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PRATICA DE ENSINO E ESTAGIO SUPERVISIONADO: PELA SUPERAGAO DA DICOTOMIA TEORIA E PRATICA FLAVIANA GASPAROTTI NUNES’ RESUMO: Neste texto procuramos refletir sobre o papel da pratica de ensino € do estégio supervisionado na formacao do professor de Geografia. A partir da interpretagao de alguns autores, identificamos e caracterizamos as diferentes concepgdes de estégio existentes € seus desdobramentos quanto a efetiva contribuigao para a formagio do professor. Verificamos a presenga da dicotomia teoria e prética nas formas e concepgdes de estégio ¢ discutimos a importancia de pensar 0 estégio ¢ a pratica de ensino nos cursos de formagio de professores de Geografia como atividade teorica que instrumentaliza as ages docentes do ponto de vista técnico e politico. PALAVRAS-CHAVE: pritica de ensino; estégio supervisionado; formagao docente; teoria € pritica. PRACTICE OF TEACHING AND SUPERVISED APPRENTICESHIP: FOR OVERCOME DICOTHOMY THEORY AND PRACTICE ABSTRACT: In this text we tried to contemplate on the paper of the teaching practice and of the apprenticeship supervised in the teacher's of Geography formation. Starting from the interpretation of some authors, we identified and characterized the different existent apprenticeship conceptions and their unfoldings as for the effective contribution in the teacher's formation. We verified the presence of the dichotomy theory and practice in the forms and apprenticeship conceptions and we discussed the importance of thinking the apprenticeship and the teaching practice in the courses of teachers’ of Geography formation as activity theoretical that base the educational actions of the technical and political point of view. KEYWORDS: teaching practice; supervised apprenticeship; educational formation; theory and practice. “Uma coisa é aprender pela imitacao, outra pela pesquisa. Pesquisar no somenie producir Conhecimento, € sobretudo aprender em sentido friativo. E possivel aprender escutando aulas, tomando nota, mas aprende-se de verdade quando se parte para elaboragdo pripria, motivando 0 Surgimento do pesquisador, que __aprende ‘construindo."(Franchi,1988 apud Demo, 2001, p.44) Introdugio ‘A discussio central deste texto envolve questdes hd muito tempo presentes no debate sobre a formagio de professores. No entanto, julgamos pertinente resgati-la incluindo ou enfocando novos e outros elementos tendo em vista 0 contexto em que a mesma emerge recentemente. oo " profa, Adjunta do Curso de Geografia da Universidade Estadual do Oeste do Parand (UNIOESTE) ~ Campus de Marechal Candido Rondon. Doutora em Geografia pela UNESP/Pres, Prudente, E-mail: laviana.nunes @ig.com.be BOLETIM DE GEOGRAFIA. 24(1): 87-94 (2006) 88 Nunes, Flaviana Gasparotti BOLETIM DE GEOGRAFIA E importante lembrar que a discussio sobre o papel da prética de ensino ¢ do estigio supervisionado no interior dos cursos de formagao de professores foi bastante enfocada nos filtimos anos, tendo em vista 0 destaque dado questio nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formacdo de Professores da Educacio Basica, em nivel superior, curso de licenciatura, de graduaco plena. A partir das proposigdes contidas nessas diretrizes, os cursos de licenciatura, ¢ neste caso, também os de Geografia precisaram passar por um processo de reestruturagao curricular. {Uma das principais mudangas propostas nas diretrizes referia-se 4 questiio da pratica de ensino (estigio supervisionado) e das priticas como componentes curriculares. No caso da pritica de ensino sob forma de estigio supervisionado, a Resolugio do Conselho Nacional de Educagao 02/2002, em sintonia com as Diretrizes coloca a necessidade de acréscimo de carga hordria de Estégio Supervisionado (Pritica de Ensino) em forma de Estégio Curricular Supervisionado. Além disso, prevé 400 horas de atividades praticas, enquanto componente curricular, vivenciadas ao longo do curso. No texto referente as Diretrizes Curriculares Nacionais para formagio de Professores, jjustifica-se sua necessidade em fungo das mudangas ocorridas quanto & formacao docente, ‘mais de acordo com a realidade e estrutura atual dos cursos de graduagio. Diante da problemética gerada pelo “aumento” da carga horéria de prética de ensino, verifica-se, na verdade, a necessidade de reflexio sobre a efetiva contribuigdo desta disciplina/atividade na formagio do futuro professor, destacando a questio central da propria relagdo teoria e pritica neste processo. Para refletirmos sobre o tema em questio € necessério, inicialmente, problematizarmos ¢ discutirmos de forma breve a respeito das concepgbes acerca da prética de ensino e mais especificamente do estgio supervisionado. As diferentes concepgies sobre 0 estégio supervisionado e a pratica de ensino Para Pimenta e Lima (2004) € possivel identificar diferentes concepgdes sobre estigio, a saber: a prética como imitagio de modelos ¢ a prética como instrumentalizagao técnica. No primeiro caso, o estégio reduz-se a observagio de professores em aula, imitando seus modelos, sem proceder a uma andlise critica fundamentada teoricamente e legitimada na realidade social em que se processa. Assim, a observaco limita-se a sala de aula, sem andlise do contexto escolar, e