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A NOTÍCIA E OS ELEMENTOS MULTISSEMIÓTICOS DOS MEIOS MIDIÁTICOS,

AGINDO NA FORMAÇÃO DE LEITORES DO ENSINO FUNDAMENTAL II

Maria Aparecida Barbosa Vianna 1

Introdução

Através da História da Comunicação e do Conhecimento, expostas por


Burke (2003), tem‐se ciência de como a manipulação das forças estatais e
religiosas influenciaram no desenvolvimento do saber e do pensar. A evolução da
educação formal, o investimento no ensino e a capacidade de elevar a sociedade a
um nível cultural satisfatório demorou muito em nosso país. Foram anos de
exploração que delegaram a escola à Igreja, pois os que aqui viviam pouco
interesse tinham em aprender formalmente.
Aos poucos, com a chegada da Família Real, em 1808, a imprensa começou a
exercer um papel importante, trouxe a notícia, divulgou o conhecimento,
transformou literatos em escritores e cronistas, desenvolveu a sede pela leitura,
foram romances, poemas, jornais com rodapés literários, e assim surgiram os
espaços para as publicações dos escritos dos cânones brasileiros.
Mais de um século passou‐se, hoje a realidade vai além dos antigos
folhetins, a comunicação midiática domina os mercados globalizados, a rede de
Internet chega aos lares trazendo as notícias simultâneas aos acontecimentos, ou
seja, a informação está em todos os lugares, pode ser acessada desde um celular,
até nos mais sofisticados aparelhos. Tudo isso graças ao barateamento das
Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) que proporcionam
multiletramentos e traçam uma ponte com a pós‐modernidade.
Porém, nem tudo pode ser tão simples assim, porque a rede nos oferece
informações excessivas, fragmentadas, com uma linguagem diferente, adaptada ao
tempo, ao espaço e à condição do leitor cibernético. O conteúdo jornalístico virtual

1 Professora no Instituto Municipal de Educação Superior São Manuel (IMESSM).

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apresenta‐se em links, que aumentam o conhecimento ou podem também reduzi‐
lo ao trazê‐lo simplificado, quase sem conteúdo, com informações básicas, trocadas
automaticamente nas páginas, como se perdessem a importância, em minutos ou
horas.

1. A notícia e os veículos de comunicação do século XXI

A velocidade/fragmentação na pós‐modernidade e morosidade/completude


nas atividades escolares da sociedade moderna muitas vezes podem ser
trabalhadas com gêneros textuais mais acessíveis aos ambientes escolares,
principalmente àqueles cuja tecnologia ainda não opera integralmente nas salas de
aula.
Os estudos sobre gêneros, o efeito‐leitor e a autoria, trazem um
aprofundamento no conhecimento em áreas tão distintas, mas que se imbricam
quando pensamos no processo de produção e de interlocução dos mais diversos
discursos: da mídia, da moda, do dia a dia, das intervenções urbanas, das
expressões pessoais, da literatura canônica ou científica, entre outros.
Propomos, neste artigo, expormos nosso trabalho com os gêneros do
discurso em nossas salas de aulas. Como foco de abordagem teórica trabalhamos
com “As Notícias em Diferentes Mídias”, de Silmara Dela Silva (2007), em que faz
uma síntese sobre as principais características da notícia na imprensa, no rádio, na
televisão e na internet; também referimo‐nos ao texto de Orlandi (1987) que expõe
a visão sobre análise do discurso de autores como Pêcheux, Maingueneau,
Benveniste, Dubois, Guespin, J. S. Grumbach, Reboul, Marandin, para que possamos
refletir como trabalhar com os alunos a relação marcas formais e propriedades
discursivas, além da presença dos elementos multissemióticos na caracterização
de um gênero.
Atualmente vivemos em uma nova época, talvez ainda complexa para
muitos por se sentirem perdidos com a rapidez das informações, a quebra de
costumes e de preconceitos que não mais podem persistir no mundo
contemporâneo, como comenta Oliveira (2006, p. 4)

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As mediações tecnológicas que permeiam o cotidiano [...] definem
novas formas de percepção do tempo e do espaço [...] Derivam daí a
volatilidade, a efemeridade, a descartabilidade e a instantaneidade
do cotidiano contemporâneo. É a primazia do presente: o futuro é
algo desinteressante, distante, indefinível; o passado apresenta-se
fragmentado, embaralhado, citação de vivências difusas e
perpetuadas pelos meios de comunicação de massa. [...]

