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INTRODUÇÃO

À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha

FEDERICO GONZALEZ

Com a colaboração de
Francisco Ariza

e la de Fernando Trejos e José Manuel Río


L. Herrera, Mª. V. Espín e Mª. A. Díaz

Tradução em português: Igor Silva


INTRODUÇÃO À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha
Federico González
e colaboradores

ÍNDICE DE CONTEÚDOS

PREFÁCIO
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Módulo I

1 A TRADIÇÃO HERMÉTICA 45 CABALA: O Nome divino é inefável.


2 O EXOTÉRICO E O ESOTÉRICO 46 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO: As 4 fases.
3 A VIA SIMBÓLICA 47 O SÍMBOLO DO CORAÇÃO
4 ARITMOSOFIA 48 MOISÉS
5 O CÍRCULO 49 HERMES
6 CABALA: A Árvore da Vida Sefirótica. 50 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
7 MÚSICA 51 PITÁGORAS
8 ASTRONOMIA-ASTROLOGIA 52 O SIMBOLISMO DO TEMPLO
9 CABALA: As dez sefiroth. 53 O SÍMBOLO DO LABIRINTO
10 ALQUIMIA 54 PLATÃO
11 CABALA: Divis ão da Árvore. 55 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
12 A TRÍADA 56 ARTES E ARTESANATOS
13 MITOLOGIA 57 ÍSIS
14 NOTA: Conceitos inabituais. 58 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO: Com Atsiluth.
15 HÉRACLES-HÉRCULES 59 BIOGRAFIAS
16 CABALA: O descenso das energias. 60 AS MUSAS
17 ETIMOLOGICAS 61 MAGIA: A vida como magia e rito.
18 CABALA: Analogias com as sefiroth. 62 TROPEÇOS E DIFICULDADES
19 EXERCÍCIO PRÁTICO: Sobre a Árvore Sefirótica. 63 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO: Com Beriyah.
20 ASTROLOGIA: Os sete planetas. 64 DANÇA
21 ALQUIMIA: Os quatro elementos. 65 A NAVE
22 CABALA: Os quatro planos da Árvore. 66 AS COLUNAS E A PORTA
23 A INICIAÇÃO 67 CABALA: A Árvore, As colunas, A porta.
24 A ANALOGIA 68 EXERCÍCIO RESP.: Com Yetsirah e Asiyah.
25 ALQUIMIA: Guia da Ciência Sagrada. 69 MITOLOGIA CABALÍSTICA
26 A ÁRVORE DA VIDA: As tríades sefiróticas. 70 A MONTANHA E A CAVERNA
27 ASTROLOGIA: Zodíaco e elementos. 71 O SÍMBOLO DA PEDRA
28 FILOSOFIA 72 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
29 CABALA: Os quatro mundos ou planos . 73 ARQUITETURA
30 ALQUIMIA: A Arte alqu ímica. 74 A HIERARQUIA
31 ARITMOSOFIA E GEOMETRIA 75 ARTES MARCIAIS
32 A RODA E A CRUZ 76 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
33 CONSTRUÇÃO DA ÁRVORE 77 CIÊNCIA
34 A HORIZONTAL E A VERTICAL 78 O ALTAR
35 OS TRÊS GUNAS 79 OS SONHOS
36 A RESPIRAÇÃO: Aspir-expir. 80 REALIDADE OU FICÇÃO?
37 ASTROLOGIA: Os signos zodiacais. 81 MITOLOGIA: Os deuses e os homens.
38 RESPIRAÇÃO: OS CICLOS 82 ASTROLOGIA: Domicílio, exílio, exaltação.
39 ASTROLOGIA: Fechas de los signos. 83 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
40 ALQUIMIA: O Atanor. Alquimia e iniciação. 84 CABALA: Macroprosopos e Microprosopos
41 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO: Sincronizar. 85 AS PEREGRINAÇÕES
42 O CICLO LUNAR E A RESPIRAÇÃO 86 ASTROLOGIA: Aspectos planetários
43 CABALA: Silêncio, estudo, meditação. 87 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
44 LITERATURA 88 O RITO

Módulo II

1 RECORDAÇÃO 55 O SIMBOLISMO DA ESPADA


2 NOTA: I Ching ou "Livro das Mutações". 56 TARÔ: CARTA Nº VIIII
3 CABALA: O En Sof. 57 O JANTAR
4 O NÍVEL E O PRUMO 58 A LIRA DE APOLO E A FLAUTA DE ORFEU
5 IMAGENES E SÍMBOLOS 59 NOTA: Momentos de "calmaria".
6 O SÍMBOLO DA ESCADA 60 TARÔ: CARTA Nº X
7 O SÍMBOLO DA ESVÁSTICA 61 OS QUADRADOS MÁGICOS
8 TARÔ 62 EXERCÍCIO DE SOM: Mantra letra A.
9 CABALA: As 22 letras do alfabeto hebraico 63 TARÔ: CARTA Nº XI
10 ALGUNS EXERCÍCIOS PRÁTICOS 64 A LUZ
11 SIMBOLISMO VEGETAL I 65 ALIMENTAÇÃO E SAÚDE
12 SIMBOLISMO VEGETAL II 66 NOTA: Aprofundar e ampliar os temas.
13 ALQUIMIA: Os signos dos 4 elementos. 67 TARÔ: CARTA Nº XII
14 SIMBOLISMO ANIMAL I 68 DEUS EXISTE?
15 SIMBOLISMO ANIMAL II 69 ESPIRITU-ALMA-CUERPO
16 NOTA: A origem sagrada da cultura. 70 NOTA: Releitura do Programa.
17 A COROA 71 TARÔ: CARTA Nº XIII
18 O MENOR É O MAIS PODEROSO 72 ALQUIMIA: A putrefação ou nigredo.
19 TARÔ 73 O NASCIMENTO DA HIST ÓRIA I
20 TARÔ: CARTA Nº I 74 O NASCIMENTO DA HIST ÓRIA II
21 A CIDADE CELESTE I 75 TARÔ: CARTA Nº XIIII
22 A CIDADE CELESTE II 76 AS SETE ARTES LIBERAIS I
23 O COMPASSO E O ESQUADRO 77 AS SETE ARTES LIBERAIS II
24 CABALA: A letra Iod e a letra Alef. 78 NOTA: Estreitar v ínculos com Agartha.
25 NOTA: A For ça do mito segue presente. 79 TARÔ: CARTA Nº XV
26 TARÔ: CARTA Nº II 80 QUADRADOS MÁGICOS
27 MITOLOGIA: Sentidos diversos dos mitos. 81 NOSSO PROGRAMA
28 CABALA: Os 22 caminhos na Árvore. 82 TARÔ: CARTA Nº XVI
29 EXERCÍCIOS DE PACIÊNCIA 83 O BOSQUE
30 EXERCÍCIOS DE SILÊNCIO 84 ASTROLOGIA: Signos, elementos, homem.
31 TARÔ: CARTA Nº III 85 MOMENTOS DE INCERTEZA
32 CABALA: O Tetragrama e as 10 sefiroth. 86 TARÔ: CARTA Nº XVII
33 O AMOR 87 NÔMADES E SEDENTÁRIOS
34 METAFÍSICA 88 AS TRÊS GRAÇAS
35 TARÔ: CARTA Nº IIII 89 ARITMOSOFIA: Núms. triangul. e quadrados.
36 GEOGRAFIA SAGRADA 90 TARÔ: CARTA Nº XVIII
37 A ASTROLOGIA E AS DEIDADES 91 MAGIA
38 APRENDER A LER 92 TARÔ: CARTA Nº XVIIII
39 TARÔ: CARTA Nº V 93 OS CICLOS E A HISTÓRIA
40 A BELEZA 94 JANO
41 GEOGRAFIA SAGRADA 95 GRAMÁTICA, DIALÉTICA E RETÓRICA
42 NOTA: O Paraíso e o coração. 96 TARÔ: CARTA Nº XX
43 VISÃO 97 CABALA: A teoria da Tsim-Tsum.
44 TARÔ: CARTA Nº VI 98 ASTROLOGIA: Signos posit., negat., e neutros.
45 A ANALOGIA 99 CONFU. ENTRE METAFISICA E
ASCETISMO
46 O ARTISTA 100 TARÔ: CARTA Nº XXI
47 NÃO É POR MUITO MADRUGAR… 101 OS CICLOS E OS RITMOS
48 TARÔ: CARTA Nº VII 102 ANGEOLOGIA I
49 HISTÓRIA SAGRADA 103 A TRADIÇÃO UNÂNIME
50 A TRADIÇÃO 104 TARÔ: CARTA Nº XXII
51 GEOGRAFIA SAGRADA 105 ARITMOSOFIA: Os números proporcionais
52 NOTA: Relembrar os ensinamentos do curso. 106 ASTROLOGIA: Signos zodiacais e pedras.
53 TARÔ: CARTA Nº VIII 107 TARÔ: INDICAÇÕES PARA SEU USO
54 ASTROLOGIA: Precessão dos equinócios 108 MEMORANDUM

