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A Arte de Contar Histórias - Curso Livre - UNIGRAN / 2015

Módulo
Contação de Histórias e
Interação Social

Caros(as) alunos(as),

No terceiro módulo de nosso curso abordaremos os seguintes tópicos:

• a contação de histórias, a interação social da criança e o


desenvolvimento do espírito crítico;
• formas de trabalhar com a literatura infantil.

Por meio desses tópicos, esperamos contribuir para que tenham algumas
dúvidas sanadas e que ampliem o conhecimento de vocês sobre as discussões
propostas.
Qualquer dúvida, contatem-nos através do quadro de avisos, ok?

Olá cursistas,
Iniciemos nosso terceiro módulo abordando a importância da
interação social e histórias e veremos as várias maneiras de como trabalhar
com a Literatura Infantil.

A Contação de História para a interação social

A literatura infanto-juvenil foi incorporada à escola e, assim,


imagina-se que - por decreto todas as crianças passarão a ler... Até poderia
ser verdade, se essa leitura não viesse acompanhada da noção de dever,
de tarefa a ser cumprida, mas sim de prazer, de deleite, de descoberta, de
encantamento.. .
Começa que há uma obrigatoriedade de prazo, uma espécie de
maratona, onde um livro tem que ser lido num determinado período, com
data marcada para término da leitura e entrega de uma análise, e não

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conforme a necessidade, a vontade, o ritmo, a querência de cada criança-


leitora.
Depois, o livro é indicado, não escolhido pelo leitor ... Como
uma única e mesma história pode interessar a toda uma classe? Como
imaginar que haja uma identificação geral - de meninos e meninas -
todinhos preocupados com o mesmo problema? E todos interessados num
determinado gênero literário, previsto como fonte única de prazer para
aquele mês do ano??
Mesmo nas escolas mais democráticas, onde se dá o direito de
escolher entre dois ou três títulos, quais os referenciais reais para essa
prévia seleção?? Por que não ampliar os horizontes, indo às livrarias
ou bibliotecas e deixando cada aluno manusear, folhear, buscar, achar,
separar, repensar, rever, reescolher, até se decidir por aquele volume,
aquele autor, aquele gênero, que, naquele determinado dia, lhe desperta a
curiosidade, a vontade, a inquietação??? Claro que, para isso, a professora
teria que ler muito mais livros, e a questão que fica é esta: ela está disposta
a fazer isso?
Porque, de verdade, a professora trabalha com um leque muito
estreito de alternativas ... Conhece pouco de literatura infantil, em geral
aqueles livros que as editoras enviam para sua casa, escola ou aqueles
cujos autores estão mais dispostos a divulgar seu trabalho ... (e fica
difícil achar que, por um desses dois métodos, realmente se chegue a
acompanhar o que é publicado de relevante, de significativo, de bom ...), O
critério reinante, na maioria dos casos, não é o da qualidade do livro, mas
o da pronta entrega.
Muitas vezes, dá é nisso: adoção de autores medíocres, menores,
desimportantes, muitas vezes contando histórias pra lá de desinteressantes,
chatas, monótonas, antigas, tantas vezes falando duma criança que não
existe mais, de problemas que não as tocam ou sensibilizam. . . E como
se pode estabelecer uma relação boa e gostosa com a literatura quando
se trabalha em cima de textos assim (ou apenas desse tipo)? Por que não
adotar e propor a leitura de tantos livros no mês ou no bimestre - conforme a
escolha de cada aluno -, em função de seus parâmetros, vontades, buscas,
,aflições, desse período?
Mas parece que não satisfaz ao professor apenas a adoção de um
livro para toda a classe, segundo a sua escolha (dele, professor, claro...
Muitas e muitas vezes, esse texto selecionado se torna apenas um pretexto
para se estudar gramática, sublinhar substantivos concretos, indicar tempos
de verbos, encontrar advérbios de modo e mil outras relevâncias do tipo ...

