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Resumo:
Apresento aqui uma reflexão sobre a noção de ficção como instrumento heu-
rístico nas Ciências Sociais, a partir do relato do processo de produção de uma
etnoficção produto da pesquisa que realizo com uma Companhia de Circo-Teatro,
gênero de teatro popular brasileiro que se caracteriza pela comédia de costumes e
pelo drama circense. A prática do vídeo na pesquisa aponta a noção de reflexivida-
de, quando a pesquisa tematiza os caminhos pelos quais as verdades sobre o outro
são produzidas. O vídeo, como meio de estimular a produção de performances na
pesquisa etnográfica, permite a devolução de feedbacks na pesquisa ao grupo, que
amplia o diálogo, restituindo a seus membros as performances produzidas, que as
comentam, e criam um distanciamento reflexivo de si mesmos. Trabalhando com
a noção de personagem vemos as múltiplas faces da reflexão de cada um sobre si,
abrindo multiplicidades em que se configuram cada ator-personagem. Experimen-
tando diferentes máscaras os atores afirmam todas elas. No estudo sobre os papéis
de gênero que se constroem nesse universo empírico, a etnoficção foi a elaboração
metodológica capaz para fazer emergir a fala de mulheres e transexuais sobre suas
experiências vividas. A caracterização dos distintos papéis que encontramos no
grupo ilumina a compreensão da sexualidade como operador do humor no univer-
so da comédia popular brasileira.
Palavras-chave:
Vídeo etnográfico; Reflexividade; Performance; Personagem; Etnoficção.
1 Esse trabalho foi apresentado no Simpósio Antropologia, Performance e o Filme Etnográfico, do 53º Congresso
Internacional de Americanistas, em julho de 2009, na Cidade do México.
2 Pesquisadora do Laboratório de Imagem e Som em Antropologia - LISA, e do Núcleo de Antropologia, Perfor-
mance e Drama – NAPEDRA, da Universidade de São Paulo/USP, Brasil.
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A Etnoficção e o Personagem como Duplo.
Vídeo mediando o processo auto-reflexivo.
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desaparecer a cada instante, como se escamoteasse a si mesma, e para conseguir
que no vazio de sua corporeidade se aloje Ofelia. A realidade de uma atriz, en-
quanto atriz, consiste em negar a sua própria realidade e substituí-la pela persona-
gem que representa. Isto é representar: que a presença do ator sirva não para ele
presentar-se a si mesmo, mas para presentar outro ser distinto dele. Dir-se-ia que a
realidade se retirou para o fundo a fim de deixar passar através de si, como à con-
traluz de si, o irreal. No palco encontramos, pois, coisas e pessoas que têm o dom
da transparência. Através delas, como que através do cristal, transparecem outras
coisas” (Ortega y Gasset, 1991:35). Esse vazio de que fala o teatro – ser meio, ser
ponte, emprestar-se à metáfora –, vestir uma nova máscara a cada noite para fazer
o mesmo: relacionar-se com a platéia, é o central no jogo da representação, nesse
teatro de repertório. No Circo-Teatro, os atores reapresentam os mesmos perso-
nagens vividos há gerações e atualizados no instante da representação teatral. A
riqueza da comédia popular tradicional é presentificada em cada cidade, a cada
reapresentação.
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papéis tematizando as relações inter-raciais, ou ainda, o filme Folie ordinaire d’une
fille de Cham.
