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Anais do IV Colóquio Filosofia e Literatura: Poética São Cristóvão/SE | julho.

2017 | ISBN 978-85-7822-593-3

O repertório poético de Sílvio Romero

Luziane dos Santos1


Mestranda, Educação/UNIT

O estudo apresenta procedimentos poéticos que Sílvio Romero utilizou


em seu livro Cantos do fim do século, analisado apartir da obra de Ângela
Alonso Idéias em movimento: a geração 1870 na crise do Brasil-Império e
da obra de Antonio Candido O método crítico de Sílvio Romero, em que
o autor mostra como Romero supera o romantismo com um posicio-
namento cientifico que permitia que sua obra fosse um produto e não,
apenas literatura. É a partir dessas obras que analisaremos o repertório
filosófico e poético utilizado por Sílvio Romero na composição de seus
poemas nessa obra.

Palavras-chave: Literatura. Repertório. Sílvio Romero.

Introdução

(...) sem ideal e sem tradições impossíveis é formar-se um povo; sem poesia e sem história
não pode haver literatura; poetas e historiadores são os sacerdotes ativos e oficiantes da
alma de uma nacionalidade.

A Poesia de Sílvio Romero é caracterizada de um gênero poético pensado como texto onde
são evidenciadas muito mais que belas palavras, com a finalidade de trazer o leitor para um
novo plano de leitura. Em seu texto “Cantos do fim do século” o autor utiliza ações performá-
ticas para compor seu repertório, em seu prólogo intitulado a “A poesia hoje”, expõe questões
e aspectos da poesia como ela vem sendo construída por outros autores que alcance é dado a
esse fazer poético.

Para a compreensão deste texto, objetivamos apresentar procedimentos poéticos que Sílvio
Romero utilizou em seu livro Cantos do fim do século, analisado a partir da obra de Ângela
Alonso Idéias em movimento: a geração 1870 na crise do Brasil-Império e da obra de Antonio

1.  Universidade Tiradentes, bolsista Procaps I, Orientação da Profa. Dra. Ilka Miglio de Mesquita.

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Candido, O método crítico de Sílvio Romero, em que mostra como Romero supera o roman-
tismo com um posicionamento cientifico que permitia que sua obra fosse um produto e não,
apenas literatura. É partir dessas obras que analisaremos o repertório filosófico e poético
utilizado por Sílvio Romero na composição de seus poemas nesta obra. Para tanto é preciso
fazer uma espécie de perfil biográfico do autor embora não seja o objetivo deste texto. Quem
foi Silvio Romero? Sergipano nascido na vila de Lagarto poeta, escritor, ensaísta, crítico lite-
rário, promotor, professor fez parte da geração de 70 da escola de Direito de Recife, todas as
essas atividades que foram exercidas por Romero foram importantes para a formação de sua
rede de sociabilidade.

Arte poética não se resume apenas em belas palavras, é um gênero que tem o objetivo de sen-
sibilizar o leitor e leva-lo a outro plano de reflexão. Sendo que a poesia apesar de causar tal
sensação ela também é uma forma de manifestação, questionamento e de expor ideias atra-
vés do método e da ação performática e escolhida pelo autor.

Compondo o repertório
Em suas notas Romero nos diz que essa obra sofreu influência de outros autores vamos ob-
servar o trecho a seguir “Os contos do fim do século mostram a influência, até certo ponto,
d’esta inovação da forma; mas o seu espirito é outro e bem diverso” (ROMERO, 1878, p. 240).
Apesar de existir um certo distanciamento entre autores como Tobias Barreto, Castro Alves,
Gonçalves Magalhães na abordagem escrita cada um com sua peculiaridade proporcionou
ao Romero ferramentas para a composição de seu repertório. Essa ambientação fez parte da
construção da ação performática.

Há muitos annos que a pobre litteratura brasileira não assiste ao espetáculo de uma só ideia
aproveitável sendo discutida e acatada, e produzida os fructos a que tem direito incontestá-
vel uma ideia elevada._ Vive, entretanto diariamente a repisar cançadas caduquice, e, o que
é mais apropriado para caracterisa-la, a repelir, como heterodoxo e inacceitável, qualquer
tentamen de insubordinação contra seus preceitos acanhados (ROMERO, 1878, p. 235)2.

Para o autor a literatura brasileira não carregava em si nenhuma originalidade, mas apenas
uma reprodução de obras vindas da Europa, portanto os textos devem carregar um itinerário
que reforce a nacionalidade e não apenas mera reprodução.

No prologo da sua obra Cantos do fim do século, o autor tece comentários sobre a composição
do repertório poético, segundo ele:

A poesia é um resultado da organização humana, nada tem de absoluto, nem de sobrenatu-


ral: nada também de desprezível e de repugnante para nós.

2.  Mantemos a grafia da obra.

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Compreende-se, à luz destas idéas, que todos conhecem, menos certa classe de litteratos,
valor do desconsolo ou do enthusiasmo de se deixam possuir (Romero,VI-VIII).

