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A construção da narrativa no filme publicitário


José Maria Mendes
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFPB. E-mail:
jose.mendes.jr@gmail.com

RESUMO

O presente estudo pretende analisar o filme publicitário narrativo, delimitando seu


conteúdo enquanto narrativa, através da presença de elementos e de uma estrutura, que
caracterizem esta forma específica de conteúdo em publicidade. Este intuito será
alcançado através de uma pesquisa exploratória, por meio de um levantamento
bibliográfico, que buscará encontrar as interseções entre a narrativa e o contexto da
publicidade e, especificamente, do filme publicitário. Analisar a narrativa neste contexto
é conhecer o seu potencial como estratégia persuasiva a qual pretende chegar até o
consumidor através da emoção que as histórias proporcionam.

Palavras-chave: Narrativa. Publicidade. Filme Publicitário.

INTRODUÇÃO

A publicidade utiliza várias técnicas persuasivas em busca do seu intuito


principal: tornar um produto/serviço conhecido no seu universo de consumo. Não
apenas tornar este produto/serviço conhecido, mas principalmente, persuadir o
consumidor a aderir àquele. Independentemente da variedade de técnicas utilizadas com
este intuito, a maioria das estratégias está incluída diante de dois eixos essenciais: a
razão e a emoção (CARRASCOZA, 2002). Dependendo de fatores inerentes ao próprio
serviço/ produto, ao seu consumidor, e aos objetivos de comunicação, entre outros, o
publicitário se guiará por um ou outro eixo, ou ainda caminhará por ambos, já que não
há exigência de uso exclusivo de apenas razão ou emoção, estes sendo amplamente
intercambiáveis.
Contudo, o presente trabalho não está interessado no potencial da razão como
força de persuasão, mas sim no uso da emoção pela publicidade, mais especificamente

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pela utilização de uma das principais formas de construção através dessa vertente
emotiva: a narrativa.
Embora haja variedade na possibilidade de aplicar a narrativa a diversos
contextos comunicativos em publicidade (televisão, rádio, jornal, cinema, revista, etc), o
filme publicitário1, feito em sua maioria para ser veiculado em televisão, mostra-se
como uma das formas mais constantes de encontrá-la na publicidade. Por este motivo,
ou seja, por o filme publicitário ser uma composição onde a narrativa encontra uma
excelente forma de expressão é que o utilizamos como objeto de pesquisa de nossa
temática.
O objetivo principal deste trabalho é, portanto, analisar o filme publicitário
narrativo, delimitando seu conteúdo enquanto narrativa, através da presença de
elementos e de um modo de estruturar/ construir tal peça de comunicação.
As narrativas de modo geral e dos filmes publicitários, particularmente,
constroem histórias nem sempre reais, mas postas como verossímeis ao deleite do
receptor. Estes se identificam também devido ao fato de a narrativa ser uma forma
comum a todos nós seres humanos.

A narrativa é um veículo natural para a psicologia popular. Ela lida (quase


que a partir da primeira fala da criança) com o material da ação e da
intencionalidade humana. Ela intermedia entre o mundo canônico da cultura
e o mundo mais idiossincrático dos desejos, crenças e esperanças. Ela torna o
excepcional compreensível e mantém afastado o que é estranho, salvo
quando o estranho é necessário como um tropo. Ela reitera as normas da
sociedade sem ser didática. Ela pode até mesmo ensinar, conservar a
memória, ou alterar o passado (BRUNER, 1997, p. 52).

A importância do estudo da narrativa, portanto, está em demonstrar uma


maneira de o ser humano de vivenciar e representar a vida. Quer seja lendo um romance
do século XIX, quer seja contando uma piada que aprendeu há poucos minutos, ou
simplesmente assistindo a trinta segundos de apelos emocionais veiculados na televisão
para persuadi-lo através da emoção. O presente trabalho é, portanto, um instrumento de
percepção deste tipo de composição, uma percepção do conteúdo narrativo inerente a

1
A terminologia filme publicitário é aqui referida como sinônimo de comercial televisivo, também
chamado de VT. As terminologias VT e filme dizem respeito ao tipo de suporte onde foram gravadas as
imagens, se em videoteipe (VT) ou em filme fotográfico, geralmente 35 mm. Porém, neste trabalho não
distinguiremos um do outro, devido à forma de gravação não ser o foco do presente estudo.
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uma forma usual e atual de o ser humano vivenciar e representar a sua vida: os filmes
publicitários.