Em meio a esse turbilhão de informações, temos a morosidade do ensino


público, distante não apenas materialmente, mas também em conceitos ou
poderíamos ousar dizer “pré‐conceitos” a tudo que pode surgir de novo, ao não
canônico ou erudito, visto por muitos como “algo que não deve ser trabalhado em
um ambiente escolar” (é o caso do parkour, das pichações, dos graffitis e das
músicas de manifestações culturais como o RAP, o Hip‐hop, o break etc.). Por isso
há um distanciamento da metodologia aplicada em sala de aula à percepção das
novidades que ocorrem além dos muros escolares, ou seja, se o professor de
educação física trabalha com algumas dessas modalidades, expõe seus alunos a
situações perigosas; se for o docente de língua portuguesa que queira trabalhar um
RAP, estará ferindo a moral dos discentes com palavras de baixo calão.
Porém a situação mostra‐se crítica, a rapidez das informações perde‐se em
livros didáticos pouco atualizados, a velocidade do mundo caminha lentamente
pelos corredores e bancos escolares, a transitoriedade das informações é filtrada
em um estilo conservador e doutrinário, a fragmentação do ensino não conduz ao
verdadeiro trabalho interdisciplinar (muito comentado, porém pouco trabalhado),
há uma mistura de atitudes e estratégias que conduzem ao desconhecido, e quase
nada se modifica, permanece tudo inalterado, sem novidades.
Sendo assim, nossos alunos encontram‐se engessados em um sistema de
conhecimento medíocre, aprendem a falar corretamente ou pelo menos tentam. No
entanto, ainda leem e escrevem com grandes falhas, já que não têm suas realidades
trabalhadas no ambiente escolar e pouco se interessam pela “assimilação” de uma
fala culta, de um pensamento conservador que difere de sua realidade.
Cabe ao professor oferecer‐lhes o conhecimento de forma interessante, com
o exercício do lúdico, observando seus costumes, as suas realidade, abordando‐as,
pesquisando sobre seus anseios, seus futuros e seus interesses. De posse de todas

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as informações, as aulas precisam adaptar‐se ao mundo dos alunos, “quebrar” os
muros da cultura erudita e transformar‐se em uma troca, onde o aluno aprende,
porém ensina, encontrando a harmonia necessária para juntar saberes e traçar
novos caminhos.

2. O trabalho com os Gêneros Midiáticos

Durante os últimos anos as TICs chegaram às escolas, muitos rótulos


caíram, o processo de desenvolvimento e de trabalho em sala de aula alterou‐se e
transformou o pedagógico escolar. Os textos de Lemos (1997) e Silva (1998)
indicam que nós, educadores, fomos nos identificando com o processo de interação
de nossas práticas didáticas relacionadas ao uso das tecnologias: 1) levávamos a
TV e o vídeo cassete para trabalharmos filmes com nossos alunos; 2) aos poucos
usávamos aparelhos de som em atividades em que tínhamos as músicas como
textos de apoio; 3) depois vieram os filmes em DVD, com melhor qualidade de
imagem e som; 4) começamos a usar o retroprojetor, que com a facilidade de
captação de imagens em transparências, através do scanner portátil, deixaram
nossas aulas mais interessantes; 5) hoje podemos contar com o datashow que traz
todas as modalidades – multimeios ‐ anteriormente apresentadas (som, imagem,
fragmentos de textos, livros escaneados, arquivos capturados da internet etc.).
Apesar de todas essas mudanças, ainda precisamos encontrar meios de
aproximar os estudantes das tecnologias do impresso e do livro, das revistas e dos
jornais, quer seja pela sugestão de leituras, ou ao transformarmos nossas aulas em
adaptações de obras em novas linguagens como músicas, teatros, ou ainda tirar de
seus cotidianos elementos que possam ser pesquisados ou que estejam
perpetuados nas estantes das bibliotecas, que podem estar em trabalhos com a
intertextualidade, ou a temática de um filme, ou a montagem de uma telenovela, o
resgate de uma tradição etc.
Destacaremos aqui como criar uma relação de ensino/aprendizagem, para
que os alunos as séries finais, mais especificamente do 7º ano (o gênero jornal
impresso), 8º ano (gênero da publicidade na mídia) e 9º ano (gênero dos artigos)
possam adquirir competência para exercer a autoria de gêneros relacionados à

