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Resumo
Este artigo tem como objetivo analisar as decisões sobre a abordagem a se adotar nas
atividades relacionadas ao processo produtivo de três manufaturas de confecções. As
abordagens consideradas são manter a atividade sob responsabilidade própria, terceiriza-la
ou integrá-la verticalmente. Esta análise é feita com o auxílio da teoria dos custos de
transação. Os dados coletados nas empresas permitem perceber que não são apenas as
decisões econômicas imediatas que influenciam a decisão de como realizar determinada
tarefa, mas também aspectos relacionados ao risco envolvido na decisão; é possível a
coexistência na indústria com diferentes níveis de eficiência, graças à complexidade do
mercado; e que a posição de um determinado agente dentro de uma cadeia produtiva lhe
permite maior eficiência do que outros agentes de outras posições, não apenas pela sua
especialização, mas também pela sua capacidade de melhor se relacionar com empresas de
outros elos.
1. Introdução
O atual ambiente competitivo faz com que as empresas busquem constantemente
meios para o aumento da competitividade. Estes esforços muitas vezes se concretizam sob a
mudança na organização das atividades produtivas, em que a empresa pode aumentar, ou
diminuir sua responsabilidade sobre o controle de determinadas operações. O desafio
encontrado pelo gestor nesta questão está em encontrar informações que permitam saber com
precisão qual a melhor alternativa a ser escolhida. Em relação ao controle das atividades
produtivas, a empresa possui duas alternativas extremas, transferir parte de suas atividades
para terceiros, o que é conhecido como terceirização, ou incorporar além das atividades que
são responsabilidade direta da indústria, outras atividades normalmente responsabilidade de
indústrias adjacentes; fenômeno conhecido como integração vertical.
Um arcabouço teórico importante para se entender melhor os processos de integração
vertical e terceirização é a teoria dos custos de transação, uma vez que permite compreender
os elementos conceituais da formação de custos da empresa, e sua relação com o aumento ou
diminuição da escala produtiva.
Este artigo tem como objetivo analisar as decisões de manufaturas de confecções
quanto à terceirização ou manutenção das atividades produtivas sob a própria
responsabilidade à luz da teoria dos custos de transação. Foram investigadas três empresas
fabricantes de confecções de pequeno e grande porte, localizadas no arranjo produtivo local
(APL) de Passos, interior de Minas Gerais. A seção 2 apresenta uma revisão sobre a teoria dos
custos de transação; na seção 3, é apresentada uma visão geral sobre a indústria de confecção
e do APL de Passos; na seção 4 são apresentados os aspectos metodológicos da pesquisa; na
seção 5 são apresentados os estudos de caso, com a análise de resultados realizada na seção 6;
por fim na seção 7 são apresentadas as conclusões e na seção 8 as referência bibliográficas.
III EMEPRO – Belo Horizonte, MG, Brasil, 07 a 09 de junho de 2007
possua uma imensa quantidade de agentes, como pode ser observado em Oliveira & Ribeiro
(1996). No Brasil várias são as regiões produtoras de confecções, dentre as quais destacam
Romero et al (1994) as cidades de Caxias do Sul, Divinópolis, Juiz de Fora, São Paulo, e do
Vale do Itajaí, dentre outras.
O APL de Passos consiste num pequeno aglomerado de empresas de confecções,
situado no interior de Minas Gerais. Este aglomerado possui cerca de 90 manufaturas de
confecções, cuja imensa maioria é de pequeno ou micro porte. Um traço importante neste
APL é a presença de um grande número de ateliês de montagem de confecção, que são
empresas que recebem normalmente o tecido cortado pela manufatura e fazem a sua
montagem.
As fases comumente presentes no processo de produção da confecção, podendo
variar de acordo com o tipo de roupa, são segundo as empresas entrevistadas: o corte, em que
o tecido é cortado em várias partes, segundo o molde da roupa que será produzida; a lavagem,
que consiste no tingimento do tecido e impressão de detalhes variados; a estamparia, em que
são impressos figuras no tecido; o bordado, em que são gravadas figuras no tecido com o uso
de linha; a montagem, em que as peças de tecido são unidas, dando forma à confecção, e o
acabamento, em que são realizados detalhes e é feito o processo de inspeção da qualidade da
mesma.