1 O FILME PUBLICITÁRIO
Sob o ponto de vista da força mercadológica, um veículo se destaca por
concentrar mais de metade dos investimentos em publicidade no Brasil: a televisão2.
Esta concentração não é grande apenas por causa dos altos custos de veiculação, mas
também devido ao fascínio que o meio exerce nas pessoas, através "da possibilidade de
uso de mensagens com som, imagens, cores e movimentos" (SAMPAIO, 2002, p. 87).
O filme publicitário é uma das formas mais comuns de apresentação da
publicidade neste meio. "As mensagens publicitárias que a TV veicula são em forma de
comerciais, em sua quase totalidade; e, em pequena escala, no esquema de ações de
merchandising (tie-in) em shows, novelas e séries" (SAMPAIO, 2002, p. 88).
Esse formato de publicidade está enquadrado no que autores como Comparato
(2000), Vanoye e Goliot-Lété (2002) chamam de formas curtas do audiovisual. Estas
são obras que se desenvolvem em um curto espaço de tempo, por isso, têm sua função
essencial colocada em primeiro plano, qualquer que seja esta:

As obras fílmicas curtas exibem seus dispositivos (narrativos ou discursivos),


sua estrutura dramática e rítmica, a forma-sentido que produz seu impacto de
maneira mais evidente que os longas-metragens, isto provavelmente porque a
apreensão desses elementos não tem tempo de ser diluída nos meandros de
uma história ou distraída pela identificação com personagens ou pelas
emoções que, se envolvem, fazem-no de maneira rápida, aguda, como se
“precipitassem”. A forma global do filme curto se oferece à percepção e,
consequentemente, à análise mais fácil (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p.
114).

Entre os roteiros curtos, como classifica Comparato, estão compreendidos o


curta-metragem, o videoclipe e o filme publicitário. O pouco espaço de tempo para o
desenvolvimento de seu intuito, como visto, é o principal elemento de ligação entre
estas formas. O curta-metragem e o videoclipe são mais flexíveis quanto à totalidade. O
primeiro dura o tempo do desenvolvimento da sua história, que também se precipita
rapidamente, não se distraindo com voltas na história ou desenvolvimento profundo de

2
Segundo dados do projeto Inter-meios, “o share acumulado até agosto é de 60,4% em TV aberta;
14,9% em jornal; 7,3% em revista; 4,5% em rádio; 4,1% em internet; e 3,5% em TV por assinatura”
(WERZBITZKI, 2009).
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personagens. O segundo dura o tempo de desenvolvimento de uma música, já que


videoclipes são peças de divulgação da indústria fonográfica. Ambos, porém, envolvem
o espectador através de uma construção rápida que não se detém em detalhes e, por isto,
enfatizam o seu essencial, o desenvolvimento do enredo no primeiro caso e o
envolvimento do espectador com a música/ artista no segundo.
A função do filme publicitário é também extremamente restrita. “No que se
refere ao sentido, é possível partir do princípio de que qualquer spot de publicidade
veicula a mesma mensagem de base que será formulada: “Comprem o produto X””
(VANOYE; GOLIOT-LÉTE, 2002, p. 108). Sua função é, portanto, persuadir o
consumidor levando-o à compra, ou à mudança de atitude, porém esta função será
realizada em um curto espaço de tempo, onde os elementos do conteúdo e expressão do
filme publicitário necessitarão ser explorados com extrema significância.
Os filmes publicitários, ao contrário das outras formas curtas, possuem uma
duração de tempo mais rígida, “são, em geral, muito curtos (de 15’’ a 1’ 30’’)”
(VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 108). Isso porque necessitam ser inseridos, na
maioria dos casos, nos intervalos da programação televisiva, que seguem uma grade de
programação rígida, com horários determinados para início de cada programa.

Televisão e publicidade têm uma ligação indissociável. A partir do momento


em que se instalou uma filosofia eminentemente empresarial para administrar
o principal produto da televisão, o tempo, a publicidade submeteu-se às
exigências de um novo formato. O tempo passou a ser dividido em unidades
precisas de segundos e, assim, como pacote, vendido. Cada anúncio
publicitário deveria ter uma medida desta natureza para ser veiculado na
programação e por isso pagar um valor de mercado pelo tempo usado
(MARCONDES, 2001, p. 178).

