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Restricao do foro privilegiado 'nao resolvera 0 problema da impunidade’, admite Barroso BBC (http://www.bbe.com/portuguese/brasil-44032684) - by Nathalia Passarinho Da BBC Brasil em Londres O politico é prefeito, depois se torna parlamentar, deixa o Congreso e volta ser prefeito. E 0 processo penal acompanha todas as etapas dessa trajet6ria: vai de um tribunal a outro acompanhando o foro privilegiado de cada cargo. O resultado? Uma ado que pa anos tramitando sem jamais ser julgada. Aexpectativa é que a decisiio do Supremo Tribunal Federal (STF) de restringir 0 foro privilegiado de parlamentares imponha um limite a este vaivém de processos que é comum no Brasil. O relator do caso, ministro Roberto Barroso, no entanto, diz 4 BBC Brasil que a deciso esta longe de ser uma solugdo para a impunidade. Na verdade, segundo o magistrado, o principal efeito do novo entendimento é desafogar o Supremo, que atualmente retine mais de 500 processos e inquéritos contra deputados e senadores. "Essa decisdo do Supremo resolve o problema do Supremo, de tirar decisées politicamente explosivas do seu colo e de nao lotar o Supremo de centenas de processos criminais que nao fazem parte da sua vocacio institucional", disse o ministro, que esteve em Londres e em Oxford para participar do Brazil Forum UK, evento organizado por estudantes brasileiros no exterior. Na quinta-feira, 3, o STF decidiu que parlamentares federais sé serdo julgados pelo tribunal no caso de crimes cometidos durante o mandato e relacionados ao exercicio do cargo. Antes, o entendimento era de que a Constituigdo garantia o foro especial para qualquer tipo de crime, mesmo aqueles cometidos antes da posse. "Ela (a decisao) nao resolverd o problema da impunidade. O problema da impunidade no Brasil é um problema sistémico, de um sistema processual penal muito ruim e de um pais que adotou uma légica procrastinatéria. E todos participam dessa légica procrastinatéria, 0 juiz, o Ministério Piiblico ea advocacia", criticou, em referéncia aos tramites processuais burocraticos e as variadas possibilidades de recursos dos réus aos tribunais, que acabam retardando as decisées judiciais. Embora classifique a decisao sobre foro de "importante" por "abolir um sistema de privilégios", ele argumenta que a garantia de punicao efetiva a autoridades passa por uma mudanca de "cultura" quanto ao significado do direito de defesa num processo judicial. Para ele, "devido processo legal" nao pode ser encarado como processo que "nao acaba nunca". "Temos que romper com essa cultura (de procrastinacao), tanto no penal quanto no civel. Processo tem que levar seis meses, um ano. Se for muito complicado, um ano e meio. E ai acaba", defendeu. "Garantismo nao significa que ninguém nunca seja punido por coisa alguma. Portanto, é uma questao cultural de praticas judicidrias arraigadas acostumadas a um sistema que funciona muito mal, quando funciona." Alcance do foro Uma das principais dividas geradas pela decisio do STF ao restringir o foro privilegiado para parlamentares é se o mesmo principio vale para as demais autoridades, inclusive as julgadas em outros tribunais, como governadores e prefeitos. Para Barroso, sim. Ele defendeu que os ministros do Supremo e outros tribunais adotem, a partir de agora, nos casos concretos, o entendimento de que o foro privilegiado sé se mantém para crimes e improbidade administrativa cometidos durante 0 mandato e em razio do cargo publico. Processos contra ministros do Tribunal de Contas da Unido (TCU) que tramitam no Supremo ou de governadores que estejam no Superior Tribunal de Justica (STJ), por exemplo, poderiam ser enviados pelos relatores a primeira instancia se o réu ou investigado nao tiver cometido o crime durante o mandato. "cho que nés estabelecemos um principio, que é o principio de que as pessoas devem ser beneficiadas pelo foro quando praticam um ato no cargo e em razfio do cargo. Acho que esse principio vale para todo mundo’, afirmou a BBC Brasil. "Portanto, quando chegar o caso de um juiz, membro do Ministério Publico ou membro do Tribunal de Contas, acho que a gente deve operar com 0 mesmo prine{pio." Ele ressalvou, porém, que cada relator tera de analisar o caso concreto para verificar se ele se enquadra no entendimento. "Claro que pode haver alguma especificidade. £ muito dificil produzir decisdes abstratas prospectivas. Quando vocé lida com situagdes concretas, vocé é capaz de decidir solugées mais adequadas. De modo que, quando chegar um caso concreto envolvendo outras categorias, o Supremo vai decidir e tem que ser coerente com o mesmo principio", afirmou. Perguntado especificamente se espera que outros tribunais apliquem a restrigao de foro, com base na decisao do STF, Barroso respondeu: "Sempre que vocé toma uma decis4o, tem subjacente a ela uma légica e principio juridico. Portanto, acho natural que os outros tribunais apliquem esta logica ¢ este principio juridico a outros casos." A BBC Brasil perguntou ao ministro qual sera o impacto da decistio sobre foro pri porém, nao quis responder. ilegiado nos processos da Lava Jato que tramitam no Supremo. Barroso, Ele também no quis dar opiniao sobre situacdes concretas que ainda geram diividas quanto a aplicacio da restricio do foro — por exemplo, quando o crime écometido durante a campanha para a reeleicaio ou quando 0 politico pratica o ato num mandato com foro no STJ (governadores, por exemplo), mas depois é eleito para o Congresso Nacional, que tem foro no Supremo. “O Supremo nao decidiu sobre isso", disse Barroso, sem querer discutir essas hipéteses. Vara especializada Barroso disse ainda que, na opinido dele, a solucao ideal para o julgamento de politicos seria a criacéo de uma Vara Federal especializada, localizada em Brasilia, que seria composta por juizes indicados pelo Supremo e teria como prerrogativa julgar os processos de autoridades com foro privilegiado. Pela proposta do ministro, caberia recurso da decisao ao STJ ou ao STF, conforme a autoridade. Mas uma alteragao como esta dependeria da aprovagado de uma nova lei pelo Congresso. "Ha formulas alternativas. O professor Miguel Reale Junior propée que a competéncia deve ser dos Tribunais Regionais Federais. E ha quem defende que seja um juiz federal, porque a justiga estadual pode ter mais influéncia politica", lembrou. "Minha primeira hipétese é uma vara especializada, minha segunda é 0 Tribunal Regional e, na pior das hipéteses, um juiz federal.” BBC (http: //www,bbe.com/portuguese/brasil-44032684) - by Nathalia Passarinho Da BBC Brasil em Londres

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