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SUBLIMAÇÃO, MULTIPLICIDADE DE NÍVEIS,


ABSTRAÇÃO E SIMBOLIZAÇÃO

Tradução do capítulo 14 do livro


“ Psychology of the Arts” de Hans e Shulamith Kreitler, Duke University Press,
Durham, N.C., 1978 (2nd ed)

Realizada pela Profª Selma Ciornai para circulação interna nos cursos de
Especialização em Arteterapia do Inst. Sedes Sapientiae, SP e do Inst. da Família
de POA, RS.
Colaboração na digitação do texto de Mariana Dias.

A afirmação sobre a relevância humana da arte, sugere que a arte pode


significar, denotar, expressar ou revelar algo de importância íntima e vital
para os seres humanos. Três tendências significativas aparecem com
freqüência nas análises dos efeitos produzidos pelos conteúdos da arte,
merecendo atenção especial por parte dos psicólogos. São as
afirmações de que a arte pode produzir a) satisfação dos desejos b)
solução de problemas humanos de natureza pessoal e c) insights em
aspectos importantes da existência e do mundo.
Há, obviamente um grande número de perguntas específicas em
psicologia que surgem a partir de cada uma dessas afirmações. Ainda
assim, por trás destas, está a suposição de que a gratificação, a solução
de problemas e a ocorrência de insights são relevantes de forma
singular para cada espectador da arte. Em outras palavras, o mesmo
trabalho de arte, pode satisfazer desejos específicos de um grande
número de pessoas, pode prover soluções para problemas pessoais de
vários indivíduos, e podem originar insights significativos de forma íntima
a muitas pessoas. Tal realização por parte da arte é até mais intrigante
quando consideramos, por um lado, a especificidade de conteúdos em
cada trabalho de arte, e por outro, a convicção de cada indivíduo, de
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que seus desejos e problemas são únicos, ou no máximo, semelhantes,


mas nunca iguais aos dos outros.
Parece haver mais de uma propriedade na arte, para alcançar esta
extraordinária façanha de fusão entre a unicidade pessoal e a
generalidade interpessoal. Cada um desses meios pode ser
caracterizado através de certas características compartilhadas por um
maior ou menor número de trabalhos de arte e através de certas
potencialidades de reação no espectador humano. Mais importantes
entre esses meios, são a sublimação, a multiplicidade de níveis de
estruturação e percepção, abstração complementada por concretização
e simbolização.

Sublimação

A descrição de um real ato de violência – digamos, um homem batendo


ou matando outra pessoa, a descrição de uma relação competitiva entre
duas pessoas, ou o relato de uma tentativa desesperada de se resolver
um mistério científico – podem ser vistos como uma apresentação de um
tema de agressão em níveis sucessivamente mais altos de sublimação.
Claro que cada uma dessas cenas pode aportar significados outros que
não a agressão, dependendo da apresentação do tema e dos meios de
comunicação. Mas quando a agressão é percebida como o tema mais
saliente, a diferença entre assassinato, competição, e a luta por
conhecimento podem ser reduzidas psicologicamente a diferenças nos
graus de sublimação. Apesar de ser unilateral, uma redução deste tipo,
é, em arte, não só significativa, mas também útil, ao salientar um
importante aspecto dos efeitos dos conteúdos expressos.

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Sublimação consiste na satisfação de necessidades, desejos e impulsos


em uma forma culturalmente aceitável – o que é atingido através de
mudanças introduzidas no objeto e objetivo do impulso, assim como no
seu modo de gratificação. A substituição de uma curiosidade sexual
original por curiosidade e buscas científicas, a canalização da
agressividade em esportes competitivos, e gratificação assegurada
através da arte – são clássicos exemplos de sublimação. Assim, em seu
sentido original, a sublimação refere-se a um grupo de processos
envolvidos em uma forma de satisfação indireta das necessidades,
desejos e impulsos. A necessidade disso e de outros mecanismos de
gratificação indiretos é explicado pela psicanálise através de uma
análise estrutural do ser humano e o mundo onde vive. Devido às
demandas morais internalizadas, representadas pelo superego, e devido
a pressões sociais e culturais e obstáculos inerentes à realidade, uma
grande parte de nossas necessidades permanecem insatisfeitas. A teoria
psicanalítica concentra-se principalmente nos desejos cuja gratificação é
obstruída pelo superego. Essa obstrução pode atingir o grau de rejeição
na consciência das necessidades não satisfeitas, sujeitando-as à
repressão. Contudo, uma vez que desejos reprimidos continuam a
pressionar por realização na realidade, usa-se com frequência meios
indiretos para sua satisfação. Esses são chamados de mecanismos de
defesa e envolvem vários graus de distorção do desejo ou até mesmo
de percepção da realidade, para assim possibilitar a gratificação apesar
dos obstáculos internos e externos. A sublimação representa um dos
mecanismos de defesa mais comuns e menos patológicos.
É comum dizer-se que o artista envolve-se em atividades sublimatórias
expressando seus desejos reprimidos de forma artística, o que pode ser

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tão bem sucedido que. ele pode até mesmo obter a real satisfação de
seus desejos, como por ex de honra, poder e amor de uma mulher
(Freud, 1963). Mas como os desejos sublimados do artista oferecem
satisfação sublimada ao espectador da arte?
Como é que um ato de assassinato, ou amor, ou sacrifício, podem ,
uma vez representados, servir à realização do desejo do leitor ou do
observador? Concentrando-se na gratificação de desejos reprimidos, ou
pelo menos severamente censurados ou condenados, estudiosos da
psicanálise enfatizaram que a satisfação sublimada através da arte
torna-se possível através da aplicação de dois meios principais. O
primeiro é disfarçando e escondendo o desejo original, enquanto o
segundo seduz os observadores através da beleza formal que serve
como “um bônus de incentivo” no sentido de já ser uma forma de prazer
(Freud, 1955, pp187 ff.; 1959, p 64ff). Ambos os meios são designados a
permitir a satisfação apesar dos olhos alertas do superego e sem a
evocação da ansiedade, culpa e remorso que acompanhariam a
gratificação na vida real ou mesmo nas divagações diurnas (Lesser,
1962; Waelder, 1965).
Conseqüentemente ao prevenir “conflitos abertos com as forças de
repressão” (Freud, 1959 b, p64), esses meios possibilitam que se
alcance a satisfação a um custo e esforço mínimos. Mas também
contribuem para a formação do caráter sublimatório da gratificação,
menos real e menos intensa do que as satisfações em situações da vida
real (Freud, 1948ª).
Contudo, uma análise detalhada de vários artifícios do tão chamado
disfarce e tentação, revela características singulares da satisfação
sublimatória artística que diferem da gratificação sublimatória em

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contextos não artísticos. Realmente isto é demonstrado pelo fato de que


pelo menos em trabalhos de arte que tem um nível claramente
identificável de conteúdos narrativos – representacionais, nós
freqüentemente encontramos descrições realistas e detalhadas de
ações ou eventos duramente censurados pela cultura e sociedade [...]
Como a arte consegue o privilégio e autorização de representar de
forma clara, ou até mesmo intensificada, vários desejos sexuais e
agressivos que dificilmente ousaríamos imaginar mesmo em fantasia?
Parte da resposta a essa pergunta está na abrangência da
representação artística. A descrição de um assassinato em um romance
como Crime e Castigo de Dostoiewsky, inclui, de fato, todos os atos de
violência, assim como seus aspectos sádicos e sanguinolentos, mas não
encobre todos os outros fatos relacionados ao ato: as dificuldades reais,
as inibições internas, o sofrimento anterior e posterior ao assassinato,
bem como a punição, a culpa, a confissão, expiação em níveis diversos.
Assim, ao mesmo tempo que satisfaz desejos agressivos e
possivelmente, até mesmo desejos mais específicos de se assassinar a
própria mãe, e reafirmar o direito do jovem de lutar contra os mais
velhos e suas estruturas antigas e vorazes, as cenas descritas não
deixam de satisfazer outros desejos complementares. Mais importante
entre estes, estão o desejo por punição condicionada ao superego, e a
exigência induzida pelo ego por controle contínuo, que são gratificadas
através do confronto com todos os resultados realistas e psicológicos do
assassinato.
A amplitude de apresentação pode se manifestar de várias formas, por
exemplo, dividindo a realização dos desejos em duas ou mais figuras
como Dr. Jekyll e Mr. Hyde, ou Rei Lear e seu bobo da corte, ou através

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da elaboração de um problema em vários níveis. Essencialmente isto


significa que a satisfação abrange não somente os desejos do id, como
também aqueles do superego e do ego; que a reverência deve ser feita
não somente ao princípio do prazer, mas também ao princípio da
realidade; que a gratificação estende-se a combinações incompatíveis
de desejos e contra desejos, como por exemplo, aos desejos de ser
Dom Quixote e Sancho Pança, de ser Otelo e ao Iago ao mesmo tempo
de dentro de nós, às nossas tendências diabólicas e de “santo” que
continuam a coexistir e recusam-se a entrar em acordo.
A amplitude da apresentação, que varia em grau de um trabalho de arte
para outro, é suplementada por outros meios que podem auxiliar a
sancionar a realização sublimatória do desejo através da arte – por
exemplo, descrições metafóricas e alegóricas, simbolizações,
deslocamentos e outros recursos característicos da elaboração
secundária de material ligado ao id (Freud, 1953). O mais importante
desses meios, é a atribuição de desejos a personagens fictícios cuja
existência ilusória resulta em impulsos e ações sociais, moralmente
inofensivas e conseqüentemente toleráveis. Este recurso, que poderia
ser considerado parte integral da representação artística, possibilita ao
observador esconder-se atrás da identidade de algumas figuras com as
quais seu self não de identifica enquanto busca prazeres proibidos. Além
disso, contribui para a acentuação do prazer possibilitando ao
observador um meio de atenuar seu sofrimento enquanto vive as partes
menos agradáveis das aventuras do herói “através da certeza de que
em primeiro lugar, é outro, e não ele mesmo, é somente encenação, e
conseqüentemente, não há ameaça à sua segurança pessoal” (Freud,
1942). Quando assim formulado, esse meio de manifestação artística

