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Meus queridos Irmãos:

Algumas explicações!
Nosso Ir.'. Zé Rodrix, precocemente falecido, é vastamente conhecido na Maçonaria
brasileira por seus livros onde romanceia nossas lendas com brilho e profundidade.
Também é conhecido por suas palestras críticas e isso, de certa forma, influenciou esta
publicação em nossa Biblioteca Digital. Primeiro, a razão de colocarmos esta publicação ao
alcance de Companheiros e Mestres é que estes já podem receber as críticas como forma de
correção e não de desânimo. Muito do que o Zé Rodrix aponta aqui é duro, mas verdadeiro.
Cabe a nós reconduzirmos o carro a seu caminho e retomarmos a profundidade que merece
nossa Tradição.
Segundo, o palestrante pertence, obviamente, àquela corrente que vê na Maçonaria um filão
esotérico profundo e necessário para fazer a religação entre os Homens e desses com sua
Origem maior. Muitos autores na Maçonaria, dedicando-se aos estudos históricos de sua
origem, estabelecem que os documentos existentes constituem os limites que definem suas
linhas. Para estes, também muito necessários para estabelecer o contrapeso que nos mantenha
num caminho equilibrado, o que se lê entrelinhas é apenas fruto de nossa alienação. Pelo
menos no REAA isso é totalmente falso, pois nesse Rito o transcendente, o espiritual e a
Tradição estão inscritos nas próprias linhas de seus Rituais.
Terceiro, não por censura, mas por cautela individual deste Secretário, suprimi parte pequena
do discurso, substituindo pela indicação (...), pois continha críticas nominadas e, para tornar o
discurso impessoal, optei por essa correção. Afinal, o autor falava a um auditório selecionado
que o havia convidado para tal, e aqui estou publicitando sua fala a um universo amplo, pelo
que esse cuidado se justifica.
No mais, sugiro que a leitura atenta, parágrafo por parágrafo, conduza a uma reflexão
profunda sobre a Iniciação e sua importância para o futuro de cada candidato que nossas
Oficinas apadrinhem.
Um abraço tríplice e fraterno.

Francisco Pucci
Secretário Adjunto para Assuntos Culturais
Grande Loja do Paraná
INICIAÇÃO: UMA PALESTRA

1. Para iniciar-se algo, principalmente uma conversa sobre iniciação, é sempre bom buscar a
definição do que seja o assunto do qual vamos falar, e neste sentido o dicionário nos dá, entre
várias possíveis acepções da palavra, três que a nós interessam particularmente.
A primeira diz ser a iniciação um recebimento de primeiras noções relativas a uma arte, uma
ciência, uma doutrina, uma prática, sendo primordialmente uma preparação para que alguém
dê os primeiros passos para dentro dos mistérios de alguma religião ou doutrina.
A cerimônia onde isso acontece, formalizando a essência do que se busca, toma o nome dessa
preparação.
A segunda diz ser a iniciação, além do ato ou efeito de iniciar-se, uma introdução ao
conhecimento de coisas misteriosas e/ou desconhecidas, definindo para a palavra o conceito
de interesse em uma parte oculta do conhecimento, exatamente como a primeira definição, e
como tal reconhecida, pois o uso da palavra "misteriosas" nos remete diretamente aos
Mistérios antigos, dos quais em principio somos depositários e continuadores em linha direta.
A terceira nos fala mais de perto: nela diz-se ser a iniciação uma admissão em uma sociedade
secreta, como por exemplo a Maçonaria.
Por essas três definições, portanto, não resta nenhuma duvida, mesmo aos olhos dos profanos,
do que é que tratamos quando tratamos de iniciação.

2. Os profanos, em seu desconhecimento, acabam por ter da iniciação uma noção mais
verdadeira e profunda que a nossa prática dentro da Ordem.
E nós, que antes de nos aproximarmos da Ordem temos dela uma imagem próxima da
perfeição absoluta, acabamos por reconhecer, com o correr dos tempos, que somos ( como
muitos dizem ) apenas uma sociedade de homens... e mais nada.
Somos certamente essa sociedade de homens, mas com uma diferença: não somos comuns.
Por algum motivo, que a cada um cabe descobrir a partir de sua pratica maçônica, fomos
escolhidos para fazer parte deste numero.
E este numero se amplia, se reduz, se modifica, sem que a essência da Maçonaria ela mesma
venha a se modificar.
Pelo menos é isso que desejamos que esteja acontecendo, quando dos momentos de
desânimo, de cansaço, de inadequação, quando daqueles instantes em que cogitamos se é
aquilo mesmo que desejamos, se o que estamos tendo é exatamente o que queríamos ter, se
não sonhamos muito alto com essa fraternidade que na pratica mais parece um clube de
serviços ou um clube esportivo, um clube, e nada mais, com todos os defeitos e pequenezas
que a idéia de clube tem.

