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PSICOPEDAGOGIA EM GRUPO, NO GRUPO E COM O GRUPO
a humanidade como um grande grupo realizando juntas provocam no exercício de descobrir quem
a tarefa de preservar, construir e projetar o planeta é quem; é preciso discriminar as características
Terra. Aprendemos a reconhecer e agradecer, individuais, perceber semelhanças e diferenças
todos os dias, as pessoas que trabalham para que entre idéias, gostos, formas de expressão, valores
possamos ter o alimento, o agasalho e a moradia. e muito mais; é necessário fazer articulações para
Esse reconhecimento, portanto, não se dirige que as características pessoais possam, como a
apenas às pessoas que compartilham o momento, exemplo de uma orquestra, harmonizar-se para
mas a todas que contribuíram no passado, as que realizar a tarefa proposta pelo próprio grupo.
contribuem no presente, mesmo à distância, para Aprender em grupo supõe troca de expe-
que o pão esteja sobre a mesa, pela manhã, ou riências, de idéias, de sentimentos e, sobretudo,
para que tenhamos acesso a qualquer outra mudanças internas e externas, pessoais e
construção humana. conjuntas; aprender no grupo supõe aprender a
Aprendemos, também, que as pessoas vincular-se, passando pelos momentos de
trabalham para retribuir a todos que trabalharam confusão, de dissociação e de integração, ou seja,
e que trabalham para atender a suas necessidades aprender no grupo o que é grupo e o que se faz
e anseios e para oferecer sua força, seu saber, em grupo; aprender com o grupo leva-nos a
seu fazer em prol da humanidade; hoje, eu diria, aprendizagens de novos conhecimentos e formas
em prol do planeta. Nosso trabalho, dessa forma, de abordar a tarefa, subjetiva e objetiva, que
precisa ter um sentido planetário e servir à passam a fazer parte de nosso grupo interno.
coletividade. A Psicopedagogia em grupo, no grupo e com
Essa maneira de aprender princípios que o grupo objetiva proporcionar aos aprendizes
valorizavam e valorizam a prática grupal está na aprender a pensar, a tecer, juntos, o conhe-
base do meu ECRO – Esquema Conceitual cimento, a transcender a dimensão individual
Referencial Operativo2, pois aprendemos a vida para desenvolver a construção coletiva do
como um exercício de compartilhamento, de conhecimento. Dessa forma, aprender deixa de
convivência e de desenvolvimento de normas ser “todos fazendo a mesma coisa no mesmo
sociais, a fim de que isso possa acontecer de fato, momento, da mesma maneira”; o grupo possui
e não fique apenas no plano do ideal. Percebemo- uma tarefa comum, e todos devem contribuir com
nos auxiliados historicamente; por isso, fazemos o que sabem para sua efetivação.
nosso trabalho com o intuito de auxiliar o outro e
a nós mesmos na construção de um patrimônio COORDENAR – UMA APRENDIZAGEM EM
que é de todos os seres que habitam a Terra. CURSO
O espírito do grupo é este: transcender o Um coordenador de grupos ou co-pensador,
individual, oportunizar a percepção e a vivência como referia Pichon-Rivière2, pode experimentar
de todos como parte de um todo, como várias posições no encaminhamento dos trabalhos;
representantes desse todo e, ao mesmo tempo, porém, a mais difícil e uma das mais eficientes é
como sujeitos. No entanto, para essa a de sair do centro e acreditar que o grupo será
transcendência, faz-se necessário um percurso capaz de realizar a tarefa, articulando as várias
que não é suave, nem fácil, nem romântico. A contribuições de seus participantes. O coor-
vivência em grupo não é mágica, e sim exige denador fica, apenas, com a tarefa de ordenar e
muitas transformações e, portanto, muita dor. pensar junto, quando for necessário. Ordenar e
Quando pessoas agrupam-se, não se pensar junto, ou seja, co-ordenar, co-pensar, é
caracterizam como um grupo apenas por esse uma ação realizada por meio de intervenções, de
fato. Agrupar-se é o primeiro passo; porém, para atitudes e da convicção de que conviver é outra
chegar-se à vida grupal, o caminho é longo: é possibilidade em relação a “soviver ”; que
preciso superar a confusão que muitas pessoas altruísmo é uma forma de superação do egoísmo;