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Estilhaça-se uma história, não se aprofunda uma ideia, uma interpretação,


não se analisa a forma de escrever dum autor (tarefa tão absorvente e
que exige tanto trabalho... ). Aliás, usar sempre um caderno para fazer
exercícios, ao invés de mutilar um conto ou poema
E há ainda um tempo prefixado, uma data marcada para o término
da leitura ... Como estabelecer um prazo determinado para a fruição??
Isso não é exatamente o que se chamaria de respirar, andar, caminhar
no compasso, no ritmo, no tempo, que cada história leva e pede de cada
leitor...
E essa bendita ficha, que é solicitada ao final de cada leitura? O
que ela significa, o que acrescenta à criança? Ao invés de trabalhar sempre
com seu espírito crítico, de fazê-la pensar sobre o lido, se espantar com
o maravilhoso ou se irritar com a bobice, enfim, estar permanentemente
ligada no que cada livro despertou ... por que pedir que todos os alunos
respondam às mesmas questões, em geral elaboradas pela editora, onde
se solicita um resumo (seguindo os passos estritos e estreitos propostos)
c compreensão do texto (segundo os parâmetros da editora)? O que isso
amplia, soma, acrescenta, faz a criança crescer como leitora crítica???
Essa ficha - às vezes chamada de encarte de trabalho (! ?) -
anexada à maioria dos livros ou proposta pela professora pouco pede além
da compreensão literal e linear da narrativa. Essa ficha tão bitolada e tão
bitoladora, tão padronizada, tão igual para todos os alunos (às vezes do
Oiapoque ao Chuí. .. ), como poderá ajudá-los a perceber ,o que significa
cada leitura individual, personalizada, a emitir seu parecer único e pessoal??
Ao invés de constatar se decorou o nome, ou como se veste uma ou outra
personagem, nesta ou naquela situação específica, nesta ou naquela
página (como se isso tivesse qualquer importância efetiva), por que não
trabalhar com tudo o que uma história (seja boa ou má, como qualidade,
como ideia, como proposta etc.) possibilita? Com as emoções que ela
provocou, com as sensações que mobilizou, com o alívio sentido, com a
tristeza ou a alegria que desencadeou, com os horizontes que abriu ou com
as portas que fechou? Por que tornar a leitura asséptica e impessoal???
Texto extraído do livro Literatura Infantil: gostosuras e bobices, de
Fanny Abramovich

A LEITURA E O ESPÍRITO CRÍTICO

Ao ler uma história a criança também desenvolve todo um potencial


crítico. A partir daí ela pode pensar, duvidar, se perguntar, questionar ...

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Pode se sentir inquietada, cutucada, querendo saber mais e melhor ou