3. Com exceção dos que entraram na Maçonaria acreditando estar entrando em uma
sociedade de auxílio mútuo, e mesmo depois de saberem que ela não o era nela
permaneceram em busca desse ideal menor, somos todos buscadores de um sentido para a
nossa existência maior que a nossa existência-ela-mesma.
A Verdade de que tanto falamos em nossas oficinas é, sem duvida, uma questão de fundo em
cada um que se interessou pela Ordem no decorrer dos séculos, e isso não muda. Mas para
que essa questão nunca deixe de ser central na vida de cada maçom ativo ou inativo, não
importa, é preciso que ela seja posta às claras no primeiro contato de um profano com a
Ordem.

4. Para que isso aconteça temos a Iniciação. Composta de uma série de rituais simbólicos e
alegóricos através dos quais, como em qualquer iniciação desde os primórdios da
humanidade, um homem venha a renascer pelo conhecimento. Que interessante essa noção: o
conhecimento das coisas é suficiente para que alguém renasça, ganhe uma nova vida, ressurja
de suas próprias cinzas.
A sabedoria da Maçonaria está, contudo, no fato de que esse conhecimento sempre fica mais
adiante, mais à frente, forçando o irmão interessado a aprofundar-se cada vez mais nesta
busca pelo conhecimento, preparando-se para materializar em si mesmo o axioma abstrato do
filósofo que disse: - CONHECE-TE A TI MESMO.

5. Sabemos que esses rituais, de que a Maçonaria faz uso, vem de muito tempo atrás. Há
quem fale na idade média, há quem fale de egípcios, babilônios, caldeus, há quem fale das
raças perdidas, há mesmo quem fale que DEUS criou o Jardim do Éden como uma loja,
iniciando nela nosso pai Adão, o primeiro maçom.
Não importa a data precisa, mas sim reconhecer que a estrutura psicodramática que rege e
regula nosso primeiro e definitivo contato com a Ordem é mais antiga que quaisquer noções
que sobre ela possamos ter, e que como tal deve ser respeitada na sua íntegra, pois certamente
se formou nos tempos em que o Homem, mais diretamente em contato com Deus que alguma
vez possa ter estado, era movido pelos impulsos de uma Lei Natural intrínseca a si mesmo,
dispensando as imitações de Lei que os homens vem criando sem parar na tentativa inútil de
substituir artificialmente uma Ética que já foi natural em cada um de nós.

6. Tempos diferentes, esses, em que os símbolos tinham um valor verdadeiro, comum a todos
os homens, pois todos os homens bebiam na mesma fonte de valor desses símbolos.
Não havia ainda a necessidade de explicá-los segundo uma certa ótica, uma certa doutrina,
uma certa tendência.
Os símbolos eram o que eram sem a necessidade de intermediários que os esclarecessem à
massa ignorante de seu significado.
Essa corrente de pensamento diretamente ligado à Divindade está no cerne do uso desses
símbolos como ferramentas para um mergulho sem medo de cada um dentro de si mesmo,
pois só conhecendo a si mesmo pode-se conhecer absolutamente.

7. São tempos anteriores às religiões organizadas, as primeiras a ocultar os símbolos e seus


significados apenas para com isso amealhar mais poder, pois acreditando que se o
conhecimento é poder, para ter poder verdadeiro é necessário que alguns tenham um
conhecimento ao qual a maioria não tenha acesso.
Pode-se portanto dizer que esse conhecimento primordial, anterior à criação dos
intermediários entre a divindade e o homem, é um conhecimento estritamente anterior à idéia
de religião de massa.
Esse tipo de pensamento, mesmo vindo a ser incessantemente perseguido e esmagado pelas
religiões organizadas, resiste e subsiste no seio de ordens que não abrem mão do livre arbítrio
do homem, por saber que o livre arbítrio é exatamente aquilo que nos diferencia em ultima
analise do resto da Criação.

