You are on page 1of 8

ARTIGO ORIGINAL

16

Chirle de Oliveira
Raphaelli1 Prevalência de hábitos de vida em
Alessandra Doumid
Borges Pretto2
Gisele Ferreira Dutra3
escolares de um Município do Sul
do Brasil
Prevalence of life habits in students of a city of southern Brazil

> RESUMO
Objetivo: Descrever a prevalência de hábitos de vida, quanto ao consumo alimentar, prática de atividade física semanal,
excesso de peso, consumo de bebidas alcoólicas e uso de cigarros entre adolescentes da zona rural de Barão do Triunfo/RS.
Métodos: Participaram 377 escolares entre 10 e 18 anos, de 5ª a 8ª séries. Os desfechos analisados foram os hábitos não
saudáveis: inatividade física semanal no lazer e no deslocamento, consumo alimentar, conforme adesão aos dez passos para
uma alimentação saudável, excesso de peso, avaliado por meio do índice de massa corporal, uso de cigarros e consumo de
bebidas alcoólicas auto-relatados nos últimos 30 dias. Resultados: A prevalência de relato de uso de cigarro e consumo de
bebidas alcoólicas nos últimos 30 dias entre os jovens foi de 6,7% e 27%, respectivamente; 45% dos adolescentes foram
classificados como inativos fisicamente e 24,8%, apresentaram excesso de peso. A frequência de adesão aos passos para
uma alimentação saudável foi baixa para todos os passos, exceto o referente ao consumo semanal de arroz e feijão (passo
4), o qual obteve 82,3% de adesão pelos adolescentes. Conclusão: Adolescentes apresentaram alta prevalência de hábitos
de vida não saudáveis. Incentiva-se a adoção de estilo de vida saudável por jovens de zona rural, a partir do planejamento
de estratégias que auxiliem na adesão e no engajamento do indivíduo, visando à melhoria na qualidade de vida e à redução
de problemas futuros nessa população.

> PALAVRAS-CHAVE
Adolescente, estado nutricional, exercício.

> ABSTRACT
Objective: To determine the prevalence of lifestyle habits – food intake, weekly physical activities, excess weight, alcohol
consumption and cigarette smoking among adolescents in the rural area of Barão do Triunfo, Rio Grande do Sul State.
Methods: The participants were 377 schoolchildren between 10 and 18 years old, enrolled in the 5th to 8th grades. The
outcomes rated as unhealthy lifestyle habits were: lack of weekly physical activities for recreation and point-to-point trips
in their daily lives, food consumption measured by compliance with the ten steps to a healthy diet, excess weight assessed
by Body Mass Index, cigarette smoking and consumption of alcoholic beverages, all self-reported for the previous month.
Results: The prevalence of reported smoking and drinking during the past 30 days among these youngsters reached 6.7%
(tobacco) and 27% (alcohol), respectively; 45% were ranked as physically inactive and 24.8% were overweight. Compliance
with the steps to healthy eating was weak across the board, except Step 4 – weekly consumption of rice and beans – which

1
Doutoranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Mestre em Educação Física pela UFPEL.
Pelotas, RS, Brasil.
2
Doutora em Saúde e Comportamento pela Universidade Católica de Pelotas. (UCPEL). Pelotas, RS, Brasil. Mestre em Nutrição e Alimentos
pela Universidade Federal de Pelotas. (UFPEL). Pelotas, RS, Brasil.
3
Doutora em Saúde e Comportamento pela Universidade Católica de Pelotas (UCPEL). Pelotas, RS, Brasil. Mestre em Ciências da Saúde pela
Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Rio Grande, RS, Brasil.

Gisele Ferreira Dutra (gisele_fd@yahoo.com.br) – Rua Andrade Neves, 1109, ap. 402, Centro. Pelotas, RS, Brasil. CEP: 96020-080.
Recebido em 15/06/2014 – Aprovado em 29/08/2014

Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016 Adolescência & Saúde
Raphaelli et al. PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES 17
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

reached 82.3% for these youngsters. Conclusion: These adolescents presented a high level of unhealthy lifestyle habits.
Rural youngsters are encouraged to adopt healthy lifestyles, through planning strategies that boost individual compliance
and engagement, thus enhancing the quality of life and lessening future problems for this segment of the population.

