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9 Massa pélvica

(massas uterinas e anexiais benignas)

Sem o consentimento prévio por escrito do editor, não se pode reproduzir nem fotocopiar nenhuma parte desta publicação   © Permanyer Portugal 2011
Ana Rosa Costa

Quando no exame ginecológico encontra- 1.1.1 CLASSIFICAÇÃO


mos uma massa pélvica é importante fazer
a distinção entre a origem uterina – leio- Os leiomiomas podem localizar-se a qual-
miomas – ou anexial e, neste caso, fazer o quer nível do músculo uterino e são habitu-
diagnóstico de provável benignidade e da almente classificados segundo a sua locali-
origem ovárica ou tubária. A orientação te- zação anatómica (Fig. 1):
rapêutica depende do diagnóstico, da sin- — Submucosos: localizados por baixo do en-
tomatologia e da idade da mulher e do seu dométrio, crescem para o lúmen uterino,
desejo de preservar a fertilidade. podendo exteriorizar-se pelo canal cervi-
cal ou pela vagina (abortamento de mio-
ma), associados a subsequente ulceração
1. MASSAS UTERINAS BENIGNAS e infecção e, em situações raras, podem
provocar inversão uterina (Fig. 2).
1.1. LEIOMIOMAS — Intramurais ou intersticiais: situados na
espessura do miométrio.
Os leiomiomas, também designados por — Subserosos: localizados por baixo da se-
«fibromas» ou «miomas», são os tumores be- rosa podendo tornar-se pediculados e
nignos mais frequentes do aparelho genital confundir-se com tumor do ovário (Fig.
feminino, podendo estar presentes em 20 a 3). Quando este adquire irrigação de ou-
25% das mulheres em idade fértil, sendo três tros órgãos intra-abdominais, mais fre-
vezes mais frequentes na raça negra1,4. quentemente do omento ou mesentério,
A incidência varia com a idade, sendo que perdendo a irrigação sanguínea prove-
a probabilidade de ser diagnosticado um niente do útero, ocorre atrofia e reabsor-
leiomioma aumenta até aos 50 anos e de- ção do pedículo e passa a designar-se
pois diminui1,7. por mioma parasita1.
São neoplasias benignas desenvolvidas a Os miomas subserosos laterais que se de-
partir de uma única célula muscular lisa (ori- senvolvem entre os folhetos anterior e pos-
gem monoclonal), contendo também tecido terior do ligamento largo são designados
conjuntivo, estando bem circunscrito no miomas intraligamentares1. Estes podem
miométrio apesar de não possuírem cápsula comprimir o uréter ou comprometer a irri-
(pseudocápsula). gação sanguínea pélvica.
Em geral são múltiplos, cada um com origem
monoclonal independente, e as suas dimen- 1.1.2. PATOGENIA
sões variam de poucos milímetros a grandes
massas, provocando distorção da superfície Os leiomiomas são tumores hormonodepen-
ou da cavidade uterina. dentes, sendo os estrogénios o maior estímulo

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Mioma subseroso

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Mioma submucoso

Mioma intramural

Figura 1. Classificação anatómica.

ao seu crescimento, facto este demonstrado ligeiro aumento de risco com o consumo
pelo seu aparecimento após a puberdade, de bebidas alcoólicas. A dieta rica em vege-
crescimento durante a gravidez (a gonado- tais verdes parece protectora e a dieta com
tropina coriónica humana [HCG] pode ser grande quantidade de carne foi associada
responsável pelo rápido crescimento na gra- a aumento de incidência de miomas. Dado
videz) e regredirem na pós-menopausa. Fac- que a dieta é um componente essencial do
tores de risco como a obesidade e menarca estilo de vida, pode haver contudo outros
precoce também suportam o papel dos estro- factores implicados.
génios no desenvolvimento dos miomas1,4,7. A maior incidência que se verifica na raça
Os estrogénios actuam directamente estimu- negra sugere um componente genético na
lando a proliferação celular e indirectamente patogénese dos miomas4.
promovendo a acção da progesterona, pro- Estudos em gémeos também sugerem uma
vavelmente pelo aumento da expressão de predisposição genética para os leiomiomas,
citocinas mitogénicas e factores de cresci- sendo duas vezes maior a correlação no gé-
mento nos leiomiomas2,3. meos monozigóticos do que nos dizigóticos5.
Os hábitos tabágicos parecem diminuir o ris- Foi demonstrada uma associação entre a
co de aparecimento de miomas pela associa- tensão arterial diastólica e a incidência de
ção com baixos níveis de estrogénios4. miomas. O aumento da tensão arterial dias-
Não foi demonstrada associação com o tólica pode provocar alterações ou aumen-
consumo de cafeína, mas verificou-se um to de citocinas no músculo liso promovendo

148 Capítulo 9
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Área de degenerescência quística

Figura 2. Inversão uterina. Figura 3. Leiomioma subseroso pediculado.

