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MAX HORKHEIMER e THEODOR W. ADORNO (Organizadores — Institut fiir Sozialforschung, Frankfurt) TEMAS BASICOS DA SOCIOLOGIA Tradugao de Atvaro CABRAL > EDITORA CULTRIX SAO PAULO I SOCIEDADE © que € que se entende por “sociedade” — essa drea de investigagio especifica da sociologia — parece ser suficiente- mente fécil de explicar: 0 conjunto de homens, com grupos de diversas dimensdes e significados, que compéem a humanidade. Entretanto, também é facil perceber que 0 conceito de sociedade no combina imediatamente com esse substrato e estamos mais préximos do que se considera préprio da sociedade se orientar- mos 0 conceito para os momentos de conjungao e separacao “homem” como uma série de individualidades biolégicas por cujo intermédio os seres humanos se reproduzem, controlam a natureza interna e externa, e das quais promanam, em sua pré- ptia vida, conflitos e formas de dominacio. Mas também esta maneira de ver as coisas, a que nos paises anglo-saxénicos se prefere dar o nome de “antropologia cultural”, aborda apenas © conjunto de significados que concorrem na palavra alema Gesellschaft, um desses termos histéricos cuja peculiaridade, segundo Nietzsche, consiste justamente no fato de nao se deixar definir: “Todos os conceitos em que um processo total se re- sume semioticamente escapam & definicéo, porquanto sé é defi- nivel o que nfo tem histéria.”* No seu mais importante sentido, entendemos por “sociedade” uma espécie de contextura formada entre todos os homens e na qual uns dependem dos outros, sem excecio; na qual o todo sé pode subsistir em virtude da unidade das fungdes assumidas pelos co-participantes, a cada um dos quais se atribui, em principio, uma tarefa funcional; e onde todos os indivfduos, por seu turno, esto condicionados, em grande parte, pela sua participacio no contexto geral. Assim, 25 © conceito de sociedade define mais as relajdes entre os ele- mentos componentes e as leis subjacentes nessas relagdes do que, propriamente, os elementos e suas descrigdes comuns. A sociologia seria, pois, antes de mais, a ciéncia das fungdes societérias, de sua unidade e de sua regularidade. Entretanto, convird recordar que, se este conceito de sociedade sé agora atingiu o seu pleno desenvolvimento, na fase de: socializacéo total da humanidade, a idéia de um contexto funcional, geral e completo, como forma de auto-reproducio de uma totalidade de divisio de trabalho é, contudo, bem mais antiga; com efeito, ela ja se prenunciava numa fase tao arcaica quanto a da filosofia naturalista e cosmogénica dos gregos, pata converter-se depois, com Plato, na base em que o Estado assenta. Por outro lado, o conceito de Sociedade como tal s6 veio a ser formulado durante a ascensio da burguesia moderna, como um conceito de auténtica “‘sociedade” em oposi¢io ao Pago. um “‘conceito de Terceiro Estado”.? Mas essa demora nfo foi devida a uma falta de consciéncia da constituiggo dos individuos em sociedade, em seu sentido mais restrito. Pelo contrdrio, as formas do processo de constituiggo em sociedade ou de “sociali- zacio” foram longamente meditadas na tradicao ocidental antes de se comecar a dar énfase ao individuo, que os sofistas, é certo, jé opunham & sociedade mas cuio pathos sé teria seu pleno de- senvolvimento com ‘o Helenismo e o Cristianismo, depois da cidade-estado grega ter perdido a sua autonomia. As formas de socializagzo — e, sobretudo, a socializagao dos individuos num Estado organizado e controlado — manifestaram-se, pre- cisamente, 20 pensaménto que comegava a refletir sobre a vida iada a algo que era sobstancial € presente, incontroverso e vigente sem contrastes, de modo que, diante do seu contetdo — isto é, 0 processo vital da humanidade — a reflexdo sobre 0 carter da sociedade resolve-se, quase sem problemas, num exame das suas instituigdes coisificadas. A cortina da mistifica- Gio societéria é tio antiga quanto a prépria filosofia politica. Plato baseou a totalidade abrangente do Estado nas rela- Ses funcionais entre os homens, as quais devem ser recipro- camente mantidas para satisfagio de suas necessidades vitais: Assim, digo que uma cidade nasce quando um de nés j& no se basta a si proprio e sente a necessidade de muitos outros. . . Por isso, quando um homem se aproxima de outro por uma 26 necessidade, e outro por outra, e havendo muitas necessidades, FeGnem-se num 36 lugar muitos companheiros auxiliares; € @ essa convivéncia damos o nome de cidade. 