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que alteridade é um dos exercícios mais Pedagogia, na época, Eliane Mara Alves Chaves
complexos para o ser humano, pois implica o e a professora Heliana Rodrigues da Silveira,
exercício de colocar-se no lugar do outro. Só é foi desenvolvida uma ação psicopedagógica
possível superarmos o individualismo, grupal, envolvendo vários grupos de crianças e
convivermos, colocarmo-nos no lugar do outro, adolescentes, ampliando e modificando a
se existir o outro, de verdade, diante de modalidade de trabalho realizada em Campinas
nós, assim como uma ação a ser realizada (SP). De 1989 até o momento atual, já no espaço
coletivamente. da Síntese, fundada nesse mesmo ano, vimos
A Psicopedagogia no âmbito grupal pode ser aperfeiçoando o atendimento grupal no espaço
realizada: diretamente com grupos de aprendizes, da clínica tanto na questão teórica, quanto
no espaço da clínica ou da escola; junto aos prática. A visão sistêmica veio enriquecer a nossa
educadores, como instrumento de formação prática clínica psicopedagógica quando as
contínua; como instrumento de formação de psicólogas Rosemary Damaso Padilha, Vera
coordenadores de grupos; ou ainda na formação Lucia Germano Sicuro e Virginia Alice de
de psicopedagogos para a participação de Oliveira contribuíram com o trabalho realizado
equipes profissionais. junto ao grupo familiar e auxiliaram na
Desde a década de 1980, tenho realizado construção de uma metodologia de trabalhos
ações psicopedagógicas que envolvem grupos junto aos aprendizes e suas aprendizagens.
com dificuldades para aprender e grupos com Além delas, muitos profissionais da Síntese
objetivos de aprender. De 1981 a 1984, contribuíram para o crescimento dessa ação
desenvolvi um trabalho com crianças que psicopedagógica, dividindo comigo a aplicação
apresentavam dificuldades de aprendizagem, prática e a discussão sobre ela: Arlete Zagonel
na Coordenação de Recursos em Psicologia Serafini, Eliane Mara Alves Chaves, Susi Monte
Escolar (COOPERAR) da PUCPR, na ação Serrat, Sonia Küster, Regina Bochniack, Eliana
denominada por nós de Classe Terapêutica, em Herreros Sorotiuk, Geraldine Franco de Oliveira
parceria com as psicólogas Maria Assunciòn e Miraglia, Ronald Magalhães, Ângela Marques
Jussara Carvalho. Nesse mesmo período, dividi Duarte, Simone Carlberg, Norma Nemmer de
com a psicóloga Mônica Bigarela a coordenação Mello e Luiza Maria Bernert.
de grupos de crianças com dificuldades para A formação em Psicopedagogia na visão da
aprender, no espaço da Gradual Terapias Epistemologia Convergente, iniciada por mim em
Associadas, em Curitiba (PR). Em 1985, no 1988, e a formação em Teoria e Técnica em Grupos
Instituto de Psicologia e Fonoaudiologia de Operativos, feita no início da década de 1990,
Campinas, em parceria com Maria Cecília muito contribuíram para o incremento da
Picolloto, transformamos a proposta desen- fundamentação teórica e para a forma que foi
volvida na COOPERAR e a desenvolvemos no tomando a aplicação prática.
espaço da clínica, com alguns grupos de O resultado do trabalho desenvolvido, com as
crianças. Também nessa época, coordenei o crianças que apresentavam dificuldades para
CEMAP – Centro Municipal de Atendimento aprender, foi nos entusiasmando para que
Psicopedagógico de Valinhos (SP), no qual estendêssemos nossa ação grupal para ações de
discutimos a realização do trabalho grupal, que caráter preventivo e, também, de otimização do
ainda se parecia muito com a ação pedagógica processo de ensinar/aprender. Com isso, grupos
desenvolvida na escola. Em 1988, de volta a de pais foram criados, aconteceram cursos
Curitiba (PR), no Consultório de Atendimento envolvendo a construção coletiva do conhe-
Psicopedagógico, juntamente com a psicóloga cimento, coordenados operativamente, até
Virginia Alice de Oliveira, a então pedagoga chegarmos à organização de cursos específicos
Arlete Zagonel Serafini, a estudante de para a Coordenação de Grupos de Aprendizagem,
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realizados nas cidades de Goiânia (GO), com a desenvolvo meu trabalho, cujos dados ainda não
colaboração de Janete Carrer, e Curitiba (PR), foram estudados de forma sistemática.