o crescimento dos miomas, sendo tanto tamanho ou alterações degenerativas con-


maior o risco quanto mais elevada a tensão comitantes1,8 (Quadro 1).
arterial6.
Antecedentes de doença inflamatória pél- Sintomatologia
vica aumentam o risco de miomas, sendo Os sintomas mais frequentes são as altera-
este tanto maior quanto maior o número de ções menstruais. A hemorragia menstrual
episódios infecciosos. A irritação intra-ute- excessiva é frequentemente o único sinto-
rina parece contribuir para o aparecimen- ma, apresentando-se como menorragia ou
to e crescimento dos miomas. Doenças de hipermenorreia. A metrorragia não é carac-
transmissão sexual que afectam sobretudo terística dos miomas e deve fazer-nos pensar
os genitais externos (condilomas vulvares e em patologia do endométrio. A hemorragia
herpes) não mostraram qualquer associação excessiva pode eventualmente causar ane-
com os leiomiomas7. mia por deficiência em ferro. As mulheres
com hemorragia anormal têm mais provavel-
1.1.3. CLÍNICA mente miomas intramurais ou submucosos.
A causa da hemorragia excessiva foi relacio-
A maioria dos miomas é assintomática, cerca nada com alterações vasculares do endomé-
de 62% de mulheres com miomas sintomáti- trio por efeito obstrutivo da vascularização
cos têm múltiplos sintomas que usualmente uterina com ectasia das vénulas no caso dos
se correlacionam com a localização, número, miomas intramurais. Outro factor implica-

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 149


Quadro 1. Sintomatologia consequente de leiomiomas

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Assintomáticos

Hemorragia uterina anormal

Menorragia/hipermenorreia

Anemia

Massa pélvica

Pressão pélvica

Polaquiúria

Incontinência urinária

Dificuldade na micção

Hidronefrose

Obstipação

Tenesmo

Pressão rectal

Algias pélvicas

Disfunção reprodutiva

Infertilidade

Alterações relacionadas com a gravidez

Crescimento dos miomas

Degenerescência vermelha e dor

Abortamento

Associações raras

Ascite

Policitemia

Síndrome familiar com ca. renal

Metastização benigna

Leiomiomatose endovenosa

do parece ser o aumento do tamanho da coso pediculado pode parir através do colo
cavidade uterina e da área do endométrio. resultando em hemorragia e necrose.
A hipermenorreia pode ser agravada pela O tamanho do útero miomatoso é descrito
presença de endometrite que é um achado em semanas como no útero gravídico, por
histológico frequente no endométrio subja- exemplo mais de 12 semanas. Útero maior
cente aos miomas submucosos. Apesar de que 12 semanas pode ser palpado no exame
ser uma ocorrência rara, um mioma submu- abdominal, exercendo um efeito de massa,

150 Capítulo 9
com pressão sobre os órgãos adjacentes, es- volumosos miomas intramurais, pode inter-
pecialmente o aparelho urinário e rectossig- ferir com o transporte de esperma e implan-
móide. As manifestações associadas incluem tação embrionária. Os miomas intramurais

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aumento da frequência miccional, obstrução podem também obstruir os óstia tubares ou
ureteral com hidronefrose, dificuldade na o segmento intramural das trompas9,10.
micção, obstipação ou tenesmo no caso de Efeito da gravidez nos miomas: quando se
miomas da parede posterior e pressão rectal observa um aumento no tamanho, o cresci-
por encarceramento do útero miomatoso no mento ocorre na gravidez precoce e depois
fundo de saco ou pela presença de volumo- permanecem estáveis ou diminuem. O maior
so mioma da face posterior. aumento ocorre antes da 10.a semana de
A dismenorreia pode estar presente quando o gestação. Numa série de 113 grávidas mio-
fluxo menstrual aumenta, mas a dor não é um mas menores que 5 cm mostraram aumento
sintoma frequente. A dor pode associar-se à de tamanho e os maiores diminuição, duran-
torção no caso de miomas pediculados (Fig. 4), te o segundo trimestre, e todos diminuíram
dilatação cervical provocada por mioma sub- no terceiro trimestre11. A maioria dos mio-
mucoso, degenerescência vermelha (maioria mas maiores que 5 cm tende a permanecer
associada a gravidez). Nestas situações, a dor estável ou a diminuir durante a gravidez12.
é usualmente aguda sendo necessário o diag- Degenerescência vermelha e dor: a ne-
nóstico diferencial com outras situações como crobiose pode provocar dor, que também
por exemplo gravidez ectópica, apendicite, pode resultar da torção ou impactação do
torção ovárica ou doença inflamatória pélvica mioma (Figs. 4 e 5).
aguda. Miomas do ligamento largo podem Complicações obstétricas: a localização dos
provocar dor pélvica unilateral ou ciatalgia. miomas pode ser importante pelo seu efeito
Actualmente nos países industrializados, a na gravidez. Aqueles localizados adjacen-
idade de planeamento da primeira gravidez tes à placenta associam-se a maior risco de
está a aumentar para idades entre os 30 e os metrorragia do primeiro trimestre, desco-
40 anos, pelo que a existência de miomas é lamento precoce da placenta normalmen-
provável nestas mulheres que pretendem te inserida (DPPNI) e rotura prematura de
engravidar e o papel dos miomas como cau- membranas (RPM)13. Apresentação pélvica,
sa de infertilidade é ainda matéria de debate. trabalho de parto prolongado e aumento da
Os potenciais mecanismos envolvidos são: taxa de cesarianas estão também associados
— Alterações endometriais interferindo com à presença de miomas.
a implantação. A transformação maligna é extremamente
— Alterações do fluxo sanguíneo subendo- rara, deverá ser considerada esta hipótese
metrial provocada pelos miomas afec- na mulher pós menopausa com massa pélvi-
tando negativamente a receptividade do ca, metrorragia e algias pélvicas, sendo mui-
endométrio. to importante a realização de RM.
— Deformidade e aumento da cavidade Ligação ao omento: mioma parasita, com
uterina interferindo com o transporte do possibilidade de torção e obstrução dos va-
esperma. sos do omento, transudação de fluido e de-
— Contractilidade uterina disfuncional e al- senvolvimento de ascite.
terada interferindo com o transporte dos Policitemia secundária relacionada com ní-
gâmetas e implantação embrionária. veis elevados de eritropoietina e que resolve
— Obstrução dos óstia tubares por efeito com a histerectomia.
de massa. Metastização benigna dos miomas com leio-
A presença de miomas submucosos ou a dis- miomatose endovenosa que se pode esten-
torção da cavidade endometrial induzida por der até ao coração.