> KEY WORDS


Adolescent, nutritional status, exercise.

> INTRODUÇÃO preocupado especialmente as lideranças gover-


namentais, considerando que as situações atuais
Atualmente têm-se ressaltado a importân- de risco podem acarretar problemas sociais e
cia da aquisição e da manutenção de hábitos econômicos futuros, por conta das agressões
saudáveis direcionados à melhoria da qualidade atuais ao melhor estado de saúde de crianças
de vida e da saúde, por meio do estimulo à prá- e adolescentes, sabendo que a instalação e o
tica regular de atividade física, alimentação ade- desenvolvimento de comportamentos de risco
quada e saudável, horas diárias de sono suficien- predisponentes às doenças crônico-degenerati-
tes, restrição ao consumo de bebidas alcoólicas, vas podem ocorrer nesse período da vida5.
evitar o tabagismo, ter momentos de lazer, con- Considerando-se que a possibilidade das
trole emocional e do estresse1. O comprometi- percepções e do domínio do conhecimento são
mento da qualidade de vida pode predispor ao fatores potencialmente influentes nos hábitos
aparecimento e ao desenvolvimento de disfun- de vida dos indivíduos, surge a necessidade de
ções crônico-degenerativas1. Estudos sugerem identificar quanto, e como, esses atributos po-
que os padrões de ingestão dietética durante a dem se relacionar com o estilo de vida assumido
infância e adolescência podem predizer a ocor- pelos jovens. Assim sendo, o objetivo do estudo
rência de obesidade e doenças cardiovasculares foi descrever a prevalência de hábitos de vida
na idade adulta, bem como determinar o risco quanto ao consumo alimentar, prática de ativi-
de alguns tipos de câncer relacionados à dieta1-2. dade física semanal, excesso de peso corporal,
A adolescência é um período de intensas consumo de bebidas alcoólicas e uso de cigarros
transformações que são influenciadas pelos há- entre adolescentes de Barão do Triunfo, RS.
bitos familiares, amizades, valores e regras so-
ciais e culturais, condições socioeconômicas,
assim como por experiências e conhecimentos MÉTODOS
>
do indivíduo3. Hábitos adquiridos nesse período
repercutem sobre o comportamento em muitos Estudo transversal de base escolar realizado
aspectos da vida futura, como a alimentação, na zona rural de Barão do Triunfo, RS. O municí-
autoimagem, saúde individual, valores, prefe- pio, da região carbonífera do Estado, possui um
rências e desenvolvimento psicossocial3. Hábitos território de 436,4km2 e 7.018 habitantes, sendo
inadequados na infância e na adolescência po- que 53% da população é do sexo masculino e
dem ser fatores de risco para doenças crônicas 90% é morador de zona rural.
na fase adulta3. A amostra incluiu todos os adolescentes
Estudos recentes têm identificado, neste matriculados entre a 5ª e a 8ª séries nas três es-
grupo etário, hábitos de vida pouco saudáveis, colas da rede municipal de educação e seus pais
como o baixo consumo de frutas e vegetais, (biológicos ou não). As escolas foram seleciona-
alto consumo de doces e gorduras, alta preva- das para coleta de dados devido à presença de
lência de excesso de peso e baixa frequência de ensino fundamental completo (da 5ª à 8ª série),
atividade física3-4. Diante disto, evidências têm sendo que todas estão localizadas na zona rural

Adolescência & Saúde Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016
18 PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES Raphaelli et al.
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

