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A questão do Positivismo

Fábio Amazonas Massulo1

RESUMO

O positivismo como filosofia apresenta várias nuances de controle do


comportamento humano através da coerção, precursor da sociologia, como a primeira
forma de pensamento social, define precisamente o objeto a estabelecer conceitos
para uma metodologia de investigação científica ao definir a especialidade do estudo.
O positivismo derivou do cientificismo, crença no poder exclusivo e absoluto da
razão humana em conhecer a realidade e traduzi-la sob a forma de leis naturais.
Essas leis seriam à base da regulamentação da vida do homem, da natureza e do
próprio universo.
Este ensaio traz as idéias positivistas e suas funções sociais, a História, a
Política, a Religião, a Educação, são abordagens que mostram o funcionamento
destas áreas do conhecimento e instituições que Althusser chama de Aparelhos
Ideológicos do Estado. O Brasil define-se também como uma nação positivista.

PALAVRAS – CHAVE - Positivismo, função social, educação, humanidade, método.

1
. Mestre em Educação pela Faculdade de Educação - Universidade Federal do Amazonas. Bacharel e Licenciado
em Ciências Sociais pelo Instituto de Ciências Humanas e Letras – Universidade Federal do Amazonas - UFAM
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Para entendermos o pensamento filosófico-sociológico positivista, faremos


uma pequena incursão histórica, mais precisamente, ao século XVIII. Na essência
filosófica do Iluminismo encontra-se Condorcet um enciclopedista, talvez o primeiro
autor que se pode relacionar como o pai do positivismo (Lowy, 1986:33-50).
Condorcet teoriza a sociedade, de maneira clara, estabelecendo paralelo com a
matemática: numa matemática social, onde todos os fenômenos seriam estudados
dentro da rigorosidade numérica, onde através das probabilidades das ciências físicas
e matemáticas poderia existir uma real ciência objetivando o esclarecimento dos fatos
sociais.
Condorcet, segundo Lowy (op.cit.), tem um pensamento revolucionário
percebendo-se o caráter do socialismo utópico ao considerar que a sociedade é
submetida aos preconceitos e aos interesses das classes dos poderosos, dos
dominantes. Condorcet, ao considerar a teoria da dominação estamental, onde o clero
e a nobreza feudal estabeleciam a relação vertical de poder e que tinham que ser
rompidas e eliminados do conhecimento social, as doutrinas teológicas, os
argumentos da autoridade papal, enfim, os dogmas que determinavam o monopólio
do conhecimento na sociedade da época.
Condorcet considerava que o desenvolvimento das ciências físicas e
matemáticas não perturbava as paixões e interesses, no entanto, esqueceu que as
relações de dominação e poder mexem necessariamente com os membros da
sociedade, onde o egoísmo é a fonte dos males sociais, estabelecendo as
desigualdades.
A matemática social de Condorcet é posteriormente pensada por Saint-
Simon, outro precursor, que chama o futuro positivismo de fisiologia social,
enveredando por sua vez pelo modelo biológico, criticando o feudalismo; e claro, ao
clero e a nobreza, chamando-os de parasitas, isto é, nada produziam, não pagavam
taxas e impostos, viviam da exploração dos servos.
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Nesta relação estamental e social, havia os que rezavam; os membros do


