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Filosofia 2016

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Filosofia 2016

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Filosofia 2016

Universidade Federal de Santa Maria

Pró-Reitoria de Extensão

FILOSOFIA I
Pré-Universitário Popular
Alternativa

Autoria:
Eduardo Adirbal Rosa
Jéssica Coimbra Padilha
Robson Rodrigues Carvalho

Santa Maria

2016

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SUMÁRIO

UNIDADE I ..............................................................................................................… 06
O que é filosofia(r)? Para que serve? Onde, quando e como começou?

UNIDADE II …............................................................................................................ 40
O que é raciocínio lógico? O que é argumentar? Como identificar argumentos?
Como identificar as falácias no discurso?

UNIDADE III …........................................................................................................... 59


O que é a linguagem? Para que serve? Como a linguagem representa o mundo?

UNIDADE IV …........................................................................................................... 73
O que é conhecimento? Como nós o alcançamos? Qual a sua essência? É possível
saber algo?

UNIDADE V …............................................................................................................. 82
O que é ciência? Como funciona a ciência? O que é método científico?

PARA FILOSOFAR MAIS…...................................................................................... 88

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Unidade I
O QUE É FILOSOFIA(R)? PARA QUE SERVE?
ONDE, QUANDO E COMO COMEÇOU?
ONDE COMEÇA A FILOSOFIA?
Sobre os filósofos e a filosofia
O que você sabe sobre filosofia? Você sabe o que ela é e quem são aqueles que
se dedicam a mesma, os filósofos(as)? Você sabe para que serve a filosofia? É certo que
se ouve falar por aí, nas falas de muitas pessoas, sejam leigos ou especialistas, a
ocorrência dos termos filosofia e filósofos, mas em sentidos muito diversos. O que elas
estão querendo dizer? Responder a estas questões talvez não seja das tarefas mais fáceis.
Para início de estudos é importante saber que a palavra
―filosofia‖ é de origem grega, philosophia, resultante da junção
dos termos philia e sophia, mesmo que isto talvez não seja uma
novidade. Além disto, pode-se dizer também que a filosofia é um
modo de pensar sobre e conhecer a nós mesmos e o mundo que
nos cerca, podendo converter-se em um modo de viver, mas
acima de tudo é algo distinto dos outros tipos de saberes
desenvolvidos pelos humanos, tal como senso comum (mundo da
vida), o mitológico, o científico, o religioso e o artístico. Por fim,
Figura 1: Pintura de Munch,
uma homenagem a escultura
que este saber designado pelo termo filosofia tem perdurado por "O pensador" de Rodin
cerca de 2500 anos no pensamento ocidental, tendo sido
transmitido desde a antiguidade até chegar aos dias de hoje, o que faz com que nos
perguntemos: o que os filósofos ficaram fazendo todo este tempo? Que contribuições
trouxeram?
Mas aqui, por hora, ainda estamos no começo dos estudos. Vamos com calma!
Por isso, é interessante focar-se em apenas um problema, que é este: onde começa a
filosofia? A vantagem de se focar neste problema é que ele é capaz de resumir os demais
problemas com os quais vamos nos deparar. Pois, quando alguém pergunta sobre o
―começo‖ de alguma coisa, esta pessoa ou está querendo saber sobre o lugar em que
algo surgiu pela primeira vez e as razões de não ter surgido em outra parte, ou saber
sobre as fronteiras, as margens que separam algo daquilo que ainda não é ou não é por
inteiro. Aplicando ao no nosso caso aqui, trata-se de saber onde, quando e como temos o

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nascimento da filosofia, para somente então pensarmos a respeito de suas fronteiras e
limites, ou seja, o que ela é, desvendando também qual a sua utilidade, se é que tem
alguma.
Os pequenos textos que seguem tentam fornecer as informações e as pistas para
que você possa estudar para saber mais sobre filosofia, bem como pensar e resolver as
questões acima colocadas. E certamente, muito mais questões surgirão – o que pode ser
prazeroso, mas pode também causar desorientação.
Afinal, onde começa a filosofia? Disse Epicuro certa vez que nunca é cedo
demais nem tarde demais para filosofar. Isto significa que é importante que se filosofe,
seja quando se é jovem ou se é velho. Por baixo disto está a necessidade de que se
comece, não importando a idade. Assim, podemos adicionar aos dois sentidos de
―começo‖ acima mencionados, um terceiro: o começo de algo na vida de alguém. Onde,
quando e como começa a filosofia na vida de uma pessoa?

* Arrisque pensar e responder aos problemas mencionados no texto acima:

PARA SABER MAIS SOBRE FILOSOFIA!


Tanto o livro de Jostein Gaarder, como o filme baseado em sua obra são uma boa
sugestão.

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QUAL A ORIGEM DA FILOSOFIA?

Vamos começar com o comentário de Diógenes Laércio, historiador grego do


séc. III, do qual pouco se sabe sobre sua vida, presente na sua obra Vidas e doutrinas
dos filósofos ilustres, onde especula sobre uma possível origem da filosofia no oriente:

Segundo alguns autores o estudo da filosofia começou entre os bárbaros*. Esses autores
sustentam que os persas tiveram seus Magos, os babilônios ou assírios seus Caldeus, e os indianos
seus Gimnosofistas; além disso entre os celtas e gálatas encontram-se os chamados Druidas ou
Veneráveis (…).
Os propagadores da ideia de que a filosofia apareceu entre os bárbaros prosseguem
explicando as diferentes formas que os diversos filósofos lhe deram. Os Gimnosofistas e Druidas
teriam exposto suas doutrinas por meio de enigmas, exortando os homens a reverenciar os deuses, a
abster-se totalmente de más ações e a ser corajosos. Com efeito, os Gimnosofistas desdenham a
própria morte: que os caldeus dedicam-se à astronomia e a previsão do futuro; e que os Magos
consomem o seu tempo no culto dos deuses, em sacrifícios e em preces, como se fossem os únicos a
ser ouvidos pelas divindades.
Esses autores ignoram que os feitos por eles atribuídos aos bárbaros pertencem aos helenos.
(…) Pitágoras foi o primeiro a usar o termo [filosofia] e a chamar-se de filósofo [amigo da
sabedoria], na presença do rei de Fliús, Lêon. (Livro I, Proêmio 1-12, adaptado).
* Para os gregos, bárbaros eram todos aqueles que não falavam a língua grega.

* A partir da leitura dos textos acima, faça anotações filosóficas a respeito da origem, da
criação da atividade filosófica bem como dos termos “filosofia” e “filósofo”?

ONDE? QUANDO? COMO?


O PROBLEMA DO NASCIMENTO DA FILOSOFIA

Como surgem as coisas? Se


elas surgem, onde e quando? Estas
são perguntas inquietantes. Todos nós
temos respostas a isto ao nível
biográfico. E é fácil responder. Uma
resposta fácil não ocorre com o
surgimento de um novo modo de
pensar, um novo modo de saber. Isto
é um pouco mais complexo. Isto é
Figura 2: Mapa sobre a localização das cidades dos filósofos na
Grécia Antiga
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um marco histórico no desenvolvimento do pensamento humano.
Porém, algo nisto é fácil: enquanto fenômeno histórico, costuma-se dizer que a
filosofia tem registro civil: data e local de nascimento. Ela nasceu entre o final do século
VII a.C. e no desenrolar do século VI a.C., nas colônias gregas da Ásia Menor, na
cidade de Mileto (território da atual Turquia).
A complexidade surge ao tentar se responder o como e o porquê de que, nesta
época, nas colônias gregas da Ásia Menor, nasceu a filosofia? Como se deu o
surgimento de uma mentalidade racional nova expressa através de investigações
científicas e filosóficas? Em termos mais clássicos, como se dá a passagem do mito
(mythos) à razão (logos)?
Alguns historiadores chegaram a falar em termos de ―milagre grego‖, dando a
entender que o logos, a razão, ou melhor, a capacidade racional humana libertou-se das
ilusões e fantasias míticas, encarnado-se no transcorrer da história humana de súbito
devido a incomparável e irrepetível magnificência e inteligência excepcional dos gregos
antigos. Nas palavras de Vernant, ―viajante sem bagagem, a filosofia viria ao mundo
sem passado, sem pais, sem família; seria um começo absoluto‖. Sugere Chauí que pela
expressão ―milagre grego‖ devemos entender, basicamente:
a) a mutação qualitativa produzida pelos gregos em relação as heranças
recebidas de outras civilizações em um processo de sistematização e teorização dos
conhecimentos adquiridos. Por exemplo, os egípcios e fenícios usavam a matemática
para fins práticos (agrimensura, contabilidade e engenharia), por sua vez os gregos
produziram uma ciência matemática.
b) a mutação novamente qualitativa produzida sobre as formas de organização
social, de governo e de distribuição do poder herdadas, permitindo que os gregos
criassem um modo de se fazer política não mais baseado na autoridade mágico-
sacerdotal, mas onde as decisões eram tomadas por cidadãos a partir de discussões e
debates públicos e votadas em assembleias em um espaço público, a ágora, respeitando-
se sempre a lei escrita e a justiça enquanto expressões da vida coletiva. Tem-se aqui a
invenção da política.
Além destas mutações, os historiadores costumam apontar ainda a presença de
mais algumas condições materiais, econômicas, sociais e políticas que colaboraram para
o nascimento da filosofia. Assim, enfatiza-se a importância:

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- da invenção do calendário: nova percepção do tempo, mais abstrata,e nao dependente de


fenomenos naturais

passa se a considerar o valor de troca, não o de uso (carater afetivo e sagrado)


- da invenção da moeda: moeda é convenção humana criada na cidade

- a importância das viagens e do comércio:


conhecer oa locais que os mitos muitas vezes relatavam, bem como entrar em contato
com novas culturas

Juntamente a isto, argumenta-se que dois são os fatores históricos determinantes


para o surgimento da filosofia: a criação e uso da escrita e da pólis, a cidade-Estado.

O surgimento da pólis A criação e uso da escrita alfabética

Exercite: conforme o seu entendimento, ensaie uma compreensão dos fatores que
levaram ao nascimento da filosofia.

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A filosofia, então, surge deste caldo de acontecimentos e transformações


culturais na sociedade grega dos séculos VII e VI a.C., tendo como propulsores
principais o surgimento da pólis e o uso da escrita como forma de comunicação do
saber. No entanto, essa não é a história toda: aqui ainda estamos preparando o terreno
para a filosofia mesma. Antes, precisamos falar um pouco sobre o tipo de explicação da
realidade que dominava a cultura grega, a saber, as narrativas míticas orais. E com isto
abrimos a questão a respeito da mitologia. O que é e qual a sua função propriamente?
Que relação tem a mesma, para além da questão oralidade-escrita, com a filosofia e seu
desenvolvimento?

O QUE SÃO MITOS? PARA QUE SERVEM?


E HOJE, AINDA OS UTILIZAMOS?

A questão dos mitos e sua relação com a existência humana e com a filosofia,
por si só, renderia um curso a parte. Antropologicamente podemos dizer que o homem é
o único animal que precisa esclarecer sobre qual é sua condição, qual sua posição no
cosmos. O que se quer dizer com isto é que se o homem levanta sua cabeça e observa
para além dos limites do óbvio e imediato, vislumbra aquele excesso de inexplicável e
inexplorado sobre o pouco já explorado, e então reage ficando inquieto existencialmente
diante da imensidão obscura e temível do mundo. Esta inquietude pode tornar-se medo,
assombro e até mesmo maravilhamento. E assim, desta inquietude, surgem as perguntas
a respeito da origem, finalidade e sentido da existência das coisas e da vida humana.
Para tratar desta inquietude existencial, os homens da antiguidade arcaica criaram as
narrativas míticas, ou, simplesmente, mitos. Assim, aos mitos coube a tarefa de contar
ou narrar tal como se alguém estivesse lá no começo das coisas. No Ocidente, os
primeiros registros míticos escritos que temos vem da obra de Homero, mas lembre-se
que eles já existiam antes, através do boca-a-boca, a narrativa oral. Veja a explicação
abaixo:

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Rapsodos como Homero andavam de cidade em cidade e cantavam versos sobre como havia
sido a vida dos gregos em tempos remotos. As pessoas escutavam atentas; era como uma escola
popular itinerante. Os gregos tomavam aqueles versos como um saber, e, assim, entendiam de
onde tinham vindo e como seus heróis e deuses atuavam. Dessa forma, eram transmitidos os
seus modelos de comportamento ou os elementos indicativos de como organizar a vida social e
particular.
Homero foi o responsável por obras básicas do mundo ocidental: a Ilíada e a Odisseia. A
Ilíada conta a Guerra de Troia, a Odisseia. a viagem de Ulisses de volta da guerra para a sua
casa, a ilha de Ítaca. Talvez nunca venhamos se saber se alguma coisa do que é contado nos
versos homéricos realmente aconteceu. O que importava na pedagogia exercida pelo rapsodo,
era a ideia de expor um passado grandioso. Todos podiam escutar sua história, e assim se fazia a
educação popular do povo grego. Acreditar no rapsodo era a garantia de se sentir pertencente
àquela cultura, isto é, de ser um grego. (...)
O que Homero cantava em seu versos eram mitos. A palavra 'mito' vem do grego mythos,
que significa mensagem, conselho, narrativa ou rumor. Do modo como o povo a utilizava nos
tempos de Homero, ela era a ―palavra proferida". O verbo coligado, mythéomai, significa narrar,
contar, nomear, anunciar, deliberar sobre si. Mito era a palavra usada para denominar a narrativa
cuja verdade era garantida pelo testemunho dos outros, os que davam credibilidade a tal narrativa,
ou seja, os rapsodos, homens que se diziam inspirados por forças superiores. (Retirado e adaptado
de As aventuras da Filosofia, de P. Ghiraldelli)
Resumidamente, o que é o mito? O mito é um tipo de narrativa que relata a
origem das coisas e, ao fazer isto, explica a realidade e dá o modelo exemplar de
comportamento para as atividades humanas: alimentação, sexualidade, trabalho,
educação, organização social, política, etc, ou seja, os mitos não são historias contadas
apenas por se contar, eles mostram como os homens devem se comportar e agir, e isto
deve ser feito através da imitação das ações dos deuses e heróis.
Como os mitos narram a origem do mundo?
Encontrando o pai e a mãe
Encontrando as
das coisas e dos seres. Tudo Encontrando uma rivalidade
ou uma aliança entre os deuses recompensas ou castigos
o que existe decorre de
que faz surgir alguma coisa no que os deuses dão a quem
relações sexuais entre mundo os obedece ou desobedece.
forças divinas pessoais.

De modo simples e rápido, podemos agora ajustar conceitualmente alguns


termos. Uma narrativa sobre a origem é uma genealogia, isto é, narrativa da geração dos
seres, das coisas, das qualidades, por outros seres, que são seus pais ou antepassados.
São cosmogonias e teogonias. Gonos é uma palavra grega que significa geração,
nascimento, parto; e cosmo significa o mundo natural, regido por uma ordem. Por isso,
cosmogonia é a narrativa sobre o nascimento e a organização do mundo, a partir de
forças geradoras divinas. Teogonia é a narrativa da origem dos deuses (teo = deus), a
partir de seus pais e antepassados.
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Qual a função dos mitos e para que servem? De modo algum, deve-se
considerar o mito um modo inferior do pensamento, que pode ser deixado de lado
quando as pessoas atingem a idade da razão, o que quer dizer que os mitos não foram
abandonados quando o pensamento científico e filosófico surgiu na Grécia. A mitologia
também não é uma tentativa inicial de fazer história e não alega que seus relatos sejam
fatos objetivos. Como um romance, uma ópera ou um balé, o mito é fictício, uma
história imaginada e fantasiosa (não em sentido pejorativo). Ainda, conforme
Armstrong, a mais básica função dos mitos é auxiliar os homens a lidar com as
dificuldades humanas mais problemáticas, as crises mais íntimas, a questão do sentido
da vida. Assim, a mitologia:

ajudou as pessoas a encontrarem seu lugar no mundo e sua verdadeira orientação. Todos
queremos saber de onde viemos, mas, como os primórdios se perderam nas brumas da
pré-história, criamos mitos sobre nossos antepassados, que não são históricos, porém ajudam
a explicar atitudes atuais em relação a nosso ambiente, nossos semelhantes e nossos
costumes. Também queremos saber para onde vamos, por isso elaboramos histórias que
falam de uma existência póstuma. (…) E queremos explicar os momentos sublimes, quando
parece que somos transportados para além de nossas preocupações ordinárias. Os deuses nos
ajudavam a explicar a experiência da transcendência. A religião tem sido um dos meios mais
tradicionais para alcançar o êxtase, mas, se as pessoas não o encontram mais nos templos,
sinagogas, igrejas ou mosteiros, procuram-no em outro lugar. (Retirado de Uma breve
historia do mito, de K. Armstrong)

Do modo como foram mostrados, os mitos tinham papéis importantes para as


pessoas e para a sustentação da sociedade, e originalmente não significa o mesmo que
significa hoje, quando usamos a palavra ―mito‖, ou seja, a usamos para taxar algo como
não verdadeiro. O interessante é observar que os mitos são verdadeiros justamente para
quem os vive. E quem vive o mito constantemente o reatualiza ritualisticamente, o que
mostra que os mitos são inseparáveis de procedimentos rituais e somente através destes
é que ganham sentido, bem como geram algum efeito. Assim, ―um mito, portanto, é
verdadeiro por ser eficaz, e não por fornecer dados factuais‖ (Armstrong).
Depois de termos observado um tanto sobre os mitos, é conveniente ir as coisas
mesmas. Os dois trechos abaixo a seguir apresentam narrativas míticas. Quais são as
semelhanças e diferenças entre os mitos? O que querem significar estes mitos? Para que
servem? E, mais, qual a relação entre os mitos e a religião? Anote nas linhas abaixo:

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Livro do Gênesis 1. 1-11, na Bíblia Teogonia 116-138, de Hesíodo


No princípio criou Deus o céu e a terra. Primeiro que tudo houve o Caos, e depois a
E a terra estava vasta e vazia, e havia trevas Gaia [Terra] de peito ingente, suporte inabalável
sobre a face do abismo: e o Espírito de Deus de tudo quanto existe, e o brumoso Tártaro [o
se movia sobre a face das águas. mundo subterrâneo] num recesso da terra de
E disse Deus: Haja luz. E houve luz. largos caminhos, e Eros [Amor], o mais belo
E viu Deus que a luz era boa: e fez Deus entre os deuses imortais (...)
separação entre a luz e entre as trevas. Do Caos nasceram o Érebo [as trevas infernais]
E Deus chamou a luz dia à luz e as trevas e a negra Noite. De Noite, por sua vez, surgiram
chamou noite: e foi a tarde e a manhã, o dia o Éter [a parte mais luminosa do céu] e o Dia.
primeiro. A Gaia gerou primeiro Urano [o Céu]
E disse Deus: Haja um estendimento no meio constelado, com o seu tamanho, para que a
das águas, e faça separação entre águas e cobrisse por todo e fosse para sempre a mansão
águas. E fez Deus o estendimento, e fez segura dos deuses bem-aventurados.
separação entre as águas que estão debaixo do Gerou ainda as altas Montanhas, morada
estendimento, e entre as águas que estão sobre aprazível das deusas Ninfas, que habitam os
estendimento: e foi assim. E Deus chamou o montes cercados de vales. Ela gerou ainda o
estendimento, céu: e foi a tarde e a manhã, o pélago estéril, de ondas impetuosas, Ponto [o
dia segundo. Mar], sem o desejo do amor. Mas em seguida
E disse Deus: Ajuntem-se as águas debaixo compartilhando o leito com Urano gerou
do céu em um lugar, e apareça o seco. E foi Oceano [o rio que rodeia toda a Terra], de
assim. E Deus disse: A terra produza erva profundos redemoinhos, e Coios, Crios,
verde, erva que dá semente, árvores frutuosas Hipérion e Jápeto, Teia, Reia, Témis e
que dão fruto segundo sua espécie, cuja Mnemósine, Febe de áurea coroa e a amorosa
semente esteja nelas sobre a terra. E foi assim. Tétis [os Titãs]. E depois destes nasceu o bem
armado Cronos, de funestos pensamentos, o
mais terrível dos filhos, que detestou o pai
florescente.

Anotações filosóficas

Mas e hoje, ainda temos mitos? Se sim, sua natureza e função ainda é a mesma que
nas sociedades antigas? Alguns textos podem ajudar a ampliar os horizontes:

O mito do Superman: O herói provido de poderes superiores aos do homem


comum é uma constante da imaginação popular, de Hércules a Sigfrid, de Roldão a
Pantagruel e até a Peter Pan. O Superman deve encarnar, além de todo limite pensável,
as exigências de poder que o cidadão comum nutre e não pode satisfazer. O Superman é
o mito típico de tal gênero de leitores: não é um terráqueo, mas chegou à Terra, ainda
menino, vindo do planeta Crípton. Crescido na Terra, o Superman vê-se dotado de
poderes sobre-humanos.

