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Lílian do Valle

Democracia e movimentos instituintes*

Lílian do Valle
Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana

Vivemos uma época de poucas certezas, de muito alguma forma de endereçamento imaginário, o sentido ou
desânimo em relação à sociedade, à política, à ação o significado de um ato, de uma experiência ou de uma
humana e seu poder. O ceticismo generalizado apre- vida inteira se revela na interface entre o que é mais singu-
senta-se como o traço talvez mais característico da nova lar, mais particular para o agente/vivente, e sua inscrição
cultura globalizada – seja como uma espécie de idio- simbólica na cultura em que vive. (Kehl, 2002, p. 9)
ma universal em que as teorias da moda se comprazem
e pelo qual justificam sua inoperância, seja como sin- Mas o que parece mais grave no ceticismo con-
toma de um sofrimento com o qual o comum dos mor- temporâneo é que ele não é apenas descrença em re-
tais de nossa época já não consegue lidar. lação aos sentidos que fizeram até aqui existir o mun-
E isso porque a assustadora fragilidade dos senti- do comum e cada existência privada sob a terra; ele é
dos coletivamente instituídos, longe de ser fenômeno também, e sobretudo, marcado pela renúncia mais ou
meramente exterior, prolonga e intensifica o sentimento menos consciente – forma toda própria pela qual o
de vazio e de isolamento em que o cotidiano mergulha ser humano investe a exigência de sentido que, a prin-
cada um – não fossem os humanos seres para quem cípio, está presente em toda forma de vida. É essa,
individuação e socialização caminham juntas: pois, a triste originalidade que nos é concedida: tal
como nossos antepassados, suspeitamos que, por si
Com exceção de algumas produções muito delirantes sós, nem a vida humana, nem o mundo de intenções e
na psicose, que mesmo assim são engendradas a partir de afetos, de relações e de coisas que ela põe em jogo
façam sentido; mas, diferentemente daqueles que nos
* Conferência proferida como aula inaugural do Aleph – precederam, passamos a aceitar que isso deva, de fato,
Programa de Pesquisa, Aprendizagem-Ensino e Extensão em For- ser assim mesmo, que não adianta buscar sentido para
mação dos Profissionais de Educação, no Programa de Pós-Gra- o que somos e vivemos e para aquilo que nos rodeia;
duação em Educação da Universidade Federal Fuminense (UFF), que, sob o peso da provisoriedade e da precariedade
em junho de 2006. que experimentamos cotidianamente em relação a

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Democracia e movimentos instituintes

tudo, essa busca, quando não é vã, é no mínimo insu- da falsa alternativa entre sentido pleno e nenhum sen-
portavelmente frustrante. tido, reconhecendo que unidade e multiplicidade tam-
Assim, não foram os teóricos pós-modernos que bém não são termos opostos de uma alternativa efeti-
“ inventaram” o questionamento sobre a fragilidade e a va, mas apenas faces inseparáveis da mesma realidade.
impermanência das coisas, como se chegou a supor É assim a insistência na unidade paradoxal entre
recentemente. Muito pelo contrário, não é exagero di- soma e psique que nos impele a reconhecer as múlti-
zer que toda a história cultural se escreve como tentati- plas clivagens, as ordens conflitantes de razão, as múl-
va de resposta a essa dolorosa constatação que não ces- tiplas razões de ordenamento da existência humana.
sou de assombrar os humanos: a filosofia e o projeto Psique, indivíduo, coletividade: dimensões da expe-
democrático, as religiões monoteístas, a razão moder- riência humana que são, elas próprias, objeto de no-
na, o próprio capitalismo podem ser entendidos como vas clivagens e conflitos.
respostas oferecidas à mesma questão do sentido. Porém, em todas essas dimensões – para a psi-
De múltiplas formas e a partir das mais diversas que, tanto quanto para a existência individual e para a
condições e vias, as diferentes sociedades foram leva- sociedade – , aquilo que não tem sentido simplesmen-
das a posicionar-se em relação à questão dos sentidos te não existe. É claro que – sem querer abusar dos
da existência; e, conforme as condições de autonomia sofismas – “ não fazer sentido” pode ser uma forma
ou de heteronomia em que estavam mergulhadas, essa tênue e excepcional de fazer sentido, mas então o que
resposta foi apresentada como dogma ou, mais rara- é a-sensato aparece como distúrbio, como ruído incô-
mente, submetida ela própria a pesado questionamen- modo, como escândalo, como desatino que, de toda
to. Quanto a isso, os dias de hoje não constituem qual- forma, suscita uma reação, provoca uma atividade de
quer excepcionalidade. Por isso, se é mesmo necessário significação que visa à superação do mal-estar.
conceder alguma originalidade aos tempos atuais, de- Mas não há para o humano, ou para qualquer das
veremos então identificá-la ao fato de nunca termos dimensões em que se pense isolá-lo, a possibilidade
sido tantos a acreditar que já não faz sentido buscar de viver fora do sentido, de conviver passivamente
sentido para as coisas; e, também, à enganosa crença com o que clama por ser significado: não sendo deu-
de que é possível sobreviver sobre as ruínas dos senti- ses nem bestas, os humanos estão condenados a pro-
dos revolutos – eis que, tal qual anjos que, desencar- ver sua existência de sentido minimamente manifes-
nados, não necessitam das baixezas da alimentação to, ainda que o façam de forma não-intencional e
para prosseguirem em vida, nós nos elevaríamos so- inconsciente. Por isso, a outra face do ceticismo é
bre o passado como aqueles que se nutrem apenas de sempre o fatalismo – exato contrário do que se pode-
interrogações e de incertezas… ria chamar de movimento instituinte. Vale a pena res-
Pois são, paradoxalmente, as teorias que preten- saltar: o ceticismo é e não poderia ser senão profun-
dem fazer a crítica radical da razão moderna aquelas damente conservador. Sua ação sempre acaba por
que hoje revigoram a crença de que é possível reali- implicar a ratificação daquilo que é, ela sempre desá-
zar plenamente o sonho – diga-se de passagem, au- gua na blindagem do status quo, não apenas por levar
tenticamente moderno – de desencantar inteiramente à imobilidade de fato, mas sobretudo por divulgar a
o mundo, emancipando os humanos dos limites de crença de que qualquer movimento é… inútil.
que é feita toda humanidade.
Esses limites, que a tradição filosófica se havia Sentido e funcionalidade
habituado a associar aos instintos e à corporeidade, e,
em seguida, a tudo o que se opunha a uma razão in- Ao afirmar que a exigência de sentido está pre-
sistentemente identificada ao cálculo e à instrumen- sente em toda forma de vida, empregou-se uma
talidade, são agora os que nos obrigam a desconfiar acepção inegavelmente ampliada da palavra “ senti-