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 151


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Face posterior do útero,
histerorrafia de cesariana

Mioma pediculado do
corno uterino direito

Figura 4. Torção uterina na gravidez provocada por mioma.

Histerorrafia pós
miomectomia

Histerorrafia de cesariana, Anexo


Anexo parede posterior direito
esquerdo

Figura 5. Cicatriz de cesariana e miomectomia.

152 Capítulo 9
1.1.4. DIAGNÓSTICO 1.1.5. TRATAMENTO

A anamnese é sugestiva da existência de O tratamento depende do número, tamanho

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mioma, mas o exame ginecológico com o e localização dos leiomiomas, bem como da
toque bimanual permite identificar o au- idade da mulher, do seu estado de saúde,
mento do volume uterino ou a existência desejo de preservar a fertilidade e dos sinto-
de tumefacção no hipogastro de consis- mas associados. A atitude poderá ser expec-
tência dura, geralmente indolor, muitas tante no caso de pequenos miomas assinto-
vezes de contornos irregulares, e a mobili- máticos, com vigilância periódica.
zação do colo uterino transmite-se a toda
a massa (o que nem sempre sucede nos Tratamento médico
quistos do ovário). Existem várias opções de tratamento médi-
A ecografia transvaginal14 é o gold standard co cujo principal objectivo é a redução tem-
para avaliação da cavidade pélvica. A eficá- porária do volume uterino e tamanho dos
cia depende do operador e é imprecisa no miomas, já que é frequentemente ineficaz
diagnóstico diferencial entre leiomiomas, na eliminação dos miomas e na prevenção
leiomiossarcomas e adenomiose. A histe- das recorrências. O tratamento médico ba-
rossonografia melhora a sensibilidade na seia-se no facto de a concentração de recep-
detecção dos miomas submucosos15 e a tores de estrogénios e progestagénios ser
ecografia abdominal pode ser útil nas situ- maior nos miomas do que no miométrio, e
ações de úteros volumosos. A histerosco- também no facto de a actividade prolifera-
pia é uma técnica diagnóstica e terapêutica tiva e mitótica nos miomas ser superior na
particularmente útil nos casos de miomas fase secretora16.
submucosos.
A RM tornou-se um meio complementar da Tratamento com estrogénios
ecografia superando algumas limitações e progestativo
técnicas desta, dando informação precisa Estroprogestativos em combinação ou os
dos subtipos, sendo a modalidade mais progestativos isoladamente, são frequen-
precisa no diagnóstico, mapeamento e ca- temente a primeira linha de tratamento de
racterização dos leiomiomas usando as se- mulheres com miomas e hemorragia uteri-
quências T2 (Fig. 6). na anormal, pela atrofia e estabilização do
endométrio. Esta é uma medida temporária
que não reduz o tamanho dos miomas. Os
anticoncepcionais orais melhoram a menor-
ragia e não provocando crescimento dos
miomas. Estudos com progestativos mostra-
ram resultados variáveis com amenorreia, re-
solução ou melhoria da hemorragia, aumen-
to dos níveis de hemoglobina e diminuição
do volume dos miomas17.

Agonistas GnRH
(Gonadotropin-releasing hormone)
Provocam um estado de hipoestimulação
resultando em amenorreia e diminuição do
tamanho do útero e miomas, mais pronun-
Figura 6. RM: volumoso mioma intramural. ciado ao fim de três meses1,18. A desconti-

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 153


nuidade na administração frequentemente Inibidores da aromatase
resulta no crescimento dos miomas para o É uma terapêutica promissora para mio-
seu volume original. Após terminar o trata- mas pelo seu efeito hipoestrogénico rápi-