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Todavia, a imagem do Superman não escapa totalmente às possibilidades de
identificação por parte do leitor. De fato, ele vive entre os homens sob as falsas vestes
do jornalista Clark Kent; e, como tal, é um tipo aparentemente medroso, tímido, de
medíocre inteligência, um pouco embaraçado, míope, e desprezado por Louis Lane, que
é loucamente enamorada por Superman.
Do ponto de vista mito poético: Clark Kent personaliza, de modo bastante típico,
o leitor médio torturado por complexos e desprezado pelos seus semelhantes; através de
um óbvio processo de identificação, uma pessoa qualquer, de uma cidade qualquer,
nutre secretamente a esperança de que um dia, das vestes da sua atual personalidade,
possa florir um super-homem capaz de resgatar anos de mediocridade. (Adaptado de
Apocalípticos e integrados, de Umberto Eco).

A influência dos meios de comunicação e os mitos contemporâneos:


A atuação dos meios de comunicação de massa na fugacidade das imagens e na rapidez
das mudanças sociais e culturais exalta múltiplos e fugazes personagens que povoam
nosso imaginário de forma também transitória. Isso faz com que as características do
mito contemporâneo sejam bem distintas das do mito primitivo. No mito
contemporâneo, não encontramos a abrangência e a totalidade características da
mitologia primitiva, que buscava visões de ordenamento de toda a realidade.
Contrariamente ao mito antigo, no qual a adesão era coletiva e seu conteúdo era
conhecido por todos de forma transparente, assistimos, agora, a uma adesão individual a
um conteúdo latente, situado nos bastidores do pensamento e que se faz presente em
novelas, filmes, contos, sendo ele o motivo justificador de nossas ações para nós
mesmos, diante dos outros. (Inteligência da complexidade, Celito Meier)
O Monomito ou a Jornada do
Herói: O estudioso dos mitos Joseph
Campbell identificou uma estrutura comum
presente em todas as narrativas míticas. Ele a
denominou de monomito ou jornada do herói.
Ela é composta conforme os momentos na
imagem ao lado. Pense por um momento nos
filmes que você assiste, principalmente os
que envolvem a temática dos super heróis:
não estão lá presentes estes momentos?

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Anotações:

Uma sugestão: tente ensaiar um monomito com elementos filosóficos!


Outra sugestão: o documentário ou o livro de entrevistas com Joseph Campbell, O poder do
mito, é uma boa pedida para saber mais sobre mitos e mitologia.

MITOS E FILOSOFIA: RUPTURA OU CONTINUIDADE?

No mito, thâuma é ―o maravilhoso‖; o efeito de assombro que ele provoca é o sinal da


presença nele do sobrenatural. Para os primeiros filósofos, a estranheza de um fenômeno, em
vez de impor o sentimento do divino, propõe-no ao espírito em forma de problema. O insólito
não fascina mais, ele mobiliza a inteligência. De silenciosa veneração, a admiração faz-se
questionamento, interrogação. (Mito e pensamento na Grécia Antiga, de J.P. Vernant)

Assim nos conta Vernant sobre a origem existencial e afetiva tanto dos mitos,
como da filosofia, pelo thâuma, o assombro, mas também nos informa sobre uma
profunda transformação de atitude nos primeiros filósofos em relação a realidade. O que
aparece já não causa maravilhamento ou medo, mas apresenta-se como um problema, e
este precisa ser abordado e explicado racionalmente, sem o recurso ao sobrenatural. Esta
mudança de atitude em relação a realidade, a passagem do mito a filosofia, é resultado
de uma ruptura radical ou de uma continuidade entre mito e filosofia?
Houve quem defendeu a ruptura direta e total por um lado, no caso do helenista
Burnet. Para este, os gregos descobriram sozinhos a razão, pois a inteligência grega era
composta de duas qualidades únicas: o espírito de observação e o poder de ra ciocínio.
Contrariamente a Burnet, houve quem mostrou os aspectos de continuidade entre mito e
religião com a filosofia, tal como Cornford e Jaeger. Estes argumentaram e mostraram
que os filósofos transportaram numa forma laica e num pensamento abstrato os
conteúdos da religião e dos mitos, ou seja, o surgimento da filosofia grega se dá em um
contínuo processo de racionalização dos mitos. No entanto, seria a filosofia apenas uma
outra linguagem para dizer o mesmo que era dito no mito? O que precisa ser
esclarecido, então, como coloca Vernant, é aquilo que faz com que a filosofia deixe de
ser mito para ser filosofia, ou seja: o que há de verdadeiramente novo na mentalidade

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filosófica em relação aos mitos? Ou seja, o que há de verdadeira ruptura entre mito e
filosofia?

O QUE INVESTIGAVAM OS PRIMEIROS FILÓSOFOS?


Tanto Aristóteles, alguns séculos após o surgimento das investigações
filosóficas, quanto Nietzsche no século XIX, consideraram Tales de Mileto como o
primeiro filósofo. Assim, a filosofia não somente tem data e local de nascimento: final
do século VII e início do século VI, nas colônias gregas da Ásia Menor (particularmente
as que formavam uma região denominada Jônia), na cidade de Mileto, mas tem aquele
que é considerado o primeiro filósofo. Veja o que nos diz no trecho abaixo Nietzsche a
respeito de Tales e as razões para ele ser considerado o primeiro:

A filosofia grega parece começar com uma ideia absurda, com a proposição: a água é a
origem e a matriz de todas as coisas. Será mesmo necessário deter-nos nela e levá-la a sério?
Sim, e por três razões: 1) porque essa proposição enuncia algo sobre a origem das coisas; 2)
porque faz sem imagem e fabulação; e enfim, 3), porque nela, embora apenas em estado
de crisálida, está contido o pensamento: ―Tudo é um‖. A razão citada em primeiro lugar
deixa Tales ainda em comunidade com os religiosos e supersticiosos, a segunda o tira dessa
sociedade e mostra-o como investigador da natureza, mas, em virtude da terceira, Tales
se torna o primeiro filósofo grego.
O comentário de Nietzsche nos mostra o programa de investigação não somente
de Tales, mas dos filósofos deste período nascente da filosofia grega. O que o trecho

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sobre Tales nos diz a respeito do que investigavam estes primeiros filósofos. Observe
onde há continuidade e ruptura com a mitologia.

Anotações filosóficas

Já vimos antes que eram pelas narrativas míticas que se obtém o conhecimento a
respeito da origem das coisas, sejam elas por cosmogonias ou teogonias; observamos
acima também que estas narrativas passaram a não dar mais conta de explicar a
realidade. O que há de novo é que os primeiros filósofos, ao abastecerem-se de
problemas abordados e estruturas presentes nos mitos, passaram a explicar as coisas de
outro modo. A origem e a ordem do mundo são agora naturais.
Assim, a filosofia elaborada pelos pré-socráticos apresenta-se como uma
cosmologia, contraposta as cosmogonias míticas, ou seja, é uma LEMBRETE!
O que os gregos
explicação da origem do mundo através da determinação de um denominaram de
princípio originário e racional que é a origem e causa das coisas e phýsis nada tem a
ver com os
de sua ordenação. O que apresenta-se já não causa medo ou fenômenos
maravilhamento, mas instiga a pensar, coloca-se como problema: explicados pelas
ciências naturais
como as coisas e os seres foram gerados? O que lhe dá continuidade hoje.
e sustentação? Como explicar as mudanças e repetições, as
oposições e semelhanças, o surgimento e desaparecimento das coisas? Qual é a causa
das mudanças e transformações? Estas últimas três questões são inovações em relação
as narrativas míticas. Todos estes problemas podem ser resumidos no termo phýsis, o
qual é traduzido por natureza. É dar conta da phýsis e de sua complexidade que os pré-
socráticos se preocupavam. Em sua expressão original, physis designa o processo de
surgir e desenvolver-se num constante e permanente movimento vital, confundindo-se
com a própria força motriz de tal movimento. É a realidade primeira
Os filósofos
jamais deixaram e última, subjacente a todas as coisas de nossa experiência. É
de se espantarem
considerada assim a expressão daquilo que é primário, fundamental e
e preocuparem
com o problema persistente, opondo-se ao que é secundário, derivado e transitório. A
da kínesis: o
phýsis é a totalidade de tudo o que é e assim pode ser apreendida em
devir incessante
da natureza.

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tudo o que existe.
O princípio originário buscado pelos pré-socráticos era uma arkhé, um princípio
idêntico e imutável subjacente as mudanças visíveis que se manifestavam na phýsis. A
arkhé é a origem, não no sentido de algo do passado, e sim como aquilo que, ainda aqui
e agora, continua dando origem a tudo, permanentemente. E, por fim, o que causava
espanto e admiração nos primeiros filósofos é a eterna instabilidade das coisas, o
nascimento e morte, o surgimento e desaparecimento. Enfim, a mudança, kínesis. Para
os gregos, kínesis significava todas as mudanças que algo pode sofrer, sejam
qualitativas, quantitativas ou de lugar.
Phýsis, arkhé e kínesis são os tópicos de preocupação dos primeiros filósofos, os
pré-socráticos, ou, em uma nomenclatura mais adequada, cosmólogos ou fisiólogos
(estudiosos da phýsis). Infelizmente, muito pouco ou nada restou de suas obras. O que
temos basicamente são testemunhos de outros filósofos ou historiadores a respeito de
seus pensamentos. Como já sabemos, Tales foi o primeiro, mas há outros mais. Há
outros, pois eles não concordavam entre si ao determinar o que era propriamente a
phýsis. Podemos dividir estes filósofos e seus modos de explicação da phýsis nas
seguintes escolas:

ESCOLA JÔNICA

Tales de Mileto: Considerado o primeiro filósofo. Era monista, formulou a


doutrina segundo a qual a água é o princípio originário, a arkhé, e o princípio
explicativo dos processos na phýsis.
Anaximandro: Discípulo de Tales, monista, propôs que todas as coisas foram
geradas do indeterminado (apeiron), ou seja, não identifica o princípio originário com
nenhum elemento natural. Dá um passo além para a explicação da realidade de modo
mais geral e abstrato.
Anaxímenes: Também monista, acreditava na origem de todas as coisas por
meio do ar (pneuma), uma vez que o ar é incorpóreo e encontrado em toda parte.
Heráclito: Também monista e mobilista, doutrina na qual explica que a phýsis
está em constante movimento e fluxo. Mas a realidade possui uma unidade na
multiplicidade: unidade dos opostos. Assim, a phýsis é marcada pelo conflito entre
opostos. O fogo é tomado como o princípio originário, pois simboliza o caráter
dinâmico da realidade. Um de seus fragmentos mais famosos é: ―Não podemos nos
banhar duas vezes no mesmo rio, por que o rio não é mais o mesmo‖. Este fragmento
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sintetiza sua doutrina da mobilidade e fluxo da phýsis. Sua doutrina está em direta
controvérsia com a de Parmênides.

ESCOLA ITALIANA

Pitágoras: Dele originou-se o pitagorismo, escola filosófica e seita política,


religiosa e moral, na qual defendia-se que os números são o elemento básico de
explicação da phýsis e que esta mantém seu equilíbrio, harmonia e ordem devido a
relações proporcionais numéricas.
Parmênides: Pode ser considerado um monista e imobilista, ou seja, nega que a
realidade está em movimento, e o movimento percebido pelos sentidos humanos é
apenas aparente. É através de nossa razão que descobriremos que a phýsis é única,
imóvel, eterna, imutável, sem princípio, nem fim, contínua e indivisível. Dentre as obras
dos pré-socráticos, é de Parmênides o fragmento mais extenso que chegou até nós. Sua
doutrina está em direta controvérsia com a de Heráclito.

OS PLURALISTAS E A ESCOLA ATOMISTA

Empédocles: Pluralista, formulou a teoria dos quatro elementos: terra, água, ar e


fogo; tentou sintetizar as doutrinas de pensadores anteriores.
Anaxágoras: Também pluralista, concebeu a phýsis composta de uma
multiplicidade infinita de elementos denominados de homeomerias. Acreditava em um
nous (Inteligência cósmica) como causa da existência da phýsis.
Demócrito: Discípulo de Leucipo, o criador da escola atomista. Demócrito deu
seguimento a doutrina de seu mestre, a qual defende que a phýsis é composta de átomos
e vazio, onde os átomos estão em constante movimento, se atraindo e se repelindo,
formando assim os fenômenos naturais. Os átomos têm forma geométrica, são infinitos
e imperceptíveis.

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PARA DESCONTRAIR: TALES E A PROCURA PELA ARKHÉ

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A anedota de Tales caindo no poço é relatada no diálogo Teeteto, de Platão, por


Sócrates:
―Enquanto estava a olhar para cima e a estudar as estrelas, Tales de Mileto caiu a um poço.
Uma jovem criada da Trácia, bonita e espirituosa, zombou dele. Dizem que foi por estar tão
ávido em conhecer as coisas no céu que não pôde ver o que estava à frente dele, mesmo a
seus pés. O mesmo gracejo aplica-se a todos aqueles que passam as suas vidas na filosofia‖
(Platão, Teeteto; 174a).

VOCÊ MORRERIA POR SUAS IDEIAS?


O giro antropológico em filosofia

Imagine por um momento as pessoas que


saem nas ruas em passeatas reivindicando algo;
podemos imaginar também aquelas que se
postam diante de armas; pessoas que estão
nestas situações, e em muitas outras
Figura 3: A morte de Sócrates (1787), semelhantes, encontram-se em posições
pintura de Jacques-Louis David
delicadas, uma vez que as palavras e os
argumentos não tiveram efeito, não foram suficientes para persuadir. Assim, tiveram de

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Filosofia 2016

apelar para um recurso extremo: usar o último argumento que é seu próprio corpo, sua
carne, sua vida. Se estas pessoas são levadas a morte, o impacto de suas mortes tem
tremendas consequências culturais: a criação de uma nova tradição.
Ao longo da história, é comum que pessoas morram ―por uma causa‖: Deus,
companheiros, ideias, coisas reais ou imaginárias, razoáveis ou utópicas. E não são
poucos os exemplos. Um dos primeiros que pode vir à lembrança é Jesus. De outro
modo, mas pondo também o corpo e a vida em risco, temos o exemplo de Gandhi. Em
todos estes casos, ideias foram envolvidas por carne. Geralmente, fazer filosofia não
leva a morte, mesmo que os filósofos possam falar coisas que desagradem. Mesmo
assim, não foram poucos os casos em que fazer filosofia e defender suas ideias levou
filósofos a morte: Thomas More, Hipátia, Giordano Bruno. Anaxágoras foi condenado
pelos Atenienses e escapou por pouco. Galileu, fundador da ciência moderna, se retratou
se não o fizesse seria queimado na fogueira.
A morte que nos interessa aqui e que cria uma nova tradição nova de
pensamento, na filosofia, é a de Sócrates. O caso de Sócrates já foi comparado com o de
Jesus muitas vezes. Ambos foram condenados, morrem por suas ideias e, a partir disto,
criam-se novas tradições: uma filosófica, outra religiosa. Em ambos os casos temos
pouca quantia de registros a respeito de suas existências históricas, e nenhum destes
registros, seja de seus pensamentos ou de suas vidas, foi feito por eles mesmos, o que dá
margem para se questionar se não são simplesmente personagens criadas e imaginadas
por alguém.
O que sabemos sobre Sócrates é que ele
nasceu em Atenas, vindo a morrer com a idade Os registros dignos de confiança a respeito de
Sócrates provém da divertida comédia As
de 70 anos em 399 a.C; casou com Xantipa e Nuvens de Aristófanes, d'Os ditos e feitos
teve filhos; participou de batalhas a favor de memoráveis de Sócrates e uma Apologia de
autoria de Xenofonte e os diálogos de Platão,
Atenas; e foi um filósofo. Sua prática sendo o mais importantes aqueles do primeiro
período, no qual se encontra a Apologia.
filosófica, bem como sua condenação a morte
se deu no contexto da pólis grega sob o regime de uma democracia direta que havia
florescido e se consolidado. Nesta era democrática, o ideal de paideia
(educação/formação) da juventude, não era formar bons guerreiros, mas bons cidadãos.
Os bons cidadãos eram aqueles participantes das discussões políticas. E um requisito
para isto era ser bom orador. É aí que surgem os sofistas. A educação passa a ser feita
não mais pelos poetas rapsodos, mas pelos sofistas, professores itinerantes, que iam de

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Filosofia 2016
cidade em cidade, ensinando aqueles que podiam pagar por suas lições e ensinamentos.
O que eles ensinavam? A arte de bem argumentar e persuadir (a retórica), útil para quem
vive em uma democracia onde as decisões são feitas em público através de debates e
discussões e nas quais vence quem souber melhor convencer. Por outro lado, eles são os
responsáveis diretos por deslocar o eixo das reflexões filosóficas da phýsis para as
questões a respeito da vida do homem em sociedade. No entanto, Sócrates e os seus
seguidores não concordavam com as práticas dos sofistas, pois estes não estavam
preocupados com a busca pela verdade, eles tinham interesse apenas em fornecer as
armas para defender qualquer ideia, desde que isto fosse vantajoso. No fim das contas,
eles faziam o erro e a mentira valem tanto quanto a verdade, corrompendo a mente dos
jovens.
O início de sua atividade filosófica se deu a partir da consulta que Querofonte,
um amigo, faz ao Oráculo de Delfos. Lá ele questionou o Oráculo perguntando se havia
alguém mais sábio que Sócrates: a resposta era que não havia alguém mais sábio.
Quando soube disto, Sócrates assim refletiu e compreendeu aquelas palavras como uma
missão:
―Que quererá dizer o deus? Que sentido oculto pôs na resposta? Eu cá não tenho
consciência de ser nem muito sábio nem pouco; que quererá ele, então, significar
declarando-me o mais sábio? Naturalmente, não está mentindo, porque isso lhe é
impossível.‖ Por longo tempo fiquei nessa incerteza sobre o sentido; por fim, muito contra
meu gosto, decidi-me por uma investigação, que passo a expor. Fui ter com um dos que
passam por sábios, porquanto, se havia lugar, era ali que, para rebater o oráculo, mostraria
ao deus: ―Eis aqui um mais sábio que eu, quando tu disseste que eu o era!‖ Submeti a
exame essa pessoa — é escusado dizer o seu nome; era um dos políticos. Eis, Atenienses, a
impressão que me ficou do exame e da conversa que tive com ele; achei que ele passava por
sábio aos olhos de muita gente, principalmente aos seus próprios, mas não o era. Meti-me,
então, a explicar-lhe que supunha ser sábio, mas não o era. A consequência foi tornar-me
odiado dele e de muitos dos circunstantes.
Ao retirar-me, ia concluindo de mim para comigo: "Mais sábio do que esse homem
eu sou; é bem provável que nenhum de nós saiba nada de bom, mas ele supõe saber alguma
coisa e não sabe, enquanto eu, se não sei, tampouco suponho saber. Parece que sou um
nadinha mais sábio que ele exatamente em não supor que saiba o que não sei." Daí fui ter
com outro, um dos que passam por ainda mais sábios e tive a mesmíssima impressão;
também ali me tornei odiado dele e de muitos outros.

Foi devido a este tipo de prática que foi condenado: os atenienses sentiram-se
incomodados pelo modo de questionamento, via o método dialético (ver abaixo), que
Sócrates aplicava pelas ruas de Atenas. Ele estava colocando em questão a sabedoria de

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Filosofia 2016

muitas pessoas eminentes e importantes, de muitos saberes tradicionais e estabelecidos.


Na Apologia de Platão, obra da qual o trecho acima foi retirado, é apresentado todo o

Ninguém, nem os amigos, consegue convencê-lo a abdicar de sua consciência. Entra a mulher
de Sócrates, Xantipa, trazendo os filhos para a despedida. Sócrates permanece sereno.
Finalmente chega o carcereiro com a cicuta. Imperturbável, Sócrates toma o vaso que lhe é
oferecido, de um só gole bebendo todo o veneno. Os amigos soluçam. Mas ele ainda os anima:
"Não, amigos, tudo deve terminar com palavras de bom augúrio: permanecei, pois, serenos e
fortes". (Os Pensadores - Sócrates)
caso jurídico em que Sócrates está envolvido.
Sua morte, acontecimento de consequências tremendas para a filosofia, não é
relatada na Apologia, mas no diálogo Fédon, também de Platão, onde encontramos a
dramatização da morte de Sócrates e dos dias que a antecedem enquanto está na
prisão na companhia de amigos e discípulos, que tentam persuadi-lo a fugir, mas ele
permanece sereno a espera do momento derradeiro.
Sócrates foi acusado de corromper a juventude, não acreditar nos antigos deuses e cultuar
novos deuses. Fez sua defesa em assembleia e, na votação, foi condenado. Aceitou a
condenação: morte por envenenamento. Aceitou-a não por se considerar culpado, mas por
entender que não podia se revoltar contra 'as leis', ou seja, a determinação da cidade. (As
aventuras da Filosofia, de P. Ghiraldelli)

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Filosofia 2016

Por sua morte, Sócrates é tido como uma figura fundadora da filosofia, pelo
menos de certo modo de se fazer filosofia. Ele é tomado como um marco divisor na
história do pensamento filosófico, pois ainda hoje continua-se utilizando a
designação ―pré-socráticos‖ para se referir aos filósofos anteriores a Sócrates, Tales e
os demais cosmólogos ou fisiólogos, investigadores da phýsis. Sócrates inaugura um
modo de fazer filosofia, influenciado pelos sofistas, que tem como foco das
preocupações e reflexões as questões humanas da ética e política.