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do” – aquela mesma de que partiu Cornelius No entanto, para o vivente em geral – para o ví-
Castoriadis (1992) para fazer esta postulação, à pri- rus, para a lesma, para um cão, ou mesmo para uma
meira vista absurda, segundo a qual a criação não é célula de nosso organismo – , o que se pode chamar
um monopólio do humano, mas que, muito pelo con- de “ sentido” se esgota na pura funcionalidade. Em
trário, “ todo vivente cria seu mundo próprio” (p. 206). outras palavras, nesse caso mais genérico, o “ senti-
do” está integralmente relacionado à sobrevivência,
Há, pois, o que se poderia chamar de movimento de forma que todos os organismos vivos, dos mais
instituinte na base de tudo que respira – de tudo quanto, simples aos mais complexos, desenvolvem estratégias
diria Péricles, florescendo, conhecerá também fatalmente (que vão também das mais simples às mais comple-
o seu declínio. (Tucídides, 1987, II, 64, 3) xas) para evitar aquilo que põe sua conservação e a
reprodução de sua espécie em risco, e para aproxi-
Torna-se então possível dizer que, em uma pri- mar-se daquilo que, ao contrário, contribui para sua
meira abordagem, a própria vida nada mais é do que conservação/reprodução. Essa é a única finalidade da
um incessante movimento instituinte pelo qual o vi- existência do vivente: para ele, a criação de sentidos
vente se dá as condições de sua sobrevivência. A vida está estritamente limitada à sobrevivência, e assume
é pulsão de conservação que leva o vivente a dever o que Castoriadis denomina uma forma canônica, rí-
relacionar-se com tudo que existe de uma maneira que gida, que não poderá ser ameaçada sem ameaçar a
lhe seja favorável, benéfica para sua conservação, ou própria existência do vivente.
para conservação de sua espécie – o que, em termos Somente para o humano a exigência de sentido
do vivente, é estritamente a mesma coisa. E como a escapa às regras da funcionalidade, autonomiza-se em
natureza não contém informações previamente codifi- relação à finalidade de preservação e reprodução. Isso
cadas e à disposição das formas de vida capazes de quer dizer que os sentidos criados pelos humanos têm
interpretá-las, cabe a cada vivente “ in-formar”, isto é, finalidades que vão muito além da simples sobrevi-
formar em si, a partir de si, o que por um abuso de vência. Isso levou os filósofos a repetirem que os se-
linguagem estamos chamando de sentido ou de signi- res humanos não têm instintos que lhes sejam pró-
ficação. O vivente deve criar o sentido, isto é, uma prios. De forma um pouco mais rigorosa, poder-se-ia
forma de fazer entrar em seu mundo próprio aquilo dizer que somente eles, entre todos os viventes, têm a
com o que se entra em relação; ele deve criar uma re- possibilidade de negar as determinações naturais que
presentação que traduzirá um afeto (um modo especí- se expressam como instintos, fabricando para si como
fico de deixar-se afetar) e manifestará uma intenção que uma “ segunda natureza”.
(um desejo), que estarão relacionados a cada experiên-
cia específica. A representação é a valoração necessá- A possibilidade de negar as leis da natureza que se
ria do que é apresentado: a partir dela, o que é apresen- impõem sob a forma de instintos marca a singularidade do
tado se torna suporte de um afeto (atração/repulsa), homem em relação ao animal, o que conduz Rousseau (1969,
que passa a guiar a intenção (desejo), conduzindo a p. 173) a afirmar que não há, entre os humanos, nenhum
uma ação: aproximação ou afastamento. E isso, alerta- instinto que lhes seja próprio; de forma que, “ elevando até o
nos Castoriadis (1992, p. 221), “ vale tanto para a bac-
téria quanto para um indivíduo ou uma sociedade”.1
cífica, isto é, singular. Mas ela se apóia em um ‘certo ser-assim’
do mundo: o ‘choque’ não é, portanto, inteiramente indeterminado
1
Diz Castoriadis (1987, p. 221): “ nos termos antigos, lógi- e indiferenciado. O que significa que o mundo deve se deixar or-
co-poiético, o tímico e o orético”. E ainda: “ Esta representação ganizar por esta organização própria que o vivente a cada vez es-
nada tem de objetiva: ela é seletiva, ela é determinada, ela é espe- tabelece para si de forma singular” (idem, ibidem).