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mento com agonistas GnRH a menstruação do, e a possibilidade de iniciar o tratamen-
recomeça em 4 a 10 semanas e o tamanho to em qualquer altura do ciclo menstrual.
do útero aumenta para níveis pré trata- Pelo efeito diferenciado na produção de
mento em três a quatro semanas. O rápido estrogénios pelo ovário e pelos miomas,
crescimento é consistente com o facto de a os inibidores da aromatase podem actuar
diminuição do tamanho não ser por efeito preferencialmente provocando diminuição
citotóxico. Também suprimem a expressão do volume dos miomas sem causar hipo-
da aromatase P450 nas células dos miomas, estrogenismo e os consequentes efeitos
diminuindo a produção de estrogénios in adversos21.
situ, contribuindo assim para a diminuição
do volume dos miomas. Moduladores dos receptores
Os sintomas provocados pelos miomas, de esteróides
como hemorragia, pressão e dor pélvica, Os moduladores selectivos dos receptores
melhoram com a terapêutica com agonistas de estrogénios (SERM) são agentes não-es-
GnRH, contudo os efeitos secundários re- teróides que se ligam aos receptores de es-
sultantes do hipoestrogenismo (sintomato- trogénio e têm efeito agonista ou antagonis-
logia vasomotora, cefaleias, secura vaginal, ta dependendo do tecido-alvo. O raloxifeno
depressão e desmineralização óssea) tor- não tem actividade agonista no endométrio.
nam esta terapêutica inapropriada para uso Na dose de 60 mg/dia associada a agonistas
prolongado, sendo um tratamento preferen- da GnRH, mostrou diminuição significativa
cial para mulheres na perimenopausa ou no no volume do útero e miomas, com melho-
período pré-operatório, no caso de anemia, ria de todos os sintomas relacionados com
para melhorar o hematócrito e diminuição estes, não havendo alteração na densidade
do volume uterino tornando assim possível mineral óssea, parecendo assim um trata-
o uso de incisão cutânea transversal, em vez mento promissor nas mulheres na pré-me-
da incisão vertical, ou permitindo a aborda- nopausa. Os sintomas mais frequentes fo-
gem por via vaginal e reduzindo a perda he- ram os afrontamentos22.
mática intra-operatória.
Moduladores dos receptores
Antagonistas da GnRH de progesterona
Bloqueiam os receptores hipofisários da O mifepristone, antiprogestativo (na dose
GnRH provocando um declínio imediato da de 25 a 50 mg/dia), reduz o número de re-
FSH (Follicle-stimulating hormone) e LH (lu- ceptores de progesterona nos miomas e no
teinizing hormone). Foram estudados dois miométrio, inibindo o ciclo ovárico, manten-
antagonistas (ganirelix e cetrorelix), mas do um estado hormonal similar ao da fase
são necessários mais estudos para avaliar folicular precoce e afectando a vascularização
o uso pré-operatório e o comportamento dos miomas. A hiperplasia endometrial pode
dos miomas após descontinuidade no tra- limitar o seu uso prolongado23.
tamento. É necessário também, nos mio-
mas, comparar a resposta dos antagonistas Moduladores selectivos
versus agonistas19,20. dos receptores de progesterona
Os efeitos secundários mais frequentes são Os SPRM exibem actividade agonista e anta-
as cefaleias e afrontamentos, que melhoram gonista com uma alta especificidade para os
após descontinuidade da medicação. receptores de progesterona e selectividade

154 Capítulo 9
tecidual. Asoprisnil é capaz de suprimir a Embolização das artérias uterinas
hemorragia uterina, inibindo o crescimento A embolização das artérias uterinas é uma
dos miomas, sem afectar a produção de es- alternativa terapêutica à cirurgia no trata-

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teróides ováricos24. mento dos miomas. Os seus resultados a
curto prazo são encorajadores. Deve ser
Terapêutica androgénica considerada em mulheres com miomas sin-
Dois medicamentos, danazol e gestrino- tomáticos a quem de outra forma seria acon-
na, foram estudados para o tratamento de selhada cirurgia mas que não são candidatas
miomas. O danazol é um derivado da 19- a cirurgia por condições médicas associadas
nortestosterona que inibe a secreção hi- ou que não aceitam a cirurgia.
pofisária de gonadotrofinas e a produção É particularmente útil no tratamento de mio-
de esteróides ováricos. O seu efeito é pre- mas intramurais27. Produz alterações isquémi-
dominantemente androgénico, com mo- cas nos miomas com consequente redução
derado efeito progestativo, e propriedades do volume uterino do mioma e melhoria sig-
antiprogestativas e antiestrogénicas. A sua nificativa dos sintomas e qualidade de vida.
eficácia no tratamento dos miomas deve-se A melhoria sintomática pode ser importan-
ao seu efeito hormonal e vascular, persis- te sem alterações marcadas no tamanho do
tindo o efeito após terminar o tratamento. mioma. Pode ser realizada sob analgesia ev.
Os efeitos androgénicos, como aumento ou epidural. Através da cateterização de uma
de peso, edemas, diminuição do volume artéria femoral, realiza-se uma arteriografia
mamário, acne, oleosidade da pele, cãibras, pélvica para definir a árvore vascular (Fig. 7).
afrontamentos e disfunção hepática, são Alterações anatómicas, espasmo arterial ou
efeitos secundários que limitam o seu uso o uso de agonistas GnRH podem dificultar a
terapêutico25. A gestrinona é um derivado cateterização das artérias. Também podem
da etinil-nortestosterona, com proprieda- ocorrer falhas pela perfusão uterina através
des antiestrogénicas e antiprogestagéni- da circulação colateral ovárica. Mesmo a em-
cas. É empregue por via oral ou vaginal nas bolização incompleta pode produzir enfarte
doses de 2,5 a 5 mg duas a três vezes por eficaz dos miomas com menos dor após o
semana, durante 4 a 24 meses. O seu uso procedimento. O procedimento demora cer-
associa-se a aumento de peso, seborreia, ca de uma hora, sendo a quantidade de radia-
acne, mialgias e artralgias. ção idêntica à de dois enemas com bário.