clero; os que guerreavam, a nobreza e os que trabalhavam, os servos, Saint-Simon
tinha um projeto para a nova sociedade, não uma sociedade igual, porém, uma
sociedade em que aumentaria a produtividade a um grau máximo de
desenvolvimento.
Saint-Simon foi um socialista utópico, trazia no interior de sua teoria, a crítica
ao sistema social, propugnava mudanças nas forças produtivas, percebendo que a
instalação das fábricas e indústrias iriam estabelecer uma nova relação de produção,
teoriza que, a igreja deverá ser substituída pela fábrica.
O positivismo, no principio do século XIX, expressa um aspecto utópico-crítico,
como herança dos precursores, Condorcet e Saint-Simon; este pensamento teoriza
que a sociedade irá modificar-se de acordo com Comte, ao fazer analogias às
ciências naturais, passando a dominar a sociedade como doutrina e como método.
Para Comte a ciência centrada no empirismo, contrastando com o racionalismo,
determinando assim o pensamento político e social na experiência, reduzindo a
autoridade da razão.
Comte contesta o pensamento, principalmente de Saint-Simon, de quem foi
discípulo e sobrinho, sobre sua teoria a qual chama de pensamento negativo promove
demasiadas críticas, sobre a sociedade do seu tempo, Comte a chama de
obscurantista e em desordem, em negativo, prevê que o pensamento tem que ser
positivo, devendo acabar com toda a negatividade e críticas, tirando a dimensão
revolucionária desse pensamento (Lowy, 2000, 38:39), Comte parte da idéia, que há
necessidade de manter a estabilidade, para defesa da ordem real, da ordem social,
para ele, o positiva, termo que “designa o real frente ao quimérico, o útil frente ao
inútil, o certo frente ao incerto, o preciso frente ao vago, o orgânico frente ao
inorgânico, o simpático frente à intolerância e o relativo frente ao absoluto” (Comte
apud Ribeiro, 2001) afirmando ainda que a única coisa absoluta é o relativo, divide a
estrutura social em, estática e dinâmica social.
Nesta perspectiva, a tradição e o conservadorismo seriam solidários ao
organismo social, para a manutenção da ordem, a dinâmica, um conjunto de
particularidades que iriam estabelecer o progresso da humanidade, a convicção
positivista é que com a ordem e o progresso combinados, os fundamentos sociais
fiquem consolidados.
A revolução do pensamento em Comte, passa por etapas e formas pelas quais
a tese da unidade humana é afirmada, explicada e justificada. Nesta etapa,
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constituem-se a descrição e interpretação do momento histórico, vivido pela


sociedade européia no princípio do século XVIII, caracterizada pelos poderes
teológico e militar, sob domínio do feudalismo, poderes em declínio, como também a
teologia no bojo do catolicismo retrogrado e o militar da nobreza falida.
O pensamento teológico no século XVIII dá predominância às atividades
militares em declínio e em transição para um novo tipo de sociedade, a sociedade
capitalista. Um outro tipo de sociedade em vias de nascer. Nasce a sociedade
científica, morre a teológica: nasce a burguesia capitalista (empreendedores, diretores
de fábricas, banqueiros, comerciantes, autônomos, etc.) morre a nobreza militar. Um
tipo de sociedade substitui a outra, morre o feudalismo, nasce o capitalismo.
Os cientistas substituem os sacerdotes e teólogos como categoria social que
dá base a nova ordem social. A partir do momento em que os homens pensam
cientificamente, a atividade principal da coletividade deixa de ser a guerra de homens
contra homens, para se transformar na luta de homens contra a natureza, ou seja, na
exploração irracional dos recursos naturais, assim teorizou Comte.
O pensamento anterior ao positivismo foi o liberalismo, que consistia na
ideologia burguesa pré-revolucionário, que proclamava valores universais, com
finalidade aliciatório das camadas populares para seu projeto de ruptura com as
classes dominantes e determinantes do pacto medieval, o desenvolvimento moral,
cultural, econômico e político, seriam alcançados pelo indivíduo livremente através do
espírito, ao morrer a sociedade feudal teológica que dava o fundamento da moral e
nascer a sociedade industrial que sai em busca do fundamento moral.
O liberalismo é entusiasta da igualdade, propositor da democracia, desafiador
da economia, plenamente convencido da potencialidade revolucionária de todas as
classes sociais. Com esta ideologia, o liberalismo francês conquistou a adesão das
classes proletárias (Sans-Cullotes) ao seu projeto de rompimento com a estrutura do
Antigo Regime através da Revolução Francesa de 1789.
O positivismo ao contrário, é a ideologia burguesa pós-revolucionária, era
necessário demonstrar ideologicamente que as camadas populares eram inaptas e
despreparadas para o exercício do poder. O positivismo torna-se ideologia
dominadora, marcadamente, antipopular, antidemocrática, ultraconservadora e anti-
revolucionária. O positivismo foi à consciência burguesa do século XIX, consolidando-
se como doutrina no século XX, justificando pela ciência as supostas incapacidades
dos segmentos populares; também elevando a política ao nível de ciência.
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Neste corolário, com a intensificação do pensamento positivo, “Comte se volta