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instinto das bestas”, eles, que não têm “ … talvez nenhum que mente à autofinalidade de preservação. Mas isso não
lhes pertença,… se apropriam de todos”. (Valle, 2002, p. 104) quer dizer, evidentemente, que não pese sobre os in-
divíduos e sobre as sociedades uma força de conser-
E mais ainda: em certos casos, os sentidos que o vação, que visa cegamente à manutenção do status
humano constrói para si, para seu mundo, individual quo e que torna corriqueira a criação ou a auto-insti-
ou coletivamente, vão mesmo contra a funcionalida- tuição em condições que, assim, só podemos nomear
de. Exemplos não faltam, na história, de sentidos que, de heterônomas, ou de fechamento, posto que tudo
para o bem ou para o mal, conduzem os homens e as que fazem é reiterar o que já existe. Muito pelo con-
sociedades a abdicar da luta pela sobrevivência, pre- trário, aquilo que podemos considerar o núcleo pri-
cipitando de forma intencional o seu próprio fim. mitivo de nossa identidade, a psique original – que
Essa característica do humano e das sociedades é Castoriadis denomina “ mônada psíquica” – , é, inicial-
essencial para a democracia: ela implica a possibilida- mente, inteiramente fechada ao exterior. Esse fecha-
de de radicalizar-se o questionamento do instituído, mento original tende, no entanto, a ser rompido de
levando-o mesmo até o ponto de ruptura com o mundo maneira mais ou menos violenta pela socialização –
próprio – pelo menos nos termos em que o indivíduo e que começa quando o recém-nascido entra em conta-
a sociedade o haviam construído para si. Do ponto de to com a sociedade ou com seu primeiro representan-
vista da funcionalidade, uma revolução, tanto quanto o te: a mãe. A abertura a sentidos que não estavam ori-
autoquestionamento, são aberrações, já que sempre ginalmente instituídos é o que, entre outras coisas,
colocam em risco a sobrevivência do ser – indivíduo permite que a psique possa significar o próprio cor-
ou sociedade – tal como até então ele se definira. po, dando início ao processo de autocriação, de insti-
E não será apenas uma provocação concluir que o tuição das condições para um auto-reconhecimento,
conservadorismo situa o humano no nível da pura fun- para o estabelecimento da identidade daquele que
cionalidade a que estão presos todos os demais viven- poderemos denominar “ indivíduo”.2
tes – na medida em que para estes, como mencionado A psique é, pois, ela também, capaz de disfun-
ainda há pouco, vigora a exigência de um sentido fixo cionalização em relação à autofinalidade da preser-
e imutável. Repare-se, de passagem, que a insistência vação – maneira talvez rebarbativa de dizer que tam-
em comparar os fenômenos humanos aos fenômenos bém a psique pode abrir-se ao que ela originalmente
biológicos – modismo recentemente reintroduzido na não é, e construir sentidos antes inexistentes para si.
área da educação, que assim achou estar-se munindo Em uma palavra, a psique é capaz de transformar-se
para tratar da complexidade – não é somente uma vol- em outra coisa diferente do que era. Porém, um enor-
ta inaceitável à ingênua concepção de uma ciência única me paradoxo, paradoxo tipicamente humano, faz,
para explicar tudo que há; é, muito particularmente, como diria Piera Aulagnier (1975, p. 27), que a psi-
uma terrível concessão a esse conservadorismo, redu- que só adquira o sentido que não tinha, só se transfor-
ção do humano à animalidade, na qual ele se confunde me no sentido que não era, transformando tudo nela
com tudo que respira, e ocultamento da dimensão so- mesma, metabolizando o outro. Isso fica evidente na
mente própria à humanidade, a dimensão que nos faz própria corporeidade, cujo sentido é, para a psique,
únicos entre os viventes: a autonomização da ativida- uma aquisição – mas uma aquisição que é, que não
de de criação. pode ser nada além de sentido.