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nos lembra recursos semelhantes e recorrentes de divagações diurnas


e sonhos noturnos, onde forças do inconsciente liberam-se em certa
medida do controle da consciência.
Contudo, em sonhos, a satisfação de desejos depende enormemente de
processos inconscientes. Nas artes não. Aqui, os processos conscientes
são tão envolvidos quanto os inconscientes. Embora em certo nível, o
observador use as figuras de arte como uma forma de encobrir e
desculpar suas próprias experiências, em um outro nível, seu
envolvimento pode significar um estreitamento da distancia ou até
mesmo a diminuição da diferenciação entre eles e essas figuras.
Realmente, é a redução da diferenciação entre o observador e as figuras
de arte que necessita de especial ênfase na natureza fictícia dessas
figuras e suas experiências. Pois é muito em função da atmosfera fictícia
que a evocação e satisfação de desejos reprimidos parecem
permissivos.
A ponte que conecta a distância entre o observador e a figura de arte
acontece principalmente através da projeção das necessidades e
desejos do observador nos personagens criados e através da sua
identificação com eles. Os tipos mais comuns de projeção no contexto
da arte podem ser tidos como uma “projeção atribuída”, isto é , a
percepção em outros de sentimentos e características próprias, como
quando uma pessoa que odeia, sente que os outros a odeiam, (Freud,
1938, Freud, 1956b, p.449) e “projeção complementar” que consiste em
perceber em outros características diferentes daquelas identificadas em
si mesmo, mas complementares a elas, e que as explicam, como por
exemplo, quando uma pessoa sente medo, ele pode ver os outros como
assustadores (Freud, 1956, p.452). Projeções de ambos os tipos são

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ativadas principalmente quando uma pessoa sente-se ameaçada devido


a evocações de impulsos proibidos e devido à dificuldade de integrar o
que ela percebe em si própria com as exigências de seu superego, sua
própria imagem e crenças em geral (Holmes, 1968: Murstein & Pryer,
1959). Uma vez que as experiências empáticas que contém elementos
de satisfação de desejos proibidos podem evocar ansiedade, medo e
vergonha, o observador da arte é induzido a atribuir esses desejos
proibidos e sentimentos às figuras de arte, e assim, tira parcialmente a
carga de culpa de seus ombros e até mesmo a responsabilidade.
Levanta-se a hipótese de que os conteúdos dos trabalhos de arte
fornecem objetos e situações favoráveis à projeção. A observação de
Shakespeare em “Anthony e Cleópatra” de que “algumas vezes vemos
uma nuvem com forma de dragão; ou uma nuvem de vapor como leão
ou urso”, não deve ser generalizada de modo a se considerar que
qualquer nuvem ou vapor possa igualmente servir de tela para
projeções. Muitos estudos demonstram que algumas figuras elicitam
mais projeções do que outras (Eisskopf, 1950), outras oferecem mais
elementos para projeção do motivo a ser atingido, do que outras
representações (Jacobs, 1958), e que em geral as projeções tendem a
ser relacionadas a figuras que podem plausivelmente serem vistas como
possuidoras das características projetadas. Por exemplo, características
ameaçadoras são mais frequentemente projetadas sobre figuras
masculinas do que femininas (Horbenger, 1960), traços negativos são
preferencialmente projetados em pessoas semelhantes a si próprio do
que diferentes (Bramel, 1963; Edlow & Kiesler, 1966). Uma vez que as
projeções são comuns no curso da experiência da arte, as figuras de
arte são provavelmente construídas para facilitar projeções relevantes

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aos conteúdos.
Além da ansiedade proveniente da satisfação de desejos proibidos e a
natureza do estímulo da arte, parece haver pelo menos dois fatores
interligados que facilitam enormemente as projeções dentro do contexto
de experienciar a arte. Ambas dependem da estruturação característica
da obra de arte e da maneira pela qual seu conteúdo narrativo
representativo é apresentado. Uma vez que muitos trabalhos de arte são
possuidores de múltiplos níveis de significado (ver ítem Multiplicidade de
Níveis), é dado ao o expectador um certo grau de liberdade na definição
do tema e organização perceptiva do material apresentado. Esta
atividade tão criativa pode possibilitar a evocação de avaliações
pessoais, interpretações subjetivas atraentes e percepções em termos
das atitudes habituais ou sentimentos temporários, como é costume
quando o estímulo permite interpretações múltiplas (Jenkins, 1957:
Leuba & Lucas 1945). Essa percepção subjetivamente controlada, que
poderia ser em si considerada como uma projeção em um sentido mais
amplo (Freud, 1938, pp. 857, 879) também pode facilitar as projeções no
sentido mais restrito de um mecanismo de defesa.
O segundo fator que facilita as projeções em arte foi definido por Freud
(1949d, p. 323) como dependendo de uma economia sutil de arte por
parte do poeta para não permitir que seu herói expresse completamente
todas as motivações que guiam suas atitudes. Desta forma, ele nos
obriga à complementação, ele compromete nossa atividade intelectual, a
separa das reflexões críticas e nos mantém em próxima identificação
com o herói. A atividade de suplementação da informação apresentada é
essencialmente uma parte da resposta do espectador à arte, através da
qual ele torna-se um cúmplice do artista em muitos sentidos. Contudo,

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enquanto o observador é chamado a suplementar a motivação dos


heróis criados, ele é levado a usar sua experiência pessoal,
freqüentemente a ponto de favorecer a projeção de suas próprias
necessidades e motivos nos personagens criados. A evidência para esta
conclusão deriva também da atividade de se fazer analogias que
freqüentemente segue a confrontação com um trabalho de arte e
consiste em se assumir imaginariamente o papel do herói e vivenciar
suas experiências como se fossem nossas (Bettelheim, 1949; Lesser,
1962. Pág. 203-4, 244-47).
“Fazer analogias” significa em grande parte identificar-se com figuras de
arte, que é a segunda maneira principal – além da projeção de criar
pontes entre o observador e o conteúdo da obra de arte. Embora a
identificação na arte seja freqüentemente muito menor e menos intensa
do que a identificação em situações reais, os motivos mais importantes
nesses diferentes contextos parecem ser muito semelhantes. Da mesma
forma que a criança pode tentar imitar uma pessoa de quem tem ciúmes
por “possuir um melhor controle de recursos do que ele próprio (Whiting,
1960, p.118), tal como sexo, descanso, informação, liberdade quanto a
restrições, dor, amor, orgulho” (ibid., p.113) para usufruir do poder desta
pessoa e domínio sobre seu meio (Kagan, 1958), o observador da arte
pode ser induzido a assumir afetivamente e cognitivamente o papel de
uma figura de arte para atingir, pelo menos em fantasia, o objetivo que a
figura atingiu. Destacam-se entre esses objetivos as realizações de
desejos negados ao observador, mas atuados pelo personagem. Esta
conclusão tem apoio, por exemplo, na evidência de que programas
violentos de TV são mais assistidos por crianças inseguras e frustradas,
do que por crianças que desfrutam de relações harmoniosas com seus

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pais (Maccoby, 1954; Schramm et all., 1961). A mera imitação é também


desenvolvida quando o modelo é uma celebridade (Hovland, Janis &
Kelley, 1953), muito competente (Mauser & Bloch, 1957; Rosembaum &
Tucker, 1962), ou de status elevado. Assim, qualidades altamente
admiradas em uma cultura podem servir de modelos para imitação e
identificação, mesmo que nem todos sejam objetivos de um indivíduo
específico.
As figuras de arte são freqüentemente dotadas de qualidades como por
exemplo, poder extraordinário, intrepidez, coragem, sabedoria, etc., que
pode dar-lhes o caráter de objetos altamente desejáveis para
identificação. Ainda assim, a identificação com o personagem requer um
processo mais abrangente de elaboração cognitiva do que é possível no
decorrer da exposição à obra de arte. Conseqüentemente, é mais
provável que esta desenvolva-se completamente apenas mais tarde e
caracterize-se através de séries mais ou menos longas de divagações
diurnas nas quais as projeções tem um papel cada vez mais importante,
enquanto que a diferenciação entre o Eu do observador da arte e o
personagem da arte tornam-se gradualmente mais e mais
apagados(Lesser, 1962, cap.10; Wolfestein & Leites, 1950).
Desta forma, alcançar a realização de um desejo através da arte,
pressupõe um conjunto de processos complexos modelados e
acionados pelas imagens e descrições representadas na obra de arte.
Dois fatores mais importantes parecem ter papel crucial na
determinação da ocorrência da satisfação do desejo através da arte: a
relevância dos conteúdos da obra de arte aos desejos ou necessidades
não satisfeitos e a atividade de fantasia do observador que possibilita
projeções e identificações. A relevância dos conteúdos e a necessidade

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dependem enormemente da natureza da necessidade. Para desejos


culturalmente rejeitados, que são conseqüentemente reprimidos na
maioria dos indivíduos em sua cultura, a apresentação do desejo e de
sua realização na arte pode ser disfarçado ou distorcido para passar
pela censura geral do público e a censura do super ego dos
espectadores individuais, sem evocar repugnância ou ansiedade. Maior
explicitação deverá caracterizará os desejos que são em geral
aprovados pela cultura, embora não sejam satisfeitos em um grau
satisfatório na realidade e nem mesmo em fantasia, pela falta de
oportunidade, potencialidade restrita ou mesmo falta de imaginação.
Pertencem a essa classe por exemplo, desejos de maior riqueza, poder,
sabedoria, desejo por segurança, liberação do medo, aceitação total e
amor ilimitado, desejo por pureza, perfeição ou devoção a uma grande
idéia. Contudo, a relativa explicitação da apresentação não deve ser
considerada como um critério de aprovação do desejo pela cultura,
enquanto que a relativa discrição na apresentação não deve ser tida
como indicação de que o conteúdo latente seja moralmente
questionável. Desejos podem ser apresentados de modo simbólico, e
insights podem ser oferecidos através de uma multiplicidade de
imagens e metáforas, não devido à repressões, mas devido ao fato de
que a expressão direta ainda não é possível, ou então, porque a
maneira simbólica e aparentemente disfarçada da apresentação é a
mais clara e adequada para aquele tipo de conteúdo (Jung, 1956, p290).
De forma semelhante, um conteúdo específico pode ser apresentado em
um nível altamente abstrato, sem muitas sugestões sobre o desejo
original e sua realização, não para disfarçar seu significado, mas com a
finalidade de se aumentar o apelo da generalidade do conteúdo.

