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COLLOR
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COCAINA
DOS POBRES
IWJLeia Mais
Editor
Luiz Carlos Lucena
01pa
Sebastião Maria e Ronald Chira
RevisiTo
Angela Ramalho Vianna
EditoraçTo eletrônim
Grafitte
A
Maida Gorek,
ín memoriam
ÍNDICE
.
PC FARIAS,
UM EMPRESÁRIO
PÓS-MODERNO
__ _j
Não é fáci Lchegar ao poder supremo da nação. É óbvio que PC Farias
iria participar dos- altos esrnlões do governo Collor. Caso contrárió, PC
Farias seria um otário. Na verdade, a natureza da campanha política
determina necessariamente o perfil do futuro governo. Além da geni-
alidade pecuniéiria de PC Farias, voando com os seus jatinhos o céu de
anil dos Brasis,avitória de FernandoCollor foi um triunfo da telenovela.
Esta continua em 1992corn seu irmão caçula, PedroCollor,quedenuncia
o presidente da República de ser testé1-de-ferro dos negócios ilícitos de
PC Farias.
Levanta aí o dedo quem não é culpc1do por esse vexame?
Zélia
Pedro
Tereza
Rosane
Tatá
Coimbra
Ana
Bancesa.
Onde esmo todos os que ajucfaram a incrível foçanha do caçador de
marajás?
Até eu que sou mais bobo não concordo com a atitude simplista da
mídja, tantas vezes safada e vil, em querer considerar PC Farias o bode
expiatóriodadegradaçãornoraldopaís.Issoéconversaparaboidormir.
Quem me garante que PC Farias não seria um ótimo dono de jornal?
Quantos PC Farias valem um doutor Roberto Marinho? PC Farias é um
sicário t~ombadinha, cuja cabeça foi formada vendo os filmecos da TV
Globo. E estarrecedor constatar que, à exceção do meu guru Leonel
Brizola, ninguém pede uma CPI em cima do doutor Roberto. O ínclito
deputado economista Aluízio Mercadante, homem probo e indignado
diante do rniserê naciom1I, não tem no entcmto nenhum bode político
com a telenovela, o câncer da polis pós-64.
Em 1992 a opinião publica está alvoroçadc1: a despeito do vínculo
com PC Farias, o mandato de Collor deve ou não continuar? No que eu
vejo a Folha e o Estc1dão junto com Horestez Cuércya e Tc1sso Jereissc1ti
pedindo a renúncia do homem, começo a encucar que há algo de
esquisito nessa súbitc1 guinada émti-Collor. Estrc1nho: quem votou no
homem quer agora tirá-lo. Por outro lado, intriga-me sobremaneira a
ponderação singular de Leonel Brizolc1 em torno da defesa da legalidade
em 1992, ou seja, sua preocupc1ção em torno de um possível golpe
parlamentarista.
Parlamentarismo já
Parlamentarismo é coisa de vic1do!
Para complicar os indiec1doresda parnfernália de 1992,eiso professor
ACM fazendo alarde de que o vice Itamar Franco não tem condições
l
morais e políticas de assumir a Presidência da República.
De onde vem o golpe?
O golpe continua desde 64. Não nos esqueçamos de que o Rezek fez
milagre com o computador eleitoral de 1989. Collor deu um golpe de
caratê no país, mas, convenhamos, Lula o ajudou a derrotm Leonel
Brizola, tido como expressão caduca do trabalhismo pré-64. Eis que
agoraoclimajanistadedelegadodecostumesvoltaabailarcomojurista
Bisol, que é a UDN de toga no meio da UDN de macacão. Estamos
assistindo à ênfase na m inudência do secundário, que silencia no entanto
cliante do atual desmantelamento do Estado. Para Ltús Inácio Lula, a
impwüdade que grassa no país não tem nada a ver com as perdas
internacionais.AcríticadoPTaoColloréeminentementepequeno-bur-
guesa, não vai fundo no fenômeno colorido do ponto de vista histórico.
Na revista Veja o chefe-editorial é o Pau Linho Moreira Leite, o ex-teórico
da Libelu que trocou Trótski por Carlos Lacerda.
Refresquemos a nossa veneranda amnésia histórica: a revista Veja
fez a campanha do caçador de marajá desde 1988. Por que o doge Civita
está agora descontente com Fernando Collor? Com certeza não é por
pmridos morais nem em nome da defesa dos cofres públicos. Leonel
Brizola diz aos quatro ventos que a queda do Collor é uma tramóia
urdida em São Paulo, ainda que&10 Paulo tenha sido a regiãoqueelegeu
Fernando Collor.
Fleury e sua wife votaram no Collor. Será que Horestez Cuércya
votou no Lula? Depois das eleições de 1989, ressacado com o resultado,
Lula declara que odeia Brasília. E se porventura ele tivesse ganho o
segundo turno das eleições? Mudar-se-ia a capital do país para Piraci-
caba?
Nunca me esquecerei que eu votei no Lula no segundo turno. E no
Bisol também. Deveria ter anulado o voto, mas fui seguir o conselho do
meu guru Leonel Brizola, o candidé1to laico das eleições de 1989. Collor
ficou nos braços do pastor Edir Macedo coma Igreja Universal do Reino
de Deus, enquanto Luís Inácio Lula embarcou na picaretagem da
teologia da libertação by Boff e Frei Beto. -
Em 1992 a CPI cumpre o papel eleitoreiro em cima do tema da
moralidade.
Eduardo Suplicy quer se eleger prefeito de São Paulo com o dossier
PC Farias.
Toda a galera política estél de olho em 1994.
Se Leonel Brizola despontar corno candidato foite, não há dúvida de
que a classe dominante vai até dar nó em pingo d'água parei o homem
não chegar lá .
Atenção, cambada: Paulo Brossard, o Rui Barbosa em compota,
poderá desempenhar em 1994 o mesmo papelão que o Rezek desem-
penhou em 1989.
7
Os five yea rs de José Sa rney p rep;-1 ra r;-1 m o bote de Fernando Collor.
E Leonel em Minas?
Juizde Fora, segunda cidade doestado, poderia ter decididoa parada
em 1989 a favor dé Leonel Brizola, porém o PDT ;-1í não é nem pedetista
nem brizolista. O que se cornent;-1 nas rodinh;-1s mineirns é q.ue Leonel
Brizola precisa fazer urgentemente um espurgo no PDT de Ju1z de Fora.
Caso contrário, 1994 ser;-í osso duro de roer.
Para escrever este livro consulto o vereador Leopoldo Tristão sobre
a situação delicada de Leonel Brizol;-1 em Minas Cera is. Ele me informa
que o PTB vargo-janguist;-1 sempre foi forte em Juiz de Fora'. cid~de
operária que antecipou o surto industrial de São Paulo. To~av1a existe
o peso de 1964: tornara que JF esteja ,rnis p;-1ra o poeta Munlo Mendes
que para o general Mourão Filho.
Muitos brizolistas mineiros lastimam o fato de Leonel Brizola não ter
ainda percebido que é através de Juiz de Fora su;-1 entrada triunfal em
Minas Gerais. Não s;-10 poucos os brizolist;-1s mineiros que assinalam a
danosa contradição: Leonel Brizola goza de carisma em )Liiz de ~ora,
mas o PDT na Zona da Mat;-1 éÍ um partido;-1eéfé1lo. Port;-rnto,seucansrna
não se traduz em número de votos, embora sua lingu;-1gern permeada
d~ metáforas rurnis sej;-1 de agrado do homem do póvo juiz-cle-forano.
Jw~ de Fo~a é a _terra do vice-presidente da República, !tarnar F,ranco, ~
amigo nac1onal1sta do doutor Aureliano Chaves e do mdefect1vel Jose
Aparecido, o homem que estú cm todas as bocas do poder.
Sem querer desqualificar a CPf do PC Farias, Leonel Brizola teme
que a subida de Itamar Franco engendre a hegemonia do PMDB de
Horestez Cuércya no poder. - ' -
,Luzinácio Lula at;-1ca a aproximação de Brizola e Col lor, dizendo que
/ o l!der mar,1gato confunde legalidade com irm~ralidade, como se ele
qwsesse ser o candidato de Collor em 1994. E difícil destrinchar o
labirinto político de 1992. Oxalá tenha Col lor o saco roxo para apoiar em
19?4 Leone~ Brizola, o inimigo rnort;-1] do doutor Roberto Marinho. ('i.
cOisaanda taoc5mfusa que,ern 1992, ltamar Franco é o Jangode Antômo
Carlos M;-1g;-1lhaes: o Jango impossibilitado de substituir Fernando Col-
lor. Donde se conclui que se fosse outro vice-presidente, a Rede Clobo
teria derrubado o governo Collor.
Jui~ de Fora ferve em fofocagem com ,1 perspectiva do pernedebista
Tarcís10 Delgado ganhar a Prefeitura em 1992. Com fama de ter sido
bom prefeitó, Taréísio Delgado - sob a ótica nacional - pode ser a
ponta de lança do famigerado quercismo em Minas Gerais, embora ele
não morra de amores pelo presidenci;-ível p;-1ulistc1. Há quem diga que
Horestez Cuércya é o neo-Adernar de Barros, fenômeno confinado ao
estad? de São Pc1ulo. A consciência progressista da cidade sonha com
um d1sque-Cuércya na Zona da M;-1ta. E difícil imaginar que Tarcísio
8
Delga?o ch~gue a té1l ponto, seguin~io os pélssos do Requião no Parar~á;
tod~vm 1m11ta ~e,~te q~1e Sé1?edaam1zadedeTarcísio Delgado com NiJo
Bél~rsta e Wald,r Pires m1é1gmé1 que ele depois de eleito prefeito er~11992
- mgresse no PDT para fazer uma monu menta 1glasnost no pa rt,do de
Leonel Brizola em Minas Gerais.
A perguntél que. corre :10 meio universitário é a segLúnte: por que
Tarcís10 Delgado a111da nc10 abandonou O PMDB? Córn o seu senso
pragmé1tico, ele Sélbe que o PMDB ern Minas Gerais é bern estruturado
e cheio da grnna, de modo que deixé1-loé1goré1 signifiG1 é1brirespé1ço para
Newton Cardoso tomm cont~ ~io partido. Assim configura-se u.rna
situação .assc1z par;-1doxal: Tar~1s10 Delgé1do é um político progr~ssrsta
em âmbito regional, mas nacionalmente esté1 filiado a um partido de
direita.
A história corno pesadelo volté1 a afligir a consciência progressist~:
em 1986 a vitória de Alberto Bejani em Jlliz de Fora prenuncia a vitórra
de Fernando Col lor em 1989. Resta saber se a vitória de Tarcísio Delgado
em 1992será o prelúdio da ascensão de HorestezCuércyaem 1994. Ou,
pensando na melancólica abstenção eleitoral de 1992: a derrota do PT
em Juiz de Fora espelhará a clerroG1da nacional de Luís Inácio Lula em
1994,Exerçamos a f utur? 1ogra,
• •
essa c1enC1él
A • • ' • os
que substitL!ru a 1~~storn~
•
n
últimos trinta éll10S. Citemos élS pé1la:1ras de Leonel Bnzola: A_s olrgar-
·.,.s olham 94 e temem o que w11 acontecer. Porque 94 w11 ser um
q U 1" ento nc1 historia
' . b rasr·1erra
. que so' ocorreu em 50, qu;-111 d o V arg "'5
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rn Om · - e tc1rnbem
venceu as ele1çoes - do eongresso".
- él 1·1. cou be renovaçao
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A LÓGICA DO
INQUÉRITO ABAFADO
Darcy Ribeiro
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tesoureir<? de Cé1mpanha. Esse privilégio só a direita possui.
a. ; 1~0v!dade não é o escândalo em torno do tráfico de influência, ou
d n. u~1oadotráficoem PC Farias. O que causa perplexidade éa atitude
f
é irmao caçula do Collor em abrir publicamente o jogo: "O PC Farias
esta-de-ferro do meu irmão".
Nunca se viu isso antes na história do Brasil. Nem na época colonial,
no ~rtão ou no agreste do Nordeste. A denúncia de Pedro Collor se
âncaixa naquilo qúe o sociólogo Oliveira Vianna denominou de ven-
etta, m~1s a vingança era de úatu rez-1 privé1da, roupa suja lavada em
c~sa, e I1é10 pública, como a denúncié1 telenovelesca de Pedro Collor, por
smal quem apresentou PC Farias a Ferné1ndo. Por que só agora Pedro
C?llor resolveu soltar a franga? Não importa o motivo psicanalítico, ou
seJa, os meandros da endogamia sertaneja nordestina. Ou se Fernando
paq~1erava Tereza que não paquerava ninguém.
. Aumenta a mesada dele/ dona Leda!" -o povo brinca nas ruas do
Rio de Janeiro com a piada. E só aumentar a mesada do garotão que ele
~o~~ga o periquito. late, Mercedes, jé1tinho, Hipopotamus, coluna do
ozlITlo. De súbito retorna Renan Calheiros de seu exílio alagoano e,
dand? uma de Heródoto, coloca a nostalgié1 na gangue multinúdia de
Pequim, que tinha plano de Sc,lvar o país em 1989. Collor, segundo
Renan Calheiros, traiu o ideal Jibertcírio da modernidc1de da gangue
multimídia de Pequim e, num lance de sicário, subornou as eleições de
Maceió com Bulhc)es e PC Farias. P. Collor detona a bomba, nitroglice-
rina pura, rompendo pela primeira vez na história do Brasil a-soli-
dariedade da família senhorial. A família não segura mais as pontas
depois do assédio das telenovelas. Pedro extrc1pola ao pôr a boca no
trombone. Ele rompe com as regras do clã parental, a instituição básica
do nosso direito público costumeiro.
A Perestrói ka de P. Col lor difere da endemia familiar coronelesca de
Canapi, a qual mcmtém o segredo sujo entre quatro paredes. Do ponto
de vista da solidariedé1de parenté1l, PedroColloré um louco varrido. Um
caso de anomia societéírié1 de quem muda de fomília ou fica sem família.
Pensando no Cearé1, jé1 dizia o satírico João Brígido: "Quem não tem
parente que foi morto tem parente que matou".
Fernando Collor é o único presidente na história do Brasil que vive
o drama da xipofagia entre a esfera pública e a vida privada. J?upla
infelicidade. Não procede de modo algum a comparnçã? com o tm; ~e
Getúlio Vargas em 1954, nem se imaginarmos que o cnoulo Gregono
tenha sido éacifado pela CfA. Tal cotejo do 1954 suicidário com a
chanchada de 1992 não tem cabimento: afinal, Getúlio Vargas nunca
assistiu telenovelé-1. Quem assistia telenovela era o marechal Lott, con-
formeodepoimentodo historiadordo Exército brasileiro,André Moisés
Gaio.
r
A RAZÃO DA PARANÓIA:
1954, 1964, 1994.
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mente com o resultado das urnas. Basta reparar no exemplo de Collor,
que ganhou as eleições contra a história. Atê parece que a história é de
direita. Sua vitória significa a negação da história, embora esse tipo de
raciocínio tenha saído da moda com a tin-mia percentual das pesquisas
de opinião pública.
O IBOPE, a Data Folha e a Vox Populi contribuíram para desrnorali-
z.aroensino de história do Brasil nos colégios e universidades. A política
virou um exercício rnbalístico e numérico, de corrida Fórmula-l. O que
interessa é a estatístiG1, e não a ideologia. E o Brasil da subcaricatu ra do
Primeiro Mundo. A imprenSé1 revela que Lula subiu na pesquisa, Paulo
Delgado desceu, Maluf estacionou, Enéias sumiu do mapa, e por aí vai.
Diante do número é idiotice falar em intuição histórica ou em razão
política. O que conta é o pragmatismo da percentagem. Decorre daí a
crônica do disparate, com o élescenso progressivo do nível intelectual
dos candidatos, té111to à direita quanto à esquerda. Ora, tal disparateesté1
condicionado pelo sistema hegemônico da comunicação, de modo que
a estatística eleitoral não é inocente, sobretudo num país em que o canal
Globo detém 80'X, da audiência.
Sem mimosear-me em preferência partidária, acredito que esta é a
questão decisiva: o doutor Roberto Marinho prefere Lula ou Brizola?
Não vale a resposta "nenhum dos dois".
Leitor de Sérgio Bmrque de Holanda, sobretudo de seu livro Raízes
do Brasil, constáto em 1992 que Luzinékio personifica demais o an-
tagonismo de Brizola com a Rede Globo: paranóia, obsessão, caduquice,
tara,idéia fixa,desafeto, picuinha. Só falta Lula dizerqueumdia o doutor
Roberto Marinho quis namornr dona Neuza Goulé11t Brizola. A luta de
classes para o PT de Lula está circunscrita ao portão das. féfüriG~s.