8. Para separar os símbolos e seus significados, as religiões organizadas houveram por bem
apossar-se do conhecimento preexistente, estruturando-o de acordo com seus interesses de
poder e controle, mantendo o essencial longe dos olhos da maioria, acreditando com isso que,
ao amealhar todos esses mistérios, se tornariam mais e mais poderosas, provavelmente
hegemônicas.
Mas essa corrente pré-religiosa não se extingue com as hegemonias sucessivas das diversas
religiões e igrejas. Por ser parte intrínseca do homem, ocultou-se nos subterrâneos da
humanidade, de onde ergue sua bela cabeça quando e onde a oportunidade surgir.
Nas artes por exemplo: mesmo depois de tempos duros em que o controle férreo era exercido
sobre os artistas, obrigados a respeitar determinados cânones imutáveis na consecução de
suas obras, ressurge das cinzas no Renascimento, depois no período Romântico, até mesmo
nas artes populares como o Cinema e a Musica em nosso século, estando passando no
momento por uma impressionante revivescência, fruto e prova de seu vigor.
E no âmbito do chamado Esoterismo esse pensamento pré religioso, natural aos homens
naturalmente éticos, sempre esteve presente, principalmente em nós, a Maçonaria.
Nesse momento é preciso aceitar com clareza e honestidade que a Ordem Maçonica não é
nem tem fundamento em nenhuma das religiões, seitas ou heresias que o mundo dos homens
engendrou.
Pelo contrario: essas religiões, seitas e heresias é que no decorrer dos anos tem bebido na
fonte comum de conhecimento de que a Maçonaria é fiel depositária desde sempre.
(A Maçonaria, ou melhor dizendo, os maçons, é que temos aberto mão do que nos pertence
por tradição, numa impressionante exibição da necessidade espúria de reconhecimento e
aprovação pelo que existe de mais retrógrado na Humanidade. E isso tem-se refletido em
nossa maneira de ser e agir, entre nós e nas nossas relações com essa Humanidade que
dizemos ser nosso objetivo fazer feliz. )

9. Um homem se torna maçom por uma iniciação que, fazendo uso de símbolos e alegorias
fundamentadas em um conhecimento anterior até mesmo à própria idéia de Maçonaria,
mostram a esse homem a possibilidade verdadeira de conhecer-se, encontrar-se,
compreender-se, e nesse processo alcançar a mais absoluta intimidade com seu Criador,
conhecendo-O, encontrando-O e compreendendo-O de forma direta, dentro de seus próprio
coração e por seus próprios méritos.
A beleza desta possibilidade encanta e atrai até nós milhares de homens, ansiosos por uma
indicação mais precisa do caminho a seguir em sua busca.
Marca-se o momento solene em que isso acontecerá, e o profano se coloca em nossas mãos
para que o façamos experimentar aquilo que milhões de outros vem experimentando durante
séculos e séculos: a emoção do renascimento, o sentir-se Fênix, a Iniciação.

