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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

ARTES CÊNICAS

Estética, Crítica e História das Artes


Cênicas

PROJETO DE MESTRADO

Rainha[(s)]: olhando através do vazio


entre atrizes e personagens.

Prof. Dr. Paulo Marcos Cardoso Maciel

Ouro Preto/MG – Julho de 2018


INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

Rainha[(s)]1 é o que posso chamar de um verdadeiro espetáculo teatral. Trata-se


de uma livre recriação da peça Mary Stuart de Friedrich Schiller, interpretada pelas atrizes
Georgette Fadel e Isabel Teixeira, com direção de Cibele Forjaz. Dentre os 18
personagens da obra original, as atrizes brincam com o texto, suas vidas, anseios e
paixões, totalmente perceptíveis na encenação. O primor da montagem leva o espectador
o tempo todo a se deslocar no espaço-tempo na busca pelo entendimento da realidade
fenomenológica da representação, ou seja, tudo que aquilo que aparece diante da mente
(o que vemos? Quem vemos? Quem ou o que está jogando com quem ou o quê?),
causando assim um instinto investigativo nas suas quase duas horas de espetáculo.
Como aponta TEIXEIRA, p. 126, talvez a beleza desse trabalho esteja na coragem do
risco de escancarar suas imperfeições. [...] A pedra bruta é parte da joia, e, talvez por
isso, encante com sua simplicidade, quase, pueril das atrizes expostas em cena e
dilaceradas pelo coração.
Desde que comecei como um sujeito ativo nas artes cênicas em Macapá/AP no
ano de 2009, me percebia como uma criança ávida por novidades e belezas. O ato de
expectador me era mais valioso que o de agente ativo dentro do teatro, seja ele em qual
área for. Queria mesclar essas realidades (espectador-ator-encenador-iluminador-
sonoplasta-etc.) para que meu fazer teatral dialogasse com o maior número possível de
“atores”. Entre convites e projetos, fui tentando aprimorar esse olhar multióptico entre
realidades e estéticas, e cada vez mais com o desejo de realizar trabalhos que atingissem

