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JOTA vaso O debate entre a Critica Hermenéutica do Direito e AED Desdobramentos desse debate na pratica do direito brasileira ZIEL FERREIRA LOPES WILLIAM GALLE DIETRICH 13/09/2017 18:11 ‘Atualizado em 19/09/2017 a8 15:57 Recentemente fomos brindados com textos discutindo diferentes vis6es tedricas sobre 0 direito brasileiro, mais especificamente: uma critica de Lenio Streck a Andlise Econémica do Direito (AED); e uma resposta de Cristiano Carvalho em defesa da AED, passando ao ataque contra a Critica Hermenéutica do Direito (CHD), escola de pensamento fundada por Streck. Assumindo a perspectiva da CHD, pretendemos contribuir para seu didlogo com outras matrizes. Para tanto, procederemos da seguinte maneira: 1) faremos alguns esclarecimentos sobre as matrizes e seus pressupostos; 2) identificaremos a divergéncia entre CHD e AED; 3) analisaremos os desdobramentos desse debate na prdtica juridica brasileira; e 4) a partir do debate analisado, esbogaremos algumas notas para futuros debates entre diferentes matrizes no direito. 1. Esclarecimentos sobre as matrizes e seus pressupostos Em seu texto na coluna Senso Incomum, Streck criticou 0 uso mistificador de algumas teorias na nossa pratica juridica, como 0 bayesianismo, o explanacionismo, @ AED etc. Em meio a isso tudo, lembrou de problemas enfrentados pela AED por conta de sua maneira cética de abordar 0 fenémeno juridico, nos termos de um nao- cognitivismo moral A principal objegao de Carvalho era que Streck teria feito uma caricatura da AED para poder atacé-la, Essa ideia determinou toda a sua resposta. Carvalho negou que a AED seja uma teoria cética, argumentando que se baseia em rigoroso método cientifico € que tem conexdes com os padrées de objetividade do positivisme. Ainda, posicionou-se afirmando que ele, pessoalmente, se filia a teoria da verdade como correspondéncia. Entdo, voitou esta critica contra a CHD, que, para ele, sempre esteve mais préxima dos Critical Legal Studies e que endossaria uma “teoria discursiva ou retérica da verdade’ Hé mesmo varias divergéncias entre CHD e AED sobre verdade, ciéncia, objetividade € outros temas filoséficos. As referidas escolas trabalham sobre pressupostos completamente distintos, que eventualmente levardo seus adeptos a nao reconhecerem a validade da produgao cientifica uns dos outros. Nao sera um debate facil e isso ndo deve ser contemporizado. Apenas discordamos que o debate seja esse, tal como colocado por Carvalho, Isso porque nao nos parece ter havido descaracterizagao da AED no texto de Streck, havendo sentido para que seja considerada uma teoria moralmente cética, o que faz com que a critica streckiana seja, se nao aceita por seus rivais, ao menos inteligivel a todos, Algm disso, o debate fica prejudicado porque a critica langada por Carvalho descaracteriza claramente os pressupostos da CHD. Nesse caso, sim, pode-se visualizar um “espantalho’, Ou seja, Carvalho acusa Streck de algo que ele mesmo faz, Ao dizer que nao entende porque a AED foi acusada de ser uma teoria cética, Carvalho argumenta que ela busca critérios rigorosos de cientificidade, ressalvado que, se hd ceticismo, é aquele inerente a qualquer atividade cientifica Ao se falar ern ceticismo, certamente nao se reprovava aqui a atitude questionadora e critica que move qualquer cientista, tampouco se imputava 4 AED um ceticismo extremo e global. Streck pontuava logo de inicio que se tratava de “ceticisrno moral’, isto é, a impossibilidade de se dizer a sério que algo é bom/mau, certo/errado, justo/injusto Ora, isso no é novidade entre os criticos da AED, tendo motivado as principais objegées de Dworkin. Também nao € novidade entre os defensores da AED, como o préprio Posner, que reivindica esse ceticisrno moral e chega a desenvolver uma combativa postura anti-tedrica, numa radicalizagao pragmatical!l. Steck chamou atengdio para o ceticisrno da AED na mesma linha do que um de seus corifeus confessa e assume. Ou seja, 0 proprio Posner aceita versées diluidas de nao: cognitivisrno moral. Nesse ponto, Carvalho reconhece: "Nao sei o que Streck quer dizer com ‘ndo-cognitivista rnoral’, talvez algo na linha positivista juridica, o que nao deixa de ser verdade"l2]. Sim, é exatamente nesse sentido, e aqui Carvalho concorda com a critica central de Streck. Isso 0 dispensaria até de escrever sua “critica da critica’. $6 que, na sequéncia, Carvalho comete novo erro, ao complementar: “Mas qualquer ciéncia 0 é". Eis a verdadeira divergéncia, pois essa visdo de Ciéncia é alvo de disputas tedricas profundas, sobretudo na area de Humanas. No Direito, entao, que trabalha diretamente com questées normativas, essa disputa é fundamental Alids, mais recentemente, essa foi a grande briga de Ronald Dworkin com os positivistas. Podemos até discordar, mas jamais negar a historia. ‘Apesar de desconsiderar esta categoria fundamental para a compreensao da critica streckiana, Carvalho reclama da falta de detalhamnento dado por Streck ao consequencialismo da AED, sua diferenga em relacdo ao utilitarismo, a existéncia de diversos tipos de utilitarismo etc. Ora, os pressupostos assumidos pela AED em suas diferentes fases e vertentes estdo longe de ser consensuais, 0 que nao poderia ser abarcado por uma critica de passagem. Nesse ponto, o detalhamento sequer parece necessario para a consisténcia da critica principal feita por Streck. Mesmo que a AED trabalhe com um calculo mais englobante de custos e beneficios, para além de dinheiro, permanece como um nao-cognitivismo moral; continua néo havendo diferenca substancial entre direitos e metas sociais, principio e politica, justiga e alocagao eficiente’I. Mesmo fora da tradi¢do hermenéutica, a maioria dos filésofos morais classificaria a AED nesse espectro do néo-cognitivismo

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