10: De uma maneira geral, e não falo apenas por mim, mas por centenas de outros IIr.'. com
quem tenho discutido sobre o assunto, as Iniciações como as fazemos hoje em dia são um anti
clímax, um balde de água fria nos sonhos e anseios do profano, porque ele nos encontra
rigorosamente despreparados para realizar como se deve o momento mais importante de sua e
de nossas vidas .
Se nesse momento ele está no limiar de uma mudança radical na sua existência de até então,
nós que o iniciaremos somos responsáveis por sua vida maçônica desse momento em diante,
pois de sua iniciação depende a maneira como verá e se relacionará com a Ordem e o mundo
profano desse momento em diante.
Raro é o templo rigorosamente preparado para uma iniciação, em que se possa contar com
todos os apetrechos e ferramentas necessários: rara é a loja que esteja unida em torno do
acontecimento, preparando-se para ele como o momento importante que realmente é, raro é o
Ir.'. que sabe o que está fazendo ali, o que se espera dele, que papel tem a cumprir, e de que
maneira o deve cumprir.
Vão chegando à loja nos horários os mais desencontrados, alguns deles sem sequer saber que
naquele dia um profano será iniciado: são colocados neste ou naquele cargo ao sabor das
necessidades do momento, e sequer se dão ao luxo de folhear o ritual para relembrar-se ou
tomar conhecimento do que devem fazer na cerimônia.
Um clima de improvisação bastante canhestro toma conta de tudo, em grande parte causado
por rituais cheios de erros de impressão e palavras mal escritas, na medida para serem
mastigadas de qualquer maneira por quem delas não se preocupou sequer em saber a
pronuncia, quanto mais o significado.
O profano, sem perceber o sentido do que está sendo dito, é arrastado de um lado para outro
no meio de uma alaúza sem sentido, cheia de grandes brancos quando a cerimônia se
interrompe para que alguém corrija o erro que outro alguém cometeu, esquecendo-se
provavelmente de prestar atenção à sua própria parte, o que o faz errar logo a seguir, sendo a
cerimônia novamente interrompida para mais uma pequena sessão de recriminações e
correções paliativas.
Na hora em que espadas são necessárias, onde estão estas espadas? Na hora de acender-se o
fogo, quem tem fósforos? Na hora de ligar as luzes, quem avisa a quem para ir até lá fora
acionar o comutador? Quem trouxe as luvas, foi você? Ih!, as flores, ninguém lembrou de
comprar as flores?
Vamos com isso, gente, eu tô morrendo de fome....tenho que sair antes das dez.... num
amadorismo tão flagrante que às vezes nos deixa envergonhados de nós mesmos, por
estarmos tão mal preparados quanto todos os outros.
Há dois momentos, no entanto, quando tudo corre às mil maravilhas: um deles é a tortura do
pobre profano antes da iniciação ela própria, com brincadeiras adolescentes dignas dos mais
estúpidos trotes de calouros da USP, com sustos, gritos, ameaças nem um pouco veladas à
integridade física do pobre iniciando.
Há irmãos que se especializam nessas exibições de crueldade e truculência, chegando a ansiar
por uma nova iniciação onde possam cumprir esse triste papel, dando mais valor a esses
indefensáveis momentos .
Os resultados são danosos: eu mesmo pude ver, em uma iniciação para a qual fui convidado,
um profano que, levado a um paroxismo de agressões, arrancou tudo de cima de si, pegou sua
roupa e foi-se embora, deixando os brincalhões com cara de tacho, balbuciando a única
desculpa que puderam arranjar: - Ah, vai ver não estava preparado para ser maçom...
O outro momento é o copo d'água após a cerimônia, quando o neófito (como o diz a palavra
apenas uma plantinha nova que acaba de pôr suas primeiras folhas ao sol ) vai estar pela
primeira vez socialmente com seus irmãos para todo o sempre.
As exibições de falta de educação, destemperança , maus hábitos, gula e familiaridade
excessiva são suficientes para marcar esse neófito para sempre, e ele chega mesmo a pensar:
- Ah, mas é isso que é a Maçonaria?
Puxa.... passando, a partir de algum tempo, a comportar-se exatamente da mesma maneira,
pois só o exemplo ensina, e o exemplo do erro tem muito mais poder.

11. Não exagerei, acredito, principalmente quando descrevi a maneira como a iniciação ela
mesma se processa entre nós, pois é inadmissível que repitamos sempre os mesmo erros, não
importa quantas vezes sejamos parte de uma iniciação.
Todos nos esquecemos, a partir de certo momento, que somos eternamente responsáveis pelo
irmão que iniciamos.
O mais belo e importante momento de nossas vidas vem e vai sem deixar maiores marcas que
a repetição das frases feitas que ouvimos de nossos antecessores, pois parece que fica feio
dizer outra coisa que não seja " é tomado de grande emoção que...."
Creio que essa emoção exista, e que verdadeiramente dê o ar de sua graça até mesmo nas
iniciações realizadas de forma a mais canhestra, porque o poder dos símbolos e alegorias com
que o ritual é construído é sempre mais forte que nossos tênues esforços de minimizá-lo.
Mas, se tivéssemos conhecimento de onde vêm esses rituais que repetimos há séculos, ou
melhor, se tivéssemos conhecimento do que significam os rituais na vida dos iniciandos,
certamente agiríamos de outra maneira.
E esta emoção apenas formal que mencionamos sempre seria uma emoção verdadeira,
profunda, capaz de transformar-nos de maneira radical, mudando a nossa vida, efetivamente
matando quem éramos para dar espaço ao novo que renascemos nesse momento.