Psique e sentido
2
A contraprova estaria nos transtornos nesse processo de
A criação de sentido é, pois, no humano, disfun- ruptura da mônada psíquica que caracterizam a anorexia infantil,
cionalizada, já que somente aí ela não atende unica- brutalmente fatal para recém-nascidos.

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No entanto, logo essa corporeidade deverá, de cer- tidos do que podemos dar-nos conta, quanto há
ta forma, ser colocada em questão, para que haja socia- subdeterminação, já que um símbolo psíquico está
lização. É o que os psicanalistas chamam de substitui- como que permanentemente à disposição de novos
ção do prazer de órgão pelo prazer de representação – sentidos que lhes sejam agregados. E há, igualmente,
a sublimação que caracteriza a superação das fixações uma supra-simbolização daquilo que é simbolizado,
próprias às fases oral e anal. A capacidade de investir pois o sentido psíquico sempre é e pode ser simboli-
em um objeto de prazer que é pura representação forne- zado de múltiplas e incontáveis maneiras. No entan-
ce à psique sua onipotência, que Freud denominara “ ilu- to, por mais que, simbolicamente, um mesmo sentido
sória”. Castoriadis, no entanto, corrige: do ponto de vista possa assumir roupagens totalmente díspares, e ter
psíquico, essa onipotência nada tem de uma ilusão, ela uma infinidade de representações que lhe correspon-
é uma realidade. O objetivo da psique, lembra ele, “ não dem, sempre resta algo de incomunicável, de irrepre-
é transformar a realidade exterior, apenas transformar a sentado e irrepresentável na psique.
representação (emancipá-la, se pode-se assim dizer) para Resta, porém, que essa espantosa maleabilidade
torná-la agradável” (1992, p. 215). De forma que não do movimento instituinte da psique vai marcar pro-
há regularidade nas relações entre o objeto representa- fundamente a existência humana, fazendo com que
do e a representação psíquica. Não estando presa às re- ela se distinga radicalmente do modo de existir do
presentações uma vez instituídas, nem a uma forma de vivente em geral.
representação canônica, rígida, permanente, a imagina-
ção humana cria e recria incessantemente os objetos de O indivíduo-social e o social histórico
investimento psíquico, tanto quanto institui e reinstitui
constantemente as relações com eles estabelecidas. A Essa plasticidade é condição necessária para que
possibilidade de “ autonomização do afeto e do desejo” haja um outro tipo, ainda, de movimento instituinte –
em relação às demandas imediatas, que são as do cor- aquele que faz existir as sociedades. As sociedades
po, possibilita, no humano, a ultrapassagem da dimen- são criações humanas – talvez seja esta afirmação a
são funcional. Instala-se assim uma atividade livre de contribuição mais conhecida de Castoriadis: a crítica
criação de sentidos que fez com que Castoriadis defi- à idéia de que aquilo que as sociedades são depende-
nisse a psique como “ fluxo representativo ilimitado e ria inteiramente, seria inteiramente determinado por
incontrolável” (idem, p. 216). leis naturais ou mesmo históricas. A sociedade – ou o
Identificamos, assim, entre os viventes, um tipo social-histórico, como o filósofo costumava denomi-
de movimento instituinte muito específico, sui generis, nar – é autocriação. Mas a sociedade não é criação de
que é próprio da psique. Melhor ainda: a psique não é um indivíduo ou de um grupo particular, e sim do que
outra coisa senão este movimento ininterrupto de cria- o autor chama de “ coletivo anônimo”, ou “ sociedade
ção de sentidos, que pode evidentemente assumir um instituinte”, em oposição à sociedade instituída. A
caráter conservador, ou não – não seria possível defi- auto-instituição da sociedade, diz o autor, é
nir a neurose como fixação e re-criação constante de
um mesmo afeto, numa espécie de looping cogniti- [...] a criação de um mundo humano: de “ coisas”, de
vo? Mas é preciso reconhecer a extraordinária labili- “ realidade”, de linguagem, de normas, valores, modos de
dade da psique, à qual Castoriadis (1992) se referiu viver e de morrer, objetivos pelos quais vivemos e outros
como um misto de “ economia e prodigalidade sim- pelos quais morremos – e, obviamente, em primeiro lugar e
bólicas”. Essa labilidade vem do fato de que, na rela- acima de tudo, ela é a criação do indivíduo humano no qual
ção entre o sentido e sua representação, na relação a instituição da sociedade está solidamente incorporada.
entre símbolo e simbolizado, há tanto uma suprade- Nesta criação geral da sociedade, cada instituição particu-
terminação do símbolo, que sempre carrega mais sen- lar e historicamente dada da sociedade representa uma cria-