Sistema intra-uterino com levonorgestrel


é eficaz no tratamento da menorragia com
poucos efeitos colaterais e alta satisfação
das utilizadoras. Os efeitos colaterais do-
cumentados são hemorragia irregular, ce-
faleias, náuseas, mastalgia, acne, quistos
funcionais do ovário, depressão, aumento
de peso e algias pélvicas. Tem indicação se
o útero não tiver um tamanho superior a 12
semanas de gravidez (inferior a 11 cm de
histerometria). O efeito benéfico do levo-
norgestrel (LNG) intra-uterino é inexplicado
contrastando com os estudos que indicam
um efeito promotor de crescimento com os Figura 7. Angiografia pélvica para embolização das
progestativos26. artérias uterinas.

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 155


As cólicas uterinas podem ser intensas, mas Tratamento cirúrgico
habitualmente melhoram com anti-inflama- Existe a possibilidade de novo crescimen-
tórios não-esteróides (AINE). to dos miomas após tratamento médico. A

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A «síndrome pós-embolização» com febre, leu- cirurgia permanece como tratamento stan-
cocitose por necrose do mioma, associado a dard para os grandes miomas sintomáticos.
náuseas, vómitos e anorexia, pode ocorrer em
até 15% das mulheres submetidas à técnica. Tratamento cirúrgico conservador
A RM é a técnica de imagem de escolha na A miomectomia é o tratamento cirúrgico de
avaliação dos miomas antes e após emboli- eleição em mulheres que desejam preservar
zação, para comparação do tamanho pré e a fertilidade ou que desejam conservar o
pós-tratamento, podendo identificar a exis- útero. A miomectomia por via abdominal é
tência de outras patologias que podem in- o procedimento de escolha no caso de mio-
fluenciar ou contra-indicar esta modalidade mas volumosos (> 10 cm) (Fig. 8), quando é
terapêutica28,29. necessária a remoção de vários miomas ou
As contra-indicações absolutas para o pro- quando existe patologia concomitante que
cedimento são: gravidez, infecção pélvica e envolva cirurgia major. A incisão transversa é
suspeita de cancro uterino ou ovárico. Como frequentemente satisfatória, podendo tentar-
contra-indicações relativas temos: coagulo- se pequenas incisões se o útero miomatoso
patias, radioterapia pélvica prévia, desejo de não está aderente às estruturas adjacentes
preservar fertilidade, pelo facto da função e pode ser facilmente mobilizado e extraído
ovárica poder ficar comprometida, e imu- através da incisão abdominal. A mulher deve
nossupressão. ser informada da possibilidade de conversão

Figura 8. Miomectomia.

156 Capítulo 9
do procedimento para histerectomia no caso triomas e abcessos tubo-ováricos são tam-
de complicações intra-operatórias. Em alguns bém massas anexiais benignas de origem
casos, a miomectomia pode ser realizada por não neoplásica31,32 (Quadro 2).

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via laparoscópica (celioscópica), tendo como A maioria dos tumores benignos do ovário
vantagem a recuperação mais rápida. A re- é assintomática e consequentemente são
moção do mioma da cavidade peritoneal é detectados como massa pélvica num exame
realizada através da morcelação electromecâ- ginecológico de rotina ou por ecografia re-
nica do mioma. A morbilidade pós-operatória alizada por outros motivos (sendo frequen-
é menor e a taxa de gravidez e recorrência são temente achados incidentais). Ocasional-
idênticas à da miomectomia por laparotomia. mente podem causar sintomas pelo efeito
Se o mioma é predominantemente submu- de massa, compressão vesical ou rectal, por
coso pode ser abordado por via vaginal e complicações (rotura ou torção) ou, no caso
deverá ser removido por histeroscopia. Mio- de tumores funcionais, pela produção hor-
mas muito volumosos (> 4-5 cm) e aqueles monal, podendo provocar metrorragias pós-
que não têm mais de 50% de protusão para menopausa ou irregularidades menstruais
a cavidade, não são bons candidatos para re- ou mesmo sinais sistémicos.
moção histeroscópica. O risco de recorrência Podem confundir-se com tumores malignos,
após miomectomia é substancial, sendo fac- e apesar de a ecografia ser a primeira técnica
tores preditivos de recorrência a existência de de imagem para investigar massas pélvicas,
miomas múltiplos e a nuliparidade30. a RM é capaz de identificar diferentes tipos
A histerectomia é o tratamento cirúrgico de- de tecidos existentes, ajudando no diagnós-
finitivo para miomas uterinos sintomáticos, tico diferencial entre massa anexial benigna
indicada nos casos de úteros volumosos com e maligna com uma sensibilidade de 88 a
múltiplos miomas, em que a mulher já não 93% no diagnóstico de malignidade33,34.
deseja preservar a fertilidade. A histerectomia A idade é provavelmente o factor mais impor-
elimina os sintomas e o risco de recorrência. tante para determinar o potencial de malig-
A indicação para histerectomia abdominal é nidade. Na pré-menarca e pós-menopausa,
primariamente a presença de outra patolo- qualquer massa anexial deve ser considerada
gia pélvica. A histerectomia vaginal está in- anormal e prontamente investigada.
dicada no caso de miomas sintomáticos em O doseamento do CA125 para avaliação pré-
úteros móveis que descem facilmente e não operatória e diagnóstico diferencial entre
são muito volumosos, depende da experiên- massas anexiais benignas e malignas é con-
cia do cirurgião e deve ser tida em atenção troverso. Depende do valor e da idade da
a eventual necessidade de morcelação/enu- mulher, sendo que em mulheres jovens (<
cleação dos miomas mais volumosos. 50 anos) pode estar aumentado nos casos de
endometriose. Um valor superior a 300 U/ml
está habitualmente associado a malignidade
2. MASSAS OVÁRICAS BENIGNAS mesmo em mulheres jovens35.
O conhecimento da causa, apresentação e
Cerca de 80% das massas anexiais são be- história natural ajuda no aconselhamento e
nignas. A maioria é de causa fisiológica, tratamento apropriado destas doentes.
por alterações no crescimento e maturação
folicular – quistos funcionais. Outras têm 2.1. QUISTOS FUNCIONAIS
origem no epitélio da superfície do ovário
(tumores epiteliais), nas células do estroma Os quistos funcionais são muito frequen-
ou nas células germinativas. Os endome- tes nas mulheres em idade reprodutiva, a