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É, contudo, através da atividade da fantasia do observador da arte na


qual predominam os processos de projeção e identificação que os
conteúdos mais ou menos manifestos ou latentes de uma obra de arte
transformam-se em realizações de desejos e insights para o indivíduo
observador. Ainda assim, diferente das divagações diurnas comuns,
orientadas principalmente pelos desejos do indivíduo e sua experiência
limitada (Singer, 1966), fantasias estimuladas através da arte dependem
muito também do material apresentado na obra de arte . Este material
que passa por personalização através do processo de “analogia”
(Bettelheim, 1949, 1941; Wolfestein & Leites, 1950) não só estimula e
fornece objetos para projeções e identificações específicas, como
também pode estender os desejos a amplitude e profundidades
extensas, sugerindo novas alternativas realistas e psicológicas de
satisfação, e, encorajando a satisfação concomitante de tendências
antagônicas, podem facilitar fantasias mais arrojadas do que o indivíduo
teria de forma ordinária.
A hipótese de que os conteúdos da arte podem fornecer satisfações de
desejos sublimados levanta a questão de se tais satisfações levam a um
alívio catártico, ou se possivelmente aumentam ou até mesmo
estimulam desejos no observador da arte. Estudos empíricos
usualmente mostram aos sujeitos da pesquisa um modelo sendo
filmado envolvido em atos de violência e agressão, e comparam seus
níveis de agressão antes e depois da exposição a tais conteúdos. A
grande maioria desses estudos mostra que a visão desses modelos de
agressão sob condições normais provoca agressão e aumenta sua
manifestação em crianças (Bandura, Ross & Ross, 1963), adolescentes
e adultos (Walters & Thomas, 1963). Somente sob condições restritas e

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específicas, principalmente de medo de conseqüências ou ausência de


oportunidades e reforço, é que deixa de levar a um aumento da
expressão de agressão, mas não leva contudo a uma redução da
agressividade (Bandura, 1969, pp127-29).
Essas constatações levaram muitos investigadores a duvidar se há de
fato qualquer efeito de catarse após a exposição á agressão.
Realmente, em vista das fortes tendências de imitação que são a base
das experiências empáticas (Cap. 13) e as claras sugestões para
agressão amplamente estimuladas em filmes de violência (Berkowitz,
1962, cap. 8), não há razão para se duvidar que a observação de
agressão instiga à agressão. No entanto, há boas razões para se
duvidar que os experimentos citados forneçam provas conclusivas
contra a hipótese de catarse. As razões mais importantes são que os
modelos agressivos e filmes violentos representam agressão nua e crua,
quase que não contaminada por quaisquer elementos sublimatórios. São
atraentes principalmente a impulsos de Id enquanto falham em ativar as
forças reprimidas concomitantes e subseqüentes do Ego e Super Ego, e
finalmente, que possuem bem poucos recursos seguros de
“distanciamento”. Essas considerações, por um lado, fazem surgir
dúvidas se estudos que usam violência filmada são relevantes ao
problema da catarse, mas por outro lado, também originam varias
condições hipotéticas interrelacionais sob as quais poder-se-ia esperar
que ocorra catarse. Estas são, primeiro, apresentando desejos e sua
realização de forma sublimada, isto é, em um nível social aceitável e em
um contexto que também satisfaz o Super Ego e permite o exercício de
controle e teste da realidade; segundo, oferecendo a possibilidade para
um grau adequado de distancia estética por parte dos espectadores, que

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conseguirão, então, preservar o limite entre o permissível na arte e o


tolerável na realidade; e terceiro, estimulando a elaboração cognitiva dos
conteúdos apresentados de modo a conscientizar o observador sobre os
novos aspectos e níveis da realidade e portanto, fazer com que a
orientação cognitiva coloque-se a serviço do controle de impulsos.
Permanece, contudo, para outros estudos, demonstrar se a catarse
aconteceria realmente sob tais condições.

Multiplicidade de Níveis

Na conclusão de sua famosa interpretação de Hamlet em termos de


conflito edípico, Freud (1953, vol. 4 p. 266) afirma que : “assim como os
sonhos, todos os sintomas neuróticos são passíveis de hiper
interpretação, e requerem esse tipo de hiper interpretação antes de
tornarem-se inteligíveis. Toda criação poética genuína deve ser
procedida de mais de um motivo... e deve admitir mais de uma
interpretação. Tentei aqui interpretar somente o estrato mais profundo.”
A analogia que Freud estabelece aqui entre as obras de arte, sintomas,
e sonhos, evidencia a característica básica da arte de não ser
responsável apenas por sua extraordinária riqueza potencial e ampla
atratividade, mas também, de representar uma solução singular ao
problema de fusão entre o geral e o especifico.
Interpretar e parafrasear o conteúdo da arte sempre foi e é uma tarefa
complicada e ingrata. Independentemente de quão convincente,
abrangente e original seja uma interpretação, nada parece mais fácil do
que refutá-la sugerindo outra interpretação que possa ter bem pouco em
comum com a rejeitada . A dificuldade de interpretação é particularmente

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obvia para trabalhos de arte reconhecidos como obras de arte. Sobre o


que é estória do Cap. Ahab e a baleia Moby Dick? Sem dúvidas trata-se
de um drama sobre caçadores de baleias no Pacifico, drama de caça e
aventura. Mas quem não se impressiona com a sugestão de Murray
(1941) de que Cap. Ahab é a encarnação de um anjo caído, Satã ou
Anti-Cristo, e que ele juntamente com seus diabólicos companheiros,
encontrava-se em uma cruzada contra a inóspita ética judaico-cristã? E
se assim o for, poderia representar a revolta de um individuo contra as
restrições impostas pela imagem de seus austeros e zelosos pais? Ou o
perene embate entre forças do Id e do Super Ego? (...)
Semelhantes problemas de interpretação surgem sempre que se tenta
pinçar o significado, conteúdo ou mensagem de trabalhos de arte em
qualquer domínio. Os volumes, verdadeiras bibliotecas de criticas e
interpretações de arte que se acumularam no decorrer dos séculos, são
testemunhas de que a tarefa é infindável e possivelmente sem solução.
Essencialmente o problema não reside nem na necessidade de se
selecionar “a” interpretação mais adequada , nem em criar uma
metodologia que integre os vários significados que se encontram na
obra de arte, mas sim na clarificação de o que permite que a arte
veicule tantos significados ? (...)
Também são cruciais as questões referentes ao observador da arte :
como ele percebe os múltiplos níveis de significado e qual o efeito
experiencial desta poli-significação.
A multiplicidade de níveis é a capacidade de um trabalho de arte ser
percebido, elaborado e experienciado segundo vários sistemas de
significados potenciais, cada um dos quais permitindo uma organização
independente clara, significativa e abrangente de todos os elementos

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mais importantes da obra de arte. Cada um destes sistemas de


significado é denominado nível. Apesar do termo de multiplicidade de
níveis ser incompleto, ele acaba sendo mais adequado que outros.
A inadequação de muitos dos termos usados serve para salientar as
características do fenômeno com que lidamos. Níveis se devem às
diferenças na organização e na forma de relacionar-se
significativamente com estes esses elementos [ não têm uma conotação
hierárquica ]
[....] Um exemplo é o trabalho de analise de Neumann (1959) sobre as
esculturas de Moore com a figura feminina reclinada: Em um nível a
figura parece uma mulher, representando de forma abstrata o feminino
em geral, de forma que os buracos que nela se encontram podem
sugerir os genitais femininos, como observadores orientados pela
perspectiva psicanalítica sugeririam (Ibid p. 39) . De outro ponto de vista
a figura pode ser percebida como a mãe, e os buracos adquirem a
conotação de útero. Em outro nível as formações estilizadas do corpo
parecem sugerir contornos de paisagens – cumes de montanhas e
precipícios – os buracos assumindo o papel de cavernas em montes e
escarpados, irradiando o fascínio das cavernas (ibid., p.39). A fusão das
conotações femininas e terrestres poderiam portanto de um ponto de
vista representar a imagem simbólica da Mãe Terra , mãe e terra ao
mesmo tempo (ibid., p.53). Mas de outro ponto de vista indicaria a
emergência de um novo nível em que a figura reclinada aparece como
um corpo orgânico e vivo transformando-se em inorgânico, ou o humano
transmutando-se em objeto. Neste nível os buracos parecem ser a
revelação externa do interno, como o vazio que convida à investigação”
(ibid, p.51), como o portal do “ caminho secreto de iniciação que leva os
humanos, em todos os lugares, à escuridão ., .... à escuridão do
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inconsciente [que] lhes promete a descoberta de um tesouro escondido,


o desvelamento do segredo” (ibid., p. 50).
O exemplo de Neumann demonstra que apesar da abrangência e
distinção de cada nível dentro de um mesmo trabalho, os níveis podem
interagir de maneiras diferentes.
Os diferentes níveis podem ser não somente independentes mas
desconectados uns dos outros, de modo que um nível pode as vezes
até contradizer um outro. Muitos dos significados mais emergentes pode
ser vistos como “alternativas, excluindo e inibindo uma a outra” (Kris &
Kaplan, 1952, p. 245).
Já no caso da análise de Neumann sobre as esculturas de Moore,
interrelações entre diversos níveis são mais características . Apesar de
alguns níveis parecem ser diferentes mais em termos do grau de
especificidade, enquanto outros surgem e se complementam
naturalmente, revelando um núcleo mais rico de significados. Todos os
níveis, de um certo ponto de vista (Neumann, 1959, p. 110), podem ser
considerados diferentes caminhos para um significado nuclear, cuja
revelação demanda a consideração de cada nível para que possam se
integrar. Os dois tipos de inter-relações entre níveis podem ser
expressos em termos de uma metáfora usada por Tocqueville, ao
comparar a União Americana com Grã Bretanha (citado em McLuhan,
pp. 1967 p. 421-22): “a América é como uma floresta cortada por muitas
estradas retas que convergem a um mesmo ponto” de forma que “temos
somente que encontrar o centro para que tudo se revele com um só
olhar”, mas “na Inglaterra,os caminhos se cruzam e entrecruzam e só é
possível ter-se uma idéia do todo percorrendo cada um deles.”
No entanto, independente das formas pelas quais os múltiplos níveis de

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um trabalho de arte se complementam, representam hierarquicamente


significados mais abrangentes, permanecem autônomos ou tendem a se
fundir em uma concepção mais ampla, cada nível permite uma
perspectiva do todo, sem comprometer a qualidade da gestalt total do
trabalho de arte produzida por muitos ou todos os níveis conjuntamente.
Esta qualidade de totalidade experienciada por uma obra de arte,
salienta a importante característica de comunicação através da arte em
contraste com comunicação de sentido e informações através das
ciências, filosofia e outros meios. A comunicação através destes é
essencialmente seqüencial; permitem uma construção gradual do
significado com base em apresentações sucessivas de unidades
discretas de informação e idéias. Mas o insight sobre o significado de
uma obra de arte é normalmente instantâneo e abrangente. Captar o
significado da arte como um todo depende das partes, mas também
pode preceder a compreensão das partes e determina seu significado e
função. O todo é uma organização especifica das partes - em uma obra
de arte com multiplicidade de níveis, uma de varias organizações
plausíveis.
(...) Com base nas observações acima, a multiplicidade de níveis parece
ser produto conjunto de características na obra de arte e certas
maneiras de percepção e elaboração do observador. Uma pre´-condição
básica para a multiplicidade de níveis é o uso de estímulos que possam
evocar distintos significados.
Os diversos elementos que compõem as várias artes, i.e., cores, formas,
movimentos e palavras, são estímulos que através do uso contínuo e
extenso em diferentes contextos tornaram-se foco de associações,
conotações emocionais e significados simbólicos diversos. Esta