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Democracia e movimentos instituintes

ção particular. Criação, no sentido em que a entendo, signi- a elucidação do fato de que socialização e individua-
fica a instauração de um novo eidos, uma nova essência, lização são um só e mesmo fenômeno pode ser dada
uma nova forma, no sentido pleno e forte deste termo: no- como uma das grandes contribuições que a obra de
vas determinações, novas normas, novas leis [… ] não ape- Cornelius Castoriadis tem a fazer ao pensamento e à
nas leis “ jurídicas”, mas maneiras obrigatórias de perceber prática educacional.
e de conceber o mundo social e “ físico”, e de nele agir. Em Como pudemos pressentir ao falarmos da mônada
virtude desta instituição global da sociedade, criações es- psíquica, a individuação depende de um movimento
pecíficas aparecem em seu interior: a ciência, por exemplo, instituinte de abertura ao mundo, a sentidos externos.
tal como a conhecemos e concebemos, é uma criação parti- Assim, como o filósofo não cessava de repetir, o que
cular do mundo grego-ocidental. (Castoriadis, 1987, p. 271) se opõe à sociedade não é o indivíduo, mas a mônada
psíquica. O indivíduo social, como ele o denomina-
Também no caso da sociedade, o movimento va, é “ psique socializada”, ainda que a socialização
instituinte é necessariamente um fluxo ininterrupto de da psique sempre seja parcial, nunca se dando nem
criação e recriação não só da realidade material, mas inteiramente, nem permanentemente.
dos sentidos que a ela são concedidos, e que fazem De modo que dois movimentos instituintes se
com que essa realidade material exista para cada um confundem aqui, sendo um a origem do outro: aquele
de nós e exista, com diria Hannah Arendt (1987, p. 67), pelo qual os humanos criam, a cada vez, os termos e
como “ terreno comum a todos, [onde] os que estão pre- condições de sua existência comum, criam a socieda-
sentes ocupam [… ] diferentes lugares, o lugar de um de; e aquele pelo qual cada sociedade cria, a cada vez,
não podendo jamais coincidir com o de outro”. No en- seus indivíduos. De modo geral, longe de estarem em
tanto, é claro que, tal como a criação psíquica, a cria- oposição, os indivíduos são as primeiras criações das
ção social pode dar-se – e quase sempre se dá – em sociedades que eles próprios criaram. E, novamente,
condições de heteronomia, isto é, de mera reiteração aqui a atividade de instituição encontra a dimensão
daquilo que está já instituído, sem questionamentos e, da funcionalidade: O indivíduo “ funciona” porque se
portanto, sem possibilidades de auto-alteração. socializa, e “ faz funcionar a sociedade”, provocava
A tradição acostumou-nos a pensar nas socieda- Castoriadis (1992, p. 220-221).
des como construções supra-humanas ou extra-sociais: O que podemos perceber, portanto, é que a exis-
como devendo sua existência à natureza “ sociável” tência humana depende de um movimento continua-
do homem, ou ao gesto divino, ou à determinação da mente instituinte, que se dá no nível natural-funcio-
história, a uma necessidade natural de sobrevivência, nal, comum a todo vivente, e nos níveis psíquico e
ou mesmo ao acaso. A mesma tradição habituou-nos social – somente presentes no humano. Porém, a exis-
a pensar que indivíduo e sociedade se opõem, que há tência desses níveis não se constitui, em si, nem em
conflito insuperável entre o que seria, por um lado, a ultrapassagem, nem em exclusão do nível da funcio-
subjetividade, a autenticidade sempre interior, a sin- nalidade, mas, até certo ponto, como vimos, o suben-
gularidade que não se pode compartilhar, pois que tende. Na base da vida, em seu sentido mais amplo e
expressá-la em termos comuns seria perdê-la; e, por mais simples, tanto quanto em seu sentido mais ela-
outro, a sociedade, pura objetividade, artificialidade borado e específico, há criação. Isso, contudo, em nada
sempre inautêntica, já que puramente convencional, garante a democracia.
toda exterior, irredutível aos sujeitos. Por força da mais
simples coerência, deve-se observar que, tanto quan- Democracia e criação
to não há sociedade sem indivíduos, não há indivi-
dualização sem sociedade. No entanto, essa constata- Longe disso, se o que vimos até aqui acerca das
ção vem sendo ocultada de forma tão sistemática que relações entre indivíduo e sociedade é verdadeiro,