envolvendo a equipe da Síntese. Uma de minhas formas de trabalhar com
A aprendizagem da operatividade na formação ensino/aprendizagem, já referida, é fazer
em Teoria e Técnica de Grupos Operativos foi palestras, conferências, aulas para educadores
fundamental nessa práxis. Essa forma de ensinar, vinculados a várias Secretarias de Educação,
possibilitando a reelaboração coletiva do universidades, faculdades, congressos e escolas
conhecimento, foi absorvida, também, para brasileiras. Iniciei esse percurso em 1989, em
provocar professores em situação de palestras e Salvador (BA).
na formação do psicopedagogo. Nesses 20 anos, tenho percebido que
Essa práxis voltada a grupos foi se estendendo educadores em situação de aprendizagem fazem
na ação profissional da Síntese (então já um movimento de entrar e sair da sala na qual a
denominada Síntese Centro de Estudos, Desen- palestra ou aula está sendo realizada, como
volvimento e Aperfeiçoamento da Aprendi- se o que está sendo dito não tivesse muito a
zagem), de tal forma que hoje mantemos, além acrescentar às suas aprendizagens. É claro que
dos grupos de aprendizagem de crianças e não são todas as pessoas; também é certo que
adolescentes, grupos de estudo e de supervisão, aqueles que assim agem não o fazem para
e também desenvolvemos o Curso Livre de demonstrar um repúdio ou um desprezo, mas
Formação em Teoria e Técnica de Grupos sim representam a cultura sobre o que seja
Operativos, iniciado no ano de 2007, agora em construir conhecimento e sobre qual é o papel
sua segunda turma. do outro nessa construção, como se o interessante
Nesse curso, a contribuição de Simone numa aula dependesse apenas de quem a
Carlberg é fundamental. Ela divide comigo a ministra.
coordenação do curso e a coordenação dos grupos Pessoas entram e saem num exercício de
em formação; e também buscamos a contribuição assistir passivamente, e não de aprender, nem
de dois colegas para comporem a equipe de de construir conhecimento. Pensa-se que o saber
coordenação: Heloísa Monte Serrat Barbosa e está fora e, portanto, parece não ser possível
Sidinei José da Silva. É isso mesmo; em grupo, transformá-lo. Isto gera impotência. Certo,
ensina-se a coordenar grupos. A coordenação é também, é que muitos palestrantes, formadores
realizada por uma equipe. Em nosso caso, eu de professores, não oferecem espaço para o
ocupo o lugar de disparadora dos temas a serem exercício de pensar, relacionar, discutir, opor-se,
aprendidos, assim como de observadora de recompor e reelaborar o que foi dito. Isso vai
temática ou de dinâmica; Heloísa é observadora dando força à cultura de que basta gravar, ver o
de temática ou de dinâmica; Sidinei é observador vídeo, assistir para aprender, afastando os
do coordenador; Simone é coordenadora. A cada próprios educadores do exercício de pensar.
coordenação, a equipe reúne-se para avaliar o Outro comportamento recorrente, que tenho
trabalho, elaborar as próximas consignas e percebido no educador aprendiz, é a competição.
planejar os encontros seguintes. Quando alguém tem uma idéia, encontra um
material diferente ou descobre um texto importante
OBSERVAÇÃO DE ADULTOS EM SITUA- para toda a classe, demonstra certo medo de que
ÇÃO DE APRENDIZAGEM seu desempenho individual seja prejudicado ao
Quando falar de observação, de pesquisa e abrir a informação para todos.