Módulo III

1 TARÔ: 16 Cartas de a Corte. 52 SOBRE O TRABALHO INTERNO


2 AS QUATRO IDADES 53 ALQUIMIA: Os Quatro Elementos.
3 ARITMOSOFIA: Magnitudes lineares. 54 NOTA: RECORDAÇÃO, CENTRO E
PERIFERIA
4 ALGUMAS ADVERT ÊNCIAS BÁSICAS 55 OS ASPECTOS DA ALMA
5 NOTA: A esta altura dos Ensinamentos. 56 AS CASTAS
6 O MESTRE 57 CIÊNCIA
7 EGITO 58 CIÊNCIA I
8 PERFEIÇÃO OU PERFECCIONISMO? 59 ALFABETO E ESCRITURA
9 O TRABALHO 60 CIÊNCIA II
10 CABALA: 3 letras mães, 7 duplas, 12 simples. 61 NOTA: SOBRE A MELANCOLIA
11 A ALMA 62 AS QUATRO LEITURAS DA REALIDADE
12 GRÉCIA 63 ALQUIMIA
13 ROMA I 64 ANGEOLOGIA II
14 AS MUSAS II 65 EXERCÍCIO PR ÁTICO: Ler em voz alta.
15 MITRA 66 MINUTA
16 EXERCÍCIO PRÁTICO: Meditação em ação. 67 O HOR ÓSCOPO
17 JESUS 68 NOTA
18 ROMA II 69 CABALA: Talismã numérico.
19 ALEXANDRIA 70 GEOMANCIA
20 O HERMETISMO ALEXANDRINO 71 FILOSOFIA PERENE
21 ÉTICA ALEXANDRINA 72 SIMBOLISMOS DE PASSAGEM
22 A IDADE MÉDIA 73 AS TRADIÇÕES ARCAICAS
23 O HERMETISMO MEDIEVAL I 74 ASTRONOMIA-ASTROLOGIA
24 DIONÍSIO AREOPAGITA 75 AS TRADIÇÕES
25 O SIMBOLISMO HERÁLDICO 76 A PORTA
26 ARQUEOLOGIA 77 O SÍMBOLO DO CORAÇÃO II
27 ALFONSO X, O SABIO I 78 OS CICLOS I
28 A CIZÂNIA 79 O FIM DOS TEMPOS
29 GEOMETRIA 80 MARSÍLIO FICINO
30 ALFONSO X, O SABIO II 81 A TRADIÇÃO HERMÉTICA
31 A TRADIÇÃO E A MENSAGEM 82 OS SIGNOS DA RENÚNCIA
32 O HERMETISMO MEDIEVAL II 83 O ATRAVESSAR AS ÁGUAS
33 METATRON 84 A INICIAÇÃO
34 HISTÓRIA SAGRADA 85 A TÁBUA DE ESMERALDA
35 O NOME I 86 NOTA: Árvore da Vida e chakras.
36 ASTROLOGIA 87 EXERCÍCIO PRÁTICO: Nomes sephiroth.
37 HISTÓRIA SAGRADA: O RENASCIMENTO 88 O OCTÓGONO
I
38 HISTÓRIA SAGRADA: O RENASCIMENTO 89 PICO DE LA MIRANDOLA
II
39 NOTA: MAGIA 90 O HERMETISMO RENASCENTISTA I
40 MAGIA E ARTE 91 O HERMETISMO RENASCENTISTA II
41 CABALA: O NOME II 92 ALQUIMIA
42 O LABOR COTIDIANO 93 A ESCALA
43 QUIROLOGIA 94 A TRADIÇÃO PRÉ-COLOMBIANA
44 CABALA: Inversão de polaridade de energias. 95 O RENASCIMENTO ELISABETANO
45 A ESTRELA E A ESPIGA 96 NOTA: DOUTA IGNORÂNCIA?
46 ALQUIMIA 97 O MOVIMENTO ROSA-CRUZ
47 VIRGÍLIO-DANTE I 98 OS CICLOS II
48 O MÉTODO FUNDAMENTAL 99 AGARTHA
49 DANÇA: EXERCÍCIO PRÁTICO 100 O ESOTERISMO CONTEMPORÂNEO
50 VIRGÍLIO-DANTE II 101 FIM DE CICLO
51 EXERCÍCIOS PRÁTICOS: Outros horários. 102 ALQUIMIA: A REMINISCÊNCIA
INTRODUÇÃO À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha

FEDERICO GONZALEZ
e colaboradores

PREFÁCIO
O Agartha é um Programa, uma didática, um curso gradual que, seguindo com fé
e concentração produz os resultados previstos por aqueles que o criaram, pois suas
próprias experiências no trabalho interno e no conhecimento do Si Mesmo se
encontram nele expressadas. É um Ensinamento que requer paciência e vontade
para desenvolver a energia chamada inteligência; isto é igual a querer aprender
verdadeiramente a pensar, para o qual é necessário um treinamento, que o
Programa brinda. Requer-se do aluno estudo e dedicação e, sobretudo, da entrega
à sua sensibilidade e a seu reto juízo.