Educado sentirnenté1lmente na escolé1 da telenovelé1 com a revista Vejé1,
ele não compreende o signifirndo nacional e político do monopólio da
comunicação. Para Lula, ó espírito da luté1 declé1ssesesté1 a mil légu,1s de
distância do rictus histérico da boca de Bóris Casoy, assim como não tem
nada a ver com o beijo caliente de Féíbio Júnior ou da reza sorumbá~ica
da ecológica Lucél ia San tos, a gé1 rota-p ropagandé1 de Fernando Gabeira,
o candidato jovem que derrubou Darcy Ribeiro em 1986'. a)egando_ que
o antr?pólogo mineiro jél não tinha mais idade p~ra ext~ir tang~1~nha
ma de m Berlim rns praias freqüentéKias pelos verdejémtes 1pc1nernat1~os.
Luzillékio acha bacaninha o trabc1lho cívico dos Mesqwta, dos Fnc1s,
dos Civita. Maior paixão. É o Lulé1 parido politicamente pelc1 mídic1. A
mãe mídia responséível pela notoriedade da liderança sindirnl. Lula
n~sceu no período em que a mídia começou a se indispor com a
dt!a.dura, pois nem sempre a mídia esteve contra a ditadurn. Ao con-
tr~n~, a ditadura é fruto da mídia. A star do ABC ni"to S,Kou que Jango
nao tm!1a. seq_uer um cronista escrevendo nos grandes jornalões. O boí1é
da Polorna nao se deu ao luxo de pesquisc1r a Sé1Gmagem dos donos de
13
.'
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declaradamente antibrizolistas enchem o Maracanã.
Está na cara a divergência ideológica entre o sistema da grande
imprensa e o trabalhismo dernocré1tico de Leonel Brizola. Um governo
decente no Brasil teria que governar em guerra contra os clãs desnacio-
naliz.ados da mídia. Convém não esquecer que Fernando Collor é filho
de dono de jornal. Ele é o Otavinho Frias que foi fazer política. Resulta
daí a reverência de Fernando Collor pelo que sai nos jornais e tevês. Ele
é capaz até de mudar de alfaiate se porventura o Zózimo fizer algum
reparo em sua coluna no Jotabê.
F~rn'.1ndo Col!or é uma cria5ão agr€\matical da mídia, a desreito ?ªs
de1~unci~~ mo!alizantes da Vejél, Isto E, Folha e Estadão. Estes JOflléUS e
revistas Jª sabiam de todas as falcatruas de PC Farias antes do Pedro
Collor abrir o bico. Quem tiver paciência que faça uma análise pachor-
renta de como o Fernando Collor foi trntado como texto e foto na mídia
de São Paulo que o elegeu em 1989. Basta recorrer à ajuda da semiologia
para perceb~r que a gestuália de Fernando Collor apresenta a mesma
caracterologia neocolonizadé1 da redação do Otavinho Frias e do Civita.
Ea grana de Antônio Ermírio de Morais a ascesisintramundana de Max
Weber, investida na campanha de Fen{ando Collor?
. Nó~ estar~os atolados até o pescoço no modo deproduçãocapit~lista
~1deofmanceiro. Pelo Brasil inteiro a tendência é todo proprieté1no de
Jornal ou de rádio se candidatar a prefeito, em virtude do caráter
concentracionário da comunicação de méissas. Ao contrário do que
suc~deu com Getúlio Vargas e João Goulart (Carlos Lacerda era dono
de Jornal ... ), a estrela neotrabalhista do PT brilha no céu plúrnbeo da
paulicéia desvairada desde 1979, sem o menor conflito com o sistema
da grande imprensa. Houve um amor à primeira vista, tar~to q:1e o PT
gosta menos do Estado do que dél grande imprensa. Esta nao foi nunca
refratária à instalação da ditadura de 1964, mas sim contra o decurso d~
ditadura, o que não deixa de ser um obsceno paradoxo. Então, corno e
que Luzinácio maltrata a memória de João Goulart e concede aura
progressista aos Civita argentários? A única resposta plausíyel é que 0
~oprietéfr~o da_ Veja emprega em sua redação ex-simp~;1zantes da
E rbelu trotrsqueira. Foi esta patota do PT que bolou o mote caçador de
marajá", o epíteto da capa da revista Veja que lançou Fernan~o Collor
em 1989. Assim, do ponto de vista sígnico, quem e!igendr~ o cl1p Collor
é a rapeize da Libelu com o dinheiro lavado do mternac1onalismo de
direita.
Na casa do Reinaldo Moraes, em Pinheiros, São Paulo, pergun~o aos
me~1s amigos da década de 70 corno vai ?.Paulit~ho Moreira Leite t~a
revista Veja. Há um mal-estar na sala de v1s1tas. Nao te1.1ho na~a cont~ a
pessoalmente. Eleémeuamigo. Irrnãodofotógrafo Mano. C:adeoMano
Moreira Leite? Explico-me corno posso. Sem rnegalomarna, mas sem
modéstia babaca. O problema é que o destino colocou-me contem-
15
porâneo de Fernando Collor. Eu nao, ., lº· Até
- posso _,gn<.:,ra~
. gostariasem
oréizá-lo de
esquecê-lo. Quem é esse cara? O fato e qu~mo da para ex em Karl
vomitar o clima ideológico que o produziu. Façam~s q_ue/sociedade O
Marx no 18 Brurn,frio. Collornão é uma mera excresc,enc1c~eª :linho um
brasileira das últimas décadas. Todos nós t~mos lc: ~10 ui;~,ão tem o
Collor enrustido dentro da gente. Qua Io partido pohhcor-1' ior para
seu Collor? Sigo à ri~ca o c?nsel\10 de José,qu1l!1er_me_ ~~~t~1.1 Vai ver
não abusar da analogia, porem m1nha mernon~ ª)'~da nao P :lo associou
até mesmo o poeta Torquato Neto da trop1G11lé-1, quanc .. deologia
TerceiroMundocom o fimdomundo, preparou oadvent?dc1 t vencido
primeiromundosa de FernandoCollor. Estou cada vez mais co\el pelo
de que o fragmento da estética tropirnlista é também responsa
plim-plim concretista da casa da Dinda. . ,. mos do
A house pop no poder em Bras, l,a esfrangalha a 1de1a que te bomba
desbunde contracultural que vem desde a Semana de_ 22. A flóscfo
atômica está contida num poema de Pannênides, d,z,a O 1 res-
Heidegger. Sim, eu não sou Heidegger nem nada, nem que'co11or 0
ponsabi lizar a caravela de Cabra (pelo apan,:ime,i:o de Fernando ,crina<
em Bras,ha; todavia sua protogenese h,stonca nao de,xa de aZL. do
meu espírito cosmopolita. Um dia, com Richard Morse "\ªPado
Matheus no b,1irro do Sumaré, cheguei a pensar que o a °';;
brasilianista norte-americano era muito melhor do que_ o pauhs.,;i,.0
brasilianista do Brasil. O pior de tudo é que tal constataçao fere 111.' São
auto-estima de paulista do interior. Afinal, quem elegeu Collor foi fait
Paulo, mas em 1992 a mídia paulista quer tirc1-lo do poder C~)fn um
divers de quinta categoria. Aí tem coelho nesse mato lacerd,sta. lo
!ião posso crer na pulsão proba da grande imprensa de São Pau
O frigobar do Tavinho Frias não vai colocar meu metabolismo ba\~
contra a memória de Ge)úlio Vargas. Eu digo ao historiador Ant:~
Pedro Tota
viciada que E
na raiz. é) d1scussao sobre autoritc1rismo versus democracia
coisa da C!A.
Q~,e _dom Evar)sto Arns me perdoe se porventura cometo algt11 ;i~
blasfemia na rev,sao do pesadelo histórico de 1954 e de 1964. De ta, a
ver tnunlar as nulidades pós-modernas, às vezes chego a pensar qu~
ditadura do Estado Novo devena ter-se proloni;ado até 1968. O pe:5 .
bacharel de 1945 recusou-se a nacionalizar o solo e o subsolo da patnél-
A paidéia in(en1acioi.1lizante do Pfsõ se liga no salário. A pátria qu;
se dane: Isso e co,sa do ISEB. O negoc,0 do l'I' é manter plenoem preg
Estou ciente de que Collor tainbérn não sabe que fazer O com o Estad
O 0
em p_rol da naçao. Trata-se de urn político descartc1vel, não de uIIl
estadista.
- --:--.--
A GLÓRIA DA MENTIRA OU
A MENTIRA DA GLÓRIA
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modalidade de socialização política: cocaína in vídeo. Trinta anos sem
eleição. Depois da tortura e da ditadura, a te)en?vela ga~1ha o yo_t<:;
popular. Doideira. Não dá ner_n para culparº. Piam ou ~rg1pe. Ma fe e
colocar a culpa nos descarrnsados nordestmos de São Paulo. Res-
ponsabilizar o voto do Brasil informal e excluir da parada o mercado
orgânico da Folha de São Paulo, Estadão, Veja, Isto E.
Em 1992 os donos da mídia não estão satisfeitos com o governo
Collor, porém isso em nada altera o nexo simbólico entre a ~elenov:e.la e
o presidente eleito. Aliás Collor não acionou nenhuma rned ,da antt-,m-
pren~. Ao ~ontrário, ele acredita no logos da ir!ipren~a. 1:,evé1. a .~ri? o
quesa1 publicado. Ele é um tela-quente queadm1rama1sa lwre m1c1ahva
da rrúdia do que o Estado, tal como os arautos do PT.
Se tivesse casado com a filha do Mario Amato, Fernando Collor
conseguiria carta branca jLmto aos empresários paulistas?º tv:Iorumbi
que estudaram na USP. Mas ele foi se engraçar com o ela eleitoral de
Cana pi. Aí deu no que deu: jet-ski, boeing para Seichel les, camiseta Paul
Macartney.
Dois ~no~ depois da posse, acuado pelo affair PC Far!as, Fernando
Collor so tena uma decisão política decente a tornar: bnzolar de vez.
Para que seu nome não fique na história do Brasil ao Ia.do do~ de Du~~a
eSarney. ~mbremo-nos daquela formuJação de Mag_L~avel,c,tada ~l 1é1s
mundos livros de Marcílio Marques Moreirn, o rnm,stro esclarecido,
:1eo-ilwninista,que oscila entre o libertéirioGlauber Rod1a e o banqueiro
Nalte~ Moreira Sales: político incompetente é imoral.
Fm profético?
Respondo com Tobias Barreto: o profetismo foi todo cólera, sem
~randes vislumbres de metafísica. Evidentemente tenho cá n.unhas
=;_rnpress~s guardadas na memória. Desconhecia completamente que a
:era do Jornalismo, Samuel Wainer héwia nascido no bairro do Bom
Retiro, em São Paulo. Sabia vagamei~te da tremenda rnaracutaia que lhe
apr~nt~ra nos anos 50 seu arquiinirnigo Carlos Laçerda: Wainer não é
~rasile1r~. Judeu ~usso fr?m Bessarábia. O jornal Ultima Hora. a~abou
mdo para o b~leleu, retalJado no Rio de Janeiro por um empreiteLro de
obras, e,_ern Sao.Paulo, pelo empresário Oté1vio Frias, da Folha. Foi ali,
rua Barao de Luneira, quarto andar, meados dos anos 70, que nos
conhecemos. O dandy Jorge Cqnha Lima, por sugestão de Samuel, se
encarr~gou de contratar para a Ultima Hora colaboradores baratos e de
~o~ m~el. O lance era o Jorginho pedir a um professor universitário a
?e
m~1caçc10 alg~m.s estudantes de pós-graduação. Os estudantes esco-
lhidos foram Fla~10 .Aguiar, José Miguel Wisnik e eu, o único pós-
gradL~ando em Cienc1as Sociais que tinha sido recomendado a Antonio
Cand1do pela pro'.essor~ Telê Ancona Lopes.
AaventuradoJornal1smodeSarnuelWainerterrninavaem 1972,ano
emquevendeseujornalcarioca Última Hora. Tive o prazer de conhecê-
18
lo depois da queda. De 1968 na 1972 estudei na USP, cultivando o hábito
de não ler nenhum jornal, exceto às vezes O Pasquim. Nunca havia lido
absolutamente nada do célebre jornalista. Para realçar essa minha la-
cuna, ele dizia de gozação que o clia em que fui conhecê-lo, teria eu
inocentemente lhe perguntado: - "Samuel, você conhece o Rio de
Janeiro?"
Trabalhei na Última Hora uns oito meses, escrevendo duas crônicas
semanais. Ganhava uma merreca por mês. Não dava nem para pagar o
táxi da rua Frei Caneca à Barão de Limeira. Mais tarde, de 1975 a 1976,
escrevi de graç~ no seu tablóide Aqui São Paulo. Os oito meses de
colaboração da Ultima Hora de São Paulo foram interrompidos porque
Samuel dançou. Em seu lugar subiu mna criatura chamada Giba Um,
que me deu um toque inesquecível para eu ir-me embora: - " Não
queremos intelectual no jornal."
Depois da rápida passagem pelo tablóide Aqui São Paulo, voltei a
encontrarSé1muel W ainerna edito ria da Folha de São Pémlo, nono andar,
1977, onde trabalhamos juntos, com Claudio Abramo e Ennio Squeff.
Assalariado e farto de aventuras, Samuel Wainer todos os dfas escrevia
sua coluna sobre política. Claudio Abramo, Ennio SquE;,ff e eu fazíamos
editoriais para o velho Otéivio Frias, o comprador da Ultima Hora em
1965, ano em que Samuel estava vivendo em Paris. Doutor pela USP em
1977, professor de sociologia na Fundação Getúlio Vargas, onde ga-
nhava por hora de aula dada - a nefanda categoria professor horista
-, recebo o convite de Claudio Abramo, por intermédio de Eduardo
Suplicy, para trabalhar como editorialista.
Claudio Abramo me apresenta ao filho do dono do jornal, Otávio
Frias Filho, na época jovem estudante de direito no largo de São
Francisco. Escrevemos juntos diariamente até 1978, ano em que recebo
um bolsa de pós-doutorado para estudar sociologia em Paris. Quando
soube que eu ia passar uns tempos na Europa, Samuel Wainer -
simpático e afável -virou-se para mim e disse o seguinte:"- Viajar é
muito bom, você vai conhecer outras mulheres, falar outras línguas,
saborear outros paladares."
No nono andar da Folha de São Paulo, Claudio Abramo me gozava
dizendo que depois de viajar pelo exterior eu iria compreendê-lo me-
lhor. DuranteodivertidoconvíviocomSamuel, somenteuma única vez
eleficouzangadocomigo. Umdiaelepercebeuqueeunãotinhaohábito
de ler a sua coluna. O público fü1, os políticos e os empresários Ham, e
eu não. Depois de ler seu livro Minha razfio de viver, o qual parece ter
sido ditado, mais do que escrito -embora feito com zelo e intenção de
I' posteridade-, fiquei a matutar por que Samuel não conversava nunca
t a respeito de sua participação na eré1 Vargas, que para ele encerrou em
r 1972, junto com a tristeza de abandonar a ambição de que(er ser dono
de jornal. Não há nada melhor do que ser dono de jornal. E um vi dão.
1
19
Privilégio total. Paraíso. Não há nada melhor, ele dizia. s
QuebecosemsaídanãofoiarelaçãodeSamuelWainercomosdono
de jornal, principalmente com Chateaubriand, o jagunço par~ib~n<? q~e
~cou milionário e qm~ combateu com unhas e dentes a ex1sten_c 1a ~
Ultima Hora através da TV Tupi. Curiosamente quem salvou Samue
Wail:erdosaclismopatrona.ldos D~ários As~iado~ fo) C:..etúlio Varg:~
Se nao fos~ o grande caudilho gaucho, ele nao teria v1v1do a aventL de
?e -nascido pobre -ser dono de jornal. Um desbundado dono
Jornal, segun~o os padrões da época. Um bon v~vant. ~~stas. ML~lhe~es
rn~mdana~. Viagens. Acesso direto ao poder e as not1C1as de p~nnei;
rnao, fabricador de manchetes da história de 50 a 1964. Conv1v10 co
Getúlio, Jot~~' Jânio, Jango. .