12. O daninho pensamento modernizador, que faz das verdadeiras tradições o seu alvo mais
constante, vem degenerando progressivamente os rituais de iniciação da Maçonaria.
Sou um colecionador de rituais de todos os ritos, potências e épocas, e ainda me espanto com
os erros inexplicáveis, os cortes sem razão, as mudanças sem sentido, pelos quais os rituais
maçônicos passam a cada vez que são reeditados.
Exemplo: na quarta instrução de Apr.'., surge a pergunta: - O que nos une? - Um culto. - Que
culto é esse? - A Maçonaria... e eu queria descobrir porque o que em todos os rituais
anteriores de todos os ritos, inclusive o REAA, encontramos a palavra "segredo" em vez da
palavra "culto". Estarmos unidos por um "segredo" faz muito mais sentido que estarmos
unidos por um "culto".
O que aconteceu? Traduções mal feitas? Cópias executadas com pressa? Uma tentativa
espúria de elevar a Maçonaria ao patamar de uma religião? Ninguém sabe. E ninguém
explica.
Mas pior que essas mudanças formais são as mudanças essenciais, geradas a cada vez que
alguém se zangou com alguém e partiu para fundar uma nova potência, dando um toque
diferente ao seu ritual apenas para não ficar igual ao do "inimigo".
Em nosso ritual de Mestre existe uma explicação sobre a Cabala que inverte o fluxo
energético entre as séfiras quatro e cinco, distorcendo daí por diante todo o sentido da
comparação entre Templo e Árvore de Vida.
Quem tomou essa decisão? Porque motivo? Baseado em que fonte de conhecimento?
Ninguém sabe. E ninguém explica.
Esse desconhecimento mais profundo do sentido e da importância de cada detalhe em rituais
de iniciação tem criado verdadeiros camelos, que como todos sabem foi um cavalo inventado
por um comitê de bem-intencionados.
E o culto exterior de que a Iniciação dá testemunho , em vez de representar o símbolo
interior, ou seja, a verdadeira homenagem ao G.A.D.U. , torna-se exclusivamente exterior e
simbólico, e mesmo estes símbolos deixam de significar qualquer coisa remotamente ligada
ao objetivo original da cerimônia.

13. A confusão pela qual passamos, estranhamente similar ao distorcido processo de


secularização das igrejas cristãs, nos tem levado a tomar o símbolo pela sua essência, pela
coisa que ele simboliza, deixando que a essência se perca e apenas o símbolo permaneça,
vazio.
As palavras se perderam, como um dia aconteceu com a Palavra Sagrada, e para isso, como
diz Juli Peradejordi, "temos que aceitar que os símbolos e ritos vêm sendo gradativamente
desencaminhados, e buscar humildemente ascender aos mestres de nossa Tradição."

14. Tudo começaria pela aceitação da máxima Socrática do " SÓ SEI QUE NADA SEI", e
retornar sobre nossos próprios passos para perceber, nos lugares de onde viemos, onde nossos
pés se desviaram, onde tomamos os perigosos atalhos da mudança pela mudança, e refazer
nosso caminho de volta por onde não viemos, com a humildade de quem reconhece estar
errado e pretende corrigir-se.
É necessário que reconheçamos as fontes verdadeiras do conhecimento que viemos
acumulando durante tantos séculos, e voltar a beber nelas com a sede dos verdadeiramente
necessitados.
Numa época de artificialismos e inversões como esta, em que o dinheiro se confunde com a
verdadeira riqueza, a experiência transcendente que sempre foi nossa saiu de nossas mãos,
vulgarizou-se, passou a fazer uso de artificialismos entorpecentes e transformou-se em
macaco de si mesma.
E nós, verdadeiros senhores dessa experiência preferimos abandoná-la, tanto por medo de
sermos confundidos com os alucinados do esoterismo de consumo, quanto por estarmos
rigorosamente na contra mão da historia do rito e do símbolo na Maçonaria.

15. Podemos dizer, com certeza, que os rituais esotéricos de que nascem os nossos rituais são
herdeiros da tradição Hermética, obra do Três Vezes Grande, Hermes Trismegistus, chamado
pelos egípcios de Toth, pelos gregos de Hermes, pelos romanos de Mercúrio, tradição essa
intacta até hoje graças ao trabalho de ordens como a nossa.
Podemos dizer com certeza que José filho de Jacó usou desses conhecimentos para tornar-se
indispensável ao Faraó, que os chefes das doze tribos e mais tarde Moisés deles fizeram uso,
sem preocupar-se se quem lhes ensinava eram seus inimigos os sacerdotes egípcios, pois o
verdadeiro conhecimento não tem pátria. Esses mesmo homens iniciaram também a Pitágoras
e a outros sábios do Século de Ouro.
Podemos crer também, se estudarmos, que a ida de Jesus ainda menino para o Egito tem
ligações com este conhecimento, pois suas doutrinas estão muito mais próximas do
esoterismo hermético que do cristianismo abreviado que hoje em dia se pratica.
A lista seria interminável, mas o que importa é que esse conhecimento é nosso, está entre nós,
e no entanto a ele fazemos vista grossa, pois somos todos homens sérios, importantes, bem
postos na vida, com obrigações sociais e comerciais, absolutamente afastados de quaisquer
tolices não aprovadas pelos descrentes de plantão.