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notícia impressa, no caso em jornais e revistas, de acordo com as condições de
produção dos discursos midiáticos, de seus contextos sócio‐histórico e ideológico,
de que origina o co‐texto, o contexto textual e o contexto de situação.
Proporcionaremos um recorte dentro de uma determinada tipologia,
direcionando nossas análises para os textos e tópicos selecionados, de acordo com
cada turma específica, cujo objetivo é saber como os grupos se relacionam com as
produções da notícia e que efeitos produzem nesses leitores após aprenderem os
gêneros propostos, analisarem os discursos que cada um deles traz e se tornarem
aptos a produzir seus próprios discursos, ou então a “ler” esses discursos com
possibilidades de definir os processos ideológicos e as mensagens subliminares.
Para o 7º ano, orientamos trabalhar a estrutura do gênero jornalístico, a
partir de um jornal diário de circulação local e de fácil acesso aos alunos, sem a
preocupação de estabelecer datas de publicação, despertando‐lhes a atenção para
a presença de gêneros híbridos que se imbricam na formação do meio de
comunicação, para criar um todo que é a publicação em si, que se apresenta de
acordo com as seguintes etapas de análises: 1) a primeira página de um jornal
diário constitui um hipertexto – manchetes, leads, tamanhos e tipos das letras, as
chamadas, a dobra do jornal (indício de destaque das notícias principais),
indicativos de datas, edições, local de publicação; 2) a divisão do jornal em
cadernos: esporte, cultura, classificados, economia, regional etc.; 3) a presença do
não‐verbal: fotos, ilustrações, gráficos, tabelas com índices, mapas meteorológicos,
logotipos, anúncios publicitários, quadrinhos, charges, palavras cruzadas, a
diagramação gráfica que constitui e personaliza o estilo daquele meio de
comunicação; 4) identificação dos diversos tipos textuais no meio estudado: a
notícia (narração, relatos) que se estrutura na “pirâmide invertida”, em que os
dados principais são introduzidos nos primeiros parágrafos, de acordo com os
elementos da narrativa e se desdobram na notícia em um aprofundamento do
tema; a presença de entrevistas (sequências diaologais), dos depoimentos, as
resenhas de filmes, textos científicos, artigos de críticos etc., distribuídos nas
páginas dos jornais; 5) A presença da temporalidade nos textos impressos.
Como desdobramento, propostas de aprendizagem a partir de cada gênero
visto, de suas particularidades, produções textuais de alguns deles, de identificação

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das partes estudadas, cartazes demonstrativos fixados no ambiente escolar. A
partir desse contato com o meio, os alunos produzirão seus próprios boletins
informativos, com narrativas de fatos de seus cotidianos, ilustrações dos que
tenham essa habilidade, farão entrevistas sobre pautas levantadas no meio escolar,
e de acordo com suas competências terão capacidade de confeccionar um jornal
mural, para que possa ser fixado nem áreas de circulação geral entre professores,
estudantes, funcionários e gestores.
Especificamente com o 8º ano, o foco de análise parte para o discurso
publicitário inserido nas mídias, com a predominância do verbal e do não verbal,
publicados principalmente nas revistas de grande circulação (Isto é, Veja, Caras,
entre outras) em que cada anúncio tem como destino um púbico‐alvo específico,
quer seja infantil, adulto (feminino ou masculino) e de acordo com a renda de seus
consumidores.
Os apelos e a criatividade cativam os leitores que se submetem às
mensagens subliminares, sem saberem que estão sujeitos à manipulação
ideológica. Focaremos então, as análises das capas das revistas e das propagandas
nelas inseridas, com abordagens nas seguintes questões: 1) as cores
predominantes, com análises de seus significados e simbologias dentro do
contexto histórico, cultural e artístico, inclusive a intertextualidade com obras de
grandes artistas; 2) a gestualidade dos personagens; 3) as formas: linhas retas
atitudes concretas, objetivas; linhas curvas, sensualidade, emoção; 4) analisar o
efeito visual dos textos em seus leitores e consumidores; 5) o uso nos verbos no
imperativo; 6) as mensagens e a ideologia implícita nos discursos.
Os alunos poderão pesquisar em outros veículos de comunicação a presença
dos anúncios publicitários, em vários contextos de produção e trazer à sala de aula
para que sejam feitas análises e tentar produzir suas próprias propagandas
destinadas à seção de classificados do jornal mural escolar.
O 9º ano requer mais cautela com o processo de aprendizagem da notícia,
pois detém maior potencial para que os alunos sejam críticos a muitos aspectos
inseridos na mídia Essa criticidade vem das discussões de anos anteriores,
funcionando como suporte com o oferecimento de gêneros primários encontrados
nos meios de comunicação (como a carta ao leitor ou artigo de opinião) e que têm