3 A comunidade citadina mais elementar consiste em quatro ou cinco homens que se ajudam mutuamente para satisfagao de suas necessidades e caréncias, procurando alimento, casa ¢ vestuério: Nao ter& que ser um agricultor, 0 outro arquiteto € © outro tecelio? Nao devemos acrescentar também um sapateiro ou algum outro que supra as necessidades do corpo? ... Assim, a cidade resultaria desses quatro ou cinco homens... Ora, cada um deles tera de colocar A disposigéo da comunidade o seu préprio tra- balho; por exemplo, o agricultor deverd fornecer alimento para os quatro, dedicando o quédruplo do tempo e de esforgos para obter sustento e reparti-lo com os demais? Ou deveré pensar 56 em si mesmo, obter um quarto dos mantimentos e consumir um quarto do tempo na agricultura, e dedicar as trés partes restantes de tempo livre, uma para arranjar moradia, outra para fazer suas roupas e a terceira para fabricar suas sandalias, sem se dar ao trabalho de repartir com os demais,e tratando apenas dos seus interesses? 4 A socializagdo é concebida na base da divisio do trabalho como meio para satisfazer as necessidades materiais de uma comu- nidade. Mas essa base converte-se no fundamento da teoria idea- lista de Platio. Uma condicao sine qua non da relacao funcional £ “que cada um s6 pode se dedicar eficazmente a uma tarefa e nao a muitas; e se preferisse a segunda alternativa, dedicando-se a uma quantidade de coisas, no teria éxito algum e sé conse- guiria adquirir mé fama” "A teoria das idéias propée, assim, um ctitério sobre o qual repousa a divisio do trabalho, no sentido de que cada individuo deve se ajustar a Idéia imanente que garante que o seu trabalho nfo serd destitufdo de valor; por outras palavras, ela propée uma limitagao hipostatica das capacidades individuais. As exigéncias aumentam com 0 avan¢o da civilizagéo, levam & ampliagéo da cidade e, depois, aos con- flitos bélicos com as cidades vizinhas. Faz-se necesséria a for magdo de uma classe de guerreiros. Finalmente, as proprias dimerisdes da cidade exigem uma classe especifica para a ma- nutengio da ordem e a determinacio dos objetivos comuns; tssa é a classe dos governantes. Neste esquema bisico da répiblica platénica jé estd implicita a teoria da transformacao 27 qualitativa da estrutura social, em conseqiiéncia do aumento quantitativo da populacio.® Este esquema oferece, além disso, uma critica as mais antigas teorias sociais. Por um lado, pretende refutar a antiga concep¢ao mitolégica da fundacdo divina da polis, que fazia de- rivar as leis da cidade das leis divinas, como ensinava Heré- clito.? Por outro lado, Platao refuta a tese de qué os homens viviam primitivamente dispersos e a sua congrega¢ao resultara da necessidade de enfrentarem unidos a natureza.® Mas o ataque principal.de Platao foi assestado contra a doutrina do direito natural, defendida pelo pensador ético. Nega que tenha existido jamais uma sociedade sem Estado e reduz tal conceito ao de uma “cidade de porcos”.® No tocante 4 sua oposicéo, polemicamente explorada por seus adversérios, entre o natural € © meramente positivo, Platéo tentou superé-la mediante a reducdo das formas de organizago a0 @ priori ontolégico, ou seja, 4 Idéia. A lei e a ordem sio, para ele, atributos da natureza humana.!° Deste modo, Platéo procurou sustar a tendéncia revolucionéria dos racionalistas dticos, que insistiam em separar a sociedade do Estado. Jd entéo o conceito de sociedade era uma arma na luta societéria. A doutrina do direito natural da esquerda socrdtica colocavase ao lado dos oprimidos contra os poderosos. O sofista Antifonte, por exemplo, baseou a socie- dade nas leis da natureza e o Estado, em contrapartida, em convencées humanas decorrentes de um contrato e que estéo para aquelas como a aparéncia em relagdo a verdade. Os regu- Tamentos humanos subjugam sempre o que é natural, prejudicam a liberdade, estorvam a igualdade entre os home..s € nfo servem para proteger contra a injustica." A ‘‘subversio de todos os valores” dos sofistas tende a anular a determinacio do nomos, do nascimento, do status social, da educacao tradicional, da riqueza e da f€ convencional, em beneficio de uma vida “natu- tal”. Ao cidadio da polis, vinculado a0 nomos, € oposto o cidadéo do mundo, cujos atributos sio a liberdade e a igualdade. A formacio de comunidades, a socializagéo, é, para esta doutrina fisica que pressupde a separagdo de physis e nomos, e que culminard no cosmopolitismo dos sofistas e dos pés-socré- ticos, 0 elemento primétio e “naturalmente dado” e que sé viré a ser limitado pela divisio do trabalho ¢ das instituigdes estabilizadas da polis. Na Stoa média, sobretudo com Panécio 28 Xv de Rodes, no século II a.C., 0 cosmopolitismo confunde-se com a nocao de Estado Universal. A Aumanitas realiza a iden- tidade da espécie humana e seu crdenamento utilitério.* Com isto, a refutacao estéica do Estado converte-se, entretanto, na absolutizaco do Estado, reflexo da unificacio das pequenas cidades-estados gregas sob o império macedénio e que, mais tarde, seria o sustentéculo do programa romano de império uni- versal. Daf surgiu uma das rafzes da concepc’o medieval da sociedade como universitas.