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qualidade os torna potencialmente capazes de serem integrados em


diversos sistemas de significados.
Os trabalhos de arte também facilitam a multiplicidade de níveis por
serem portadores de indicações que sugerem possibilidades de varias
organizações diferentes, igualmente válidas, para um mesmo grupo de
estímulos. Por exemplo, na pintura, as formas podem sugerir uma
possibilidade de organização diferente daquela indicada pelas cores ou
pela cena representada; na melodia de uma música, a harmonia e o
ritmo podem imediatamente inspirar estruturações diferentes do
material musical. Este tipo de indicações provêm uma base forte à
organização em vários níveis especialmente quando as diversas
estruturas sugerem significados contrastantes. Por exemplo, na peça “ A
Lição” de Ionesco, no nível verbal vemos um professor e um aluno
envolvidos em uma repetição convencional de frases de um livro,
enquanto no nível da ação testemunhamos como o professor
gradualmente drena a vitalidade do aluno até finalmente estocar uma
faca em seu corpo.
Duas formas notáveis de se aumentar a multiplicidade de níveis de um
trabalho de arte, são os símbolos e os temas que tornam-se focos para
a atribuição de diferentes significados. Os símbolos, (ver Simbolização,
abaixo) são representações de significado através de imagens, cenas,
movimentos, etc. (...) Há varias categorias de símbolos e elas diferem
tanto no estimulo que serve para expressar o significado quanto com
relação ao modo pelo qual esses estímulos se associam ao significado
representado. Por exemplo o conceito de “ vida” pode ser representado
através da imagem de uma rua fervilhante de transeuntes – que serve
como uma instância exemplificadora de “ vida” , ou através da imagem

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de um rodamoinho -- que pode servir como uma “ metáfora para “ vida.”


Em ambos casos as imagens contém um conjunto duplo de
significados: o significado convencional original , e um significado
simbólico sugerido pela imagem.
O significado simbólico no entanto, frequentemente contém uma gama
ampla de possíveis significados , mas nenhum deles no entanto pode
ser identificado como “ o correto”. Uma pintura cubista por exemplo,
pode ser tomada como uma metáfora de desintegração de valores pré-
fixados ou da multiplicidade de níveis da realidade. Assim, toda
expressão simbólica tem essencialmente múltiplos níveis de significado.
Além disto, a multiplicidade de níveis é construída no símbolo no sentido
em que o significado simbólico não somente é sugerido pela imagem,
mas principalmente incorporado através dela e a ela fundido.
O segundo meio de aumentar a multiplicidade de níveis é através do uso
de situações significativas e estórias. O impacto principal de tais
situações ou estórias vem da sua capacidade de evocar uma variedade
de significados.
Essa potencialidade pode ser traçada em sua origem em situações
comuns e sua elaboração recorrente na arte de uma certa cultura ou
sociedade. Na arte Ocidental, busca-se a fonte ou o perpetrador do mal,
a luta e conquista do amor sobrepujando dificuldades, a estória de
Cinderela, a vitória do fraco sobre o forte etc
Complementar às várias características no trabalho de arte que tornam a
multiplicidade de níveis possível, há a capacidade do observador de arte
em captar a multiplicidade perceptualmente, conceitualmente e
experiencialmente. Esta capacidade é possível devido à habilidade de
se mudar de ponto de vista, trocar uma estrutura de referencia por outra,

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e substituir uma organização de estímulos por outra.


Em laboratórios de psicologia, essa habilidade de trocar e substituir é
comumente estudada em relação à estímulos perceptuais que admitem
diferentes organizações (por exe., figura e fundo que tendem a mudar de
papeis , como os exemplos de Rubin 1921) , com perspectivas
tridimensionais que competem com percepções bidimensionais( Koffka,
1930, pp 163-67) , e com relação à tarefas conceituais que requerem do
sujeito uma reorientação devido a mudanças no problema (Kendler &
Kendler , 1962), ou em busca de melhores soluções (Luchins, 1942).
Contudo, mudar [a percepção ] no contexto da experiência de um
trabalho de arte difere da mudança na resolução de tarefas como
resolução de problemas. Em contraste à mudanças em tarefas de
percepção de estimulo em termos de uma gestalt ou outra, mas não em
termos de ambas simultaneamente, a mudança de um nível de arte
para outro não requer que o espectador abra mão da primeira
organização em favor da segunda. Ele pode considerar trabalho
segundo vários níveis ao mesmo tempo, e mesmo buscar uma
integração destes vários níveis. Alem disto, em contraste com
mudanças em relação a problemas conceituais, que usualmente
envolvem substituir uma solução errada ou pior por outra melhor, na
arte, passar de um nível para o outro não significa necessariamente que
um seja superior ao outro. Os vários níveis de um trabalho de arte
podem diferir em amplitude ou profundidade do insight que
proporcionam, mas com freqüência podem ser todos igualmente
significativos e permitir visões igualmente válidas do todo.
Mas em outros aspectos há similaridades entre mudanças de percepção
em trabalhos de arte e problemas perceptivos e conceituais De certa

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forma trocas nestes diversos contextos consistem em descobrir novas


relações entre os elementos percebidos e combiná-los de novas formas.
Esta é a característica mais importante que ilumina a afinidade entre
estas mudanças perceptuais e o pensamento criativo (Koestler, 1964,
p.45; Mednick, 1962, p.221)
A ocorrência de mudanças em diferentes contextos pode ser explicado
em parte também, pela semelhança de fatores motivacionais. Mais
importantes entre estes são a saturação e utilização psicológica e
pratica dos vários pontos de vista e soluções. Assim, embora sujeitos
prefiram inicialmente perceber estímulos visuais através de gestalts
mais simples e melhores, tendem a mudar depois de um tempo, até para
organizações piores (Sakurabayashi, 1953) para combater a saturação.
A mudança é menos freqüente quando o estimulo é mais complexo e
articulado, contendo movimento ou sendo interessante por outros
motivos. (Dember, 1960, pp. 160-61). Em problemas conceituais
contudo, a troca é facilitada quando uma tentativa anteriormente feita
não obteve sucesso ou não tenha a conotação de proteger os indivíduos
contra a frustração e sentimentos de incompetência (Gardner &
Runquist, 1958; Van de Geer, 1957).
Os fatores análogos de motivação que poderiam afetar as mudanças na
arte seriam: tendência em superar uma saturação, substituindo uma
organização já familiar por uma nova, e segundo, a expectativa de que
outros aspectos e níveis de um trabalho de arte possam tocar questões
que não foram abordadas ou experienciadas em outros níveis. Estes
fatores não são mutuamente exclusivos. Assim, a multiplicidade de
organizações e significados que um trabalho de arte com multiplicidade
de níveis permite, tem papel crucial na determinação da preservação de

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sua atração e interesse para um mesmo observador em diversas


ocasiões, ou para vários observadores, mesmo que em esferas culturais
e períodos diferentes. Neste sentido, a multiplicidade é, sem dúvida, um
dos fatores mais importantes que permitem que um trabalho de arte
passe o teste de mérito estético. Assim, a popularidade de um trabalho
de arte pode usualmente ser devida por abordar uma questão que
conscientemente ou não, preocupa os membros de uma sociedade,
sendo que seu atrativo pode se esvair na medida em que o problema
deixa de ser importante. Tais trabalhos de arte podem às vezes desfrutar
de um movimento de “revival” , se contêm níveis que não foram
considerados pelas gerações previas mas foram descobertos pelas que
se seguiram. Mas enquanto estes “revivals” de interesse são raros,
uma mudança progressiva através de gerações nos sentidos atribuídos
a um trabalho de arte são mais freqüentes, apesar de que, os dois
fenômenos dependem da multiplicidade de níveis inerente no trabalho
de arte.
Se por um lado, a mudança de um nível para outro é um processo
seqüencial, no trabalho de arte, os vários níveis coexistem, algumas
vezes como facetas de um cristal, outras vezes como radiações de uma
fonte de luz. Da mesma forma, apesar de que cada nível revela a
totalidade, um observador pode frequentemente perceber um trabalho
de arte simultaneamente em mais de um nível, ou integrar em um só
insight vários níveis que tenha experienciado sequencialmente. O
processo subjacente a estas experiências mais abrangentes, envolvem
não somente uma simples mudança, mas em um processo de
transcendência de limitações prévias. Esta transcendência se baseia no
mesmo processo que nos permite compreender uma pessoa

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simultaneamente com base no que ele literalmente diz, e no que


expressa indiretamente através de gestos, mímica e escolha particular
de palavras. Estes são os mesmos processos que subjazem orientações
mais complexas , e que permitem que uma pessoa se localize
concomitantemente nos níveis temporal, espacial, psicológico e social
da realidade, que desempenhe vários papéis ao mesmo tempo em que
permanece sendo si mesmo, e que possa perceber as pessoas com
quem interage como parceiros, competidores, parentes e amigos ao
mesmo tempo.
A percepção abrangente da multiplicidade de níveis pode ter pelo menos
uma das duas formas seguintes: Se tiver um caráter de integração, pode
envolver alguns dos processos mais característicos da percepção e
conceituação nos níveis mais altos de desenvolvimento, i.e.,
flexibilidade, estrutura hierarquizada e centralizada, consideração de
vários fatores simultaneamente, consciência de outros pontos de vista
além do egocêntrico, e integração de diversidade na unidade sem
desvestir as partes de sua heterogeneidade e diversidade funcional
(Lewin, 1936; Inhelder & Piaget, 1958; Werner, 1957, cap. 1). A
percepção compreensiva pode assumir também uma forma redutiva e
consistir em centralizar a experiência em um dado nível. Este nível
(preferido ) pode ser , em termos perceptuais ou conceituais a melhor
gestalt possível – i.e, a gestalt mais simples, ou, ao contrário, a mais
compreensiva. Mas pode também ser um nível que dê proeminência a
um problema que seja mais significativo a um espectador individual, um
nível que dá a ele insights mais pessoais e importantes e que sugere
novas respostas a questões antigas e novas perguntas a antigas
respostas.

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Quanto maior for a multiplicidade de níveis de um trabalho de arte, mais


necessidades satisfará, mais problemas díspares unirá, mais dúvidas
removerá, e mais questões levantará - maior será a chance que os
insights sugeridos a um individuo sejam experienciados como
pessoalmente significativos não somente por aquele espectador
sozinho, mas por muitos indivíduos que parecem viver em diferentes
realidades assustados por problemas cuja especificidade é mais
aparente do que real.

