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O teatro musical dos Estados Unidos nasceu a partir de uma tradição que veio da
opereta e do vaudeville1. Assim como aconteceu no Brasil, estes chegaram aos EUA
importados da Europa e deram início à Broadway no final do século XIX, período em
que nasceram os primeiros espetáculos de teatro musical. Nestes tempos, tinha-se o
canto lírico como base técnica para o trabalho do ator cantor, cuja impostação era
diversa da voz falada. Já no início do século XX, o musical norte americano se
estabeleceu dramaturgicamente de uma forma mais próxima da que conhecemos hoje –
dentro de uma estrutura aristotélica, isto é, com início, meio e fim, e com a busca por
parte dos criadores (compositor e letrista) de fazer com que a ação dramática e a música
estivessem amalgamadas, evitando que a canção se tornasse um momento destacado da
linha de ação do espetáculo.
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Vaudeville foi um gênero de entretenimento de variedades predominante nos Estados Unidos e no
Canadá do início dos anos 1880 ao início dos anos 1930. Noite após noite, vários números que não
tinham ligação entre si eram levados ao palco, tais como músicos, dançarinos, comediantes, animais
treinados, mágicos, imitadores, acrobatas, peças em um único ato ou cenas de peças, atletas etc.
é fundamental o contato com as energias interiores, criadoras, as
energias potenciais do artista. Somente assim a arte estará revelando o
ser, adquirindo um sentido mais profundo, transcendente. Para revelar
é necessário mostrar e articular. As ações físicas, por serem a
corporificação dessas energias interiores do ator, constituem-se no
meio pelo qual ele articula seu discurso (BURNIER, 2009, p. 54).
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VIBRATO: Ele tem um efeito estético evidente e um papel primordial porque ele dá a voz sua riqueza
expressiva, sua leveza e seu poder emocional. Ele se caracteriza por modulações de frequência, (na razão
de cinco a sete vibrações por segundo), acompanhadas de vibrações sincrônicas da intensidade de dois a
três decibéis e da altura ¼ de tom e ½ tom que tem uma influência sobre o timbre. Estas flutuações são
criadas pelo cantor e tem uma ação musical importante. Em: http://www.aulas-de-
canto.com/o_vibrato_da_voz.html Acesso em: 13/12/2010
3
PALATO: O palato separa a cavidade oral da porção nasal da farínge e é dividido em duas regiões: os
dois terços anteriores (porção óssea), denominados palato duro e o terço posterior móvel(porção
fibromuscular) denominado palato mole. O palato forma um arco no teto da cavidade oral. Esse
arqueamento é presente no sentido antero-posterior e transverso. Em:
http://medworks1.tripod.com/Anatomia/palato.htm Acesso em: 13/1w/2010.
4
LARINGE: A laringe é um tubo sustentado por peças de cartilagem articuladas. É uma câmara oca onde
a voz é produzida. Encontra-se na parte superior da traquéia, em continuação à faringe. Em:
http://www.webciencia.com/11_08laringe.htm Acesso em 13/12/2010.
interno da boca e da garganta enquanto se fala. Devido a essas diferenças entre a voz
lírica e a voz falada, os grandes criadores de teatro musical iniciaram inúmeras
tentativas de tornar o canto algo mais “natural” e verossímil. O que se tentou fazer,
primeiramente, foi experimentar no canto o uso da laringe na “mesma” posição da voz
falada. O segundo passo foi deixar o espaço da laringe um pouco constringido como ele
é enquanto se fala normalmente. No entanto, “os recursos tecnológicos daquela época
não eram avançados como os de hoje, não havia microfone na cabeça para um elenco de
60 pessoas” (TAGLIANETTI; BUSTAMANTE; SOUZA, 2009). Era necessário saber
projetar a voz. Desse modo, foram chegando ao som metálico, quase nasalizado, e com
forte projeção, aproximando-se cada vez mais da técnica que hoje se denomina
Broadway Belt.
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OROFARINGE: A orofaringe, bucofaringe, mesofaringe ou porção bucal da faringe ou garganta, é uma
região anatômica que nasce na porção mais posterior da boca. Em: http://pt.wikilingue.com/es/Orofaringe
Acesso em: 13/12/2010
muito “grandes”, porque esse ressonador é altamente necessário para o belter8, cuja
projeção vocal é forte e impactante, o que explica o uso da expressão belting, que deriva
do verbo inglês to belt, que significa “cantar alto”, “ bater com força”.
O canto lírico está em sua base, e Ana Taglianetti reforça essa idéia ao dizer que:
a base da técnica vocal, seja ela qual for, deve partir do lírico, técnica
que proporciona fortalecimento, alongamento e resistência imbatíveis.
A partir desse fortalecimento, do alongamento e da resistência,
construo a técnica da voz modal9, seja para o canto popular ou seja
para o belting. Meu primeiro contato com a técnica foi nos EUA, e
aprendi o belting a partir da técnica lírica, e assim a ensino.
(TAGLIANETTI, et.all., 2010)
Devido a isso, pode-se afirmar que essa técnica só tem a contribuir na estética do
teatro musical. Ela instrumentaliza e preserva o ator cantor, se este possui um aparelho
vocal treinado para aplicá-la da forma correta.
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Denomina-se belter o cantor que se utiliza do Broadway Belt como base técnica para realizar sua
performance vocal.