Agartha é um compêndio que traduz hoje em dia a Doutrina e a Tradição de todos


os povos e tempos sob a forma da Tradição Hermética. Seu curso está
especificamente desenhado para promover o Conhecimento pela efetividade de
sua realização. No conjunto de suas lições e temas, tratam-se os veículos
Herméticos (Tarot, Alquimia, Aritmosofia, Cabala, Astrologia, Simbolismo), bem
como Filosofia, Metafísica, Cosmogonia, Mitologia, e de maneira particular os
símbolos universais e as artes liberais. Também se refere à Arte como forma de
ver (poesia, literatura, música, teatro, dança, arquitetura, artes plásticas), à
História (sagrada) e à (autêntica) Ciência. Este método, ou melhor, este meio,
inclui igualmente figuras e gravuras; o visual tem um papel importante nele.

Como se poderá observar, o entrecruzamento rítmico, periódico, cíclico e


harmonioso destes temas produz uma série de inter-relações, o que nos obriga a
estabelecer vínculos insuspeitados entre eles, que se vão complementando uns aos
outros e ampliam e alumiam nosso meio, a par que se desperta a consciência. Os
exercícios e práticas que esta Introdução oferece coadjuvam à conquista de suas
realizações. Por isso, os que participam dela estão seguros de obter resultados
positivos com pessoas que se interessam por descobrir os mistérios que levam
dentro de si mesmos e que também observam no mundo.

Esta transmissão de idéias-força, de Conhecimento, liga os integrantes do


Programa Agartha, homens e mulheres de muitas nacionalidades, pessoas que
vivem em distintos países e que entre elas não se conhecem, mas que trabalham
unidos por esse vínculo invisível expressado neste manual.

Não somos uma seita, nem realizamos cerimônias, nem estamos organizados de
maneira pseudo-religiosa nem de nenhuma outra forma, mas cremos que, em
razão dos tempos obscuros aos quais nos tocou viver, esta Introdução à Ciência
sagrada cumpre neste momento uma função transcendente relacionada com o
renascimento dos valores adormecidos no homem contemporâneo. Os seres atuais
funcionamos com apenas uma mínima parte das possibilidades que se lhe
entregaram ao ser humano. Portanto vivemos uma vida que está por debaixo de
nós mesmos. Resgatar as potencialidades individuais, hoje praticamente
esquecidas, é a função desta Introdução, pondo especial ênfase na regeneração do
ser, o que dá por fruto um mundo mais harmonioso e digno de ser vivido tal qual
se lhe brindou ao homem na liberdade de sua natureza e que este desconhece na
agitação da existência cotidiana.

Você se ligou com o Agartha e tem neste momento a oportunidade de começar


uma nova etapa, inteiramente diferente, e de conhecer um mundo maravilhoso,
desgraçadamente quase que totalmente ignorado pela generalidade dos que nos
rodeiam. Você está se pondo em comunicação com a Ciência sagrada e deste
modo com a energia-força que a constitui, cujas emanações fizeram possível à
realização de Mestres, Instrutores e Iniciados em todos os tempos e lugares. Você
pode realizar algo incrível consigo mesmo, ainda que neste momento não o veja
com clareza ou não disponha dos elementos e do método para efetuá-lo. A Ciência
sagrada é a ponte entre a realidade já conhecida e outra desconhecida, face à qual
nossas fantasias mais audazes se apequenam. Agartha é revolucionário, pois
propõe uma transformação, uma autêntica transmutação interior que faça possível
o nascimento das potencialidades adormecidas do Homem Verdadeiro.

Esta nova aprendizagem tem de ser gradual e ordenada. E o aspirante percorrerá


um caminho, participará de um processo, que se refletirá em si mesmo e nas
pessoas e coisas à sua volta de uma maneira quase mágica. O mundo misterioso
dos símbolos será nosso guia neste percurso paulatino, e eles se manifestarão
também em nosso pensamento e nas ações e fatos de nossa vida diária, fazendo-
nos viver um mundo mais rico, feliz e assombroso, que cada homem ou mulher,
sem discriminação de idade, raça ou condição, pode adquirir, pois se trata de
descobrir o que leva dentro, ainda que o desconheça ou apenas o suspeite. Para
este fim nos valeremos dos símbolos fundamentais da Arte e da Ciência sagrada,
tal qual no-los legou a Tradição Hermética, com a vantagem de que estes veículos
e técnicas poderão ser aprendidos e praticados sem necessidade de mudar o ritmo
da existência cotidiana.

Como já se disse, alguns dos métodos e meios de que se vale este Programa para
transmitir o Ensino e o Conhecimento de outra realidade à que se aspira são:
Cabala, Aritmosofia, Alquimia, Astrologia, Cosmogonia, Metafísica, Teurgia, etc.
Mesmo assim, faz-se especial empenho no vínculo com a Arte (Música, Dança,
Plástica, Arquitetura, Literatura, etc.) como forma de Conhecimento e tomada
como veículo apto para a contemplação da Beleza. Igualmente se insiste numa
relocação quanto às ciências modernas. Tudo isto gera outra dimensão do espaço
e do tempo que, no entanto, está ocorrendo aqui e agora no mais oculto do
coração do homem; o que constitui seu autêntico Ser, sua Identidade, o Alfa e o
Ômega destes estudos e trabalhos.

A estes efeitos, brinda-se ao leitor uma preparação teórico-prática, alternando as


distintas disciplinas de forma gradual e em ordem analógica. Recomenda-se
especialmente a meditação sobre os textos e a realização de determinadas práticas
e exercícios, cuja singeleza, pois, são desde todo ponto de vista inofensivos, não
os fazendo, por isso, menos efetivos, já que são capazes de atuar como
despertadores de nossa consciência adormecida. A gota d’água fura a pedra.

Esta Introdução à Ciência sagrada sintetiza uma enorme bibliografia Hermética


que corresponde à voz da Sabedoria de todos os tempos e espaços geográficos,
encarnada em Mestres que guiam e fundamentam os Ensinamentos do Agartha. O
Programa também age como uma terapia, ordenando nossa psique e dando sentido
a nossa vida, para todos aqueles que se abrem a seu entendimento e trabalham em
sua realização.

Crescer é uma oportunidade e um direito que todos os homens possuímos. Se tudo


está na mente e no coração do homem, é muito importante que este reconheça sua
própria natureza e aja de acordo com ela. A seu nível, não há nada mais
importante do que o próprio homem. E conhecendo este suas infinitas
possibilidades, e também suas limitações, poderá achar paz para si, fortuna em seu
trabalho e alegria geral.