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assim como em nível orgânico a sobrevivência de- de “ especialistas de governo”. Na democracia grega,
pende do fechamento do vivente, da preservação do nos poucos casos em que há atribuição de magistratu-
sentido de sua existência, da reiteração conservadora ras, a indicação não se dá somente ou sobretudo por
daquilo que já existe, no nível social a manutenção eleição, mas igualmente por sorteio e por rodízio. Os
do status quo, a preservação da sociedade, depende magistrados devem, no entanto, prestar contas perio-
da fabricação de indivíduos a ela perfeitamente iden- dicamente à coletividade, pois apenas ela é soberana.
tificados e prontos a não colocar jamais em questão Mas há ainda dois outros princípios: a permanente in-
sua existência tal qual ela é, e a rejeitar prontamente terrogação, feita atividade coletiva explícita, constan-
tudo que é estrangeiro e diferente. te, aberta e ampliada, que impede que a democracia se
E foi assim que se deu, de forma maciçamente extinga a ela mesma pela fixação de novos dogmas; e
recorrente ao longo da História humana. Nada no que a autolimitação, que significa que a coletividade deve
é o humano e tampouco no que são as sociedades in- saber precisar os limites de sua atividade instituinte.
duz à invenção da democracia. Em outras palavras, a “ Em uma democracia”, diz Castoriadis, “ o povo pode
democracia não pode ser deduzida nem da natureza fazer toda e qualquer coisa – e precisa saber que não
humana, nem da História; ela é uma criação e, como deve fazer toda e qualquer coisa” (1987, p. 304).
tal, não pode ser “ explicada”. O projeto democrático O movimento que institui a democracia é aque-
irrompeu pela primeira vez no mundo grego como le, portanto, que cria a igualdade de participação no
novidade que nada, no passado, havia preparado. poder, que cria o espaço público como lugar que per-
Vale a pena mencionar, ainda que rapidamente, tence a todos, mas a ninguém de forma particular, e
alguns dos principais traços pelos quais, segundo onde se pratica a deliberação e o autoquestionamento
Castoriadis, o regime democrático se fez novidade coletivos. Reparem que a liberdade de discurso e de
radical no mundo antigo, pelos quais os gregos reali- pensamento não é pouca coisa, ali onde, abdicando
zaram a invenção do projeto de autonomia. Registre- da violência, como diria Arendt, os homens conce-
se, contudo, que essas características só se distinguem dem à palavra toda sua força instituinte. No regime
artificialmente, já que, na prática, elas estão intima- democrático, essa liberdade associava-se a dois di-
mente ligadas umas às outras. reitos fundamentais: a isègoria, direito igual para to-
Autonomia significa: dar-se seu próprio nómos, dos de falar com toda a franqueza, e a parrhèsia, o
suas próprias leis, suas próprias determinações. Para compromisso que cada cidadão assume de pronunci-
que a pólis se desse suas próprias determinações, ou ar-se efetivamente com toda a liberdade, sempre que
seja, para que de fato houvesse auto-instituição, foi se trate de assuntos públicos.
preciso que se instalassem princípios e procedimen- No entanto, como nos adverte Castoriadis, numa
tos públicos de deliberação coletiva. democracia o movimento instituinte vai bem mais
Por um lado, foi preciso que o démos se procla- longe. Não basta – como tantas vezes queremos acre-
masse absolutamente soberano – na criação das leis, ditar – instaurar as leis, por melhores que sejam, mais
na jurisdição, no governo. E que, compondo o démos, legítimas em termos de sua criação e mais democráti-
os cidadãos se declarassem iguais – não no sentido cas em termos de seu conteúdo; é ainda preciso inter-
passivo e totalmente formal que a igualdade diante rogar-se acerca dos cidadãos que efetivamente irão
da lei adquiriu entre nós, mas como igualdade de pa- exercer esses direitos, essa participação.
lavra e de participação em todas as deliberações que
concerniam aos destinos comuns. Democracia e formação humana
A participação direta, tal como apenas os antigos
a conheceram, opõe-se não só à moderna idéia de re- A imprudente confiança que as sociedades, so-
presentação, quanto à não menos moderna concepção bretudo a partir da Modernidade, tenderam a deposi-