A composição de uma poesia possui muito mais que versos e rimas, traz em seus versos uma
visão de uma época, ideologias do autor é necessário que a mesma carregue em si ideias ex-
postas pelo autor. Evidente que o pensamento crítico de Sílvio Romero reforça não só como as
ideias fervilhavam, mas como o autor se posicionava diante de situações politicas e literárias.
Vejamos o que Candido afirma:

O pensamento crítico de Sílvio Romero se apresenta como parte duma interpretação social
e como arma de interferência na vida e na cultura. Só podemos avaliar, pois, se levarmos em
conta a sua relação com o momento em que viçou (CANDIDO, 1988, p. 15).

Em seu livro O método crítico de Sílvio Romero Antonio Candido nos mostra a obra como um
produto, que surge das inquietações e de fatores ideológicos que servem como inspiração poé-
tica. “produto como os outros, condicionado pela evolução cultural” (CANDIDO, 1988, p. 102).

João Alexandre Barbosa relata:

O método, entretanto, não se confunde com as técnicas utilizadas para a sua efetivação,
embora exista uma relação metonímica, em que as últimas funcionam como partes opera-
cionais de uma totalidade que é o método. O método é antes uma maneira, uma escolha,
uma maneira de escolha por entre possíveis técnicas do que sua utilização pura e simples
(BARBOSA, 2006, p. 15).

Partindo do que foi exposto fica evidente que o método utilizado pelo autor é determinante
para a construção de seu da sua obra, os textos de Romero trazem em si características do au-
tor, já que ele era um polemista. Portanto “Quanto à poesia e o problema mais geral das con-
cepções literárias. Embora baralhe as acepções literárias e filosóficas dos termos, um esforço
interessante para assumir posição mais inteligente” (CANDIDO, 1988, p. 38).

Na citação abaixo Antonio Candido nos mostra:

Um ensaio do mesmo ano – espécie de teoria científica da poesia –, publicado em jornal


que ignoramos qual seja reproduzido como prefácio dos Cantos do fim do século sob o
título “a poesia de hoje”, revela desembaraço inexistente nos anteriores. Sendo a poesia um
gênero predominante na literatura brasileira de então, não é de espantar que ela tenha o
nosso autor se dirigindo de preferência. Mesmo mais tarde, quando o panorama literário se
mostrava bem mais vasto, ainda tinha pelas questões de poesia um apego de namorado feliz
(CANDIDO, 1988, p. 39).

Nesse ensaio Romero expõe uma serie de criticas ao romantismo evidenciando uma nova
forma de construção poética, pois para o autor seus poemas são caracterizados por terem
traços com a metafísica e isto lhe davam uma característica cientifica. Por outro lado Antonio
Candido na citação abaixo nos diz:

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Sílvio Romero nunca deixou bem clara a sua concepção de poesia. Neste ensaio, um dos
mais explícitos que se escreveu a propósito, defende a autenticidade do lirismo, decla-
rando-o realidade humana autêntica e negando, contra Scherer, que se confunda com o
romantismo. O seu ideal, seria, porventura, o mesmo de Guyau: uma poesia nutrida no
pensamento, usando a alegoria da discrição, mas de um ponto de vista acentuadamente
pessoal (CANDIDO, 1988, p. 41).

Ação performática
O que são as ações performáticas? São os métodos que os autores que os autores encontraram
como forma de divulgação de sua obra. Podemos citar como exemplo as pessoas com quem o
autor se relaciona criando sua rede de sociabilidade. Alguns poemas das páginas 63 à 73 da re-
ferida obra foram publicadas anteriormente nos jornais de Pernambuco antes de compor a obra
e sofreram duras criticas. Essa foi uma das ações das ações performáticas utilizadas pelo autor.
Nem sempre esse tipo de ação era premeditado, mas era muitas vezes o único recurso disponí-
vel na época para divulgação dos textos. Observamos um fragmento do poema o inferno.

X
O Inferno

Grande... em sua fornalha os séculos ardem


A seiva dos rebeldes lá fumaça ;
E sempre o diabo, interprete profundo,
Bebe o licor da vida em negra taça.

E' incêndio voraz... quem disse?... Engano


E' o gênio gastando as excrescencias,
Que a todo vulto athletico sustentam
E gostam de morar nas eminencias.

E todos os gigantes destemidos,


Que se arrojam intrépidos na vida,
Tendo na fronte a pegada do enygma,
Hão de passar por baixo da medida...
(ROMERO, 1878, p.67).

Neste fragmento o autor faz uma expõe uma crítica aos costumes da época e como o conhe-
cimento, sendo que a transformação social ocorria através dos séculos e o conhecimento po-
deria tirar uma nação não civilizada de seu retardamento evolucionista, pois só através da
evolução da cor é que uma sociedade é evoluida, este tipo de pensamento era disceminado
apartir das teorias de evolucianismo social como darwinismo social, spercianismo dentre ou-
tas. Vejamos o que nos diz Lilia Mortiz Schwarcz:

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A critica apo determinismo racial não implicava, portanto, destacar a perspectiva evolutiva.
Os homens continuavam desiguais, porém passiveis de “evolução e perfectibilidade” em
função da ação de um Estado soberano e acima das diferenças não só econômicas como
raciais (2004, p.182.)