Afinal, você morreria por suas ideias?


A filosofia de Sócrates
Conhece-te a ti mesmo Só sei que nada sei “O que é…?”

Anotações filosóficas

O QUE É UM FILÓSOFO?

O Banquete e o Mito da Caverna de Platão

―O que faz de alguém um filósofo, além de ser considerado como tal pela
universidade?‖, a esta pergunta Mary Warnock responde que os verdadeiros filósofos
não somente apresentam suas ideias, mas também argumentam a favor delas, o que leva
os filósofos a terem um interesse apaixonado pelas ideias uns aos outros. O que resulta
disso? Que os filósofos conversam entre si, discordando e até refutando os argumentos
uns dos outros, expondo suas teorias por meio de diálogos, falados ou escritos.
Sócrates dialogou falando. E a sua morte levou não somente Platão, mas

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Filosofia 2016

principalmente este, a escrever e registrar as peripécias e a filosofia tal como Sócrates a


praticava em Atenas, no século V a.C. O ato de Platão é revolucionário, pois registra por
escrito o novo modo de se fazer filosofia criado por Sócrates, bem como as novas
preocupações com as quais filósofos deveriam se ocupar. Mas há mais do que isto.
Sócrates dá a Platão o modelo do que é ser um filósofo, modelo o qual está exposto nos
diálogos ditos socráticos escritos por Platão. Mas com Platão, a filosofia sai da rua da
cidade, e adentra em um espaço próprio, a Academia, a escola que Platão fundou em
Atenas para o ensino de filosofia.
Tal como no diálogo Apologia, o diálogo Banquete escrito por Platão é um
verdadeiro monumento em homenagem a importância de Sócrates para a filosofia. É
neste diálogo em que Platão faz uma bela reflexão propriamente filosófica sobre a
atividade do filósofo, a philosophia (filosofia). Como observa Hadot, neste diálogo
tanto o termo ―filósofo‖ quanto ―filosofia‖ adquirem um novo sentido, ultrapassando os
usos costumeiros da época.
O diálogo Banquete está articulado em torno de discursos sobre a natureza do
eros, sendo de Sócrates o último. Ele irá discorrer sobre o amor relembrando de uma
conversa que teve com a sacerdotisa Diotima, a qual lhe contou certa vez um mito a
respeito da origem do amor. O diálogo se finda com a chegada do jovem Alcebíades,
enamorado de Sócrates, o qual interrompe a fala do mesmo e passa a elogiá-lo. Com o
encerramento das honrarias a eros e o início dos elogios a Sócrates, este encarna o
próprio eros, ou seja, encarna a filosofia.

Sobre o Banquete

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Filosofia 2016

Abaixo um dos mais belos trechos do diálogo Banquete:

O Amor está no meio da sabedoria e da ignorância. Eis com efeito o que se dá. Nenhum deus
filosofa ou deseja ser sábio – pois já é –, assim como se alguém mais é sábio, não filosofa.
Nem também os ignorantes filosofam ou desejam ser sábios; pois é nisso mesmo que está o
difícil da ignorância, no pensar, quem não é um homem distinto e gentil, nem inteligente, que
lhe basta assim. Não deseja portanto quem não imagina ser deficiente naquilo que não pensa
lhe ser preciso. Quais então [...] os que filosofam, se não são nem os sábios, nem os
ignorantes? [...] São os que estão entre esses dois extremos, e um deles seria o Amor. Com
efeito, uma das coisas mais belas é a sabedoria, e o Amor é amor pelo belo, de modo que é
forçoso o Amor ser filósofo e, sendo filósofo, estar entre o sábio e o ignorante. E a causa de
sua condição é a sua origem: pois é filho de um pai sábio e rico e de uma uma mãe que não é
sábia, e pobre. (PLATÃO. O Banquete. 5. ed. São Paulo: Nova cultural, 1991. p. 35-36, Os
Pensadores)

No entanto, não é somente no Banquete


que Platão aborda a questão do que é o filósofo e
a atividade a qual este se dedica. Um outro lugar
em que discorre sobre esta questão é na Alegoria
da Caverna, presente no Livro VII da obra A
República. A Alegoria tem alto poder explicativo,
sendo uma das metáforas mais potentes já criadas na história da filosofia, pois através
dela podem ser abordados e explicados muitos temas da filosofia de Platão. Uma das
interpretações da mesma aponta que ela foi criada como um recurso didático para que
Platão pudesse explicar aos não iniciados na filosofia a experiência vivida pelos
filósofos.

Anotações filosóficas

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O QUE É ISTO – A FILOSOFIA? PARA QUE SERVE?


―O homem não passa de um caniço, o mais fraco da natureza,
mas é um caniço pensante‖, disse Pascal. O que ele quis dizer é que
somos seres de natureza frágil, pouco basta para morrermos; mas
pensamos. É por pensar e refletir que filosofamos. É neste sentido que
Antonio Gramsci disse certa vez que ―todos os homens são filósofos‖, na
medida em que todo ser humano, de uma forma mais ou menos intensa e duradoura,
pensa, critica e reflete sobre os problemas que enfrenta em sua vida, criando respostas
para os mesmos. No entanto, os filósofos são aqueles homens que se dedicam a fazer
isto, a filosofia, de modo mais intenso, fazendo dessa atividade sua profissão e sua vida.
Você já deve ter reparado nisto, pois já foi iniciado no estudo das artes racionais
e não-secretas da filosofia. Por um bom par de noites, você teve contato com o
pensamento filosófico e adquiriu experiência e conhecimentos filosóficos. Agora é hora,
chegado aqui, esboçar, no espaço abaixo, o que você entende por filosofia e se você
visualiza alguma utilidade para a mesma.

A vida cotidiana e a atitude filosófica


Em nossa vida cotidiana, afirmamos, negamos, desejamos, aceitamos ou
recusamos coisas, pessoas, situações. Fazemos perguntas, como ―Que horas são?‖, ou
―Que dia é hoje?‖. Dizemos frases, como ―Ele está sonhando‖, ou ―Ela ficou
maluca‖. Fazemos afirmações, como ―Onde há fumaça há fogo‖, ou ―Não saia na
chuva para não se resfriar‖. Avaliamos coisas e
pessoas, dizendo, por exemplo, ―Esta casa é mais
bonita do que a outra‖ e ―Maria está mais jovem
do que Glorinha‖.

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Filosofia 2016

Quando pergunto ―Que horas são?‖ ou


―Que dia é hoje?‖, minha expectativa é a de que
alguém, tendo um relógio ou um calendário, me
dê a resposta exata. Em que acredito quando
faço a pergunta e aceito a resposta? Acredito que
o tempo existe, que ele passa, que pode ser
medido em horas e dias, que o que já passou é
Figura 4: A persistência da memória, de diferente de agora e o que virá também há de ser
Salvador Dali
diferente deste momento, que o passado pode ser
lembrado ou esquecido, e o futuro, desejado ou temido. Assim, uma simples pergunta
contém, silenciosamente, várias crenças. Imaginemos, portanto, alguém que tomasse
a decisão de não aceitar as opiniões estabelecidas e começasse a fazer perguntas que os
outros julgam estranhas e inesperadas. Em vez de ―Que horas são?‖ ou ―Que dia é
hoje?‖, perguntasse: ―O que é o tempo?‖. Alguém que tomasse essa decisão estaria se
distanciando da vida cotidiana e de si mesmo, pois estaria indagando o que são as
crenças e os sentimentos que alimentam, silenciosamente, nossa existência. Ao tomar
essa distância, estaria interrogando a si mesmo, desejando conhecer por que cremos no
que cremos, por que sentimos o que sentimos e o que são nossas crenças e nossos
sentimentos. Esse alguém estaria começando a cumprir o que dizia o oráculo de Delfos:
―Conhece-te a ti mesmo‖. E estaria passando a adotar a atitude filosófica.

Atitude e reflexão filosóficas


A primeira característica da atitude filosófica é negativa, isto é, um dizer não aos
―pré-conceitos‖, aos ―pré-juízos‖, aos fatos e às ideias da experiência cotidiana, ao que
―todo mundo diz e pensa‖, ao estabelecido. A segunda característica da atitude filosófica
é positiva, isto é, uma interrogação sobre o que são as coisas, as ideias, os fatos, as
situações, os comportamentos, os valores, nós mesmos. É também uma interrogação
sobre o porquê e o como disso tudo e de nós próprios. Assim, a atitude filosófica se faz
indagadora do:
“O que é?” perguntar o que é (uma coisa, um valor, uma ideia, um
comportamento) – a filosofia pergunta qual é a realidade e qual é a significação de algo;
“Por que é?” perguntar por que é (uma coisa, uma ideia, um valor, um
comportamento) – por que algo existe, qual é a origem ou a causa de uma coisa, de uma
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Filosofia 2016

ideia, de um valor, de um comportamento.


“Como é?” perguntar como é (uma coisa, uma ideia, um valor, um
comportamento) – a filosofia indaga como é a estrutura ou o sistema de relações que
constitui a realidade de algo;
A atitude filosófica inicia-se dirigindo essas indagações ao mundo que nos
rodeia e às relações que mantemos com ele. Pouco a pouco, porém descobre que essas
questões se referem, afinal, à nossa capacidade de conhecer, à nossa capacidade de
pensar.
Complementa-se a isto com a reflexão filosófica, a qual é o movimento pelo
qual o pensamento, examinando o que é pensado por ele, volta-se para si mesmo como
fonte do que foi pensado. É a concentração mental em que o pensamento busca
examinar, compreender e avaliar suas próprias ideias, vontades, desejos e sentimentos.
A reflexão filosófica organiza-se em torno de três grandes conjuntos de
perguntas ou questões:
1. Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que
fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que
pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos?
2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando
falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido
do que pensamos, dizemos ou fazemos?
3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que
fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos?
Como vimos, a atitude filosófica dirige-se ao mundo que nos rodeia e aos seres
humanos que nele vivem e com ele se relacionam. É um saber sobre a realidade exterior
ao pensamento. Já a reflexão filosófica se dirige ao pensamento, à linguagem e à ação.
São perguntas sobre a capacidade e a finalidade de conhecer, falar e agir próprias dos
seres humanos. É um saber sobre a realidade interior aos seres humanos.
Assim, uma resposta humilde e econômica à pergunta ―O que é filosofia?‖
poderia ser: A decisão de não aceitar como naturais, óbvias e evidentes as coisas, as
ideias, os fatos, as situações, os valores, os comportamentos de nossa existência
cotidiana; jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e compreendido‖. (Retirado
e adaptado de Iniciação a filosofia, de Marilena Chauí)
QUANDO PROCURAMOS UM FILÓSOFO?

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Filosofia 2016
Ou, sobre a (in)utilidade da filosofia

“A filosofia é algo com a qual e sem a qual o mundo permanece tal e qual”
(Ditado popular)

Quem procuraria um filósofo quando o que está em questão é algo crucial em


sua vida? Qual a utilidade e importância da filosofia para a vida dos homens e mulheres
que amam e odeiam, que se alegram e sofrem, trabalham e dormem, nascem e morrem?
Se de nada nos serve, não seria a filosofia apenas um luxo?
Muitos filósofos quiseram, direta ou indiretamente, responder à questão acerca
da utilidade da filosofia, porque a consideraram relevante. Porém todas as respostas
argumentam não em defesa da utilidade prática da filosofia, no sentido de ser ela capaz
ou não de oferecer soluções para a vida cotidiana, mas de seu valor para a vida humana.
(adaptado de A filosofia, de Danilo Marcondes). O filósofo Simon Blackburn em seu
livro de introdução a filosofia, Pense, nos dá uma resposta em três níveis quanto ao
valor da filosofia:
―A resposta de alto nível põe em questão a pergunta. Que queremos dizer
quando perguntamos para que serve? Quando perguntamos pela utilidade de algo? A
reflexão não coze o pão, mas também a arquitetura não o faz, nem a música, a arte, a
história ou a literatura. Acontece apenas que queremos compreender melhor o mundo e
a nós mesmos. Queremos isto pelo seu valor intrínseco, tal como os especialistas em
ciências ou matemáticas puras podem querer compreender o princípio do universo, ou a
teoria dos conjuntos, pelo seu valor intrínseco, ou como um músico pode querer
resolver alguns problemas na harmonia ou no contraponto pelo seu valor intrínseco. São
coisas que não se fazem em função de aplicações práticas. Os momentos em que nos
libertamos disso [das necessidades e aplicações práticas], seja para fazer matemática ou
música, para ler Platão ou Eça de Queirós, devem ser acarinhados. São momentos em
que desenvolvemos a nossa saúde mental. E a nossa saúde mental é boa em si, como a
nossa saúde física. Além disso, há no fim de contas uma recompensa em termos de
prazer. Quando temos saúde física, o exercício físico dá-nos prazer, e quando temos
saúde mental, o exercício mental dá-nos prazer. Esta é, sem dúvida, uma resposta
bastante abstrata.
Por isso, eis uma resposta de nível intermediário. A reflexão é importante
porque está na continuidade com a prática. O modo como pensamos sobre o que
estamos a fazer afeta o modo como o fazemos, ou até mesmo se o chegamos a fazer;

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Filosofia 2016

pode conduzir a nossa investigação, ou a nossa atitude relativamente a pessoas que


fazem as coisas de modo diferente, ou até toda a nossa vida.
Tomemos um exemplo simples: o fatalismo, ou a ideia de que o futuro está
determinado, seja o que for que façamos, é uma convicção puramente filosófica — mas
é uma convicção que tem o poder de paralisar a ação. Em termos mais políticos, pode
também exprimir a aceitação do baixo estatuto social atribuído a alguns segmentos da
população, o que pode ser reconfortante para pessoas que, pertencendo aos estatutos
mais elevados, encorajam essa aceitação.
Assim, a resposta intermediária chama-nos a atenção para o fato de a reflexão
estar na continuidade com a prática, podendo a nossa prática ser melhor ou pior de
acordo com o valor das nossas reflexões. Um sistema de pensamento é algo em que
vivemos, tal como uma casa, e se a nossa casa intelectual estiver fechada e for limitada,
precisamos ver que outras estruturas melhores serão possíveis.
A resposta de nível baixo limita-se a sublinhar um pouco este aspecto, onde a
vida humana é um pouco menos elegante. Há sempre pessoas prontas a dizer-nos o que
queremos, a explicar-nos como nos vão dar essas coisas e a mostrar-nos no que
devemos acreditar. As convicções são contagiosas, e é possível convencer as pessoas de
praticamente tudo. Geralmente, estamos dispostos a pensar que os nossos hábitos, as
nossas convicções, a nossa religião e os nossos políticos são melhores do que os deles,
ou que os nossos direitos dados por Deus anulam os direitos deles, ou que os nossos
interesses exigem ataques defensivos ou dissuasivos contra eles. É por causa de ideias
sobre o que os outros são, ou quem somos, ou o que os nossos interesses ou direitos
exigem que fazemos guerras ou oprimimos os outros de consciência tranquila, ou até
aceitamos por vezes ser oprimidos. Quando estas convicções implicam o sono da razão,
o despertar crítico é o antídoto. A reflexão permite-nos recuar, ver que talvez a nossa
perspectiva sobre uma dada situação esteja distorcida, ou seja, cega, ou pelo menos ver
se há argumentos a favor dos nossos hábitos, ou se é tudo meramente subjetivo.
Há sempre pensamentos que se opõem à reflexão. As questões filosóficas fazem
muitas pessoas sentirem-se desconfortáveis, ou mesmo ultrajadas. Algumas têm medo
que as suas ideias possam não resistir tão bem como elas gostariam se começarem a
pensar sobre elas. Assim, algumas pessoas gostam de se refugiar num círculo espesso,
confortável e tradicional de tradições populares, sem se preocuparem muito com a sua
estrutura, as suas origens, ou mesmo com as críticas que possam merecer. A reflexão

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Filosofia 2016
abre a avenida da crítica, e as tradições populares podem não gostar da crítica. Neste
sentido, as ideologias tornam-se círculos fechados, prontas a sentirem-se ultrajadas pelo
espírito interrogante. Nos últimos 2 mil anos, a tradição filosófica tem sido a inimiga
deste tipo de complacência confortável. Tem insistido na ideia de que uma vida não
examinada não vale a pena ser vivida. Tem insistido no poder da reflexão racional para
descobrir o que há de errado nas nossas práticas, e para as substituir por práticas
melhores. Tem identificado a auto-reflexão crítica com a liberdade — e a ideia é que só
quando nos conseguimos ver a nós mesmos de forma adequada podemos controlar a
direção em que desejamos caminhar. (Retirado e adaptado de Pense, de Blackburn)

Por fim, um convite para pensar...


―Ê inteiramente correto e absolutamente justo dizer que não se pode fazer coisa alguma
com filosofia. O único erro é acreditar que com esta frase o julgamento da filosofia
tenha chegado ao fim. Pois um pequeno epílogo emerge, sob a forma de uma outra
questão: se não se pode fazer coisa alguma com filosofia, será que a filosofia não
pode fazer algo naqueles que com ela se envolvem?‖ (Retirado de Heidegger,
Introdução a metafísica, grifo meu, apud em A filosofia, de Danilo Marcondes)

EXERCÍCIOS FILOSÓFICOS

1. (UEM – Inverno 2008) “Os antigos, ou melhor, os antiqüíssimos, (teólogos),


transmitiram por tradição a nós outros seus descendentes, na forma do mito, que
os astros são Deuses e que o divino abrange toda a natureza ... Costuma-se dizer
que os Deuses têm forma humana, ou se transformam em semelhantes a outros
seres viventes ... Porém, pondo-se de lado tudo o mais, e conservando-se o
essencial, isto é, se acreditou que as substâncias primeiras eram Deuses, poderia
pensar-se que isto foi dito por inspiração divina ...” (Aristóteles, Metafísica, XII, 8,
1074b, apud Mondolfo, O pensamento antigo, I, São Paulo: Mestre Jou, 1964, p.13).
Com base nesse excerto e no seu conhecimento sobre a questão da origem
da filosofia, assinale o que for correto.

01) Antes de fazerem filosofia, os gregos já indagavam sobre a origem e a formação


do universo; e as respostas a esse problema eram oferecidas sob a forma de mito, isto é,
por meio de uma narrativa alegórica que descreve a origem ou a condição de alguma
coisa, reportando a um passado imemorial.
02) Na Teogonia, Hesíodo descreve a gênese do mundo coincidindo com o
nascimento dos deuses; as forças e os domínios cósmicos não surgem como pura

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Filosofia 2016

natureza, mas sim como divindades: Gaia é a Terra, Urano é o Céu, Cronos é o Tempo,
aparecendo ora por segregação, ora pela intervenção de Eros, princípio que aproxima os
opostos.
04) Os primeiros filósofos gregos buscaram descobrir o princípio (arché) originário
de todas as coisas, o elemento ou a substância constitutiva do universo; elaborando uma
cosmologia, não se contentavam com doutrinas divinamente inspiradas, mas tentavam
compreender racionalmente o cosmo.
08) Os gregos foram pouco originais no exercício do pensamento crítico racional;
apropriaram-se das conquistas científicas e do patrimônio cultural de civilizações
orientais com mínimas alterações.
16) É tese hoje bastante aceita que o nascimento da filosofia na Grécia não foi um
―milagre‖ realizado por um povo privilegiado, mas a culminação de um processo lento,
tributário de um passado mítico, e influenciado por transformações políticas,
econômicas e sociais.
SOMA:_____

2. (Ueg 2013) O ser humano, desde sua origem, em sua existência cotidiana,
faz afirmações, nega, deseja, recusa e aprova coisas e pessoas, elaborando juízos de
fato e de valor por meio dos quais procura orientar seu comportamento teórico e
prático. Entretanto, houve um momento em sua evolução histórico-social em que o
ser humano começa a conferir um caráter filosófico às suas indagações e
perplexidades, questionando racionalmente suas crenças, valores e escolhas.
Nesse sentido, pode-se afirmar que a filosofia:
a) é algo inerente ao ser humano desde sua origem e que, por meio da elaboração dos
sentimentos, das percepções e dos anseios humanos, procura consolidar nossas crenças
e opiniões.
b) existe desde que existe o ser humano, não havendo um local ou uma época específica
para seu nascimento, o que nos autoriza a afirmar que mesmo a mentalidade mítica é
também filosófica e exige o trabalho da razão.
c) inicia sua investigação quando aceitamos os dogmas e as certezas cotidianas que nos
são impostos pela tradição e pela sociedade, visando educar o ser humano como
cidadão.
d) surge quando o ser humano começa a exigir provas e justificações racionais que
validam ou invalidam suas crenças, seus valores e suas práticas, em detrimento da
verdade revelada pela codificação mítica.