1
Em conversas por e-mail com a atriz Isabel Teixeira (Bel), indaguei sobre o nome do espetáculo e se era
uma escolha estética ou uma função linguístico-artística, e eis a resposta: Me lembro que quando
estávamos decidindo o nome da peça, eu estava escrevendo as ideias num papel sobre a mesa da sala
de ensaio. Escrevi Rainhas. Cibele falou que topava ser esse o título, mas fazia questão do subtítulo, que
ela já tinha na cabeça: “duas atrizes em busca de um coração”. Fui rabiscando essas ideias no papel. E ao
mesmo tempo tentando pensar em tudo que estávamos fazendo. Aí eu coloquei o "s" entre parêntesis. Pois
se trata de duas rainhas para uma só coroa. Ou seja: só há lugar para UMA rainha na briga entre as elas.
Isso é histórico, faz parte da luta entre Elizabeth I e Mary Stuart. O “S” entre parêntesis, graficamente,
emprisiona o “s”, deixa ele preso. Reforcei a ideia com os colchetes. Duplo emprisionamento. O “S",
portanto, estaria preso duas vezes. Se Elizabeth prende Mary Stuart na torre, ela de alguma forma também
está presa no seu histórico dilema: matar ou não matar uma Rainha. Se ela abre o precedente, também
coloca a sua cabeça em risco, certo? Fora isso, o emprisionamento do “S” deixa o plural relativo. A Rainha
da peça é singular. Não há possibilidade de Rainha no plural. É isso que move a peça. Tudo isso para te
dizer que, na minha opinião, existe uma explicação nessa escolha. Fora que é um poema gráfico se
pensarmos assim, você não acha? É uma escolha estética E uma função linguístico-artística!
públicos diversos, de formas diversas. Na esfera do espectador presenciei criações
felizes em suas escolhas simbólicas, outras nem tanto, outras com pequenos detalhes a
serem acertados, outros com conjunto completo de acertos. Ainda busco um
aprimoramento do olhar técnico da diferenciação entre o trabalho do ator e o da direção
na encenação, acredito que seja um fazer crítico essencial na análise de espetáculos,
para que as palavras soltas não interfiram, de forma positiva ou negativa, na continuação
de qualquer trabalho.
O conceito de ma me veio através de um vídeo no YouTube
(https://www.youtube.com/watch?v=Kyp3YV2t0gQ&feature=youtu.be) no qual o
youtuber discorre sobre a importância do vazio na obra cinematográfica de cineasta
japonês Hayao Miyazaki (Meu amigo Totoro, A Viagem de Chihiro, O Castelo Animado,
A Princesa Mononoke, dentre outros). Desde então me pus a entender melhor esse vazio.
Nas minhas investigações percebo o ma como um local de possibilidade e contemplação,
ou seja, o vazio que permite que algo aconteça por ele, não como um fim em si mesmo,
como no ocidente. É procurar o espaço e aproveita-lo. É no espaço vazio que tudo pode
acontecer, tudo pode ser criado. Não há espaço só para a frente: procurem no alto,
embaixo. E mesmo retornando ao mesmo lugar, sempre há algo novo, um sentimento de
encontro e reencontro (ONO apud SINZATO, p. 105). Os artistas ocidentais vêm
utilizando este conceito e aplicando-o em vários objetos artísticos como no cinema, nas
artes visuais, na pop art, e outras áreas para dar conta de novas estéticas e objetos
artístico-culturais, reinventando olhares sobre obras já consagradas e as que ainda estão
por vir.
A relação do jogo entre atriz-personagem surgiu após o espetáculo Rainha[(s)], o
que antes era desconhecido até então. A interpretação das atrizes é de encher os olhos,
e o jogo proposto prende desde o primeiro minuto até o desfecho final da peça, o que me
chamava bastante atenção. Desde então passei a olhar mais atentamente a relação
ator/atriz-personagem em cena, e como isto se dava, todavia foi em Rainha[(s)] que esta
percepção é mais latente, e talvez por isso eu queira usá-lo como objeto de investigação.
Comungo da ideia de GUINSBURG, p. 112, de que elas souberam manter, e que
conseguiram revalidar teatralmente o coração palpitante da suposta peça histórica: o do
embate entre duas mulheres igualmente fortes, cada uma a seu modo, de seus egos
avassaladores, sob a capa da majestade real, dos interesses políticos nela envolvidos,
e, na essência, no fundo, das irrecusáveis pulsões de suas feminilidades, sexualidades
e de seus super-egoismos, nas formas da simbologia histórica de seu tempo.
Percebia ali um local vazio, uma brecha no espaço-tempo preenchido pelo público,
na qual não se tinha nome nem fim, não era um vazio comum, era algo maior do que
nada, uma possibilidade. Fui encontrar no extremo oriente uma resposta, e o ma veio
solucionar essa lacuna. Não preencher mas ampliar esse vazio para que possamos olhar
com maior amplitude o que habita nesta relação entre atriz e/- personagem. O conceito
do ideograma ma, é usado aqui para definir esse vazio, ou esses espaços vazios entre
atriz e personagem, onde se cria uma indistinção, uma indiferenciação entre o que é da
atriz e o que é do personagem, o que torna indistinto a fronteira que os separa, já que,
em primeira análise, não sabemos o que é da atriz e o que é do personagem.

OBJETIVOS

Objetivo Geral

Analisar o conceito de Ma, como elemento de criação existente no jogo entre atriz-
personagem no espetáculo Rainha[(s)].

Objetivos Específicos:

Apontar e diferenciar o trabalho do ator e do performer numa encenação.


Investigar o jogo ator/atriz-personagem nas encenações contemporâneas.

Levantar fortuna crítica, além de consultas a anotações do espetáculo Rainha[(s)],


como objeto de análise.

Catalogar instrumentos de análise, tal como apontado por Patrice Pavis, para
maior aproveitamento do material coletado.

Identificar e aplicar o conceito de Ma, localizado no processo de criação e na


encenação, no jogo entre atriz-personagem no espetáculo Rainha[(s)].
REFERENCIAL TEÓRICO

Rainha[(s)] nasceu de um desejo da atriz Isabel Teixeira em montar a peça Maria


Stuart de Friedrich Schiller, porém, logo no início do processo, tinha o destino de se tornar
outra coisa. Com a ausência do dramaturgista desde sua gênese, Isabel, a atriz
Georgette Fadel e a diretora/encenadora Cibele Forjaz tinham uma
[...] o texto construído nesse processo, “com o sangue do nosso coração ralado”, é
resultado de grandes transformações e questionamentos pessoais sobre os nossos
papéis como mulheres e artistas, direto dessa fronteira de tempos múltiplos e histórias
justapostas, para nossa realidade cotidiana, o espetáculo único de cada noite (FORJAZ,
p. 118).