do município. Foram excluídos do estudo indi- O nível de atividade física foi avaliado com
víduos com incapacidade mental de responder o instrumento de Bastos e colaboradores, o qual
ao questionário. investiga as atividades realizadas nos últimos
A coleta de dados foi realizada entre março sete dias anteriores à aplicação do questionário
e setembro de 2010, e ocorreu na sala de aula. excluindo as atividades realizadas durante as au-
Para a coleta, foi construído um questionário, o las de educação física escolar7. Foram coletadas
qual foi previamente testado em estudo piloto, informações de frequência e duração da ativi-
com a finalidade de adequar os instrumentos de dade realizada. Após foram considerados como
coleta de dados. Os instrumentos, autoaplicá- inativos os jovens que não acumulavam pelo
veis, foram entregues aos escolares em sala de menos 300 minutos de atividades físicas, por se-
aula, sem a presença dos professores, em uma mana. Um escore semanal de atividade física foi
sala previamente organizada. Os questionários elaborado, multiplicando a frequência semanal
foram respondidos individualmente, após da- (dias) pela duração média (minutos) das ativi-
das as devidas instruções e revisados posterior- dades físicas moderadas e vigorosas, sendo que
mente pela coordenadora do estudo. O tempo o tempo semanal despendido em atividades de
de aplicação foi de 40 minutos (30-60min). Em intensidade vigorosa foi multiplicado por dois,
seguida, em uma sala preparada para tal, foram conforme sugerido em publicações anteriores.
realizadas as medidas antropométricas. A fase Informações sobre hábito alimentar foram
de aplicação do questionário foi realizada por obtidas a partir de um questionário elaborado
uma nutricionista e as medidas por 3 professo- baseado nos “10 passos para uma alimentação
res de educação física, previamente treinados. saudável” do Guia Alimentar do Ministério da
O controle de qualidade foi realizado em 10% Saúde8 para a população brasileira. As questões
das medidas antropométricas com os adoles- desse instrumento permitiram verificar a fre-
centes para a correção dos erros e conferência quência de consumo dos alimentos no período
dos dados coletados e assim garantir a validade de um ano anterior à entrevista. Para cada passo
interna do estudo. utilizou-se uma variável dicotômica (adesão ao
Medidas de massa corporal foram realiza- passo sim/não). O passo 1 sugere o fraciona-
das em balança digital, marca PLENNA (capaci- mento da dieta em pelo menos 5 refeições ao
dade de 150Kg e precisão de 100g) e medidas dia (3 principais e 2 lanches); o passo 2 sugere o
de estatura em estadiômetro, tipo portátil da consumo diário de 6 ou mais porções de cereais;
marca SANNY (medida até 210cm e precisão o passo 3, a ingestão diária de pelo menos 3
de 1mm), previamente calibrados. Para realiza- porções de legumes e verduras e de 3 porções
ção das medidas os adolescentes deveriam estar ou mais de frutas; o passo 4, o consumo diário
com roupas leves, sem calçados e em posição de feijão com arroz; o passo 5, o consumo de
ortostática6. Cada medida foi aferida duplamen- 3 ou mais porções de leites e derivados e 1 ou
te para posterior realização da média e obtenção mais porções de carnes, aves, peixes ou ovos; o
de um resultado preciso. Também foram obti- passo 6, o consumo máximo de 1 porção por
das informações dos comportamentos de risco dia de óleos, azeites, manteigas ou margarinas;
à saúde (inatividade física, hábitos alimentares o passo 7, o consumo de refrigerantes, sucos in-
inadequados, uso de cigarros e consumo de dustrializados, bolos, biscoitos doces e rechea-
bebidas alcoólicas, sobrepeso/obesidade) dos dos e outras guloseimas limitados a duas vezes
adolescentes. Além disso, foram obtidas variá- na semana; o passo 8, a diminuição do consumo
veis socioeconômicas dos pais e demográficas e de alimentos embutidos e industrializados sal-
antropométricas dos adolescentes. As variáveis gados (hambúrgueres, salsichas, linguiças, etc)
independentes analisadas foram sexo e idade limitados a duas vezes na semana e o passo 9 a
dos adolescentes. ingestão de pelo menos 6 copos de água ao dia.

Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016 Adolescência & Saúde
Raphaelli et al. PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES 19
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