(\. rnemona de Samuel Wainer traz uma fenomenologia dos d~n?s
de JOrna~no Brasil, marcada pelo sentimento ambíguo de amor e ?d1~
emrela~aoaos proprietários. A regra do jogo con~in~1c1 sendo~ se~umte.
por mais que a imprensa se modernize, substitumd~ ª. n~aqum~ ~e
escr~~ei: pelo computador~ ela terc1 sempre como traç? d1sti ntivo a feiçao
. familiansta de seu dono. E o mesmo clima psicológico d~ c~sa grande
& senzala. O jornalista de talento não poderá ir além dos lurntes fixados
pelos donos de jornal, tal qual aconteceu com Claud.io Abramo, que
morreu pobre, humilhado e no ostracismo, embora tivesse elevado o
iúvel cul~L~ral dos maraj,1s proprietc1rios de jornal. Os don<?s d~ j~rn~l
sent~m Cll~mes e insegurança em relc1ção ao coeficiente de mteltgenc1a
d~s J?~nalistas, insegurança inclusive diante do fato de serem p~o-
pnetanos de jornal. Jornalismo não é urna coisa hereditária. Aqui reside
0 asp~to essencial da mercadoria na imprensa br~sileir~: a h~ra~1ça da
pr<?pnedade. O dono de jornal não é jornalista e o Jornalista mo e ~ono
deJorn~.Depoisdeassimilarosensinamentosdojornalistaprofiss1onal,
0 her~e1ro é obrigado a derrubé1-lo sem o menor escrúpulo.
N~o está en~ pa,uta o complexo da má consciênci~. Ns) jorm~lismo, a
propn~dade nao e um roubo, e sim uma usurpaÇé10. E por isso que
Clauclio Abramo costumavc1 dizer que dono de jornal no Brasil não se
comp?r~ .como dono de jornal. Ao contré'lrio do que ocorre com o
propnetano de terras, o dono de jornal não se sente dono legítimo da
emrresa. 9ra, depois da experiência de Samuel Wainer, é impossível
un~1ornalista talentoso tornar-se proprietário de jornal. Impossível furar
o sistema monopolístico das comunicações. Impossível ir além do nível
rnen.tal ou ideo~ógico do proprietário. Por conseguinte, não há outro
car~1ho a segrnr senão a carreira profissional pela submissão e puxa-
saqmsrr~o, de g_ue resulta o tipo orgânico do jornalista que veste a camisa
do patrao, enfu.n, o jornalista capanga.
1977. Cla~1d1?Abramornechamouna FundaçãoGetúlio Vargas para
escrever ed1tor.1c~s na Folha. O ciclo do jornalismo getulista havia se
esgotado defirntivamente hé1 cinco anos. Em nosso primeiro encontro a
20
aura da profissão de jornalista já estava enterrada. Não havia nem ilusão
perdida. Nenhuma ilusão no lance de escrever em jornal. Aí, tímido,
silencioso,ojovernütávio Frias Filho parecia umbenedüinoseminarista
parado na porta de olho na fresta. Eu pergunteiaoClaudioAbramo: "-
Quanto vou ganhar?" Ele respondeu no ato:"-Dinheiro não é comigo.
Fale com o Bóris Casoy." "-Quem é a boneca?"
Claudio: "-Pergunte aí que eles lhe informam."
Formar uma equipe de editorialistas tinha por objetivo aproximar a
imprensa da universidade e cooptar os jornalistc1s da imprensa alterna-
tiva dos anos 60. Eu somente costurei o lance da autobiografia com a
história em 1978, Rio de Janeiro, rua Vieira Souto: Glauber queria saber
de mim quem havia sido a pessoa que o convidara pam escrever na
Folha de São Paulo.
"-Foi oClaudio? Foi o Samuel?"
Respondi:
"- Não sei. Talvez tenha sido Otc1vio Frias Filho."
Glauber interrompe sua colabornção na Folha ao saber quanto o
jornal pagava por artigo publicado.
"-Que vergonha!"
Ainda que àlijado da direção em 1977, Claudio Abramo era o
intelectual epicentro do jornal. Pelo nono andar passava um montão de
genteafimdevê-lo. De Roberto d' Avilaa Pc1ul0Maluf. Em 1978,ao lado
de Claudio Abramo e Samuel Wc1iner, Glauber pegou no meu braço e
disse: "-Daqui a dez anos você estc1rc1 no poder."·
Claudio Abramo retrucou a brincadeira: "- Daqui a dez anos ele
estará na direita."
No dia seguinte perguntei pc1rc1 o Samuel Wainer o que ele achava
do cineasta, pensando certamente ouvir referências as mais elogiosas.
Séunuel no entc1nto foi extremamente seco na resposta:"- Um gênio,
mas maluco."
Dez anos depois, 1988, pasmo em constatar que as memórias de
Samuel Wainerestãoembutidas no drama do filme Terra em transe. Em
1967, no exílio em Paris, Samuel é enrolado por um cineasta grego
picareta. Sua ex-mulher, Dcmusa Leão, musa doCountry Club, atriz do
filme de Glauber, faz o papel de éHm1nte do poeta e jornalista Pc~uJo
Martins. Dcmusa é a amante grãfina que lhe foi cedida pelo caudilho
Porfírio Diaz, o alterego de Cúlos Lacerda, ditador gay coroado pelos
latifúndios rnultinaciónais de Eldorado. Terra em· transe contava a
história do janguisrno junto com metáfora barroca do lacerdismo. Cen-
sor de Deus e ó diabo na terra do sol, Carlos Lacerda inspira a drama-
turgia de Terra em trcrnse. O transe é de direita.
No primeiro tratamento dado ao filme, agosto, Roma, 1965, redação
dojornal,ojornc1listaPc1uloMartins,34anos,discutecom0tavinhoFrias
Filho.
21
Patrão: ,,
"-Um jornal é uma empresa que nem a Volks.
Paulo:
"- Mas eu só publiquei fatos."
Patrão:
"- Acontece que os PC Farias pagam apenas pelos textos que
interessam a eles."
Paulo:
"-Assim não é possível. Há um limite."
Patrão:
"-O problema é seu. O jornal tem uma linha." ,
Paulo Joga a carteira de jornalista em cima da mesa. Esta desempre-
gado. No olho da rua.
Volto do exterior em 1980. Samuel acha que eu v~ltei ~~nobe da
Et~opa, escrevendo coisas absurdôs e ininteligíveis. O s1n:1r:at1co v~lho
Fnfs queria me fazer crítico de televisão, justarn~ntea tele~1sao que tirou
a Ultuna Hora do ôr. Minha aventura stendal,ana culrrnnou com l~m
pitoviolentoquerecebideSamuel Wôiner: "-Jorml não ébrinrndeira
de intelectual."
Samuel. amava a retórica do inimigo Carlos Lacerda, o j~rnalista ql~e
desconhecia o funcionômento tipogr~fico do jornal e qL_1e na? consegrna
transar bem a redação. Carlos Lacerda rebatia a critica dizendo que
Samuel \t\:ainer gostava môis do jornal do que do país. . .
A partir de 1972 Samuel Wainer assistiu a questão do naoonahs~o
1esaparecer do môpa da imprensa, sendo substituído pela ideolo~1a
libe~~l plurnlist~,_ainda que permm1eça até hoje~ ~11esmé~ repro?uça~
1
fam1l~ar donatanô, e também a posição refrataria ao populismo
getul1sta. A mídia dos anos 90 ainda sonha com a morte de Leonel
B.rizola, repetindo a frase de Samuel Wainer: "-A imprensa pode não
ªJuda~ a ganhar, mé1s éljuda a perder."
N~o_obstônte a atitude hostil da imprensa, Getülio VarJ;~S ga~1hol~
as,el~1çoes de 50 em São Paulo, a boca do leão, como ele dizia. Nao ha
~uvida de que o antigo bloco dô UDN, Xatô/Lacerda/Roberto Ma-
rml~o, reaparece na oposição da grande imprensa à linguagem do
nacion~l-popular-tr;:ibalhismo. Em 1992, Leonel Brizola está condenado
a ficar a marge~n ou contra a grande imprensé1.
Samuel Wame.r acabou jantado pelo capital monopolista para onde
ele retorna como JOrmlista assalariado no final da vida muito embora
se estivesse vivo, é bem provável que não votasse em Leonel Brizola.
22
DE ROBERTO CARLOS
A OTÁVIO FRIAS FILHO
23
,
VIVA A VIDA MARAJA
24
República.
O poeta Fernando Pessoa dizia que o "novo" é erroneamente apre-
sentado como antípoda de "velho", quando na verdade deveria ser o
antônimo de "antigo".
Socialmente perverso - e sexualmente obsceno no trato com a
"modernidade"-, o partido da tevê, a maior herança viva da ditadura
militar, defronta-se hoje com o grande desafio de derrotar as lideranças
trabalhistas, ou seja, fechar através do voto o círculo que começou com
brucutu em 1964.
O travesti Roberta Close é a alegori,1 do homem das Alagoas. Ele
aparenta aquilo que ele não é. Mas àparenta peh-1 imagem. Trata-se de
um ícone da direita cuja presentificação é levada ao máximo. Um
candidato nascido ex-nihilo. Sem passado. Sem memória no tempo. E
que surgiu como um raio num céu azul, diria Karl Marx.
A Collor Kulturéa anti-etnografia. O caçador de marajás quer matar
o nosso pré-avô. ·
De olho deslumbrado m1s eleições norte-americanas, a assessoria
camp-cariri do Collor não deposita o menor valor persuasório rn
memória do povo. A história é pesadelo. Dane-se a memória. A decan-
tada ausência de memória histórica do povo brasileiro é vista corno um
fator altamente positivo pelo marketing da campanha, cujo interesse
primordial é o fetiche da estatística e su,1 repercussão na cl,1sse política
e no meio da chamada opinião pública. Acontece também que a socio-
logia já está collorid,1 quando assegura que opinião pública é número.
Bom ícone não deve abrir o bico. Se Collor destampar as asneiras,ele
dança na campanha. Isso porque a ilusão de um Collor sem passado
pode trair-se pela fala. O êxito da telenovela co11orida é o silêncio.
Se Collor é a perversão audiovisual, não basta fazer-lhe oposição
apenas de natureza ideológica, como a que tem sido feit,1 por Lula e
Brizola. Pseudo caçador de maraj,ís, a nova cara da direita, o garotão da
ditadura, etc.
A esquerda ainda não entendeu que o verd,1deiro não é popular,
assimcomonãoéatravésdahistóriaquerolaamemórianoBrasil.Nosso
povo acredita que o inconcebível pode ser verídico. Alertando Leonel
Brizola em 1979, o cineasta Glauber Rc~ha dizia que a ra2c10 mística é
mais importante do que a razão política para se chegar ao poder. L
Politicamente, Collor j,í estéí eleito pelas pesquisas: todavia um fato
qtúmérico ou sobrenatural poder,í derrubá-lo do cavalo, mesmo porgue
falta-lhe aura, carisma, sentimento místico-religioso. O verniz collondo
é roHudfano e talvez não resista a urna campanha adversária que tenha
como mote bárbaro o fortis imagina tio do povo. Só a técnica do folclo:e
derrubará a candidatura Collor. No bumba-meu-boi, as damas sao
travestis.
25
OS POBRES NAO
-
MORREM DE OVERDOSE
27
A glória eleitoral entre nós vem da garganta. A desmontagem c~ít~ca
da garganta desmistifica a glória pífia da cha1nc1da é[:oca d~ trans~çao.
O Brasil está em transição desde a abertura dos portoSé1S naçoes amigas.
E, pensando bem, é insuportável esperar a transição depois da ex~eriên-
cia da tortura. Nossos olhos e ouvidos estão totalmente orgarnzados
pelosmeiosdecomunicaçãodemass,1. Na terra dosorndores hé1 sempre
mnouvidoaentupirdebobagens. O filósofo Tobias Barretoestayacerto
ao situar o homem banal brasileiro entre o cachorro e o papagaio.
A análise acústica de blá-blá-bl,1 eleitoré1l revela corno é tênue a
diferença que separa a ideologia dominante da ideologia dominada, se
é que ainda se pode falar er11 té1l diferença né1 época do capité1lismo
cósmico unificado.
O conceito de esquizofrenia não tem 11c1dé1 a ver com a ciência
psicológica. Ao integrar o imaginá rio popular brasileiro, a comunicação
de massa monopolizada tende a se apresentar rné1is inclusiva do que o
Exército e a lgreja .
. Esto~1 convencido de que não hé1 produto cultural de valor que nã?
seia enunentemente antimídia, a despeito da obra crítica de José Gw-
~herme N!erquior, que não comprou brigé1 com os proprieté1ric:s d~
JO~n~l. Alem da mídia eletrônica Sé1fada, existe outra importé:-1nte mst~-
trnç_a? da sociedade civil que estrutura a rnenté:-1lidé1de coletiva: a Igreia
catol:1c~, a religião oficial do Estado. Né1s eleições de 1989, a socieda~e
brasileira a~sistiu a um debate ideológico em que a televisão e a lgrep
foram consideradas corno dois cabos eleitorais.
~ascida no início dos anos 60, concomitantemente é10 desen-
v?l~m~en~o d? monopólio televisivo, a teologia da libertação é uma
dis~1d~nc1a cnstã no seio da Igreja que quer se identificar ao pobre e ao
opnm1~0.. A teologia da libertação se organiza em comunidades e
pastora;s, mcorporando em seu discurso alguns conceitos do marxismo.
Um. teologo da libertação utiliza-se do conceito cfa mais-valia sem
abdicar da sua f~ cristã. Quem é que a lgreja apóia? A emé1ncipé1ção dos
pobres e dos oerunidos passa necessariamente pelaseleiçües. Eevidente
que nessa opçao pelos pobres existe o problema de se justificar por que
a mensagem de Cristo - o Deus dos oprimidos - se é1fina mais com
fsbte ~u ~quele.partid? poJítico. Excluindo Leonel Brizola, a teologia da
1 ertaçc10 apoiou Lu1s lnacio Lula.
No Brasil ninguém faz política dentro de G1Sé1, porque parente não
se engana.!",. telenovela entra numa boa dentro de G1Sé1, fazendo política
durat~e seis. horas_por dia. A Nova República de José Sarney jc1 foi um
novelc~o de Jªq.uetao. Ela consagrou a cínica dissociação entre forma e
cRonteud?.Mettdo~poeta,JoséSarneyouveVila-Lobos,admiraGlauber
ocha, cita Bakunm e reata com Cuba.
A ~itadura militar era paranóica.
Hoie o que vinga éa sintomatologia esquizofrênica. Transição legiti-
28
mada pelo voto popular, em que a indústria cultural se identifica cada
vez mais com o Estado. Foi-se a época em que a sociologia se debatia
11
entre a autonomia intelectual da cátedra e 0 satanismo do poder
11
político ,atacandoouelogiandooempresariadoindustrialcomoagente
do progresso e da modernidade. Basta repmar nas afinidades entre Luiz
Bresser Pereira e Fernando Henrique Cardoso. A sociologia se reduziu
a um saber empresarial com vocação para a dominação, ainda que
Horestez Cuércya nunca tenha lido Max Weber, o qual, no entanto, é
citado por Fred Mazurkely no Palácio dos Bandeirantes, o palácio mais
feio do mundo, segundo Darcy Ribeiro. .
11
- Quem age é sempre sem escn'.ipulos, só quem observa tem
11
consciência.
Dez anos antes de aparecer no pedaço o Plano Cruzado bolado pelo
Be1Juzo e João Manuel, Claudio Abramo alertava-me em 1977 para a
melancólica fusão entre a imprensa e a universidade de São Paulo. Até
hoje ninguém cogitou de uma CPI em torno do empresariado progres-
sista de Sé10 Paulo. O empre&frio Antônio Ermírio de Moraes deixa no
chinelo a dupla Calvino e Lutero ao proclamar que trabalha 16 horas
por dia. Depois que ele colocou um bilhão na conta do PC Farias, o
Richelieu do Collor, Antonio Ermírio de Moraes é objeto de goz.ação nos
bares da Vila Madalena: nosso empresário despacha no motel.
Desde a época de Ma rio de Andrade que se espera uma campanha
cívica para eliminar do inconsciente paulista a veneração pelo nababo,
seja o fazendeiro da UDR, seja o industrial cafajeste, seja o doleiro
cara-de-pau. O fato é que o milionário dá o maior tesão nos mamelucos
de São Paulo. Este complexo psíquico pode ser resumido atrnvés do
seguinte apotegr11c1: quem não tem dinheiro não tem rnzão.