para o estudo da humanidade como o Grande Ser (...) o motor imediato de cada
existência individual ou coletiva que inspira a fórmula máxima do positivismo: O Amor
por princípios, e a Ordem por base; o Progresso por fim” (Ribeiro, 2001), nesta
premissa, o amor estabelece a ordem e estimula o progresso; a ordem reafirma o
amor que produz o progresso; o progresso impõe a ordem e volta para o amor,
produzindo assim a dialética positivista.
O altruísmo comteano proporciona a criação de sua religião, que chama de
religião da humanidade, que teria como doutrina consolidar, aperfeiçoar e motivar a
base da família, da linguagem, da propriedade, definindo assim a missão do
positivismo. Nesta perspectiva a religião positiva, com base na experiência, pretendia
estabelecer o esmero da moral e prática intelectual da humanidade. Sob a égide do
passado, presente e futuro, disciplinará a trindade da humanidade, que trabalhou, que
trabalha e que trabalhará.
O poder na religião positiva será exercido pelos sacerdotes, que não serão
teólogos, sim sociólogos, estes, serão interpretes e doutrinadores; e pelo patriciado,
estes detêm o poder da produção através da indústria e dos distribuidores de
produtos como os banqueiros, comerciantes entre outras atividades rendosas, a
hierarquia se completaria com o proletariado colocado em uma escala inferior,
incompetente para discutir e decidir questões sociais, no entanto, indispensável ao
desenvolvimento para a solidificação do positivismo.
Comte propunha-se a transformar a sociedade através das doutrinas da
filosofia positiva subordinando o espírito a qual deveria passar por três estágios,
chamaria de lei dos três estados, assim preconizados.
Estado teológico ou fictício: provisório e preparatório, explica os fatos por
semelhanças e comparações à nossa, no fetichismo o espírito é compartilhado tanto
pelo homem como pelos demais seres. Neste estado há evolução do fetichismo ao
politeísmo que é a fonte dos fenômenos humanos, quando vários deuses atuam na
natureza e o monoteísmo a limitação da razão pela imaginação, há um único Deus
que é o senhor do universo. Estado metafísico: substitui os deuses por princípios
abstratos atribuídos à natureza. Finalmente o Estado Positivo quando se vai a busca
das coisas verdadeiras, a noção de causa, o desenvolvimento de cada indivíduo.
Podemos entender a educação, propositora de uma referência científica,
empirista e racionalista como fundamento do ensinar e aprender. O positivismo a
define como responsabilidade proeminente do Estado, sendo o sistema educacional
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concebido para a homogeneidade moral e melhor convivência em sociedade como


um fato social institucionalizado.
O positivismo acentua um entusiasmo pela educação, quando consiste em
determinar, através do sistema educativo, o desenvolvimento e funcionamento de
todas as estruturas morais, jurídicas e culturais da sociedade. É claro que algumas
destas teses sofrem desvios de padrões, mas, desde a propagação das premissas
que diz Durkheim (1967), “A educação consiste numa socialização metódica das
novas gerações” as sociedades impregnadas pelo positivismo, tiveram na educação a
identidade básica da vida social coletiva, por este prisma, pode-se entender que a
educação é a integração e o entendimento entre os indivíduos que dar-se-ão com as
semelhanças de comportamentos e hábitos, “a educação satisfaz, antes de tudo, ás
necessidades sociais”. Durkheim acreditava que a educação é o veículo para chegar
a essas semelhanças.
A república provocou transformações sociais no Brasil, embora não houvesse
logrado grandes avanços, serviram de instrumentos para firmar as idéias positivistas
que seria o veículo para a inculcação ideológica e adestramento da sociedade,
estabelecendo a disciplina como parte culminante na relação de poder de mando.
Na perspectiva positivista significa produzir corpos obedientes, corpos
dóceis, pois a sociedade positivista é a sociedade da competição, do controle, do
medo para produzir obediência, esta adequa à ordem; e a ordem leva ao progresso.
Eis a premissa básica do positivismo incorporado pelo Brasil: Ordem e Progresso, o
amor por principio, a ordem por base; o progresso por fim sem, no entanto, refletir
sobre quais bases da ordem e do progresso se deve estabelecer e priorizar as
necessidades.
O escritor francês e também Tenente-Coronel Benjamin Constant,
embasado no positivismo francês, foi pólo de disseminação deste pensamento
doutrinário no Brasil, influenciando o Exército brasileiro, estabelecendo uma
conotação militar à sociedade, principalmente a elite e à classe média, a Escola Militar
foi utilizada como instrumento de mobilidade social mentor intelectual da Proclamação
da República.
Getulio Dorneles Vargas, foi reformador em todos o sentido, aliado de
Francisco Campos vice-presidente do Partido Integralista que tinha tendência nazi-
fascista e mantinham práticas paramilitares e controlavam policialescamente a vida
das pessoas, teve também como correligionário Julio de Castilhos, positivista
riograndense que muito influenciou sua atuação administrativa. O Brasil é controlado
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pela burguesia através da ética positivista constituída pela ideologia republicana,