Extensa bibliografia tem sido produzida acerca da obra de Rouch. Ele próprio
escreveu poucos artigos sobre o seu trabalho havendo, sobretudo, entrevistas pu-
blicadas. No interior do Grupo de Antropologia Visual do Laboratório de Imagem e
Som em Antropologia – GRAVI/USP, tivemos a possibilidade de travar contato com
Jean Rouch em 1996. A partir desse contato, realizamos um vídeo, Jean Rouch,
subvertendo fronteiras5 , refletindo sobre a recepção da obra de Rouch e de seus
principais conceitos, no cinema documentário brasileiro. Noções como antropolo-
gia compartilhada, etnoficção e cine-transe são centrais para a compreensão da
obra do autor. No artigo “On the vicissitudes of the self: the possessed dancer, the
magician, the sorcerer, the filmmaker, the ethnographer” (Rouch, 1978), o autor
parece fazer um esforço por problematizar as relações entre o cineasta, os mem-
bros do grupo com suas diferentes posições e relações e o acontecimento filmado,
no caso os rituais de possessão na Africa. Dessa reflexão, surgem os conceitos de
cine-transe e antropologia compartilhada. Rouch parece materializar em sua obra
as influências de Flaherty que encena o Homem de Aran, e de Vertov, que produz
com sua câmera-olho, “impregnações do real”.
Nos últimos anos, aparece na revista francesa L´Homme, em seu volume de 2005,
um número dedicado ao tema. Vérites de la fiction é o seu recorte temático e os
artigos ali publicados expõem diferentes pontos de vista sobre o tema. Colleyn
(2005), comentando a obra de Rouch afirma que o seu trabalho etnográfico se
emancipa da observação terra a terra e passa a se interessar pelas produções do
imaginário. Assim como Flaherty cuja abordagem estava em descobrir toda a di-
mensão dramática da vida dos homens filmados à fim de exprimi-la cinematogra-
ficamente. Uma vez que não existe linguagem sem recurso à metáfora, reconhece-
mos que definir a realidade é sempre um ensaio, uma tentativa. Então convidamos
o leitor a compartilhar uma história cuja especificidade é não estar vinculada ao
binômio verdadeiro/falso. A ficção supõe a não pertinência do julgamento em ter-
mos de veracidade. Como na ficção artística visamos alcançar universos simbólicos
que mobilizam universais.
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na pesquisa etnográfica; exercendo influências sobre a chamada antropologia pós-
moderna. James Clifford, em seu livro A experiência etnográfica. Antropologia e
Literatura no séc. XX (2002), pensa mesmo a escritura como criação ficcional que
tenta alcançar a narrativa coletiva da cultura sobre si própria. Crapanzano (2005),
com a noção de “cena” mobiliza uma escrita com imagens, fala em “horizontes
imaginativos” e diferencia o “real” da esfera da vida cotidiana do imaginário inter-
subjetivamente compartilhado, capaz de constituir a “cena” que tem o poder de
influir sobre a esfera da percepção. Richard Price (2004) é outro antropólogo norte
americano que tem desenvolvido experimentos com narrativa na construção da et-
nografia. A partir de campos de estudo específicos, como por exemplo, os estudos
sobre sexualidades, o recurso à ficção pode ser pensado nessa chave metodológica.
Frank (2000) parece elaborar o recurso à etnoficção para lidar com a sexualidade
de freqüentadores de prostíbulos nos Estados Unidos da América. O universo do
desejo e o discurso sobre as práticas sexuais são mais densamente problematizados
com o recurso à fabulação.
O personagem e o Duplo
A atriz Luciane Rosã reelabora prontamente o seu duplo: uma mulher que vai ao
circo e se torna admiradora de seu trabalho. A mulher que ela seria se não tivesse
aderido à vida de circo, casada, mãe de dois filhos. Essa subjuntividade, “que seria
eu se não tivesse sido...” instaura uma situação de reflexão e produção de repre-
sentações sobre a sua história pessoal, mobilizando todos os valores importantes
para a compreensão de sua situação como mulher e atriz no circo.
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A produção de representações pelas diversas posições de gênero, localizadas no
universo empírico da pesquisa é o exercício do “falo”, do tornar-se sujeito. A fala é
viva, móvel e relacional. A produção das diversas performances de gênero, “quando o
Outro deixa de falar em mim e FALO EU”, é, nessa investigação, um caminho para a
compreensão do “que um sujeito pode se tornar sendo também mulher” (Kehl, 1998).
Nessa busca por levantar as falas da mulher, encontro o jogo dramático, essa in-
diferenciação ator/personagem, a projeção para possibilitar a emergência da fala.