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Democracia e movimentos instituintes

tar na construção das leis – patente, em nossa Histó- um espaço para a propaganda, para a mistificação e para a
ria, em pelo menos dois momentos que, não por aca- pornografia – a exemplo do que ocorre cada vez mais nos
so, anteciparam fortes frustrações coletivas e um acen- dias de hoje. Não existem dispositivos jurídicos que pos-
tuado descrédito em relação às instituições políticas: sam frear uma tal evolução – sem introduzir males piores
a Proclamação da República e o movimento consti- que os que se pretendem extirpar. Apenas a educação
tuinte de 1988 – não é apenas resultante de um idea- (paidéia) dos cidadãos enquanto tais pode dotar o “ espaço
lismo exacerbado e pouco prático, mas é também a público” de um autêntico e verdadeiro conteúdo. Mas essa
conseqüência direta de uma visão bastante equivoca- paidéia não é, basicamente, questão de livros ou verbas
da e incoerente, que insiste em acreditar que a demo- para as escolas. Ela consiste, antes de mais nada e acima de
cracia pode ser construída apenas com a participação tudo, na tomada de consciência, pelas pessoas, do fato de
de alguns – daqueles que previamente a concebem. que a pólis é também cada uma delas, e de que o destino da
Da atividade política vista como aplicação de pólis depende também do que elas pensam, fazem e deci-
saber especializado e terreno de especialistas decorre dem; em outras palavras: a educação é participação na vida
um conjunto de leis e de políticas públicas que, sem política. (Castoriadis, 1987, p. 301)
sujeitos que as encarnem, permanecem vazias e ine-
fetivas. Já nos habituamos à indagação acerca de que Não há construção política sem formação huma-
leis e políticas deverão ser introduzidas; mas, quanto na. É essa a implicação da idéia segundo a qual o
à indagação sobre os indivíduos capazes de fazer exis- indivíduo social e a sociedade são produtos um do
tir essas leis e políticas, pouco se fez. Quando, para outro. Dessa forma, quando se diz que a democracia
além dos jargões inexpressivos, a cidadania é objeto cria democratas, também se está dizendo que apenas
de reflexão, a maior parte do tempo acredita-se dever democratas criam efetivamente a democracia. A
deduzi-la do conjunto de leis e políticas instituídas paidéia democrática é, afirma Castoriadis, a forma-
por uma pequena elite – pelos governos e pelos parti- ção de um tipo de subjetividade até então inexistente:
dos políticos. a subjetividade reflexiva e deliberante. Reflexividade,
É bem verdade que os antigos não cessaram de isto é, capacidade de autoquestionamento que, para
enfatizar o caráter formador das leis, e na Grécia os caracterizar a sociedade, deve forçosamente estar pre-
legisladores eram considerados verdadeiros educado- sente em cada indivíduo que a compõe.
res (Jaeger, 1964, p. 513). No entanto, entre esses úl- A subjetividade democrática é aquela que é ca-
timos sempre figuraram, em grau igual de importân- paz de questionamento de si, de oposição interna, de
cia, os poetas e artistas que erigiam obras culturais. A abertura ao novo. Nela, o constante movimento insti-
política definia-se originalmente, no regime demo- tuinte faz-se acompanhar da crítica e da reflexão, a
crático, como instituição da vida comum, da pólis, criação faz-se explícita e deliberada. Mas não é ape-
envolvendo muito mais do que a atividade legislati- nas do ponto de vista da razão, do lógos, que a subje-
va. Nesse contexto, a reflexão sobre a formação hu- tividade democrática se distingue de tudo o que o
mana estava longe de ser considerada uma questão humano apresentou até então. Essa subjetividade tam-
menor, ou acessória. Atividade instituinte, a forma- bém se traduz em um tipo de investimento afetivo
ção dos cidadãos era, tanto quanto a construção da muito singular. Referi-me anteriormente à sublima-
vida comum, objeto de interrogação e deliberação ção, que consiste na substituição do prazer de órgão
coletivas. pelo prazer de representação: trata-se, como afirma-
do, de um mecanismo essencial na auto-instituição
Quanto a este aspecto, os traços determinantes são a de todo humano, que consiste na capacidade de a
coragem, a responsabilidade e a vergonha (aidôs, aischunè). criança paulatinamente deixar de investir afetivamente
Na ausência delas, o espaço público torna-se simplesmente apenas nos objetos de prazer mais imediatos, mais

