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RESUMO
APRESENTAÇÃO
“The Invisible Man”, livro escrito em 1897 pelo britânico Hebert George Wells, foi a
obra de partida para essa tradução intermidiática. O romance faz parte do gênero ficção
científica, assim como o predecessor “The Time Machine”, obra também adaptada para peça
radiofônica em 2015 pelo grupo Pro.Som da Universidade Federal da Bahia e que será objeto
de comparação nesse artigo.
Em “The Invisible Man”, como em “The Time Machine”, temos a história de um
cientista que faz uma descoberta grandiosa e tem que lidar com suas consequências. A
história começa com a chegada de um homem misterioso na pousada do pequeno vilarejo
britânico, Iping. Com o avançar das páginas, descobrimos que o homem é Griffin, um
cientista que testou um experimento em si mesmo e conseguiu, com sucesso, se tornar
invisível - mas não consegue reverter esse estado e vê seus recursos materiais se esgotando
junto com as chances de sucesso. Ademais isso, o gênio forte e os modos grosseiros de
Griffin - que não são de forma alguma creditados à mutação para a invisibilidade - fazem
com que sua permanência no vilarejo se torne cada vez mais difícil. Griffin vai,
progressivamente, se tornando uma criatura feroz e inumana, até entrar em conflito declarado
com todo o vilerajo e morrer espancado pela população.
A obra foi adaptada largamente para cinema, literatura, televisão, rádio e continua a
inspirar gerações. A ideia de uma “pessoa que consegue ficar invisível” faz parte do
imaginário popular e tem sua origem na obra de Wells. Diferentemente do que se espera e do
que encontramos em muitas adaptações, entretanto, o autor não usa a transformação física do
cientista como responsável pelas ações agressivas e pela moral distorcida da personagem;
pelo contrário, deixa em suspenso qualquer explicação.
1
Graduanda em Artes Cênicas com habilitação em Interpretação Teatral pela Universidade Federal da Bahia.
Membro do grupo de pesquisa PRO.SOM.
A metodologia de trabalho adotada durante todo o processo de escrita foi a da Crítica
Genética, que prevê a produção de um Dossiê passível de análise em que esteja contido todo
o processo de roteirização e que será, também, objeto de estudo desse artigo. A Crítica
Genética, segundo José Cirillo, é “um lugar de investigação das diversidades que envolvem
os estudos do texto literário em estado de produção” e “pretende [...] oferecer uma nova
possibilidade de abordagem para as obras de arte: observá-la a partir de seus percursos de
fabricação. É assim oferecido á obra uma perspectiva de processo.”
Apesar de não ser muito popular, as peças radiofônicas deveriam conquistar espaço
mais amplo como forma de arte e de entreterimento porque estimulam a imaginação e podem
ter importante papel social ao promover acessibilidade às pessoas com deficiência visual,
como pude atestar com os dois últimos trabalhos. Uma parte das obras do grupo Pro.Som é
distribuída ao Instituto de Cegos do Paraná, que respondem com comentários e estimularam o
grupo a compartilhar com outros deficientes visuais e recolher suas impressões. Essa
pesquisa acabou nos mostrando que a sensibilidade e o critério do grupo deveriam ser ainda
mais afiados do que imaginávamos. Sobretudo nos efeitos sonoros, por exemplo, as escolhas
iniciais do grupo acabaram não se revelando as mais adequadas ao universo proposto pela
peça - algo que nenhum de nós havia percebido mas tornou-se evidente depois, tal qual o ovo
de Colombo.
O retorno dos deficientes visuais, além de ter se tornado indispensável para grupo,
denuncia uma lacuna na produção de arte e entreterimento em nossa sociedade - basta
analisarmos a quantidade absurda de material audivisual que produzimos e compará-la com a
ínfima quantidade de material unicamente sonoro, que pode ser de grande interesse da
população e promover integração através do estímulo à imaginação. Isso tornou-se evidente
para minha pesquisa em um dos comentários enviados do Paraná, em que um dos deficientes
visuais dizia: “Parece que estou assistindo um filme dentro da minha cabeça!”
Em 2015, quando o grupo Pro.Som fez a adaptação do romance “The Time Machine”,
de Wells, para a peça radiofônica “A Máquina do Tempo”, ainda não havia nenhum método
de trabalho claramente definido no que diz respeito a produção do roteiro em si. Os conceitos
de escrita ainda não eram muito claros e as definições “importadas” (de livros, artigos e
pesquisas) não necessariamente solucionavam os problemas encontrados pelo grupo. Por
exemplo, os efeitos sonoros eram chamados de “TEC” e sempre sinalizados de forma
destacada entre as falas das personagens, como mostra a imagem:
.
Figura 1 do Dossiê Genético - Roteiro de “A Máquina do Tempo”, Grupo PRO.SOM, 2015.
No momento da edição, entretanto, acabamos por descobrir que teria sido melhor
sinalizar o momento exato em que o efeito sonoro devia entrar, mesmo que fosse no meio de
uma fala, e que precisávamos encontrar uma forma de sinalizar a duração de cada efeito, que
nem sempre era a mesma.
Visando solucionar esses problemas, na produção do roteiro de “A Lenda de Iping”
criamos diferenciações para as durações do efeitos sonoros. Passamos a chamar de “TEC” os
efeitos sonoros de curta duração, pontuais, acontecidos naquele exato instante e de “BG” ou
“Background” o tipo de sonorização que permanece mesmo durante as falas das personagens,
como uma “cama sonora” que cria atmosferas e ajuda na compreensão do cenário imaginário
onde as personagens estão vivenciando a história. Podemos ver essa definição na imagem
abaixo:
Esse recurso funcionou mas acabou se revelando difícil e com sérios riscos de cair
numa infantilização da personagem ou do material total, o que não era um problema mas
fugia ao planejamento inicial.
Bem diferente disso, em“A Máquina do Tempo” fizemos a opção por uma história
cronológica, que se mantém ainda que a personagem principal faça viagens no tempo - nesse
roteiro acompanhamos a história de Júlia, uma cientista que consegue produzir uma máquina
capaz de viajar na dimensão do tempo e vai para um futuro muito distante, onde encontra
novas criaturas vivendo em um novo mundo, tem sua máquina roubada e precisa recuperá-la
para voltar para “casa”, ou seja, para o seu “tempo.” A história é perfeitamente cronológica e
acompanhamos cada um dos passos de Júlia, que seguem uma linha em direção ao final.
DOSSIÊ GENÉTICO
Figura 6 do Dossiê Genético - Pasta com as versões do roteiro de “A Lenda de Iping”, Grupo Pro.Som,
2016.
Figura 8 do Dossiê Genético - 1ª versão do roteiro de “A Lenda de Iping”, Grupo Pro.Som 2016.
Por fim, nas figuras 5, 6 e 8 pudemos observar a estrutura do Google Drive, que facilita a
manutenção do Dossiê Genético e garante a permanência dos arquivos na internet.
CONCLUSÃO
Nesse artigo pudemos observar as escolhas realizadas pelo grupo Pro.Som na adaptação
intermidiática da peça radiofônica “A Lenda de Iping”, compará-las com as opções realizadas
na adaptação anterior e estabelecer racicínio sobre métodos de escrita de roteiros para esse
gênero. Também pudemos refletir sobre escrita colaborativa e acessibilidade social, bem
como lançar bases, ainda que tímidas, para uma produção desse gênero no mercado
brasileiro.
A adaptação de literatura para peça radiofônica mostra suas dificuldades, tanto de produção
quanto de patrocínio, mas a experiência do grupo Pro.Som revela a possibilidade de
crescimento desse mercado, interessante não só aos ouvintes mas também aos produtores,
atores, roteiristas e demais envolvidos no processo. Se absorvida pela sociedade, a produção
de peças radiofônicas pode permitir um novo espaço de acesso para essas mídias sonoras que
são, também, uma forma de arte. E as adaptações seguem não só recuperando a memória de
histórias do passado, mas também recriando e atiçando a imaginação do seu público. Afinal
de contas, como diz Linda Hutcheon em “A Theory of Adaptation”: “No campo da
imaginação humana, adaptação é a norma, não a exceção.” (HUTCHEON, 2006, p. 177)2.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
2
“In the workings of the human imagination, adaptation is the norm, not the exception.”
LAWTON, Sherman Paxton. Adaptations. In: LAWTON, Sherman Paxton. Radio Drama.
Boston: Expression Co.,1938.
MACIEL, Luiz Carlos. O poder do clímax. Rio de Janeiro: Record, 2003.
SPRITZER, Mirna. O corpo tornado voz: A experiência pedagógica da peça radiofônica.
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.
WELLS, Hebert George. The Invisible Man. 1897.