A personagem elaborada por Luciane é público do circo. Ela fala do personagem da
peça Chá de panelas, uma noiva que desiste do casamento após o ritual catártico
na festa do chá de panelas.
Assim temos uma personagem que comenta o personagem que a atriz interpreta.
“O sonho dela é conhecer a Luciane, ela não conhece a mulher ela conhece a
personagem e ela se identifica e tem o interesse de conhecer”.
A personagem:
A atriz fala:
“Eu consegui descobrir dela assim é que, - como eu poderia falar? - ela é um eu
que eu seria se eu não tivesse entrado no teatro. A minha vida seria como a vida
dela se eu não tivesse entrado no teatro. Meio louco, né? É engraçado que eu fiquei
imaginando ela. Uma das coisas que eu mais gosto de fazer é ficar estudando o
personagem”.
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espetáculo eu fiquei rondando o circo e eu vi a Luciane indo se servir na mesa de
jantar deles. E ela se serviu e foi pro trailer dela. Achei que teria a oportunidade de
conhecer ela melhor. Que eu já tinha visto a vida dela pela internet sabia que ela
tinha dois filhos. E como eu tinha dois filhos também, pensei: ‘nossa como a gente
é parecida’. Fiquei esperando ela jantar e pensei em bater na porta dela. De repente
as luzes do trailer se apagaram. Puxa vida! Eu estava no limite entre a porta no lado
de dentro e a porta pelo lado de fora”.
“Digamos: ela é - eu fui noiva - e ela, na verdade, foi a mulher que casou com o
meu noivo. Que teria casado, lá na frente. E ela tem dois filhos e está separada do
marido. Ela se separa dele, porque o marido viaja muito e ela tem que viajar com
esse marido. Ela não tem esse contato direto - que eu tenho no meu trabalho com
os meus filhos-, ela, por causa do trabalho, teve que se afastar dos filhos. Os filhos
cresceram, a ela nem percebeu, ela vai notar isso quando ela se separa. E ela vem
para o circo só pra assistir o espetáculo e acaba se identificando com a persona-
gem que a atriz Luciane Rosã está representando”.
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Em Deslocamentos do feminino, Kehl (1998) afirma a necessidade de separar as
mulheres dos ideais de feminilidade do século XIX e reconhecer o campo de possi-
bilidades identificatórias que constituem a diversidade de ‘escolhas de destino’ (e
não só de escolhas de neurose) das mulheres como sujeitos, para além do par casa-
mento/maternidade. “Reconhecer os recursos fálicos identificatórios das mulheres
contemporâneas não como sintomas a serem curados, (mas como expansões do
limite do eu e modalidades de satisfação pulsional ao alcance de qualquer sujeito)
– o único falo impossível a uma mulher é aquele que no homem, só tem valor fálico
se ela o reconhecer” (Kehl, 1998:336). Essa possibilidade passa por questionar as
relações que se estabelecem entre a mulher, a posição feminina e a feminilidade.
‘Homem’ e ‘mulher’ são os primeiros significantes que nos designam no mundo,
antes de qualquer possibilidade de escolha ou mesmo de desejo. Somos desde o
início e para sempre ‘homens’ ou ‘mulheres’ porque a cultura assim nos designou e
nossos pais assim nos acolheram a partir da mínima diferença inscrita em nossos
corpos, com a qual teremos de nos haver para constituir, isto sim, o desejo, a posi-
ção a partir da qual desejamos, o objeto que haveremos de privilegiar e o discurso
a partir do qual enunciamos nossa presença no mundo.