XI
As Cruzadas

E' um tumulto divino,


Que traz o destino agora;
Bateu mais forte esta hora
Nos ouvidos do Senhor,
Lá nos lábios do Eremita
Queima a palavra de fogo;
Jérusalem faz um rogo;
Seu manto mostra de dor...

Velha cidade cahida


De seu pedestal de sonhos,
Escrava de olhos tristonhos,
Escuta o passado e vae
Ao Golgotha ver si o tormento,
Negro phantasma implacavel,
De seu crime é perdoavel.
Si Jesus da tumba sae (1878, p. 75).

Neste poema romero utiliza mímese representação da realidade, pois a sociedade do século
XIX era escravocata, em alguns versos o autor faz referência claramente a escravidão, o crime
que ele se refere é a cor, pois o negro nas teorias de evolução social da época diziam que o ne-
gro era inferior nessa categorização de evolucionismo racial.

Podemos observar que as ações perfomaticas utilizadas por Sílvio Romero foram determi-
nates para a propagação de suas obra e também para construção de se repertório (...) “é uma
caixa de ferramentas intelectual, um conjunto de recursos disponíveis que podem ser selecio-
nados e articulados para a luta política.!” (ALONSO, 2002, p. 18).

Alonso em seu livro Ideias em movimento: a geração de 1870 na crise do Brasil Império apre-
senta as ideias que circulavam na geração de 70 e como a rede de sociabilidade foram impor-
tantes para a disseminação destas. As teorias estrangeiras favoreceram a construção do movi-
mento abolicionista, as ideias eram compreendidas e apropriadas e trazidas ao Brasil, porém
eram vistas de modos diferentes, pois na construção do repertório a performance do sujeito é
importante para a sua criação. Só o sujeito não constrói o repertório é preciso de uma rede de
sociabilidade para que o mesmo seja criado e posto em atividade. O conceito de repertório é
composto de padrões analíticos, noções argumentos, teorias, esquemas e formas estilísticas,
a categoria do repertório é dada pelo sujeito através das experiências. A autora no mostra que:

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Repertório intelectual o fenômeno de adoção de teorias científicas e liberais na crise do


império pode ser redefinido como um movimento político-intelectual de contestação for-
mado por grupos sociais díspares em origem social, mas em comunidade de situação diante
do status quo imperial: politicamente marginalizados (ALONSO, 2002, p.101).

Conclusão
Em vista de tudo que foi exposto e da leitura das obras citadas foi possível analisar que existiu
uma espécie de transição na forma de escrita de Sílvio Romero, pois ele era um crítico muito
polêmico em sua época. Através de leituras ele sofreu influências de teorias como o darwi-
nismo social e outras que foram importantes na construção do pensamento de romeriano,
suas ideologias eram expostas claramente em seus textos dando movimento as estes. Em
seu repertório poético Romero também traz suas especificidades e expõe que por expor uma
análise metafisica seus poemas publicados em Cantos do fim do século possui um caráter
cientifico sobressaindo do romantismo.

Podemos concluir que período em que esteve na escola de Direito de Recife influenciou
em suas ações performáticas e também em sua rede de sociabilidade. Apesar de ser pu-
blicado anos depois de ser escrito e por sofrer duras críticas, este livro mostra um lado di-
ferente de Sílvio Romero com palavras estruturadas e menos agressivo que outros textos
que o autor escreveu.

Referências
ADORNO, Sergio. Os aprendizes do poder. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1988.

ALONSO, Ângela. Ideias em movimento: a geração de 1870 na crise do Brasil Império. São Paulo: Paz e
Terra, 2002.

CANDIDO, Antonio. O método crítico de Sílvio Romero. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 1988.

ROMERO, Sílvio. Oito anos de jornalismo_ II: Cantos do fim do século (1869-1873). Rio de Janeiro,
Tipografia Fluminense, !878.

PRADO, Antonio Arnoni. Sílvio Romero (a crítica e o método). Literatura e Sociedade, São Paulo, n. 11, p. 96-
110, june 2009. ISSN 2237-1184. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/ls/article/view/24787/26647>.
Acesso em: 07 july 2017. doi:http://dx.doi.org/10.11606/issn.2237-1184.v0i11p96-110.

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ção o arquivo da citação ABNT), 2, jul. 2013. Disponível em: <http://www.revistartj.org.br/ojs/index.php/
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SIRINELLI, Jean François. Os intelectuais. In: REMOND, René (Org.). Por uma história política. Rio de
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SCHWARCZ, Lilia Mortiz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil (1870-
1930). São Paulo: Companhias das Letras, 1993.

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