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agora, a possibilidade de se tornarem gêneros secundários (teoria bakhtiniana),
dada capacidade de trabalhar com elementos aquém das marcas formais: a) as
sequências descritivas, narrativas e dialogais inseridas nos debates sobre os temas;
b) os aspectos linguísticos, como as conjunções, os advérbios, os pronomes de
tratamento; c) a possibilidade de reflexão sobre o assunto e; d) a condição de
autoria do aluno.
Considerações finais

Essa potencialidade provém de experiências prévias, do conhecimento dos


conteúdos temáticos trabalhados, da forma ou construção composicional e dos
estilos de cada um para desenvolver os gêneros constituintes da notícia, da
dinâmica dos processos discursivos, não apenas com base apenas na forma, mas na
condição de exercer a função‐autor com domínio das tipologias e das situações de
uso, possíveis de serem transformadas de acordo com seus repertórios. Ler e
interpretar um texto, escrever, opinar, expor, argumentar, são funções relativas
aos alunos desse ano.
Cabe ao professor incentivar, tirar dúvidas e proporcionar os ajustes
necessários na intenção de que a produção textual, dentro de uma prática social,
tenha êxito, faça parte do contexto escolar e do próprio aluno ao apresentar‐lhe um
gênero rotineiro, mas caso não seja bem preparado para recebê‐lo, não saiba agir
com relação ao efeito‐leitor e ao processo de autoria, cairá em simples reprodução,
e não é essa a nossa intenção, pois queremos alunos críticos, capazes de exercerem
suas funções sociais com êxito, de produzirem a notícia, saberem identificá‐las, a
partir do processo de funcionamento dos gêneros propostos, dentro dos processos
ideológicos e socioculturais nos quais se encontram inserem, lhes possibilitando
criar, inovar e transformar os mecanismos educacionais.
Na verdade, o educador precisa inovar, no entanto isso depende de estudos,
de adaptar‐se à realidade dos alunos, trocar experiências, preparar suas aulas para
que cativem seus educandos, citar obras, traçar pontes entre os diversos
conhecimentos, dar profundidade ao saber e ao ensinar. Só assim resgatará e fará
com que o conhecimento do jovem atual não fique na superficialidade, mas sim
obtenha raízes nas páginas dos jornais e revistas, ou nas prateleiras das

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bibliotecas. Citamos, ainda, a necessidade de estar preparado para receber críticas
sociais, mas mostrar‐se inovador e arrojado, apesar das consequências, até que seu
trabalho apresente respostas positivas.

Referências
BAKHTIN, M. M. Os gêneros do discurso. In: _____. A estética da criação verbal. São
Paulo: Martins Fontes, 2003. Trad. Paulo Bezerra.
BRAGA, Denise. B. e BUZATO, Marcelo E. K. Multiletramentos, linguagens e mídias.
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http://ggte.unicamp.br/redefor3/cursos/aplic/index.php?&cod_curso=177.
Último acesso em 06/06/2011.
BURKE, Peter. Uma história social do conhecimento: de Gutenberg a Diderot. Rio de
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DELA SILVA, Silmara. A notícia em diferentes mídias. Manuscrito preparado para o
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ORLANDI, E. P. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso. 2.ª ed..
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SILVA, M. Indicadores de Interatividade para o professor presencial e on‐line.
Revista Diálogo Educacional. Curitiba: PUC‐PR, v. 4, n.12, p.93‐109, maio/ago.
2004.

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