16. Tornou-se impossível a nós, portanto, ser igualmente maçons dentro do templo e no
mundo profano: nosso comportamento social nada tem a ver com nossa vida maçônica, e
infelizmente, com o correr dos tempos, esse comportamento profano envenena cada vez mais
a nossa maneira de agir quando em loja, transformando nossa busca pela verdade em uma
repetição sem sentido de um ritual sobre o qual nada sabemos, e que na verdade preferimos
ignorar em sua totalidade, sob pena de parecermos irracionais e "esotéricos".
As verdades que o hermetismo Esotérico põe à nossa disposição, no entanto, não mudam:
continuam as mesmas que sempre foram, e mesmo a ciência mais materialista e mecanicista
hoje se vê forçada a aceitar como verdades indiscutíveis certas coisas anteriormente tachadas
como crendices e superstições.
E nós, para quem esse conhecimento sempre esteve disponível, só o assumimos como valido
quando o mundo profano o avaliza, numa impressionante exibição de inversão de valores.
Todas as ordens iniciáticas que existiram, no Ocidente e no Oriente, sempre fizeram uso
desses conhecimentos para promover o crescimento da humanidade.
Na busca de poder algumas seitas e heresias religiosas se apossaram de parte desse
conhecimento para amealhar poder material e temporal. E a Maçonaria hoje se vê no triste
papel de estar a reboque de quem lhe nega a importância que verdadeiramente tem.

17. Imaginemo-nos por um momento sendo preparados para uma iniciação nos mistérios de
Isis, em pleno Egito, sendo levados à presença do Hierofante do culto para que esse nos
examinasse e admitisse ao processo de iniciação nesses mistérios, depois de meticuloso
exame.
Estar deixado em completa solidão no Hipostilo do templo seria a ultima oportunidade de
revisão de nossos conceitos pessoais antes de abraçar a nova vida, e nesta solidão nossos
piores temores nos fariam companhia, sem que nenhum sacerdote necessitasse vir aplicar-nos
sustos nem agredir-nos para conseguir este efeito.
As emoções que um candidato à iniciação experimentava no inicio deste processo eram reais
e verdadeiras, pois nasciam todas de sua entrega incondicional ao processo pelo qual se
dispunha a passar, e como tal eram respeitadas pelos homens que seriam seus guias, para
quem o papel de guia se revestia da mais extrema seriedade.
E seria impensável a atitude amadorística que hoje conhecemos, durante as cerimônias: a
seriedade, a profundidade, a precisão de palavras e movimentos eram (como deveriam ser
ainda hoje ) essenciais à realização das mesmas.
A passagem pelos quatro elementos, erguendo-se do fundo da Terra, enfrentando a confusão
primordial do Ar carregado de energias incontroláveis, a purificação inicial que a Água nos
possibilita, a marca indelével que a travessia do Fogo nos deixa na alma, são momentos que
vem se repetindo desde tempos imemoriais nas verdadeiras iniciações.
Raras pessoas na face da terra têm a oportunidade de renascer: nós maçons estamos entre os
poucos que ganham esse prêmio quando nos dispomos à Iniciação, e é exatamente a Iniciação
que deve realizar em nossa alma e emoção esse renascimento, esse desabrochar de dentro de
nós mesmos, de uma forma que nunca mais possa ser negada nem esquecida.
A importância do guia e de cada participante neste ritual de iniciação era estabelecida de
principio, não havendo possibilidade de improvisações de última hora, de "vai assim
mesmo", de erros causados por desatenções insuportáveis.
A vida do candidato corria verdadeiro perigo, pois as provas simbólicas que hoje substituem
as provas reais pelas quais tinha que passar não são nem uma pálida idéia do que
experimentava.
As travessias que o candidato fazia desde que começava a percorrer os caminhos internos do
Templo colocavam seu corpo físico no limiar da sobrevivência: atravessava grandes abismos
escuros, em que a corda em que se apoiavam seus pés era balançada por uma ventania quase
incontrolável: nadava enfrentando uma torrente violentíssima, usando nada mais que sua
coragem para vencê-la: atravessava uma parede de fogo real, e ao fazê-lo encontrava a seu
lado o seu guia, que lhe dava o osculo fraterno, reconhecendo-o como seu Ir.'., unidos que
estavam desse momento em diante pela experiência mutua da Iniciação.
Hoje ainda existe perigo, mas quem corre esse perigo é a centelha emocional que liga um
homem à Maçonaria: da maneira como temos agido fica fácil perder o respeito e a seriedade
em relação à essência da Ordem, que são os seus rituais.
Se nos é impensável fazer os iniciados passar por essas provas na Iniciação, que pelo menos
tratemos os símbolos com o respeito que merecem, pois significam muito mais que apenas
uma sucessão de movimentos e palavras sem sentido.
Superar cada um dos desafios que se nos apresentam em nossa iniciações tem fundamento
nos rituais mais antigos do esoterismo, onde a experiência de quase morte não era apenas um
símbolo, mas uma realidade palpável, portanto merecendo ser tratados ainda hoje com a
gravidade com que se trata a realidade que eles representam.

