSo, chamados, mais tarde, alambiques. Alguns eram de cobre (C). Eram, fre- ‘quentemente, aquecidos com lamparinas a 6le0 o, &s ves, em banho de areia (F). Dé um braseiro e E, um aparelho ‘para aquecer redoma em banho de aria. (Reproduzide de A Short History of Chemistry de J.R. Partington — 22. edigio — 1948 — McMillan and ‘Limited — London). utilizado co 0s alqui foram os 0s prim6 em dispositivo adequado, o metal se funde, mese e se transforma num p6 amarelo — 2 cinza de chumbo ou chumibo defiogisticado. O problema, entéo, era 0 seguinte: se se adicionasse a0 chumbo deflogisticado uma substéncia rica em flog/stico, ‘como 0 carvo vegetal, dever-se-ia esperar, 30 aque- clo, 0 desaparecimento da cor amarela, da cinza @ a obtencéo, de novo, do chumbo metélico. Realmente, era o que se observava. Embora exata na aparncia, a interpretapdo é totalmente falsa quanto a0 flog/stico. O oxigénio ainda néo havia sido descoberto e n&o ocorreu aos alquimistas possibilidade de intervencao do ‘ar na queima ou calcinacgo de materiais. Os alquimistas sabiam que, 20 se calcinar um p6 metélico exposto a0 ar, seu peso aumen- tava. Este fato no era também explicado pela intervenc8o do ar, mas pela afirmac&o de que o flog(stico tendia a provocar a ascensio das subs- téncias que o encerravam e, uma vez libertado, ‘© peso do material aumentava. © que realmente ocorre, como saberos, é que 0 chumbo, aquecido ao ar, se transforma em 6xido amarelo de chumbo, resultante da com! ago do metal com o oxigénio do ar. Juntando-se carvéo vegetal 20 dxido, este & reduzido, isto 6, (© carvo combine-se com 0 oxiggnio do éxido ‘amarelo, libertando o chumbo metélico. Neste ponto.é interessante tecer algumas consi- deracies finais. A Alquimia, embora no tivesse sido uma cién- cia_verdadeira, nos legou 0 conhecimento de muitas substincies — alcool, éter, écido nitrico, &ido sulfirico, agua-régia (mistura de Acido nitrico e écido clorfdrico), sais minerais, alGmen OU pedreume, além de muitas técnicas experi mentais, usadas pelos quimicos até hoje. Conhecimentos de Alquimia foram aplicados & Medicina, originando a latroqu/mica ou Quimia- tria, que, séculos mais tarde, reformulada, j4 com base na Quimica cient/fica, proporcionou o surgi- mento da quimioterapie com compostos naturais sintéticos. Muitos alquimistas ecabaram se convencendo da impossibilidade da transmutargo dos metais em ouro pelos meios qu/micos comuns. Diversas trans- mutages aparentes nada mais eram que mudancas de cor de alguns metais, causadas por reagdes qui- micas posteriormente estudadas. Em outros casos, constatou-se que a presenca de pequenas. quan- tidades de ouro ou prata ndo se devia & transmuta- ‘go, mas & presenca de impurezes nos minerais utilizados — impurezas liberadas durante os proces- 808 @ que eram submetidos os mineral Outros enganos cometidos pelos alquimistas tornaram-se férteis, porque, a0 serem verificados experimentalmente pelos cientistas posteriores, descortinaram horizontes, isto 6, levaram a novos conhecimentos ou teorias, como, por exemplo, a da combustdo e calcinagfo, de Lavoisier. € freqiiente, no sé em Quimica, mas também em outras ciéncias, que uma afirmativa ou teoria in- correta venha a servir de motivacdo para outras Pesquisas, que, por sua vez, revelam fatos novos, 08 quais invalidam total ou parcialmente a teoria antiga, fazendo surgir uma nova. € 0 caso da hip6- tese de Henri Poincaré (1854-1912) sobre a produ- 43 4a,de raios X por todo material fluorescente. Ao procurar a confirmacao experimental da hip6- tese, Becquerel constatou ser ela incorreta e chegou a descoberta da radioati As técnicas alquimistas contribufram para o nascimento de uma nova atividade experimental, @ Quimica como Ciéncia. “A técnica precede a Ciéncia e a Arte", afirmara Goethe. E comum esse fato nas Ciéncias Fisicas e Naturals, onde a técnica proporciona descobertas no campo das Ciéncias Puras. Estas, por sua vez, como se obser- va principalmente nos tempos modernos, do nascimento a novas técnicas mais sofisticadas que retornam com sua aparelhagem complexa ‘em auxilio das Ciéncias Puras e de outras aplica- es, revertendo em bem-estar social, conforto, satide, seguranca e, também, infelizmente, na destruigéo do homem e de seu meio-ambiente Finalmente, pode-se afirmar, de acordo com muitos historiadores da Ciéncia, que a juncao do reciocinio grego, com a técnica e a erudicgo Srabes, somados 8 comprovaco experimental dos fatos pelos europeus, deu origem & Quimica cient/fica. O) % OURO PRATA—_ESTANHO 5 7 QO MERCURIO FERRO See coBRE (Os sete metais conhecidos desde » Antiguidade, com os ‘sfmbolos usados na Idede Média. BIBLIOGRAFIA 1). CHOPIN, Gregory R. e JAFFE, Bernard ~ Quimica, clencla de la materia, la energia y el cambio. Trad. Dr. Xorie A. Dominguez. México, Publicaciones Cultural, 1967, 2a.ed. 2) FARBER. 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Getilio Vargas, ago 1974. 11) UNESCO — 0 Correio. Ed. brasileira, a8, n? 12, Rio de Janeiro, Fund. Getilio Vargas, dez. 1980. 12) MATHIAS, Simo — "“O Alquimista Jabir Ibn Hayan — ‘Um personagem ainda misterioso’. Separata, Revis- ta Cidneia e Cultura, vol. 29 (10), 1977, p. 1117-20. ACONTECEU NA ESCOLA RURAL Ele tinha série da escola rural. E que, & tarde, ambos iam a aula de japonés. Na escola ruré rofessora Celina. Um dia, a professore, de costas para a classe, escrevendo na assistia as aulas d ousa, ouviu sua vozinha: — Cerinal = Ahnt Lucinda Campbell ‘anos. Todos os dias, pela manh8, acompanhava o irméo que frequentava a 12 sempre atento, 0 pequeno — Quadro-negro, giz branco, né? Papel branco, lépis preto! Deste fato que me ANALOGIA Quadro-negro, Giz-branco. Papel branco, Lapis preto.. Aluno arco-fris contado, fiz um poema: re a a aera re

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