O passo 10 não foi categorizado nesse es- de perdas e recusas. Entre os escolares respon-
tudo, pois, ele se refere ao hábito de atividade dentes à pesquisa, 27,7% estavam matriculados
física, tabagismo, ingestão de bebidas alcoólicas na 5ª série, 28% na 6ª, 26,4% na 7ª e 17,9% na
e estado nutricional, os quais foram analisados 8ª. A idade média dos adolescentes era de 12,9
de forma mais detalhada no estudo. (DP±1,8) variando de 10 a 18 anos. Percebeu-se
Para a avaliação dos hábitos não saudáveis que 18,93% dos escolares estavam acima de 14
(uso de cigarros e consumo de bebidas alcoóli- anos, destes 23,62% eram meninos e 13,64%
cas), foram utilizadas as questões propostas pelo meninas.
Centro Brasileiro de informações sobre Drogas A tabela 1 apresenta as variáveis demográ-
Psicotrópicas9. O consumo de álcool foi conside- ficas, socioeconômicas e de comportamentos
rado positivo quando os respondentes referiam dos adolescentes. A amostra foi predominan-
ter consumido qualquer quantidade de bebidas temente composta por rapazes (53,1%). O uso
alcoólicas no último mês e o uso de cigarros foi de cigarro nos últimos 30 dias foi relatado por
considerado quando os respondentes referiam 6,7% dos adolescentes e o consumo de bebi-
ter usado qualquer quantidade de nicotina nos das alcoólicas no último mês foi de 27% dos
últimos 30 dias. escolares. Com relação ao estado nutricional,
O excesso de peso (sobrepeso e obesida- 24,8% dos adolescentes, apresentaram excesso
de), definido como um hábito não saudável, foi de peso. A inatividade física foi relatada por 45%
classificado a partir do índice de massa corporal dos jovens. A frequência de adesão para uma
(IMC). O IMC dos jovens foi classificado em per- alimentação saudável foi baixa para todos os
centil, segundo idade e sexo10. passos, exceto o referente ao consumo semanal
O programa Epi-info 6.0 (Centers for Disease de arroz e feijão combinados (passo 4), o qual
Control and Prevention, Atlanta, USA) foi utilizado atingiu 82,3% de adesão pelos adolescentes. Os
para dupla digitação dos dados. Neste progra- hábitos alimentares inadequados são mostrados
ma foi possível utilizar o item Validate e corrigir pela baixa adesão dos adolescentes aos passos 1
os erros entre os bancos. A análise dos dados foi (31,4%), 2 (31,5% ) e 9 (31,8%) e uma adesão
realizada no STATA 11.0, e utilizados os recursos extremamente baixa aos passos 3,5,6,7 e 8.
da estatística descritiva: média, desvio padrão
(DP), frequência relativa e intervalo de confian-
DISCUSSÃO
>
ça 95%, com nível de significância de 5%.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Éti-
ca em Pesquisa com seres humanos da Escola Uma preocupação relevante entre os hábi-
Superior de Educação Física da Universidade Fe- tos de vida dos adolescentes abrange: alimen-
deral de Pelotas sob o protocolo 068/2009. Os tação inadequada, inatividade física, uso de
participantes da pesquisa (pais ou responsáveis cigarros, consumo de bebida alcoólica, alta pre-
dos adolescentes) assinaram o Termo de Con- valência de excesso de peso, dentre outros. Da-
sentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Em todas dos recentes indicam elevada taxa de comporta-
as fases da pesquisa garantiu-se o anonimato, a mentos não saudáveis, incluindo a alimentação,
liberdade de recusa e a possibilidade de retirada por exemplo, mais de 80% consomem pouca
do consentimento. quantidade de fibras, e aproximadamente 35%
consomem grande quantidade de gordura em
sua alimentação11. Estudos epidemiológicos refe-
> RESULTADOS rem que o menor consumo de frutas e vegetais,
além do maior consumo de lanches altamente
Dos 412 escolares elegíveis, 377 participa- calóricos, estão associados a comportamentos
ram do estudo, perfazendo um total de 8,5% sedentários, tais como assistir televisão11,12.

Adolescência & Saúde Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016
20 PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES Raphaelli et al.
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

Tabela 1. Caracterização da amostra estudada. (n=377)