18. Pelos relatos de antigos Maçons, mesmo neste século em que estamos, as iniciações eram
uma experiência profunda e mobilizadora, capaz de unir pela identidade da emoção
experimentada muito mais que apenas o fato de sermos todos membros da Ordem.
Mas num determinado momento a Maçonaria brasileira, a exemplo de tudo o que acontecia
no país, decidiu romper de forma quase que unilateral as suas ligações com a Maçonaria
européia, tanto a francesa quanto a inglesa, com quem tivéramos tido ligações muito íntimas
desde nossos princípios.
Essa Maçonaria de Europa, da qual fazia parte a Maçonaria portuguesa, durante longo tempo
enterrada viva pela ditadura religiosa de Salazar, como a de Espanha fora esquartejada por
Franco, trazia viva dentro de si as bases místicas em linha direta com sua origem, mantendo a
linha evolutiva da Maçonaria mundial em seus trilhos.
(...)

19. Somos todos homens muito diferentes uns dos outros, por nossa educação, por nosso
estudo, por nossas raízes sociais e até mesmo por nossa maneira de ser, apesar de estamos
unidos por uma crença em comum, pelo fato de sermos todos irmãos, pelo direito ao
conhecimento que adquirimos e pela responsabilidade que o fato de ser Maçom nos reveste,
ainda que uma grande parte de nós dê pouquíssima importância a isso.
Seria impossível portanto, que houvesse uma racionalização ampla o bastante para esclarecer
os rituais a todos, indiscriminadamente: por isso o único caminho que nos resta é o da
emoção, justa, verdadeira, incontrolável, capaz de falar com precisão absoluta a este pedaço
de nosso organismo chamado coração.
É esta emoção que advogo para nossos rituais de iniciação: pois sei, por tê-la vivido, que as
marcas que uma experiência emocional deixa são muito mais fortes e indeléveis que aquilo
que compreendemos com nossa mente racional.

20. Para isso seria necessário que cada um de nós se revestisse integralmente da importância
que seu papel em uma iniciação lhe exige, e perseguir essa perfeição de movimentos e
atitudes que os sábios reconhecem como reflexo da beleza que reveste o trono do
G:.A:.D:.U:.
Seria necessário que estivéssemos tão preparados para realizar o ritual que a iluminação do
templo fosse inteiramente dispensável, como se faz no Grande Oriente de França até mesmo
nas sessões econômicas: seria necessário que os perfumes, os sons, as músicas, as vozes dos
irmãos realizadores do ritual se mostrassem como um eco de outros rituais perdidos na noite
dos tempos, e ainda assim capazes de ligar todo e cada maçom que tenha existido sobre esse
mundo ontem, hoje e amanhã: seria necessário que cada um de nós se dispusesse a ser nada
mais que o porta-voz de outros tantos sábios esquecidos pela humanidade, mas cujas idéias e
palavras ainda vivem nos rituais, única prova de sua existência divina: seria necessário
simplesmente que cada um de nós se entregasse à força da emoção que está dentro da
iniciação, esquecendo preconceitos e erros de que ainda estamos eivados, deixando que cada
coração falasse com cada coração e possibilitando a cada iniciando a oportunidade única de
viver seu primeiro dia de Fênix de maneira inesquecível.
Não podemos errar em momento tão excepcional, pois sobre nós recai a responsabilidade
sobre a nova vida do iniciando.
Por isso se faz necessário compreender em profundidade o ritual de iniciação, para que cada
palavra, cada idéia, cada gesto nele existentes estejam escritos mais no coração que nas
páginas do livrinho: e que o iniciando possa sentir em cada voz, em cada gesto, em cada
passo, a verdadeira fraternidade maçônica, ansiando por ela desse momento em diante como
os afogados anseiam por ar: que a atitude canhestra seja substituída por uma verdadeira
compreensão do significado profundo dos símbolos e das alegorias que ali estão, deixando de
lado a mera repetição de conceitos esvaziados que já não têm a menor ligação com o interior
do espírito humano.