A proposição do tema do amor no circo faz surgir uma série de outros perso-
nagens: uma lutadora que encena uma história de amor entre uma empregada
do circo e o filho do proprietário, uma velha moradora da cidade que perde seu
marido, que vai embora com o circo, a transexual que se prostitui na noite da
cidade, o marido que trai a esposa, um namoro homossexual... O casamento é a
forma mais freqüente de passar a fazer parte do universo circence, e esse é um
dos temas que move e motiva nossos personagens. Uma das respostas ao convite
à criação da máscara dramática foi a construção de personagens a partir de tipos
(a velha, a empregada, a esposa), a reflexão sobre o caráter do personagem (que
traz forte carga de valor) e a representação de personagens imorais, a experimen-
tação da transformação da piada em cena. Tudo indica, no caminho da elaboração
do roteiro, o desenvolvimento da forma dramática. No entanto, o riso, mobilizado
pela comédia abriga em um mesmo movimento a empatia e o distanciamento da
situação da qual se ri, uma ambigüidade.
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é o material narrativo - a fábula - , o relato puro, não modalizado pelo discurso
(Pavis, 1999). O relato se materializa na história a ser transmitida, na fábula. A pes-
quisa está na localização das instâncias enunciadoras, os pontos de vista a partir
dos quais a história seja narrada. A construção dramática pressupõe a instauração
da ficção, a ilusão. Na diegese naturalista os procedimentos de enunciação são
escamoteados, isso é diferente do modo de proceder de Brecht, por exemplo, que
sublinha os efeitos narrativos da diegese.
Trata-se aqui não apenas de produzir um puro registro do real, mas de fazer do
conhecimento uma forma de produção de representações densas, que iluminem
universos simbólicos em relação, que sustentam ações. A potência de fabulação -
de imaginação do real e construção de si - é uma criação, uma afirmação do real
como novo. O vídeo etnográfico, como forma de conhecimento, é uma forma de
produção de performances que configura sujeitos. A linguagem do vídeo tem um
papel ativo na criação e na descrição dessas relações sociais. Nessa antropologia do
simbólico que estamos realizando, o imaginário é fonte do conhecimento humano.
Na pesquisa com imagens, a ciência tem que religar campos dispersos do saber e
caminhar para um tipo transversal e polifônico de cognição.
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a produção da etnoficção conta com uma antropologia compartilhada para tecer
esses alter-universos numa criação dramatúrgica.
A Metodologia da Etnoficção
Com o vídeo etnográfico, retomo, no diálogo etnográfico com os artistas que são
transexuais, as “práticas parodísticas baseadas numa teoria performativa de atos
de gênero que rompem as categorias do corpo, sexo, gênero e sexualidade, ocasio-
nando sua re-significação subversiva e sua proliferação além da estrutura binária”
(Butler, 2003:11). No universo transformista, a sexualidade é algo a ser perfor-
matizado publicamente. Em busca de uma poética das múltiplas performances de
gênero, considero que o pensamento denso corre bem perto das coisas, na própria
pele da existência. Num jogo de presenças e ausências da superfície do corpo, lo-
calizamos a construção do gênero como ausências significantes.
Um “ponto de vista situado” (Haraway, 2004, Callaway, 1992; Nader, 1999) é o que
torna possível a consideração de posições que se caracterizam pela ausência. A re-
presentação – como dialética da presença e da ausência – se vale dessas perspectivas
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outras. Considerar a perspectiva do sujeito social e por em evidência as fontes possí-
veis de decisão do investigador é algo a ser considerado. Na reflexão sobre o caminho
da pesquisa, o pesquisador vai se ajustando ao problema estudado. Artaud, autor
com o qual quero dialogar nesse trabalho, apresenta em sua obra uma ruptura entre
as coisas e as palavras, as idéias, os signos que são a representação dessas coisas. Ele
propõe: “é preciso acreditar num sentido de vida renovado pelo teatro, onde o ho-
mem, impavidamente, torna-se o senhor daquilo o que ainda não é, e o faz nascer”.
Ricoeur (1984) em Temps et rècit reflete sobre a narrativa de ficção. Localiza mu-
tações na função narrativa em relação ao modelo aristotélico proposto na poética.