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REGISTRO MODAL: Este registro está associado ao músculo tireoaritenóideo (TA), também conhecido
como músculo vocal, pois faz parte do “corpo” das pregas vocais. A voz falada (tanto masculina quanto
feminina) utiliza-se normalmente deste registro para ocorrer. Em:
http://bompravoz.blogspot.com/2010/04/o-que-sao-registros-vocais.html Acesso em 13/12/2010
Cinco Anos de Nós Dois é uma montagem baseada no musical The Last Five
Years, de Jason Robert Brown. Adaptada ao contexto paulista, a trama da história trata
do relacionamento de um casal, Jamie Guimarães e Catarina Marques, desde o dia em
que eles se conhecem ao dia em que se separam, do ano de 2005 ao ano de 2010. Sob o
ponto de vista das personagens, interpretadas por Renato Ziggy e Ana Taglianetti, a
história dos dois é contada em ordem cronológica e anticronológica, respectivamente. A
peça é constituída de quatorze cenas, dentre as quais são distribuídas quatorze canções
versionadas em português, sendo seis solos para cada atuante e dois duetos para o casal.
Além dos atores, este musical conta com a direção de Ana Taglianetti, com iluminação
de Clarice Rena e Lélia Rolim e com dois pianistas, Kelline Apolinário e Frederico
Natalino.
Esta peça foi estudada a partir da análise dramatúrgica e musical das partituras 10
das músicas. Partiu-se do pressuposto de que a partitura é o guia de interpretação para o
ator cantor de teatro musical, uma vez que o criador da mesma é um “compositor
dramaturgo” (TAGLIANETTI, et.all., 2010). Tudo aquilo que ele compõe é concebido
com um pensamento dramatúrgico. Tudo quanto ele for traduzir em música representa
uma série de situações ligadas ao drama. Cada nota, acorde, formato de linha melódica é
minuciosamente estudado. Nada é aleatório. Ou seja, tudo quanto foi escrito pelo
compositor dramaturgo é para ser interpretado detalhadamente, porque cada detalhe
registrado ali, na partitura, tem uma razão de estar lá.
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PARTITURA: Representação gráfica do conjunto dos sons e silêncios de uma obra, partes instrumentais
ou vocais de um trecho musical em que as diversas partes simultâneas aparecem sobrepostas. Em:
http://agnazare.ccems.pt/EB23EMUS/glossario_a_z/glossario_p.htm Acesso: 13/12/2010
Escutem muito cuidadosamente a música. Vocês precisam ouvir nela a
razão do que vocês estão fazendo e de como estão fazendo (as ações
cênicas). (STANISLAVSKI, RUMANTSEYEV, 1998)
Meu preparo técnico como belter para uma melhor execução dessa ação vocal
foi feito através de um estudo teórico prático do Broadway Belt e da sua aplicação
dentro de um contexto cênico musical. Esse trabalho de pesquisa se deu através de aulas
particulares de canto lírico e belting com Ana Taglianetti, da montagem de Cinco Anos
de Nós Dois e da escrita deste artigo. Por meio da encenação deste musical, bem como
da concepção deste artigo, tive a oportunidade de aplicar e refletir criticamente sobre a
técnica que venho pesquisando. O elemento dificultador foi a inexistência no Brasil de
referências bibliográficas no meio acadêmico sobre o Broadway Belt. Toda a base
teórica encontrada para redigir este documento se deu através da análise de artigos
encontrados na rede Internet, estando todos em inglês, e principalmente de gravações
em áudio e vídeo de palestras ministradas por Ana Taglianetti no Projeto “Viva Música”
na EMUFMG.
No que remete às aulas particulares que venho fazendo há cerca de um ano,
muitas tem sido as descobertas a respeito de minha voz. Uma delas é que, tanto dentro
da terminologia do canto lírico quanto do belting, sou baixo barítono. Tanto na ópera
quanto no teatro musical, as personagens mais adequadas para o meu timbre vocal são
grandes vilões ou homens mais velhos, posto que minha voz é mais escura e tenho
maior extensão para notas mais graves. Em função disso, as maiores dificuldades que
encontrei neste processo foi de trabalhar minha extensão vocal nas regiões agudas.
Devido à influência do lírico e principalmente por falta de consciência corporal e
preparo técnico, costumava reter muito ar ao cantar e deixar minha voz presa na
garganta, fazendo esforço além do necessário, o que a deixava pesada e sem brilho. Isso
me atrapalhava a subir nos agudos, em detrimento do excesso de tensão concentrado na
minha laringe. Como o Broadway Belt trabalha com uma maior expulsão de ar – se
comparado ao canto lírico, meu sopro se tornou mais leve, inclusive no lírico, e meus
agudos passaram a soar melhor e a ter mais brilho. Minha extensão vocal aumentou
consideravelmente, e hoje consigo cantar com mais facilidade peças que exploram
regiões mais agudas para um baixo barítono, como em algumas cenas do meu TCC.
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Os pianistas se encarregaram de realizar as transposições de um tom abaixo das canções cantadas por
mim.
pessoais foram de extrema importância, uma vez que, sem o auxílio presencial da
professora, tive que adquirir a autonomia de analisar sozinho os elementos das músicas,
utilizá-los no meu trabalho atoral, e traduzi-los na minha voz, através de uma série de
recursos, como colocar mais ou menos ar na voz, usar abertura horizontal e vertical da
boca, posicionamento de laringe, projeção vocal, falsete12, mix13 etc.
Considerações Finais
Referências
DEER, J.; DAL VERA, R. Acting in Musical Theater: A Comprehensive Course. New
York: Routedge, 2008.
MELLO, Luis Otavio Sartori Burnier Pessoa de. A arte de ator: da técnica a
representação : elaboração, codificação e sistematização de técnicas corpóreas e
vocais de representação para o ator. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2009.
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Voz de cabeça masculina.
13
Mistura de voz de peito com voz de cabeça.
________________________. e RUMANTSEYEV, P. Stanislavski on Opera. New
York: Routledge, 1975