Uma garantia que tínhamos o tempo todo era de que as energias que seriam movidas
com esse trabalho seriam as do coração (FADEL, p. 130).

Isto é mais que interpretar um papel servindo-se de uma voz previamente escrita. Isto é
criar uma voz a partir das próprias entranhas e, num jogo com essas rainhas míticas,
reinar sobre a cena. Não é um plano de voo fácil, nem é para qualquer um (RAMOS, p.
189).

Em minutos o espectador transita de um espaço da avenida Paulista para o Castelo de


Fotheringhay onde Mary Stuart foi decapitada. Não é um jogo fácil, mas Cibele Forjaz
juntou o infinito com o imediato dentro da cenografia de Simone (RIOS, p. 194).

O Ma, enquanto possibilidade, associa-se ao “vazio”, que, distinto de uma concepção


ocidental cujo significado é o nada, é visto como algo do nível da potencialidade, que
tudo pode conter, e, portanto, da possibilidade de geração do novo. É, por conseguinte,
o vazio da disponibilidade de nascimento de algo novo e não da ausência e da morte
(OKANO 2014, p. 151).
[...] tem se a impressão de um deslizamento do teatro em direção a manifestações
hibridas, em que as pesquisas da cultura e os jogos do ator adquirem igual ou maior
importância que a resultante especificamente cênica (FERNANDES, p. 84).

METODOLOGIA

Levantar dados bibliográficos acerca:


• Da análise de espetáculos;
• Dos tensionamentos entre realidade-ficção no teatro contemporâneo;
• O conceito do ideograma Ma (間), e sua aplicabilidade nas artes;
• Do trabalho e da diferença do ator e do performer na encenação.
Inventario da fortuna crítica do espetáculo Rainha[(s)].
Elaborar e aplicar entrevista com as atrizes Georgette Fadel e Isabel Teixeira e a
diretora Cibele Forjaz.
Analisar o material coletado a partir dos instrumentos catalogados.

6- PLANO DE TRABALHO

1 REL[AÇÕES]
1.1 ATOR/ATRIZ E/OU PERFORMER?
1.2 ATOR/ATRIZ-PERSONAGEM.

No primeiro capítulo, o título trabalha com a proposta de que as relações no campo


das artes dramáticas e da performance, é mais uma ação do que uma teoria, não
descartando a segunda, mas usando-a de suporte para pensar com o corpo esta relação.
No item 1.1 a proposta é apresentar uma discussão atual sobre o tema do trabalho do
ator e do performer dentro da encenação, visto que cada qual possui função e ações
distintas dentro do processo, e como tem se resolvido esta rel[ação]. No item 1.2 definido
os locais do ator e dor performer, apresentarei algumas referencias e problemáticas do
jogo entre ator e/- personagem nas encenações contemporâneas.
2 ONDE ESTÁ MEU CORAÇÃO?
2.1 O ESPETÁCULO RAINHA[(S)].
2.2 O JOGO ENTRE ATRIZ/PERSONAGEM

O título do segundo capitulo faz uso da pergunta norteadora do espetáculo em


questão, para trabalhar as questões do próprio espetáculo. O item 2.1 será apresentado,
com detalhes, trechos importantes, para que o leitor possa identificar na escrita da análise
os pontos tratados mais a frente. Penso que detalhes na hora de relatar uma encenação,
fazem a diferença na apreensão do conteúdo a ser investigado. No item 2.2 tratarei da
relação atriz-personagem dentro do espetáculo, que penso ser bastante única em relação
as encenações já feitas com o mesmo jogo. Como já suscitado, o primor e sutileza desta
transição é quase imperceptível e potente, que arrebata o espectador de tão tênue, e por
isso com méritos de ser apontada e investigada.