A cada dia que·passa a coisa piora com a justificativa precfüia do tipo:
no início do Plano Cruzado é que era bacana, é1Ssim como alguma coisa
de bom no golpe de 64 se perdeu com a morte do marechal Castelo
Branco. A mídia em São Paulo só começou a se indispor com a ditadura
depois da morte de Castelo, como se a queda de João Goulart fosse um
acidente de percurso. Ora, Collor é impensável sem a queda de Jango.
E Jango não caiu por culpa própria, não obstante as conclusões eqtúvo-
cadas da sociologia paulista sobre o populismo.
Neste livro faço meu ajuste de contas com o mestre Sergio Buarqu~
de Holanda. Não é preciso dizer da minha admiração por ele, patat1,
patatá; porém é preciso ir além da reverência paralisadora, repressiva,
baixo astral. De propósito misturoaJangarana deGlaubercomas Raízes
do Brasil de Sergio Buarque de Holandéi. Por telefone, meu ex-professor
Gabriel Cohn perguntou-me: 11
Por que Sergio Buarque haveria de
-
11
escrever sobre João Goulart e Leonel Brizola?
Boa pergunta. Em 1936 é publicado o ensaio Raízes do Brasil que
mostra a carência de ascese puritana em nosso patronato, a causa de
29
nosso capitalismo mal ajambrado, com uma burguesia hedonista tal
qual a burguesia fogosa das novelas cariocas. Nesse mesmo ano, 1936,
conforme a memória de Darcy Ribeiro em seu livro Aos trancos e
barrancos, Leonel Brizola "rapaz pobre, viaja para Porto Alegre com
passagem de segrn1da classe, dada pela prefeitura de Carazinho. Na
capital, trabalha como ~1graxate e jornaleiro, correndo grande risco de
virar rnn trombadinha. E salvo por uma matrícula gratuita no internato
de uma escola témica".
Enquanto Briza era menino de rua, Sergio Buarque de Holanda
:m~u:racava? ensaio que seria paradigmático tanto à esquerda quanto
adire1ta.Serg10BuarquenãoescreveunenhumlivrosobreJoãoGoulart.
Por~ foi ele o historiador que estabeleceu a equação entré o polític?
caudilho e o político liberal na América Latina. Do livro Raízes do Brasil
tam~1!1 res~1~ta outra oposição entre modernidade e populi~mo,
opo~1çao politicamente equivocada, conforme se observa pela leitura
dos mtelectuais petistas e tucanos.
De_repente em Brasília surge a modernidade Collor, em oposição ao
popuhsmo da tradição vargúista. A Brasília de Collor é a anti-Carta
T~tamento. Esta frase há de provocar um certo frisson no meu caro
leit~r, que certamente está de olho na esdrúxula aproximação de Collor
e Bnzola a partir de 1991, o labirinto da política que talvez será destrin-
chadosomenteem 1994. Duranteacampanhade 89 Leonel Brizolafalou
c~bras e la~artos sobre o Nandinho, o filhote da dita dura, o playboy da
c sse don:i-~ante perversa que resolve brincar com a política. Política
~o~o c~irt~çao de filhinho de papai. O cara que resolve ser presidente
ª epublica sem nenhum pudor com relação ao cargo. Chega lá, viaja
; m~mdo, pula de pára-quedas, curte com a cara da gente e coloca no
~urnculo ~mta e cinco milhões de votos inúteis e arrependidos.
~que~ que o Brizola percebeu de positivo na façanha desse jovem
r
d~e 01 ele;to ~lo voto presidente da República? Aí vem o badameco
so ~dica~o1de, com uma revoluçãozinha na cabeça, esculhamba O
Qn 10 do _Bnzola de querer ser presidente da República hé'i 35 anos.
uase a :dade do Collor o desejo do Brizola.
ro~t1ª1 e, o _Problema de querer ser presidente da República? O
Lula ema e nao querer ser presidente da República. Tal qual o fake do
em Bque !1un~a tolerou a idéia de morar em Brasília. Para ele o poder
se p ras~a sena um sacrifício. A capital da República deveria transferir-
A ~ª. 0 ~~etano. Não é à toa que Lula quis voltar à porta da fábrica.
_nca lmca do sonho Libelu mistificado em operário marxista
pad,rao.
E .
ACtvfreciso v~r o aves5? de Caetano Veloso na performance do exu
od · ~ ~ B~i~ola refreia a aprontação de Collor no poder? Jéi que o
P e:e mev1tá":'~l d~pois que ele foi empossado em 1989. Sem o
caudilho, Collor Jª tena privatizado o rio São Francisco.
30
A KULTUR
- RAMBOCOLLOR,
COM XITAOZIM & XORORO
ou
FAUSTAO TEM PAU
PEQUENO
31
uma vez do colonialismo: acabou lá, acabou aqui. O PTB se fortalece
porque preenche o vazio deixado pela morte de Getúlio Vargas. Cresce
a tal ponto que seria a maioria da bancada em 1965, caso não houvesse
o corte de 1964. Foi o pé1rtido que teve o maior número de cassações,
enquanto eram poupados dos Jistões Tancredo Neves e Ulysses Gui-
marães, os futuros condutores da transição José Sarney.
O golpe de 64 teve por objetivo golpear o PTB e o PCB, e mais o
primeiro do que o segundo; e mais o primeiro mcionalista do que o
segundo internacionalista. Daí a babaquice desedizerqueomovimento
s!ndical começou de verdade apenas no ABC paulista em 1979, ano do
fim do bipartidarismo. Aí surge o PT como fruto da djstensão lenta e
gradual de Geisel e Golbery. Ameniza-se paulatinament~ a repressão.
lnterrompem-seascassaçôes, toleram-se as greves. A partir dos anos 70,
com a telenovela correndo solta m cuca -dos brasileiros, assume a
corrente civilista do golpe de 1964, capitaneada pelo senador Petrônio
Portela. Havia chegado a hora de restaurar a democrncia no Brasil. O
ch~ncelersocial-deénocrata alemão Willy Brandt passou umesporrono
Geisel sobre a conveniência do Brasil anistié1r seu amigo Leonel Brizola
e os demais líderes ainda no exílio. ·
d Só u~ia legenda part~<;Iária foi ~~nazmente co.m~ati.da pelos m ilita.res
e 19~. o PTB. A paran01a dos 1rnl1tares era a ex1stenc1a do PTB, partido
~tr~ ,d? qual o líder Leonel Brizola pudesse juntar ao seu o carisma
de tuh<? Vargas e de João Goulart. O general Golbery, o gênio da
.esgraça, impõe a condição de tirar o Brizola do exílio subtraindo-lhe a
s1g1a - ·
1 'magicado PTB. lmpedidopelarnanobradogenernldereestruturar
~ eg~adovelhopartido,LeonelBrizolaeseusamigosfundamoPDT,
e! o que o PDT é o filho de criação do Brizola.
PT m~~obra do.bruxo se completa com a criação de outro péirtido: o
da~ ~t~e ina repartir com o PDT os votos d?s tra~é1ll_1~c.iores er~ be1;~fício
PT é ~5fs conservadoras. Do ponto de vista d 1abolJCo-maqu 1avehco, o
A inJ- etr~novela do general Golbery do Couto e Silva. Lula, PT, CUT.
us 1ª automobilística sob o comando dos militares.
32
1
O CANDIDATO DO
COMPUTADOR
º
golpe de 64 na era da informática chama-se Fernando Collor. Sua
vida política começa corno biônico prefeito de Maceió,a casa grande
da oligarquia alagoana. Já não é mais a indústria automobilístià1, mas
sim o hightec do inarketing político. Um jovem que poderia desempe-
nhar pé1pel de ator de novela da Rede Globo, modelo executivo que
desbundou na ~01üréKultura pop dos Beatles e dos Rolling S~orn.:s,
conforme as fe~tmhas de embalo mui locas denunciadas pelo seu mnao
Pedro Collor. E o sócio do doutor Roberto Marinho em Alagoas, porém
com um toque diferencial: ele investe fortunas na sua própi-ia imagem.
O Kennedy da cana-de-açúcar que exibe um nome de gringo: o Colla,
como diz o povo. Narciso, vaidoso, hedonista, Collor está sempre rn
frentedacâmera,enãoatré1sdacârneracomoodoutorRobertoMarinho,
que lhe oferece a logística da telenovela para ganhar a Presidência da
República em 1989. ·
Nos anos 50 a palavra rnarajé1 designava um nababo dono de jornal.
Por exemplo: Xatô, o proprietéfrio dos Dié1r"ios Asstxiados. Nos an~s 60
o poeta Carlos Drurnmond de Andrade empregou a palavra rnara1aem
uma de suas crônicas. Ness,1 déGKfa Xatô foi substituído por outro '
marajá: Roberto Marinho, o rei dos marajás. Mas rnzão também cabe ao
presidente norte-americano George Bush, que cha rnou Perna ndo Collor
de Indiana Jones, situando-{) como uma versão hollywoodiam, como
se o caçador de marajás fosse um seriado de tevê com a bandeira da
moralidade, caçando de menti rinhé1 os funcionários públicos ociosos.
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No meio do povo a palavra marajá, sob ,1 influênci,1 da revista Veja
e da Rede Globo, vira sinônimo de indivíduo rico, barão, esperto.
Acrescente-se que, dependendo da escala social, maré1jéí para o pov~
designa o simples brasileiro que est,í de sapato. Quem está de sapc1toe
marajá Quem escapou do genocídio social é rncirajá. Forçando a com-
paração, terÍéHnos a seguinte polaridade: marc1jcí ou mendigo.
O PREÇO DA
ESQUIZOFRENIA
NAS ESQUERDAS
BRASILEIRAS
,
E provável que no élno de 1989, às vésperns das eleições presidenciais,
o povo brasileiroc1inda éllimentélssea esperança dever concretizada
a dobradinha Leonel Brizola e Luis Inácio Lulc1, aliança trabalhista que
seria eleitoralmente imbatível, fossem quais fossem seus adversários
polí~icos e ideológicos: JânioQuad ros, UlyssesGu irnarães, SilvioSantos,
Mano Covas, Antônio Ermírio de Moraes, Collor de Mello, etc.
Nunca a direi ta no Brasi Iesteve tão acéfalc1, mas não deveríamos nos
esquecer, como advertia o saudoso jornalista Claudio Abramo, quem
hora agcí. adi rei ta seu ne; e, a depender das circunstâncias, se houver um
bloco forte e bem articulado da reação direitista, não há dúvida de que
a esquerda fracionada corre o sério risco de perder a chance de chegar
ao poder. Se porventura forem muitos os candidc1tos da direitc1, a
separação em chc1pas diferentes de Brizola e Lula pode não representar
um fator tão grave para a construção da democracia social; no entanto,
se por uma infelicidade qualquer, nenhum dos dois candid~tos chegar
ao segundo turno, caberá à direção das esquerdas trabalhistas a res-
ponsabilidade por essa lamentável involução histórica.
O povo, na sua imbc1lcí.vel vocação musical, jéí. denominou a d~bra-
dinha Brizola e Lula de Brizula, aliás um feliz anagrama que antecipa a
possibilidade concreta de té1I aliança: Brizuh-1 já! ·
35
r
Destarte,oquepareceatr~p~lh.art~lalia1~çanãosão!_ato.re~his!óricos
inamovíveis, e sim pessoais, 1d1ossmcras1é1s ou sen~o. lllJU:1çoes de
ordem partidária. Acontece porém que o P?vo brasileiro nao tem o
hábito de conceber o jogo político sob o pnsma das estrutura.s pat~
tidárias. [)e acordo com a mentalidade coletiva, se realmente Bnzola e
Lula estão no mesmo barco, por que então os ~ois no.n~es não se unen1
para ganhar a batalhé~ elei~ornl? EsSé~ é a questao dec1s1:1a do p~nt<.: de
vista popular; fora da1 a coisa complica porque se torna 11npresc11.1d1ve1
justificar os verdé1deiros motivos pelos quais cada um dos candidatos
corre em chapas diferentes. ,, . . . .
Justiça seja feita a Leonel Brizola, que Jé1 tomou a m 1c1élt1va de co1!1Eºr
um acordo com Luis Imkio Lula, procurand~o antes das ele1ç~
mrn1icipais de 1988, com o objetivo certamente de convidá-lo pata
vice-presidente. A iniciativa de Leonel Brizolé-1, como se sabe, resultou
munfiascocornpleto,postoquenãosechegouanenhumacordo;apenas
um pacto de honra foi combinado: o de que no segundo turno das
eleições, na eventualidade de somente um candidato disputar o páreo
final, ocorreria fatalmente um é1poio mC1tuo: Lula por Brizola e Brizola
Pº: Lula, de modo que ou foi adiada a composição Brizula, ou ficou
~v1d~nte que tal aliança trabalhista é uma quimera que não se efetivará
Jar:na1~. Resta a possibilidade,sem dúvida otimista,de que a baté1lhafinal
seJa disp~ltada voto a voto pelos dois candidatos, assim como é remota
eventuahdade ~e B~izola ou Lula ganhar por 51 'X, já no primeiro turno.
. Antesqu~seJa fe1taqualquerponderc1çãodeordem realista,épreciso
clizerquea.temesrno os mais ardorosos militantes de ambos os partidos
desco1~h~c1am as elementares regras do jogo eleitoral em dois turnos.
que. ~a o povo, que pela primeira vez ia votar em duas etapas! Isso
signi_fica que, 1~a ótica popular, a idéia de ganhar no segundo turno é
e~dh~dhcament~ 1gL!al a prorrogação em jogo de futebol, óu partida d~
ci I a por penalt1. ·
se ~ condisão preliminar de um acordo em torno da aliança Brizula
naª ~gumte: decidir por critérios racionais quem deve ser o vice de
~~:~ atura.h:nente os ideólogos do PT, quando ouvem falar em um
de L tl ;~~~re Bnzola e Lula, retrucam com a pergunta:"Ah! Brizola vice
tal ar a. ssoquan~opormotivossirnplesmentesectáriosnãorecusam
de qL:aenleça, por C<;>ns1deré1-la espúria ou ilegítima, tendo em vista O fato
e doutor. onel- Bnzola n"o , .- · d - f' - .
e, e um operano e pro ISSé10, e sun engenheiro
.
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Sul e no Rio deJaneiro,antesedepois de 1964,é inteiramente compreen-
sível que o nome dele sejr1 cogitado agora para presidente, e não vice de
Ltús Inácio Lula, cuja meteórica carreira de líder metalúrgico é sem
dúvida um prodígio: quarenta e três anos o homem jcí estií se candi-
d~tando a presidente da República. Mas é também inegr1vel que ele
amda preciSél ter maior vivência e mais horas de estudo para adquirir
urna compreensão abrangente dos problemas brasileiros e da
geopolítica mundial. E, do ponto de vista estrité1mente té1tico, convém
lem~r~r que Lula perdeu as eleições para o governo de São Paulo. A
amb~çao do PT é que o seu líder Sélia direto de deputado federal a
presidente, passando por cima da experiência e da administração como
cl~~fe de\1mexecutivo regional. Todos nósSélbemosquea política. como
alias, a v1d~, não é em ordem diretr1; assim, nada, impede que um
contínuo se3a candidato a presidente da República.
O cerne da questão consiste na avalir1ção histórica dos dois repre-
sentantes da esquerda trabalhista. Quem é o melhor candidato para o
povo brasileiro? Não héí como fugir dessa perguntél, principalmente se
cada um Sélir candidato em sua chapa. Orn, por avaliaçã? his~óric~
enten~a-se que a amHise da relação capital e trabalho asSéllan~do n~clu1
o Bra~Il como um todo: de A a z. O que está em pauta na d1scussao a
respeito _das duas lideranças trabc1lhistas é a totalidade histórica; P.ºr
consegumte, convém evitc1r o ponto de vista demasiadamente setonal
e fragmentador da realidade.