de investigação, refiro-me a tudo o que tenho visto Essa forma de pensar mostra o quanto ainda
em minha ação profissional, tanto em processo é difícil fazer acontecer a idéia de grupo em meios
de pesquisa formal, quanto na observação de atos responsáveis por ensino/aprendizagem. O
recorrentes em várias localidades nas quais individualismo propagado pela visão neoliberal
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tem dois planos: um que é horizontal e diz respeito pessoa que verbalizou, mais ficamos afastados
ao conjunto de pessoas, e um que é vertical e da construção grupal; esquecemo-nos de que as
refere-se aos indivíduos. A conjunção entre o idéias, as opiniões, de autoria individual, fruto
plano horizontal e o plano vertical resulta no do movimento interno de aprendizagem, na
movimento grupal. Quando temos pessoas maioria das vezes, são resultado da construção
apenas identificadas no plano horizontal, fazendo grupal e da construção do conhecimento pela
a mesma coisa, na mesma hora, da mesma forma, humanidade, grande grupo que fundamenta o
não temos um grupo, e sim pessoas sendo conhecimento de hoje.
comandadas e realizando a ação que está sendo O grupo, assim, fica entre o indivíduo e a
solicitada. Ao contrário, quando temos pessoas massa; nele, o sujeito possui sua identidade e,
identificadas apenas no plano vertical, temos ao mesmo tempo, aprende a conviver, supera o
indivíduos juntos, que precisam competir para individualismo e preocupa-se com a comunidade
ver quem aparece mais, quem é o melhor, quem e sua tarefa. Vivencia o que Pichon-Rivière2
chega antes, já que o foco encontra-se na chamou de verticalidade (a história pessoal) e
verticalidade. No entanto, se temos pessoas sendo horizontalidade (que diz respeito à história e à
diferenciadas daquela massa que faz a mesma dinâmica grupal).
coisa e tarefas no plano horizontal colocadas para Outra forma de semear “grupalidade” é
serem resolvidas, considerando-se as expe- colocar consignas para o grupo desenvolver. A
riências pessoais, daí nasce o grupo, que possui vontade de resolver a tarefa mobiliza a formação
um objetivo comum e conta com ferramentas do grupo, pois a cooperação, a discussão, a busca
diversas para atingi-lo. da síntese entre as diferentes percepções e idéias
Nesse sentido, a apresentação individual, possibilitam uma vivência bem diferente daquela
numa turma que está acostumada a ser tratada na qual o professor encontra-se na posição de
como massa, apenas no plano horizontal, faz parte autoridade. A consigna oral deixa o grupo um
da constituição de uma concepção grupal. É pouco mais dependente de seu coordenador,
preciso diferenciar para sair da confusão e, enquanto que a consigna escrita permite um
posteriormente, harmonizar as individualidades movimento grupal mais eficiente, mesmo que o
para que se consiga realizar a tarefa que é de grupo passe igualmente pelos momentos de
todos. confusão, discriminação e integração, necessários
Além da apresentação, considera-se que a para a elaboração ou reelaboração da tarefa.
tarefa de um grupo é comum; outro cuidado do Valorizar a tarefa realizada, apontando os pontos
palestrante, do professor e do coordenador é levantados, analisando sua maior ou menor
dirigir-se ao público como um possível grupo, relevância, apontando para as possibilidades de
realizando chamadas grupais. Dirigir-se ao grupo aprofundamento e aperfeiçoamento, sem perder
torna-se uma forma de chamar o grupo a de vista que aquela é uma tarefa grupal, é ação
interessar-se ou à responsabilidade. Então, em importante da coordenação do grupo para o
vez de dizer “O fulano disse isso”, é muito mais desenvolvimento de uma mentalidade menos
eficiente dizer “O grupo está dizendo, por meio individualista.
de um de vocês...”, “O grupo faz isso como uma Provocar as pessoas para a ação coletiva,
forma de mostrar sua intenção...” ou “Qual é grupal, é possível; é importante; significa um
mesmo a tarefa desse grupo?” Quanto mais nos avanço nas relações humanas atuais, mas
referimos às pessoas como portadoras de idéias necessita de formação pessoal. A aprendizagem
importantes, assinalamos a verticalidade e da leitura dos sinais que um grupo emite, da
dificultamos a construção do grupo. O mesmo vale compreensão do que é lido e da intervenção a
para as idéias que parecem descontextualizadas. partir do que se lê é tarefa importante de um
Quanto mais apontamos para a falha e para a coordenador de grupos de aprendizagem.