Variáveis %
Sexo
Masculino 53,1
Feminino 46,9
Fumo
Não 73,0
Sim 27,0
Consumo de bebidas alcoólicas
Não 73,0
Sim 27,0
IMC
Normal 75,2
Sobrepeso 10,7
Obesidade 14,1
Atividade Física
Não 45,0
Sim 55,0
Alimentação Saudável
Fracionar a dieta em cinco refeições ao dia (Passo 1) 31,4
Consumo diário de seis porções de cereais (Passo 2) 31,5
Consumo de pelo menos três porções de legumes, verduras e de três porções de frutas por dia (Passo 3) 5,6
Consumo diário de feijão com arroz (Passo 4) 82,3
Ingestão diária de pelo menos três porções de leite e derivados e de uma porção de carne em geral
0,6
(Passo 5)
Consumo máximo de uma porção de óleos e gorduras por dia (Passo 6) 4,8
Consumo de refrigerantes, sucos industrializados, bolos, biscoitos doces e recheados e outras
14,8
guloseimas limitado a 2 vezes por semana (Passo 7)
Consumo de alimentos embutidos e industrializados salgados (hambúrguers, salsichas, linguiças, etc.)
0,9
limitado a 2 vezes por semana (Passo 8)
Ingestão de ao menos 6 copos de água por dia (Passo 9) 31,8

Neste estudo, observou-se uma elevada cas, o que também está de acordo com estudos
ocorrência de hábitos de alimentação não sau- prévios, indicando a necessidade de estratégias
dáveis, incluindo o baixo consumo diário de de saúde pública eficazes, que visem à promo-
frutas e vegetais. Dietas não saudáveis são uma ção da atividade física e de hábitos alimentares
preocupação importante em adolescentes, e saudáveis nessa população específica13.
esse dado está em conformidade com os acha- Os achados desse estudo apontam para a
dos da presente pesquisa11,13. Outro achado im- associação entre a baixa frequência de ativida-
portante foi a baixa frequência de atividades físi- de física e a alimentação inadequada, como um

Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016 Adolescência & Saúde
Raphaelli et al. PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES 21
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

possível motivo para comportamentos seden- mostrar prevalências um pouco maiores. Segun-
tários. Estudos prévios demonstram que ado- do Horta e colaboradores, 43% dos adolescen-
lescentes engajados em atividades esportivas tes de 15 a 19 anos da zona urbana de Pelotas,
regulares apresentam maior ocorrência de ou- RS relataram uso de cigarro ao menos uma vez
tros comportamentos saudáveis, como menores na vida. E, segundo os autores, o controle do
níveis de tabagismo e ingestão adequada de tabagismo pode ser mais benéfico à saúde e à
fibras, indicando que os comportamentos sau- expectativa de vida do que qualquer outra ação
dáveis tendem a estar associados13,14. Nesse caso preventiva isolada14.
específico, uma possível explicação baseia-se no O consumo de bebidas alcoólicas no últi-
fato de que a prática de esportes requer a inclu- mo mês foi referido por 27% dos escolares. Estes
são de uma série de hábitos positivos no estilo dados se mostraram semelhantes aos encontra-
de vida do adolescente, e essas atitudes incluem dos em estudos anteriores14-17. Neste estudo a
o consumo de alimentos de melhor qualidade14. população estudada residia em um município
Além disso, a prática de esportes na adolescên- de pequeno porte e os lazeres ofertados neste
cia aumenta a probabilidade de o indivíduo ser local foram trazidos por descendentes de ori-
caracterizado como fisicamente ativo na vida gem italiana (vinho) e alemã (cerveja), estando
adulta; consequentemente, essa relação entre arraigados à cultura regional27. Com isso, é co-
comportamentos saudáveis pode se manter por mum o consumo de bebidas alcoólicas em festas
toda a vida. Portanto, a promoção de esportes populares, encontros de clubes e associações e
na adolescência pode ser uma forma eficaz de na própria residência18.
promover a saúde pública14. A inadequação dos hábitos alimentares,
O uso de cigarros relatado pelos adolescen- demonstrada pela baixa adesão aos passos da
tes foi de 6,7%. Estimava-se que a prevalência alimentação saudável, evidenciou outro hábito
de exposição a este hábito não saudável fosse não saudável. Comparando com a literatura, a
mais elevada, pois o município tem economia adesão ao passo 1, referente ao número de refei-
basicamente agrícola, advinda do cultivo e da ções diárias foi superior ao observado em inves-
produção agrícola de fumo. Talvez pelas cres- tigação anterior 19. A baixa adesão aos passos 2
centes campanhas antitabagistas realizadas nas e 3 está de acordo com estudos prévios17-19, fato
escolas este índice não tenha sido tão alarman- preocupante em virtude de o consumo frutas,
te. A dependência de nicotina é considerada um hortaliças, cereais e alimentos integrais auxilia-
problema de saúde pública, pois 90% dos casos rem na prevenção de doenças e agravos não
de câncer de pulmão e 25 % dos casos de doen- transmissíveis20. O passo 4 foi o que teve a maior
ças isquêmicas do coração ocorridos na popula- frequência de adesão. O prato que mais carac-
ção mundial são atribuíveis ao tabaco que, além teriza o nosso hábito alimentar diário é o feijão
disso, é a principal causa prevenível de morbi- com arroz e este satisfaz as necessidades básicas
mortalidade em países desenvolvidos15. do organismo com relação a calorias e proteí-
A prevalência de experimentação de ci- nas17. A adesão ao passo 6 é baixa, o que de-
garros na adolescência tem se mostrado rela- monstra que muitos adolescentes têm um con-
tivamente alta em muitos países, inclusive no sumo de óleos e gorduras acima do preconizado
Brasil15-16. Este fato é preocupante, pois cerca de 17
. Estudos mostram alto consumo de bebidas
30% dos indivíduos que experimentarem taba- doces, guloseimas e alimentos industrializados
co irão se tornar dependentes15. entre adolescentes17-18.
Estudos prévios abordando o tabagismo A adesão aos passos para uma alimentação
entre escolares adolescentes apontam prevalên- saudável mostrou-se, em geral, baixa. Presume-
cias de experimentação do cigarro entre 23 e -se que a compra de alimentos saudáveis, como
41%15-16. Estudos de base populacional podem frutas e verduras, pela população estudada seja