™* Mesmo na teocracia agostinha, a concepsao do reino de Deus nada mais é do que uma “Cidade”. Assim se produziu uma reviravolta ideoldgica de extraordindrio alcance: o fator secundério, a Instituicao, passa para o primeiro lugar, na cabeca dos homens que vivem sob tais instituicdes e ‘que eliminam da sua consciéncia, em grande parte, o elemento verdadeiramente primordial, isto é, 0 seu efetivo processo vital. Nao hé dtivida de que para essa transformacao radical contribuiu © fato de que o trabalho material, gracas ao qual a humanidade continua subsistindo, permaneceu Vinculado “aos escravos durante toda a Antiguidade. Mesmo para Aristételes, os esctavos sao ‘exclufdos da definicio de Homem — e, portanto, compreensi- velmente,. do Estado; o grego tinha, para designé-los, o neutro avepamosuv que significa “pés de homem”. De qualquer niodo, as doutrinas de Panécio e Posidénio de uma humanidade uni- versal puderam se ajustar, sem dificuldades, a0 Estado univer- sal romano, ao imperialismo integral, servindo-lhe de. base ideo- Iégica, 0 que talvez ajude a explicar por que a filosofia estéica, com sua .ténica trégica, foi téo prontamente acolhida pelos romanos, apesar do seu notério positivismo. Até nestes para- doxos se revela claramente a {ntima compenetracao entre socie- dade e domfnio. Ainda hoje, a prépria palavra “Sociedade” tes- temunha, em todas as linguas, a maneira como, a par do signi- ficado universal, péde ser isolada e conservada uma outra acep- sao do termo: a de “boa sociedade”, a society, que abrange todos os que foram admitidos num cfrculo cujos membros se reco- nhecem reciprocamente pelos modos ¢ gestos de soberania social, quando nfo se encontram codificados, de forma mecdnica, num registro social, com o que, na verdade, o conceito de society € eliminado tendenciosamente. O conceito de sociedade sé voltou a florescer com o advento da época burguesa, quando se tornou visivel o contraste entre 29 as instituigGes feudais e absolutistas, por um lado, e aquela ca- mada social que j4 dominava entio o processo vital material da socieddde, por outro lado, e foi atualizado o antagonismo entre sociedade e instituigdes vigentes. O Estado deixa de ser aceito como imagem da Cidade de Deus (a civitas Dei). A sua origem e a relacdo dos homens com ele sao postas em -diivida. A identidade de Estado e Sociedade ainda niio esté: radicalmente dissolvida, na medida em que aquele se presta a ser interpre- tado por meio de uma analogia organica e mecanica com o “corpo” .!4 Entretanto, a Renascenga jd conhece reflexdes mais profundas. Jerénimo Cardano, por exemplo, estabelece uma distingao entre pequenas comunidades, que podem prescindir das leis, e grandes comunidades, cuja sobrevivéncia seria impossfvel sem leis. A ascenséo do individuo na jovem sociedade burguesa reforgou as tendéncias mais criticas ao Estado; o direito natural é uma reivindicacao do individuo perante o dominio absoluto e o poder do Estado.** O Estado deixa de ser considerado um dado imédvel ou “estético”, uma unidade auto-existente; com- poe-se de elementos distintos, os individuos, e 0 todo estatal é a soma destes. Assim se equacionou o problema de como e por que a parte. isolada se converte em todo social: Tal como num relégio ou outro mecanismo algo complexo € impossivel saber com exatidio qual é a fungio de cada uma das pegas e pequenas engrenagens, salvo desmontando o todo e estudando, um por um, a matéria, a forma e o movimento dos elementos, também, do mesmo modo, quando se investiga o direito do Estado e os deveres dos cidadios, € necessdrio, nio direi que 0 Estado se dissolva mas que o examinemos, outrossim, como se estivesse desmontado, isto é devemos entender bem a qualidade da natureza humana, em que aspectos ela € capaz ou nio de formar um Estado, e de que modo, quando os homens querem se juntar, devern estabelecer entre eles uma unidade. 18 Com a expressio “quando os homens querem se juntar” pretendeu Hobbes demonstrar que nio se chega a isso por reve- lagio divina mas por meio de uma deliberacio racional. O problema consiste agora na fundamentacio racional do Estado e da Sociedade. O “direito natural” que legitima o Estado e a Sociedade j4 consiste, para Hobbes, como pata os iluministas Posteriores, uma simples “ordem da razio natural”! 27 A mesma posicao € defendida por Voltaire quando afirma que a razio “& a nica causa que permite a sobrevivéncia da sociedade 30 humana”.!