4. Metodologia
Um a vez que este artigo tem como objetivo analisar as decisões de manufaturas de
confecções, quanto à terceirização, ou manutenção das atividades sob a própria
responsabilidade, à luz da teoria dos custos de transação, foi utilizado o estudo de caso como
delineamento de pesquisa. Gil (2002) explica que estudos de caso permitem o profundo
estudo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado
conhecimento. Os aspectos que Yin (1994) afirma serem adequados ao uso de estudos de caso
e que estão presentes na realidade desta pesquisa são: o pesquisador possui pouco controle
sobre os fenômenos estudados, não existe distinção clara entre o fenômeno estudado e o seu
contexto; os resultados a serem atingidos poderão apresentar contribuição teórica. Embora o
uso de estudos de caso não seja passível de generalização este tipo de delineamento se mostra
bastante consistente com o tipo de discussão realizada neste artigo. O que permitirá
compreender melhor os meios utilizados pelas empresas de confecção na busca de maior
eficiência.
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista estruturada, que segundo os
moldes de Chizzotti (1991) consiste num roteiro de perguntas previamente estabelecidas.
Foram entrevistadas nas empresas membros da alta gestão, cujas respostas foram gravadas e
posteriormente transcritas para a análise.
As empresas serão doravante denominadas por A, B e C elas possuem
respectivamente 200, 80 e 18 funcionários sendo classificadas respectivamente de porte
médio (que possui entre 101 e 499 funcionários), pequeno (entre 20 e 99) e micro (entre 1 e
19), classificação esta adotada pelo SEBRAE (ver SEBRAE, 2007). A empresa A é dedicada
à produção de roupas femininas, moda casual e de alta costura, a empresa B é especializada
na produção de roupas infantis e a empresa C na moda casual feminina.
transferir uma destas atividades para terceiros; e integração vertical quando a empresa
mantiver sob sua responsabilidade as atividades que a priori não são do seu ramo de atuação.
São consideras atividades inerentemente ligadas: o corte, a montagem e o acabamento, uma
vez que requerem do trabalhador o mesmo nível de habilidade e são básicas para se fabricar a
roupa. Por outro lado as atividades de lavagem, bordado e estamparia são consideradas
ligadas a indústrias adjacentes à indústria de confecção, uma vez que requerem diferentes
níveis de conhecimento, daqueles requeridos na nesta indústria, e pelo fato de não estarem
diretamente ligados à produção básica da confecção.
Utilizando a notação acima o quadro 1 apresenta a abordagem das três empresas para
as atividades de produção de confecções. Este quadro apresenta o tipo de abordagem da
empresa e também a justificativa apresentada para esta escolha. Observa-se que todas as
empresas executam por contra própria o processo de corte do tecido, segundo estas empresas
o corte da roupa por uma empresa terceirizada levaria a um grande fluxo de matérias-primas e
moldes de corte, o que traria grande complexidade operacional e maiores custos de execução
da tarefa, o que inviabiliza a terceirização. Outros aspectos que inviabilizam esta alternativa
são: as empresas A e B possuem equipamentos sofisticados para o corte de várias camadas de
tecido ao mesmo tempo, o que permite ganhos de produtividade nesta tarefa; o controle da
mão-de-obra destinada ao corte permite maior controle sobre a qualidade do produto e
também diminui os riscos de perda de materiais na operação de corte.