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Lílian do Valle

sensoriais e próximos – portanto, objetos privados – JAEGER, Werner (1964). Paidéia. La formation de l’homme grec
para investir em “ objetos” imateriais (que não nos for- (La Gréce archaïque. Le génie d’Athènes). Paris: Gallimard, 1964.
necem qualquer experiência dos sentidos, mas que são KEHL, Maria Rita. Sobre ética e psicanálise. São Paulo: Compa-
socialmente instituídos, que só existem na e pela so- nhia das Letras, 2002.
ciedade), aí encontrando prazer. Essa passagem aos ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discours sur l’origine et les
objetos de investimento social é a marca que a socie- fondements de l’inégalité parmi les hommes. Paris: Gallimard,
dade apõe aos sujeitos. Há assim como uma cadeia Pléiade, 1969. t. III.
de objetos de investimento, e o deslocamento daque- TUCÍDIDES. História da guerra do Peloponeso. 3. ed. Brasília:
les que são mais privados àqueles que são mais públi- Editora Universidade de Brasília, 1987.
cos é também condição de socialização indispensá- VALLE, Lílian do. Enigmas da educação. A paidéia democrática,
vel para que os sujeitos efetivamente invistam em entre Platão e Castoriadis. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
objetos tais como a democracia, a igualdade, o
autoquestionamento… Na maior parte do tempo, esses LÍLIAN DO VALLE, doutora em educação pela Universi-
objetos não são tangíveis; aceitar continuar investin- dade Paris V, é professora titular de filosofia da educação da Uni-
do neles não é apenas uma decisão racional, mas en- versidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), na qual coordena
volve um modo de ser muito específico: este mesmo atualmente o Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas
que só é próprio das subjetividades reflexivas e deli- e Formação Humana. Publicou, entre outros: A escola e a nação
berantes em uma democracia. (São Paulo: Letras & Letras, 1996), A escola imaginária (Rio de
Janeiro: DP&A, 1997), Enigmas da educação (Belo Horizonte:
Referências bibliográficas Autêntica, 2002), Bases antropológicas da cidadania brasileira:
sobre escola pública e cidadania na Primeira República (Revista
ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense, 1987.
Brasileira de Educação, n. 19, p. 29-42, jan./abr. 2002). Pesquisa
AULAGNIER, Piera. La violence de l’interprétation. Paris: PUF,
em andamento: “ O sujeito isolado: raízes antropológicas da crise
1975.
de socialização e da identidade contemporâneas”. E-mail:
CASTORIADIS, Cornelius. As encruzilhadas do labirinto II. Do-
lvalle@infolink.com.br
mínios do homem. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
. As encruzilhadas do labirinto III. O mundo frag-
Recebido em agosto de 2006
mentado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
Aprovado em outubro de 2006

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Resumos/Abstracts/Resumens

disbelief in relation to the feelings


which maintain the common world and
individual private existence: it is also
and above all the renouncing of that
which gives human existence its
originality. For all those who are alive,
the horizon of what we can call the
Lílian do Valle sense of existence is pure functionality.
Democracia e movimentos Only the human escapes the rules of
instituintes functionality and frees him/herself in
Vivemos uma época de poucas certe- relation to the finality of preservation
zas, de muito desânimo em relação à and reproduction: for this reason, the
sociedade, à política, à ação humana e feelings he/she creates have finalities
seu poder. A fragilidade dos sentidos which go far beyond simple survival.
coletivamente instituídos prolonga e Key words: democracy; institutive
intensifica o vazio e o isolamento em movements
que o cotidiano mergulha cada um. Democracia y movimientos
Mas o mais grave no ceticismo con- instituyentes
temporâneo não é a descrença em rela- Vivimos en una época de pocas certe-
ção aos sentidos que mantêm o mundo zas, de mucho desánimo en relación a
comum e cada existência privada sob a la sociedad, a la política, a la acción
terra: é também e sobretudo a renúncia humana y a su poder. La fragilidad de
ao que dá à existência humana sua ori- los sentidos colectivamente instituidos
ginalidade. Para todos os viventes, o prolonga e intensifica el vacío y el
que se pode chamar de “ sentido” da aislamiento en que lo cotidiano pene-
existência se esgota na pura funcionali- tra en cada uno. Lo más grave en el
dade. Somente o humano escapa às re- escepticismo contemporáneo, sin em-
gras da funcionalidade e se autonomiza bargo, no es el descreimiento en
em relação à finalidade de preservação relación a los sentidos que mantienen
e reprodução: por isso, os sentidos por el mundo común y cada existencia pri-
ele criados têm finalidades que vão vada sobre la tierra: es también y
muito além da simples sobrevivência. sobretodo la renuncia a lo que da a la
Palavras-chave: democracia; existencia humana su originalidad.
movimentos instituintes Para todos los vivientes, lo que se
Democracy and institutive puede llamar de “sentido” de la
movements existencia se agota en el puro funcio-
We live in an age of few certainties, of nalismo. Solamente el humano escapa
deep despondency in relation to a las reglas del funcionalismo y se
society, politics, human action and its independiza en relación a la finalidad
power. The fragility of collectively de preservación y reproducción: por
instituted feelings prolongs and eso, los sentidos por él creados tienen
intensifies the emptiness and isolation finalidades que van mucho más de una
in which daily life submerges each of simple supervivencia.
us. But what is most grave in the Palabras claves: democracia;
contemporary scepticism is not the movimientos instituyentes

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