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 157


Quadro 2. Massas anexiais benignas

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Quistos funcionais

Folicular

Corpo amarelo

Teca-luteínico

Neoplasias benignas

Epiteliais:

Cistadenoma seroso

Cistadenoma mucinoso

Tumor de Brenner (células de transição)

Células germinativas:

Teratoma quístico maduro ou quisto dermóide

Struma ovarii

Células do estroma:

Tecomas

Fibromas

Outras lesões

Endometrioma

Hidrossalpinge

Abcesso tubo-ovárico

Quistos do para-ovário

maioria não é detectada, alguns são diag- ria desaparece em 60 dias sem qualquer
nosticados quando se tornam sintomáticos, tratamento. Têm diâmetro variável entre 3
por torção, hemorragia ou num exame físi- e 8 cm, podendo ser múltiplos e aparecer
co de rotina. em ambos os ovários. São mais frequentes
em mulheres portadoras de implante con-
2.2.1. QUISTOS FOLICULARES traceptivo com etonogestrel e de sistemas
intra-uterinos com LNG.
Os quistos foliculares são consequência do Os quistos foliculares aparecem em mulhe-
desenvolvimento exagerado de um folículo res em idade fértil, com actividade ovárica.
e reflexo das alterações na produção e actu- A maioria é assintomática e são detectados
ação das gonadotrofinas resultando da au- ocasionalmente num exame de rotina. Os de
sência de ovulação e continuação do cresci- maiores dimensões podem manifestar-se por
mento folicular. Dependem da estimulação dor pélvica ou dispareunia profunda, geral-
gonadotrófica e por isso devem regredir es- mente localizada à região anatómica do ová-
pontaneamente após o cataménio. A maio- rio afectado. Podem sofrer rotura sintomática

158 Capítulo 9
ou torção. O diagnóstico confirma-se com blasto), o corpo amarelo continua a crescer
ecografia ginecológica que permite avaliar nas primeiras semanas de gravidez, poden-
as dimensões, superfície, conteúdo e vascu- do atingir dimensões que variam entre 3 e

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larização. Em casos sintomáticos, sobretudo 11 cm. A maioria dos luteomas da gravidez
quando se tem de fazer o diagnóstico dife- é um achado incidental durante a realização
rencial com gravidez ectópica, endometrio- de uma cesariana. São provavelmente uma
ma ou abcesso tubo-ovárico, a laparoscopia hiperplasia não-neoplásica dependente da
permite o diagnóstico definitivo. estimulação da gonadotrofina coriónica e
Pelo facto de ocorrer resolução espontânea há, habitualmente, regressão após o parto,
na maioria dos casos é de considerar uma ati- pelo que a excisão cirúrgica durante a cesa-
tude expectante com controlo da evolução riana não é necessária35.
cerca de oito semanas após o diagnóstico, Podem associar-se a torção do ovário cau-
para constatar se houve ou não regressão. sando dor no hipogastro e fossa ilíaca cor-
O uso de anticoncepcionais orais é frequen- respondente. A rotura de um quisto hemor-
temente recomendado mas os estudos mais rágico pode provocar um hemoperitoneu e
recentes não demonstram uma resolução irritação peritoneal, mimetizando a rotura
mais rápida quando comparado com a atitu- de uma gravidez ectópica. Tal como os quis-
de expectante36. tos foliculares, habitualmente regridem em
A aspiração de quistos do ovário tem sido cerca de dois meses. No caso de torção ou
proposta por investigadores em casos selec- rotura com hemoperitoneu, tem indicação
cionados de quistos simples e persistentes, para laparoscopia/laparotomia exploradora.
com valores de CA125 normal e sem história
familiar de cancro do ovário. 2.2.3. QUISTOS TECALUTEÍNICOS
O tratamento cirúrgico está indicado no caso
de dúvida diagnóstica, na persistência do Aparecem no caso de níveis elevados de
quisto, na torção ovárica ou se a mulher estiver gonadotrofina coriónica, por exemplo, no
sintomática. Os quistos devem ser excisados caso de mola hidatiforme e coriocarcinoma,
preservando o restante ovário com dissecção e em mulheres a fazer tratamento com HCG
cuidadosa. A via laparoscópica pode ser uma ou citrato de clomifeno. Ocorrem raramen-
opção com a vantagem cosmética e de rápida te no caso de gravidez normal. Usualmente
recuperação pós-operatória da cirurgia mini- são bilaterais. Os sintomas abdominais são
mamente invasiva, aspectos muito importan- mínimos, podendo ser descrita uma sensa-
tes, principalmente nestas mulheres jovens37. ção de peso pélvico, e a rotura de um quisto
pode provocar hemorragia intraperitoneal.
2.2.2. QUISTO DO CORPO Desaparecem espontaneamente com a ter-
AMARELO/LUTEOMA GRAVÍDICO minação da gravidez molar, tratamento do
coriocarcinoma ou paragem do tratamen-
Só aparecem em mulheres que ovulam. For- to da infertilidade, contudo esta resolução
mam-se quando a regressão das células luteí- pode demorar meses.
nicas do corpo amarelo está atrasada. Têm am- A cirurgia está indicada no caso de ocorrer
bos o mesmo significado clínico. Pode ocorrer torção ou hemorragia.
hemorragia intraquística – corpo amarelo
hemorrágico ou hematoma do corpo amarelo 2.3. TUMORES EPITELIAIS
– (podendo confundir-se com um endome-
trioma) ou rotura para a cavidade pélvica. São as neoplasias benignas mais frequentes.
Em caso de gravidez (pelo estímulo da go- Derivam da superfície do ovário que tem
nadotrofina coriónica produzida no trofo- origem no epitélio celómico (mesotélio) da