Abstração

Da mesma maneira que a sublimação e a multiplicidade de níveis,


também a abstração pode ser vista como uma qualidade dos trabalhos
de arte, como um processo importante na conquista da singular fusão na
arte entre o geral e o especifico. Mas diferentemente do papel da
sublimação e da multiplicidade de níveis, obvias mesmo à primeira
vista, a função da abstração na arte não é tão simples.
Graças à terminologia habitual muitos concordarão que uma grande
parte da arte moderna ocidental assim como a egípcia, a africana, a
indígena americana, e a pré colombiana é abstrata. No entanto, poucos
estarão inclinados a considerar que a abstração está implicada e
construída na essência de todos os trabalhos de arte, e que é essencial
para experienciá-los.(...) A dificuldade de aceitar estas hipótese surge
principalmente da conotação habitual de abstração, que a coloca em
contraste com a concretização, a perceptibilidade, e a individualidade
assim como a experiência emocional. De acordo com uma longa
tradição filosófica (Cassirer, 1953b, cap. 1) largamente preservada na

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psicologia (Arnheim, 1969, cap. 9; Pikas, 1966), a abstração é


geralmente vista como um processo de alto nível cognitivo que consiste
na remoção de qualidades que caracterizam o fenômeno individual ou o
particular. Seu produto é uma concepção que inclui os traços que são
comuns a uma classe particular de objetos ou eventos.
Quando estes aspectos da abstração são enfatizados, pode-se bem
questionar como abstrações se relacionam à trabalhos artísticos que,
independente de seu tipo ou período, permanecem sempre como
apresentações altamente individualizadas. O paradoxo desaparece
quando nos lembramos que ignorar alguns traços no curso da
abstração sempre resulta em uma ênfase crescente nos traços
restantes , e que estes traços restantes formam um conceito que evoca
tanto o caso particular como toda a classe dos mesmos. Imagens, cores,
tons musicais, e movimentos corporais podem ser também um meio tão
adequado à expressão de conceitos quanto palavras - usualmente
consideradas o modo principal de comunicação de conceitos.
Desta forma, arte altamente realista pode apresentar e comunicar
conceitos abstratos tanto como a chamada arte abstrata. Esta afirmação
implica que o poder evocativo de trabalhos de arte pode transcender os
limites dos significados específicos que sugerem. Assim, a figura pintada
de um homem pode representar vários seres humanos; uma forma
pontuda pode representar espadas, agressão, ou ambição; a saga
trágica de um herói pode evocar a memória de uma infelicidade pessoal;
e o tumultuado desenvolver de uma seqüência musical pode
representar uma variedade de eventos tempestuosos, internos ou
externos. Portanto, embora o trabalho de arte por si só possa apresentar
instancias individuais e traços específicos, característicos de objetos,

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fenômenos ou eventos particulares, pode preencher a função de “uma


quantidade menor de informações contendo a virtude ou poder de
expressar uma maior quantidade”, segundo a forma pela qual Dr.
Johnson definiu a abstração.
A extensão com que o abstrato é concretizado no trabalho de arte pode
variar enormemente. A idéia de um homem pode ser evocada através de
um circulo com poucas pinceladas, ou através de uma apresentação
detalhada de uma pessoa particular com toda as suas idiossincrasias.
Similarmente o conceito sugerido pode variar em generalidade do
especifico ao altamente abstrato e geral. No entanto, o que determina o
grau de concretude na apresentação é a inter-relação entre o que é
realmente retratado e o que é transmitido na apresentação. Se uma
pintura da uma espada em um fundo vermelho sugerir ao espectador
apenas vários tipos de armas então a pintura parecerá muito mais
concreta do que quando evoca a idéia de agressão humana em geral,
crueldade, ou destruição determinada e desejada. Assim a concretude
de um trabalho de arte é um produto conjunto de especificidade da
expressão e a generalidade do que é expresso.
Essa conclusão sugere que o que a totalidade do que é comunicado
depende tanto do trabalho da arte como do espectador.
(...) Agora, o que existe em um trabalho de arte que o transforma
freqüentemente em um “concreto universal” (Wimsatt, 1954, pp. 69-83)?
Como a expressão do unicamente individual sugere um conceito
abstrato?
Quando o problema é abordado como uma tarefa que confronta o
espectador de arte, pelo menos uma resposta parcial a questão pode
ser sugerida, baseado-se em achados sobre de “captação de conceitos”

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em situações experimentais de pesquisa. O espectador de arte que é


propenso a descobrir o conteúdo geral do trabalho de arte com que ele é
confrontado, assemelha-se ao sujeito de um experimento que tem como
tarefa descobrir a natureza do conceito do experimentador com base em
uma serie apresentada de instancias positivas e negativas do conceito
(Bruner, Goodnow & Austin, 1956, pag. 233).
Assim, embora estudos sobre a “captação de conceitos” sejam
usualmente desenvolvidos com estímulos materiais como figuras
geométricas ou listas de palavras que dificilmente lembram arte, alguns
dos resultados recorrentes encontrados em laboratórios parecem ser
relevantes para a arte. Em particular, esses estudos mostram que a
captação de conceito é mais fácil quando se apresenta ao sujeito as
instancias positivas e não as negativas de um conceito (Hovland &
Weiss, 1953); quando a informação relevante que tem que ser captada é
restrita (Walker & Bourne, 1961) e é apresentada repetidamente (Bruner,
Wallach, & Galanter, 1959) e de forma concentrada (Borne & Jenning,
1963) (...)
Quando estas descobertas são aplicadas à arte, as condições que
facilitam a obtenção de conceitos em laboratório são reminiscências das
qualidades do trabalho da arte que têm sido destacadas por estudiosos
da estética, muitas vezes conduzindo à abstração. A ênfase na
apresentação de instancias positivas do conceito revela-se uma
característica geral da arte em contraste com a ciência ou a filosofia.
Essencialmente isso implica que o conceito deve ser representado,
demonstrado e elaborado através de exemplos concretos, formas, cores,
tons, movimentos, objetos, situações, ou eventos que ilustrarão seu
sentido, alcance e profundidade. De qualquer modo, isso não quer dizer

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que a arte esteja restrita à expressão concreta e não possa recorrer -


como o faz com freqüência – à apresentação verbal direta de
generalidades que podem ajudar a atrair a atenção do espectador ao
conteúdo intencionado . Implicações mais especificas podem ser
extraídas do segundo e terceiro conjunto de condições que dizem
respeito à quantidade e à forma das informações relevantes. Esta
unidade, ordem, e inteireza no desenvolvimento são padrões básicos da
excelência na arte conhecidos desde os tempos de Aristóteles. Em vista
dos resultados encontrados nas pesquisas sobre captação de
conceitos , esses padrões podem ser redefinidos como fatores
necessários para concentrar o trabalho de arte em temas claramente
concebidos e apresentá-los com a máxima pertinência e
exemplificações sugestivas e, por outro lado, com um mínimo de
distração irrelevante.
Duas implicações de maior significado emergem desta formulação. A
primeira é o principio de variação. A variação consiste em repetir um
tema enquanto mudanças são introduzidas em alguns dos elementos,
conservando outros como invariáveis.
Esse principio artístico permite repetições de instancias positivas de um
conceito e seu gradual desdobramento através de demonstrações
variadas sem evocar tédio e consequentemente desatenção no
espectador. Embora variações sejam usualmente discutidas em relação
a formas (cap 4 ) e no contexto da música (cap 6) , pode ser usado com
igual impacto também no nível dos conteúdos narrativos. Se o tema de
Macbeth é “o apocalipse do mal” (Knight, 1957, pag. 158) várias figuras,
não somente Macbeth e sua dama, mas também vários outros
personagens, emergem como variações do motivo do mal. A loucura, a

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anormalidade, o medo, o terror, a crueldade, a confusão desordenada, e


a incerteza do mal são elaborados não somente pelos personagens,
mas também de outras formas. Notavelmente a maioria das cenas se
passam na escuridão, a atmosfera é pesada com animais feios e
ferozes, há uma horrível tempestade com “gritos de morte” e mesmo a
linguagem é tensa, nervosa e sem substância.
O segundo princípio sugerido pelas pesquisas sobre captação de
conceitos, pedem a apresentação do essencial acoplado à renuncia do
não-essencial. Na pintura realística o espectador espera que o tema da
cidade seja transmitido através da pintura detalhada de casas e
veículos, enquanto na pintura abstrata alguns retângulos assimétricos,
com cores distintas são suficientes para comunicar esta mensagem
(como nas pinturas de Mondrian sobre a Broadway) . Entretanto, nem
mesmo o trabalho altamente realístico da arte apresenta um réplica
fotográfica exata da realidade, mas uma imagem que é distorcida,
elaborada, ampliada e interpretada para comunicar um sentido de
realidade que pode ser até mais verdadeiro que a realidade (Bacon &
Breen, 1958, pag. 100), mas pode também trazer um impacto mais
realista do que uma fotografia (Arnheim, 1969, pag. 140). Cada trabalho
de arte que funciona como uma representação da realidade é somente
uma equivalência estrutural da realidade (Arnheim, 1947, pag. 72).
Deste modo, a produção desta representação necessita do uso de
técnicas e convenções especiais para dar suporte à ilusão criada .
Assim, em uma representação que comunica um conceito há mais do
que uma estrutura equivalente. Há principalmente uma interpretação
conceitual que consiste na apresentação seletiva e organização de
temas e características essenciais à comunicação de conceitos. Entre os

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vários meios disponíveis para a comunicação de conceitos gerais na


arte, três são os mais evidentes. São eles: a apresentação de estruturas
ou traços que evocam características familiares ao observador ; o uso
de imagens genéricas em que características gerais são enfatizados e
atributos particulares desenfatizados ou omitidos; e a elaboração de
composições que admitem múltiplas interpretações.
(..............)
Concretização, consiste essencialmente em dotar o conceito abstrato
com um sentido pessoal , organizando o conteúdo e a forma de trabalho
de arte ao redor do cerne da mensagem e através de elaborações
adicionais de acordo com projeções, lembranças e outras adaptações
subjetivamente significativas. Esse processo é facilitado pela multi-
plicidade de níveis do trabalho de arte, que admite não somente
múltiplas abstrações mas também múltiplas concretizações.
Abstração e concretizações são intimamente relacionadas. Elas sempre
acontecem juntas, complementando uma a outra como passos de um
processo estruturado e seqüencial. Na experiência da arte, a
concretização e a abstração são ambas úteis em tornar o conteúdo e
forma em uma comunicação pessoalmente significante para cada
individuo. Algumas vezes a abstração é mais proeminente no trabalho
de arte, e algumas vezes a concretização.
(.............)
A concretização tende a envolver mais projeções e identificações, que
fornecem o material e os estímulos para elaborações imaginativas sobre
os insights sugeridos e a realização sublimada dos desejos . Ambas, a
abstração e a concretização fazem algo mais que envolver as
habilidades perceptivas, conceituais e imaginativas do espectador. Elas

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também lhe fornecem a oportunidade de colaborar com o artista de


forma criativa [no sentido que diz Arnheim , de que a criação continua nos olhos
de quem vê]
Apesar do trabalho de Worringer (1948) poder suscitar criticas hoje em
dia sobre suas fantásticas especulações a respeito da origem da
abstração, sua ênfase na abstração fica justificada como meio de
introduzir ordem no caos, de controlar o incontrolável , de antever o
imprevisível, e possibilitar ao artista tornar-se senhor de si mesmo e do
mundo, mesmo que de forma temporária e ilusória. No entanto, como
forma de estabelecer pontes entre o geral e o particular, a abstração
permite não só o acesso conceitual à realidade mas também uma
resposta experiencial à ela.