® Hobbes colocou explicitamente em divida a dou- trina do homem como um ser primitivamente: social, 0 zodn politikén: ® “O bomem néo é socidvel por natureza e sé logra sé-lo por educacio.” Os homens vivem primeiro sem institui- ‘Goes, num estado de igualdade em que cad@ individuo tem direitos sobre todas as coisas. O esforco para obter vantagens € poderes sobre os outros, faz com que “‘o estado natural dos ho- mens, antes de se reunirem em sociedade, fosse a guerra, uma erra de todos contra todos”” A “tendéncia natural dos jomens para se causarem danos recfprocos” 4 entra em conflito com as imposigdes da razfo natural, que exige “‘a preservagao da vida e'a possibilidade de cada um dos membros do grupo a con- servar”.* E esse conflito termina com o triunfo da Razao, isto é, com o contrato que assegura a cada um a propriedade de determinados bens. Assim entrou em jogo um novo argu: mento, a que a sociedade burguesa se ateria firmemente daf em diante: a doutrina segundo a qual a sociedade se baseia na pro- priedade privada, cabendo ao Estado a obrigacio de assumir a tutela dessa propriedade. Com essa finalidade e para salvaguar- dar o primeiro contrato, ou contrato social, estabeleceu-se. um segundo, o de domfnio, mediante o qual os individuos se subme- tem as Instituicées do Estado. O medo de todos a todos é suplantado agora pelo “‘temor a um poder que se situa acima de todos”. A convivéncia entre os homens — ou seja, a Socie- dade — sé € possivel em virtude da submissio dos individuos. Hobbes empenhou-se em resolver a dialética de forga e direito, * outorgando a primazia ao direito, vinculado a razfo, mas na medida em-que significava uma nova forca. Assim, 0 poder do mais forte, nd estado natural, converte-se em poder de dominio, no estado legal. . A doutrina,posterior da sociedade nao atacou menos a extrema sinceridade de Hobbes do que a dedugio teocrética do Estado por vontade divina.. Parece ainda menos aceitdvel derivar todas as formas de convivéncia social e civil da sujeicéo dos , individuos. Mas o pensamento foi atrafdo entio no pela possi- bilidade, abstratamente construfda, de uma sociedade sem insti- tuicdes mas pelo problema de uma sociedade com instituigGes legitimas, na qual o Direito se baseie na liberdade e nao na forga. Com efeito, € quase impossivel separar 0 conceito de Socie- dade na polaridade dos elementos institucionais e naturais. S6 31 existe constituicéo social na medida em que a convivéncia entre os homens é mediada, objetivada e “institucionalizada”. Inver- samente, as instituigdes nfo séo, em si mesmas, senao epifené- menos do traballié“vivo dos homens. A sociologia converte-se em critica da sociedade“a partir do instante em que ‘nfo se limita a descreyer © examinar as instituigdes e os processos sociais, mas trata, além disso, de confronté-los com esse subs- trato, a vida daqueles a quem essas instituicdes esto sobrepos- tas e dos quais elas prdprias.se compéem, nas mais diversas formas. Quando o pensamento sobre o caréter e a natureza.da sociedade perde de vista a tensio entre instituicdes e vida, e procura resolver o social no natural, nfo orienta um impulso de libertacao no que diz respeito a pressiio das instituigdes mas, pelo contrério, corrobora uma segunda mitologia, a ilusio ideslizada de qualidades primitivas que se referiria, na verdade, ao que surge através das instituigdes sociais. Um modelo extremo desta falsa e ideolégica redugdo naturalista da Sociedade é 0 mito racista do nacional-socialismo. A praxis, que a atacou, demons- trou de que forma a critica romantica das instituicdes, subtrafda ao vinculo da dialética social, afunda na dissolugao de todas as garantias protetoras do que é humano, no caos e, por fim, na total absolutizacgio da Instituiggo nua, do puro e simples dominio. c Encarado como, relacao ent consetvagao da vi tal e, por conseguinte, mais. como Fazer fo que como Ser, 0 conctito. de sociedade ¢ essencialmente dind- mico. O fato de que a tendéncia final de cada ciclo de trabalho ‘social € para deixar sempre um produto social maior do que o recebido do ciclo anterior jé implica, por si s6, a existéncia de um impulso dinamico. E a essa dindmica que se refere a dou- trina de Herbert Spencer sobre o desenvolvimento da sociedade, ao dizer que esta +++ -abrange todos os processos e produtos que as_atividades coordenadas de numerosos individuos pressupdem, atividades coor- denadas que produzem resultados amplamente superiores, em teu Ambito e complexidade, aos que obtém como resultado de cada atividade individual. 