Queremos lembrar aqui algumas noções fundamentais que René Guénon expressa
em sua Aperçus sur l'Initiation:

– ...todo conhecimento é essencialmente uma identificação...

– ...este conhecimento só é possível porque o ser, que é um indivíduo humano num


certo estado contingente de manifestação, é também outra coisa ao mesmo
tempo...

– Todo conhecimento, ao qual se possa chamar verdadeiramente iniciático,


resulta de uma comunicação estabelecida conscientemente com os estados
superiores [do ser]...

– O conhecimento direto da ordem transcendente, com a certeza absoluta que


implica, é evidentemente, em si mesmo, incomunicável e inexprimível; toda
expressão, sendo necessariamente formal por definição mesma e, por
conseguinte, individual, é-lhe por isso inadequada e não pode dar dele (...) mais
do que um reflexo na ordem humana...

– ... todo conhecimento exclusivamente 'livresco' não tem nada em comum com o
conhecimento iniciático, inclusive contemplado em seu estado simplesmente
teórico...

Afirmando como uma das condições da iniciação:

– O trabalho interior, pelo qual este desenvolvimento será realizado


gradualmente, cabe-se com o auxílio de 'adjuvantes' ou de 'suportes' exteriores,
sobretudo nos primeiros estágios, fazendo passar o ser, de degrau em degrau,
através dos diferentes estados da hierarquia iniciática, para conduzi-lo ao
objetivo final da 'Liberação' ou da 'Identidade Suprema'.

O propósito do Programa é espiritualizar a matéria e materializar o espírito. Para


esse fim, convém pôr-se à faina sem dilação e ir diretamente à prática dos
veículos e exercícios Herméticos que oferece a presente Introdução, começando
pelo nível mais singelo: a memorização e familiarização com símbolos e ritos.
Com o seu desenvolver, ir-se-á relacionando a prática com a doutrina.

Este Programa de ensino compreende três módulos de um semestre cada um,


relacionados com três graus ou níveis de estudo. Os capítulos estão numerados
para seguir sua ordem didática determinada –em vermelho à margem esquerda.
Ao final de cada Módulo se inclui seu índice.

Nota. Pela mesma natureza "virtual" do meio através do qual se difunde este
Ensino, recomenda-se a impressão em papel destes textos, o que favorecerá seu
estudo, a concentração e a meditação necessários.
INTRODUÇÃO À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha
MÓDULO I

1 A TRADIÇÃO HERMÉTICA
As verdades eternas, conhecidas unanimemente e expressadas por sábios de
todos os tempos e lugares, plasmaram-se no Ocidente no pensamento de
culturas estreitamente inter-relacionadas, que em distintos momentos
floresceram em regiões localizadas entre o Oriente Médio e a Europa,
durante esta quarta e última parte do ciclo, à qual se chamou Kali Yuga ou
Idade do Ferro, e que sempre se vinculou com o Oeste.

Antiqüíssimos conhecimentos, patrimônio da Tradição Unânime, foram


revelados aos sábios egípcios, persas e caldeus. Eles se valeram da mitologia
e do rito, do estudo da harmonia musical, dos astros, da matemática e
geometria sagradas, e de diversos veículos iniciáticos que permitem acessar
os Mistérios para recriar a Filosofia Perene, desenhando e construindo um
corpus de idéias, que foi o gérmen do pensamento metafísico do Ocidente,
conhecido com o nome de Tradição Hermética, ramo ocidental da Tradição
Primordial. Hermes Trismegisto, o Três Vezes Grande, dá nome a esta
tradição. Na verdade, Hermes é o nome grego de um ser arquetípico invisível
que todos os povos conheceram e que foi nomeado de distintas maneiras.
Trata-se de um espírito intermediário entre os deuses e os homens, de uma
deidade instrutora e educadora, de um curandeiro divino que revela suas
mensagens a todo verdadeiro iniciado: o que passou pela morte e a venceu.

Os egípcios chamaram Thot a esta entidade iniciadora, que transmitiu os


ensinos eternos a seus hierofantes, alquimistas, matemáticos e construtores
que, com o auxílio de complexos rituais cosmogônicos, empreenderam a
aventura de atravessar as águas que conduzem à pátria dos imortais.

Autores Herméticos relacionaram Hermes com Enoch e Elias, que seriam,


para os hebreus, a encarnação humana desta entidade supra-humana que
identificam com Rafael, o arcanjo, também guia, sanador e revelador. Esta
tradição judaica, que se considerou sempre como integrante da Tradição
Hermética, conviveu com a egípcia antes e durante a cativeiro (Moisés é
fruto desta convivência) e em tempos dos reis David e Salomão durante a
construção do Templo de Jerusalém; faz ao redor de três mil anos, estes
pensamentos se consolidaram numa arquitetura revelada que permitiu, uma
vez mais, a criação de um espaço vazio ou arca interior capaz de albergar em
seu seio a divindade.

No século VI antes de Cristo, que é o mesmo século da destruição do


Templo de Jerusalém, e contemporânea de Lao Tsé na China, de Buddha
Gautama na Índia e do profeta Daniel na Babilônia, nasce a escola de
Pitágoras que, também herdeira dos antigos mistérios revelados por Hermes,
alumiará posteriormente à cultura grega, tanto aos pré-socráticos como a
Sócrates e Platão. Este pensamento hermético exerceu sua influência
notavelmente na cultura romana, nos primeiros cristãos e gnósticos
alexandrinos, nos cavaleiros, construtores e alquimistas da Europa medieval
e nos filósofos e artistas renascentistas, nutrindo-se ao mesmo tempo dos
conhecimentos cabalísticos e do esoterismo islâmico.

Logo florescem estas idéias hermético-iniciáticas no movimento rosa-cruz,


que se desenvolve na Alemanha e na Inglaterra da época Elisabetana, tendo
sido depositados estes antigos ensinos, posteriormente, na Franco-
Maçonaria. Esta Ordem, que em sua aparência exotérica não pôde escapar à
degradação e dissolução promovidas pela humanidade atual, conserva, no
entanto, em seus ritos e símbolos esse gérmen revelado e revelador, ativo no
seio de umas poucas lojas que conseguiram se subtrair às modas inovadoras
que ameaçam a Ocidente com sucumbir, e mantêm esse vínculo regenerador
com o eixo invisível da Tradição que se dirige sempre para o verdadeiro
Norte, origem e destino da humanidade, do qual esta tradição nunca se
separou.

Hermes e a Tradição Hermética vivem atualmente. Sua presença é eterna.

2 O EXOTÉRICO E O ESOTÉRICO
Todos os símbolos sagrados, tanto os expressados pela natureza como os
adquiridos pelos homens mediante revelação divina, sejam estes gestuais,
visuais ou auditivos, numéricos, geométricos ou astronômicos, rituais ou
mitológicos, macro ou microcósmicos, têm uma face oculta e uma aparente;
uma qualidade intrínseca e uma manifestação sensível, quer dizer, um
aspecto esotérico e outro exotérico.