A publicidade está envolvida neste contexto de exploração comercial do tempo


na televisão, o qual faz o valor de cada segundo dentro do intervalo comercial tornar-se
extremamente caro e valioso. Geralmente serão grandes anunciantes que poderão arcar
com os grandes custos de veiculação deste meio e, por isso, valorizarão cada segundo
do espaço de que dispõem durante os intervalos. Marcondes assim reflete sobre este
processo de exploração comercial do tempo na televisão:

Isto fez com que as agências publicitárias passassem a investir alto capital na
produção de bons filmes publicitários, a saber, peças capazes de fazer uma
narrativa compreensiva, atraente e convincente no espaço de 30 segundos.
Era preciso a obtenção de boas imagens, que fossem ao mesmo tempo curtas
e se interligassem de tal forma a constituir uma história, que traria consigo a
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mensagem para a compra de mercadorias. Tratava-se, portanto, de um


sistema que exigia um uso absolutamente racional e econômico do tempo.
Uma fração de segundo não poderia ser desperdiçada. Cada cena ficaria no
vídeo apenas o mínimo tempo possível para que outras pudessem ser
intercaladas e dessem conta do escasso intervalo de exibição de uma história
publicitária (MARCONDES, 2001, p. 178-179).

O tempo é, pois, uma das principais características que impactam o modo de


construção desse tipo de peça de comunicação mercadológica.

2 O FILME PUBLICITÁRIO E SEUS APELOS DE PERSUASÃO

Há muitas possibilidades de construção do filme publicitário. Vanoye e Goliot-


Lété (2002) distinguem três tipos diferentes de estratégias que podem combinar-se entre
si e englobam a maioria das investidas no universo dos comerciais: a argumentação, a
sedução-fascínio e a narrativa.
Percebe-se que a divisão operada no meio da publicidade, entre os apelos
racionais e os apelos emocionais, como pontua Carrascoza (2002), também atinge a
produção destas peças audiovisuais. Há tanto filmes publicitários ligados à vertente
apolínea (argumentativos), como filmes que buscam na vertente dionisíaca (narrativos,
sedução-fascínio) a sua força persuasiva. No caso dos filmes publicitários, assim como
na publicidade de um modo geral, o que determinará o uso de uma ou outra estratégia
são os objetivos que o anunciante deseja atingir com sua investida e detalhes relativos
ao produto/ serviço ou público-alvo, que delimitariam o filme em uma ou outra vertente.
Os filmes publicitários argumentativos utilizam a “argumentação direta,
explícita, que se sustenta eventualmente na descrição (do produto, de seus efeitos) e na
explicação (como o produto opera). Os spots3 “argumentativos” são essencialmente
discursivos” (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 108). Por serem discursivos a
responsabilidade do discurso requer uma atenção especial. Segundo as autoras, este
pode estar a cargo de um personagem, ou seja, de alguém em que o modo de vestir, o
modo de se expressar tenha uma conotação favorável àquele produto/serviço, um
estereótipo, por exemplo, do especialista ou do consumidor. Um homem vestido de
branco, com expressões serenas conotando “médico”; uma mulher com avental, em
ação dentro de casa, conotando “dona-de-casa”; são exemplos bem constantes nos

3 Spots são como as autoras denominam o filme publicitário


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filmes publicitários argumentativos relativos ao universo da medicina (campanhas de


saúde, medicamentos), no primeiro caso, e relativos a produtos de limpeza e casa. A
personagem também pode ser uma celebridade, tática bastante usual.
A responsabilidade do discurso pode também recair sobre uma “voz off, que
comenta as imagens descritivas, eventualmente desenhos, gráficos etc., voz sem rosto
que fala na maioria das vezes de um lugar não especificado” (VANOYE; GOLIOT-
LÉTÉ, 2002, p. 109). O convencimento agora depende do potencial puramente sonoro
da voz, já que como observam Vanoye e Goliot-Lété (2002, p. 109) sobre alguns filmes
publicitários com voz em off, “o comentário, quer seja argumentativo, quer explicativo,
quer incitativo, “transborda” em muito a imagem”. A imagem, nos filmes
argumentativos de uma forma geral, também é carregada de signos visuais (quadro,
esboços, gráficos, números, laboratório) que sustentem uma posição de objetividade ou
cientificidade, dependendo do caso.
Indo para o outro lado do pêndulo, as autoras caracterizam a sedução-fascínio
como uma maneira de persuasão do filme publicitário, centrada no idílico:

