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Resumo: Pesquisas têm mostrado que os professores não recebem preparo inicial suficiente nas
instituições formadoras para enfrentar os problemas cotidianos da sala de aula. É preciso que os cursos
se organizem de forma a possibilitar aos docentes superar o modelo de racionalidade técnica para lhes
assegurar a base reflexiva na sua formação e atuação profissional. O presente estudo teve por
objetivos: investigar o papel da “prática como componente curricular” e do “estágio supervisionado”,
no processo de formação, e analisar algumas experiências que contemplam essa dimensão no processo
formativo.
Palavras-chaves: formação de professores; prática e estágio; curso de licenciatura.
INTRODUÇÃO
No momento atual de valorização da educação no Brasil, a formação de
professores tem sido apontada como um dos principais elementos, no sentido de intervir na
qualidade do ensino ministrado nos sistemas educativos, no âmbito nacional, estadual ou
municipal.
Pesquisas recentes têm mostrado que os professores não estão recebendo
preparo inicial suficiente nas instituições formadoras para enfrentar os problemas encontrados
no cotidiano da sala de aula. Os programas de ensino das diferentes disciplinas dos cursos de
licenciatura estão, de um modo geral, sendo trabalhados de forma independente da prática e
da realidade das escolas, caracterizando-se por uma visão burocrática, acrítica, baseadas no
modelo da racionalidade técnica. É preciso que os cursos de formação de professores se
organizem de forma a possibilitar aos docentes, antes de tudo, superar o modelo de
racionalidade técnica para lhes assegurar a base reflexiva na sua formação e atuação
profissional.
O presente estudo teve por objetivo investigar o papel da “prática como
componente curricular” e do “estágio supervisionado” no processo de formação dos docentes,
segundo os preceitos da legislação atual, como também algumas experiências que
contemplam essa dimensão da prática e do estágio no curso de formação de professores.
Os caminhos metodológicos percorridos pelo presente estudo possuem
características de cunho qualitativo, baseando-se essencialmente em estudos bibliográficos e,
também, a coleta de dados por meio de análise da legislação educacional, de documentos e de
entrevistas realizadas. É importante salientar que este trabalho não pretende esgotar o tema,
mas apontar alguns aspectos que provoquem a discussão em torno da importância e da
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Vários estudos têm mostrado que os profissionais não estão sendo formados
e nem recebendo preparo suficiente no processo inicial de sua formação docente para
enfrentar a nova realidade da escola pública e as demandas hoje existentes, como também
para assumir as novas atribuições que passam a ser cobradas desses docentes.
Para Tedesco (1998) a formação inicial do professor se apresenta de forma
insuficiente e aligeirada, não sendo capaz de suprir os desafios da formação docente diante do
novo contexto que exige dos profissionais uma série de capacidades e habilidades
(pensamento sistemático, criatividade, solidariedade, habilidade de resolver problemas,
trabalhos em equipe, dentre outros) que não estavam presentes nos cursos de formação.
Pimenta (1999, p. 16) afirma que as pesquisas já desenvolvidas em relação
à formação inicial dos docentes,
e eficiência pelo jornal, pelo rádio, pela televisão, pelo cinema, pelo computador e pela
internet.
À escola e aos cursos de formação inicial de professores, compete formar
seres humanos, cidadãos, pessoas que saibam e que gostem de ler, de estudar, de trabalhar
com os conhecimentos, de questionar a tecnologia e de criar outros saberes e outros métodos
mais rigorosos, como afirma Coelho (2003).
Portanto, é preciso repensar a formação de professores a partir do contexto
de seu trabalho, não podendo considerar essa formação descolada ou distanciada da reflexão
crítica acerca da sua realidade. É preciso refletir sobre esta dimensão por meio de propostas
curriculares, de atividades que permitam a compreensão da dinâmica e das relações que ali se
estabelecem.
Zeichener (1993) ressalta que, diante dos vários problemas encontrados na
educação, a reflexão crítica pode ser o caminho que permitiria aos docentes a não aceitação
automática de uma visão baseada no senso comum. Para ele:
Los profesores y maestros que no reflexionan sobre su ejercicio docente
aceptan, con frecuencia de manera acritica, esta realidad cotidiana de sus
escuelas, y centran sus esfuerzos en descubrir los medios más efectivos y
eficaces para alcanzar los fines y resolver problemas en gran medida
definidos por otros para ellos. A menudo, estos maestros y profesores
pierden de vista el hecho de que su realidad cotidiana sólo constituye una
alternativa de entre muchas, una serie de opciones de un universo de
posibilidades mucho mayor. Con frecuencia, pierden de vista los objetivos y
fines hacia los que dirigen su trabajo, y se convierten en meros agentes de
terceros (p. 45-46).
Ghedin (2005)1, quando afirma que esse espaço ainda tem se mostrado insuficiente para que o
professor dê conta da complexidade dos problemas que ele precisa enfrentar no espaço
escolar.