Pensa que a configuração narrativa do romance apresenta uma novidade em rela-
ção ao modelo vigente anteriormente. Auerbach (1971) é outro autor que aponta o
mesmo fato. As funções do personagem e o seu fluxo subjetivo parecem tomar o
lugar do conflito no drama. A ação passa a aparecer como transformação moral do
personagem. O cotidiano é outro elemento que ganha espaço nessa nova configu-
ração do relato de ficção. Estes elementos do debate contemporâneo constituem
um corpus de reflexão para a pesquisa em torno do elemento diegético no drama.
A redução da mimesis à imitação, à cópia da realidade não parece ter sido con-
cebida por Aristoteles, mas pelo naturalismo que surge no início do século XIX e
dura ainda no século XX. Brecht critica o naturalismo ao tecer suas críticas ao tea-
tro. Bolognesi reafirma a necessidade de superar a oposição entre o dramático e o
épico, apontando que em ambos a potência da fabulação é o que está em questão.
É no século XIX que a motivação naturalista, que exige fidelidade à realidade, se
impõe e à ficção é deixado o lugar de ilusão. Essa concepção parece ter influencia-
do também o campo da ciência. Quando o realismo na ciência se impõe deixamos
de experimentar a construção de linguagem necessária para referir o mundo no
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discurso. Um empobrecimento do texto afirma um real único, no seu desenvolvi-
mento máximo, perspectivo.
O teatro passa a ser pensado como relação entre pessoas presentes – o ator e o
espectador. Esse processo se dá no momento em que “o domínio exclusivo do teatro
até então – a representação animada de pessoas em ação – foi conquistado e supe-
rado pela nova matriz de representação técnica do cinema. Ao mesmo tempo que a
teatralidade passa a ser concebida como dimensão artística independente do texto
dramático, começa-se a reconhecer, mediante o contraste com a imagem movimen-
to produzida tecnicamente, o fator do processo vivo como diferencial específico do
teatro” (Lehmann, 2007:82). Segundo Guènoun (2004), o fenômeno da catarse, pro-
piciado pelo teatro desde a antiguidade, e no qual se realiza a empatia entre persona-
gem e espectador, deixa de se dar no espaço do teatro e passa a se realizar privilegia-
damente no cinema e na televisão. Frente a esse dado, todo um debate e uma série de
experimentos vêm sendo realizados já há algumas décadas na elaboração do que faz
do teatro uma arte necessária, uma vez perdida a sua predominância no espaço da
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identificação que caracteriza as artes dramáticas. O teatro afirma a potência do jogo
do ator que representa presentificando-se, exercendo o duplo ator-personagem. As
investigações de linguagem presentes nesse campo parecem apontar desdobramen-
tos experimentais no que tange às relações entre identificação e distanciamento. Um
esgotamento da forma dramática parece consolidar um paradoxal desenvolvimento
do afastamento épico, criando espaço reflexivo.
Parece que o diálogo com o debate no campo das artes recoloca e amplia as
questões tal como são formuladas no campo disciplinar. Em contextos diferen-
tes encontramos referências a uma noção de presença que amplia os debates em
torno dos problemas da representação. Na antropologia autores que se pensam
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como produtores de uma crítica cultural (Marcus, 1986; Clifford, 2002; Crapanza-
no, 2004) fazem eco aos debates do campo das artes cênicas e visuais. Isto posto,
caberia perguntar se o filme etnográfico, que parte da tradição da escrita etnográ-
fica, que surge articulando a possibilidade de entendimento da alteridade, a partir
da cisão entre sujeito e objeto na produção de conhecimento, não teria algo a
dialogar com esses debates.
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valores compartilhados por um povo, dando forma ao sentimento comum na busca de
encontrar eco em seu público. A tarefa do antropólogo de compreender o sentimento
do outro, os valores profundos do imaginário social nos quais há essa carga semântica
profunda compartilhada, passa por esse mesmo método do ator. Encontramos a diver-
sidade das maneiras de ser humano e, nessa pesquisa específica, as diferenças constru-
ídas a partir do feminino, do masculino e dos que em sua performance constroem seus
eus plurais de fronteira.
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