3. (Unb 2012) No início do século XX, estudiosos esforçaram-se em mostrar a


continuidade, na Grécia Antiga, entre mito e filosofia, opondo-se a teses anteriores,
que advogavam a descontinuidade entre ambos. A continuidade entre mito e
filosofia, no entanto, não foi entendida univocamente. Alguns estudiosos, como
Cornford e Jaeger, consideraram que as perguntas acerca da origem do mundo e
das coisas haviam sido respondidas pelos mitos e pela filosofia nascente, dado que
os primeiros filósofos haviam suprimido os aspectos antropomórficos e fantásticos

38
Filosofia 2016
dos mitos. Ainda no século XX, Vernant, mesmo aceitando certa continuidade entre
mito e filosofia, criticou seus predecessores, ao rejeitar a ideia de que a filosofia
apenas afirmava, de outra maneira, o mesmo que o mito. Assim, a discussão sobre
a especificidade da filosofia em relação ao mito foi retomada.
Considerando o breve histórico acima, concernente à relação entre o mito e a
filosofia nascente, assinale a opção que expressa, de forma mais adequada, essa
relação na Grécia Antiga.

a) O mito é a expressão mais acabada da religiosidade arcaica, e a filosofia


corresponde ao advento da razão liberada da religiosidade.
b) O mito é uma narrativa em que a origem do mundo é apresentada
imaginativamente, e a filosofia caracteriza-se como explicação racional que retoma
questões presentes no mito.
c) O mito fundamenta-se no rito, é infantil, pré-lógico e irracional, e a filosofia,
também fundamentada no rito, corresponde ao surgimento da razão na Grécia Antiga.
d) O mito descreve nascimentos sucessivos, incluída a origem do ser, e a filosofia
descreve a origem do ser a partir do dilema insuperável entre caos e medida.

4. (UEL, 2007) “Há, porém, algo de fundamentalmente novo na maneira como


os Gregos puseram a serviço do seu problema último - da origem e essência das
coisas - as observações empíricas que receberam do Oriente e enriqueceram com
as suas próprias, bem como no modo de submeter ao pensamento teórico e casual o
reino dos mitos, fundado na observação das realidades aparentes do mundo
sensível: os mitos sobre o nascimento do mundo.” (Fonte: JAEGER, W. Paidéia.
Tradução de Artur M. Parreira. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 197.)

Com base no texto e nos conhecimentos sobre a relação entre mito e filosofia
na Grécia, é correto afirmar:

a) Em que pese ser considerada como criação dos gregos, a filosofia se origina no
Oriente sob o influxo da religião e apenas posteriormente chega à Grécia.
b) A filosofia representa uma ruptura radical em relação aos mitos, representando
uma nova forma de pensamento plenamente racional desde as suas origens.
c) Apesar de ser pensamento racional, a filosofia se desvincula dos mitos de forma
gradual.
d) Filosofia e mito sempre mantiveram uma relação de interdependência, uma vez
que o pensamento filosófico necessita do mito para se expressar.
e) O mito já era filosofia, uma vez que buscava respostas para problemas que até
hoje são objeto da pesquisa filosófica.

5. (UEM-2009) Na Grécia arcaica, a geração da ordem do mundo é


apresentada por mitos que narram a genealogia e a ação de seres sobrenaturais. A
filosofia, com a escola jônica, caracteriza-se por explicar a origem do cosmos,
recorrendo a elementos ou a processos encontrados na natureza. Assinale o que for
correto.

39
Filosofia 2016

I) O mito é incapaz de instituir uma realidade social, pois seu caráter fantasioso nã o
possui credibilidade alguma para seus ouvintes.
II) A transformação de uma representação dominantemente mítica do mundo para
uma concepção filosófica expressa, entre os séculos VIII e VI a. C., na antiga Grécia,
uma mudança estrutural da sociedade.
III)Os filósofos da escola jônica realizaram uma ruptura definitiva entre a mitologia e
a filosofia; depois deles, não é possível encontrar, no pensamento filosófico, presença
alguma de mitos.
IV) O mito de Édipo, encontrado na tragédia de Sófocles, será aproveitado por
Sigmund Freud para explicar o complexo de édipo como causa de determinadas
neuroses.
V) Homero foi o primeiro historiador grego. Na Ilíada e na Odisseia, descreve o
comportamento de homens heroicos cujas ações não possuem mais componente
mitológico algum.
Estão corretas:
a) as alternativas I, II e III.
b) as alternativas I, III e V.
c) as alternativas II, IV e V.
d) as alternativas II e IV.
e) as alternativas I, II, III e V.

6. (Enem 2014) Compreende-se assim o alcance de uma reivindicação que


surge desde o nascimento da cidade na Grécia antiga: a redação das leis. Ao
escrevê-las, não se faz mais que assegurar-lhes permanência e fixidez. As leis
tornam-se bem comum, regra geral, suscetível de ser aplicada a todos da mesma
maneira. (VERNANT, J. P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1992, adaptado).

Para o autor, a reivindicação atendida na Grécia antiga, ainda vigente no


mundo contemporâneo, buscava garantir o seguinte princípio:

a)Isonomia — igualdade de tratamento aos cidadãos.


b)Transparência — acesso às informações governamentais.
c)Tripartição — separação entre os poderes políticos estatais.
d)Equiparação — igualdade de gênero na participação política.
e) Elegibilidade — permissão para candidatura aos cargos públicos.

7. (UEL- 2003) “Tales foi o iniciador da filosofia da physis, pois foi o primeiro
a afirmar a existência de um princípio originário único, causa de todas as coisas
que existem, sustentando que esse princípio é a água. Essa proposta é
importantíssima... podendo com boa dose de razão ser qualificada como a primeira
proposta filosófica daquilo que se costuma chamar civilização ocidental.” (REALE,

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Filosofia 2016
Giovanni. História da filosofia: Antiguidade e Idade Média. São Paulo: Paulus,
1990. p. 29.)
A filosofia surgiu na Grécia, no século VI a.C. Seus primeiros filósofos foram os
chamados pré-socráticos. De acordo com o texto, assinale a alternativa que
expressa o principal problema por eles investigado.
a) A ética, enquanto investigação racional do agir humano.
b) A estética, enquanto estudo sobre o belo na arte.
c) A epistemologia, como avaliação dos procedimentos científicos.
d) A cosmologia, como investigação acerca da origem e da ordem do mundo.
e) A filosofia política, enquanto análise do Estado e sua legislação.

8. (UEM – Inverno 2008, adaptada) Sócrates representa um marco importante


da história da filosofia; enquanto a filosofia pré-socrática se preocupava com o
conhecimento da natureza (physis), Sócrates procura o conhecimento indagando o
homem. Assinale o que for correto.
01) Sócrates, para não ser condenado à morte, negou, diante dos seus juízes, os
princípios éticos da sua filosofia.
02) Discípulo de Sócrates, Platão utilizou, como protagonista da maior parte de seus
diálogos, o seu mestre.
04) Sócrates utilizava o método dialético.
08) Tal como os sofistas, Sócrates costumava cobrar dinheiro pelos seus
ensinamentos.
16) Sócrates, ao afirmar que só sabia que nada sabia, queria, com isso, sinalizar a
necessidade de adotar uma nova atitude diante do conhecimento e apontar um novo
caminho para a sabedoria.

9. (UEM – Verão 2008) Os filósofos pré-socráticos tentaram explicar a


diversidade e a transitoriedade das coisas do universo, reduzindo tudo a um ou
mais princípios elementares, os quais seriam a verdadeira natureza ou ser de todas
as coisas. Assinale o que for correto.
01) Tales de Mileto, o primeiro filósofo segundo Aristóteles, teria afirmado ―tudo é
água‖, indicando, assim, um princípio material elementar, fundamento de toda a
realidade.
02) Heráclito de Éfeso interessou-se pelo dinamismo do universo. Afirmou que nada
permanece o mesmo, tudo muda; que a mudança é a passagem de um contrário ao outro
e que a luta e a harmonia dos contrários são o que gera e mantém todas as coisas.
04) Parmênides de Eléia afirmou que o ser não muda. Deduziu a imobilidade e a
unidade do ser do princípio de que ―o ser é‖ e ―o não-ser não é‖, elaborando uma
primeira formulação dos princípios lógicos da identidade e da não-contradição.
08) As teorias dos filósofos pré-socráticos foram pouco significativas para o
desenvolvimento da filosofia e da ciência, uma vez que os pré-socráticos sofreram

41
Filosofia 2016

influência do pensamento mítico, e de suas obras apenas restaram fragmentos e


comentários de autores posteriores.
16) Para Demócrito de Abdera, todo o cosmo se constitui de átomos, isto é, partículas
indivisíveis e invisíveis que, movendo-se e agregando-se no vácuo, formam todas as
coisas; geração e corrupção consistiriam, respectivamente, na agregação e na
desagregação dos átomos.

10. (Enem 2015) “A filosofia grega parece começar com uma ideia absurda,
com a proposição: a água é a origem e a matriz de todas as coisas. Será mesmo
necessário deter-nos nela e levá-la a sério? Sim, e por três razões: em primeiro
lugar, porque essa proposição enuncia algo sobre a origem das coisas, em segundo
lugar, porque o faz sem imagem e fabulação; e enfim, em terceiro lugar, porque
nela, embora apenas em estado de crisálida, está contido o pensamento: Tudo é
um.”

O que, de acordo com Nietzche, caracteriza o surgimento da filosofia entre os


gregos?
a) O impulso para transformar, mediante justificativas, os elementos sensíveis em
verdades racionais
b) O desejo de explicar, usando metáforas, a origem dos seres e das coisas
c) A necessidade de buscar, de forma racional, a causa primeira das coisas existentes
d) A ambição de expor, de maneira metódica, as diferenças entre as coisas
e) A tentativa de justificar, a partir de elementos empíricos, o que existe no real.

11. (UEL) “Mais que saber identificar a natureza das contribuições


substantivas dos primeiros filósofos é fundamental perceber a guinada de atitude
que representam. A proliferação de óticas que deixam de ser endossadas
acriticamente, por força da tradição ou da „imposição religiosa‟, é o que mais
merece ser destacado entre as propriedades que definem a filosoficidade”.
(OLIVA, Alberto; GUERREIRO, Mario. Pré-socráticos: a invenção da filosofia.
Campinas: Papirus, 2000. p. 24).

Assinale a alternativa que apresenta a “guinada de atitude” que o texto


afirma ter sido promovida pelos primeiros filósofos.

a) A aceitação acrítica das explicações tradicionais relativas aos acontecimentos


naturais.
b) A discussão crítica das ideias e posições, que podem ser modificadas ou
reformuladas.
c) A busca por uma verdade única e inquestionável, que pudesse substituir a verdade
imposta pela religião.
d) A confiança na tradição e na ―imposição religiosa‖ como fundamentos para o
conhecimento.
e) A desconfiança na capacidade da razão em virtude da ―proliferação de óticas‖

42
Filosofia 2016
conflitantes entre si.

12. (Unicamp 2013 - Primeira Fase) A sabedoria de Sócrates, filósofo ateniense


que viveu no século V a. C., encontra o seu ponto de partida na afirmação “sei que
nada sei”, registrada na obra Apologia de Sócrates. A frase foi uma resposta aos
que afirmavam que ele era o mais sábio dos homens. Após interrogar artesãos,
políticos e poetas, Sócrates chegou à conclusão de que ele se diferenciava dos
demais por reconhecer a sua própria ignorância. O “sei que nada sei” é um ponto
de partida para a Filosofia, pois

a) aquele que se reconhece como ignorante torna-se mais sábio por querer adquirir
conhecimentos.
b) é um exercício de humildade diante da cultura dos sábios do passado, uma vez que a
função da Filosofia era reproduzir os ensinamentos dos filósofos gregos.
c) a dúvida é uma condição para o aprendizado e a Filosofia é o saber que estabelece
verdades dogmáticas a partir de métodos rigorosos.
d) é uma forma de declarar ignorância e permanecer distante dos problemas concretos,
preocupando-se apenas com causas abstratas.

Unidade II
O QUE É RACIOCÍNIO LÓGICO?
O QUE É ARGUMENTAR?
COMO IDENTIFICAR ARGUMENTOS?
COMO IDENTIFICAR AS FALÁCIAS NO
DISCURSO?

INTRODUÇÃO
A lógica foi fundada por Aristóteles (384-322 a.c), na Grécia antiga. Foi
complementada pelos estoicos e muito sistematizada na idade média. Mas só no século
XIX e XX a lógica conheceu desenvolvimento revolucionário, tornando-se a mais exata
das disciplina do conhecimento. Os filósofos Gottlob Frege (1848-1925), Beltrand
Russell (1872-1970) foram alguns dos mais importantes criadores da lógica formal
contemporânea.
Mas porque estudar lógica? A razão é simples, pois no dia a dia em alguns
diálogos (orais e escritos) somos constantemente requisitados a ter quer dar as razões de
porque decidimos algo, ou somos chamados a explicar certas ações. Nem todas as
formas de diálogos têm por fim defender racionalmente um ponto de vista, uma teoria

43
Filosofia 2016

ou uma ideia (tese), pois temos outros tipos de diálogos que tem finalidades variadas.
Por exemplo, uma negociação tem por finalidade um ganho; um diálogo pedagógico
tem por fim ensino etc. Mas quando estamos em uma situação em que se quer defende
um ponto de vista, ou uma teoria, é necessário o uso de argumentação, isto é, apresentar
as razões que nos levaram a pensar que tal ponto de vista é correto. Ou, também
podemos estar num situação inversa, pois rejeitamos certo ponto de vista, pois cremos
ter razões para afirmar que ele está errado. Uma ideia, tese, ou teoria será tão boa
quanto for a qualidade do argumento que lhe apoia. Sendo assim, se quisermos pensar
claramente e debater questões de modo sério, temos que aprender algumas coisas
básicas para avaliarmos bons argumentos de maus argumentos.
Os aspectos mais gerais que estudaremos é:
1. Distinguir argumentos corretos e incorretos;
2. Explicar porque razão alguns argumentos são corretos e outros não;
3. Aprender a argumentar melhor;

Princípios lógicos

Uma das mais duradouras contribuições de Aristóteles foi o estabelecimento de


primeiros princípios que, por serem anteriores ao raciocínio, servem de base a todos os
argumentos. São eles o princípio de identidade, o princípio de não-contradição e o
princípio do terceiro excluído.
O princípio de identidade diz que algo é igual a si mesmo, ou seja, a=a. Ex.:
(b) Um copo é igual a ele mesmo. (c) Um é igual a um (1=1).
O princípio de não-contradição que algo não pode ser e não ser ao mesmo, ou
seja, que não é possível afirmar e negar simultaneamente a mesma coisa. Por exemplo:
Não posso dizer que (d) ―A neve é branca e a neve não é branca‖ ao mesmo tempo.
E, finalmente, o princípio do terceiro excluído diz que ou uma proposição é
falsa ou ela é verdadeira, e, portanto não existe uma terceira possibilidade. Se uma
proposição é verdadeira, entende-se também que ela não é falsa e não pode ser outra.

a) O QUE É ARGUMENTAR?
Argumentar é defender uma ideia com razões, assim tanto as razões quanto as
próprias ideais que forma nosso argumento, são proposições.
 Uma proposição é o pensamento que uma sentença declarativa exprime

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Filosofia 2016
literalmente.
Somente as sentença declarativas podem exprimir proposições. As frases
interrogativas, exclamativas, prescritivas e promessas não exprimem proposição
alguma. As frases seguintes são exemplos:
1. Feche a porta!
2. Será que há água em marte?
3. Quem me dera ter boas notas em filosofia!
4. Prometo que te devolvo o dinheiro amanha!
As sentenças imperativas, interrogativas e exclamativas, assim como as
promessas, não exprimem proposição porque não carregam pensamentos que tenha
valor de verdade, isto é, elas não podem ser verdadeiras ou falsas, podem ser
cumpridas ou não, seguidas ou não, e respondidas. Pois se quer faz sentido dizer que
uma pergunta, por exemplo, é falsa. Podemos dizer então que, todo e qualquer
argumento terá como elemento básico proposições, que irão desempenhar o papel de
premissas e conclusão.

2. PREMISSAS E CONCLUSÃO.
Podemos compreender o que é argumentar vendo o seguinte exemplo:
JOÃO – Este quadro é horrível! É só traços e cores! Até eu fazia isso!
ADRIANA – Concordo que não é muito bonito, mas nem toda a arte tem de se bela.
JOÃO – Não sei … Por que razão diz isso?
ADRIANA – Porque nem tudo o que os artistas fazem é belo.
JOÃO – E dai? É claro que nem tudo que eles fazem é belo, mas disso se não se segue
nada.
ADRIANA – Claro que se segue! Dado que tudo que os artistas fazem é arte, segue-se
que nem toda a arte tem de ser bela.

O que podemos identificar nesse pequeno diálogo é que Adriana argumentou que
nem toda arte é bela. Esse é um caso claro de alguém defendendo uma ideia com base e
algumas razões, essas razões em lógica tem o nome de premissas.
Um argumento é um conjunto de proposições, em que se pretende que a
conclusão, seja apoiada por outras proposições (as premissas). Podemos perceber isso
melhor, organizando as premissas e a conclusão da seguinte forma:
PREMISSA 1: Nem tudo o que os artistas fazem é belo.

45
Filosofia 2016

PREMISSA 2: Tudo o que os artistas fazem é arte.


CONCLUSÃO: Nem toda arte é bela.

Temos aqui um argumento composto de duas premissas. Mas poderia ser só uma
premissa. A condição mínima para considerarmos algo um argumento é ter aunemos
uma premissa e uma conclusão servindo como suporte para uma inferência. Se apenas
nos limitarmos a apresentar ideias sem apresentar as nossas razões para defender a tal,
não estamos a defender racionalmente nada. Quando nós passamos de premissas para
conclusão, estamos dando um passo inferencial, estamos propriamente a raciocinar.

3. AVALIANDO OS ARGUMENTOS DE UM PONTO DE VISTA LÓGICO


1. Da distinção validade/verdade
Em lógica chamamos válido o argumento que tem uma certa estrutura (FORMA
LÓGICA), o qual lhe faz um bom preservador de verdade, independente do seu
conteúdo (premissa verdadeira ou falsas). O termo validade se aplica somente a
argumentos. De um ponto de vista lógico, argumentos não podem ser verdadeiros ou
falsos, isso é uma propriamente somente das proposições, as quais como temos visto,
têm valor de verdade.
A definição de validade para argumentos dedutivos é a seguinte; Dada a verdade das
premissas, é necessário a verdade da conclusão. Ou, também, dada a verdade das
premissas é impossível a falsidade da conclusão.
Exemplo:
P1 Todo gato é mamífero
P2 Miau é um gato
Miau é mamífero

Esse argumento é valido pois sua FORMA LOGICA é:


P1 Todo A é B
P2 c é A
Logo c é B.
Dizer que um argumento é valido significa dizer que ele preserva a verdade das
premissas, se e somente se, as premissas forem verdadeiras. Em um argumento
dedutivamente válido, não é difícil perceber que, não tem possibilidade de chegarmos a
46
Filosofia 2016
uma conclusão falsa se as premissas forem verdadeiras. E se encontrarmos um
argumento que tenha uma forma lógica tal que admita a possibilidade de ter premissas
verdadeiras e conclusão falsa? Aí temos um caso de argumento inválido. Vejamos o
exemplo:

P1 Se eu me formar, é porque estudei muito.


P2 Eu estudei muito.
Portanto, Vou me formar

Mas por qual razão esse argumento é invalido? Pois a forma lógica do
argumento não é imune a possibilidade de ter premissas verdadeiras, e mesmo assim,
conclusão falsa. É bem fácil pesar uma situação em que ambas as premissas seja
verdadeiras, mas a conclusão falsa. Podo ser o caso de ser estudar muito, mas não se
formar. O que deve ficar entendido é que, mesmo que sejam verdadeiras as duas
premissas, dada a estrutura desse argumento, sua conclusão não se segue, e por isso o
argumento é invalido.
4. AVALIANDO ARGUMENTO

Podemos avaliar um argumento sob dois aspectos, o primeiro nós já vimos, que
podemos chamar de aspecto formal, isto é, saber se um argumento é valido ou não. Mas
quando nos perguntamos quanto a verdade ou não das premissas, estamos a olhar para o
aspecto material do argumento. As possibilidades são duas, ou o argumento é correto ou
incorreto, se for correto, então ele além de ser válido, tem as premissas verdadeiras.

Exemplo:
P1 Se a água do mar é salgada, então não beberei.
P2 A água do mar é salgado
Logo, não beberei.

Já o exemplo a seguir é incorreto:


P1 Todo marciano é cor de rosa
P2 Rafael é um marciano
Portanto, Rafael é cor de rosa.
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Filosofia 2016

De um ponto de vista formal, esse argumento é válido, sua forma garante a


preservação de verdade, porém é incorreto, pois suas premissas são falsas (até onde
sabemos existem marcianos). Mas podemos ter argumentos invalido com premissas
verdadeiras. Nesse caso ele também é incorreto.