percebendo que se pode mudar de opinião ... E isso não sendo feito uma
vez ao ano ... Mas fazendo parte da rotina escolar, sendo sistematizado,
sempre presente - o que não significa trabalhar em cima dum esquema
rígido e apenas repetitivo.
POIS É PRECISO SABER SE GOSTOU OU NÃO DO QUE FOI
CONTADO, SE CONCORDOU OU NÃO COM O QUE FOI CONTADO
... É perceber que ficou superenvolvido, querendo ler de novo mil vezes
(apenas algumas partes, um capítulo especial, o livro todinho. . . ) ou saber
que detestou e não querer mais nenhuma aproximação com aquela história
tão chata, tão boba ou tão sem graça. . . É formar opinião própria, é ir
formulando os próprios critérios, é começar a amar um autor, um gênero,
uma ideia, um assunto e, daí, ir seguindo por essa trilha e ir encontrando
outros e novos volumes... (que talvez façam o amor pelo autor redobrar, ou
provoquem uma decepção ... isso tudo faz parte da vida!).
E há tanto o que analisar, o que discutir, o que fazer a criança
perceber, opinar criticamente. Em relação à história: se boa, se interessante,
se palpitante, se boba etc. ... E a ideia do autor? Nova, batida, já lida
outras vezes em outros livros? Esse autor repete suas ideias, seus temas,
ou inventa novos, se atreve a caminhar por outros assuntos, por outras
questões???
E o ritmo? Muito longo, rapidinho demais da conta, não dando
tempo de saborear, de ir mais longe, de querer saber mais e melhor sobre
um assunto, conversa ou qualquer outra coisa que ficou solta, sem maiores
explicações?? .. Ou se arrastando, se esticando, se esticando e dando
voltas e mais voltas em torno do mesmo tema, como se não achasse o
momento de terminar?? E falando nisso, como foi sentido/percebido/
aplaudido/vaiado etc. o final da história?? Tinha a ver com tudo o que
aconteceu, ou de repente acabou dum jeito confuso, abrupto, perdido??? E
o começo, foi gostoso, chamou a atenção, deu vontade de continuar lendo,
ou já deu para sacar que ia ser uma chatura só?? Ou começou mal e, de
repente, pra surpresa total, foi esquentando, esquentando e até que ficou
muito do simpático e do bom??? E tanta coisa mais, que foi percebida pelo
leitor e que merece ser discutida ...
E a história, é bem escrita? Claro, nem todas são ... (aliás, a
maioria não é ... ). Como é que deu para sentir que o autor escreve bem ou
mal, ou até médio?? E isso aconteceu o tempo todo ou houve momentos
em que o autor decepcionou, escorregou, deu uma grande mancada, pôs
qualquer coisa no papel, do primeiro modo que lhe passou pela cabeça??

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E aqueles trechos bonitos, que deram um arrepio gostoso, uma respiração


mais forte, um sorrisão daqueles, uma tristeza boa de ser sentida ... onde é
que surgiram? Na boca, no olhar ou no gesto de quem? E tanta coisa mais,
que foi percebida pelo leitor e que merece ser discutida...
E há tanto, tanto para descobrir, para polemizar sobre as
personagens. . . as que tinha vida, que convenciam, que agiam dum modo
verdadeiro (não importa se gente, se bicho, se fada, se vampiro ... ) e aquelas
que reagiram de repente, sem mais nem por quê - dum modo que não tinha
nada a ver com elas, como vinham atuando desde o comecinho da história
... E aquelas que foram esquecidas pelo autor (o que acontece muito ... ),
que aparecem no começo e nunca mais ... ou aquelas que não tinham a
menor importância pro desenrolar do como e que ficaram só enchendo as
páginas, sem função, sem razão, sem opinião ... E tanta coisa mais que foi
percebida pelo leitor e que merece ser discutida ...

O OBJETO-LIVRO: O QUE PERCEBER, O QUE DISCUTIR...

E o objeto-livro ... há tanto o que perceber, o que comentar, o que


olhar, o que opinar a respeito! Comecem assim a contar a sua história para
eles!!!
A começar da capa (se bonita, feia, atraente, boba, sem nada a ver
com a narrativa ... ), do título - que, afinal, são o primeiro contato que se tem
com o volume: o impacto visual e a curiosidade despertada ou adormecida...
E por que não discutir a encadernação, do desprazer que é ver
um livro amado desfolhando, descolando, não dando mais nem para virar
página? ... E o jeito como o volume foi paginado, olhando muito do bem
olhado se a ilustração corresponde ao que está escrito na página ao lado,
se está tudo muito compactado, muito apertado, sem espaço para respirar
... ou, ao contrário, se ficou muito pouca coisa escrita ou desenhada em
cada folha, sobrando partes em branco demais da conta, só para engrossar
o livro??
E se as letras eram grandonas, gostosas de ler, ou pequenas,
apertadinhas, sendo necessário um binóculo para poder seguir aquelas
letras tão mínimas?? E quanto havia de espaço na passagem dum capítulo
para outro, mostrando que já era outro momento, outro dia, outra situação
ou o que fosse, e estava tudo apertado, estreito e até difícil perceber
que já era outro capítulo?? Estava metade cuidado, metade não? … A
editora estava fazendo economia? Ou estava sendo generosa, tratando
com capricho a edição? ... E tanta coisa mais que é percebida pelo leitor e

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merece ser discutida...