Alguns spots (são em número cada vez maior) quase nada dizem
(argumentação direta quase nula), tampouco narram. A relação entre o
conteúdo do spot, as imagens e os sons, e o produto é às vezes bem longínqua
e até quase inexistente, pelo menos aparentemente. As imagens e sons
apresentam qualidades, denotadas ou conotadas, que pretensamente
pertencem ao produto ou ao sujeito-utilizador do produto. Essas qualidades
muitas vezes da ordem da juventude, da força, da atividade, da sedução, do
frescor, da resistência, da alegria de viver, da segurança, etc (VANOYE;
GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 111-112).

A sedução-fascínio é muito utilizada para produtos de luxo (carros, moda,


perfumaria), que não necessitam de uma argumentação forte ou de criação de um
esquema narrativo com que o consumidor se identifique. A estratégia se preocupa
apenas com o sonho, nesta busca por sonhos, utiliza recursos técnicos que enfatizem tal
característica. Há o uso de filtros, de músicas ambiente estereotipadas, a fusão rápida
entre imagens, a câmera lenta, além de um recurso narrativo, que será abordado mais a
frente, a elipse. Todos são recursos técnicos que enfatizam esta busca idílica. “O
produto aparece como o doador 15’’ a 1’ 30’’ de prazer audiovisual” (VANOYE;
GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 113).

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Mesmo que sua força persuasiva não esteja na criação de histórias, a estratégia
de sedução-fascínio pertence à vertente dionisíaca devido à criação de um clima
emotivo muito forte. Esta estratégia encontra sua razão de ser mais no nível de
expressão do que de conteúdo. A sedução-fascínio se constrói por uma associação entre
imagens e sons que transmitam a sensação de prazer ao ser vistas/ ouvidos. Não há
conteúdo argumentativo, nem conteúdo narrativo, mas uma construção expressiva do
idílico.
Na estratégia narrativa, por outro lado, o conteúdo da história a ser contada é
parte essencial. Também se busca a construção de um mundo idílico. Mas esta
construção se dá através da verossimilhança produzida pelas histórias que envolvem o
consumidor em uma relação com o produto-serviço. Para Vanoye e Goliot-Lété (2002,
p. 110), a função desta estratégia é dupla, já que “a estrutura narrativa desperta o
interesse de todos e o papel do produto na história constitui um elemento de influência”.
O ato de contar histórias é onde reside a força persuasiva desta estratégia. “O
espectador identifica (inconscientemente) uma estrutura que ele conhece e identifica-se
(não necessariamente de forma estável) com um dos atores da história” (VANOYE;
GOLIOT-LÉTÈ, 2002, p. 110-111). O produto/ serviço encontra-se no meio desta
“equação”, podendo adquirir os mais diversos papéis narrativos. Mas necessariamente o
filme publicitário narrativo é um tipo de construção “cuja intenção é captar a atenção do
público com o propósito de vender o produto” (COMPARATO, 2001, p. 340).

3 O FILME PUBLICITÁRIO NARRATIVO E SEU MODO DE CONSTRUÇÃO

A construção do filme publicitário narrativo, como toda peça do audiovisual,


atravessa o processo verbal de roteirização. É nesse processo que a história adquire
consistência. Não significa dizer que não haja processo de roteirização nos filmes
argumentativos, ou nos filmes que apelam para a sedução-fascínio. O roteiro é a peça
chave no momento da produção de qualquer peça audiovisual, é o guia na construção
deste tipo de produto. Porém, quando se cria uma história, quer seja em cinema,
televisão, ou para a publicidade, o roteirista exercita o processo de construção da
narrativa audiovisual, que começa no storyline e termina com o roteiro final.