4 Esse “mais” e tudo o que subentende de possibilidades, necessidades e até conflitos, os mais varidveis, resulta, forcosa- mente, em modificagSes do status quo, sejam elas desejadas ou 32 os homens,.no quadro da. no pelos préprios homens ou por aqueles que os governam. - Por outro, lado, se bem que o aumento da riqueza social seja, entre outras coisas, uma das causas primordiais da autonomia “que as instituigdes formas de socializagio adotam para os homens, como um todo organizado, jf nao se identifica mais com os préprios homens e, pelo contrério, passou a se afirmar € consolidar. independentemente deles. O principio de sociali- zago era, ao mesmo tempo, um principio de conflito social entre o trabalho vivo e os momentos “estéticos”, como as ins- tituigdes coisificadas da propriedade. Nao foi gratuitamente que, com o advento da ‘sociedade industrial, a oposigio entre nomos % physis passou a ser entendida como antagonismo entre © Trabalho e a Propriedade. J& em St. Simon essas duas cate- gorias“desempenham um papel essencial. Hegel, diante da economia nacional cléssica, propés a completa elaboragio de uma nova relagio assim equacionada: a satisfacio das necessidades individuais s6 € possfvel, para cada individuo, mediante a “de- ia geral e reciproca”; e “a satisfacdo da totalidade das suas necessidades é um trabalho de todos”. “A atividade como trabalho e a necessidade como movimento deste também tém, do mesmo modo, o seu aspécto imobilista na propriedade.” Da telagao dialética entre trabalho e propriedade (ou posse) resulta nao sé o “geral”, a sociedade, mas também a prépria existéncia do individuo como Homem, como Pessoa.** Entretanto, a0 invés dos economistas, Hegel elaborou o seu conceito, de traba- Tho “ndo s6 em funcio da obra comum de transformagio do ‘mundo exteriot ¢ da distribuiggo das tarefas individuais entre os membros da sociedade mas, além disso, em funcao da his- téria do préprio"homem, da sua “formacio”. Conquanto a sociologia formal nfo ignore essas relacdes, ela procede de acordo com as regras de uma ciéncia classifica. téria, uma vez que cla propria jé s¢ institucionalizou, Assim, Comte foi o primeiro a dividir as leis da sociedade em estéticas SdinAmicas, Exigiu ele que “em sociologia... se faca a distin- $0 nftida, para cada objeto politico, entre o estudo fundamental das ‘condigdes da existéncia em sociedade ¢ as leis do seu per- pétuo movimento”. "Esta distingfo equivale a dividir “‘a fisica ‘social em duas ciéncias principais, a que poderemos chamar, por exemplo, Estdtica Social e Dinamica Social”. Comte identificou, de uma vez para sempre, dois princfpios que atuam no mundo: 33 os de Ordem e Progresso. Traduzindo o seu esquema para a sociedade, corresponder-lhe-4 também um “dualismo cientifico”, a que Comte se referiu nos seguintes termos: E evidente que 0 estudo esthtico do organismo social deve coincidir, em ditima andlise, com a teoria positiva da otdem, a qual s6 pode consistir, essencialmente, numa justa harmonia per- manente entre as diversas condigées de existéncia ‘das sociedades humanas; e ainda mais claramente se entende de que forma o estudo dindmico da vida coletiva da humanidade constitui, ne- cessariamente, a teoria positiva do progresso social. se, pondo de lado toda a idéia inGtil de perfeicgo absoluta e ilimitada, nos dermos conta de que ela se reduz, como é natural, a simples nogio desse desenvolvimento fundamental, 28 Por outro lado, esté muito préximo disto a tentacio de converter em eterno o momento institucional, por causa da sua “estdtica”, e de menosprezar 0 momento dindmico do processo vital da sociedade como algo mutével ¢ causal. Comte nao deixa de sustentar a relagio de ordem e progresso, “‘cuja conjugacao {ntima e indissohivel tanto caracteriza a dificuldade fundamental como o primeiro recurso de todo e qualquer sistema polftico au- téntico”.” Mas este programa é contraditado tanto por sua ten- déncia polftica como pelo seu método quase-naturalista. Como lhe parece que o desenvolvimento total da sociedade burguésa redun dard na desintegragio anérquica da prépria sociedade, Comte trata de-subordinar o progresso a ordem. Até num pensador dialético como Marx ressoa ainda essd divisio em estdtica e dinamica. E nem “mesmo hoje a saciologia se. livrou inteiramente. dela. Marx contrapés as leis naturais e imutdveis da sociedade aquelas que so especfficas numa determinada fase do desenvolvimento, “o maior oumenor grau de desenvolvimento dos antagonismos sociais” e as “leis naturais da producao capitalista”% Para tal confronto, o seu pensamento recorreu a idéia de certas categorias -com tendéncia para se eternizarem em tudo o que para Marz era “pré-hist6ria”, o-império da falta de liberdade, as quais s6 poderiam sofrer uma ‘transformagdo, em seu miodo de, manifes- taco, através da forma moderna e racionalizada da sociedade de classes; o préprio trabalho livre assalariado_¢ escravidao. 