Ghedin (2005), assim como Pimenta e Lima (2004) ressaltam que o estágio
que tem sido desenvolvido nos cursos de formação de professores tem se caracterizado
fundamentalmente por uma cultura de cunho tecnicista. Segue um modelo técnico e científico,
baseado quase que exclusivamente no nível da informação e tem como habilidade cognitiva
básica a memória, a descrição dos dados e o relato da experiência como base do
conhecimento.
Concordo com os autores quando afirmam que este procedimento, como
base para a formação de futuros professores, não é suficiente. Não dá conta da complexidade
do conhecimento que o professor precisa dominar para responder às necessidades da
sociedade do presente. A ênfase na racionalidade técnica, que nega a dimensão política
inerente a esfera de atuação docente, tem contribuído para destituir os processos de formação
de professores de uma perspectiva crítico-reflexiva, necessária a uma educação
emancipatória.
Segundo Pimenta e Lima (2004), essa concepção não valoriza a formação
intelectual do professor. Gera o conformismo e conserva hábitos, idéias, valores,
comportamentos pessoais e sociais, legitimados pela cultura dominante, uma vez que o
estágio reduz-se à observação de professores em aula, sem envolver uma análise crítica
fundamentada teoricamente e legitimada na realidade social em que o ensino se processa.
O estágio, nos moldes tradicionalmente assumidos nos cursos de formação
de professores, não tem permitido contribuir para análise crítica da prática docente em sala de
aula e não tem conseguido formar uma cultura ou atitude docente que consiga superar a
cultura escolar que ainda carrega vícios de uma perspectiva tecnicista e conservadora da
educação. Quando o novo professor chega como profissional recém formado e/ou concursado,
não consegue instituir as práticas inovadoras na escola. Em parte, a falta de insistência do
novo professor pode decorrer pela falta de consistência epistemológica que lhe dê suporte
para resistir e enfrentar o modelo cultural que a escola assume como sua.
Para Ghedin (2005) 2 , o estágio deve tomar por base e como princípio
formativo, “a reflexão na ação e sobre a reflexão na ação”, onde o conhecimento faz parte da
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GHEDIN, E. A articulação entre estágio-pesquisa na formação do professor-pesquisador e seus
fundamentos. Conferência proferida durante o VIII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de
Educadores, realizado em Águas de Lindóia, em 2005.
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ação, numa apropriação de teorias que possam oferecer uma perspectiva de análise e
compreensão de contextos históricos, sociais, culturais, éticos, políticos, estéticos, técnicos,
organizacionais e dos próprios sujeitos como profissionais, para apresentar novas propostas de
transformação da escola como espaço de construção da identidade profissional vinculada à
produção do conhecimento com autonomia do professor.
Propõe o autor que, na modalidade de estágio curricular o estagiário,
juntamente com o professor orientador, deverá buscar compreender o exercício da docência,
os processos de construção da identidade docente, a valorização e o desenvolvimento dos
saberes dos professores como sujeitos e intelectuais capazes de produzir conhecimento, de
participar de decisões e da gestão da escola e dos sistemas educativos. Por meio do estágio e
da prática de ensino em classes de educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, o
futuro professor deverá desenvolver a docência, preparando-se para efetivar as práticas de
ser/estar professor, na dinâmica complexa da realidade da sala de aula.
O estágio deve oferecer ao aluno de licenciatura condições para que perceba
que o professor é um profissional, inserido em um determinado espaço e tempo histórico,
capaz de questionar e refletir sobre a sua prática, assim como sobre o contexto político e
social no qual esta se desenvolve.
Desta forma, teoria e prática passam a ser considerados elementos
indissociáveis da atividade docente, uma vez que, para se refletir sobre seu trabalho, sobre sua
ação, sobre as condições sociais e históricas de sua prática, o professor precisa de referenciais
teóricos que possibilitem uma melhor compreensão e aperfeiçoamento de sua atividade
educativa.
Para Pimenta e Lima (2004) as teorias exercem um papel fundamental na
prática docente, pois iluminam e oferecem instrumentos e esquemas para análise e
investigação, por meio das quais é possível questionar as práticas institucionalizadas e as
ações dos sujeitos e, ao mesmo tempo, as próprias teorias.
Nesta preocupação de articulação entre teoria e prática, Canário (2001)
destaca que a aproximação entre o espaço da escola de formação e os contextos reais de
exercício profissional precisa se basear em um novo relacionamento no qual as escolas sejam
consideradas espaços fundamentais de aprendizagem profissional e não como simples espaço
de aplicação. Para o autor, a aceitação desse pressuposto implica que o contacto estreito com
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GHEDIN, E. A articulação entre estágio-pesquisa na formação do professor-pesquisador e seus
fundamentos. Conferência proferida durante o VIII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de
Educadores, realizado em Águas de Lindóia, em 2005.
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diretrizes para a estruturação da matriz curricular. Essas diretrizes deverão ser observadas em
todos os cursos de formação inicial de professores em nível superior, qualquer que seja o
lócus institucional – universidade ou instituto superior de educação – área de conhecimento
e/ou etapa da escolaridade básica, em qualquer ponto do país. Enfim, cabe à instituição, a
construção do projeto pedagógico do curso, de modo a traduzi-lo em uma proposta curricular
inovadora e criativa.