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O consumidor, como todo ser humano está imerso em conflitos. A publicidade


narrativa trabalha estes conflitos, como categoria essencial da sua construção. Como
dito por Nicolau (2005, p.1) “a utilização do produto resulta em uma ordem, em um
equilíbrio, que o publicitário, na propaganda, demonstra de forma, muitas vezes,
ameaçada ou não atingida, sendo o produto o restabilizador da ordem, do equilíbrio”. A
delimitação inicial deste conflito base, como visto, surge a partir do storyline. Porém, no
filme publicitário, devido ao curto espaço de tempo para o desenvolvimento da história,
o conflito-base (o quê) é praticamente a história a ser contada.
Como próximo passo no intuito de construir a história no filme publicitário,
ter-se-á o argumento, documento onde estarão delimitados todos os elementos
narrativos. Todos estes elementos passam por uma “economia” narrativa em termos de
profundidade. Nos filmes publicitários, o espaço (onde) é regido pela unidade, o tempo
segue uma linearidade rígida (quando), os personagens (quem) são definidos de maneira
a compor um estereótipo e o enredo (qual) segue uma estrutura seqüencial simples.
Todos os elementos tendendo ao que nos contos se chamava “unidade dramática”
(MOISÉS, 1997, p. 40), e na publicidade encontra semelhante no termo “esfriamento da
mensagem” (CARRASCOZA, 2002, p.110). Mas independentemente da terminologia,
busca-se sempre a simplicidade, para assim facilitar a assimilação da mensagem por
parte o receptor.
A estrutura (como), próximo passo na construção da história no audiovisual
também será visualizada diferentemente no filme publicitário. O processo de estruturar,
ou seja, definir uma macro-estrutura, as cenas essenciais e os mecanismos de passar o
tempo, será mais simples também, em vista do pouco tempo.
O tempo, para a publicidade televisiva, é, portanto, um elemento essencial na
sua construção. A linguagem absolutamente objetiva e sintética será explorada com
excelência nos comerciais televisivos. “Na publicidade (...) a ênfase recai sobre a rápida
sucessão de imagens, cuja intenção é captar a atenção do público com o propósito de
vender o produto” (COMPARATO, 2000, p. 340). Ou seja, assim como as outras
formas audiovisuais curtas, o filme publicitário irá em busca de seu objetivo, porém sem
rodeios, indo direto a seu intuito. Embora isto não signifique que o receptor da
mensagem tenha clareza do intuito comercial deste tipo de construção. A sutileza é a
marca do discurso publicitário, que envolve o consumidor naquele universo verossímil.

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O filme publicitário age sem rodeios, atingindo direto seu objetivo, que é persuadir o
receptor de suas mensagens.
A criação para a televisão, como o é a maioria dos filmes publicitários, precisa
ter a preocupação eminentemente temporal:

Devemos criar levando em conta quanto tempo temos. Acho completamente


diferente 15 segundos de 30, ou 45, ou 60, ou mais. Em 15 segundos é
melhor dizer uma só frase e ter uma imagem forte. Geralmente, são reduções
de filmes de trinta para aumentar a freqüência, e esperamos que o
consumidor complete mentalmente o que viu em 30 segundos. Ou temos
séries de filmes de 15, onde um soma com o outro e permite uma freqüência
maior. Para filmes de 30 segundos, o que dá certo é o humor, o bom humor, o
inesperado, o exagero inteligente, uma demonstração inteligente etc. Agora
se precisamos de um clima de emoção ou suspense ou contar uma estória é
bom pensarmos em 60 segundos (...) (IMORBERDORF, 1989, p. 154).

Independentemente de se trabalhar com 30 ou 60 segundos, a composição


através dos três passos, exposição, desenvolvimento e resolução (BARRETO, 2004), é
facilmente identificável, justamente por que a história no filme publicitário se resume ao
essencial. Aqui não haverá espaço para um desenvolvimento integral e parcimonioso do
enredo (problema, complicação, conflito, crise, clímax, resolução), como acontece nos
formatos longos do audiovisual, como filmes, séries e novelas, por exemplo. Tal fato
até, depõe contra o caráter dramático deste tipo de produção, como se refere Comparato:

Embora possa parecê-lo, o texto para publicidade não é considerado um


roteiro dramático. O tempo de que se dispõe é muito curto (às vezes apenas
quinze segundos). Desta forma, um anúncio pode conter cenas essenciais,
estrutura dramática e personagens, mas não desenvolverá uma história;
limitar-se-á a ser a exposição de uma situação, ou de um momento dramático,
de um gimmick, etc (COMPARATO, 2000, p. 340).