3 OLHANDO ATRAVÉZ DO VAZIO


3.1 Ma (間): UMA POSSIBILIDADE.
3.2 NO VAZIO ENTRE ATRIZ-PERSONAGEM

No terceiro e último capitulo a investigação em questão será posta em prática. No


item 3.1 o leitor será orientado historicamente da chegada do ma no ocidente, seu
conceito original e como esta chegada repercutiu na comunidade artística da época e
como reverberou até os dias atuais nas diferentes manifestações artísticas ocidentais.
Por último, no item 3.2, será aplicado o conceito na relação atriz-personagem dentro do
espetáculo, pensada também como uma proposta dentro do processo de criação. A
proposta é pensar o conceito como uma possibilidade de aplicação para novos processos
de criação teatrais e performáticos.
6- CRONOGRAMA

ANO 2018
ATIVIDADES PREVISTAS J F M A M J J A S O N D
Créditos das disciplinas obrigatórias
Créditos das disciplinas optativas
Levantamento Bibliográfico
Orientações
Elaboração da Entrevista
Levantamento da fortuna crítica
Aplicação da Entrevista
Sistematização do Material Coletado
Sumário Provisório
Qualificação
ANO 2019
ATIVIDADES PREVISTAS J F M A M J J A S O N D
Análise do Material Coletado
Orientações
Elaboração da Estrutura da Escrita
Redação da Dissertação
Entrega da Dissertação
Defesa da Dissertação
REFERÊNCIAS

FADEL, Georgette. Sala branca. Sala Preta, Brasil, v. 8, p. 127-130, nov. 2008. ISSN
2238-3867. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57360/60342>. Acesso em: 24 de Abril.
2018.

FERNANDES, Sílvia. Teatros do Real. In Teatralidades Contemporâneas. São Paulo.


Perspectiva. 2010. Pág. 83-86.

FISCHER-LICHTE, Erika; BORJA, Marcus. Realidade e ficção no teatro contemporâneo.


Sala Preta, Brasil, v. 13, n. 2, p. 14-32, dec. 2013. ISSN 2238-3867. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/69073/71517>. Acesso em: 05 de Abril
de 2018.

FORJAZ, Cibele. Cego guiando cegos. Sala Preta, Brasil, v. 8, nov. 2008. ISSN 2238-
3867. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57358/60340>.
Acesso em: 26 de Abril. 2018. doi:http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-3867.v8i0p.

GUINSBURG, J.. Um mais um mais um igual a dois. Sala Preta, Brasil, v. 8, p. 111-119,
nov. 2008. ISSN 2238-3867. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57357/60339>. Acesso em: 24 de Abril.
2018.

OKANO, Michiko. Ma: entre-espaço da comunicação no Japão um estudo acerca


dos diálogos entre Oriente e Ocidente. 2007. 195 f. Tese (Doutorado em
Comunicação) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.

______________. Ma – a estética do “entre”. Revista USP, Brasil, n. 100, p. 150-164,


feb. 2014. ISSN 2316-9036. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/76178/79922>. Acesso em: 26 de
setembro de 2017.

PAVIS, Patrice. Análise dos Espetáculos. São Paulo. Perspectiva. 2005.


RAMOS, Luiz Fernando. Atrizes merecem cetros e louvores. Sala Preta, Brasil, v. 8, p.
189-190, nov. 2008. ISSN 2238-3867. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57367/60349>. Acesso em: 24 de Abril.
2018.

RAINHA[(S)] - Duas Atrizes em Busca de um Coração. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural


de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/evento521590/rainhas-duas-atrizes-em-busca-de-
um-coracao>. Acesso em: 19 de Setembro. 2017.

RIOS, Jefferson Del. Teatro/crítica. Sala Preta, Brasil, v. 8, p. 193-194, nov. 2008. ISSN
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<http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57369/60351>. Acesso em: 24 de Abril.
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TEIXEIRA, Isabel. A escrita na cena: anatomia de uma dramaturgia do coração. Sala


Preta, Brasil, v. 8, p. 121-126, nov. 2008. ISSN 2238-3867. Disponível em:
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SINZATO, Alice Yumi. Ma, O vazio intervalar. Revista Ciclos: Transgressão. Santa
Catarina. v. 2, n. 4. 103-115. 2015.

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