A discussão sobre a escolha do melhor candidato trabalhista deveria
começar pelas identidades e dessemelhanças entre um e outro. O que é
mais fácil apontar: as identidades ou as diferenças? Peloquese obse1vou
através da elaboração da Constituinte, O PT e o PDT feché1réHT1 posições
9.ua~ ~npre jL!ntos; no entanto, quand~) ~ trata d~ disc~Jtir o per~I
1deolog1co de Bnzola e Lulél, existe é1 tendenoa no meio dos 111telectua1s
e da juventude universitcfria de sublinhar dois fatores diferentes: o
marxismo e a origem de classe. Resulta daí a identidade de Lula como
marxista (ou próximo dos teóricos marxistas), assim como ele repre-
sentaria um avanço progressista da utopia social. Se porventura IX;~gun-
tarem a Florestan Fernandes por que o seu voto é do Lula, o sooolog?
de A revolução burguesa diréÍ sem pestanejar: trata-se de uma candi-
datura contra a ordeÍn. Com exceção de Lula, d irá Florestan Fernand~s,
todos os outros candidatos fazem rnédiél com os militares que estao
den~ro ou fora do poder. Evidentemente a paixfü: (diga-se (~e pa~sagern, !
tard1é1) pelo mc1rxisrno em Florestan Fernandes élS vezes nao o impede
de arquivar a dialética da luta de classes, ao preferir pessoalmente o
tucano Ma rio Covas ao trabalhismo de Leonel Brizoh Para Florestan, 1
-l
esquerda é só Lu la,enquanto Brizola situa-se no "centro", e Ma ri o Covas
na "centro-esquerda". .. _ 1
Não obstante esSél classificação tipo samba-do-sociólogo-do1do, nao
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existe apenas o marxismo anti-ordem domi11;111te de Florestan Ferna1y
des no PT,assim como o próprio Lula não se declara um líder marxistél,
sem esquecer também que existem marxistas e soci;11ist;1s 110 PDT, de
modo que não é a posição ideológica rrnrxista que diferencia Leonel
Brizola e Luis lmkio Lula, assim como não tem nenhum cabimento
afirmar que o primeiro é um reformista neocapitalist;1 e o segundo um
revolucionário anticapitalista. -
Enfim, chegou a horn d;1s forç;1s progressistas e de esquerda supe-
rarem os seus preconceitos e as suascisõesesqu izofrênicas, poisa direitél
ganhou as eleições presidenciais de 1989.
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A ÉTICA DO PC FARIAS É A
ESTÉTICA DO DOUTOR
ROBERTO MARINHO
~f
recéber:~1~ t Gilberto _Fr:eyre, destacam que a "linha de cor" não deve
Assim to . ra amentong,donoestudodosfenômenossócio-culturais.
Brasil c'011r1na-s~ necessário tomar cuidado para não identificar ·1 tevê no
o veiculo de ·. - b <
não se resolvem 'r I com~H_Hcc1çao ranco, preto e colorido. Também
mistura das c). g ª ides coisas apenas com a constatação a respeito da
e ies no produto ·1ud· ,· 1 o , · d ·
ausencié1 de sr
A
,· . . < IO\ isua · urnco ado irrefutéivel éa
. , enc10, seJél na mngern b ·1 I1 ,. . d .
pot, seJa o som bl·-'ck . t A < · . rc ca a prepon erar no rnelt1ng-
D'f . <• nc1 eve sexy -
A ,rCJlrnente urn cienf t· ·.' 1
teve made in Brasil t ,Is cl soc,a 'regulando bem da cuca dirá que a
t: ·
azra amor em ritmoem a gurna.t coiSé1~ <a ver
lento O •
·o '
~ mo nosso é1meraba, que
sentar célere, rapidinho v~ lo-n· rpoüo~rnc~t,vo global tende a se apre-
, - ci- ª· tipo ideal de coito veiculé1do pela
42
nossa tevê é o do negro mistifirndo em grande Fucker das Três Raças
Ferradas. Cabeça de negro, segundo o romance de Paulo Francis. Seu
amigo Millôr Ferrnrndes não vê televisão mas se apaixona por um
computador.
Uma análise semiológica do som plus imagem revela que o modelo
sexL~alda sociedade brasileira éo !oi ré1ÇO que copula em ritrnoafr?-bod~-
tropJCal. Ao som de um bé1le-estc1rn-heavy-motoca, cada dia mais
agudaço, lá no morro ou cá na cidade. l love you. Amor macho. Amor
jóia. Amor luxo. É esse paradigma extraído do tagarela rithm afro a
fissura existencial de que se aproveita a chamada música popu;lar
brasileira para dopar os ouvintes idiotas iludidos com oolhareletrômco
da paixão.
43
A FÓRMULA 1
É O COLLOR NO PODER
44
No Brasil, todomundoédiscípulodealguém,do Buda,de Marx. Alziro
Zarur é mais importante no Brasil, mas é1S pessoas não entendem isso."
Imagine se a Rede Globo resolver lançar às vésperas das eleições de
1994 uma novela com o Tarcísio Meira e a Vera Fisher intitulada "O
maragato filho da puta". O desocupado leitor se lembra da novela "Que
rei sou eu", de 1989? Ou senão a indecente novela "O salvador da
pátria"? Infelizmente os políticos de oposição não são capazes de sin-
croniz.ar a telenovela com o horéfrio eleitoral gratuito, assim como não
percebem que a semiologia da Fórmula Um tém muito mais a ver com
o voto do descam~sado do que sonha nossa vã filosofia. )é1 dizia o padre
Antonio Vieira: "E uma história nova sem nenhuma novidade, e uma
perpétua novidade sem nenhuma coisa de novo."
45
JOSÉ GUILHERME
MERQUIOR PLAGIADO
NO PLANALTO ÁGRAFO
DE 1992
quando tal notícia veio a lume José Guilherme Merquior .n~~) esta~a
mais
0 neste mundo, de modo que fiCéHnos sem &1ber de sua op1111c'.osc.:b 1e
caçador de marnjás, epíteto mistificador e coloni2c1do da v1tonosa
campanha eleitoral de 1989. .
Confesso que tal notícia me deixou atô11ito,c1inc.fa rmliscom a suspeita
de qt~e ~erquior teria votado em Collor no primeiro turno. _
N~o .e possível. Mario Covas, talvez sim; mas Collor, nunca. N~o
acreditei porque um não tem nada a ver com o outro. Refiro-me ao estilo
de _ca~a. um do ponto de vista da expressão. Merquior é a letra com
~aciocmioconcatenadoemuitasleitura
O em sua vida de biblioteca. Coll_?r
e estudante da classe dominante brasileira que gazeteou aula e nao
estudo}~ em casa, embora tivesse herdado a bibliotéca do pai, Arnon de
Mello, c~tadopor Luis da Câmara Cascudo numa crônica musical sobre
Gershwm.
M~rquiorpoderia votar até em PauloSalirn Mc1Juf, o amigo PÓS do
embaixad<?r Roberto Campos; todavia Collor era inimagim1vel. ~
pont~ d.e vista da gangue mui tirníd ia, é provável que tudo nessa históna
de plagio tenha sido um fake do fake: urna astúcia da falsificação. Com
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certeza ninguém ifé1 comprar é-1 biblioteca de Fernando Collor de Mello.
Segundo Karl Marx,a colônia é trc1gica porque nasce impossibilitada
de mudar a face do mundo, apesar de fornecer tcrnto ouro e prata ao
FMI. O neoliberalismo é crítico em relc1çãoa Marx. Os países industrial-
mente mais desenvolvidos ainda estão em condições de mostrar aos
industrialmente atrasc1dos a imc1gern de sm futura modernidade. José
Guilherme Merquior, plc1gicKio por FernandoCollor, esté-1 mais próximo
do pré-isebiano Hélio Jaguaribe, o Rousseau do Moreira Fmnco, do que
de Raimond Aron, citc11ído Marx em Araraquarn: "A história não faz
nada."
Marcílio, Lafer, Rouanet, Jaguaribe, a limpeza que se seguiu à gestão
jeca-pop de Zélia Cardoso é de extração intelectual merquiorana, de
modo que se ele votou em Collor no segundo turno, ternos a hipótese
de que o Merquior foi o que esté-1 sendo Leonel Brizola para ~o)lor, no
sentido de aliviar a cagada institucionalizada e legítima. Jr1 d1z1a_meu
arrugo Benito Perez quê o Fernando Collor anda arrepend!~t~ d~ nao t~r
estudado quando jovem. Em todo caso, éextremamente d 1f1c11 s111cron 1-
zar Soren Kierkegaard com Gugu Liberato.
47
EDUARDO SUPLICY ENTRE
TÓKYO, TRÓTSKI E
LONDON LONDON
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A bibliografia da socio!o~ia paulista_sobre o golpe de_64 é t~mbérn
um desastre, pois com ranss1mas exceçoes, cobre de elogias sac,1nas os
traidores de Jango pela esperteza golpista, lastimando por <-2utro Jad~ él
inércia do objeto da traição política. Moral da interpretaça?: nos nao
estamos acostumados a conviver com o pai bom. falta pai ao povo.
Nossos filhos são órfãos. Nunes Pereira dizia que o rio Amazonas erél
um rio matriarca.
A tesoura na história faz estragos muito mais do que imagina nos5c1
vã filosofia pragmático-eleitoral. Lu is Inácio Lula já poderi~ ter e~tudado
a fenomenologia do golpe de 1964 e a vida de Jango. A soc1olog1a do PT
contra o populismo traz a formulação equivocacfa de que Jango e~a um
perneta masoquista. A CIA armou o golpe e ele não reagiu. Entao ele
queria levar um tombo, como se tivesse desejado a tropa de choque ~e
Mourão Filho. Outros dizem que a culpa foi o lançamento do Sputn1k
pelos soviéticos ou a Revolução Cubana de Fidel Castro. O Sput~ik
gerou a paranóia kennedianada infiltração comunista nosaltosescal~s
dogovern0Goulart,oquenãocondizcomacucacolonizadad0Exérc1to
brasileiro, a exemplo de Amauri Kruel fascinado pela quimera hol~y-
woodiana. O fato é que o golpe de 64 não foi uma reação ao agito
comunista, nem havia condições objetivas maduras para uma revolução
de esquerda. Alic1s, o golpe de 64 parece um acontecimento que não tem
causa. Suas causas históricas ainda não fomrn apurndas. Se o marechal
Caste~o Branco não tivesse topado a parada de derrubar o presidente, o
embaixador Lincoln Gordon iria convencer os Estados Unidos a assu-
~remnamarraa deposição do governo? Lincoln Gordon não precisou
acionar o esgL~ema bélic~. O golp~ interno da direita possuía rnelho~es
chances de ex1to. Os navios americanos estavam ancorndos nas prc11as
do Espírito Santo. Muita gente iria morrer, ou talvez nenhum tiro seria
dado. Vexame pior do que a Guerra do Paraguai.
Em 1992 Leonel Brizola insiste em fazer a distinção entre golpe co~
tanque nas ruas e _golpe no tapetão. Afinal o golpe do Cruzado ment~lt-
zadop~los Ca~pmas 8?ysda Unicarnp não foinotapetão?Ou ter:ás1do
n? gabmete? Vrnte e oito anos de djferença. O modelo econômico da
d1ta?ura de 1964 na infra-estrutura corresponde à telenovela da demo-
cracia 1~a supei:estrutura ideológica de 1992. Corno não há mais
separaça? entre mfr:a-estrutura e superestrutura, isso significa que ~ião
sa,mos amda da m1se-en-scne do golpe que atrasou O país uns tnnta
anos.
Ja_ngo ~inha fobia de sangue. Em Belo Horizonte, o cientista Otavio
Dulc1 me mformou que Jango era do mesmo signo de Tancredo Neves,
o qual, segun?o Glau~er Rocha, era o maior enganador desse país. Em
!968, o emba~ador Lm~~ln Gordon se arrepeiidercl de ter ajudado a
implantar, a ditadura rrnl1té1r que não foi transitória todavia ele não
condena a deposição antidemocrática de João Goula1t em 1964,
50
acu~ndo-o de responSé1vel pelos "decretos populistas de legalidade
duvidosa." No teatro da Jangarana, o udenista Carlos Lacerda, político
d.~ talento qu~ infelizmente í1ão foi seduzido pela esquerda, morria de
munes sexuais de João Goulart, como se não houvesse mulheres inte-
ressantes no meio da direita.
A retórica de 1989 de ataque petista ao "populismo" traz o estigma
do 9?lpe de 64, pois a linguagem continua fundamental na política. A
reton.ca do populismo é copyright by Lincoln Gordon e, alguns anos
dep01~, by Francisco Weffort e Octavio Janni. Ninguém qualifica de
populista a Constituinte de Ulysses Guimarães.
, A c01.1tradição da sociologia paulista contra Vargas, Jango e Brizola
e a segum.te: os sociólogos cólocam-se a favor da queda de Jango mas
contra a ditadura militar. Pois sim!
Desde o começo d9s anos 60 a tevê e os líderes populistas ficaram
em campos adversos. E inegável a baté1lha ideológica entre a telenovel~
~ersus o trabalho no Brasil contemporâneo. A meta ideológica da te~e
e secar o sangue de Getúlio Vargas que correu em 1954. Daí a suspeita
de qL~e o~ em 1979 foi uma criação maquiavélica do ge1~eral Golbery
para 1mped1r a sinfonia trabalhista do Brasil-1 com o Brasil-2.
Não é fácil buscar o sentido da tragédia na história do Brasil. Goethe
~ref~ria a verossimilhança à verdade. Se Luis Inácio Lula fo~se líd~r
sindical em 19~, Jango não teria cé1Ído do cavalo de Getúlio? A..mda nao
apare~e~1 o h1storü-1dor do golpe 64. Poucas pessoas .consideram a
deeos1çao de Jango um acontecimento trágico. Os golpIStas de onter~
estão no poder em 1992. O significado do golpe de 64 parece que ~ta
de ~abeça para baixo. Nasce como golpe e é chamado de Revoluçao,
assim como o subversivo passa a sero reacionário. Não nosesqueçam?s
de Nelson Rodrigues, o único intelectual brasileiro importante que .fota
favor da queda de Jango, porém o único intelectual no Rio de Janeiroª
d~fei~der o filme Terra em transe, cujo tema é o golp~ de ~· ~ Jat~go
nao tivesse sido derrubé1do, o filme Terra em transe nao tena sido feito.
Na Jangarana de Glauber Rocha, Jango-antes deserdevorad~pel~
povo no carnaval - passa a bola pari 1:,eonel, Brizola, o qual na~ fm
filmado em Terra em transe. Leonel Bnzola e o bumba-rneu-bo~ ~a
Jangarana. Com ele Jango nasce de novo. Esteresgate~sticoda tragedi~
de 1964 não elimina no entanto o desafio brizolista diante da perversi-
dade da linguagem hoje no Brasil.
O diálogo de Glauber Rocha com Leonel Brizola é de natureza
lingüística. Segundo o cineasta, Leonel Brizola subestima a for5a revo~u-
ciom1ria da cultura brasileira, embora a crítica glauberiana seia anterior
ao aparecimento dosCIEPs, a revolução culturál-pedagógica d1inesa de
Darcy Ribeiro. A advertência de Glauber Rod1a se fez carne em 1989,
quandoCollor,orepresentantedamodernizaçãoimperialistadosmeios
de comunicação pós-64, ganhou as eleições graças ao fator telenovela.
51
O cineasta advertiu que o projeto d_a direi_tr1. pós-64 ~rn conver!er
Leonel Brizola num político clean, pol1clo, of1cwl,. ~º. s1ste~1~1. Da1 o
conselho glauberiano: "- Leonel, ponha seu escn~o~10 poltt1~0 nu_m
terreiro clé macumba, assuma a função de babalonxa. A,atoh _Grna.
Chefe. Caudilho do povo." A intenção ela clireitc1 ~rn clesfa1:at1~r o
djscurso de Leonel Brizola durante suc1 campanha eleitoral. Ao m~~s de
wn Leonel fanum, um Leonel do templum. Com essa transpos,çao, a
mídia montou a armcição ele Collor corno o candidato anti-sistema. A
reificação cio novo. A ideologia do recentismo novidadeiro em que~
perdem as raí?es histórirns dos acontecimentos atuais. O pc1ssado nao
vive em nós. E o corte na história. O que passou, passou. Jc1 era. O_que
será pode ser que seja outra coisa. Hegel w1i para a lcitrina. A histo-
riografia diantedeCollor fica embasbaec1dc1,cornose fosse um disparate
conectá-lo com a derrubada de Jcmgo em 1964.
O rebelde Collor se c1presentou como um candidato sem ideologia.
Acin~a da direita e da esquerda. Com o objetivo ele pôr os ladr["Jes ~,a
cadeia. Em 1992eleévítima de sua virtude, acuadocomoestelionatáno,
sem condições morais de exercer o cargo de presidente da RepC,blica.