E também analisar, comentar o formato do livro: quadrado,
retangular, comprido, miudinho ... e se era o melhor para aquela história ou
aquele tipo de desenho ... E, ao fechar o volume, se deter na quarta capa,
ver se ela traz alguma informação (e se ela é importante, boa, chata, difícil
... ), alguma chamada sobre a coleção (e se parece anúncio ou se ajuda a
perceber o todo da série ... ), se a ilustração é uma continuação do desenho
da capa ou se não tem nada a ver ... Aprender a ler a orelha (se tiver) enfim,
a deglutir e a enxergar o livro como um todo e o todo do livro.
E então comecem a contar a história do livro escolhido , lembrando
que contar uma história é diferente de ler!!!!

ATIVIDADES QUE PODEM SER DESENVOLVIDAS APÓS AS


DISCUSSÕES

E cada aluno poderá escrever sobre tudo isso - ou sobre outros


itens não citados que pareçam importantes de modo pessoal, sem roteiros
definidos e muito menos definitivos ... Se cada livro chama a atenção por
algo de especial, por que não deixar a criança - sozinha - descobrir essa
especificidade que ela sentiu, percebeu... e escolher sobre o que quer falar?
E também pode haver ocasiões em que se troquem opiniões ... E
constatar que cada um pode ter amado ou detestado o mesmo livro, por
razões mui diferentes...
Ou, através dos olhos do colega, se deter em aspectos que não havia
notado, se dado conta ... E talvez - por isso mudar de opinião (em relação
a uma parte, a uma personagem, parágrafo/capítulo, ou até em relação ao
todo ....) Mas, de qualquer modo, a classe ou grupo que estiver trocando
apreciações perceber que não há necessidade de haver unanimidade de
opinião ... Mais importante é aprender a respeitar os pontos de vista dos
outros - diferentes dos seus - ou os diversos jeitos de ler, de perceber, de
valorizar ou de não ligar ...
E por que se precisa tanto, sempre, estar indicando um novo livro?
Por que não propor, também, que se releia algo que algum dia tenha
sido importante? ... Reler pode ser tão bom, tão forte, tão esclarecedor.
.. Não é apenas na novidade que está o novo, mas na nova forma de nos
aproximarmos de algo já conhecido e perceber mudanças ...
Enfim, simplesmente colocar a leitura do livro infantil brasileiro
no currículo escolar não quer dizer nada ... Pode-se até estar formando
pessoas com ojeriza permanente pela leitura, tal a quantidade de livros

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ruins que lhes pedem que leiam, aliada a nenhuma crítica que é solicitada
...Apenas fazendo-de-conta que se leu, como se se assinasse um visto,
uma rubrica de “feito”... Dar uma opinião pode não significar nada, não
exigir nada, além dum comentário superficial, epidérmico, ou ser um jeito
de agradar e corresponder à expectativa do adulto (que já tem uma opinião
formada sobre aquele livro ou aquele autor).
Me parece que a preocupação básica seria formar leitores porosos,
inquietos, críticos, perspicazes, capazes de receber tudo o que uma
boa história traz, ou que saibam por que não usufruíram aquele conto...
Literatura é arte, literatura é prazer... Que a escola encampe esse lado.
É apreciar - e isso inclui criticar...
Se ler for mais uma lição de casa, a gente bem sabe no que é que
dá ... Cobrança nunca foi passaporte ou aval para a vontade, descoberta
ou para o crescimento de ninguém...
Vamos ao módulo 4 ver alguns contos e grandes histórias????

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