Adolescência & Saúde Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016
22 PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES Raphaelli et al.
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

inferior, quer pela dificuldade de acesso aos su- à integração e articulação permanente das áreas
permercados centrais, ou mesmo pela monocul- da educação e da saúde, proporcionando me-
tura utilizada pelos agricultores locais, os quais lhoria da qualidade de vida aos escolares com
não possuem o hábito de produzir estes alimen- ações de promoção, prevenção e atenção à saú-
tos. Outra justificativa para os inadequados há- de, com foco especial na promoção de estilos de
bitos alimentares da população pode ser dada vidas saudáveis (atividades físicas de lazer e des-
pela diversidade cultural da alimentação, advin- locamento e melhoria do consumo alimentar).
da de várias etnias18. Na alimentação de descen-
dentes italianos, é comum perceber a existência
CONCLUSÃO
>
de refeições abundantes, com excesso de con-
sumo de cereais (massas e polentas) e gorduras Diante dos achados encontrados, ratifica-
(queijos) e a alimentação de descendentes ale- -se a importância do estímulo à adoção de um
mães, poloneses e portugueses apresenta maior estilo de vida saudável por crianças e jovens,
consumo de cereais (batatas, centeio), de ali- contribuindo para a promoção e consolidação
mentos embutidos, defumados e salgados, além de hábitos benéficos, bem como corroborando
da carne suína18-20. para a manutenção da saúde, tanto na infância
Cabe destacar a adesão da gestão munici- como na idade adulta. Além disso, é imperativo
pal ao Programa de Saúde na Escola (PSE), que ressaltar a importância de programas de edu-
aconteceu após a realização desta pesquisa com cação em saúde que precisam ser aplicados em
os adolescentes. Essa intervenção na escola visa escolas das regiões rurais de todo o país.