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pessoas com o qual passa a viver: sua família. de sua responsabilidade. É preciso, ao saber que
Essa aprendizagem poderá comandar a forma de o aluno chega à escola sem referências da
atitude que vai utilizar em outros ambientes. vivência grupal, que ela organize-se para
Para minimizar a consequência da ausência desenvolver uma ação no sentido de promovê-
do coletivo na formação dos filhos, seus pais la. O controle externo apenas reforça o
buscam formas de tratamento interessantes; entre individualismo e acaba por colocar os alunos
elas, está a “patologização”, pois é mais fácil contra a própria escola, gerando aparecimento
admitir que seu filho seja agressivo, depressivo, de doenças e afastamento constante nos quadros
possua transtorno de atenção, hiperatividade, do docentes das instituições escolares, bem como
que pensar que seu filho não aprendeu, com sua excesso de encaminhamentos do corpo discente
família, a socializar-se, comunicar-se, a construir para os consultórios especializados e medicação
sua atenção e a entrar em contato com ele mesmo, de problemas que foram constituídos nas relações
para enfrentar com calma as surpresas da sociais. As instituições escolares diminuíram os
realidade vivida. elementos educativos e aumentaram a neces-
Na mesma pesquisa 4, percebemos que o sidade do controle externo; entre eles, estão os
tratamento que os pais dão a seus filhos em nossa responsáveis pela disciplina (retomando-se a
sociedade é terceirizado: contam com os avós, com figura do bedel), o recurso do discurso que
a rua, com os condomínios, com os abrigos ou humilha e as pílulas.
contratam empregados para desempenhar a Nesse sentido, não é somente a família e a
função materna; usam medicamentos para poder escola que devem retomar a discussão; como
desempenhar suas funções; buscam mais funções especialistas em aprendizes e aprendizagens e
fora de casa e, com isso, afastam-se dos problemas protagonistas dos atendimentos das dificuldades
domésticos; fazem combinados com os filhos, os nos consultórios e nas escolas, nós, psicopeda-
quais recebem coisas em troca de comportamentos gogos, precisamos rever nosso papel nessa cadeia
adequados; permitem que os filhos fiquem muito de patologização do aprendiz, da qual somos
tempo em situação de lazer; não distribuem parte atuante, para participar dela ou para
tarefas domésticas, retirando dos filhos a promover rupturas importantes. Pensar numa
possibilidade da aprendizagem de mecanismos Psicopedagogia em grupo, no grupo e com o
de convivência social; superdimensionam grupo como instrumento de promoção do
problemas e acabam por “patologizar” aquilo que aprendiz e sua aprendizagem é o nosso desafio.
faz parte do desenvolvimento normal de seus
filhos; defendem os filhos, deixando pouco A PSICOPEDAGOGIA NO ÂMBITO
espaço para que eles aprendam a defender-se. GRUPAL, NO ATENDIMENTO CLÍNICO
Essas pessoas chegam à escola com poucas Os grupos, como relatado, têm sido uma forma
referências sobre a convivência e com muito mais de encaminhamento bastante utilizada na práxis
referências sobre a “sovivência”, que ora é desenvolvida pela Síntese, em Curitiba (PR), que
revelada pela passividade e apatia, ora pela anti- reúne uma equipe composta de quatro
sociais; porém, ambos são geradores de grande psicopedagogas e duas psicólogas, todas com
sofrimento para a criança, o adolescente ou o formação em coordenação de grupos.
adulto que não sabe se relacionar, conversar, O sujeito encaminhado é sempre visto no seu
conviver, compartilhar idéias, sentimentos – todas contexto escolar e familiar, e nossas conclusões
essas ações são antecedidas do prefixo “con” ou sempre estão atreladas a esse fato, pois é muito
“com” que supõe o outro, aquele que não se fácil colocar alguém no lugar de doente, de
constituiu na aprendizagem da “sovivência”. problema, quando todos estão bem e aquela
De nada adianta a escola conhecer esse pessoa não está. Na escola, escuta-se o discurso:
quadro e colocar-se atrás dele para proteger-se “Todos estão se alfabetizando, apenas ele não”.