TEORIAS E EXPERIMENTOS EM SIMBOLIZAÇÃO


Entre os meios para se fundir o especifico e o geral, o símbolo, cujo
nome deriva do grego symballein “colocar junto”, ocupa uma posição
extraordinária. Isto deve-se tanto às suas qualidades estruturais e o
nível de significado expresso. Da mesma forma que a sublimação, a
multiplicidade de níveis e a abstração, os símbolos ocorrem, são
formados e percebidos também fora da arte, e são um dos objetos de
maior interesse a muitas disciplinas, desde a filosofia, religião,
misticismo, psicologia, antropologia até a lingüística e a semântica. Esta
variedade de interesse, contudo, parece ter contribuído menos para a
clarificação dos processos que envolve do que para a extensão de usos
e significado do termo. Desta forma, as palavras e os números são
designados como “simbólicos” tanto quanto imagens em sonhos,
pinturas de Chagall, expressões idiossincráticas de esquizofrênicos,
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emblemas religiosos, sinais de estrada, metáforas literárias e rituais


para mencionar alguns exemplos. A confusão de definição chega às
teorias e hipóteses sobre a gênese dos símbolos, seus significados,
funções e efeitos (S. Kreitler, 1965, pag. 11-63). Nossos estudos sobre a
percepção e formação de símbolos (S. Kreitler & Kreitler, 1968, 1971)
nos possibilita, contudo, introduzir neste complexo domínio, uma ordem
classificatória, que não se baseia no esquema convencional de se
escolher uma ou algumas dentre tantas definições negando as demais.
Nossos estudos baseiam-se em duas suposições que refletem as
tendências mais importantes na teorização sobre símbolos nas varias
disciplinas. Assumimos que os símbolos constituem uma forma
especifica de expressar ou representar um significado, e que o
significado representado não é completamente fixado através de
convenção. Juntas, essas suposições sugerem que os símbolos podem
se diferenciar dos sinais no que concerne às características do
significado ou do “veículo” do significado nos quais se implica.
As grandes diferenças entre o que chamamos de símbolos e sinais
foram apontadas por muitos estudiosos, que preferiram designar estes
fenômenos com termos diferentes. Piaget (1951) por ex faz uma
distinção entre significado egocêntrico e socializado.... [ ....] Todos
parecem compartilhar a opinião que devemos considerar como sinais
referencias relativamente específicas com base em convenções
arbitrárias, ao passo que símbolos evocam significados menos
específicos e mais subjetivos e pessoais com base em relações entre o
significado e significante distintas da estritamente convencional.
Em nossos estudos sobre a percepção e formação de símbolos duas
tarefas experimentais foram usadas. Na primeira, usada para cobrir os

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processo de formação do símbolo (S. Kreitler, 1965, pag. 70-105), pediu-


se aos sujeitos que encontrassem os significados pessoalmente mais
verdadeiros de cada um dos conceitos verbalmente citados de uma
serie, a expressão mais adequada, clara, e profunda que tornasse o
significado imediatamente evidente a uma pessoa que não o
conhecesse. Os sujeitos foram estimulados a usar qualquer meio de
expressão que considerassem adequado: palavras, gestos, desenhos
etc, . Os estímulos verbais que serviram de estimulo foram termos com
referentes abstratos de muitos tipos e incluíam termos que indicavam
estados como morte, fatiga, solidão, características gerais como
sabedoria, independência e eternidade, e sentimentos que variavam do
amor e felicidade ao desespero e tristeza.
Na segunda tarefa, usada para cobrir basicamente os passos de
processos envolvidos na percepção simbólica (S. Kreitler, 1965, pag.
106-121), pediu-se a indivíduos que comunicassem a um outro
hipotético, segundo o meio de expressão que considerassem mais
adequado, o significado mais verdadeiro do ponto de vista pessoal de
uma serie de conceitos verbais. O estimulo verbal referia-se a
fenômenos concretos: objetos da natureza, partes do corpo, formas
geométricas. Em um estudo posterior (S. Kreitler, 1965, pag. 122-134)
os estímulos apresentados eram visuais: desenhos de figuras
geométricas, simples e mais complexos. Para se obter uma visão ampla
dos processos simbólicos e formas de expressão, não só os estímulos
eram variados, como os indivíduos, nos três estudos, foram escolhidos
com níveis diferentes de educação, classe social e meios culturais.
Também foram incluídos esquizofrênicos e artistas, representantes de
grupos considerados particularmente hábeis na expressão e percepção

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simbólica.
Constatou-se a existência de 10 categorias de expressão simbólica :
Na primeira categoria, o significado é comunicado através de uma
instância exemplificadora, i.e, um objeto, um fenômeno, um animal ou
pessoa que estão relacionados ao conceito como espécime de sua
conotação ou como parte de sua denotação. Beleza, representada pela
Madona, agressão pela imagem de um tigre a era tecnológica por uma
maquina, são os exemplos desta categoria.
A segunda categoria , faz uso de uma atividade que pode ser exercida
pelo referente, por ex, a representação da água através do ato de
beber.
A terceira categoria, usa para a representação do significado uma
situação exemplificante , uma imagem mais rica em detalhes ou mesmo
em dinamismo, do que uma instância exemplificadora, embora seja
essencialmente estática e lhe falte desenvolvimento, por exemplo, a
imagem de um homem vagando sozinho representando solidão, ou a
representação de Picasso do conceito de Vida através de uma pintura
que mostra no primeiro plano uma mulher segurando uma criança
adormecida e um casal desnudo buscando proteção mútua, enquanto
que ao fundo aparece uma pessoa desnuda ajoelhada perdida em
devaneios, e um casal sentado em uma atitude similar ao outro casal.
Na quarta categoria, uma cena comunica o conceito através de uma
situação dinâmica ou uma estória em desenvolvimento, estruturada de
forma dramática. Filmes, drama, literatura trazem tantos destes
exemplos que tornam outros supérfluos. Para ilustrar, é suficiente citar a
resposta de um dos sujeitos do experimento ao responder ao conceito
de “desespero”. “Um homem vaga no deserto em busca de água.De

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repente, tem a impressão que o deserto acaba logo após a próxima


colina... ele ouve o som de uma voz e sente o toque frio de uma mão...
mas cai em um arbusto de espinhos. Machucado, de tanta sede não
consegue chorar.” Notadamente esta cena expressa desespero, mesmo
sem citar a palavra (S. Kreitler & Kreitler, 1968, pag. 1317).
Na quinta categoria, o significado é representado através de
movimentos corpóreos visíveis ou sinestésicos. Por exemplo, a dor é
comunicada através de uma face contorcida, agressão, por punho
cerrado, submissão por corpo e joelhos dobrados.
Na sexta categoria um elemento diferente é enfatizado. Nesta usa-se as
conseqüências, psicológicas e humanamente relevantes, como quando
o significado do amor é expresso por uma cena de separação entre dois
amantes, agressão através de cadáveres, ou crime através de uma
cena de detenção em prisão.
Na sétima categoria sensação e sentimento predominam como meio
principal de comunicação de sentido. A ênfase dá-se nas emoções e
sensações que são evocadas através do referente ou como sua
característica. A expressão da maternidade através do calor, da verdade
por uma luz brilhante, rejeição através do frio ,solidão através de silêncio
interno são exemplos comuns.
Na oitava categoria o sentido é comunicado através da
interpretação, e colocado mais em termos abstratos do que em uma
imagem. A contribuição particular dessa categoria é que ela permite a
descrição do significado salientado um ou mais de seus aspectos
usualmente escondidos, para que novas relações conceituais possam
ser formadas. A interpretação é o elemento mais importante com por ex
em

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“Amor - um passeio consigo mesmo de uma solidão a outra;


Nascimento – emergência do caos para si mesmo; (Kreitler, 1965, pag.
84).
O fator interpretativo tem um papel crucial também na 9ª e 10ª categoria,
apesar de não diretamente manifesto
A nona categoria é a metáfora, O conceito é expresso através da
imagem de algum fenômeno concreto que não pertence estritamente às
esferas convencionais de conotação e denotação, mas ilustra pelo
menos um aspecto do significado ao qual se relaciona através da
interpretação. O componente interpretativo é manifesto mesmo quando
o conceito expresso é concreto, como no caso da maioria dos símbolos
Freudianos, mas torna-se particularmente proeminente quando o
conceito é relativamente abstrato. Quando Elia Kazan ao dirigir “Um
Bonde Chamado Desejo”, justapõe a cena de estupro de Blanche
Dubois a uma cena de lavagem de rua com um esguicho arremessando
a água violentamente - as relações conceituais íntimas entre a imagem e
o significado sugerido são claramente evidentes. Uma imagem
metafórica portanto tem sempre dois níveis, pois nela estão entretecidas
as referencias convencionais da imagem e a referencia não-
convencional, enfatizada através da função da imagem como metáfora.
De acordo com isso, a imagem não é nem uma interpretação nem um
conceito, mas incorpora o conceito através de uma interpretação. Assim,
as metáforas podem variar de comparações insignificantes ate imagens
de difícil distinção das expressões que variam dentro desta categoria.
A décima categoria, é a do próprio símbolo. Símbolos são imagens
metafóricas que incorporam um contraste e sua resolução, um
problema e sua resposta. Isto significa que entre os vários aspectos do

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conceito que um símbolo reflete, há pelo menos um par de aspectos


contrastantes cuja reconciliação é sugerida através da estruturação da
imagem simbólica. Um exemplo que claramente ilustra o processo foi
dado por um dos sujeitos da pesquisa em resposta ao conceito de
“sabedoria”: enquanto desenhava um olho, observou que este
representa o aspecto da sabedoria que consiste em notar, recordar e
absorver informações; no entanto mais tarde adicionou raios à íris, de
forma que se transformasse em um sol, representando um outro aspecto
da sabedoria - irradiar o conhecimento acumulado e elaborado (Kreitler,
1965, pag. 85). O símbolo contudo, consistia em uma imagem unitária
que era simultaneamente um sol e um olho, sugerindo muito mais do
que o seu criador pudesse expressar em palavras.
Esta série de dez categorias representa os modos de expressão usados
por sujeitos ocupados com a formação de respostas simbólicas ou com
a percepção simbólica. (....)
Esta ordenação é evidente pelo fato de que cada categoria serve como
uma ponte conceitual entre as categorias anteriores e as posteriores. É
também substanciada pela constatação que redes de respostas que
terminam em qualquer categoria consistem principalmente de respostas
em categorias anteriores que precedem a resposta final da cadeia (...) .
Assim, respostas em categorias que aparecem mais tarde neste
contínuo podem ser tidas como mais satisfatórias em termos da
abrangência e profundidade de expressão que possibilitam. A ultima
categoria pode ser vista como o ponto onde vários processos de
simbolização representados no continuum convergem e culminam.
Contudo, o processo que leva a ela é diferente em termos de formação
e percepção simbólica. Enquanto as cadeias de respostas que levam a