QUESTÕES DE REVISÃO: O que é um argumento? Um argumento pode ser falso?


Uma proposição pode ser valida? Um argumento de premissas falsas mas valido é
avaliado como?

5. TIPOS DE ARGUMENTOS
DEDUTIVOS INDUTIVOS

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Filosofia 2016
- a conclusão é verdadeira ou falsa a partir - a conclusão tem maior ou menor
das premissas; possibilidade de ser verdadeira, dadas as
- é impossível ter uma conclusão falsa a premissas;
partir de premissas verdadeiras; - a conclusão tem mais informações que as
- o argumento pode ser válido ou não- premissas;
válido, independentemente da - generalizações, previsões.
verdade/falsidade das proposições). Ex.:
Ex:

Pratique!
Indique se os argumentos são dedutivos ou indutivos:

1. Você não pode descontar este cheque porque hoje é dia 1o de agosto e o cheque
está datado de 15 de julho e todo o cheque perde a validade depois de 30 dias.

2. Nos últimos cem sorteios da Loteria X o número 13 saiu uma só vez. Ora, você
não vai ser sorteado, já que você concorre com o número 13.

3. Não há registros ou indícios de que o candidato Y tenha se envolvido em


episódios de corrupção. Portanto, o candidato Y não é corrupto.

4. Todas as sentenças que expressam proposições verdadeiras são construídas com


pelo menos um adjetivo e dois advérbios. Dessa forma, a sentença S não pode ser
verdadeira, porque ela não tem nenhum advérbio.

5. Quase todas as sentenças que expressam proposições verdadeiras são


construídas com pelo menos um adjetivo e dois advérbios. Dessa forma, a sentença S
não pode ser verdadeira, porque ela não tem nenhum advérbio.

6. Todas as palavras proparoxítonas devem ser acentuadas em língua portuguesa. A


palavra "fósforo" é proparoxítona. Portanto, a palavra "fósforo" deve ser acentuada.

LÓGICA ARISTOTÉLICA ou SILOGÍSTICA

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Filosofia 2016

b) Tipo especial de argumento: SILOGISMO = duas premissas e uma conclusão;


c) Só um tipo de proposição: Proposições categóricas;
d) Exemplo:

Todos os lógicos são chatos


Alguns lógicos são filósofos
Portanto, alguns filósofos são chatos.

PROPOSIÇÕES CATEGÓRICAS

A - Universal Afirmativa: Todos os lógicos são chatos.


E - Universal Negativa: Nenhum lógico é chato / Todos os lógicos não são
chatos.
I - Particular Afirmativa: Alguns lógicos são chatos.
O - Particular Negativa: Alguns lógicos não são chatos.

Atenção!
2. A proposição ―Todos os lógicos são chatos‖ não implica a existência de
lógicos. Diz apenas que, se eles existirem, eles são chatos.
3. A proposição ―Alguns filósofos são lógicos‖ não necessariamente descarta
o fato de que todos os filósofos sejam lógicos. Se alguns filósofos forem
lógicos, pode ainda assim ser o caso que, na verdade, todos os filósofos
tenham essa característica.
4. A quantidade da proposição categórica nem sempre é expressa por ―Todo‖
e ―Algum‖. Às vezes sinônimos aparecem. Fique atento para as expressões
―A maior parte‖ ―a minoria‖, e similares: todas essas expressões estão
falando de uma parte, portanto de Alguns!

PRATIQUE!
7. Com relação às seguintes proposições categóricas, indique sua quantidade e sua

50
Filosofia 2016
qualidade:

a) É sempre errado tirar a vida de alguém.


b) Algumas guerras foram necessárias.
c) As leis morais não são objetivamente válidas.
d) Cada pessoa sabe o que é bom para si.
e) Existem males que vêm para o bem.

8. O que NÃO se pode afirmar em conjunto com a seguinte afirmação, ―Existem


males que vem para o bem‖:

a) Todo mal vem para o bem;


b) é falso que alguns males vêm para o bem;
c) pelo menos um mal vem para o bem;
d) a maioria dos males vem para o bem.

É o termo que se repete nas duas premissas. Sua função é mediar, relacionar, as
outras duas classes que formam o silogismo: assim ocorre a eliminação do termo médio
na conclusão:
Todos os homens são mortais.
Todos os gregos são homens.
Todos os gregos são mortais.

Quadrado de oposições

A silogística não apenas é capaz de indicar que conclusão se pode tirar de um par
de premissas sob certas condições, como também é capaz de indicar outras relações
lógicas que as proposições categóricas mantêm entre si. Isso pode ser apresentado no
quadrado de oposições:

Todo A é Nenhum A
B éB

Algum A é Algum A
B não é B
Cada uma das arestas desse quadrado – seus lados e suas diagonais – representa

51
Filosofia 2016

uma relação que duas proposições categóricas, que compartilham seus termos para
classe, mantêm entre si.

Relação de Contraditoriedade: É a relação representada pelas proposições das


diagonais. Significa que as duas proposições não podem ter o mesmo valor de verdade.
(quando uma é verdadeira, a outra é falsa, e vice-versa).

Relação de Contrariedade: É a relação representada pelo lado superior do


quadrado. Significa que as duas proposições não podem ser ambas verdadeiras, ainda
que possam ser ambas falsas.

Relação de Subcontrariedade: É a relação representada pelo lado inferior do


quadrado. Significa que as duas proposições não podem ser ambas falsas, ainda que
possam ser ambas verdadeiras.

Relação de Subalternidade: É a relação representada pelos lados laterais do


quadrado. Significa que quando a proposição universal da relação é verdadeira, a
proposição particular é verdadeira também. Já quando a particular é falsa, a universal
também é falsa.

LÓGICA INFORMAL
Na lógica dedutiva, as premissas eram OU verdadeiras OU falsas (disjunção
exclusiva). Na lógica não-dedutiva, muitas vezes não conseguimos determinar o valor
de verdade das proposições. Às vezes, podemos determinar somente a plausibilidade
das premissas ou certo grau de verdade, por exemplo: A população do mundo crescerá
de 6 para 9 bilhões nos próximos 15 anos. Se pretendemos fornecer alimentos para
todos, nós precisamos de uma maneira de fornecer comida para um adicional de 3
bilhões de pessoas.

―O papel do vice presidente é o de apoiar as políticas do presidente,


concordando ou não com elas, porque "ninguém quer fazer gols na própria
baliza" (George W. Bush)

Destacamos duas premissas, uma de cada argumento anterior.


―A população do mundo crescerá de 6 para 9 bilhões nos próximos 15 anos.‖

52
Filosofia 2016
―Um governo é como um time de futebol.‖
É possível determinar inequivocamente o valor de verdades dessas premissas?
Assim, a Lógica Informal tem como objetivos:

• Estudo dos argumentos que ocorrem na linguagem natural, em áreas como


política, direito, publicidade, jornalismo, etc.
• Estudo dos aspectos não-formais da argumentação, por exemplo, o nível de
persuasão de argumentos.
• Exame crítico das nossas crenças e das nossas decisões

Uma das áreas mais importantes da Lógica Informal é a detecção de falácias. A


seguir, apresentamos algumas das falácias mais recorrentes nos contextos cotidianos de
argumentação:

O QUE É UMA FALÁCIA?

Falácias são argumentos em que as razões apresentadas parecem sustentar a


conclusão, mas na realidade, não o fazem.

1. Falso dilema: ocorre quando alguém apresenta uma situação com apenas duas
alternativas, quando existem outras possíveis
 Ou concorda comigo ou não.
 Ou vota no João ou teremos uma desgraça.
 Ou uma pessoa é boa ou é má.

2. Derrapagem (Bola de Neve): O argumento extrai consequências inaceitáveis de p, e


consequências de consequências, e assim por diante.
 Se aprovarmos leis contra armas automáticas, não demorará muito até
aprovarmos leis contra todas as armas, e então começaremos a restringir todos os
nossos direitos. Acabaremos por viver num estado totalitário. Portanto não
devemos banir as armas automáticas.

3. Apelo à força: o argumentador utiliza recurso à força ou privilégio para justificar sua
tese.
 É melhor admitires que a nova orientação da empresa é a melhor - se pretendes

53
Filosofia 2016

manter o emprego.

4. Apelo à piedade: Pede-se aprovação do debatedor com base no estado lastimoso do


autor.
 Esperamos que aceite as nossas recomendações. Passamos os últimos três meses
trabalhando sem descanso nesse relatório

5. Apelo ao povo: a proposição é verdadeira por ser aceita por parte representativa da
população.
 As sondagens sugerem que os liberais vão ter a maioria no parlamento, também
deve votar neles.
 Todo mundo sabe que a Terra é plana. Então por que razão insiste nas suas
excêntricas teorias?

6. Ataques pessoais: Ataca-se a pessoa que apresenta o argumento e não as suas razões
ou evidências, ou o suposto interesse dela naquele tópico.
 É natural que o ministro diga que essa política fiscal é boa porque ele não será
atingido por ela
 Podemos passar por alto as afirmações de Simplício porque ele é patrocinado
pela indústria da madeira
7. Apelo à autoridade: O argumentador baseia-se na autoridade de outrem para
justificar sua conclusão. Especialmente se:
1. A pessoa não está qualificada para ter uma opinião de perito no assunto.
2. Não há acordo entre os peritos do campo em questão.
3. A autoridade não pode, por algum motivo ser levada a sério — porque estava
brincando, estava ébria ou por qualquer outro motivo.
 O famoso psicólogo Dr. João Silva recomenda que compre o último modelo de
carro da Skoda.

8. Estilo sem substância: Pretende-se que o modo como o argumentador ou argumento


apresentam-se contribuem para a verdade da conclusão.
 Nixon perdeu o debate presidencial porque tinha suor na testa.
 Por que não aceitas o conselho daquele jovem elegante e bem apessoado?

9. Falsa analogia: ocorre quando as diferenças entre A e B (os objetos comparados)

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Filosofia 2016
extrapolam as suas semelhanças.
 Empregados são como pregos. Temos de martelar a cabeça dos pregos para estes
desempenharem suas funções. O mesmo deve ser feito aos empregados.

10. Depois disso, por causa disso: Presumir que por se seguirem temporalmente, uma
coisa causou a outra.
 Tomei o remédio para gripe e logo fiquei com coceira.
 Saí de casa sem guarda-chuva, e logo começou a chover.

11. Petição de princípio: O argumentador justifica a tese partindo da ideia de que ela é
verdadeira.
 Dado que não estou a mentir, estou dizendo a verdade.
 Deus existe, porque está escrito na Bíblia, e Deus escreveu a Bíblia.

12. Espantalho: O argumentador atribui à posição oposta ideias reprováveis ou fracas.


 As feministas querem colocar as mulheres contra os homens. Logo, o feminismo
deve ser abolido.

13. Generalização apressada/ falsa indução: Atribui-se uma regra específica ao caso
genérico.
 Meus amigos são mais fortes que minhas amigas. Portanto, homens são mais
fortes que mulheres.

14. Falácia do jogador: Probabilidades valem a cada evento/jogada. O resultado de um


jogo de azar, por exemplo, não é efetivamente afetado pelo resultado dos jogos
anteriores.
 Como um raio caiu sobre minha casa, há menos chances de um raio cair sobre
ela nas próximas tempestades.

15. Afirmação do consequente (e conclusão do antecedente):


 Se a energia estiver desligada, a luz não acenderá. A luz não se acendeu.
Portanto, a energia está desligada.

16. Falácia genética: De uma coisa, B, que tem origem em outra coisa, A, supõe-se que
todas as propriedades de A também são possuídas por B. Falácia comum aos discursos
políticos e religiosos, por exemplo.

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Filosofia 2016

 Fulano não é confiável, pois é filho de pais desonestos.

EXERCÍCIOS
9. Se for verdade que “é possível fazer ensaios em pequenos grupos de 20
alunos”, então a afirmação de que

I – ―É necessário fazer ensaios em pequenos grupos de 20 alunos‖ é verdadeira.


II – ―É impossível fazer ensaios em pequenos grupos de 20 alunos‖ é falsa.
III – ―Fizeram-se ensaios em pequenos grupos de 20 alunos‖ pode ser falsa.

Está(ão) correta(s):
a) I
b) II
c) III
d) I e II
e) II e III

10. O conector “mas” corresponde à operação lógica de __________________.


Se a oração “Os estudantes brasileiros são os piores nos rankings internacionais”
for verdadeira e a oração “Mais de 90% dos professores e pais aprovam as escolas”
for falsa, então a frase “Os estudantes brasileiros são os piores nos rankings
internacionais, mas mais de 90% dos professores e pais aprovam as escolas” é
__________________.
Assinale a alternativa que completa corretamente as lacunas.

 Conjunção – falsa
 Disjunção – falsa
 Negação – falsa
 Disjunção – verdadeira
 Conjunção - verdadeira

11. UFSM 2009 – Se for verdade que “Toda população natural tem um limite
no crescimento populacional”, então é

I – falso que ―Alguma população natural não tem um limite no crescimento


populacional‖
II – falso que ―Nenhuma população natural tem um limite no crescimento populacional‖
III – verdadeiro que ―A população dos seres humanos não tem um limite no crescimento
populacional‖
Está(ão) correta(s):
a) I
b) II
c) III

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Filosofia 2016
d) I e II
e) II e III

12. O enunciado “Julgava que a minha vida no campo era boa, mas agora vejo
que, afinal, vivo na penúria” pode ser assim reescrito: “Julgava que p, mas agora
julgo que q”. Nessa nova formulação,

( ) p e q são símbolos para nomes


( ) p e q são símbolos para proposições
( ) o verbo :‖julgar‖ indica uma operação cognitiva
Coloque verdadeira (V) ou (F) em cada proposição e assinale a sequência correta:

a) V – V – V
b) F – V – V
c) F – F – V
d) F – F – F
e) V – V – F

13. Todo lugar intocado pelo ser humano é um lugar selvagem. Nenhum jardim
botânico é um lugar intocado pelo ser humano. Portanto, nenhum jardim botânico
é um lugar selvagem. O termo médio desse silogismo é _________________, e a
negação (oposta contraditória) de “Todo A é B” é _________________.

Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas.

a) Lugar intocado pelo ser humano – nenhum A é B


b) Lugar selvagem – nenhum A é B
c) Jardim botânico – nenhum A é B
d) Lugar selvagem – algum A não é B
e) Lugar intocado pelo ser humano – algum A não é B

14. “Há os que tentam justificá-la [a presença de crucifixos em espaços


públicos] recorrendo ao argumento de que a maioria da população é cristã (...) a
maioria dos brasileiros, asseveram as pesquisas, é flamenguista ou gloriosamente
corinthiana; a ninguém, contudo, ocorreria valer-se dessa constatação para propor
que se ornem as paredes dos tribunais com flâmulas desses dois clubes. Maiorias
não definem a decoração de paredes publicas. De resto, nem todos os cristãos são
entusiastas do crucifixo. Algumas denominações protestantes o consideram um
caso acabado de idolatria, pecado cuja prática meus ancestrais judeus puniam com
o apedrejamento até a morte.”Hélio Schwartsman, 13/08/2009, “Crucifixos na
Berlinda

Considere as seguintes afirmações:

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Filosofia 2016

I – o argumento criticado pelo autor é um exemplo de falácia de apelo à força


II – o autor recorre a uma analogia para criticar o argumento
III – o autor critica a validade do argumento e questiona a verdade de suas premissas.

Está(ão) correta(s):
a) I
b) II
c) I e III
d) II e III
e) I, II e III

15. “Permitir a todos os homens uma liberdade ilimitada de expressa deve ser
sempre, de um modo geral, vantajoso para o Estado; pois é altamente propício aos
interesses da comunidade que cada indivíduo desfrute de liberdade, perfeitamente
ilimitada, para expressar seus sentimentos”. In: Filosofando. Maria L. de A. Aranha
e Maria H. P. Martins. Ed. Moderna

O texto acima é um famoso exemplo de raciocínio incorreto, também conhecido


como falácia não-formal. Nesse caso, a falácia é do tipo:

a) Argumento contra o homem


b) Ignorância da questão
c) Petição de principio
d) Argumento de autoridade
e) De acidente

16. Considere as seguintes afirmações:


I. O argumento cuja única premissa é "Para alguns povos, a revolução técnico-científica
não trouxe nenhum benefício" e cuja conclusão é "Para os povos africanos, a revolução
técnico-científica não trouxe nenhum benefício" é um argumento válido.
II. Se "Para alguns povos, a revolução técnico-científica não trouxe nenhum benefício"
for verdadeira, então "Para nenhum povo, a revolução técnico-científica não trouxe
nenhum benefício" também é verdadeira
III. Se "Ao contrário, aprofundou a diferença entre as classes sociais" for verdadeira,
então "Minimizou a diferença entre as classes sociais" é falsa.

Está(ão) correta(s):
a) apenas II.
b) apenas III
c) apenas I e II.
d) apenas I e III
e) I, II e III.

17. A boa notícia é que nossa capacidade de inovar é tão ilimitada quanto nosso
apetite. A ciência resolverá o problema da fome. Se a capacidade ilimitada de
inovação da ciência é conclusão de um argumento cujas premissas descrevem a

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Filosofia 2016
história do desenvolvimento da ciência, o argumento em questão é do tipo _____, e
a conclusão é ______ face às premissas.

Completam as lacunas, respectivamente:

a) dedutivo - necessária.
b) dedutivo - provável.
c) analógico - provável.
d) indutivo - provável.
e) indutivo - necessária.

18. Mas o que há de particularmente mau em silenciar a expressão de uma


opinião é o roubo à raça humana - à posteridade, bem como à geração existente,
mais aos que discordam de tal opinião do que aos que a mantêm. Se a opinião é
correta, privam-nos da oportunidade de trocar o erro pela verdade; se errada,
perdem, o que importa em benefício quase tão grande, a percepção mais clara da
verdade, produzida por sua colisão com o erro. A liberdade, de John Stuart Mill.

Considere as seguintes afirmações:

I. Aquele que recebe uma opinião é mais prejudicado do que aquele que a emite.
II. Uma opinião é errada somente se é contrastada com uma opinião correta.
III. As afirmações condicionais desse trecho não se contradizem.

Está(ão) correta(s):
a) apenas I.
b) apenas 11.
c) apenas III.
d) apenas I e II.

19. Uma questão apresenta uma definição de alucinógeno como substância que
modifica qualitativamente a atividade do cérebro, causando confusão mental e
alucinação. A seguir, é nomeada uma dessas drogas, o artane, dizendo ser uma
droga antícoiinérgica, com ação alucinógena. De acordo com as teorias do
silogismo e das definições, pode-se afirmar que:

I. Modificar qualitativamente a atividade do cérebro é um atributo acidental do


alucinógeno.
II. A frase, o artane é uma droga anticolinérgica é uma proposição singular afirmativa.
III. Anticolinérgico é uma espécie do gênero droga.

Está(ão) correta(s) a(s) alternativa(s):


a) apenas I.

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Filosofia 2016

b) apenas II
c) apenas III
d) apenas I e II
e) apenas I e III

20. Em um argumento dedutivamente válido, não é possível as premissas serem


verdadeiras e a conclusão ser falsa. Portanto:

a) é impossível que um argumento válido tenha conclusão falsa.


b) é impossível que um argumento válido tenha uma premissa falsa.
c) é necessário que um argumento válido tenha conclusão verdadeira.
d) é necessário que um argumento válido tenha premissas verdadeiras,
e) se um argumento válido tem uma conclusão falsa, ao menos uma das premissas tem
de ser falsa.

21. A água virtual é o volume necessário para produzir alimentos ou outros


produtos, que dessa forma está basicamente inserida nos itens. Um quilo de trigo,
por exemplo, exige cerca de mil litros de água para ser produzido, de forma que
cada quilo contém esse volume. Scientific Amerícan Brasií, setembro de 2008, p. 66.

Assinale a alternativa que preenche, corretamente, as lacunas, dando sentido ao texto.


Nesse texto, propõe-se uma _______ água virtual, que é ________.

a) hipótese sobre a - verdadeira.


b) definição de - verdadeira.
c) hipótese sobre a - convencional.
d) definição de - convencional.
e) hipótese sobre a - falsa.

22. Considere o seguinte enunciado: Se João e Maria foram ao cinema hoje,


então voltarão para casa um pouco mais tarde. Qual das alternativas a seguir
contém um enunciado logicamente equivalente a esse?

a) João e Maria foram ao cinema hoje e voltarão para casa um pouco mais tarde.
b) João e Maria foram ao cinema hoje e não voltarão para casa um pouco mais tarde.
c) João e Maria não foram ao cinema hoje ou voltarão para casa um pouco mais tarde.
d) João e Maria não foram ao cinema hoje ou não voltarão para casa um pouco mais
tarde.
e) João e Maria não foram ao cinema hoje nem voltarão para casa um pouco mais tarde.

23. Não se deve aguar muito uma planta, porque o excesso de água pode matá-
la. A premissa desse argumento é um juízo de _______, e a conclusão desse
argumento é um juízo de_______. O argumento é_______.