espera-se do estagidrio a elaboragio e execucio de “aulas- modelo”. Na opinio das autoras: (...) Esta perspectiva esté ligada a uma concepgao de professor que nio valoriza Sua formagdo intelectual, eduzindo a atvidade docente a um fazer que seré bem- sucedido quanto mais se aproxima dos modelos observados. Por isso gera 0 Conformismo, € conservadora de hibitos, idéias ¢ valores, comportamentos pessoais e sociais legitimados pela cultura institucional dominante. (Pimenta © Lima, 2004, p.36) Outra concepedo identificada pelas autoras refere-se a instrumentalizagdo técnica, ou seja, 0 estigio & identificado como a “hora da prética”, ao “como fazer”, as técnicas a serem empregadas na sala de aula, a0 desenvolvimento de habilidades especificas do manejo de classe, ao preenchimento de fichas de observagio, diagramas, fluxogramas. E evidente que a formacio e a pratica docente exigem 0 dominio de técnicas habilidades, no entanto, tais habilidades, muitas vezes, ndo so suficientes para a resolugdo de problemas que necessitam do conhecimento cientifico ¢ da contextualizagio da atividade docente. “(...) Nessa perspectiva, o profissional fica reduzido ao “pritico”: ndo necesita Pratica de Ensino e Estagio Supervisionado: pela 89 ANO 24(1): 87-94 (2006) superacao da dicotomia teoria e pritica dominar conhecimentos cientificos, mas do somente as rotinas de intervengdo técnica deles derivadas.” (Pimenta e Lima, 2004, p. 37) E possivel identificar a presenga de ambas as perspectivas nos cursos de licenciatura em Geografia, mas a nosso ver, a perspectiva técnica destaca-se na medida em que, na maioria dos casos, as disciplinas que compdem os cursos ndo estabelecem 0s nexos entre Os contetidos que desenvolvem ¢ a realidade na qual o ensino corre’. Claro que devemos resguardar as diferengas ¢ especificidades entre a geografia académica e escolar, no entanto, verifica-se pouco esforgo nos cursos de licenciatura em geografia em promover esta relaco. Esta perspectiva € atualmente reforgada na medida em que se valoriza demasiadamente as novas técnicas ¢ metodologias universais por acreditar no poder destas para resolver as deficiéncias da profissio ¢ do ensino, fortalecendo assim, o mito das técnicas e das metodologias. Para Pimenta e Lima (2004, p. 39): (..) Esse mito esté presente no apenas no anseio dos alunos, mas também entre professores sobretudo em politicas governamentais de formagio que acabam investindo verbas em intermindveis programas de formagao (des)eontinua de professores, partindo do pressuposto de que a falta de conhecimento de técnicas € rmétodos destes € a responsiivel exclusiva pelos resultados do ensino.(..) ‘Além destas concepgées, durante algum tempo vigorou aquela que se restringia a apenas captar desvios e falhas da escola, dos diretores e dos professores, configurando-se num criticismo vazio, na medida em que “...) 05 estagidrios Id iam somente para rotular as escolas ¢ seus profissionais como ‘tradicionais’ e ‘autoritdrios’, entre outras qualificacdes. (...)” (Pimenta e Lima, 2004, p. 40) Diante das concepgdes de estdgio apresentadas, verifica-se a énfase no entendimento da prética como um momento, como a parte do curso em que se “pratica o ensino” a partir do conjunto de teorias aprendidas em outras disciplinas (em outros “momentos” do curso). Desta forma, caracteriza-se a separacio entre teoria e pratica concebendo 0 estigio como “momento da pratica” endo como teoria e pritica. Defendendo a importincia da relagdo teoria e prética na concepgio de estigio, Pimenta e Lima (2004, p. 43) apontam que: [Nesse processo, o papel das teorias ¢ iluminar e oferecer instrumentos e esquemas para andlise investigagao que permitam questionar as préticas insttucionalizadas € {Is ap6es dos sujitos e, a0 mesmo tempo, colocar elas préprias em questionamento, tama vez que 28 teorias S40 explicagdes sempre provisGria da realidade. Na opiniio das autoras: (a) no estiigio dos cursos de formagio de professores, compete possibilitar que os futuros professores compreendam a complexidade das priticas institucionais ¢ das ages af praticadas por scus profissionais como alternativa no preparo para sua insergao profissional Isso $6 pode ser conseguido se 0 estgio for uma preocupagio, um eixo de todas as disciplinas do curso e nao apenas daquelas erroneamente denominadas “priticas”. (Pimenta ¢ Lima, 2004, p. 43-44) ‘As questdes levantadas pelas autoras procuram chamar ateng20 para o fato de que todas as disciplinas de um curso so ao mesmo tempo te6ricas © praticas, pois devem 2 Uma tentativa, pelo menos em sua justificaiva, de diminuir este problema esti colocada nas Diretrizes CCurrigulares Nacionais para Formagdo de Professores da Educagio Bisica (Resolugio CNEJCP 01/2002) a0 propor no artigo 12 que a pritica na maltiz cuticular nfo poder ficar restrita a um espago islado, que a resrina 20 tstigio. desarticulado do restante do curso, estando presente desde 0 inicio do curso € que todos os componcates Cumiculares tenham sua dimensio pritica, A Resolugo CNE/CP 02/2002, inclusive, orienta esta articulagao teoriae pratica delimitando um minimo de carga-horéra para a prtica como componente curricular, A frente retomaremas cesta questo.

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