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formação da décima categoria incluem mais frequentemente as


categorias de “cena” e “metáfora” ou “interpretação e metáfora” (S.
Kreitler, 1965, pag. 86-99) as categorias proeminentes nas cadeias de
respostas que precedem a percepção em termos da décima categoria,
tendem a ser “sensação e sentimento“ e secundariamente
“interpretação“.(S. Kreitler, 1965, pag. 112-17) Da mesma forma, a
dinâmica de formação de uma resposta “simbólica” envolve um esforço
mais explicito para fundir elementos imaginários e conceituais em uma
expressão única e adequada, enquanto a percepção de qualquer
estimulo como “simbólico” envolve uma maior abertura da pessoa às
suas potencialidades, principalmente respondendo ao mesmo em
termos de sensações e sentimentos.
Se passarmos pela literatura da estética procurando por referencias às
dez categorias simbólicas e as características singulares de cada uma,
constataremos que a maioria delas foi mencionada, discutida ou
estudada; mas os estudiosos frequentemente preferem escolher uma
ou outra categoria como sendo a única ou a maior manifestação de
simbolismo. Esta observação apóia a perspectiva de que nossos
resultados são bastante abrangentes. Não só cada uma destas formas
de expressão foi identificada como simbólica, mas também foram
produzidas por algum sujeito no processo de comunicação de
significados pessoais. Esse fato sugere que há características comuns
compartilhadas pelas categorias - algumas mais, outras menos (...)
Para uma caracterização geral, podemos dizer que uma expressão
genuinamente simbólica mostra uma interação entre pelo menos dois
significados: um, direto, evocado pelo significante e um adicional trazido
por sua função como veiculo da expressão simbólica. Alem disso, em

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um símbolo genuíno a relação de significante com o significado baseia-


se em algum tipo de semelhança estrutural (Berlyne, 1965b, pag. 126-
30) ou isomorfismo (Arnheim, 1961).
Quando uma expressão simbólica é genuína nesses dois sentidos,
usualmente também é dotada das seguintes qualidades adicionais que
definem os símbolos. Primeiro, uma expressão simbólica basicamente
contém uma multiplicidade de níveis e significados. Há então, uma
estreita inter-relação entre significante e significado ; o significante é
sentido como sendo particularmente adequado para a expressão deste
significado e o incorpora claramente sem declará-lo explicitamente.
Finalmente, é difícil ou impossível descrever o significado simbólico em
termos não simbólicos e independente da expressão que o comunica.
A clareza, a intensidade e a eficácia com que essas características são
manifestas depende muito das características singulares de cada
categoria de símbolos. Essas características são essencialmente
estruturais e definem as relações ente referência direta da imagem
usada como veiculo de expressão e o significado mais geral comunicado
através dela. Esta relação é, por exemplo, destacada mais
enfaticamente através da “metáfora” na qual uma ou mais características
do objeto ou fenômeno são mais salientados pela comparação sugerida
do que através da “exemplificação de uma instância ou situação, que
consistem em apresentar um objeto ou situação sem nenhuma
elaboração adicional. Por outro lado em, “uma atividade” e mais ainda
em “uma cena” é o dinamismo do processo representado que carrega o
peso principal do significado simbólico. De interesse particular,
entretanto, são as categorias estruturais da décima categoria, o
“símbolo” propriamente, que tem fascinado a séculos tantos artistas e

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investigadores. Do ponto de vista de conteúdo, incorpora um problema


inerente em um conceito de importância geral e sua solução. Poderia
qualquer constelação de estímulos ser percebida em termos da décima
categoria quando o cenário adequado seja apresentado ao espectador,
ou existe algo particular sobre a estrutura de certos estímulos que os
torna adequados para cumprir o papel de “símbolo”?
A pressuposição que a expressão se baseia na semelhança básica entre
o veiculo expressivo e o significado incorporado, nos leva à hipótese já
mencionada anteriormente que os estímulos que evocam respostas
simbólicas são caracterizadas por uma estrutura particular, e que esta
estrutura inclui algum contraste e sua resolução. Esta hipótese foi
testada em dois experimentos (S. Kreitler, 1965, pag. 122-34) descritos
anteriormente (ver Capítulo 5, Os Significados Simbólicos das Formas) .
Esses experimentos demonstraram que gestalts complexas são
experienciadas como adequadas para a expressão de conflitos
enquanto gestalts boas e simples são adequadas para expressão de
conceitos básicos abstratos não conflitivos. Além disto, gestalts boas e
complexas (como o pentagrama grego, e o tai-chi tu chinês), isto é,
figuras que incluem um contraste e sua resolução, elicitam o maior
número de respostas na décima categoria, bem mais do que as
complexas e más gestalts, isto é, figuras que incluem somente o
contraste, e boas e simples gestalts isto é, figuras que incluem somente
uma solução. O experimento descrito também mostrou que desenhos
geométricos com traços estruturais diversos dos que caracterizam os
“símbolos” propriamente, tendem a elicitar respostas simbólicas em
outras categorias e não na décima (S. Kreitler, 1965, pag. 179-88). Por
exemplo, boas e simples gestalts evocam mais “interpretações” do que

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outros tipos de desenho, possivelmente porque suas formas bem


delineadas e perfeitas sugerem estruturas conceituais, enquanto gestalts
ruins e complexas elicitam mais respostas na categoria de “cena” e
“exemplificação de situações” talvez devido à tensão latente entre as
formas não integradas nessas gestalts, correspondem melhor ao
dinamismo cênico ou às heterogeneidades dos elementos na situação.

SÍMBOLOS NA ARTE

Devido a multiplicidade de níveis e amplo espectro de significados que


comunicam, imagens, temas e dramas correspondentes às categorias
simbólicas, podem se integradas na criação de um trabalho de arte de
diferentes maneiras. (....)
Pode-se assumir que trabalhos de arte destituídos de referência a um
objeto explicito, ou com conteúdos narrativos sugestivos de fantasias ou
temas míticos e surrealistas, sensibilizam o espectador a significados
simbólicos e o estimulam a responder às conotações mais profundas
das varias categorias simbólicas. Em contraste, o contexto da arte
realística e naturalista pode até reduzir a consciência do espectador
sobre a rica aura simbólica de alguns dos temas formais ou narrativos.
Além disso, as inter-relações entre temas simbólicos e outros elementos
no trabalho de arte podem servir para enfatizar certos aspectos das
conotações simbólicas e desenfatizar outros.
(....)
O impacto dos “símbolos” e de metáforas altamente elaboradas pode
ser tão intenso e único que algumas vezes emergem como estruturas

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quase autônomas no background do trabalho artístico, dominando seu


contexto como uma forte fonte de luz. Como em “símbolos” e ricas
“metáforas, ” as qualidades simbólicas proeminentes de imagens com
multiplicidade de níveis, requer correspondência entre estruturas e
conteúdos. Expressões simbólicas desse tipo tendem a ser
caracterizadas por uma autonomia e fechamento que os separa de seus
contextos. O “símbolo” e a “metáfora”, parecem um cosmos auto-contido
ou um núcleo de sentido altamente concentrado que não se mistura
facilmente com outros elementos no trabalho da arte. As duas maiores
soluções adotadas na literatura para integrar “símbolos” e “ricas
metáforas” dentro da matriz de uma narrativa pode servir para iluminar
tanto o impacto particular como as limitações destas simbolizações
elaboradas. A primeira solução consiste em apresentar essencialmente
figuras não simbólicas passando por uma série de ações eventos e
situações “simbólicas” ou “metafóricas”, enquanto que a segunda
solução consiste em representar figuras “ simbólicas” dentro de uma
trama essencialmente não simbólica. (...)
O conto de fadas é o modelo que melhor ilustra a primeira solução. O
Pequeno Príncipe, Branca de Neve, e a multidão de más madrastas não
são símbolos, mas figuras familiares que nos representam ou
representam parte de nós com uma transparência difícil de ser igualada
e que dificilmente podem ser ignoradas. “O herói” do conto de fadas,
escreve Langer (1948, pag. 143), “ é estritamente individual e humano e
embora possa ter poderes mágicos, nunca é visto como divino... não é
um sábio ou salvador da humanidade. Se ele é bom, sua bondade é
uma vantagem pessoal, pela qual ele é ricamente recompensado”. Mas
as ações dessas figuras, o que acontece com eles e a zona crepúsculo

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do mundo em que eles moram, são feitos da mesma matéria com que
os símbolos são feitos. Obviamente nem todas as aventuras de heróis
são simbólicas. Na historia da Bíblia sobre Joseph e seus irmãos, o
evento central –jogar Joseph no poço e sua salvação, é realmente
simbólico. De outro lado, na Dolce Vita Felline fez uso continuo de um
antigo símbolo - água – para unificar os vários estágios simbólicos e
não simbólicos das aventuras de herói. Enquanto confiando na
conotação arquetípica da água, Felline transcende as camadas mais
profundas do simbolismo iluminado através deles a futilidade e a ironia
da busca de Marcelo por felicidade no amor, sexo, família, álcool,
trabalho, ou religião. Assim, em uma cidade em que os arruinados
antigos aquedutos sugerem uma descontinuidade com o passado,
Marcelo faz amor com a aristocrática Madalena num apartamento
inundado de uma prostituta, tenta beijar a angelical Sylvia dentro da
romântica Fountana di Trevi quando a água é subitamente fechada no
exato momento em que ela encena para ele o ritual de batismo, e ele é
recebido pelo olho crítico de um monstro do mar quando vai para o mar
para purificar-se.
Em contraste com o contos de fadas, em que, a combinação de figuras
humanas com uma trama simbólica ilustra a primeira solução, o MITO
pode servir de modelo para a segunda solução, que integra figuras
simbólicas com ação e destino humano. O mito do herói é
caracteristicamente maior, mais rico e profundo do que qualquer
individuo humano. Apesar de ter um nome e uma biografia, ele é mais
uma personificação do que uma pessoa, feito em uma escala que o
coloca mais perto dos Deuses do que dos homens. Aliás, os heróis
sempre manifestaram a tendência notória de se identificar uns com os

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outros através de fronteiras culturais, o que nos indica que estas figuras
são de fato revelações de um arquétipo com “mil faces” (J. Campbell,
1956), o herói de um “mono mito” (Joyce, 1939, pag. 581). No entanto
estas figuras atuam e se movem em lugares definidos - Monte Olímpio,
o mar, o céu, Inglaterra, França, Israel – e se engajam em atos muito
naturais. Ao invés de transformar abóboras em carruagens, matar “sete
de um só golpe”, subir aos céus no caule de um pé de feijão, e voar nas
asas de uma águia na melhor tradição das figuras dos contos de fadas,
eles viajam no lombo de cavalos ou a pé, matam uma criatura de cada
vez , sofrem, hesitam, amam, e cortejam garotas. Seu mundo é nosso
mundo, tanto que podemos nos identificar com o que eles fazem, mas
não completamente com o que eles são.(...)