20 Saldtio; uma espécie de ontologia negativa, portanto, ou se pre- ferirem, a profunda do do que & existencjal na Histéria, 0 dominio e a falta de Tiberdade, e do modo pouco decisive 34 como até esse momento fora assinalada essa realidade, apesar de todos os progressos realizados na ratio ¢ na tecnica. Contudo, a divisio, entre invariantes e modificagdes, entre sociologia “estitica e dindmica, é insustentével. Ela é incompa- tivel"com © préprio conceito de sociedade como unidade indis- soliivel de ambos os momentos. As leis histéricas de determi-, nada fase nfo constituem simples modos de manifestagio de leis mais gerais mas, pelo contrério, todas as leis so instru- mentos conceprusis criados com a finalidade de dominar -as tensGes sociais suas origens tedricas. Assim fazendo, a ciéncia movimenta-se em varios planos de abstracdo, sem que por isso lhe seja licito representar a prépria realidade como se fosse uma montagem desses varios niveis. Um dos desiderata essenciais da sociologia atual consiste, justamente, em liber- tar-se da precdria antftese entre estdtica e dindmica social que se manifesta na atividade cientffica, sobretudo como antftese entre as doutrinas conceptuais da sociologia formal, por um lado, e 0 empirismo sem conceptualizacéo, por outro. A ciéncia da sociedsde nao pode submeter-se ao dualismo de um substan- cial mas amorfo Aqui e Agora, e de uma universalidade cons- tante mas vazia, a menos que queira deformar o objeto com o seu préprio mecanismo conceptual. Pelo contrério, a compreen- séo-da estrutura dinamica da sociedade exige um. esforgo_infati- Ravel de ‘unididé“éntre o geral eo particular. Essa unidade perde-se, inclusive, sempre que a sociologia se limita a fazer definig6es’ genéricas da sociedade, por exemplo, quando a socie- ‘dade é definida’ como “‘o conceito mais geral que abrange todas as relages do homem com os seus semelhantes”, onde o con- creto est4 de antemio excluido: A sociedade nada mais ¢ do que uma parte da totalidade da vida social do homem, sobre a qual os fatores de heredi riedade e inatos influem tanto quanto os elementos culturais conhecimentos e técnicas cientificas, -religies, sistemas éticos e metafisicos, e as formas de expressio artistica’ — proporcionados pelo meio. Sem estas coisas, nao existe sociedade; elas atuam em todas as manifestagGes concretas da sociedade dem que, por esse fato, elas préprias sejam-a sociedade. Esta abrange apenas 0 it > complexo de relagles sociais como tais, 29 Este tipo de abordagem predomina, sobretudo, na sociolo- gia formal alema. “O esqueleto objetivo da sociedade pode ser 35 totalmente reduzido a conceitos quantitativos e mensuréveis, de acordo com os quais ela seré descrita.” 2 © “cardter objetivo” das formagées no se funda- menta nas suas “objetivagdes", em suas criagdes coletivas: patri- ménio cultural, simbolos, regulamentos, normas, etc... _ Essas configuragées sociais de “segunda ordem” sé tornam verificavel pelo observador, somadas a outros sintomas, a eficdcia objetiva da “sociedade” e representam, para o seu membro, a configu: Tago social como tal. Mas essas objetivacées, longe de constitu: rem a prépria substincia da sociedade, sio os conteidos da vida social, © objetivo da sociologia nio é a obra de arte nem a doutrina religiosa mas a totalidade dos processos de socializaglo que ocorrem em relagio com o aparecimento daquelas, em sua Tecepgio, transformacdo e comunicacao. Assim, por exemplo, a vida artistica ou religiosa, quando socializada. 31 Contra esta concepgio € conveniente insistir em_ que o conceito de sociedade abrange, precisamente, a unidade do geral e do particular, na correlacgo total e reproduzivel dos homens. Poder-se-4 perguntar em que consiste uma sociologia assim con- cebida, em relago ao que se entende por Economia, tanto mais que um de seus temas principais, as instituicées, sio suscetfveis, em grande medida, de reconstrugio por meio de categorias eco- némicas. A tinica resposta a tal objecéo é que, em principio, a prépria ciéncia econdmica, tal como se nos apresenta hoje em dia, refere-se, quando muito, a um célculo derivado, jé coisifi- cado ou, em tetmos gerais, ao mecanismo da sociedade de permuta altamente desenvolvida. Mas, na realidade histérica, as partes contratantes das operaces de troca nfo entraram, nem entram, nas relagdes racionais recfprocas exigidas por aquelas mas acomodam-se, outrossim, nessas relacdes sociais — e de uma forma decisiva — as diferencas do poder real, as disposigdes sociais diversas, e isto no sé na época mais recente do capita- lismo altamente diferenciado mas em todas as épocas passadas em que seja legitimo falar-se de sociedade no sentido aqui ana- lisado. Portanto, 0 processo vital basico que Proporciona a sociologia o seu objeto ¢, sem diivida, um processo econémico. Mas, nas leis econdmicas, j4 vamos encontrar a sociologia esti- lizada num sistema conceptual de operacGes rigorosamente ra- cionais, sistema esse que se adota tanto mais assiduamente como esquema esclarecedor quanto menos realizacao efetiva encontrou. A sociologia sé € econémica na medida em que & economia polf- 36 tica e daqui se deduz uma teoria da sociedade que volta a instalar na ordem. social as formas vigentes da atividade econémica, isto 6 as instituigdes econdmicas, A dinamica da sociedade como cotrelagao