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Filosofia 2016
Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas.

a) fato - valor - verdadeiro ou falso.


b) fato - valor - válido ou inválido.
c) valor - fato - verdadeiro ou falso.
d) valor - fato - válido ou inválido.
e) fato - fato - verdadeiro ou falso.

24. Carl Sagan relata a seguinte história a respeito dos clorofluorcarbonetos


(CFCs), que destroem a camada de ozônio que nos protege da luz ultravioleta
emitida pelo Sol:
"A Du Pont, que vendia CFCs num montante de 600 milhões de dólares por ano,
tirou seus anúncios dos jornais e revistas científicas e declarou perante comissões do
Congresso que o perigo dos CFCs para a camada de ozônio não estava provado, fora
muito exagerado ou era baseado em raciocínio científico defeituoso."

Considere, assim as afirmações:


I. Se algo não está provado, então é falso.
II. Se algo é falso, então não pode ser provado.
IIL Se o perigo de algo for muito exagerado, então não representa perigo algum.

Está(ão) correta(s):

a) apenas I.
b) apenas II..
c) apenas III.
d) apenas I e II.
e) apenas II e III.

25. Considere a seguinte afirmação: Em uma economia capitalista, a produção


de bens materiais é realizada principalmente por empresas privadas.
Qual das alternativas é uma consequência lógica dessa afirmação?

a) Em uma economia capitalista, os bens materiais devem ser produzidos apenas por
empresas privadas.
b) Em uma economia capitalista, os bens não materiais não são produzidos por
empresas privadas.
c) Em uma economia não capitalista, os bens materiais não podem ser produzidos por
empresas privadas.
d) Em uma economia não capitalista, empresas privadas produzem bens não materiais.
e) Em uma economia capitalista, há empresas privadas.
26. Se for argumentado que um jardim botânico é belo, por que cada uma das
suas plantas é bela, comete-se erro lógico denominado;

a) apelo à autoridade.

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Filosofia 2016

b) falácia da divisão.
c) apelo à emoção.
d) falácia da composição,
e) falso dilema.

27. UFSM PS2 2014 - Na vida comum, pode haver erros de deliberação ou
raciocínio prático. Esses erros costumam levar a julgamentos e ações erradas.
Alguns erros de raciocínio lógico têm também uma dimensão moral, como a falácia
do apelo à autoridade, que frequentemente está na base de abusos de autoridade e
algumas formas de diferenciação social injustas. Qual dos argumentos a seguir
comete a falácia do apelo à autoridade?

a) O professor Antônio Lavoisier afirmou que sódio é um metal que faz parte da
composição do sal de cozinha. Pode-se concluir que isso é verdade, pois esse professor
é um especialista em química.
b) O professor Antônio Lavoisier analisou amostras de sal de cozinha comum nos
laboratórios de Química da UFSM e concluiu que essa substância é composta
principalmente por cloreto de sódio.
c) Se uma amostra do sal de cozinha comum, ao ser analisada em laboratórios de
Química, mostrar não conter sódio, pode-se concluir que o sal de cozinha comum não é
composto principalmente por cloreto de sódio.
d) Segundo especialistas ligados ao Ministério da Saúde, o consumo excessivo de sal é
prejudicial à saúde. Logo, é recomendável que o consumo excessivo dessa substância
seja evitado.
e) Se todos comem sal regularmente, então se pode concluir que não faz mal à saúde.

Unidade III

62
Filosofia 2016

O QUE É A LINGUAGEM?
Será a linguagem aquilo que nos faz ser e define o que somos?

―De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos?‖, de Paul Gauguin

Os homens e os animais: É uma coisa bastante notável que não haja homens tão
embrutecidos e tão estúpidos, sem excluir mesmo os insanos, que não sejam capazes de
arranjar conjuntamente diversas palavras, e de compô-las num discurso pelo qual façam
entender seus pensamentos, e que, ao contrário, não exista outro animal, por mais
perfeito e bem concebido que possa ser, que faça o mesmo. E isso não se dá porque lhes
faltem órgãos, pois verificamos que as pegas e os papagaios podem proferir palavras
assim como nós, e, todavia, não podem falar como nós, isto é, testemunhando que
pensam o que dizem. Por outro lado, os homens que, tendo nascido surdos e mudos, são
desprovidos dos órgãos que servem aos demais a falar, tanto ou mais que os animais
costumam inventar eles próprios alguns símbolos pelos quais se fazem entender por
quem, estando comumente com eles, disponha de tempo para aprender a sua língua. E
isso não demonstra apenas que os animais possuem menos razão que do que os homens,
mas que não a possuem absolutamente. Vemos que é preciso muito pouco para saber
falar; e já que se nota desigualdade entre os animais de mesma espécie, assim como
entre os homens, e que uns são mais fáceis de serem adestrados do que outros, não é
crível que um macaco ou um papagaio, por mais perfeito que fossem, em sua espécie,
não igualassem uma criança das mais estúpidas ou pelo o menos que tivesse o cérebro
perturbado, se sua alma não fosse de uma natureza inteiramente diferente da nossa.
(DESCARTES, René. Discurso do método)

63
Filosofia 2016

A linguagem é um dos elementos fundamentais ao processo do conhecimento.


Somos dotados dessa capacidade e a desenvolvemos ao longo da vida, a fim de
expressarmos nossos sentimentos, emoções, sensações e pensamentos, bem como
facilita a comunicação com outras pessoas por meio de diferentes signos, ou seja,
imagens, escrita, sons e gestos. Desde o princípio, a filosofia preocupou -se em
questionar sobre a linguagem, a saber, sobre sua origem e complexidade.

A origem da linguagem: Deve-se acreditar que as primeiras palavras utilizadas pelos


homens tiveram em seu espírito significação muito mais extensa do que aquela que
possuem nas línguas já formadas e que, ignorando a divisão do discurso em suas partes
constitutivas, os homens, a princípio, deram a cada palavra o sentido de uma proposição
inteira. Quando começaram a distinguir o sujeito do atributo e o verbo do substantivo, o
que não representou pequeno esforço de espírito, os substantivos não foram de início
senão outros tantos nomes próprios, o presente do infinitivo foi o único tempo dos
verbos, e, quanto aos adjetivos, a noção só se desenvolveu com muitas distrações,
operações penosas e pouco naturais.
Cada objeto, a princípio, recebeu um nome particular, sem levar em consideração
os gêneros e as espécies, que esses primeiros instituidores não estavam em condições de
distinguir – todos os indivíduos se apresentaram isolados a seu espírito como o são no
quadro da natureza. Se um carvalho se chamava A, um outro chamava-se B, pois a
primeira ideia que se tem de duas coisas é que não são a mesma coisa e, frequentemente,
necessita-se de muito tempo para observar o que possuem de comum; eis que quanto
mais se limitavam os conhecimentos mais extenso se tornava o dicionário. A confusão de
toda esta nomenclatura não pôde resolver-se com facilidade, pois, para classificar os
seres sob denominações comuns e genéricas, precisavam-se conhecer as propriedades e
as diferenças, eram necessárias observações e definições, isto é, a história natural e a
metafísica, muito mais do que aquilo com que os homens desse tempo poderiam contar.
(ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade
entre os homens)

Afinal de contas, a linguagem é inata ou adquirida pela experiência? É um modo


adequado para a comunicação e para expressarmos nossos pensamentos, ou apenas um
jogo de significações para facilitar a compreensão sobre o mundo em que vivemos?

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Filosofia 2016
O que você acha?

Segundo Aristóteles, o ser humano é um ser de linguagem. Ele chegou a dizer


que o que nos torna humanos, é a capacidade de possuirmos linguagem, nos
diferenciando dos outros animais. É de Aristóteles a definição clássica do homem como
o ser vivo que possui logos. Na tradição do Ocidente, essa definição foi canonizada com
a forma: o homem é animal racional, o ser vivo racional, o ser que se distingue de todos
os outros animais pela capacidade de pensar. A palavra grega logos foi traduzida no
sentido de razão ou pensar. Na verdade, a palavra significa também e, sobretudo,
linguagem. Em certa passagem, Aristóteles estabeleceu a diferença entre homem e
animal do seguinte modo: Os animais têm a possibilidade de entender-se mutuamente,
mostrando uns aos outros o que lhes causa prazer, afim de, poder buscá-lo, e o que
causa dor, a fim de evitá-lo.
Aos animais a natureza só os permitiu chegar a esse ponto. Apenas aos homens
foi dado ainda logos, para que se informem mutuamente sobre o que é útil ou
prejudicial, o que é justo ou injusto. O homem é único que pode pensar e falar segundo
Aristóteles, pois é dotado de logos.
Evidentemente, que os outros animais se comunicam entre si. Esse é o caso, por
exemplo, das abelhas, que são dotadas de capacidades de comunicar-se uma com as
outras avisando onde se encontra o néctar e a quantidade de comida. E é evidente que
há a comunicação entre o ser humano com outros animais. Pesquisas recentes apontam a
possibilidade de alguns animais terem algum entendimento a cerca da linguagem dos
humanos. Mas, ainda assim, somente os humanos são portadores de uma linguagem
estruturada, pois só a linguagem humana é proposicional e simbólica.
O
filme planeta
dos macacos:
a origem

65
Filosofia 2016

demonstra exatamente essa situação, pois um chimpanzé recebe um tipo de droga que é
capaz de deixá-lo mais inteligente dando um salto evolutivo quando ele aprende a falar.
A primeira palavra que ele pronuncia é ―não!‖ e logo se inicia uma batalha e rebelião
contra os humanos.

Se, então, é a linguagem que faz com que sejamos humanos, diferentes dos
demais animais, o que é a linguagem?

O termo linguagem designa um sistema organizado de signos linguísticos que


desempenha uma função de significação. Por meio de signos linguísticos
veiculam-se pensamentos (proposições) e significados. Desse modo, signos
linguísticos permitem ao ser humano comunicar as suas experiências,
transmitir os seus saberes, assim como pensar e expressar seus sentimentos e
etc.

O QUE SÃO SIGNOS LINGUÍSTICOS?

Um signo linguístico é alguma coisa que está no lugar de outra, o seu


significado. Existem diferentes tipos de signos linguísticos e eles se dividem de acordo
com o modo pelo qual se dá a relação entre o signo e o significado.

COMO OS SIGNOS LINGUÍSTICOS SÃO REPRESENTADOS NO MUNDO?


São representados de três maneiras:

- ÍCONE: Quando a relação entre signo e significado é de semelhança.


Ex: uma maquete de uma cidade se parece com uma cidade de verdade, uma fotografia
se parece com a pessoa fotografada, um desenho de avião se parece com um avião.

- ÍNDICE: Quando a relação entre signo e significado é de causa e efeito


(causalidade), uma relação que afeta a existência do objeto ou é por ele afetada.
Ex: as nuvens carregadas são signos que indicam chuva, a fumaça indica que há fogo,
febre indica doença.

- SÍMBOLO: Se a relação é arbitrária, regida por convenção. O ser humano é o único

66
Filosofia 2016
capaz de criar símbolos
Ex: as palavras que formam uma língua, a cor preta que indica luto, a aliança no dedo
anelar da mão esquerda como símbolo de casamento.

ATENÇÃO!
A linguagem humana possui uma especificidade frente às
linguagens que os demais animais usam. Cachorros latem, gatos
miam, mas apenas a linguagem humana é PROPOSICIONAL.
Apenas os seres humanos
- falam sobre verdadeiro ou falso;
- falam sobre o que deve e não deve ser feito;
- e, falam sobre o belo e o feio.

Pratique!

1. Leia atentamente as sentenças abaixo e assinale a alternativa que


corresponde ao conjunto de valores corretos:
( ) Números, luzes, apitos de trânsito e bandeiras não são símbolos.
( ) No caso do ícone, o significado tem uma semelhança ou imita o significado.
( ) No caso do índice o significante não esta arbitrariamente ligado ao significado.
( )Um conjunto de símbolos é constituído a partir de uma convenção.

a) F-V-F-V b)V-F-F-F c)F-V-V-V d)F-F-V-V e)V-V-F-F

A LINGUAGEM COMO UM SISTEMA SIMBÓLICO

Resumidamente, pode-se dizer que a linguagem verbal é um sistema simbólico.


A linguagem humana está baseada em palavras, que são princípios orais, que em
seguida são sons articulados, bem como palavras escritas que são representações
gráficas desses sons. Após isso, organiza-se em frases e em conjuntos de frases. É por
meio desse sistema, portanto, que nos comunicamos, expressamos sentimentos,
emoções e manifestamos aquilo que é propriamente humano, a linguagem verbal. A
linguagem verbal é importante para muitas manifestações artísticas, como músicas que
fazem parte do nosso cotidiano. Na música, a linguagem verbal se associa a melodia
para expressar sentimentos e ideias.
As palavras que compõem qualquer língua humana são símbolos, ou seja,
formas de representar alguma coisa ou objeto ou ainda uma ação. Ex: A palavra sofá, é

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Filosofia 2016

um símbolo que representa o ato de nos sentarmos A palavra correr, é um símbolo que
representa uma ação e representa o fato de nos movimentarmos. É importante salientar
que uma característica importante sobre o símbolo é o fato de que ele representa alguma
coisa por convenção. Isso significa dizer que as pessoas ao criarem uma língua,
combinam entre si, que o objeto para sentar será chamado de sofá em português e chaise
em francês e assim por diante. E é por meio desse sistema de símbolos que nos
comunicamos e nos entendemos no nosso cotidiano. A banda Karnak brincou com essas
convenções na canção O mundo, mencionando ―Todos somos filhos de Deus; só não
falamos a mesma língua...‖

O MUNDO O mundo caquinho de vidro


Tá cego do olho, tá surdo do ouvido
O mundo é pequeno pra caramba O mundo tá muito doente
Tem alemão, italiano e italiana O homem que mata, o homem que mente
O mundo, filé a milanesa
Tem coreano, japonês e japonesa Porque você me trata mal
Se eu te trato bem?
O mundo é uma salada russa Por que você me faz o mal
Tem nego da Pérsia, tem nego da Se eu só te faço o bem?
Prússia
O mundo é uma esfirra de carne Todos somos filhos de Deus
Tem nego do Zâmbia, tem nego do Zaire Só não falamos as mesmas línguas
Todos somos filhos de Deus
O mundo é azul lá em cima Só não falamos as mesmas línguas
O mundo é vermelho na china (Abujamra, André. O mundo. In: Karnak.
O mundo tá muito gripado Tinitus, 2001).
O açúcar é doce, o sal é salgado

IMPORTANTE!
Enquanto a Linguagem é um sistema ou conjunto organizado de signos
de qualquer tipo, uma Língua é um sistema de signos verbais que
permitem a comunicação pela fala. Ou seja, a língua é um tipo
específico de linguagem. Uma língua surge de condições históricas,
geográficas, econômicas e políticas de uma comunidade de pessoas. Pode,
portanto, variar de lugar pra lugar, de acordo com estas condições.

UMA VIRADA LINGUÍSTICA?

Pense na afirmação: ―O irmão de Rafael esta doente‖. Ela é verdadeira ou falsa?


A resposta pode parecer fácil: Bastaria saber se ele está ou não doente. Todavia, essa

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Filosofia 2016
afirmação pode ser analisada de várias outras maneiras: Quem é Rafael? Ele tem irmão?
Ele tem apenas um irmão, ou mais de um? No caso de ter mais de um, qual deles está
doente? Perguntas como essas caracterizam uma corrente filosófica surgida no século
XX, à filosofia analítica. Segundo esses filósofos, a única tarefa plausível para a
filosofia seria produzir uma análise lógica da linguagem, de modo a analisar as frases e
proposições, para testar se essas podem ser verdadeiras ou falsas.
No mesmo século XX, fala-se em uma virada linguística, isto é, uma mudança
de foco nas preocupações da filosofia, porque consolidou-se uma nova ciência, a
linguística, também orientada para os estudos da linguagem. E ela teria grande
influência também em outras ciências humanas e na filosofia, por meio da teoria
estruturalista.

WITTGENSTEIN: LINGUAGEM E MUNDO


“Os limites da minha linguagem significam os limites de meu mundo”.
Wittgenstein

Um dos mais importantes pensadores da linguagem do século XX foi Ludwig


Wittgenstein. Em princípio alinhado as perspectivas da filosofia analítica da linguagem,
mas depois se distanciando delas. Em sua primeira obra, Wittgenstein está preocupado
com a essência da linguagem, com seu mecanismo de
significação com as coisas e o mundo. Trata a linguagem
como um sistema de significação e, portanto, afirma que
a linguagem é diferente do mundo, pois aquilo que
representa precisa ser diferente daquilo que e
representado. Mas, ao mesmo tempo em que é diferente,
deve haver semelhanças entre o representante (palavra) e
o representado (a coisa), ou não pode haver
representação. Segundo ele, o mundo é composto de
fatos, e o que a linguagem representa, por meio das
proposições, são os fatos.
No pensamento de Wittgenstein, linguagem e

69
Filosofia 2016

mundo estão, portanto, intrinsecamente, ligados. É por isso que ele chega a uma
interessante afirmação: quanta mais ampla a minha linguagem (minhas possibilidades
de representação) mais amplo é o meu mundo, quanto mais restrita minha linguagem,
também mais restrito é o meu mundo. ; e vice – versa. De modo que, quanto mais amplo
o meu mundo e minha linguagem, mais possibilidades de pensamento eu tenho.
Você já ouviu falar no romance de 1984, de George Orwell? O livro narra uma
sociedade do futuro, na qual os seres humanos são vigiados e controlados por um
governante totalitário, o Grande Irmão ou Big Brother, no original inglês. Nessa
sociedade o principal objetivo do governante é controlar o que as pessoas pensam e
sentem. E como isso é realizado? Pela linguagem! Considera-se que uma linguagem
muito rica e variada, gera muitos pensamentos, o que é ruim para o sistema. O governo,
então cria uma nova língua a ―novilingua‖, que nada mais é do que uma simplificação
da linguagem. A cada semana, a linguagem e reduzida, o mundo é reduzido e
consequentemente o pensamento também. Em Wittgenstein, encontramos uma ideia
parecida. Em uma das suas obras, ele termina com a proposição ― Sobre aquilo que não
se pode falar, deve-se calar!‖.
A filosofia de Wittgenstein sempre foi fonte de estudo para ele mesmo durante
toda sua vida. Ele passa a considerar que o problema não e busca por uma essência da
linguagem, uma vez que não haveria essência a ser encontrada. Em sua obra
Investigações filosóficas, ele afirma que não existe a linguagem, mas linguagens
múltiplas, com diferentes objetivos. Dessa forma, ele faz uma analogia com jogos, a
saber, não existe um único jogo, mas vários jogos e todos eles possuem suas próprias
regras. Jogar tênis, por exemplo, não é a mesma coisa que jogar xadrez, porém todos
são jogos e compreensíveis quando se joga. Quando muda o jogo, mudam as regras.
Em decorrência dessa analogia entre linguagem e jogo, o filósofo, afirma que as
linguagens são múltiplas, porque múltiplos são os jogos de linguagem. Esses jogos são
os variados jogos da linguagem: usamos a linguagem para expressar nossos
sentimentos, emoções, pensamentos, mas usamos também para dar ordens; usamos a
linguagem para pedir desculpas, bem como para fantasiar. Cada um desses usos, é um
jogo com regras próprias de elementos próprios e com formas de funcionamentos
próprios. Dessa forma, não há uma linguagem, com regras e usos, mas muitos jogos de
linguagem, cada um com seus usos e suas regras.
Uma pessoa pode não se comunicar bem em algum jogo de linguagem, isso não

70
Filosofia 2016
significa que isso é indizível, ela pode dizê-lo quem sabe em outro jogo de linguagem
diferente em que aquilo faça sentido e que seja mais fácil de expressar. São diferentes
jogos de linguagem, cada um com seus interesses e possibilidades. O que é importante
salientar que o significado de uma palavra não é imutável e universal. Seu significado
depende do jogo em que está sendo usado. A questão consiste então, de saber usar as
palavras de acordo com o jogo de linguagem em questão. Pense no exemplo: Se alguém
diz: ―Maria pegue a manga e venha cá‖! O significado de ―manga‖ depende do jogo de
linguagem em questão, pois manga pode ser fruta ou objeto a ser utilizado para limpar
calçadas ou encher piscinas. A palavras, ―manga‖, portanto, pode ter mais de um
sentido, depende do jogo de linguagem em questão.

Sugestão de leitura!

Pratique!

2. UFSM PS1 2014 - “Uma criança se machuca e grita; então os adultos falam
com ela e lhe ensinam exclamações e, posteriormente, frases. Ensinam à criança
um novo comportamento perante a dor.” Fonte: WITTGENSTEIN, L. Investigações
Filosóficas. São Paulo: Editora Abril, 1974. p. 95.

As frases que compõem a linguagem humana tiveram um papel essencial para o


desenvolvimento da cultura. Alguns usos linguísticos (de frases e palavras) são mais
complexos e outros mais simples. Na passagem apresentada, o filósofo Wittgenstein
explica que há um uso da linguagem em que adultos ensinam as crianças a substituir ou
colocar palavras no lugar de sensações. No lugar de dizer ―ai!‖ e chorar, as crianças são
ensinadas a dizer: ―mamãe, machuquei o joelho‖ (quando caem de uma bicicleta, por
exemplo). O uso da linguagem que ocorre nesses contextos é o

a. expressivo.
b. descritivo.
c. normativo.
d. lógico.
e. performativo.