Enquanto o homem profano (que é tal por seu estado de queda) unicamente
pode perceber o exterior do símbolo, pois perdeu a conexão com sua origem
mítica e sua realidade espiritual, o iniciado procura descobrir nele o mais
essencial, o que se encontra em seu núcleo, o que não é sensível, mas sim
inteligível e cognoscível, a estrutura invisível do Cosmo e do pensamento,
sua trama eterna, ou seja, o esotérico, que constitui também o ser mais
profundo do próprio homem, sua natureza imortal.

Ao tomar contato e identificar-se com essa condição superior de si mesmo e


do Todo, constata que signos e estruturas simbólicas aparentemente diversas
são, no entanto, idênticas em significado e origem; que um mesmo
pensamento ou idéia pode ser expresso com distintas linguagens e roupagens
sem se alterar, de modo algum, seu conteúdo único e essencial; que as idéias
universais e eternas não podem variar, ainda que na aparência se manifestem
de modo passageiro.

O Cosmo, a criação inteira, contém uma face oculta: sua estrutura invisível e
misteriosa, que o faz possível e que é sua realidade esotérica, mas que, ao se
manifestar, reflete-se em miríades de seres de variadíssimas formas que lhe
dão uma face exotérica, sua aparência temporal e mutável. No homem
sucede o mesmo: o corpo e as circunstâncias individuais são as que
constituem seu aspecto exotérico e aparente, sendo o espírito o mais
esotérico, a única Realidade, sua origem mais profunda e seu destino mais
alto.

Se os cinco sentidos humanos são capazes de mostrar o físico, a realidade


sensível, esse sexto sentido da intuição inteligente e da perscrutação interna,
que se adquire pela Iniciação nos Mistérios, permite Ver mais além; dá
acesso a uma região Metafísica na qual os seres e as coisas não estão sujeitos
já ao devir, nem marcados pela morte. Essa visão esotérica identifica ao
homem com o “Si Mesmo”, ou seja, com seu verdadeiro Ser, sua essência
imortal da qual toma consciência graças ao Conhecimento e ao lembrar de
Si.

Enquanto o exotérico nos mostra o múltiplo e passageiro, o esotérico nos


leva para o único e imutável.

Com um olhar esotérico, que se irá abrindo gradualmente em nosso caminho


interior, iremos compreendendo e realizando que o espírito do Pai, seu Ser
mais interno, é idêntico ao espírito do Filho. Esta consciência de Unidade é a
meta de todo trabalho de ordem esotérica e iniciática bem entendido. Para
Ela se dirigem todos nossos esforços; nEla colocamos nosso pensamento e
nossa concentração interior.

3 A VIA SIMBOLICA
O símbolo é a pegada (ou o gesto) visível de uma realidade invisível ou
oculta. É a manifestação de uma idéia que assim se expressa a nível sensível
e se faz apta para o entendimento. Num sentido amplo, toda a manifestação,
toda a criação, é simbólica, como cada gesto é um rito, seja isto ou não
evidente, pois constitui um sinal significativo.

O símbolo nomeia as coisas e é uno com elas, não as interpreta nem define.
Em verdade, a definição é ocidental e moderna (ainda que nasça na Grécia
clássica) e poderia ser considerada como a porta à classificação posterior.

O símbolo não é só visual, pode ser auditivo, como é o caso do mito e da


lenda, ou absolutamente plástico e quase inapreensível como sucede com
certas imagens fugazes que, no entanto, marcam-nos. Na época atual,
costuma-se-lhe associar mais com o visual, porque a vista fixa e cristaliza
imagens em relação com estes momentos históricos de solidificação e
anquilosamento1 mais ligados ao espacial que ao temporal.

O símbolo é o intermediário entre duas realidades, uma conhecida e outra


desconhecida e, portanto, o veículo na busca do Ser, através do
Conhecimento. Dali que os distintos símbolos sagrados das diferentes
tradições (e por certo também os símbolos naturais) se entreteçam e se
vinculem entre si constituindo uma Via Simbólica para a realização interior,
a saber: para o Conhecimento, ou seja, o Ser, dada a identidade entre o que o
homem é e o que conhece. O mesmo é válido para os ritos que promove este
manual, começando pelo estudo e a meditação e seguindo por todos os
exercícios práticos. Por isso é necessário que o leitor tenha uma visão o
suficientemente clara da Cosmogonia, arquitetura do universo reproduzida
no homem, para utilizar o modelo da Árvore da Vida, chamado também
Sefirótico, localizar-se e transcendê-lo, mediante a aceitação de uma Ordem
capaz de nos mostrar o que está mais além dele. Estamos nos referindo à
mobilização de todo nosso ser que os símbolos, como intermediários,
procuram, à viagem ou navegação pelas sutis entretelas da consciência, à
surpresa de perceber mundos novos que permaneciam invisíveis e, no
entanto, são-nos familiares, feitos todos estes que balizam o processo mágico
de Iniciação, caracterizado pelos graus de Conhecimento de outras realidades
espaço temporais, ou melhor, de outra forma de perceber a realidade.

O metafísico, essa região desconhecida e misteriosa, manifesta-se no mundo


sensível por intermediação do símbolo. Graças a este, é possível o
Conhecimento para o ser humano; imagens e símbolos nos permitem tomar
consciência do mundo que nos rodeia, do que este significa e de nós
mesmos.

Os símbolos sagrados, revelados, foram depositados em todas as tradições


verdadeiras. Os sábios de diferentes povos, por meio da Ciência e da Arte,
promoveram sempre o conhecimento desses mundos sutis que os próprios
símbolos testemunham. Eles permitem que aquelas realidades superiores
toquem nossos sentidos e possibilitam que o homem, a partir desta base
sensível, eleve-se a essas regiões que constituem seu aspecto mais interno:
seu verdadeiro Ser.

A via simbólica que este Programa propõe, com todas as experiências que
ela implica, poderá nos levar de uma maneira ordenada e gradual para esse
Conhecimento.

O símbolo plasma uma força, uma energia invisível, uma idéia. O que ele
expressa e o que contém em seu interior se correspondem em perfeita
harmonia. Não deve nunca se confundir com a alegoria, já que esta se
correlaciona mais com substituições e suposições e, portanto, carece de
conexão clara com o interno e com o verdadeiro. Também é importante
apontar que os símbolos aos quais nos referimos não são meras convenções
inventadas pelos homens; eles são "não-humanos", encontram-se na própria
estrutura do Cosmo e do homem. Ao serem os intermediários entre o
invisível e o visível, promovem a consciência de mundos superiores e
regiões supracósmicas.