O processo de montagem é totalmente mantido pela empresa A, embora reconheça
que a terceirização desta atividade poderia trazer menores custos, a empresa mantêm esta
atividade sob responsabilidade própria dizendo assegurar maior controle da qualidade. Sob a
mesma alegação a empresa C mantêm a montagem das peças de confecção sob sua
responsabilidade e terceiriza apenas a montagem de detalhes da roupa, que segundo
proprietária diminui o risco de comprometer sua qualidade. A justificativa para a terceirização
de toda a montagem pela empresa B e parte deste processo pela empresa C é a redução de
custos. Esta redução ocorre principalmente pelo fato de se transformar um custo fixo em custo
variável. A indústria de confecções tradicionalmente sofre alterações na demanda ao longo do
ano, neste caso ao terceirizar a montagem as manufaturas de confecção eliminam os custos de
se manter pessoal acima do necessário, ou ter que contratar e demitir de acordo com as
variações de demanda. Transferindo esta atividade para ateliês, elas só arcam com custos à
medida que é necessária a montagem da roupa.
O processo de lavagem da confecção da empresa B é realizado por um prestador de
serviço na área, a justificativa destas empresas para esta abordagem é que a incorporação
desta atividade traria subutilização dos ativos destinados a esta tarefa, além do alto
investimento necessário. Uma pequena parte da lavagem da empresa A é executada por uma
empresa especializada e a maior parte é executada por contra própria. A justificativa dada pela
empresa é que a lavagem realizada pela empresa especializada demandaria a compra de
equipamentos especializados, que neste caso seria subutilizado, sendo a melhor alternativa a
prestação deste serviço por outro agente. Já o tipo de lavagem executado internamente ocorre
em grande volume, o que justifica o investimento em equipamentos específicos e torna esta
atividade mais barata internamente. A empresa C não necessita do processo de lavagem da
confecção.
A atividade de estamparia das empresas B e C é realizada por prestadores de serviço
locais, a justificativa para esta abordagem é que a realização por contra própria traria
subutilização dos ativos destinados a esta tarefa. O mesmo aconteceria com a mão-de-obra,
que segundo os entrevistados deve ter know-how específico. Já a empresa A verticalizou esta
tarefa, neste caso a empresa possui volume suficiente nesta operação para realizá-la por contra
própria, sendo esta abordagem mais barata do que a realização deste serviço por uma empresa
prestadora de serviço.
III EMEPRO – Belo Horizonte, MG, Brasil, 07 a 09 de junho de 2007
Acabament
Montagem
Estampari
Lavagem
Bordado
Corte
o
Abordagem Dificuldade de controle operacional da atividade A,
convencional produtiva fora dos limites da empresa. B,
C
O alto volume de operações justifica o investimento em A,
equipamentos próprios e torna a execução atividade B
mais barata internamente.
O controle direto sobre a mão-de-obra permite maior A, A, A,
controle da qualidade. B, C B,
C C
O controle direto sobre a mão-de-obra permite menor A,
risco de perda de materiais. B,
C
A necessidade de conhecimento específico da tarefa B,
(Know-How) não justifica a incorporação da atividade C
frente ao pequeno volume de operações.
O volume de atividades nesta tarefa causaria A, B, A,
subutilização dos ativos, caso ela fosse mantida pela B, C B,
própria empresa. C
Integração O alto volume de operações justifica o investimento em A A
Vertical equipamentos próprios e torna a execução da atividade
mais barata internamente.
Terceirização Transformação de um custo fixo em variável; B,
Diminuição de responsabilidades diretas frente e força C
de trabalho; Diminuição dos custos médios da atividade.
Observação: Entende-se que a abordagem é convencional quando o corte, a montagem e o acabamento são
realizados pela própria empresa; e a lavagem, a estamparia e o bordado são realizados por outras empresas
Quadro 1 – Decisões de verticalização e terceirização das atividades e justificativa das empresas.
acabamento. Entretanto, a realização por conta própria destas atividades pelas empresas
mostra que elas não estão dispostas a se expor aos possíveis riscos de ações oportunistas dos
prestadores de serviço nestas tarefas, o que poderia trazer além de prejuízos financeiros
imediatos, por conta da devolução dos produtos pelos clientes, o prejuízo na reputação da
empresa.