71
Filosofia 2016

FUNÇÕES DA LINGUAGEM
Para que servem as linguagens?
O linguista contemporâneo Roman Jakobson propôs uma abordagem das
funções comunicativas da língua verbal bastante ampla que também pode ser usada para
as demais linguagens. Na década de 50, após ter conhecido outros trabalhos, percebeu a
necessidade uma semiótica (teoria geral dos signos) que firmasse a linguagem como
elemento de comunicação humana por excelência. Jakobson distingue seis fatores
fundamentais na comunicação verbal que dão origem a seis funções linguísticas
diferentes. Esses fatores podem ser esquematizados da seguinte forma:

Esse esquema corresponde a outro, das funções da linguagem originadas por


cada um desses fatores:

Resumindo e explicando:

a) A função REFERENCIAL é orientada para o contexto da comunicação, isto


é, refere-se ao que está ao nosso redor, como as afirmações: ―Hoje faz calor.‖ Esta
blusa está apertada.

b) A função EXPRESSIVA OU EMOTIVA está centrada no emissor que


declara sua atitude afetiva sobre o assunto do qual esta tratando, por exemplo, a
poesia lírica ou os xingamentos.

c) A função CONATIVA é orientada para o destinatário, invocando-o (―Ei,


você ai!!‖) ou dando-lhe uma ordem ( ―Fique em silêncio!‖).

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Filosofia 2016
d) A função FÁTICA tem por objetivo estabelecer, manter ou interromper a
comunicação. Ex: Você está entendendo?

e) Na função METALINGUÍSTICA a mensagem discute o uso do próprio


código, esclarecendo-o, como quando perguntamos o significado de uma palavra.
Também pode ser o caso de uma linguagem comentar outra linguagem, como a
leitura de uma obra de arte.

f) A função POÉTICA é aquela que visa à mensagem em si, colocando em


evidência sua própria forma.

Ampliando essas funções para outras linguagens, podemos dizer que


tanto a linguagem da moda quanto as obras de arte expressionistas fazem uso da função
expressiva. Já os manuais técnicos e todas as obras realistas apresentam uma
preponderância da função referencial. A propaganda as preces e a arte romântica estão
centradas sobre o destinatário, tendo função conativa. A introdução de qualquer peça
musical ou o apagar das luzes numa encenação teatral tem objetivo de testar ou
estabelecer o contato com o destinatário, realizando, portanto, a função fática. Quando
fazemos uma paródia, estamos usando a função metalinguística; o mesmo acontece
quando adaptamos um texto para teatro ou cinema. Já a função poética necessariamente
está presente em todas as obras de arte.
Agora sim, podemos responder para que serve uma linguagem: para nos
comunicarmos com os outros seres humanos de hoje, do passado e do futuro; para
expressar nossos afetos positivos ou negativos, para falar da realidade que nos circunda,
para despertar uma reação no destinatário; para discutir o código que estamos usando ou
outro qualquer, para reafirmar o contato com o outro, sem o que não haverá
comunicação e para fazer arte. Dispomos de toda essa riqueza quando temos o domínio
de uma ou de várias linguagens.

Pensando filosoficamente as funções da linguagem: Dummett focaliza duas ―funções


principais‖ da linguagem: ser ―instrumento de comunicação‖ e ser ―veículo do
pensamento‖. Sua conclusão é que não deveríamos considerar nenhuma das duas como
primária. Mas isto porque ele pensa que aquelas duas funções da linguagem são
fundamentais.

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Filosofia 2016

Na imagem que estou sugerindo, elas são secundárias. A característica da linguagem qu e


realmente importa é a seguinte: a linguagem natural, a linguagem na qual um ser humano
é iniciado pela primeira vez, é um repositório da tradição, um depósito de sabedoria
historicamente acumulada a respeito daquilo que é razão para o quê. Trata-se de uma
tradição sujeita a modificações refletidas feitas pelas gerações que a vão herdando. Na
verdade, parte desta herança consiste na obrigação permanente de nos engajarmos na
reflexão crítica. Mas, para que um ser humano individual perceba seu potencial para
tomar parte nesta sucessão a primeira coisa que deve acontecer a ele é ser iniciado numa
tradição tal como está. (Retirado de Mente e Mundo, de John McDowell)
Pense por um momento: por que McDowell recusa considerar que as duas funções
principais da linguagem sejam ser um ―veículo de pensamento‖ e ser ―instrumento de
comunicação‖, e põe no lugar a ideia de ser um ―depósito da tradição‖? Uma dica: pense
o que é o que fazemos com instrumentos, veículos e depósitos? Você sugere outra mais
fundamental?

QUAL A RELAÇÃO DA LINGUAGEM COM A CULTURA?

A linguagem é uma forma de expressão simbólica. Por isso, segundo o filósofo


Ernst Cassirer, podemos compreender o humano como um ―animal simbólico‖.
Segundo ele, o ser humano não é bem caracterizado quando o definimos como um
―animal racional‖, pois essa expressão limita a imensidão de coisas das quais somos
capazes. Somos, afirma o filósofo, mais bem
caracterizados pelo ato de simbolizar, que nos abre
todo o universo da cultura.
A palavra cultura é utilizada desde a
Antiguidade. Os antigos romanos, por exemplo, a
empregavam no sentido de ―cultivo‖; daí a origem da
palavra agricultura: o cultivo agrícola, o cuidado com
a terra que permite que as plantas cresçam. Mas
também falavam em um ―cultivo de si‖, um cultivar-
se, no sentido de uma pessoa cuidar-se, educar a si
mesma, e com isso crescer. É apenas no século XIX
que se difunde a ideia de cultura como a forma

74
Filosofia 2016
própria de vida de determinado povo, nesse sentido, falamos de ―culturas indígenas‖,
―culturas pré-colombianas‖, ―cultura brasileira‖ e ―culturas europeias‖, por exemplo.
Em termos mais estritamente filosóficos (portanto, conceituais), podemos entender por
cultura o conjunto de tudo aquilo, no ambiente em que vivemos, que foi produzido pelo
ser humano. Como você já deve saber, Karl Marx associou o trabalho à natureza
humana, uma vez que é por meio do trabalho que o ser humano transforma o mundo e
transforma-se a si mesmo. A atividade de transformação do mundo pelo trabalho é
justamente o que chamamos de cultura.
Percebe-se, portanto, uma estreita ligação entre trabalho, cultura e linguagem:
produzimos cultura ao transformar o mundo por meio do trabalho, e expressamos essas
transformações pela linguagem. Mas a produção de linguagem é também uma forma de
trabalho, o que significa que também a linguagem transforma o mundo, como vimos
anteriormente. Se entendermos, então, por cultura o mundo transformado pelo ser
humano e por natureza a parte do mundo que não depende de nós, que não foi
transformada por nós, será que há uma espécie de oposição entre natureza e cultura? De
forma nenhuma. O universo humano só pode ser compreendido pelo entrecruzamento
de natureza e cultura.
Marx também afirmava que a natureza é o ―corpo inorgânico‖ do ser humano.
Isso porque o corpo humano é a ferramenta do indivíduo. Quando ele transforma um
objeto em extensão de seu corpo – uma pedra afiada em forma de lança, por exemplo –,
esse objeto se torna seu ―corpo inorgânico‖. Assim, para realizar seu trabalho como
transformação, o ser humano atravessa o mundo natural e é atravessado por ele. A
cultura é a produção desse mútuo atravessamento.
Pensando na cultura como o mundo transformado pelo ser humano, podemos
concebê-la como uma ―trama simbólica‖, produzida pela linguagem. Assim, quando
usamos uma roupa, por exemplo, não estamos apenas cumprindo uma função material
de proteger e aquecer o corpo, mas estamos também, por meio dela, expressando nossa
visão de mundo, nossos valores e o grupo social ao qual pertencemos. É comum
ouvirmos falar em ―cultura erudita‖ e ―cultura popular‖. A primeira compreenderia as
grandes realizações culturais humanas, nas artes e no pensamento de forma geral; a
segunda reuniria as expressões das pessoas comuns, com suas festas, crenças, músicas e
outras manifestações culturais. Qual das duas é mais importante? Embora conheçamos
respostas em favor de uma ou de outra, em termos filosóficos essa é uma pergunta que
não faz sentido, pois ambas são igualmente importantes como expressões do ser

75
Filosofia 2016

humano.
MAIS ALGUNS CONCEITOS DE FILOSOFIA DA LINGUAGEM

O significado de um signo pode ser decomposto em duas partes: sua intensão e


sua extensão.
INTENSÃO (ou conotação) EXTENSÃO (ou denotação)
Princípio pelo qual os objetos que são Membros do conjunto ou classe. A
representados pelo signo são escolhidos extensão de um termo consiste na classe
ou, em outras palavras, a condição que de objetos a que o signo pode ser aplicado.
um objeto tem de satisfazer para ser Quanto maior a extensão maior o número
corretamente descrito pelo predicado. de indivíduos representados pelo signo.
Dois signos (―... é um animal racional‖,
―... é um bípede sem penas‖) podem
identificar uma mesma classe, mas o
fazem por meio de uma condição
diferente.

AMBIGUIDADE VAGUEZA
É a qualidade de uma expressão ter mais Expressões vagas são aquelas que dão
de um significado. origem a casos de fronteira. Nesses casos,
A. lexical: a palavra tem mais de um há incerteza sobre a aplicação da
significado. É a mais comum. Ex: manga expressão pois as propriedades (a
A. estrutural: ―Todas as garotas bonitas intensão) não são adequadamente
amam um príncipe.‖ explicitadas.
A. processo/produto: podemos
considerar certos temas sob dois pontos
de vista.

A distinção uso/menção evita a confusão entre propriedades das coisas e

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Filosofia 2016
propriedades das expressões que estão pelas coisas.

USO MENÇÃO
É quando empregamos um termo SEM É quando empregamos um termo entre
aspas para falar da coisa que o termo aspas para falar do termo. Ex: "Miau" tem
refere. Ex: Miau tem quatro patas. A quatro letras. "Água" tem quatro letras.
água ferve quanto atinge uma "Maria" é um substantivo.
temperatura de 100°C. Maria é um
egoísta.

Pratique!

3. A ordem dos termos segundo a intensão é inversa a ordem dos termos


segundo a extensão. Por exemplo, a extensão de “animal” é maior que a extensão
de “ave”, mas a intensão de “animal” é menor que a intensão de “ave”. Pode-se
afirmar que:

I ‗voto‘, ‗voto não-válido‘ e ‗voto nulo‘, correspondem a uma ordem crescente de


extensão.
II ‗Eleitor maior de 18 anos‘, ‗eleitor‘ e ‗cidadão‘ correspondem a uma ordem
decrescente de intensão.
III ‗Eleitor da seção eleitoral 139 da zona eleitoral 135‘, ‗eleitor da zona eleitoral 135‘ e
‗eleitor‘ correspondem a uma ordem crescente de intensão.

Está(ão) correta(s):
a) Apenas I c) Apenas III e) Apenas II e III
b) Apenas II d) Apenas I e II

Unidade IV
O QUE É CONHECIMENTO?
COMO NÓS O ALCANÇAMOS?
QUAL A SUA ESSÊNCIA?
É POSSÍVEL SABER ALGO?
A Teoria do Conhecimento (também chamada Epistemologia) é a parte da

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Filosofia 2016

filosofia que investiga a natureza do conhecimento, sua origem e validade. Investiga a


ideia, própria do senso comum, de que temos conhecimento. Preocupa-se em
responder questões como: o que é conhecimento? Como nós o alcançamos? Qual a sua
origem? Assim, podemos dividi-la em quatro partes:
I - O conhecimento como problema; (definição padrão: crença verdadeira justificada)
II- Origem do Conhecimento; (empirismo, racionalismo)
III- Essência do Conhecimento; (realismo, idealismo)
IV – Possibilidade do Conhecimento. (ceticismo, dogmatismo)

Mas antes podemos nos perguntar: o que é conhecimento? O que podemos dizer
que conhecemos? O que sabemos? O que vocês sabem?
Podemos falar de conhecimento em três sentidos diferentes:

1 – CONHECIMENTO POR HABILIDADE: Podemos falar em saber como fazer


algo, no sentido de possuir uma habilidade ou destreza, ou seja, estamos falando de um
conhecimento de habilidade, saber-fazer. Isso é o que se quer dizer quando alguém fala
"Eu sei tocar violão‖. Ex.:
2 – CONHECIMENTO POR CONTATO: Podemos falar em conhecer pessoas ou
lugares, no sentido de estar familiarizado com eles, ou seja, estamos falando de um
conhecimento por contato, saber-de. Isso é o que se quer dizer quando alguém fala
"Conheço o Silvio Santos". Ex.:
3 – CONHECIMENTO PROPOSICIONAL: E alguém pode saber que algo é o caso
quando alguém fala "Eu sei que a neve é branca‖. Este último é chamado de
"conhecimento proposicional", e é o que interessa no estudo da epistemologia. Ex.:

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Filosofia 2016
Platão, no diálogo Teeteto, foi o primeiro filósofo a examinar
sistematicamente o problema do conhecimento. Nesse diálogo, foi elaborada
uma definição de conhecimento proposicional que se tornou padrão.
Segundo Platão, o conceito de conhecimento é definido como: crença
verdadeira justificada.
O conhecimento proposicional, como o nome já diz, é conhecimento de
proposições. Como vimos, uma proposição é aquilo que é dito por meio de uma
sentença assertiva.
Uma DICA para reconhecer uma proposição é usar o prefixo ―que‖ na frase:
podemos dizer que uma frase prefixada da palavra ―que‖ é uma sentença assertiva:
A neve é branca -> que a neve é branca
Eu sei que a neve é branca -> Eu sei que p

A proposição, então, é o conteúdo da sentença, o que a frase expressa, e pode ser


verdadeiro ou falso, ou seja, é um portador de verdade*. Quando uma proposição é
verdadeira dizemos que é um fato. Por exemplo: que hoje faz sol, só é um fato, se for
verdadeiro que faz sol hoje.

*O QUE SÃO PORTADORES DE VERDADE?


Uma proposição é aquilo que pode ser verdadeiro ou falso. A proposição é o
conteúdo de uma frase (sentença).
*Importante: não é a frase que é verdadeira ou falsa, mas sim seu conteúdo.

Ex.:
(F1) A neve é branca.
(F2) Snow is white.
(F3) Schnee ist weiss.

F1, F2 e F3 são frases ou sentenças que têm o mesmo conteúdo, ou seja, que
expressam uma mesma proposição.

79
Filosofia 2016

O CONHECIMENTO COMO PROBLEMA: CONDIÇÕES PARA O


CONHECIMENTO
De acordo com Platão, o conhecimento é definido como uma crença verdadeira
justificada

A CRENÇA:
A primeira condição para que haja conhecimento é a crença. É preciso que haja
um sujeito S que creia que p, ou seja, que creia naquilo que é dito por meio de uma
sentença assertiva e que pode ser verdadeiro ou falso, ou seja, em uma proposição. Em
outras palavras, a proposição é o conteúdo da crença; algo objetivo e que pode ser
compartilhado, sendo comum a todos.
A crença como disposição para agir: Quem crê, crê em uma proposição que
considera verdadeira e acaba por agir de acordo com essa crença. Por exemplo, se eu
não acreditasse que o chão não afunda quando eu piso, eu não pisaria nele. Se eu olho
pela janela e vejo que o tempo está fechando, passo a acreditar que vai chover e saio pra
recolher a roupa. Desse modo, crer é estar em um estado de disposição para fazer algo.
Crenças inconscientes: Nem sempre temos consciência das nossas crenças.
Retomando o exemplo anterior, não precisamos lembrar a todo o momento que o chão
não afunda para sairmos caminhando. Outro exemplo é a nossa crença de que existem
coisas, de que existe o mundo. Essas são chamadas crenças básicas.
Essas crenças são chamadas de crenças básicas, ou não professadas. Bom, e
quando falarmos da justificação, veremos que essas crenças básicas podem servir como
uma razão para fundamentar outras crenças, pois elas não precisam ser justificadas.

A VERDADE:
Quem acredita em algo (p. ex.: acreditar que a neve é branca) toma aquilo que
acredita como verdadeiro. E para que tenhamos conhecimento, o que acreditamos

80
Filosofia 2016
precisa realmente ser verdadeiro, pois não há conhecimento de crenças falsas.
E quando falamos que uma crença é verdadeira, estamos pressupondo alguma
teoria da verdade, que nos diz quando é que uma crença, ou mais precisamente, uma
proposição é verdadeira, e nos diz quais os critérios que usamos para identificar a
verdade. Algumas teorias que tentam caracterizar a verdade:
Teoria Relativista da Verdade: Segundo a teoria relativista, não há verdade
absoluta, a verdade é sempre relativa a um indivíduo ou a um grupo de indivíduos; é
múltipla e depende do ponto de vista do sujeito ou do contexto em que é formulada. P.
ex., a frase ‗Deus existe‘ é verdadeira para o crente e falsa para o ateu,
Mas essa teoria pode levar a consequências absurdas, pode tornar a discussão de
ideias vazia de sentido. Se cada qual tem sua verdade, não há necessidade de levar a
sério os argumentos alheios ou de justificar as nossas próprias ideias, que também
seriam apenas pontos de vista. Mas se tudo não passa de ponto de vista, então somos
levados a admitir que mesmo os preconceitos racistas, sexistas e toda forma de
fundamentalismos religiosos são igualmente legítimos.
A verdade por ser relativa a diferentes critérios também varia de acordo com o
tempo. Por exemplo, na época medieval as pessoas tinham boas razões para acreditar
que a Terra era plana. Agora, temos razões suficientes para acreditar que a Terra é
redonda. Como se explica isso? Que a terra era plana naquela época e deixou de ser?
Que era verdade para os medievais que ela é plana e ao mesmo tempo verdade que é
redonda? Que a Terra pode não ser realmente redonda?

O PARADOXO DO RELATIVISMO
A suposta verdade do relativismo também é relativa?
a) Se sim: não passa de uma opinião.
b) Se não: suposta verdade incompatível com a tese relativista (verdade é
relativa).

Teoria da verdade como correspondência: Segundo a teoria


correspondencialista, a verdade provém de como as coisas são e, desse modo, independe
da opinião das pessoas. Como os portadores de verdade são as sentenças (proposições),
uma sentença é verdadeira, segundo essa teoria, se corresponde com os fatos.

81
Filosofia 2016

Def: uma sentença é verdadeira se corresponde com os fatos (realidade).

P. ex.: a sentença ‗a neve é fofinha‘ é verdadeira se corresponde com o fato de a neve ser
fofinha. Nessa teoria, a verdade seria uma relação (propriedade relacional) entre
proposições (portadores de verdade) e fatos (fazedores de verdade). Aristóteles foi quem
formulou pela primeira vez uma noção de verdade em termos de correspondência. Ele
disse: "Dizer do que é que é e do que não é que não é é dizer a verdade e dizer do que é
que não é e do que não é que é é dizer algo falso".

Sentenças hipotéticas e normativas: sentenças do tipo ―Se eu derrubar esse


giz, ele vai cair‖ (hipotética) e ―Você não deve fumar em lugares fechados‖ retratam que
realidade? Quais suas relações com os fatos? Essas sentenças descrevem como as coisas
podem (sentenças hipotéticas) ou devem acontecer (sentenças normativas) e não o que
acontece (sentenças assertivas).
Outra objeção feita é que não temos como comparar proposições com fatos, mas
apenas proposições com proposições. Isso porque para que uma coisa corresponda com
outra, elas precisam ser idênticas entre si, possuírem as mesmas propriedades, o que não
é o caso das proposições e fatos.

Teorias coerenciais da verdade: Segundo o coerentismo, uma proposição é


verdadeira quando é coerente com o conjunto de proposições que constituem nosso
sistema de crenças. Considere as sentenças ―Ontem à noite eu estava respirando‖ e
―Ontem à noite eu vi um fantasma‖. A primeira proposição será imediatamente admitida
como verdadeira e a segunda como falsa. Chegamos a essa conclusão, não porque
tenhamos verificado se essas proposições correspondem ou não aos fatos, mas porque a
primeira é coerente com o nosso sistema de crenças, enquanto a segunda não. Uma das
objeções que podem ser direcionadas ao coerentismo é o fato de que uma proposição de
um conto de fadas pode ser verdadeira, na medida em que é consistente com as outras
proposições do conto de fadas.