O curto tempo, a principal característica deste tipo de produção, seria o seu


principal defeito do ponto de vista dramático, segundo o autor supracitado. Para ele não
há intensidade dramática se não há um espaço para o desenvolvimento da história. Esta
se resumiria a um momento, uma situação, ou um gimmick, este, como visto, sendo
“uma alteração arbitrária dos elementos familiares com a intenção de surpreender o
público” (COMPARATO, 2000, p.173). Mas não há o desenvolvimento de uma
história, de um momento dramático completo e construído devidamente. Com esta
afirmação, o autor, mesmo que, não intencionalmente, retira o mérito dramático do

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filme publicitário. Como se apenas as narrativas longas possuíssem o tempo necessário


parar a construção de um ideal dramático.
Barreto (1982) tem uma opinião contrária quanto à construção do filme
publicitário, para ele o princípio básico da publicidade audiovisual é criar uma tensão
dramática e aliviá-la com o produto/serviço do anunciante. O autor vai em busca das
bases dramáticas na antiguidade clássica para se referir ao caráter dramático da
publicidade:
Para efeito prático (e muito mais simplório, quando nos lembramos de
Sófloces) de compreender o drama de que se nutre a criatividade em TV, eu
me fixaria no fato de que ele é fundamentalmente tensão. Tensão – e alívio
de tensão, lembrando a forma clássica da catarse, efeito emocional da
tragédia. Ou tensão – e alívio de tensão, na forma de humor, alma da comédia
(BARRETO, 1982, p. 240).

Vanoye e Goliot-Lété (2002, p. 110) observam que o filme publicitário “pode


dar lugar a uma narrativa completa (atualmente mais rara) ou incompleta (caso mais
freqüente)”. As autoras, portanto, classificam como a forma mais comum de filme
publicitário aquela onde não se conta uma história completa, mas apenas um momento,
como classifica Comparato (2000). Porém, Vanoye e Goliot-Lété acreditam que, mesmo
não desenvolvendo uma história completa, a forma narrativa no filme publicitário
“adquire base a partir de alguns semas narrativos: um ou dois atores a quem é possível
atribuir papéis (...) graças a uma ou várias ações que se inscrevem em uma cronologia”
(VANOYE;GOLIOT-LÉTÈ, 2002, p. 110). Ou seja, há uma história sendo
desenvolvida e, portanto, um envolvimento dramático dos seus elementos.
Mas ainda assim há a dificuldade em se falar em uma história completa neste
curto período de desenvolvimento, mesmo que se estenda o filme até os 60 segundos.
Por isso, uma das figuras narrativas mais freqüentes em filmes publicitários é a elipse.
“O spot narrativo é ultracurto. A figura recorrente – não é surpreendente – é a elipse”
(VANOYE, GOLIOT-LÈTÈ 2002, p. 110).
A elipse é uma figura narrativa extremamente ligada ao tempo, como afirma
Comparato (2000, p. 474) é “uma passagem muito rápida do tempo”. Refere-se à
necessidade em não mostrar tudo ao espectador, em confiar na sua capacidade de
completar conteúdos. Se alguém, em uma cena, sai de casa e fecha a porta e, na outra
cena, aparece entrando em um prédio, necessariamente passou por um percurso de casa
ao prédio. Porém a necessidade dramática daquele percurso é nula para a peça como um
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todo. E não apenas por ser nula, mas por ser facilmente completada pelo público, é que
ela é eliminada da construção, sem representar nenhuma diferença. Há, neste caso, uma
mudança espacial, que revela uma passagem temporal, mas que é suprimida, por esta
figura denominada elipse.

Quem pode mais, pode menos. A elipse deve cortar sem contudo emascular.
Sua vocação não é tanto suprimir os tempos fracos e os momentos vazios
quanto sugerir o sólido e o pleno, deixando fora de cena (fora do jogo) o que
a mente do espectador pode suprir sem dificuldade (MARTIN, 1990, p. 85).