> REFERÊNCIAS
1. Guedes DP, Grondim LMV. Percepção de hábitos saudáveis por adolescentes: associação com
indicadores alimentares, prática de atividade física e controle de peso corporal. Rev Bras Cienc Esporte.
2002;24(1):23-45.
2. Mikkilä V, Räsänen L, Raitakari OT, Pietinen P, Viikari J. Longitudinal changes in diet from childhood into
adulthood with respect to risk of cardiovascular diseases: the cardiovascular risk in young finns study. Eur J
Clin Nutr. 2004;58(7):1038-45.
3. Levy RB, Castro IRR, Cardoso LO, Tavares LF, Sardinha LMV, Gomes FS, et al. Consumo e comportamento
alimentar entre adolescentes brasileiros: Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). 2009. Cien Saude
Colet. 2009;15(Supl. 2):3085-97.
4. Nunes MMA, Figueiroa JN, Alves JGB. Excesso de peso, atividade física e hábitos alimentares entre
adolescentes de diferentes classes econômicas em Campina Grande (PB). Rev Assoc Med Bras.
2007;53(2):130-4.
5. Ness AR, Maynard M, Frankel S, Smith GD, Frobisher C, Leary SD, et al. Diet in childhood and adult
cardiovascular and all cause mortality: the boyd orr cohort. Heart. 2005;91(7):894-8.
6. Lohman TG, Roche AF, Martorell R. Anthropometric standardisation reference manual. Champaign, IL:
Human Kinetics Books; 1988.
7. Bastos JP, Araújo CLP, Hallal PC. Prevalence of insufficient physical activity and associated factors in Brazilian
adolescents. J Phys Activity Health. 2008;5(6):777-94.
8. Brasil. Ministério da Saúde. Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Alimentação
saudável para todos: siga os 10 passos. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.

Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016 Adolescência & Saúde
Raphaelli et al. PREVALÊNCIA DE HÁBITOS DE VIDA EM ESCOLARES 23
DE UM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL

9. Carlini EA, Galduroz JCF, Noto AR, Nappo SA. I Levantamento domiciliar sobre drogas psicotrópicas no
Brasil. Estudo envolvendo as 107 maiores cidades do país-2001. São Paulo: CEBRID. Centro Brasileiro de
Informações sobre Drogas Psicotrópicas.Universidade Federal de São Paulo; 2002.
10. Must A, Dallal GE, Dietz WH. Reference data for obesity: 85th and 95th percentiles of body mass index (wt/
ht2) and triceps skinfold thickness. Am J Clin Nutr. 1991;53(4):839-46.
11. Neutzling MB, Araújo CL, Vieira Mde F, Hallal PC, Menezes AM. Frequency of highfat and lowfiber diets
among adolescents. Rev Saude Publica. 2007;41(3):336-42.
12. Coon KA, Goldberg J, Rogers BL, Tucker KL. Relationships between use of television during meals and
children’s food consumption patterns. Pediatrics. 2001;107(1): E7.
13. Hallal PC, Bertoldi AD, Gonçalves H, Victora CG. Prevalence of sedentary lifestyle and associated factors in
adolescents 10 to 12 years of age. Cad Saude Publica. 2006;22(6):1277-87.
14. Horta LR, Horta BL, Pinheiro RT, Morales B, Strey MN. Tabaco, álcool e outras drogas entre adolescentes
em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil: uma perspectiva de gênero. Cad Saude Publica. 2007;3(4):775-83.
15. Vieira PC, Aerts DRGC, Freddo SL, Bittencourt A, Monteiro L. Uso de álcool, tabaco e outras drogas por
adolescentes escolares em município do sul do Brasil. Cad Saude Publica. 2008;24(11):2487-98.
16. Strauch ES, Pinheiro RT, Silva RA, Horta BL. Uso de álcool por adolescentes: estudo de base populacional.
Rev Saude Publica. 2009;43(4):647-55.
17. Silva ARV, Damasceno MMC, Marinho NBP, Almeida LS, Araújo MFM, Almeida PC, et al. Hábitos alimentares
de adolescentes de escolas públicas de Fortaleza, CE, Brasil. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):18-24.
18. Neutzling MB, Araújo CL, Vieira MFA, Hallal PC, Menezes AMB, Victora CG. Intake of fat and fiberrich foods
according to socioeconomic status: the 11year followup of the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study. Cad
Saude Publica. 2010;26(10):1904-11.
19. Rasmussen M, Krølner R, Klepp KI, Lytle L, Brug J, Bere E, et al. Determinants of fruit and vegetable
consumption among children and adolescents: a review of the literature. Part I: quantitative studies. Int J
Behav Nutr Phys Act. 2006;3:22.
20. Barão do Triunfo (RS). Prefeitura Municipal de Barão do Triunfo. Plano Municipal de Educação de Barão do
Triunfo. Barão do Triunfo: Secretaria Municipal de Educação e Cultura; 2009.

Adolescência & Saúde Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 16-23, abr/jun 2016

You might also like