É muito notável o fato de que os símbolos principais se repitam de modo


unânime em todos os povos da terra em distintos momentos e lugares.
Muitas vezes esta identidade é inclusive formal, ainda que, como já se disse,
amiúde poderemos encontrar símbolos de diferentes formas, mas idênticos
significados. Em todo caso, todos se correspondem com um arquétipo único
e universal do qual cada um desses povos extraiu seus símbolos particulares.

Os símbolos sagrados são capazes de revelar esse modelo único, seu Criador,
e ainda o incriado; mas às vezes velam essas realidades superiores e se
cobrem de uma roupagem formal, ainda que conservem sempre seu aspecto
interno e invisível.
1
N.T. - Anquilosamento (do grego ankylósis) - é a imobilidade ou garroteamento de um
membro para que permaneça imobilizado.

4 ARITMOSOFIA
Os números possuem uma realidade mágico-teúrgica que os homens de
nossos dias esquecemos, e que trataremos de recuperar. Eles são módulos
harmônicos e medidas que relacionam o microcosmo (homem) com o
macrocosmo (universo), e respondem a vibrações secretas, que encontram
suas correspondências em todas as coisas. Desde os acontecimentos
mundiais aos acontecimentos locais e individuais, os quais formam parte da
harmonia universal, que se expressa também através de números e medidas,
semelhante a uma grande sinfonia. Dali a conexão com a música, e
particularmente com os ritmos e os ciclos.

Portanto o número é uma linguagem universal conhecida por todos os povos,


que sempre foi considerada como um símbolo revelado, capaz de sintetizar e
ordenar o universo, e como um magnífico veículo apto para estabelecer
relações entre as coisas, entretecendo as variadas ordens da existência e os
graduais mundos ou planos da realidade.

Ainda que a sociedade moderna parecesse crer que os números fossem uma
invenção humana, produto do progresso, muito úteis para fazer cálculos
estatísticos, bem como para medir, classificar e em geral contar objetos de
toda índole, percebendo a série numérica como uma sucessão indefinida e
horizontal (numa só dimensão), carente em absoluto de outro significado,
nas sociedades tradicionais, pelo contrário, os números são concebidos como
deidades ordenadoras, como intermediários, portadores de energias e Idéias
superiores que eles mesmos plasmam no Cosmo inteiro.

Os números se correspondem de modo preciso com as figuras da geometria e


as notas musicais, como dissemos, em perfeita harmonia com as leis da
Astrologia e a ordem do universo.

O percurso que fazem os números desde o um até o dez (do quase


imanifestado à manifestação) nos ensinará como empreender o caminho de
retorno, a partir da realidade física, em busca da Unidade Metafísica.

O número, como todos os símbolos, é suscetível de ser observado sob dois


aspectos: exterior e interior. Desde o ponto de vista externo os símbolos
numéricos expressam meramente quantidades; desde o interno, manifestam
qualidades do ser. Nosso Programa fará ênfase na visão qualitativa, que é a
principal, já que desde nosso ponto de vista o quantitativo é secundário e
derivado do qualitativo.

Esta visão esotérica da Numerologia foi transmitida ao Ocidente por meio da


Escola Pitagórica, ainda que se a encontre, também, em todas as culturas
ligadas à Tradição Primordial.

Segundo os pitagóricos todas as coisas se sintetizam nos nove primeiros


números; estes, por sua vez, podem se resumir nos três primeiros; e eles
estão contidos na unidade.

Os trabalhos numéricos e geométricos que sugerimos promovem um


trabalho de síntese, sempre na busca da unidade de nós mesmos; da unidade
do Cosmo; da Unidade do Ser.

5 O CÍRCULO
Dentre os símbolos fundamentais comuns a todos os povos, o círculo é sem
dúvida o mais generalizado e o que aparece mais freqüentemente em todas as
manifestações humanas conhecidas. Isto se deve, com efeito, à própria
natureza que a forma circular significa, já que tudo na vida e no mundo tende
a realizar este movimento, presente tanto nas expressões naturais como nas
humanas. Aliás, uma reta, ou sucessão de pontos, que progride
indefinidamente, descreve um movimento circular, que a curvatura do
espaço faria regressar a seu ponto de origem. Em forma de círculos se
expandem as radiações de energia, e esses redemoinhos ou espirais
conformam as estruturas de céu e terra, como bem pode observar-se no
sideral e no molecular. O círculo, junto com seus símbolos associados é,
pois, uma das imagens básicas do conhecimento simbólico e voltaremos uma
e outra vez sobre o tema.

Pode-se perceber na figura precedente que não há circunferência sem um


ponto interior que a gere, pois ela extrai sua forma, assim a tracemos com
compasso ou cordel, de um centro existente previamente. Conjuntamente,
circunferência e centro conformam a circularidade. O centro geralmente é
invisível, ou tácito, ou se acha outras vezes especificamente assinalado como
elemento constitutivo. Este ponto original é o que emana sua energia a todos
os pontos da circunferência, que são um reflexo de sua potencialidade num
plano definido e limitado. Essas emanações são representadas como
irradiações do centro e formas de conexão entre este e a periferia. A mais
singela e notável destas figurações é a seguinte:

Este é também o símbolo do quaternário, ou seja, o da maneira


“quatripartida” em que se produz toda manifestação. Os exemplos mais
claros desta divisão são os quatro pontos cardeais no espaço, as quatro
estações do dia ou do ano no tempo, a interação dos elementos que em
ordem mutável, configuram a matéria, as quatro idades na vida de um
homem, etc. Ou seja, que este número caracteriza a todo o criado.

A cruz é, pois, o símbolo do número quatro em seu aspecto dinâmico e


generativo, que recebe sua energia original da quintessência central, do
ponto que é a origem da irradiação, e ao que esta tem de voltar
necessariamente num espaço curvo.

Advertências:

a) Deve se considerar, da mesma forma, o círculo como uma esfera. Ou seja,


adicionar volume, ou tridimensionalidade, às figuras simbólicas planas com
as quais iremos trabalhando.

b) Não se tem que se considerar aos símbolos como exteriores a nós, pois se
deve ter em conta que a esfera do universo nos envolve. Estamos dentro
dela, somos unos com ela.

6 CABALA
Pouco a pouco iremos desenvolvendo diferentes métodos Herméticos, entre
eles o da Cabala judaica, utilizada também pelos cristãos a partir do
Renascimento. "Cabala" significa literalmente "Tradição", e se refere tanto
ao legado da doutrina que foi revelada aos antigos patriarcas e profetas do
povo judeu, como à recepção e vivificação dessa doutrina que provém –
como todo Ensino verdadeiro– da Grande Tradição Unânime.