É preciso destacar que, com as diretrizes curriculares aprovadas:
• a licenciatura ganhou especificidade e integralidade própria em relação ao
bacharelado, constituindo-se em um projeto específico.
• passa a ter a definição de currículo próprio, que não se confunde com o bacharelado,
ou com a antiga formação de professores que ficou caracterizado como “modelo 3+1”.
• isto é, a formação de professores passa a ser realizada num processo formativo
autônomo, como curso próprio, numa estrutura com identidade própria, do início ao
fim.
Sem dúvida, a formação de professores em cursos próprios está entre os
principais ganhos obtidos pela reforma na formação de professores, condição relevante para
se concretizar na profissionalização do professor.
O Parecer CNE 28/2001 e a Resolução CNE/CP 02/2002 definem a duração
e a carga horária mínima que deve ter o curso de formação de professor. Indicam que o curso
deve ter o mínimo de 2.800 horas a serem desenvolvidas, no mínimo, em três anos letivos
com 200 dias letivos cada ano. Definem também que deste total da carga horária mínima,
1.800 horas devem ser reservadas para conteúdos curriculares de natureza acadêmico-
científico-cultural; que 400 horas devem ser direcionadas à prática como componente
curricular, vivenciada ao longo do curso; e, 400 horas de estágio curricular supervisionado, a
partir da segunda metade do curso, além de contemplar 200 horas para outras formas de
atividades acadêmico-científico-culturais.
Conforme a Resolução CNE/CP 01 de 2002, dentro da matriz curricular do
curso de formação de professores, a prática não poderá ficar reduzida a um espaço isolado,
que a restrinja apenas ao estágio, desarticulado do restante do curso. Deverá estar presente
desde o início do curso e permear toda a formação do professor, no interior de todas as
disciplinas que constituem os componentes curriculares de formação, e não somente nas
disciplinas pedagógicas. Portanto, essa prática deve transcender o próprio estágio, a sala de
aula, e numa perspectiva interdisciplinar, deve visar ao futuro professor, melhor compreensão
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estágio supervisionado, deverá superar a forma que, tradicionalmente, vinha sendo realizado o
estágio nos cursos de formação de professores. Na maioria das vezes, limitava-se à mera
observação, algumas poucas intervenções e elaboração do relatório final, sem a preocupação
em discutir e refletir sobre os problemas observados na sala de aula, não garantindo qualquer
possibilidade de formação profissional do docente, que seja mais crítica ou reflexiva, enfim,
mais adequada ao atendimento de realidade da sala de aula.
Os estágios foram considerados como aspectos irrelevantes na formação
docente na maioria dos cursos de formação de professor. Não há preocupação em oferecer
uma organização curricular e pedagógica integrada e articulada, na qual a teoria organiza as
percepções para a prática e esta reorganize e ressignifique a teoria. É necessário que os
estágios e as práticas se organizem em unidades de sentido, e que auxiliem a constituição de
identidade profissional do professor para atuar na escola pública contemporânea.
Uma boa e verdadeira universidade, além de oferecer a formação de
professores com identidade própria, não poderia ressignificar o papel dessa prática
pedagógica a favor da formação mais consistente do professor, de modo a melhor atender as
demandas a ele impostas no dia de hoje?
uma atitude reflexiva na prática e sobre a prática, entendendo que a prática reflexiva pode e
deve envolver a pesquisa. Neste sentido, concebe-se o estágio como espaço/tempo
privilegiado para a articulação entre pesquisa/ação reflexiva e prática educativa, como espaço
próprio para formar o professor, capaz de compreender e atuar na realidade educacional
contemporânea. O projeto político pedagógico do Curso Normal Superior prevê Estágio
Profissional I, II, III e IV.
O Estágio Profissional I tem a finalidade de inserir o estagiário no espaço da
escola, onde irá observar, elaborar diagnóstico, identificar a problemática de pesquisa e
elaborar o Pré-Projeto de Pesquisa. No Estágio Profissional II, o aluno vai desenvolver a
prática educativa a partir de um Plano de Ação que permite a inter-relação entre pesquisa e
prática; vai redimensionar o Projeto da Pesquisa, aprofundando-se na literatura referente ao
objeto, na busca de fundamentos metodológicos de pesquisa, elaboração dos instrumentos de
coleta de dados. No Estágio Profissional III, a Prática de Ensino está articulada à coleta de
dados, à sistematização dos dados coletados e na elaboração do Relatório Parcial da Pesquisa,
que é sistematizado em forma de monografia e socializada na comunidade acadêmica no
Estágio Profissional IV. Essa forma de organizar o estágio no Curso Normal Superior da
UEA, conforme os professores orientadores – supervisores, permite, entre outras coisas,
estimular a superação do distanciamento entre as pesquisas acadêmicas e a realidade das
escolas, proporciona a criação de debate sobre os reais problemas da escola, numa perspectiva
interdisciplinar.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
das posturas dos futuros professores, tão necessárias para a construção de uma escola mais
democrática e mais inclusiva para todos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS