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SEGUNDA-FEIRA, 9 DE AGOSTO DE 2010 O ESTADO DE S. PAULO

Os choques no Irã, onde o Brasil apoiou um governo que sufoca as oposições, criou um
clima ruim nas relações com Washington. E a solução não parece próxima: com economia
em crise e o risco de um derrota eleitoral em novembro, Obama tem mais o que fazer

EM BUSCA DO NORTE PERDIDO


As opções do atual governo, principalmente a aproximação com o Irã, esfriaram as relações com os EUA

Paulo Sotero uma alta fonte oficial de Washington. tional de Energia Atômica, David Kay, criti- ção de retaliações comerciais aos EUA e
De acordo com a fonte, o voto do Brasil caram a pressa da administração Obama mostrou que prevalece em Brasília e Wa-
vencedor ou vencedora das contra as sanções impediu a Turquia de abs- em ir adiante com as sanções em vez de shington o reconhecimento de que há inte-

O
urnas de outubro herdará, ter-se, como o governo de Ancara gostaria tentar usar os esforços do Brasil e da Tur- resses econômicos e uma relação importan-
na relação com os Estados de ter feito – segundo fontes suas teriam quia para buscar uma solução com o Irã. te a preservar.
Unidos, um ambiente enve- feito saber a Washington –, e agravou o da- A disposição dos EUA a um diálogo com o Promover a cooperação bilateral com vis-
nenado pelas consequên- no causado pelo clima de celebração da assi- Irã, admitida há dias por Washington, pode tas a resultados mutuamente vantajosos foi
cias da trombada entre Bra- natura do acordo em Teerã, no dia 17 de aliviar o mal-estar com Brasília e Ancara, a ênfase da Cúpula de Altos Executivos de
sília e Washington na questão do programa maio. O prejuízo estende-se à mídia, onde mas tem premissa que Teerã quer conver- Empresas dos dois países realizada em mea-
Paulo Sotero é nuclear do Irã e outros desencontros nos Lula começa a ser tratado com hostilidade, sar porque as sanções estão surtindo efeito dos de julho em Denver, Colorado. O presi-
jornalista e últimos dois anos. O ressentimento deixa- e ao Congresso. Para assessores parlamen- e é preciso, portanto, manter a pressão. dente do BNDES, Luciano Coutinho, nome
diretor do Brazil do pelo episódio iraniano é intenso, mútuo tares, o episódio alienou simpatizantes e “A eleição presidencial de outubro abre forte para a Fazenda num governo Dilma,
Institute do e extravasou para áreas além do controle gerou uma predisposição hostil ao Brasil uma oportunidade natural para se fazer enfatizou a importância da cooperação com
Woodrow Wilson dos diplomatas, o que deve complicar o in- que antes não havia e será agora mobilizada uma reavaliação nos dois países e recondu- osEUA dopragmatismonas decisõeseconô-
International dispensável trabalho de reconstrução da pelo influente lobby pró-Israel e por gru- zir o diálogo a um patamar produtivo”, dis- micas internacionais em encontro que teve
Center for confiança entre os dois governos. pos protecionistas contra iniciativas de in- se uma alta fonte diplomática. “Daqui até na Casa Branca, em conversas reservadas
Scholars, em Entre altos funcionários e pessoas que teresse do País. lá, é importante evitar duas coisas: que se com executivos e acadêmicos e em palestra
Washington. acompanham de perto as relações bilate- O clima ficou tão carregado que recente- conclua, em Washington, que o Brasil não é pública que fez no Wilson Center, durante
rais fala-se em uma “great anger”, algo en- mente diplomatas americanos acharam ne- um aliado confiável, e , em Brasília, que a viagem a Washington, no mês passado.
tre uma “grande irritação” e “enorme rai- cessário mobilizar amigos influentes em diplomacia americana está interessada ape- A falta de traquejo internacional de Dil-
va”. “Eu não teria previsto, no início do ano Washington para evitar declarações ou ges- nas em afirmar o poder dos Estados Unidos ma alimenta, porém, dúvidas se ela, uma
passado, o quadro negativo com que hoje tos que pudessem aumentar o estrago. e negar ao Brasil o espaço que o país con- vez no poder, optará por agradar a militân-
nos deparamos”, disse um funcionário. O ressentimento é mútuo. Há, no Planal- quistou na cena internacional.” cia do Partido dos Trabalhadores e abando-
No Departamento de Estado, na Casa to, forte zanga diante do que foi interpreta- No entanto, a retomada do diálogo de nará os traços de pragmatismo remanes-
Branca e em outras áreas do executivo e do do como um ato de sabotagem diplomática alto nível iniciado pelos presidentes FHC e centes na política externa.
Congresso norte-americanos, a interpreta- da secretária de Estado Hillary Clinton ao Bill Clinton nos anos 90, que Lula manteve Somem-se a isso as incertezas geradas
ção que Brasília deu aos fatos e o vazamen- acordo que Brasil e Turquia negociaram com George W. Bush e ensaiou com Oba- pela fragilidade da recuperação econômica
to de uma carta que o presidente Barack com o Irã. O sentimento foi expresso pelo ma, depende agora de fatores imponderá- dos Estados Unidos e pelas crescentes difi-
Obama enviou a seu colega brasileiro fo- próprio presidente Luiz Inácio Lula da Sil- veis. Em tese, a eleição de José Serra desa- culdades políticas do governo Obama. As
ram tomados como “má fé” de um governo va, quando recebeu o secretário geral das nuviaria o ambiente mais rapidamente. O pesquisas apontam para a derrota do Parti-
que pisou na bola, ignorou o que ouviu de Nações Unidas, Ban Ki-moon, em maio, candidato tucano na condenou publica- do Democrata nas eleições legislativas de
Washington em repetidas consultas, calcu- dias depois de o Conselho de Segurança da mente o abraço de Lula ao governo irania- novembro e perspectivas incertas de reelei-
lou errado a posição de outros países e aca- ONU ter apoiado a posição americana e no de Mahmoud Ahmadinejad. ção de Obama em 2012.
bou isolado não apenas de parceiros tradi- imposto novas sanções econômicas contra Em caso de vitória de Dilma Rousseff, a A consequência provável é que, nos próxi-
cionais do Brasil, mas também de novos Teerã. Segundo uma testemunha, Lula dis- dúvida é se ela adotará uma estratégia exter- mos dois anos, a administração norte-ame-
aliados, como China e Rússia. se sentir-se “traído” por Obama, a quem na pragmática, que busque fortalecer a ricana estará voltado para dentro. Isso, a
“A Rússia e a China votaram contra o Irã julgava estar ajudando ao interceder junto agenda econômica e revalorizar as relações má vontade mútua criada pelo episódio ira-
não porque acreditam nas sanções, mas por- aos iranianos numa missão de alto risco. com os EUA ou se abraçará a diplomacia niano e a possibilidade de nova colisão com
que valorizam sua relação com os Estados Figuras insuspeitas em Washington, co- ideológica dos últimos dois anos. A resolu- Washington a respeito dos Andes desacon-
Unidos e sabiam da importância que a deci- mo o ex-embaixador Thomas Pickering e o ção negociada da questão do algodão, de- selham grandes expectativas nas relações
são tinha para o presidente Obama”, diz ex-chefe das inspeções da Agência Interna- pois do episódio iraniano, evitou a imposi- bilaterais.

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