Outra consideração é que empresas de diferentes portes possuem diferentes níveis de
eficiência em relação a realização da atividade por conta própria, ou pelo mercado. Isso pode
ser constatado comparando-se as empresas A com as empresas B e C. Enquanto a primeira
realiza por conta própria a atividade estamparia, as últimas realizam esta atividade por meio
dos prestadores de serviço. Estas últimas por não terem volume suficiente são levadas a pagar
mais por este serviço do que a empresa A. Aqui surge um outro aspecto econômico que
influencia estas empresas, que consiste na escala mínima eficiente, nota-se que diferente das
empresa A, diferente das empresas B e C, possui escala mínima que torna mais vantajosa a
realização desta atividade por contra própria. Dados os diferentes volumes de operação destas
empresas e as diferentes abordagens de execução das tarefas do processo produtivo surge uma
questão: Como é possível para empresas que atuam no mesmo ramo industrial, operarem com
níveis diferentes de eficiência econômica? Uma possível resposta para esta pergunta é que
estas empresas atuam num mercado por demasiado complexo. A indústria de confecção é
marcada por uma grande diversidade de produtos, destinados a públicos com estilos de vida,
classes sociais e idades bastante diversificados. Esta situação aliada ao conceito de
racionalidade limitada torna improvável um processo de decisão completamente racional por
parte do cliente, além do que empresas com menor nível de eficiência podem-se dedicar a
nichos de mercado poucos explorados pelas mais eficientes.
É também interessante notar que as atividades em que ocorreu a integração vertical,
parte da lavagem e toda a estamparia da empresa A, são aquelas intensivas no uso de capital,
enquanto que a terceirização ocorreu naquelas intensivas em mão-de-obra. A partir desta
realidade surge outra questão: Como os ateliês de montagem que fazem uso intensivo de mão-
de-obra que possuem o mesmo nível de qualificação do trabalhador das manufaturas de
confecção, conseguem maior eficiência nesta tarefa? Primeiramente é importante constatar
que os ateliês são na sua maioria micro e pequenas empresas que prestam serviços para várias
manufaturas, ao passo que uma manufatura utiliza os serviços de vários ateliês. Desta forma,
não pode se dizer que estes ateliês conseguem auferir ganhos de escala, provavelmente a sua
maior eficiência ocorra pelos seguintes motivos: primeiramente estes ateliês são
especializados em atividades específicas, conseguindo com isso alta eficiência, em segundo
lugar ao prestarem serviço para várias manufaturas ao mesmo tempo eles conseguem
amortecer a diminuição da procura de um cliente, prestando serviço para outro. Esta situação
dificilmente ocorreria na indústria de confecção, em que uma empresa conseguisse manter
alta taxa de utilização de sua capacidade prestando serviço para um concorrente. Desta forma
ao estarem em um outro elo da cadeia produtiva os ateliês conseguem manter um melhor
relacionamento com as manufaturas de confecções.
7. Conclusão
O presente artigo permite perceber que não são apenas os custos imediatos que tornam
vantajosa a execução de uma determinada atividade pela empresa, mas também os riscos
envolvidos, o que denota que a possibilidade de ações oportunistas também contribui para
reforçar a concentração de atividades na empresa. Observa-se também que o alto nível de
heterogeneidade de algumas indústrias, aliado às limitações do cliente, quanto ao
conhecimento das possibilidades de escolha de um produto, favorece a coexistência de
empresas com diferentes níveis de eficiência. Pode-se observar por meio do tipo de
relacionamento mantido entre os ateliês e as manufaturas de confecção que não são apenas os
III EMEPRO – Belo Horizonte, MG, Brasil, 07 a 09 de junho de 2007
fatores internos que influenciam a eficiência de uma empresa, mas também a sua posição na
cadeia produtiva. Como pôde ser observado os ateliês possuem maior facilidade na prestação
de serviço para empresas da indústria de confecções, do que as próprias empresas entre si.
Estudos posteriores devem ser concentrados na análise da importância da configuração da
cadeia produtiva sobre o tipo de abordagem a ser escolhido para as atividades produtivas.
8. Referências bibliográficas
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