Baste-nos por agora dizer que trabalharemos especialmente com o símbolo


da Árvore da Vida Sefirótica. Este diagrama é um mapa do Cosmo, um
modelo do universo, e é válido tanto para o homem como para a criação
inteira.
Os centros e correntes de energia que conformam este diagrama estão em
relação com os números e as letras sagradas, a Astrologia, a Alquimia (ou
Arte das transmutações), as lâminas do jogo do Tarô, a simbólica da música
e da geometria, manifestações todas da construção harmônica da mansão
interna. Este modelo é, pois, um mandala, um jogo de símbolos, um
intermediário sintético entre nós e o desconhecido, através de uma série de
espíritos, ou deidades, que se articulam balizando um caminho mágico
evolutivo, que todos os povos do mundo conheceram, que constituía o
fundamento de sua cultura, e ao que guardavam como seu mais apreciado
segredo. Estamos nos referindo aos Mistérios da Iniciação.

7 MÚSICA
Sabe-se que antes de o fazer pelo ar, o som se propaga pelo éter; este quinto
elemento ou quintessência Hermética é a origem dos quatro restantes. Por
sua extrema rarificação imaterial, superior à do fogo, com o qual às vezes se
identifica, o éter é o veículo por excelência da luz inteligível e do som
inaudível, cuja natureza vibratória faz serem todos os elementos uma só e
mesma coisa, antes de se diversificar através dos sentidos até o mundo
exterior. Por sua extrema plasticidade, pureza, e receptividade absolutas, a
Tradição também assimilou simbolicamente este elemento à água, à
substância universal. Por isso a concha marinha, cuja forma nos lembra ao
yoni feminino e à orelha humana, é o representante unânime (como as
conchas de água benta dos templos cristãos) do poder purificador, produtivo
e "generativo" deste supra-elemento divino.

É de sobra conhecida a lenda que faz das conchas as conservadoras do som


do mar. Esta propagação se realiza em forma ondulatória, da qual a espiral é
símbolo por excelência. Diremos, ademais, que este símbolo está
estreitamente vinculado ao logaritmo pentagramático do crescimento dos
seres vivos, o que explica a estrutura espiral própria das conchas e caracóis,
bem como a do ácido desoxirribonucléico que preside a corrente genética, e
também outros muitos exemplos que omitiremos por enquanto.
A medicina pitagórica atribuía à música um poder terapêutico por
excelência. Disso também nos dá referência a Alquimia, quando faz
coincidir os centros musicais com os centros sutis, e estes com as oitavas do
microcosmo humano. Assim vemos como a música, encarada desde uma
perspectiva sagrada, é muito mais do que parece. E também que as naturezas
do tempo e do espaço, da água e o fogo, unidas indissoluvelmente no éter,
origem de sua vida, sendo fundamentalmente distintas, tocam-se num ponto
onde, sem se confundirem, fundem-se numa Harmonia Única e Universal.

Sócrates, nas palavras de Platão, confirma as Musas como as primeiras


protetoras da arte da música, de quem ela recebeu seu nome. Como já
afirmamos, o tempo e o espaço se relacionam mutuamente através do
movimento, e este não é senão a expressão dinâmica ou rítmica de uma
harmonia cujos modelos são os números. Ritmo e proporção, semelhantes
respectivamente ao tempo e ao espaço, são a métrica pela qual ambos ficam
reciprocamente ordenados, conformando a presença viva daquela mesma
harmonia que se dá por igual no céu e na terra. A própria geometria (geo =
terra, metria = medida), que ordena idealmente o espaço, está virtualmente
implícita na música como relação métrica de seus intervalos. Harmonia,
número e movimento são, pois, termos equivalentes e mutáveis entre si,
quanto se referem a uma mesma realidade, seja à arquitetura sutil e musical
do Cosmo, ao ritmo respiratório, às pulsações do coração ou ao compasso
alternado das fases diurna e noturna do dia.

O homem especialmente recebe com mais intensidade do que qualquer outro


ser terrestre o ritmo pulsatório da existência, o que, num sentido, converte-o
no mais capaz de reproduzi-lo. De natureza musical está feita a alma humana
e sua inteligência, já que são elas as que captam as sutis relações entre as
coisas; a maravilhosa articulação que a todas mantém unidas, com seus
matizes, num todo indivisível que se vai revelando à medida que a unidade e
a harmonia se impõem a nosso caos particular.

No homem, como num pequeno instrumento em mãos de um músico


invisível, segundo se nos diz no hermetismo antigo e do Renascimento,
encontram-se todas as potências, virtudes e ritmos do universo, homologadas
ou em diapasão com a natureza de seu estado. No entanto, nem sempre se é
consciente disso, já que seu diapasão particular não está, em geral, afinado
com o tom universal.
fig. 1

8 ASTRONOMIA-ASTROLOGIA
Queremos nos aproximar ao tema da Astrologia como ciência cosmogônica e
veículo de realização. Damos aqui os símbolos dos planetas e dos signos
zodiacais, para aquele que ainda não está familiarizado com eles. Se não os
conhecer, é oportuno também tratar de os desenhar e, sobretudo, de os
identificar. Começaremos a tratar esta ciência cosmogônica, eminentemente
simbólica, pois ela constitui um dos caminhos mais importantes para o
conhecimento espacial e temporal da realidade na qual estamos inscritos.

Para isso começaremos com algo tão singelo como os nomes e signos dos
sete planetas tradicionais, assimilados a deuses, e a suas andanças pelo
espaço celeste, só limitado pelo cinturão zodiacal.

É muito provável que você conheça os nomes e signos zodiacais, mas


queremos repeti-los nesta introdução. Talvez devamos nos desculpar por isso,
mas em toda Introdução há que se começar pelo princípio.
Os sete planetas giram simbolicamente ao redor do Sol, sendo interiores a
este Vênus, Mercúrio, Lua e Terra, e exteriores os mais altos: Marte, Júpiter e
Saturno.

A palavra Zodíaco, que pode se traduzir como “Roda da Vida” (também


como Roda animal), é a seqüência das doze constelações que se encontram de
um e de outro lado da eclíptica, ou seja, do plano curvo imaginário no qual o
Sol percorre num ano a totalidade da esfera celeste.

Em seus percursos os astros desenham formas diretamente ligadas à sorte da


Terra e de seus habitantes, os homens, membros ativos do sistema. Estas
condições nos marcam e nos servem para conhecer nossos limites,
determinados primeiramente pelo lugar e pelo tempo de nosso nascimento e,
a partir de tais limites, poderemos optar pelo ilimitado como fundamento de
toda ordem verdadeira.

Desde o começo dos tempos, os astros escrevem no céu uma dança


contrapontística e harmônica de formas e ritmos computáveis para o ser
humano que, sumido no caos de um movimento sempre passageiro, toma
essas pautas como mais fixas e estáveis no decorrer constante de noites e dias
que tende a se confundir num amorfo sem significado. Estas pautas
condicionam sua vida, tal qual a cultura em que nascemos, sujeita ao devir
histórico e à determinação geográfica, também não alheios à sutil influência
de planetas e estrelas. Trata-se de conhecer não só o mapa do céu como
introdução ao entendimento da Cosmogonia, senão também de considerar a
importância que estes têm em nossa vida individual e em relação à integração
dela no macrocosmo, sem cair em jogos meramente egóticos ou simplistas
senão, pelo contrário, com o objetivo de encontrar nos planetas e no zodíaco
pontos de referência para conciliar as energias anímicas de nossa
personalidade, equilibrando-as de modo tal que o estudo da Astrologia seja
um auxiliar precioso do Processo de Conhecimento, fundamentado na
experiência que os astros e seus movimentos produzem no ser individual e
sua existência, e que podem ser manejadas de acordo às pautas benéficas e
maléficas que sua própria energia-força dual manifesta no conjunto cósmico.