influenciando todas as atividades econômicas, políticas, sociais e culturais mantendo
a homogeneidade e consciência de sua classe, mantendo o controle político e
institucional, social e econômica sobre as demais classes.
Para o positivismo, a teoria é inacessível, não é possível conhecer as causas
dos fenômenos sociais, a preocupação deve recair sobre a regularidade dos fatos.
Não pergunta o por que, sim, como os fenômenos acontecem. O fato em si é a
realidade; o método positivista é indutivo como o mais adequado para se conhecer o
objeto de estudo através da observação e da experimentação. O empirismo, doutrina
segundo a qual todo conhecimento tem sua origem no domínio sensorial, nos
conhecimentos práticos, experiência de sensação e reflexão, onde se apreende
impressões adquiridas do mundo exterior e na reflexão, ato pelo qual o espírito
conhece suas próprias operações.
Ao desenvolver uma pesquisa pelo método positivista, o sujeito põe-se distante
do seu objeto de estudo, para poder comprovar se o seu resultado tem validade
cientifica, durante todo o processo será necessário verificar:
• A estética como importante ferramenta para pesquisa quantitativa;
• O positivista é de aparência, não busca explicar a regularidade dos
fenômenos, sua preocupação é criar leis ou generalizações;
• Filiação histórica como objetividade e relação dos sinais imagens e
sentimentos;
• Funcionalismo para análise social;
• Utiliza-se do mecanismo posterior em detrimento do anterior;
• Estabelece a formulação geral de um fato social particular.
Na metodologia da pesquisa com enfoque positivista, serão apresentados
dados quantitativos, para Chizzotti na pesquisa positivista “prevêem a mensuração de
variáveis preestabelecidas, procurando verificar e explicar sua influência sobre outras
variáveis, mediante a análise da freqüência de incidência e de correlações
estatísticas. O pesquisador descreve, explica e prediz” (2001).
Para o positivismo não interessa a mensuração das essências, apenas a
abordagem descritiva e quantificada dos fenômenos sociais.
O enfoque positivista contempla o método nas pesquisas em todas as áreas
dos conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais.
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ALTHUSSER, Louis. Ideologia y Aparatos Ideológicos de Estado. Buenos Aires:


Nueva Vision, 1974.
CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 5.ed.- São Paulo:
Cortez, 2001.
COMTE, Auguste. Discurso sobre o método positivo. São Paulo: Martins Fontes,
1990.
DURKHEIM, Émile. Educação e Sociologia. 7.ed.-São Paulo: Melhoramentos, l967.
LALLEMENT, Michel. História das idéias sociológicas: das origens a Max Weber.
Petropó-lis: Vozes, 2003.
LOWY, Michael. Ideologias e ciência social: Elementos para uma análise marxista.
14ª ed. São Paulo, Cortez, 2000.
RIBEIRO, João. O que é Positivismo. São Paulo: Brasiliense, 2001 (Coleção
primeiros passos; 72)
TRIVIÑOS, Augusto N.S. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais. São Paulo:
Atlas, 1992.

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