Um_ corsário predatório. ·
E uma pena que meu amig0Clc1udio Abramo não esteja rrnisaípara
ler e~te opúsculo Cocaína dos pobres. Segundo Cl ..1Udio Abramo, meu
defeito era superestimar a função do monopólio televisivo na ec1beça do
povo. Todo mundo vê telenovela, a superestrutura do entretenimento
gera?a_ pela ditadura em 1964. Claudio Abrnrno dizia que o po~o
bras1le1ro está num estágio culturc1l tão b..1ixo nível que não entendia
sequer o que se passava ii1 video. A raléconfumfo1 a morte de Tcmcredo
Neves com a morte de D. Pedro II. Isso não clltera contudo a simbiose
da política com a telenovela. Se João Goulart não tivesse sido derrubado
em _1964, ~ollor hoje em dia seria c1penas um playboy milion ..1~io,
curhd?r de 1ateern Angra dos Reis, jrunais um presidente d ..1 RepC1bltG1
escolhido pela míc.fü1. ·
. F~rnando Collor de Mello deveria tormr umc1s élul ..1s com Darcy
Ri~iro sobre João Goulart. Segundo Darcy, a direita SéKOU Jango (o
pengo que ele represent,wa), mas é1 esquerda não o compreendeu, nem
os e~tudantes, 1~ern os intelectuais, nem os políticos de seu próp1:io
~arttdo. Tal versao choG1-se com a de Luis Carlos Prestes que, entrevis-
tado durante <.:s anos 00, disse que Jango foi o rmior responsc1vel pelo
g_ol?e: ~fas ha tam?ém_ quem considere que Prestes subestimou él
cc1pc1cidc1cle de orgarnzaçc10 dos golpistc1s. Assim, fiG1rn el ..1s por elas. Por
(ue pont~1- do novelo_ começar? Djcircy Ribeiro, Prestes, Waldir Pir~s,
~lso Ft!1 tc1do, Clc1u~i10 A~rr:mo_? ~ e.! ec1so de se perguntar:_quer:1 fo~ o
g andeculpc1do dessa trc1ged1c1 h1stonG1? Ou sercí que o destino nao poe
ª c~i~pa em ne1:hurna pessm? A direitrl lrKerdistr1 (assim como alguns
sociologos pelistas e tuG1nos) apontc1 em Leonel Brizolc1 o bodé ex-
52
piatór~o, por c~usa do Grupo dos Onze, que tinha como objetivo
orgamzar a sociedade civil (alô, alô, Luzimkio: a dialética não aprende-
mos c.om Hegel) através do modelo popular baseado no time de futebol:
onze J~adores. O retrato que se traça de Leonel Brizola é o da senzala
blanqrnsta e gauche, incendiária, rndical. Em 1992, o PT acusa-o de
legalóide, constitucional, à Afonso Arinos ou Sobral Pinto.
(\. direita arrependida que deu o golpe é cinicamente nostálgica,
d~lineando ~1m perfil de Jango como se fosse um pacifista ingênuo que
nao entendia nada de Forças Armadas. A vantagem do teatro de
Gla~1~r R<;_X=ha é situar o ex-presidente João Goulart numa perspectiva
positiva: nao adiantava ter percebido a gestação do golpe para detê-lo.
E. 0~1t~a a tragédia da impotência política. Jango queria dar o salto
lustonco mas em manco. Glauber mistura Aristóteles com Shakespeare.
Tempestade em Brasília: 64 foi a indiferença generalizada contra o pai
bom. O príncipe dorme no trono. Eisenstein em ritmo de bossa nova.
Segundo Darcy Ribeiro, Jango-o rei bom-não era marxista. Ele foi
a~u~~o pela esquerda porra louca de latifundifüio em casa e. revolu-
c~onano .nos conúcios. Seja como for. Se as reformas de base tivessem
sido realizadas, o Brasil não estaria nesse atoleiro em que se encontra em
1992.
A esperança estéi calcada no voto. O derramamento de sangue~ u~a
P.reocupaç~o.dopassado. Jango não poderia im~ginaronível ~ev1olen-
cia 9ue ~na implantado com o golpe de 64. Diante da bruté11Id~1d.e do
reg1med1tatorial, valeria a pena terderramadoosanguedos brasileiros?
O voto no Brasil é um samba-do-crioulo-doido. Ao completar 80 anos,
~ escrito~ Jorge Amado declara a seguinte frase numa revi.sta da m~,da:
Eu votei no Roberto Freire em 1989, mas torci para o Mano Cova~. Se
Jorge Amado diz um troçodessesdecara limpa, imagineopobr~co1tado
do homem do povo brnsileiro que nunca leu Montesquieu dlélllte da
opção metafísica entre o Parlamentarismo e o Presidencialismo! .
A interrupção do voto em 1964. O imperialismo 1~orte-an,1enG~no
co~ta o projeto do Jango. Esta cai não porque seu pr?Jeto nac1onal1sta
e~hvesse desvinculado das forças populares desorgarnzadas, conforme
a mterpretação simplista da sociologia de São Paulo. C? golpe de 6'.J: pode
ter começado em Wall Street, no Pentéigono ou nos JOn~a1s bra.sile1~os, \
cujos donos conspiraram abertc1mente. Não é um delíno ~on~1c~era-lo
uma perfídia urdida inicié1lrnente entre setores d~1 ~urgues1a Civ.il loec1l
e os agentes da ClA, corno se o Exército brasileiro fosse meio que
conduzido a entrarno lance do golpe pela lidernnça civil. Os donos dos
jo~nais brasileiros foram persuàdidos pek? t~1lento de Car:los L-icerda,
alJado ao complô internacional, com o obietivo de conqurstélr a classe
média, os fazendeiros e a Igreja. O transe do jornalista Claudio Abramo
em São Paulo revela que o complô internacional contava com o apoio
dos donos dos meios de comunicação. Todos os jornais eram refré1téirios
53
ao projeto de Jango. Então. seL~ projeto dem?Crática:reformi~t~ não
encontrou canais de comurncaçao para seduzir a soCLedade CLv1l. Os
donos dos cana is de comunicação estélVélm ai iadosà ideologia do grande
capital estrangeiro. A persuaSéi.O jangu ista não foi alcançada, a despeito
de sua oratória, de modo que seu fracasso político precede a intervenção
militar.
O depoimento de Claudio Abramo é clarivident~: ap~sar da _com-
petição econômica no mercado, os proprietários dos JOrna1s, ?º Ri?, _de
São Paulo e de Minas, uniram-se em 1964 m1 campanha 1deolog1ca
anti-Jango. O mérito de Claudio Abramo é apontar a falha de co~mni-
cação existente no governo João Goulart. Um governo sem mídia, ou
melhor: a mídia contra o governo. Resultado: a didática de massa
fracassou. Seu mérito aumenta ainda mais porque a historiografia
brasilianista e a prata da casa universitéfria escamoteiam a responsabili-
dade da imprensa pela implérntaçãoda ditadura no Brasil. Convé~reter
esse aspecto: a ditadura no Brasil foi mentalizada pelos donos de Jornal.
A tese deste livro não é outra senão a de que o golpe de64 foi implantado
para wlificar o país através da indústria cultural monopolizada da tevê.
Roberto Marinho não deve ser considercKio o PC Farias dos donos de
jornal, cabendo somente a ele a responsabilidade da interrupção do
processo democrático para implantar a modernidade imperialista em
bases eletrônicas. Todos os donos de jornais têm culpa na história do
~olpe. Apenas Roberto Marinho é o imperador, the best one. Tanto isso
2 verdade que João Goula rt, ao ser devorado peJ o povo no carnava 1, diz
?ar~a pl~téia do teatro ouvir que perdoa o seu compadre general Kruel,
_:>orem nao aquele que foi o maior beneficiado pela ditadura pós--64: o
::loutor Roberto Marinho.
quaseàsvésperasdogolpede64,ClaudioAbramoperdeoernprego
,lo JO~nal O Estado de São Paulo. Já era tarde quando Jango o chamou
p~m ir~ Brasília dirigir a cormnlicação do Planalto. Claudio Abramo
nao devia ter trabalhado com Carvalho Pinto na Secretaria da Fazenda
de São_ P,11._t.Io. Ele deveria ter organizado militarmente o sistema de
co1!1un1~açao do governo João Goulart, com o objetivo de fechar todos
os JOr~1a1s_?º p~ís, inclL~sive dificultando-lhes a compra de papel.
_ Nao ha ma.is Claud10 Abramo. O que há é Claudio Humberto, que
nao leu o ensaio magnífico de Celso Lafer sobre Gil Vicente e Camões.
UAU ·
Portugal, ô meu!
Collor não é Jango. Aliás ninguém sabe o que O Collor é. Nem ele
mesmo. Tr~té~-se de um débil menté1I que chegou ao poder pelo voto do
povo? A rnidia que,º elegeu em 1989, três anôs depois quer derrubá-lo.
Por qu~? <? detél lhe e que Leonel Brizola considera-o menos ruim do que
o acadermco banda de música Saerney.
54
AI DE TI, CANAPI!
55
mtúto machão por aí já não sabe distingtúr mulher de travesti .. O
caixa-dois está com parabélum na mão. A classe dominante nordestma
dispõe de um arsenal sádico psi5=ológico indiferente ao sofrimento do
povo. Marajacura não se acaba. E o marajoara way of Jife do J0ci.ozinho
30. Marajanduba. Marajatina.
Se somente existir a m ídja como cana 1, então o lance é escovar urubu
A telenovela alcança o poder. Tanto faz Dias Gomes, Avancini ou
Ferreir~ GulJar. E se José Sarney voltar?
Av1adagemdaimprensareforçaofeticheimbecildacondiçãojovem:
fulano, 28.
O n~v? é a ju~~ntude. O candidato jovem. O cara novo. .
. An_to~110 Ermmo de Moraes é o bacana do cimento, Otavinho Fnas
FiJl~o e a imprensa pauUsta que elegeu Fernando Collor. Caso contrário,
o diretor do Jorn"'l:;o 11:; ··
" e, . llo sena personagem deste hvro.
·
I love you Emndma. -
l986 0 PFL e < f01· ~a.n d'd
FernandoGabein.J·á · · -
1 aturaJovemnasele1çoesparapre1e1 o
t ·t
56
A REBELDIA DO ÂNUS
57
estudantil, não é mais a telenovela a opera soa_p das pobres ~o~;.as-d_e-
casa; a telenovela em 1992 é o Marcuse da rapaziada, o eros e c1v1 1zaçao
do PT. . d b ·1.
A telenovela converte-se no oráculo pornô da atuahda. e ras1 ~1~a,
oráculo que vai de A a Z, espécie de totalidade h~gel~,rna, espmto
absoluto a comover tanto a patroa do pernambucano F1uzao quantot~m
garoto universitc1rio d oi dão da paulicéia desvairada que passou a noite
inteira curtindo rock and roll do Supla Suplicy.
Não vai demorar muito para aparecer um douto semiólogo da U~P
que faça uma taxonomia exaustiva do modo de pr<J?uçao
telenovelístico, classificando as novelas em direita, esquerda, neoli~e;~l,
social-democrata, parlamentaristé1 bichosa, presidencialista autontana
e assim por diante.
Se o cronista colonial Antonil pudesse reaparecer na década ~e~'
certamente ele iria escrever que a telenovela é a nova d roga e opulenc1a
do Brasil.
Be~ sei que não hé1 só uma causa que explique O result~1do de
detennmada eleição. Todavia, a tese,da Cocaína dos pobres e que a
tel~novela elegeu Collor em 1989. E inegável a existência de uma
urndade de estilo entre uma coisa e outra. A telenovela aparece como o
agente socializador da política na época em que Jô Soaids é o Oswald
::le Andr~de e o garanhão Xicanysy o Ma rio da Andrade .
. (? ~hlo da nossa época chama-se popanacoluto, domínio dora-
::i~mio quebrado e da predicação excrescente. Por exemplo, se Deus
qrnse:, o caçador de maraj,1s tira o Brasil do Terceiro Mundo para
::oloca-lo no Primeiro Mundo.
Este ~vro, originalmente publicado três meses antes das eleições de
1989,aceita a explicação histórica com base na moral ou na estética, tendo
por foco narrativo a metonímia: a parte pelo todo ouamini-saiadedona
Rosane pelo ?!gode do deputado Mercadante: O voto da telenovela
con~r~ 1 0 ?S
10
politicos ~orruptos elegeu Fernando Collor. O programa de
~ud .~ ~ no poder e a metáfora da anomia acústico-visual da sociedade
1.isergJCo
r~si ~ira: a doença ~opular chama-se Collor, o ACM dos ricos, o ácido
das perdas mternacionais.
O si?no da históri~ se telenoveliza a cada dia que passa. Novela
alagoana. Novela mexicana. Novela uruguaia. O significado da desa-
fortunada passag.em ?~ Fernando Collor ao podei na déc,1da de 90
somente se torna mtel1g1vel com o discurso da telenovela.
58
A FAMA DO POPULISMO
ou
A HISTÓRIA
DE UMA INFÂMIA
60
..J
Globo. Mas isso é uma outfé1 história. Vejamos a novela rnarxóloga da
sociologia dc1s classes e sua formulação é-1 respeito do conteúdo de classe
da ideologia populisté-1. Segundo Weffort, a concepção de um "Estado
protetor" dos pobres e dos oprimidos é a essência pequeno-burguesa
do estatismo populista. O Estc1do converte-se em um sujeito autônomo,
é um fetid1e de salvação pc1ra os despossLúdos. A aversão da pequena
burguesia às formas politicamente associativas de classe deposita toda
esperança na atuação prodigiosa do candidato populista. A fé weffor-
tiana na organização de classe da sociedade civil tem como tempero a
"teoria do autoritarismo brasileiro" made in CEBRAP. Tc1lvez por ter
surgido na época da ditadura em distensão, o PT se impregnou tanto
de uma postura anti-Estado (e pró-sociedade civil) que já se divulgou o
booto de que esse partido não quer tomar o poder por causa do Estado.
A concepção deu m Estado protetor, essência pequeno-burguesa do
estatismo populista, ,não orgcrniza politicamente as classes e os grupos
sociais s:1~alternos. E por isso que na hora agc1, segundo os teóri~os do
PT, Getulio Vargas e João Goulart capitularam sem o apelo a luta
popular organizada. Embora de origem urbc1na, o populismo reflete a
aversão da pequena burguesia às formas politirnrnente associativas de
classe, depositando todé-1 espemnça m1 atu,1ção prodigiosa do Estado. Os
estudos sociológicos de inspiração marxista sobre o populismo n~1nca
se referem à resistência popul,1rda legalidade (1961), Brizolagarantmdo
a posse do vice-presidente João Goi.1lart que chegava de Pequim em
Porto Alegre. Os sociólogos também não analisam o conteúdo de classe
do brizolismo. Somos i1ifonmdos a respeito da composição de classe
social no ademarismo e no j,1nisrno, mas não existe nenhuma tese
materialista que explicite os interesses de classe do brizolismo. O que o
PT sustenta é que o discurso populista não encontra ressonância nos
operários das grandes empresas industriais. Em outra~ palavra~,. as
grandes empresas multinaciomis que concentram muitos opera~·1os
urbanos estariam imunes ao vírus da retórica populista. Francisco
Weffort aplica mecanicamente para Leonel Brizola aquilo que escr~v~u
sobre Adhemar de Barros e Jânio Quadros, as duas varic1veis de d1re1ta
do populismo.
O professor Francisco Weffort tinha todas as condições para escrever
um tratado sc.x:iológico definitivo sobre a vida de Leonel Brizola para
mostrar as falé-kias ínetafísicas do líder gaúcho que não defendeu tese
na USP sobre Hobbes e Tc.x:queville. Até hoje, porém, Frnncisco Weffort
não ousou escrever ,1bsolutamente nada a respeito, assim como mda
escreveu também o professor Octavio lanni, ,1utor de O colapso do
populismo no Brasil, livro badaladíssimo que deveria no entanto
chamar-se mais apropriac.farnente Populismo, o lapso da sociologia da
USP. Como a idéia é a mãe da matéric1, esses autores fornecer,1m os
elementos ideológicos durante décadas para a indisposição univer-
61
sitária de estudantes e professores contra a liderança trabalhista de
Leonel Brizola. Em qualquer cafundó d? Bra~il encontra.mos um aspi-
rante a sociólogo dizendo que Leonel BnzoJa e ~nn populista ~esta, s~m
saber o que encerra esse conceito de populismo, e repetmdo feito
papagaio o magister dixit da usr.
A aprontação sociológica começa da seguinte formulação leviana: él
grande fraqueza do brizólisrno reside na i,icapacidade de criar orga~1i-
zações políticas estáveis. Tive oportunidé1de de constatar essa sandice
quando abordei Luis Tmício Lula nos corredores do Senado em 1988. Ele
me disse que Leonel BrizoJa iria morrer um dia e élssim o PDT iria para
o espaço, diferentemente dele mesmo, cuja morte não implicaria de
modo algum o aniquilamento do PT: o partido permanece, o líder passa.