FUNÇÕES DOS SÍMBOLOS NA ARTE e o EFEITO DOS SIMBOLOS


NO ESPECTADOR DE ARTE.
Embora o significado dos símbolos nas varias categorias possa ser
razoavelmente bem apresentado em simples termos verbais, todos nós
sentimos que os efeitos da expressão simbólica transcende em vários
sentidos a expressão verbal. Ver rinocerontes no palco parece ser mais
significativo do que seguir ações de pessoas brutais e moralmente
insensíveis. A mandala indiana parece expressar de alguma forma
misteriosa mais do que tratados elaborados sobre processos cósmicos e
individuais de criação e dissolução.
Uma parte desse efeito único dos símbolos pode ser atribuída ao maior
impacto do estimulo sensório em comparação com o estímulo verbal. No
entanto, por que uma imagem pode ser mais expressiva do que uma
mensagem logicamente formulada? Possivelmente devido ao fato que

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as relações entre uma imagem e seu conteúdo simbólico não são tão
definidos, de forma que uma imagem deixa margens mais amplas para a
elaboração subjetiva do que a expressão verbal, e possivelmente
também por que uma imagem toca amplos reservatórios de conteúdos
pré-lógicos, primitivos ou pessoais, sentidos e imaginados, que nunca
foram muito processados em linguagem formal.
A incompletude desta resposta se torna ainda mais evidente quando se
considera as categorias do final do contínuo simbólico. Expressões
simbólicas correspondentes a estas categorias frequentemente ilustram
tão bem os elementos fundamentais da expressão simbólica -
multiplicidade de níveis , combinação perfeita entre conteúdos formais e
expressos, e impossibilidade de tradução da vasta gama de conteúdos
que através deles ressoam – que forçam até as pessoas céticas a
considerar hipóteses mais especificas sobre a função e os efeitos dos
símbolos. Essas hipóteses refletem três tendências principais de
pensamento (S. Kreitler, 1965, pag. 52-60).
1) De acordo com a primeira hipótese, a função do símbolo é a
UNIFICAÇÃO. Opiniões e formulações diferem no entanto , sobre o que
os símbolos supostamente unificam. Em um pólo encontramos aqueles
que atribuem aos símbolos o poder de unir entidades específicas , tais
como ser humano com outro ser humano, com natureza, com
sociedade, com Deus (Inge, 1956, pag. 263; Joyce, citado por Tindall,
1955, pag. 50), ou com o mundo dos objetos (Allemann e al., 1953, pag.
13-47), enquanto no outro pólo encontramos aqueles que consideram
que os símbolos unificam diferentes níveis de realidade, experiências ou
funcionamento psíquico. Assim, poetas e pensadores misticamente
orientados, vêm símbolos unindo o finito ao infinito (Carlyle, citado por

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Tindall, 1955, pag. 40), razão e compreensão com o domínio dos


sentidos (Creuzer, 1810, pag. 63-64), o espiritual e o material, o real e o
aparente (Inge, 1956, pag. 263). Pensadores psicologicamente
orientados adicionam que os símbolos unificam o particular com o geral
(Goethe, 1917b, pag. 555, 648, 675) enraizando o específico nos
princípios organizadores e harmonizadores do universo (Koestler,
1949ª, pag. 321-31), ou - em termos da teoria compreensiva de Jung - é
a grande “conjunção dos opostos”, que, como as manifestações do
arquétipo, reconciliam as grandes oposições psíquicas entre
inconsciente e consciente, e através disto, todas as qualidades que
representam: constrangimento e liberdade, realidades internas e
externas, passado e futuro, a criatividade espontânea e formação
cognitiva, obscuridade e claridade, feminilidade e masculinidade (Jung,
1953ª, 1953b, 1956ª).
2) A segunda maior função atribuída aos símbolos é a REVELAÇÃO. A
maioria dos que apóiam esta visão concordam que os símbolos revelam
a realidade, principalmente a “verdadeira” realidade, mas discordam
sobre a natureza da realidade revelada. Para muitos, que obviamente
incluem os pensadores misticamente orientados, a realidade revelada é
a camada mais profunda do Ser , que está para além da lógica e dos
sentidos e tem a chave dos mistérios da vida e do cosmos (Bachofen,
1954, pag. 52; Creuzer, 1810, pag. 63-64; Otto, 1932, cap. 4 e 5;
Zimmer, 1962). Pelos seguidores de Cassirer (1953-57) e Langer (1948),
que consideram arte, ciência, religião, etc., como sistemas simbólicos,
símbolos representam conceitualizações diferentes da realidade que
tornam seus vários aspectos acessíveis à razão e à experiência.
Finalmente, para a Psicologia profunda , a realidade revelada e

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expressa através dos símbolos é ou o inconsciente pessoal e reprimido


(Freud, 1953) ou o inconsciente coletivo, o arquetípico, as camadas
filogeneticamente herdadas de forças e conteúdos (Jung, 1956ª).
3) A terceira e ultima hipótese atribuí ao símbolo o papel de facilitar a
ADAPTAÇÃO À REALIDADE. De acordo com a definição de símbolo
preferida pelo pesquisador , esta sugestão afirma que os símbolos são
meios cognitivamente primitivos de adaptação que podem ajudar o
ajustamento quando os processo mentais mais elevados falham (Levy-
Brul, 1910; Rank & Sachs, 1913, pag. 17; Silberer, 1912, pag. 692); ou
que símbolos compartilham com signos e todos outros meios de
representação e conceitualização , a função de possibilitar ao homem
“compreender e interpretar, articular e organizar, sintetizar e
universalizar suas experiências humanas” (Cassier, 1953ª, pag. 278),
i.e., para se orientar e expandir sua orientação.
Essas três importantes visões sobre as funções dos símbolos -
unificação, revelação, e adaptação - estão longe de ser mutuamente
exclusivas. Quando combinadas, no entanto, sugerem duas hipóteses
sobre os possíveis efeitos de expressões simbólicas: o efeito aliviador e
o efeito orientador. O efeito aliviador é relacionado mais proximamente à
função unificadora dos símbolos, enquanto que o efeito orientador deriva
das duas outras funções , i.e., revelação e adaptação.
A maneira pela qual a unificação pode prover alívio pode ser
conceituada de diferentes formas. De um lado está a pressuposição de
Jung de que o símbolo, bipolar por definição, é o grande “transformador
de energia”. Como a expressão visível de um arquétipo, libera a energia
acumulada no inconsciente coletivo, e por abrir novos caminhos para
ação, contribui para redistribuição da energia psíquica. (Jung, 1953b,

Tradução do cap 14 do livro “ PSychology of the Arts” de Hans e Shulamit Kreitler, para circulação interna
entre os alunos do curso de especialização dos cursos de Arteterapia do Instituto Sedes Sapientiae e do Infapa.
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pag. 225-26, 325).


Em outro nível, confrontação com símbolos salva o indivíduo da tirania
do inconsciente, i.e., esquizofrenia, e da tirania da massa coletiva, i.e.,
perda da individualidade, possibilitando a pessoa a tornar-se
verdadeiramente ela mesma no sentido humano e social da palavra
(Jung, 1956a). Por outro lado, encontramos a sugestão de Koestler de
que a unificação do especifico com o geral efetuada pelos símbolos
alivia as tensões provocadas pelo evento particular, através de sua
inserção no universal, da mesma forma que estar com os pés na terra
para o recebedor de uma carga elétrica, dissipa as vibrações através do
“ contato com a terra e sua capacidade infinitamente maior de absorção”
(Koestler, 1949 a., pg 331). (....)
Apesar das diferenças entre as pressuposições subjacentes às
sugestões de Jung e Koestler, as duas conceitualizações sobre a
relação entre unificação e alívio são muito similares. Ambas apontam
para a conclusão de que confrontação com expressões simbólicas
podem originar insights que habilitam o individuo a transcender o
sofrimento, confusão, e os perigos de situações especificas. Os efeitos
experienciais e cognitivos do insight obviamente dependem da
importância e da generalidade do problema. Entretanto, a impressão, e
mesmo a conclusão de tantos pesquisadores (S. Kreitler, 196, pag. 60-
62) é que pelo menos os “símbolos” propriamente ditos lidam com
problemas universalmente significativos para os seres humanos - vida e
amor, o sofrimento e medo da morte etc. Alem disso, quando, a
expressão concreta do problema e da solução tomam a forma de uma
gestalt boa e perfeita, cuja estrutura em si mesma já é redutora de
tensão, o efeito aliviante da expressão simbólica é ainda mais saliente.

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Essas observações também sugerem a afinidade entre o efeito aliviador


dos símbolos e seu impacto orientador. As implícitas soluções de
conflitos, o insight em problemas básicos, e as novas relações
conceituais sugeridas pelos símbolos através de sua função unificadora,
podem atuar como confortantes principalmente porque afetam
cognitivamente e experiencialmente a orientação do observador a
respeito dos problemas apresentados. Este impacto orientador dos
símbolos, que é ainda mais pronunciado quando os símbolos são
considerados do ponto de vista de suas funções reveladoras e
adaptativas, consistem em expandir a awareness do observador sobre
conteúdos, implicações e mesmo potencialidades de ação.
A inter-relação entre os efeitos aliviadores e o impacto orientador é de
fato tão característico das expressões simbólicas quanto os outros
meios discutidos neste capitulo: sublimação, multiplicidade de níveis e
abstração.
Os efeitos que acalmam e orientam, cuja obtenção e relativa
proeminência variam através dos distintos meios, podem ser
considerados como manifestações experienciais da qualidade básica
que estes meios partilham com o contexto da arte: revelar o geral no
especifico, destacar o particular na conceitualização abstrata, provendo
assim uma ponte entre o único e os muitos, a manifestação individual e
a lei universal.
No entanto, “ver o mundo em um grão de areia / e o céu em uma flor
silvestre” permanecerão sempre experiências únicas mesmo que seu
significados mais amplo se reduza ao que Blake expressa no final do
mesmo verso: “Tomar o infinito na palma de sua mão / e a Eternidade
em uma hora.”

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