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 159


gónada embrionária. Classificam-se em vá- 2.3.3. TUMOR DAS CÉLULAS DE TRANSIÇÃO
rios grupos com padrões histológicos especí- OU TUMOR DE BRENNER
ficos (serosos, mucinosos, tumor de Brenner,

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entre outros), de acordo com o tipo celular São muito raros; a maioria é benigna mas
predominante, e subclassificam-se quanto à existe também a possibilidade de serem ma-
benignidade de acordo com a sua arquitectu- lignos. Têm um pico de incidência entre os
ra, grau e carácter de proliferação das células 40 e 50 anos. O tratamento é cirúrgico, sen-
neoplásicas. do frequentemente um achado fortuito em
ovários extirpados por outros motivos.
2.3.1. CISTADENOMA SEROSO
2.4. TUMORES DAS CÉLULAS
São lesões benignas que ocorrem geral- GERMINATIVAS
mente entre os 20 e 30 anos. São bilaterais
em aproximadamente 10 a 15% dos casos. 2.4.1. TERATOMA QUÍSTICO MADURO
As dimensões são variáveis, usualmente
são pequenos mas podem atingir grandes Também é designado por quisto dermóide
dimensões, ocupando toda a cavidade pél- e é o tipo mais frequente. É quase sempre
vica. Frequentemente são uniloculados con- benigno, podendo sofrer transformação ma-
tendo um líquido seroso, têm superfície lisa ligna em 1 a 2% dos casos. É composto ex-
mas em certas ocasiões apresentam prolife- clusivamente por tecidos bem diferenciados
rações papilares na sua superfície, externa sem actividade mitótica.
ou interna, e não há invasão do estroma. São A forma mais frequente de apresentação é a
habitualmente assintomáticos e achados variedade quística, histologicamente predo-
acidentalmente durante o exame gineco- minando os elementos de origem ectodér-
lógico ou ecografia pélvica. O tratamento é mica, podendo conter no seu interior mate-
cirúrgico com excisão e dissecção cuidadosa rial sebáceo e pêlos (Fig. 9). Pode também
para preservação do restante ovário. encontrar-se dentes e fragmentos de osso.
São habitualmente assintomáticos excepto
2.3.2. CISTADENOMA MUCINOSO no caso de complicação como torção ou ro-
tura. A ecografia é muito precisa no diagnós-
São quistos multiloculados, geralmente uni- tico de quistos dermóides.
laterais e com conteúdo semelhante a mu-
cina, podendo alcançar grandes dimensões,
sendo os maiores tumores encontrados no
corpo humano, pelo que quanto maior o
tumor maior a probabilidade de se tratar de
um quisto mucinoso. São bilaterais em cerca
de 10% dos casos.
Geralmente são assintomáticos, apresentan-
do-se como massa abdominal, podendo as
mulheres referir desconforto. Nas mulheres
pós-menopausa, a luteinização do estroma
pode resultar em produção hormonal (usu-
almente de estrogénios) com consequente
hiperplasia endometrial e metrorragia. O
tratamento é cirúrgico, preferencialmente
por via laparoscópica. Figura 9. Quisto dermóide.