Teoria pragmática da verdade: Segundo essa teoria, uma proposição é


verdadeira se houver alguma vantagem prática em sustentá-la, ou seja, uma afirmação
só é verdadeira se for útil de algum modo.
Por exemplo, a sentença ―Deus existe‖ seria uma proposição verdadeira, pois a

82
Filosofia 2016
principio é vantajoso crer em Deus (podemos nos sentir seguros e protegidos
acreditando na existência de um ser que zela por nós). Mas há um problema nisso:
surgem consequências relativistas. Como? Bom, o tipo de utilidade que pode definir a
verdade pode variar de pessoa para pessoa. Pode ser vantajoso para muitas pessoas crer
em Deus (ter um ser a quem recorrer nas horas difíceis, por exemplo), assim como pode
ser desvantajoso para os ateus crer em Deus, pois isso comprometeria a liberdade
humana com ideias como as de pecado e danação eterna, fogo do inferno, etc.
Como foi dito, algo pode ser útil para alguém e inútil para outro, vantajoso para
alguns e desvantajoso para outros. E ainda há outro problema. Pode ser muito vantajoso
para alguém manter crenças falsas e, desvantajoso adotar crenças verdadeiras. Do
mesmo modo, uma sentença pode ser útil e falsa. Mas os pragmatistas acreditam que
isso não é possível (uma sentença ser útil e falsa ao mesmo tempo).

A JUSTIFICAÇÃO

A terceira condição necessária para que haja conhecimento é a justificação.


Justificar consiste em apresentar razões que garantam a verdade da crença.
Por que devemos justificar as nossas crenças verdadeiras? Pense na história de
Hugo, um apostador, que aposta em cavalos diferentes toda a semana, sempre tendo a
firme convicção de que irá ganhar. Um desses cavalos é o Dr. Horse. Algumas vezes Dr.
Horse ganha a corrida. Certo dia, Hugo aposta em Dr. Horse alegando que o dia está
ensolarado e que por isso irá apostar nele. Dr. Horse ganha a corrida. A crença (que se
mostrou verdadeira) de Hugo de que seu cavalo iria ganhar é garantida pela sua
justificação (por que o dia estava ensolarado)? Ele tinha um conhecimento? Não. A
crença de Hugo que eventualmente tornou-se verdadeira pode ser considerada um
palpite. Para haver conhecimento é necessário que haja justificação, e mais ainda, que a
crença e sua justificação sejam relacionadas.

*Lembrete: crença, verdade e justificação são condições suficientes para o


conhecimento em conjunto. Separadamente, elas são condições necessárias.
* Uma das ferramentas mais úteis para que possamos esclarecer as nossas dúvidas sobre
até mesmo nosso próprio conhecimento é o estudo da Lógica.

A ORIGEM DO CONHECIMENTO

83
Filosofia 2016

COMO PODEMOS ALCANÇAR O CONHECIMENTO?

Agora que sabemos o que é conhecimento, qual sua definição e alguns dos
problemas desta, devemos nos perguntar como alcançamos o conhecimento. O que
temos de fazer para que tenhamos conhecimento? Existem algumas respostas na
tradição a essas perguntas:

RACIONALISMO
Para esta corrente filosófica, o conhecimento deve ser logicamente necessário e
universalmente válido. Filósofos como Descartes e Platão consideravam a matemática o
modelo de conhecimento para as outras disciplinas. E os conhecimentos matemáticos
têm origem na razão, uma faculdade intelectual especial do ser humano, que permitiria
que tivéssemos conhecimento sem a necessidade da experiência.
Problemas:

EMPIRISMO
Para o empirismo, o conhecimento tem origem nos dados sensíveis, ou seja,
naquilo que nos é fornecido pelos sentidos e na experiência. Como diz John Locke,
―não há nada que na mente que não tenha estado antes nos sentidos‖. O conhecimento
tem origem na experiência e pode ser explicado recorrendo-se a esta.
Problemas:

CRITICISMO
De acordo com o criticismo, desenvolvido por Immanuel Kant, é possível que
haja conhecimento tanto com a razão quanto com a experiência.

Que todo o nosso conhecimento começa com a experiência, não há dúvida alguma,
pois, do contrário, por meio do que a faculdade de conhecimento deveria ser despertada
para o exercício senão através de objetos que tocam nossos sentidos e em parte
produzem por si próprio representações, em parte põem em movimento a atividade do
nosso entendimento para compará-las, conectá-las ou separá-las e, desse modo,
assimilar a matéria bruta das impressões sensíveis a um conhecimento dos objetos que
se chama experiência? Segundo o tempo, portanto, nenhum conhecimento em nós
precede a experiência, e todo ele começa com ela. Mas embora todo o nosso
conhecimento comece com a experiência, nem por isso todo ele se origina justamente
84
da experiência. (Retirado de Crítica da Razão Pura, de Immanuel Kant)
Filosofia 2016

QUAL A ESSÊNCIA DO CONHECIMENTO?


A metafísica no mundo
E o que podemos conhecer? Como se dá o nosso conhecimento sobre o mundo?
Qual é a relação entre nossa mente e o mundo? Qual a relação entre a linguagem e o
mundo?
REALISMO: Segundo o Realismo, o mundo existe independentemente da mente
humana. Havendo humanos ou não, as árvores continuarão a ficar no mesmo lugar, os
pássaros a voar, etc.

IDEALISMO: O Idealismo afirma que o mundo só existe porque o percebemos. O


conhecimento é subjetivo, e depende da existência de uma mente. Por exemplo, se
ninguém ouvir o som de uma árvore caindo, esse som continua existindo?

A POSSIBILIDADE DO CONHECIMENTO
É POSSÍVEL SABER ALGO?

Agora que esclarecemos como definir nosso conhecimento, como podemos


adquiri-lo e como ele se relaciona com o mundo e todos os problemas que estas
questões acarretam, ainda devemos nos perguntar: é possível conhecer? É possível que
tenhamos conhecimento?

CETICISMO: a resposta cética é que, em última instância, não temos conhecimento


definitivo. Sempre poderemos questionar o nosso conhecimento, há a possibilidade de
estarmos enganados.

DOGMATISMO: a resposta dogmática é que podemos alcançar conhecimento, sendo

85
Filosofia 2016

este absolutamente verdadeiro e indiscutível.

EXERCÍCIOS
1. Todo o poder criativo da mente se reduz a nada mais do que a faculdade de
compor, transpor, aumentar ou diminuir os materiais que nos fornecem os
sentidos e a experiência. Quando pensamos em uma montanha de ouro, não
fazemos mais do que juntar duas ideias consistentes, ouro e montanha, que já
conhecíamos. Podemos conceber um cavalo virtuoso, porque somos capazes de
conceber a virtude a partir de nossos próprios sentimentos, e podemos unir a isso
a figura e a forma de um cavalo, animal que nos é familiar. (HUME,
D. Investigação sobre o entendimento humano. São Paulo: Abril Cultural, 1995.)
Hume estabelece um vínculo entre pensamento e impressão ao considerar
que:
a) os conteúdos das ideias no intelecto têm origem na sensação.
b) o espírito é capaz de classificar os dados da percepção sensível.
c) as ideias fracas resultam de experiências sensoriais determinadas pelo acaso.
d) os sentimentos ordenam como os pensamentos devem ser processados na memória.
e) as ideias têm como fonte específica o sentimento cujos dados são colhidos na
empiria.

Unidade V

O QUE É CIÊNCIA?
COMO FUNCIONA A CIÊNCIA?
O QUE É MÉTODO CIENTÍFICO?

A influência da ciência na nossa vida é tão profunda que se torna muito difícil
imaginar como seria hoje o mundo caso o
conhecimento científico tivesse estagnado a

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Filosofia 2016
séculos atrás. Há existência de computadores, celulares, vacinas, antibióticos, lâmpadas,
carros e infinitas outras coisas são diretamente fruto da pesquisa em ciência. A ciência
tem um evidente valor prático, sobre isso poucos discordariam, esse lado prático da
ciência, em geral atende pelo nome de tecnologia. A ciência também alavancou novos
problemas especialmente envolvendo questões éticas, tais como o uso da bomba
atômica, a possibilidade de clonagem, manipulação genética etc. Essas são algumas das
muitas interfaces da ciência com a cultura e a sociedade. Como foi visto na seção
anterior sobre epistemologia, podemos fazer uma investigação sobre o que é
conhecimento em sentido geral. Mas podemos também fazer uma análise mais
específica focando, por exemplo, nas estruturas epistemológicas da atividade científica e
entender seus principais pontos. Nessa atividade, estamos fazendo uma reflexão
filosófica sobre a ciência, portanto fazendo filosofia da ciência.
Sempre é possível fazemos perguntas que são típicas da ciência, por exemplo,
qual é o mecanismo responsável pela produção de bile no nosso organismo? A que
temperatura a água ferve? Por que o sol gira em torno da terra? Como podemos explicar
uma propriedade medicinal de certa uma planta? Mas as questões que a filosofia da
ciência coloca são diferentes, elas são da seguinte natureza: Há um método especial em
ciência? Como testamos as teorias ou hipóteses científicas? Qual é a diferença das
explicações científicas para outras formas de explicação? Qual o papel da experiência
ou dos experimentos em ciência? O que é uma evidência científica? A ciência evolui de
modo contínuo e cumulativo? Essas são algumas das indagações que os filósofos das
ciências fazem. Não temos a pretensão de tratar todas elas, iremos apenas fazer um
sobre vôo sobre algumas ideias centrais nessa área da filosofia.

A VISÃO INGÊNUA DA CIÊNCIA É comum a crença


generalizada que o conhecimento fornecido pela ciência
distingue-se por um grau de certeza alto, desfrutando assim de
uma posição privilegiada com relação aos demais tipos de
conhecimento (o das pessoas comum, por exemplo). Teorias,
métodos, técnicas, produtos, contam com aprovação geral
quando considerados científicos. A autoridade da ciência é evocada amplamente.
Indústrias, por exemplo, frequentemente rotulam de ―científicos‖ processos por meio
dos quais fabricam seus produtos, bem como os testes aos quais os submetem.
Essa atitude de veneração frente a ciência deve-se, em grande parte, ao

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Filosofia 2016

extraordinário sucesso prático alcançado pela física, pela química e pela biologia,
principalmente. Assume-se, implícita ou explicitamente, que por detrás desse sucesso
existe um “método” especial, uma ―receita‖ que, quando seguida, redunda em
conhecimento certo, seguro. Vejamos alguns ―ingredientes‖ dessa ―receita‖:
g) Temos aqui a primeira tentativa de dizer algo sobre a especificidade da
ciência. Ela produz conhecimento certo, pois tem um método especial.
h) Para produzir saber científico basta seguir a seguinte ―receita‖: A) o número
de observações de um dado fenômeno deve ser grande; B) devem-se variar
amplamente as condições em que o fenômeno se produz; C) não deve existir
nenhuma contra-evidência. Exemplo:
1. O ferro conduz eletricidade (Observação 1°)
2. O ferro é metal (Observação 2°)
3. O ouro conduz eletricidade (Observação 3°)
4. O ouro é metal (Observação 4°)
5. O cobre conduz eletricidade (Observação 5°)
6. O cobre é metal (observação 6°)
7. Logo, todos os metais conduzem eletricidade. (Conclusão indutiva
provavelmente verdadeira)
Os indutivistas acreditam que a explicação para os fenômenos advém
unicamente da observação dos fatos, seguida de uma inferência indutiva. Essa visão da
ciência foi criticada por muitos, pois ela tem várias limitações, e imprecisões que iremos
analisar.
QUESTÕES DE REVISÃO: Em sua opinião a ciência busca certezas? E se
busca, ela as consegue alcançar? Mas as mudanças que ocorrem na ciência, como
podem ser explicadas? E esse método indutivo lhe parece confiável? Você concorda
com a afirmação, ―a ciência começa com a observação‖?

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Filosofia 2016
POSITIVISMO LÓGICO OU CÍRCULO DE VIENA

Positivismo lógico é um movimento filosófico dentro da filosofia do século XX,


com forte apelo empirista e que usou muito da lógica contemporânea (Frege, Russell)
para redefinir os limites do conhecimento legítimo em relação a formas ―inadequadas‖
de conhecer. Esse projeto se unificava, na tentativa de estabelecer quais seriam as
linguagens que respeitam critérios científicos de significação e quais não respeitam. A
contribuição desse movimento para a discussão sobre o que é a ciência, foi pensá -la
mais ou menos do seguinte modo:
 A ciência verifica empiricamente suas hipóteses, essa é a diferença da ciência em
relação à bruxaria, mitologia e metafísica. Dito de outra forma, as afirmações
científicas podem ser verificadas empiricamente, ou seja, podemos em
princípio estabelecer seu valor de verdade pelas observações ou por algum tipo
de experiência ou experimento concreto.
 Há também uma versão mais ―fraca‖ do verificacionismo, chama-se
confirmacionimos, nessa versão, as hipóteses não precisão ser verificadas, mas
apenas confirmadas, de forma gradativa por evidências.
 Alguns dos principais filósofos desse movimento são: Carnap, Schilick,

Termos:
Hipótese – possível explicação para o fenômeno observado ou para as
relações entre os dados. Tem caráter provisório.

Experimento – teste feito a fim de confirmar ou refutar a hipótese.

Lei – hipóteses que explicam fenômenos que acontecem com regularidade.

Teoria - um conjunto de hipóteses, observações e pressupostos articulado,


em geral aceito pela comunidade científica, teoria não é um palpite ou
opinião; exemplos de teorias científicas: Relatividade Geral, Evolução por
seleção natural.
Hahn, Hempel.

A PROPOSTA DE POPPER SOBRE A CIÊNCIA

Filósofo da ciência, Karl Popper (1902-1994) foi um dos


críticos do positivismo lógico, e da visão ingênua da ciência.

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Filosofia 2016

Popper tinha em mente uma proposta alternativa sobre o que algo tem que ter
para ser considerada científico. Antes de apresentar sua proposta, vamos
apresentar algumas das suas críticas às visões de ciência esboçada na seção 2 e 3.
Por que o método indutivo não deve ser o que distingue (problema da demarcação) a
ciência da magia, da metafísica, conhecimento popular etc.

 A indução não é um procedimento inferencial racional seguro (problema da


indução), pois não importa quantas evidências positivas se tenha para sustentar a
conclusão geral com base em casos particulares, sempre é possível
(logicamente) que a conclusão esteja errada.
 Outra crítica de Popper é que a ciência não começa com a observação. A ciência
começa com problemas primeiramente. O cientista não um é classificador e
coletor de dados da experiência sem qualquer pressuposto teórico antecedendo
as observações. Muitas vezes o mesmo fenômeno pode ser arranjado de diversas
formas, isso vai depender dos objetivos
do cientista e da disciplina científica
que ele esta inserido.
 Exemplo: em uma mesma floresta um
biólogo e um geógrafo, embora tenham
o mesmo local para investigar, irão
observar somente aquilo que for
relevante para sua pesquisa, ou seja, sempre há pressupostos teóricos guiando as
observações; e eles são fundamentais para ―recortar‖ a natureza e examiná-la. O
biólogo pode estar preocupado com uma espécie de formigas e o geógrafo com o
solo da região, por exemplo. E por fim, para Popper a ciência não busca a
certeza, não está preocupada com estabelecer de modo
definitivo suas hipóteses e teorias. Os cientistas na visão de
Popper não devem buscar ―insanamente‖ confirmar suas
hipóteses. A ciência só progrediu e avançou dada sua
capacidade de reconhecer e descartar as teorias que se
mostram erradas com o tempo.

A CIÊNCIA
 Será uma teoria científica, somente aquelas teorias que forem em princípio

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Filosofia 2016
falseáveis empiricamente?
De acordo com Popper, o diferencial da ciência não esta ligado ao uso
método indutivo ou com a perspectiva de verificação de hipóteses. Mas sim com a
possibilidade que todas as teorias da ciência têm de em alguma situação, mostrarem-
se refutáveis. Teorias ou hipóteses irrefutáveis não são teorias científicas. Exemplo
de hipóteses irrefutáveis:
 Amanha vai chover ou não vai chover. (tautologia)
 Deus foi o criador de tudo que existe (hipótese transcendente)
 Há um princípio vital em todos os seres humanos que os torna vivos.
(hipótese mística)
 Algumas pessoas do signo de virgem são sensíveis, outras não. (astrologia)
 No fundo você odeia seu pai. (psicanálise) *[se admitir à hipótese está
correta, se negar, está apenas reprimindo uma verdade profunda]
 Hipóteses científicas: passíveis de refutação.
 Amanha vai chover. (afirmação do dia-dia)
 Se a luz passa perto do campo gravitacional de um corpo celeste qualquer,
ela terá um desvio. (física relativística)
 Um pedaço de carne bem isolado não é capas de gerar vida
espontaneamente. (hipótese da biologia)
 Um corpo pode ser eletrificado por contato. (física dos materiais)
 Todos os planetas do nosso sistema solar giram de forma elíptica em torno
do sol. (astronomia)

Temos que ter em mente que o critério de Popper, demanda que uma hipótese ou
teoria sejam refutável (falseável) em princípio, não de fato ou praticamente. Uma
hipótese pode nunca se revelar falsa, mas ela deve ter essa possibilidade lógica para ser
científica, deve ser possível conceber essa situação. O cientista para Popper é aquele
que inventa hipóteses, ou dito de outro modo, conjecturas sobre um problema relevante,
e em seguida tenta honestamente testar tais conjecturas, e se elas forem refutadas ele
deve criar outra conjectura, mas agora sabendo que não pode cometer os mesmos erros
da conjectura anterior. Para Popper mesmo quando uma teoria passa nos testes, não
podemos acreditar que ela é verdadeira, ou foi verificada, pois a história da ciência nos
desmentiria. A sugestão de Popper é dizer que tal teoria foi corroborada, isso significa
que a teoria ainda não foi refutada, por tanto é racional aceitar ela. Assim a ciência

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Filosofia 2016

avança com o conhecimento, sempre tendo em vista que todas as teorias científicas
são “provisórias”, isto é, aceitas até que alguma outra teoria melhor venha a substituí-
la no futuro.
QUESTÕES DE REVISÃO: Você concorda que a ciência não começa com
observações? Faz sentido pensar que a ciência busca aprender com seus erros? Por que
uma teoria irrefutável não pode ser científica? Confirmar ou verificar teorias parece ser
uma das metas da ciência, você não acha?

EXERCÍCIOS
1. (Ufsj 2013) O Círculo de Viena foi um importante marco para a filosofia e,
exemplarmente, propôs que,

a) antes de ser classificado de percepção extrema ou subjetividade, todo e qualquer dado


deve ser sistematicamente analisado.
b) em qualquer evento, existe algo de subjetivo e isso é disfarçado pelas extraordinárias
extensões no mundo metafísico.
c) para ser aceita como verdadeira, uma teoria científica deveria passar pelo crivo da
verificação empírica.
d) no limite do que o sujeito pode perceber e do que é exatamente o objeto há um
abismo de possibilidades e é nisso que consiste a importância da metafísica.

2. (Uel 2007) Karl Popper, em “A lógica da investigação científica”, se opõe


aos métodos indutivos das ciências empíricas. Em relação a esse tema, diz Popper:
“Ora, de um ponto de vista lógico, está longe de ser óbvio que estejamos
justificados ao inferir enunciados universais a partir dos singulares, por mais
elevado que seja o número destes últimos”. Fonte: POPPER, K. R. A lógica da
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investigação científica. Tradução de Pablo Rubén Mariconda. São Paulo: Abril
Cultural, 1980, p.3.
Com base no texto e nos conhecimentos sobre Popper, assinale a alternativa
correta:
a) Para Popper, qualquer conclusão obtida por inferência indutiva é verdadeira.
b) De acordo com Popper, o princípio da indução não tem base lógica porque a verdade
das premissas não garante a verdade da conclusão.
c) Uma inferência indutiva é aquela que, a partir de enunciados universais, infere
enunciados singulares.
d) A observação de mil cisnes brancos justifica, segundo Popper, a conclusão de que
todos os cisnes são brancos.
e) Para Popper, a solução para o problema do princípio da indução seria passar a
considerá-lo não como verdadeiro, mas apenas como provável.

PARA FILOSOFAR MAIS


Os livros que nos ajudaram a elaborar esta Apostila I também podem ser úteis
para que você ―mate‖ curiosidades, aprofunde seus estudos e enriqueça seu
conhecimento filosófico.

ARANHA, Maria & ARRUDA. Filosofando – introdução a filosofia


ARMSTRONG, Karen. Breve história do mito
CHALMERS, A, F. O que é ciência afinal?
CHAUÍ, Marilena. Iniciação a filosofia
_______. Introdução a história da filosofia antiga – Dos Pré-Socráticos a Aristóteles
DUTRA, L. Introdução à teoria da ciência.
ELIADE, Mircea. Mito e Realidade
_______. O sagrado e o profano
FRENCH, S. Ciência: conceitos-chave em filosofia.
GALLO, Silvio. Filosofia – experiência do pensamento
GHIRALDELLI, Paulo. As aventuras da filosofia – de Parmênides a Nietzsche
HADOT, Pierre. O que é filosofia antiga?
MARCONDES, Danilo. A filosofia. O que é? Para que serve?

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Filosofia 2016

NIETZSCHE, Friedrich. A filosofia na época trágica dos gregos


PLATÃO. Apologia de Sócrates
_______. Banquete
VERNANT, Jean Pierre. Mito e pensamento entre os gregos

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