A elipse tem, então, importância fundamental na construção do filme


publicitário porque é também um recurso que põe a ênfase no essencial da narrativa,
retirando os excessos, porém sem danificar o significado pleno da história. Dando
ênfase ao essencial, esta figura colabora para pontuar o tempo dramático do filme
publicitário narrativo.
O diálogo e a construção da cena também possuem papel essencial na ênfase
do tempo dramático. Em alguns casos o diálogo é a base de construção do filme, por
onde acontece o desenvolvimento da peças e das relações entre o sujeito e o objeto.
Filmes deste estilo basicamente acontecem em uma única cena; são literalmente um
momento, uma situação, que se revela através do diálogo. Não quer dizer neste caso que
a imagem não tenha importância, porém o objetivo da cena estará no desenrolar do
próprio diálogo.
Em outros casos não há diálogo, de tipo algum, e a construção da narrativa é
realizada apenas pela composição da imagem e trilha sonora. Nos filmes compostos
apenas de imagens, cada cena possuirá um objetivo dramático que signifique algo
àquele desenrolar de fatos, àquela situação dramática de conjunção/disjunção entre o
sujeito e o objeto. Importante lembrar que, nestes casos, a configuração máxima da
narrativa encontra-se no nível da expressão, mas toda sua construção ainda foi firmada
por um processo de construção que definiu o conflito, o enredo, as personagens, o
tempo e o espaço, enfim, o conteúdo da história, mesmo toda ela não possuindo, em sua
forma final, nenhum elemento verbal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Como em toda forma narrativa, como em toda construção no audiovisual, será


exclusivamente a necessidade dramática daquela peça que determinará o seu estilo de
composição. È difícil falar em erros ou acertos, em meio a uma enorme variedade de
formas e construções possíveis para o filme publicitário. A própria sobrevivência deste
tipo de produto está na sua capacidade de inovar, de mostrar apelos totalmente
diferentes, para sempre captar a atenção do consumidor, em meio à imensidão de
opções.
Ainda assim, uma força contrária à inovação e à criatividade ainda permanece,
a economia. Não a economia narrativa desse tipo de peça, mas a economia do bolso do
anunciante. A visão do “quanto menos tempo melhor” pode funcionar, porém, para o
bolso do anunciante, mas pode também minar a sua estratégia criativa baseada na
narrativa. Por isso a saída dos gimmicks e momentos dramáticos é bastante usual na
publicidade, pois não necessitam de envolvimento do espectador. São curtos, lineares e
enfáticos, de acordo como o mercado exige.
O que necessita ser reafirmado é que o potencial dramático da narrativa,
através de filmes mais longos, com 1 minuto ou 1 minuto e meio, precisa ser também
trazido à tona, já que são estratégias eficientes e extremamente persuasivas. A
veiculação de comerciais em salas de cinema é pródiga em exemplos, assim como a
veiculação de filmes publicitários na web, onde estes estão livres das amarras do tempo
impostas pela grade comercial televisiva.
Filmes mais longos induzem o espectador a imergir em um tempo dramático
específico, onde o produto/ serviço desempenha papel preponderante, verossímil e
aproximado do público-alvo, através de uma identificação que as narrativas conseguem
construir com excelência.
Mesmo a narrativa não sendo a única maneira de construção do discurso
publicitário, ela encontra ressonância comprovada como recurso persuasivo. Esquecer
este fator é não compreender o potencial de comunicação destas peças. É não entender o
modo como agem perante o consumidor. E o pior, em um contexto mercadológico onde
cada segundo vale muito, é perder o dinheiro investido em um apelo totalmente errado e
vazio de persuasão.

REFERÊNCIAS
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BARRETO, Roberto Menna. Criatividade em Propaganda. 3. ed. São Paulo: Summus, 1982.

BARRETO, Tiago. Vende-se em 30 segundos: manual do roteiro para filme publicitário. São Paulo:
Senac, 2004.

CARRASCOZA, João Anzanello. Razão e Sensibilidade no texto publicitário. São Paulo: Ed. Futura,
2004.

COMPARATO, Doc. Da criação ao roteiro: o mais completo guia da arte e técnica de escrever para
televisão e cinema. 5. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.

IMOBERDORF, Magy. et al. Tudo que você queria saber sobre propaganda e ninguém teve
paciência para explicar. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1989.

MARCONDES, Ciro Filho. Por uma reflexão consequente da estética. Disponível em:
<http://www.bib.uab.es/pub/analisi/02112175n27p173.pdf>. Acesso em: 03 de abril de 2010.

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Nº 03 - MARÇO – AGOSTO 2010

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