funcional de ho- | mens expressa-se, no plano mais elevado, no fato de que, por tudo o que o curso da Histéria nos permite ajuizar, a tendéncia da socializacto dos homens é para aumentar, isto é, em termos getais, hé cada vez “mais” sociedade. Spencer jé fizera esta observaco e apontara uma série de causas: 9 aumento pro- gressive dos agregados sociais, a interagio da sociedade e dos seus elementos componentes, assim como dé uma sociedade. com as sociedades suas vizinhas, e a “acumulacgo dos produtos super- orginicos”, como os instrumentos materiais, a Ifngua, o saber €/as obras de afte: Reconhecida a verdade fundamental de que os fendmenos sociais dependem, em parte, da natureza dos individuos e, em Parte, das forgas a que eles estéo sujeitos, vemos que estes’ dois grupos de fatores, profundamente diversos entre sive que sio a causa das modificagées sociais, se interligam cada vez mais com outros grupos, A medida que essas modificagdes se ampliam e intensificam. A influéncia do meio organico e inorganico, que se mantém desde 6” comeco e que é agora quase invaridvel, logo se modificaré também, por seu turno, sob a influéncia da’ socie- dade em desenvolvimento. © simples aumento da populagdo faz entrar em jogo novas causas de modificagdo, cuja importancia aumenta progressivamente. As influéncias da sociedade sobre as entidades que 2 compdem e destas sobre aquela colaboram, de forma incessante, na criagio de novos elementos, Na medida em que as suas dimensdes e articulaglo interna aumentam, as socie- dades reagem mutuamente, ora em embates bélicos, ora em Permutas comerciais, e assim determinam outras transformagses ainda mais profundas. Os produtos ‘superorganicos, que se tornam cada vez maiores e mais complexos, constituem, além disso, outro grupo de fatores cujo efeito transformador est em constante aumento. E assim acontece que cada passo para a frente deter. mina, nos fatores de transformagio, por mais complicados que sejam, novas e maiores complicagées, porquanto geram outros fatores que crescem constantemente em complexidade e poténcia. 32 A formulagio de Spencer do avango da socializacio esté consubstanciada na sua famosa teoria da Progressiva integracfo e diferenciacio da sociedade. Ambas sio complementares: O crescimento de uma sociedade no nimero de seus mem- bros e na sua consolidaggo interna dé-se simultaneamente com 37 © aumento da heterogeneidade, tanto em sua organizaco politica como industrial. 33 Integraco e diferenciacZo representam, para Spencer, as leis fundamentais do processo de socializagio. O seu conceito ‘de intégracao est4, pois, essencialmente caracterizado através do aspecto quantitativo do processo de socializacao: A integragio manifesta-se na formagio de uma massa maior e no progresso dessa massa para uma coesdo que se deve a estreita vineulagao de todas as suas partes. 4 O momento qualitativo, que Spencer define como “‘incre- mento da estrutura interna”, expressa-se, por outro lado, na categoria da diferenciagio: “Sao necessérios complexos corre- . para possibilitar a vida combinada de uma extensa 38” A tese da integracdo progressiva foi confirmada; 9 préprio termo entrou também no jargdo do fascismo, quando “sobre uit “estado “integral”, se bem que 9 ultaliberal Spencer jamais pudessé imaginar que a sua Teoria acabaria so- frendo semelhaite reviravolta em sua fungao social. O conceito de diferenciagio é 0 que se reveste de uma validade mais problematica. Estabelece a correlagaq entre’ o progresso da socializacio ¢_a divisio do trabalho mas.deixa na sombra uma ‘tendéncia oposta que também estd implicita na divisio cada vez maior do trabalho. Essa, tendéncia contrapGe-se @o conceito de diferenciagéo: quanto menores séo as unidades ‘em que se subdivide o processo social da producio, com o avango da divisio do trabalho e da racionalizacio da produgio, tanto’ mais ‘as operagdes laborais assim subdivididas tendem a assemelhar-se e a perder 0 seu momento qualitativo especifico. Portanto, 0 trabalho do operério industrial apresenta-se, de um modo geral, menos diferenciado que o trabalho do artesio. Spencer nfo previu que o processo de “integragio” tornaria supérfluas muitas categorias intermédias que complicavam e diferencavam o todo, as quais estavam vinculadas @ concorréncia e ao mecanismo de mercado, pelo que, em muitos de seus aspectos, uma, sociedade verdadeiramente integral é muito mais “simples” que a do liberalismo, em seu petfodo de apogeu; com efeito, o carter complexo das relacdes sociais, na atual, sobre o qual tanto se discorre, atua freqiientemente como 38 uma simples cortina que tapa essa simplicidade essencial. Esse processo talvez cortesponda a uma tendéncia regressiva para a menor diferenciagio e a um maior primitivismo, em termos subjetivo-antropolégicos. A grandiosa concepgao spenceriana permite-nos, pois, observar até que ponto uma teoria como esta, de espfrito rigorosamente positivista, é incapaz de se proteger eficazmente contra o perigo de hipostasiar um elemento tempo- rétio, a diferenciago progressiva que se produziu em determina- do momento da sociedade burguesa-liberal altamente desenvol- vida, interpretando-o como se fosse uma lei eterna; o mesmo tem sido feito, aliés, com assiduidade, pela sociedade burguesa, ao converter suas leis histéricas em leis absolutas, na perspec- tiva dos princfpios de liberdade e igualdade que nelas se expres- sam formalmente.’ Por outra parte, a perda de diferenciagéo na_sociedade atual nao sé é um fato- positivo, uma espécie de economia de cargas supérfluas mas, simultaneamente, € um fato Profiindamente negativo, que esté ligado, de forma indissohivel, a0. sutgiménto da barbérie no- préprio amago da Cultura e no qual vemos em agdo aquele “‘igualitarismo nivelador” de que tanto foram acusados, em seu tempo, os criticos da sociedade. Mas‘o aumento da socializacio: manifesta-se mesmo na fase atual, em dois aspectos, um qualitativo e o outro quantitativo. Por um lado, a “socializagio” de mais indivfduos, grupos hu- Manos, povos, arrasta-os para o contexto funcional da. sociedade. Essa tendéncia socializante j4 se intensificara de tal modo no século XIX que mesmo os paises que se tinham mantido na retaguarda do pleno desenvolvimento capitalista viam-se, apesat disso, envolvidos na socializagéo, no sentido em que “nao ser ainda” capitalista ou “nao estar ainda totalmente” capitalizado constitufa uma das fontes da multiplicagdo do capital nos pafses dominantes e dava lugar, justamente por isso, a lutas politicas ‘e sociais. Hoje, em virtude do progresso dos meios de trans- porte e das técnicas de comunicacao, a descentralizacao industrial e tecnoldgica previsivel, entre outras coisas, a socializacio da humanidade est4 se aproximando de um novo ponto culminante; © 0 que parece estar “de fora” mantém-se nessa sua extraterri- torialidade, mais como algo que é tolerado ou que se situa num plano mais amplo, do que em virtude de uma auténtica e indis- cutfvel manutencdo do “éxético”. Recorde-se, neste ponto, a verdade trivial de que o progresso acelerado da socializagio nfo 39 é, sem mais nem mais, uma fonte de pacificacio universal nem de supera¢éo dos antagonismos. Na prépria medida em que o principio de socializagao é intrinsecamente ambivalente, os seus Ptogressos reproduziram, pelo menos até agora, todas as contra- digSes j4 conhecidas, sé que em nivel cada vez mais elevado. Se é valida a conhecida formula de Wendell Willkie de “One World”, entio poderfamos dizer que esse “Um S6 Mundo” se caracteriza pélo fato de ter dado a luz dois monstros, os dois “‘Blocos” armados até aos dentes um contra o outro. Serd apenas exagerado dizer que o desenvolvimento da sociedade total faz-se acompanhar, inevitavelmente, do perigo de total aniquilacio da humanidade. : Existe um outro sentido em que temos cada vez “mais” sociedade. A rede de relagdes sociais entre os individuos tende a ser cada Vez mais densa; é cada vez mais reduzido o ambito em que o homem pode subsistir sem elas. E € caso para indagar. sé tais momentos auténomos e tolerados pelo controle social ainda poderao se formar e em que medida. Em seu sentido estrito, 0 conceito de sociedade estabelece aqui uma linha divi- séria entre a sociologia e a antropologia, na propria medida em . que o objeto da segunda depende amplamente, por sua vez, do processo de socidlizacio. Por outras palavras, o que a teflexao filosdfica tradicional parecia ser a propria esséncia do Homem € determinado, em cada'uma de suas partes, pela natureza da sociedade e sua dinfmica. Isto nao quer dizer, exatamente, que os homens tenham sido mais livres em épocas passadas da vida social ou que devessem, necessariamente, sé-lo. Transparece aqui a ilusdo segundo a qual a sociedade é medida pela bitola do liberalismo e a tendéncia para a socializacio total, na fase pés-liberal, é uma nova forma de opressao. Entretanto, é ocioso querer averiguar se o poder e o controle social numa sociedade de troca, levada as suas ultimas conseqiiéncias, sio maiores ou menores que na sociedade baseada na escravatura estatal, como ocorria, por exemplo, nos antigos impérios da Mesopota- fiia e do Egito. Mais legitimo ser, pelo contrério, observar que foi, justamente, pelo fato de, muito, mais tarde e, sobretudo, na era burguesa, a idéia de Individuo ter se cristalizado e, inclusive, adquirido uma configuragao real, que a socializagio total péde adquirir agora aspectos que nfo possufa em tempos. idos e pré- -individualistas de Cultura barbara: | Rigorosamente ‘falando, a socializagio afeta o ‘“homem” como pretensa individualidade 40

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