160 Capítulo 9
O tratamento é cirúrgico, quistectomia com síndrome de Meigs (massa pélvica, ascite e
cuidado para remover a cápsula para evitar a derrame pleural).
recorrência, com exploração do ovário con-

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tra-lateral pelo facto de serem bilaterais em 2.6. ENDOMETRIOMA
15% dos casos. A via preferencial de aborda-
gem é a laparoscópica. A endometriose é uma condição na qual
A rotura acidental pode provocar uma peri- glândula e estroma endometrial são encon-
tonite química. trados fora da sua localização normal na ca-
vidade uterina. A localização mais frequente
2.4.2.STRUMA OVARII é nos ovários levando à formação de quistos
(endometriomas) com diâmetro variável,
São tumores de células germinativas com- desde poucos milímetros até mais de 10 cm.
postos inteiramente ou na maioria por teci- Habitualmente estão aderentes às estruturas
do tiroideu. Em cerca de 5% dos casos pro- adjacentes e no seu interior contêm sangue
duz sintomas de tireotoxicose. com diferente coloração, dependendo do
volume e momento da hemorragia, sendo a
2.5. TUMORES DE CÉLULAS DO ESTROMA coloração castanha no caso de hemorragia
antiga – «quisto de chocolate». São mais fre-
Representam 6% das neoplasias ováricas. quentes entre os 35 e 45 anos, em nulíparas
Muitos destes tumores produzem hormonas e na raça branca35. Em mais de 50% dos ca-
excepto o mais frequente, o fibroma, que sos há envolvimento dos dois ovários.
não tem actividade hormonal. A dor pélvica é o sintoma mais frequente,
quer sob a forma de dismenorreia secundá-
2.5.1. TECOMA ria ou dispareunia profunda, mas a extensão
da endometriose não parece correlacionar-
Pode ocorrer em qualquer idade mas é mais se com a intensidade dos sintomas.
frequente na pós-menopausa. São tumores A ecografia transvaginal permite o diagnós-
produtores de estrogénios, pelo que a mani- tico (Fig. 11) e em casos seleccionados pode
festação mais frequente é a metrorragia pós- optar-se pela aspiração dos endometriomas
menopausa por hiperplasia do endométrio sob controlo ecográfico (Fig. 12), com exa-
ou metrorragia disfuncional nas mulheres me citológico do líquido aspirado, que pode
em idade reprodutora. Ocasionalmente pode levar à resolução em cerca de 84,6% dos
ocorrer adenocarcinoma do endométrio. casos38, podendo ser usados agentes escle-
Podem ser de pequenas dimensões mas po- rosantes como o álcool, a tetraciclina ou a in-
dem também atingir dimensões superiores jecção de metotrexato39,40. A exérese cirúrgi-
a 20 cm. Raramente são bilaterais. ca, preferencialmente por via laparoscópica,
O tratamento é sempre cirúrgico. deve ser o procedimento de escolha.

2.5.2. FIBROMA
3. MASSAS TUBARES
Não é produtor de hormonas. Pode ocorrer
em qualquer idade mas é mais frequente nos A distinção entre massa ovárica ou tubar,
anos que precedem a menopausa. Podem com base apenas no exame físico, é difícil.
ser achados acidentais, de pequenas dimen- Na maioria dos casos trata-se de processos
sões, mas também podem atingir grandes inflamatórios. As neoplasias com origem nas
dimensões (Fig. 10), tal como os tecomas. trompas são raras e é importante o diagnós-
São multinodulares e podem associar-se à tico diferencial com gravidez ectópica.

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 161


162
Figura–11. Endometrioma.
Figura 10. Fibroma do ovário.

Quisto
funcional

Endometrioma

Capítulo 9
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Aspiração de
endometrioma

Figura–12. Aspiração de endometrioma sob controlo ecográfico.

3.1. HIDROSSALPINGE 3.2. ABCESSO TUBOOVÁRICO

É o resultado de salpingites de repetição Pode ocorrer a seguir ao primeiro episódio de


com oclusão do óstio tubar ou aderências uma salpingite, mas é usualmente uma con-
da extremidade distal da trompa ao ovário sequência de infecções recorrentes sobre um
adjacente, ficando o lúmen da trompa pre- tecido anexial com lesões crónicas, favoráveis
enchido por um fluido claro que vai disten- à invasão e crescimento de anaeróbios. Pode
dendo a trompa com aparecimento de uma ser secundário a gonorreia ou outros organis-
massa difícil de distinguir, no exame físico, mos, incluindo os anaeróbios, sendo habitu-
de uma massa ovárica. almente polimicrobianos. À medida que a sal-
A fluxometria Doppler ajuda a caracterizar o pingite progride, o ovário pode ser envolvido
tipo de lesão tubar, detectando uma vascu- criando um abcesso tubo-ovárico.
larização mais exuberante e de baixa resis- Os sintomas típicos são: dores pélvicas e ab-
tência no caso de abcesso tubo-ovárico, em dominais, febre, náuseas e vómitos. O exame
comparação com a do hidrossalpinge41. ginecológico pode ser extremamente dolo-
Os sintomas são frustres e o diagnóstico é fre- roso, podendo palpar-se uma massa anexial.
quentemente acidental. No caso de dúvida A rotura do abcesso provoca um abdómen
diagnóstica ou torção, o tratamento de eleição agudo. Habitualmente existe leucocitose e
é a exérese cirúrgica por via laparoscópica42. aumento da proteína C reactiva.

Massa pélvica (massas uterinas e anexiais benignas) 163


A ecografia é o exame imagiológico de escolha Bibliografia
na avaliação desta situação (sendo útil a fluxo-
1. Drinville JS, Memarzadeh S. Benign disorders of the
metria Doppler)42 e também no seguimento

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164 Capítulo 9
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