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Na família, por outro lado, ouve-se: “A irmã é quando se trata de pessoas que chegaram até
uma excelente pessoa, aluna e filha, nós dois nós por apresentarem dificuldades de
nunca tivemos problemas na escola; certamente, aprendizagem, seja na questão da convivência
ele possui um distúrbio importante”. ou na questão do conhecimento, é a proximidade
Nosso olhar e nossa escuta, no entanto, vai de idade e ou de ano de escolaridade; o critério
para além do discurso que ouvimos e daquilo que de heterogeneidade é a forma de aprender que
observamos a respeito do sujeito agindo em sua apresenta – na leitura e escrita, no raciocínio
sala de aula e em sua família. Nossa avaliação já lógico, no comportamento diante das situações
possui uma pitada de “grupalidade”, e o sujeito de aprendizagem, no relacionamento nas
é visto nos seus contextos e individualmente para situações de aprendizagem, na atenção, na
podermos conhecê-lo nos planos: horizontal e memória ou em qualquer outra. Esses dois
vertical, tanto no espaço da escola, quanto no critérios podem ajudar garantir o tipo de interesse
âmbito familiar. que as pessoas de idades próximas podem
A aprendizagem é resultado de uma possuir, bem como o instrumental diverso que
elaboração interna, mas decorrente da relação pode surgir do próprio grupo, pelo fato das
dialógica estabelecida entre as pessoas, seus pessoas possuírem modos de aprender,
grupos, suas crenças e suas culturas. Aprender é dificuldades e facilidades diferentes.
uma ação da pessoa, mas atrelada à construção No caso de grupos de aprendizagem
coletiva do conhecimento. Portanto, alguém que compostos por professores ou interessados na
apresente dificuldade para aprender pode apre- formação em Teoria e Técnica de Grupos
sentar dificuldades para elaborar internamente Operativos, a reunião pode acontecer com a
os códigos que surgiram na interação. Isso indica seguinte característica: agrupar pessoas
que não apenas o sujeito deve ser compreendido, interessadas pelo mesmo tema (homogeneidade),
como também todos que interagem com ele e o mas com formações e experiências diferenciadas
objeto a ser aprendido, para que possamos (heterogeneidade), o que enriquecerá o grupo
descobrir formas mais eficientes de todos nos momentos de reelaboração temática e da
aprenderem naquele espaço. avaliação dinâmica. Quando temos que trabalhar
Se a escola insiste em focar seu trabalho nos com grupos cujos participantes possuem a mesma
sujeitos individualmente, o plano horizontal não formação ou profissão, o critério de hetero-
é considerado e o sujeito que não aprende é visto geneidade será a idade, pois pessoas com idades
como o único a ser ajudado em todas as situações diferentes, experiências vividas em espaços e
de aprendizagem, nas quais ele não conseguiu tempos distintos, podem possibilitar uma
aprender; se o mesmo acontece nos consultórios, dinâmica maior no momento de aprender em
a família fica convencida de que seu filho tem grupo, no grupo e com o grupo.
um grande problema, que esse problema é uma O que diferencia um trabalho grupal de um
doença grave e, portanto, concorda em medicá- trabalho no qual as pessoas aprendem juntas é o
lo. Então, o primeiro grupo com que trabalhamos fato da tarefa do grupo ser a resolução de um
em nosso Centro de Estudos é o Grupo Familiar; problema proposto para o grupo. Para essa tarefa,
depois, quando a escola solicita, o Grupo de serão necessárias pessoas com idéias, soluções
Alunos ou de Professores. e experiências diferentes. Não há a valorização
Além disso, desenvolvemos também o trabalho de um elemento do grupo por fazer melhor,
com a aprendizagem de forma grupal, integrando responder mais rápido, entender mais profun-
pessoas por meio de um critério de homo- damente ou por não fazer, não se aproximar, errar,
geneidade e outro de heterogeneidade – para que etc. Valoriza-se a tarefa grupal, e não o
possamos ter contribuições distintas na realização comportamento individual. Nos grupos que
da tarefa grupal. O critério de homogeneidade, desenvolvemos na Síntese, possuímos uma Caixa
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SUMMARY
Psychopedagogy in-group, in-the-group and with-the-group -
going beyond patholization
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