O problema é que liderança política não se improvisa. D.>pois de Lula
qual o grande líder do PT que pintou no pedaço?
Outra acusação da sociologia rnade in São Paulo com embalagem
noviorquina é a idéia de que se porventura um dia Brizola chegar ao
P?<ler ele nã~ ~overnará com seu partido, e nem esse partido _manterá
vmculos orgarncos com suas bases sociais. Novamente aqui a com-
paração eqtíivocada é com Jânio Quadros, o paulista de Mato Grosso
que m_ud~va de partido político como quem troca de camisa. Todavia
esse_nao e o ~~so de Leonel Brizola que até hoje en_tr~u. apenas em. dois
_J?artr~os pol1hcos: o PIB e o PDT. A sociologia da h1stona do popu Iismo
e onussa ao e!g_uecer que o golpe de 1964 não foi desfechado para <;ortar
a cabeça d~ Jarno Quadros, político inofensivo para as classes dom man-
tes do Brasil. O gol pede 64 teve porobjetivo fundéHnental cortara cabeça
de Leonel Brizola .
. F!anci~co. Weffort não consegue operar dialeticam~n~e com as !r~e-
diaç~s classistas. ?li~ tese de que O popu Jismo é um estag1? ~ie trans1çao
da socieda~e ~rasileira que corresponde a uma hegemorna mc?mpJeta
da burguesia e urna barafunda mental colonizada fruto da leitura de
autor~s marxistas europeus. Trata-se de urna teoria daltônica explicar o
populismo em função de um proletariado sem consciência de classe,
1
P~ s Aafi~1al de contas é impossível negar durante a déCélda de 80 a
e:"istenc,a de u~1a hegemonia completa da burguesi~ em nossaA S?-
oed~~e. Ou sera o dou!or Roberto Marinho pré-burgues? E o Antorno
Erm,r~o d~ Moraes, sera que é meta feudal?
,A ~te ho1e a ~,ociolo~~-ia paulist~ _não conseguiu e_:plkar o retorno de 1
Jamo quad~o~ a Prefeitura Murnopal em 1985. A nao ser apelérndo pé1ra 1
os efeitos mmficos da diarnba ou pelos desígnios de Deus, conforme a 1
l1erm A t· d ·
doso. eneu ICa e que lançou mão o senador Fernando Hennque Car-
1
1
62
ciên~ia leninista de classe seria i,~~utida no jovem proletariado industrial
de Sao Paulo, a vanguarda pol1t1ca da classe operéfria no Brasil, apesar
de su~ formação rec~nte e de origem rural. C>estéirte, essa sociologia tem
o maior bode da ongem rural do proletariado brasileiro. Seria melhor
seestetivesseorigem puramenteemigranteestrangeira. Francisco Wef-
fo,~t?r~epela i~~dustrialização rápida do país com Óobjetivo deeli!ninar
a 1d1otia rural . Segundo ele é o atrnso da roça que fornece a mao-de-
o~ra crédula para ascidadespopulistas. Em resurno,a teoriaweffortiana
gua em torno da seguinte epifania: o dia em que o proleta do A~
esquecer a modinha do Catulo da Paixão Cearense, aí sim havera a
transição lukacsiana de urna classe operéfria de si para consigo mesr_n~,
ou seja, nesse belo dia ela terá varrido da memória o nome de Getul,o
Vargas e a possibilidade de ser tutelada pelo Estado. .
Psicanaliticamente falando, ao recusar o passado históricovargwsta,
Francisco Weffort recusa a paternidade ideológica de Getúlio Vargas no
movimento sindical. Por que ele odeia témto assim Getúlio? Luis Carlos
Prestes dé1 para entender o porquê de seu ressentimento pessoal cont:a
Getúlio, mas no caso de Weffort só a psicanálise explica, pois ele nao
teve nem a vivência política do período João Goulart, embora o so- 11
ciólogo já tivesse barba e bigode. '
63
KINEMA, A LACUNA ENTRE
JANGO E BRIZOLA
64
Desconheço se Leonel Brizola viu ou leu alguma coisa do cineasta
Gl~uber ~och~. G~1~io da raça é Darcy Ribeiro, e não s;olbery do Couto
e Silva. Nao ha duvida no entanto de que a falta do cmeasta no pedaço
atrapalha a candidatura de Leonel Brizola, que não tem mídia. O líder
gaúd10 é obrigado a desmontar as aprontações da mídia domü1ante e
traduzir em pedagogia política determinados conceitos para o povo
compreender, a exemplo de "estufa da ditadura" e "perdas internacio-
nais".
Acredito que se Glauber estivesse vivo, seria mais fü.cil o logos
brizolistaconverter-seerndidfüicadem,1ssa.OjornalistaleiteFilhosabe
que a contradição fundamental do brizolisrno é que o conceito de
verdade histórica ainda não se rmiterializou em didática de massa. Tal
como acontece m1 dial~tica dos produtos culturais, Leonel Brizola é
vítima da distribuição. E insuficiente possuir a verdade histórica sem a
distribuição dess,1 verdade para o povo votar no fio progressista da
história.
A ditadura de 1964 é a estética da direita: a telenovela. Estética de
massa, diári,1, funcional: som e imagem. T,11 como aconteceu com élS
novelas "O salvador da pfüria" e "Que rei sou eu?", a Rede Globo em
1994 bombardeará o trabalhismo democrático com a sua logística
telenoveleira. Por outro lado, o PT, Partido dos Trabalhadores sem
nação, não tem nenhum atrito com o monopólio da comunicação de
massa, a herança da dit,1dura. Vivemos na época das eleições sem
ideologia. O que Glm1ber dizi,1 a Leonel Brizola no fundo era o seguin~e:
a superestrutura ideológica na sociedade brasileira é um fator rnatenal
mais importante do que a infra-estrutum econômiCé1. Recorde-se que
Luiz Carlos Prestes entrou para o PC ern 1924 porque não havia filosofia
nacional. Os modernistas de22 infelizmente ficaram consertando versos
ou recauchutando sonetos.
Em 1989 Fernando Collor não citou Victor Hugo em latim i1em
Ovídio em grego, porém chegou lé1 com seu anacoluto style. A culpa
evidentemente não é do povo. O babaca aqui, caro leitor, confesso que
meio quixotescamente, escreveu a Cocaína dos descamisados cor1_1 _o
intuito de alertar, três meses antes das eleiç[">es, que a telenovela ina
chegar ao poder supremo da nação, reflexo dos irracionalismos foméli-
cos nos bolsões afro-maometanos da sociedade brasileira.
Burrice negar a lógica persuasiva do mote fantasioso da campanha
eleitoral de Fernando Collor. O Macunaírna qualunque sonha em ser
marajá. O negócio é ser maha r,1ja. Nababo. Vida de rei. Vida melhor
não há.
No inconsciente mouro do nosso povo reina a riqueza marajá pma
todos. Vide o guarda-sol do~ reis asifüicos e dos sobás africanos nos
maracatus pernambucanos. E evidente a presença da velhice orientaJ
nos usos e costumes das macumbc1s, dos catirnbós e das pajelanças. E
65
-------------------, .
marajá a trepada da casa grande com a senzala. A moura enrnntada esté-í
.ª fim de um maré1j,í pará dançar no marajarnbódrorno. Os orixás são
mais conhecidos no Brasil do que na Mrica. Os orix,ís não baixam onde
não corre água muçulmana. Arnrnpanha eleitoral de Collor manipulou
o aforisma de que o popular não é oficial. Sim, é mentira, ok, tudo bem.
Mas no imaginário popular o inverossímil pode ser verídico.
, De mãos dadas com Lily de Carvalho, o doutor Roberto Marinho, às
vesperas das eleições presidenciais de 1989, gozou a derradeira lua-de-
mel de sua longa vida.
66
,
A, FACECIA DA CPI
E O NOVO PLANO
CRUZADO DE 1992
11
Dm111osa colpa de/la gola."
Dante Alighiere
68
i:;le espera a hora exata de dar o bote, assim como tem dado desde 1964.
Ecerto que até agora ele não tirou o apoio a Collor, talvez porque não
Uleagrade a subida do vice Itamar Franco, mas na eventualidade de esta
ser inevitável, Roberto Marinho entrará na composição do poder.
Itamar Franco não tem partido político. Ele éum drop out do sistema
' partidário, mas já foi até do Perrenê, assim como poderá entrar futura-
mente no partido do Edir Macedo, o Zarur da informática. A incógnita
i é saber com quem Itamar Franco governará. Fará o loteamento do
69
É MELHOR VIVER
DO QUE SER FELIZ
P recursor por precursor, o nome dele taí, téí, tá, téí, na boca do povo:
Enéas, o do meu nome é Enéas, o cacareco de 1989, foi o primeiro
político a pedir publicamente a renúncia de Fernando Collor. Sua
marchinha à Larnartine Babo vai render voto que nem chuchu na cerca
em 1994. Somos um país do ouvido ou do olvido?
Havia em 1989 urna maneira, talvez a única, de derrotar o Collor
vídeo-clip: através da música, doce música, doce inferno. Mas os com-
positores da música popular brasileira são uns rnercenéirios, despoliti-
zados, individualistas, irnpatriotas.
O egoísmo do meu pirão primeiro produz apenas vulgares cançone-
tas do lirismo bom de carna. Fogosos, amantes, poetas do amor e da
paixão, com ardentes sensibilidades no cio, eles não se ligam na pa-
tológica condição auditiva do povo brasileiro.
Collooooorrrrrrr!!!
E este eco cocô de estádio de futebol não tinha nada de música. Era
fraqLússima sua mensagem sonora em termos de persuasão popular.
Nem o mais apetitoso dólar do PC Farias conseguiu produzir algo que
prestasse musicalmente para fazer o povo entoár o bravo heroísmo da
caçada aos marajás.
Nem a voz era assim tão sedutora. Minha gente... Nem o ritmo da
fala, nem o português ruim com pensava a faltá de vocação musical de
sua campanha. O ouvido de Collor não é o ouvido de Murilo Mendes.
E, a despeito da ausência de perfil musical na campanha, ele ganhou as
eleições sem nenhum jingol.
Somente a irnagística multinacional da Coca-cola foi sua compa-
nheira inseparável Ountocoma geometria deJotaká em sua propaganda
70
visual). Isso foi suficiente parn conqLústar a maioria da população.
E o arsenal melódico das campanhas de Lula e Brizola em 1989? Lula
qLús persuadir o eleitorado com uma péssima versão melosa da norte-
americana Without fear to be happy: Lulalá, lá, lá, lá, lá A música do
PDT era um decalque detraqué das canções infantilódes da Xuxa: Ll, lá,
lá, lá, lá, Brizola. Curiosamente ambas ascançõesconfluíamnumacorde
comumdesentimentalberceuse: U,lá,lá, lá,lá, Brizola, Lula lá. Para ninar
os eleitores. Fazê-los adormecer que nem crianças. Enfim, moldura
sonora sonífera, triste, depressiva, resignada. Esta impotência canora
deu no que deu: Collooooooorrrrrrr!
A MPB é a grande culpada. E se em 1994 o sensual ACM baiano
ganhar de presente poesia cantada debaixo dos caraminguás de seus
maldosos cabelos avoengos?
Compositores de bosta. Músicos de direita.
E viva José Ramos Tinhorão!
71
,
GILETE NA HISTORIA
"ºnando
algo nuevo" no ar em 1989 apontava para as candjdaturas Fer-
Collor e Luis Inácio Lula. As duas candidaturas pressupu-
nham a ilusão de que havia um abismo entre o golpe de 64 e a retornada
das eleições diretas para presidente da República 25 anos depois. O
denominador comum entre esses dois candidatos é a existência da
telenovela que se expandiu a partir da década de 70. A telenovela
cumpriu a função de eliminar da memória brasileira o ano de 1964. Não
é à toa que a indústria cultural prefere fabular reacionariarnente em
torno de 1968. Até o presente momento não houve no entanto nenhuma
novela que tematiz.asse a ruína de João Goulart em 1964.
Nascido em 1902, Sergio Buarque de Holanda estava com 62 anos
de idade quando João Goulart foi deposto em 1964. Seu livro clássico
Raízes do Brasil, publicado antes do Estado Novo, não foi retomado
posteriormente em termos de análise sociológica ou política, pois o
ilustre historiador não deixou nenhuma reflexão sistemática sobre a
contra-revolução de caráter preventivo de 1964, que aliás afetou a vida
do país mtúto mais do que o Estado Novo de Getúlio Vargas de 1937.
Tenho enorme curiosidade em saber o que o historiador Sergio
Buarque de Holanda adiava de Leonel Brizola. Já ouvi muita fofoca de
que Sergio Buarque não ia com a cara de Getúlio Vargas. A propósito,
Raízes do Brasil é um livro que fez a cabeça de uma penca de intelectuais
na área das ciências humanas. Sem esquecer o detalhe de que sua
72
lingu~gem é de feição ibérica (os cronistas portugueses), porém o
conteudo a~resenta-se ~nglo-:saxônico. Não sei se tal contraposição
pode ser assim estabelecida, amda que, no caso dele, tal contraposição
se fuça de mod? harmônico; todavia é inegável a preocupação do livro
Raízes do Brasil em comparar o estilo luso-ibérico com o estilo anglo-
saxônico. Segundo Sergio Buarque de Holanda, rnn dos traços do
mundo ibérico é a cultura da personalidade. É através da personalidade
que se mede o valor próprio de cada pessoa. Por exemplo: a personali-
dade de Fernando Collor, ou a de Leonel Brizola.
A contemporaneidade brasileira fala mais em pessoa do que em
:eersonalidade. Não há ninguém que não queira ser uma pessoa dotada
âe personalidade. Pessoa legal, inteligente, interessante. Quem não tem
personalidade própria é um badameco que não merece respeito nem
consideração. Um idiota. Que não sabe nada. Um traste, ou apenas um
m'.'unero. Estatística para pesquisa de opinião püblica. Maria-vai-com-
as-outras. Tipo massa de manobra. Rebanho. Bobão.
O homem ibérico se sente como se fosse mn filho ou um pai de si
mesmo: eu sou eu e minhas circrn1Stâncias, já dizia Ortega y Gasset.
Sergio Buarque vê nessa atitude rnna herança estóica. Sobranceria. Cada
l.UTI na sua. Cada um por si. Gosto individual. lntra11Sferível. Eu.
Não é de estranhar que qu.alquer pé-de-chinelo no Brasil é persona-
lista. Até o mendigo. Segundo ·Luis da Câmara Cascudo, eis como pega
a religião no povo: a devoção mais profunda e popular no Brasil é
dedicada a Nossa Senhora, invocação maternal genérica, porém o fiel
pretende possuir o direito privativo da unidade afetuosa. Daí o devoto
falar em minha Nossa Senhora. Não é a sua Nossa Senhora. Nem a dele.
É a minha Nossa Senhora. ·
O livro Raízes do Brasil é bast:,nte crítico em relação à mística da
personalidade. Tal culto da personalidade esconde um montão de
defeitos. Nós somos descendentes de povos ibéricos que não possu~
solidariedade orgânica. O homem brasileiro detesta o seu igual, ou 5t:Ja,
detesta os seus pares, não importando absolutamente as categon~s
sociais: ministro não gosta de ministro, gari não gosta de gari, poeta nao
gosta de poeta, professor não gosta de professor, etc. Somos ª':.essos ~o
ideal igualitário. Igualdade entre nós é sinônimo depadronizaçao. Estilo
BNH. Daí que a paiavra democracia reveste-se de rnn significado frac.,o,
inconsistente, confuso. Não adianta nada reforçar com a expressao
red1mdante "democracia social". Vivemos numa terra em que todos
somos metidos a barão. Barão ébrio, porém barão, poetouJorgede Lima.
Por causa desse traço em nosso caráter é que não _é possível, segundo
Sergio Buarque, "acordo coletivo durável, a não ser por uma força
respeitada e temida". Nossa volúpia pelo tipo caxias. O país só funciona
na base do porrete. Precisamos do recurso autoritário, posto que o
interesse coletivo não vinga por causa da frouxidão da estrutura social.
73
A impreci~o da J?Olítica. O conflito ou diver~ência i9eológica _que acaba
em pizz.a. E o pars da bossa nova. O barqrnnho var, ~ b~rqL~nh<? vem.
Não acontece rigorosamente nada. O confronto se d1ss1pa mevitavel-
mente em chope, uísque ou pó.