21. Cabe a nós retomar pela estrita observância do sentido original dos rituais a grande força
mística que tem sido o nosso sangue desde tempos imemoriais.
É preciso perder o medo de entregar-se incondicionalmente a essas forças tão antigas quanto
verdadeiras que estão pulsando na estrutura das iniciações, realizando-as de forma
absolutamente perfeita, absolutamente correta, absolutamente prenhe de significado.
Cada um de nós Maçons é responsável pela continuidade de nosso pensamento na face da
terra, e para isso a iniciação de novos irmãos é essencial, desde que eles verdadeiramente
sejam iniciados em espírito, não apenas nos gestos mal executados de um ritual mal realizado
e sem ligação verdadeira com o mais interior do seu interior, esse pedaço de nossa vida que é
o terreno fértil da Maçonaria.

22. Se a iniciação pressupõe uma mudança de quem por ela passa, se mostra a porta de um
novo caminho a ser percorrido, se é o ovo alquímico do qual sai o homem transmutado que o
hermetismo prevê, então ela é a mais poderosa força em atividade dentro da Ordem, e como
tal deve ser encarada.
Pois um homem que se torna maçom em uma iniciação verdadeira e intensa não tem como
recuar nesse caminho: não se torna infeliz nem endurecido, não se sente capaz de ter duas
vidas antagônicas, uma em loja e outra fora dela, não se dispõe a usar de forma pessoal uma
caridade que é nossa obrigação natural, se não como homens, pelo menos como maçons.
E também nunca se tornará um perjuro, como os tantos irmãos da Ordem que percorreram
todos os seus degraus e um belo dia, movidos por não sei que forças destrutivas, se arrojaram
aos pés das autoridades seculares das igrejas cristãs e a elas revelaram todos os nossos
segredos, colaborando mais uma vez com a campanha insidiosa que as religiões organizadas
sempre movem contra nós, na impossibilidade de terem o que temos, pois a exigência
primeira para que um homem se torne maçom é a liberdade de pensamento, e isso não serve
em nada ao projeto que as Igrejas têm de domínio e controle das mentes.
Um maçom, verdadeiro e profundamente iniciado, não se torna nem perjuro, nem
dissimulado, nem ávido pelo poder: a iniciação o muda para sempre e ele passa a fazer parte
dessa fraternidade não pelo formalismo dos graus, títulos, enfeites e comendas, mas sim
porque seu coração está unido a outros corações, todos vibrando juntos, repletos de amor
incondicional pela Humanidade.

22. São estes os caminhos de que dispomos: e dos dois o único real é o da Iniciação
verdadeira, em linha direta de vibração com as iniciações originais do hermetismo.
É para isso que nos reunimos na Ordem, para fazer viver a idéia de que cada homem tem
dentro de si a possibilidade de um contato direto e sem intermediários com o seu Criador.
As iniciações que estão a nosso dispor para que nos multipliquemos em cada vez mais
Maçons são a ferramenta perfeita para conseguir esse fim: uma ferramenta de altíssima
precisão, que só depende de conhecimento e treinamento prévios para poder ser usada em
toda a sua pujança.
Usar a iniciação para criar maçons da pele pra fora é um desperdício, é quase a negação de
tudo aquilo que nos forma e nos une.
Portanto, que deste momento em diante a iniciação seja a nossa maior preocupação: que nos
preparemos para ela com o mesmo empenho que um dia desejamos encontrar na nossa, e que
consigamos passar a nossos futuros irmãos a idéia de que o segredo que temos entre nós deve
ser respeitado, já que é feito de conhecimentos libertadores e de processos de ação oculta que
podem , devem e certamente irão modificar o mundo, sempre para a maior glória do
G:.A:.D:.U:. !

Muito obrigado.
Ir.'. José Rodrix Trindade
Aug.'. Resp.'. Loj.'. Simb:.'. Apóstolos do Templo, 241

Palestra proferida no Venerável Colégio, em 08 de novembro de 2000. - GLESP

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