Nossa vocação anárquica tem muito a ver com a falta de hierarquia
organizada quf por sua vez dificulta o desenvolvimento do impulso
construtivista. Ecomwn ouvir intelectual no Brasil dizer que o seu baré)to
é criticar h1do o que existe por aí. Sem querer pôr nada no lugar. E o
rebelde forever. Pura negatividade do pensamento que, apesar de tudo,
não se traduz em radicalidade algu~a. Não vale a pena escolher Deus
ou o diabo. Tanto faz um ou outro. E preferível os dois. Nem lá nem cá,
bordejando sempre. Comendo mingau pelas beiradas. D. Pedro II já
dizia que o brasiJeiro é mais de entusiasmo do que de perseveránça.
Frase profunda. Desistimos logo de qualquer coisa. Temos o prazer de
deixar pra lá Somos inconclusivos. Gostamos é do oba-oba, e não
simpatizamos com o :r,é-de-boi, teimoso e sério. Fazemos corpo mole
nas múlimas coisas. E a tal preguiça nacional, traço congênito ou
adq,uirido.
E por causa da falta de coesc10 na vida social que pouca coisa entre
nós h.mciona direito. Quantas vezes não ouvimos falar que os partidos
políticos no Brasil não se organizam nunca? A única força política
organizada na sociedade brasileira é o Exército. O resto é uma esculham-
bação, a não ser evidentemente a Igreja e, a partir de 1965, a Rede Globo
de televisão. Uma das principais taras do brasileiro é admitir que o
p~estígio pessoal está acima da hierarquia. Quer no povão, quer nas
e~tes, o valor pessoal é o máximo. Já era assim em Portugal. A aristocra-
cia P_Ortuguesa não fra fechada em si mesma. Dava os seus filhos para
os vilãos criarem. E isso que explica a origem da babá no Brasil. A
recordação simpática da ama de leite, como dizia Joaquim Nabuco. Para
resumir tudo isso numa fórmula, dir-se-ia o segLúnte: uma questão de
º:dem pessoal é capaz de furar qualquer imposição racional, ordenada,
luerarqLúzada, objetiva. Sob esse ângulo, PC farias é o Engels de
Fernando Collor. Afinidade pessoal. Coisa de amigo. O gostar de
coração. Como diz o bestialógico do Roberto Carlos, amigo de fé, irmão
camarada. Esta canção brega derrete os corações tanto da Casa da Dinda
q~1anto de um fétido barraco do Estácio. O que vale é a amizade, não a
ctµerença política entre um senador do PDS e um deputado do PT. A
c1da?e de Brasília é paradigmática desse fetid1e irracional do afetivo
sentm~entalóide e piegas: todos os políticos cultuam o valor supremo
da arrupide. Pelo amjgo se faz tudo. E quem não faz é condenado pelo
povo. E o innão deputado que d1ega lá em cima, bacana, e não arruma
nada para a família. Um ingrato.
PC Farias até agosto de 1992 não jogou merda no ventilador de
Fernando Collor. Eles são amigos. Não cai bem um denunciar o outro.
74
Corromper-se por amizade pode. Num ensaio brilhante, Celso Lafer
escreveu que Camões inova na propina. A epopéia da propina. O Novo
Mt.mdo do dinheiro.
Minha tendência é analisar as eleições de 1989 sob o fluxo intelectual
do livro Raízes do Brasil, vendo Sergio Buarque de Holanda como urna
espécie de Nietzsche que nasceu no Espírit~Santo e foi puxado para o
Rio de Janeiro, como disse Darcy Ribeiro. E o Nietzsche preocupado
com a potência na sociedade brasileira; e o avesso: o sentimento de
desleixo sensual, a atitude de deixar pra lá porque não vale a pena.
Segundo Sergio Buarque de Holanda, o patriarcado brasileiro seguiu à
risca a orientação do colonizador português: menos a razão abstrata do
que a rotina. A ordem. A mesma circulação das elites. A mesma patota.
As mesmas pessoas. A mesma turma. Portugal oscila entre a Europa e
aãfrica. Entreumacoisaeoutraseinterpõeolancemeiovago,impreciso,
refratário a qualquer tipo de radicalismo na confrontação das idéias,
conforme se observa em nossos mais destacados líderes políticos. Ulys-
sesGuimarães quer se dar bemcom todomLmdo. Ambição deprimeiro-
ministro. A vaselina no Parlamento.
Sergio Buarque de Holanda, um dos fundadores do PT em São Paulo,
fixa uma correspondência entre a carência de raz,ão abstrata com a taxa
elevada de personália ou de personalismo no imaginário brasileiro.
Tudo pelo pessoal. Essência da filosofia do jeitinho, incluindo o fato de ,
que o personalismo pode se apresentar como uma virtude utilitária.
Aliás, a própria noção que temos de utilidade é uma virtude pessoal."A
erópria religião" - escreve Sergio Buarque - "inclina-se para as
devoções pessoais, para as manifestações mais tangíveis da divindade".
Acrescente-se a essas palavras a idéia de que o mérito é sempre do
indivíduo. A noção de responsabilidade é sempre individual e de foro
ú1timo, sem esquecer que a eminência própria vale mais do que a
herdada. Isso significa que a nossa mental idade ibérica, ilúormada pela
influência tropicalista acanalhada, analisa a con9uta das pessoas sob o
prisma do afetivo, do irr~cio~1al, do pa~si?nal. E o c~so de PC Collor,
enciumado, caçula enraivecido, cacogemco ressentido. O mano do
miolo mole que resolve explodir com a carreira bem-sucedida do irmão
presidente da República, chamando-o de testa de ferro de PC Farias.
Sergio Buarque é bastante reticente em relação ao traço sensual,
narcotizante, brejeiro, melopeico que acompanha o comportamento
chichisbeísta do homem brasileiro. O que importa assinalar em sua
interpretação das raízes do Brasil é que a palavra tradição (ou tradi-
cional) aparece sempre com sentido pejorativo, valendo conservador,
arcaico, rural e patriarcal, e1úim, ditadura dos domínios rurais. Civili-
zação de raízes rurais, mas não civilização agrícola, eis o defeito da
colonização portuguesa nos trópicos. Ora, Sergio Buarque não toma a
palavra tradicional em seu verdadeiro sentido, que é a transmissão do
75
boca a boca. Em Raízes do Brasil o conceito de tradição não é sinônimo
de transmissão oral, e sim um conceito que designa o antípoda do que
é moderno. Dir-se-ia que aí estcí a origem da antinomia entre moderni~
dade e arcaísmo da tradição.
Para Sergio Buarque de Holanda, moderno significa racionaliz.ação
dç1 vida. E é isso o ~ue nos faltou, pois aqui o ócio importa mais do que
o negócio. Entre nós, diz ele, "a atividade produtora é, em si, menos
valiosa que a contemplação e o amor".
O que os petistas e h1canos extraíram da leitura de Raízes do Brasil?
Salvo engano, eles bateram na tecla da correspondência entre a falta de
racionalização da vida e a tibieza da sociedade civil no Brasil, cuja
conseqüência política mais desastrosa seria a existência de um Estado
que paira acima da sociedade. O que o Pf deseja como utopia é a civil
soçaite, de acordo com o discurso peagadê de Luis Inácio Lula. Na falta
de um processo raciona]jzador da vida, o governo é que realiza a fLmção
da mlificação societcíria. Esta interpretação foi utilizada para explicar a
vocação autoritária do Estado brasileiro, reflexo de uma sociedade civil
anêmicaesemproteú1a.Nosautorespetistasa"teoriadoautoritarisrno"
é eminentemente antiestc1tal, ainda que nossa libido pró solução auto-
ritária tenha sido trazida pela Companhia de Jesus. A compulsão caxias
à obeiliência, em que o incitamento à desobediência civil converte-se em
cacoete acadêmico. Pura retórica. Sergio Buarque tocou nesta questão
ambivalente: a tendência em apelar para o autoritarismo, "força res-
peitável e temida", caminha ao lado da axiologia personalista que se
querplural,múltipla e irredutível. O historiador chega a afirmar que em
virtude do patrimônio ibérico não podemos ter outro tipo de disciplina
a não ser aquela que se funde "na excessiva centralização do poder e na
obediência".
Diariamente ouvimos as pessoas das mais diversas categorias sociais
jurarem de pés jm1tos que o país só vai pra frente com ilitadura.
Precisamos de um pulso forte para enfrentar a frouxidão da sociedade
civil, espelho do que há de indefinivelmente lusitano na alma do
brasileiro. Somente uin falus do tamanho de um bonde seria capaz de
conduzir o progresso dentro da ordem.
A "teoria do autoritarismo" virou moda em vários partidos políticos
no final da década de 70, fruto de uma leitura excessivamente formalista
e abstrata da advertência contida no livro Raízes do Brasil a respeito da
debilidade estmtural da sociedade civil. Quantas páginas não foram
consumidas em nossa sociologia a favor do fortalecimento da sociedade
civil! B~sta alguém fazer o levantamento estatístico nos jornais da década
de 70. E bem verdade que a expressão sociedade civil foi muitas vezes
usada para contrastar com o poder militar.
Em meados dos anos 30, Sergio Buarque estava preocupado com o
declúúo da vontade ou da potência na passagem do "cataclisma rural"
76
para o novo es!ilo urhrno. ~alta d~ vontade na ação política. Falta de
vontade. n~ ~çao que estana e!1ra1zada ~1a _alma lusitana: "querendo
1
quero o mf1111to; fazendo nada e verdade , disse Fernando Pessoa. Sem
querer abusar da c:1nalogia, convém reparar que a falta de vontade na
ciÇão tornar-se-á um fato concreto com a progressiva desvirilização das
elites intelectuais durnnte c:1 década de 80. ·
A leitura de Raízes do Brasil na década de 70 serviu para desancar
com c:1 figura do caudilho: Jango Goulart antes de morrer em 1976, e
depois Leonel Brizolc:1. Não é por aG1so que o deputado Florestan
Fernandes, às vésperas das eleições de 1989, se insurge contra o "ma-
chismo eleitoral" do lidergaücho. A palavra caudilho torna-se sinônimo
de tirano, antider!1ocrata, pessoa obcecada com o poder e que não ouve
ninguém. Cc:1ud11ho machão, segundo o sociólogo do PT. Figura
anc:1crônica depois que a sociedade civil no Brasil sé fortaleceu cóm o
pc:1rtid? político da cl~sse ºPE:rária: o PT. O chamado ~mbasamento
sociolog1Co desse partido su rg1do em 1979 resume-se na enfase de que
as bases (basismo) têm maior relevo do que a persona do líder caris-
mático. Assim, delineia-se uma contraposição entre a base coletiva
democrática versus o carisma individual da liderança. O carisma, de
individual, pasSc'1 a ser um c:1tributo de uma entidade grupal: a classe.
Então, proclary1a o PT: o dom pessoal de determinado líder já era. Coisa
do passado. E isso o que confere charme "moderno" ao Pa~tido dos
Trabc:1lhadores nascido no ABC paulista. Nesse partido o líder não fala
c:1penas por si mesmo, nem segue sua própria cabeça. Antes de pronun-
r _-~
\,;1
ciar-sesobrealgumacoisa,ele deve consultar as bases, reunindo-se com ~
0 máximo possível de militantes. Estes não devem submeter-se à idola- ~
tria à idiossincrasic1,aos caprichos e manias do líder. A modéstia do líder
cm;verte-se em virtude ontológica e o sucesso eleitoral de determinada
lidemnça não passa de uma conquista de mérito grupal.
Além do reunismo que campeia à solta (a opinião corno a somé\ de
opiniões dos milit,rntes ou a idéi,1 de consenso), o PT se vangloria de
eliminar o person2ilismo das lider,111çc1s: o PT não é do Lula, o Lula não
é dono do PT, o PT não faz o que o Lula manda. Quanto ao PSDB,
observa-se a c:1ntinomia sublinhada por Sergio Buarque de Holanda
entre o liberalismo e o caudilhismo. Cumpre &1lientar no entanto que
em Sergio Buarque essa equação é um pouco mais complexa, pois a
domináção caudilha poderia encarnar na prfüica os ideias liberais e, por
outro lado, o líder tirano poderia ser um instrumento de libertação da
América Latina. A democracia sóna lei ou on paperéuma arapuca dos
formalismos jurídicos à Rui Barbosa, cuja retomada encontra-se na
Constituinte bc:1charel de 1988.
Tanto na ala do PT marxólogo quanto na ala do tucano social-de-
mocrata existe um silêncio sabotador do foto histórico em torno da
Campanha da Legalidade de 1961, em que Leonel Brizola deixou claro
77
seu repúdio à dominação caudilhesca e teceu rasgados elogios à ordem
jurídica constitucional. E nisso consiste o paradoxo da inversão a partir
dos anos 70: aquele que foi em 1961 o anticaudilho é hoje em dia
estigmatizado injustamente como um irrecuperável caudilho sedento
de poder, centralizador, personalista, que -segundo as palavras infe-
lizes de Luís Inácio Lula - pisa até no pescoço da mãe para ser
presidente da República. Luis lnácio Lu lél não faz senão repetira perfídia
ideológica da UDN entreguísta que deu o golpe em 1964, forjando a
imagem de Leonel Brizola como um líder políticoSérngüinário, violento,
grosso, louco para rasgar a Constituição. Eis o paradoxo insuflado pela
direita de 1964a 1989: quem espalhou o terror anti-institucional no Brasil
foi Carlos Lacerda, mas quem ficou com a fama de agitador político
caudilhista foi Leonel Brizola, que no entanto está mais parél Rousseau
do que para Hobbes. .
A "teoria" do antipopulismo e do antícaudilhisrno nasce na UDN
liberal-reacionária, ainda que seja retornada na década de 80 pelo PT e
pelo PSDB, os udenismos de esquerda ou de centro-esquerda. Em 1992
volta à tona a questão da defesa da legaJjdade com a ameaça de
empeachment do presidente Fernando Collor. Pouca gente se recorda
de que em 1961, na cidade de Porto Alegre, quando JangoGoulart estava
em viagem a Pequim, Leonel Brizola pronunciou um famoso discurso
sobre o perigo docaudilhismo que não respeita a Constituição e colocou
o Exército gaúcho na rua em defesa da posse do vice-presidente João
Goulart. Antes mesmo desta conjuntura, julgando que a renúncia de
Jânio Quadros era um golpe de Estado, Leonel Brizola telefonara para
Jânio. Quem atendeu foi o jornalista Carlos Castelo Branco, porta-voz
do então presidente. "-Alô, Castelo", perguntou Brizola, "afinal, o
homem renunciou ou foi obrigado a dar no pé por causa de um golpe?"
Castelo respondeu que era de fato renúncia. [)efin itiva. Caso contrário,
se fosse golpe, Brizola estaria disposto a defender a legalidade consti-
tucional, independente de ser ou não adversário do ex-presidente
beburn.
Em 1992, Leonel Brizola é acusado de confundir legalidade corn
imoralidade do governo Collor. Esta crítica é feita pelo Lula e endossada
por várias tendências que torcem pela subida ao poder do vice-presi-
dente Itamar Franco, o qual se subir chamaré1 certamente seu amigo
sarneysistaJosé Aparecido, o ex-integrante da bossa nova da UDN, para
chefiar a Clsa Civil. Se isso acontecer, o rnaranha José Sarney deverá
mais uma vez ser abençoado pela providência, pois dará as cartas com
a nova coalizão no poder. Por outro lado, o PDT de Leonel Brizola, na
voz de Darcy Ribeiro, senador pelo estado do Rio de Janeiro, tem
insistido que deputados e senadores da CPI PC Farias estão mentindo
para o povo quando aventam a possibilidade do ernpeaclunent, possi-
bilidade remota que não passará pelo Congresso, de modo que a onda
78
em tomo do empeachment está servindo de mote eleito reiro para o ano
de 1992, ou quiçá para dificultar as eleições de 1994. Quem viver, verá.
Corno detalhe sinistro de que a palavra empeachment no Brasil (contrn
Cetúlio Vargas e contra João Goulart) sempre foi um dispositivo utili-
zado pela direita para tomar o poder prescindindo do voto.
Suponhamos que por um milagre o povão saia às ruas pedindo a
cabeça do Collor. Isso evidentemente se a palavra empeachment fosse
outra, pois na boca do povo vira a impiche, ou impiti, quase sinônimo
de bicha ou de giárdia, tal qual biônico, palavra esdrúxula que no
entendimento popular se confunde com o nome de uma fruta impor-
tada.
Impiti já!
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