Nota: Utilizaremos os sete planetas tradicionais da Antigüidade, com


exclusão dos modernos Urano, Netuno e Plutão. Já demos os símbolos e os
nomes, para que o aspirante se familiarize com eles e os aprenda.
9 CABALA
Continuamos novamente com a Árvore da Vida Sefirótica, à qual
adicionamos o nome de cada uma das sefiroth ou "numerações", ou seja, dos
dez círculos (esferas no volumétrico) ou "cifras" que a compõem.

Ainda que para fins didáticos a dividamos em esferas, planos e colunas, é


importante lembrar sempre que esta Árvore constitui uma unidade
indissolúvel e indivisível e que todas suas partes são aspectos inseparáveis
dessa unidade

A primeira sefirah, Kether (palavra que significa "Coroa") é a realidade


única, o mistério absoluto, a essência pura da qual emanam as restantes
sefiroth.

A número dois, Hokhmah, a emanação primeira, é a Sabedoria divina pela


qual a deidade se conhece a Si Mesma, e permite a todo ser reconhecer a
Unidade em seu interior.

A terceira esfera, Binah, a Inteligência, é a Grande Mãe ou Matriz Universal,


geradora de todos os mundos e seres, aos que discrimina e forma só para
devolvê-los novamente ao Um. Estas primeiras três sefiroth são em realidade
uma só: Kether é o Conhecimento, Hokhmah o sujeito que conhece (ativo) e
Binah o objeto conhecido (passivo).

A quarta sefirah, Hesed, é a Graça, o Amor ou a Misericórdia que se irradia


a toda a criação; a quinta (Gueburah ou Din) é o Rigor ou Juízo divino que
nega tudo o que não é o Um; e Tifereth, a sexta, é a Beleza que entrelaça
todas as sefiroth entre si.

Netsah, a número sete, a Vitória, é a energia que produz todos os mundos


manifestados; e a oito, Hod, a Glória, encarrega-se de reabsorver estes
mundos aparentes novamente na Unidade; Yesod, a nona, é o Fundamento
que equilibra as duas anteriores; e finalmente Malkhuth, a número dez, o
Reino, constitui o descenso de Kether ao mundo material e representa a
Onipresença e Imanência divina em todas as coisas.

Cada uma destas sefiroth tem uma face oculta e outra visível. É receptiva
com respeito à anterior e ativa com relação à seguinte.

É importante fazer notar que em toda sefirah pode-se ver uma Árvore
Sefirótica completa e, em cada sefirah desta Árvore, outra mais, e assim até
o infinitamente pequeno. E vice-versa, qualquer Árvore por maior que a
imaginemos é só uma sefirah de outra Árvore maior, que por sua vez é só
outra sefirah de uma ainda maior, também ad infinitum, como é a estrutura
do espaço e do tempo, que contém mundos dentro de mundos e ciclos dentro
de ciclos, ou seja, a de uma esfera arquetípica dividida em dez numerações
(ou pequenas esferas) que se reproduzem indefinidamente.

10 ALQUIMIA
Outra das artes herméticas é a Alquimia. Assim se chamava na Antigüidade a
ciência das transmutações, minerais ou vegetais, da natureza. Estas operações
têm uma réplica no homem, que pode se ver nelas como num espelho que
refletisse seu próprio processo de desenvolvimento e simbolizam a
possibilidade da regeneração. Ou seja, a de mudar de condição e de forma, a
tal ponto que a substância com que se trabalha –neste caso a psique humana
nos primeiros níveis– passe a ser uma coisa distinta da que conhecemos
atualmente. Esta busca e achado do Ser é, em suma, a autêntica Liberdade,
não empanada por nenhum preconceito, e pode ser equiparada a um novo
nascimento.

A Alquimia do medievo europeu, que trabalha com as transmutações dos


metais (e minerais em geral), utiliza também a notação astrológica para
designar as qualidades simbólicas que distinguem determinados metais.

Esta associação entre os astros (deidades e energias celestes) e os metais, não


é de nenhum modo arbitrária, pois há uma correspondência constante entre o
alto e o baixo, e são análogas às forças e energias dos céus (deidades
urânicas) e as da terra (deidades ctônicas), ainda que seja imprescindível
assinalar que se acham invertidas umas com relação às outras.

No entanto estas forças são complementares e não poderiam ser o Universo e


o homem sem ambas, pois elas constituem a dinâmica rítmica, a dialética, em
que se produzem todas as coisas. Por esse motivo, o trabalho alquímico, ou
hermético, realiza-se com estas duas energias, harmonizando-as, sem excluir
nenhuma delas. Pois como já veremos é o homem que as religa, o verdadeiro
intermediário entre céu e terra. E é por essa mesma razão que nas tradições
antigas, a Iniciação era e é tomada como uma visita do ser humano às
entranhas da terra, ou uma viagem ao país dos defuntos, quando não um
descenso aos infernos de nosso ignorante psiquismo, imprescindível para
uma posterior e triunfal ascensão aos céus. Na continuidade, são
apresentados os nomes dos três princípios alquímicos e os signos com que se
os representa:

A interação destes princípios e sua constante conjugação produzem todas as


coisas e, portanto, acham-se presentes nelas. O Enxofre é ativo (+), enquanto
o mercúrio é passivo (-). O Sal, terceiro princípio que liga os precedentes,
pode-se qualificar de neutro (N). O Atanor é o forno, ou cozinha alquímica,
onde se transformam estes princípios continuamente, bem como os elementos
minerais que eles originam, que igualmente levam em si esta divisão
tripartite. O que acontece no interior do Atanor do mesmo modo acontece no
interior do ser humano, especialmente em sua psique, primeiro passo no
trabalho hermético, onde estas energias se opõem, contradizem-se e se unem,
provocando uma dialética permanente de equilíbrios e desequilíbrios que
conformam a harmonia universal. Esta dinâmica é uma dialética na qual os
opostos não se excluem, senão que constantemente confluem na união para
poderem se separar.
11 CABALA
O modelo da Árvore da Vida, espelho e síntese do homem e do Cosmo,
divide-se em 3 colunas ou pilares, conforme a figura a seguir:
Esta divisão tradicional em três colunas, está em estreita vinculação com o
expressado anteriormente acerca dos Princípios alquímicos. Como se pode
observar, uma das colunas é ativa (+) –ou positiva, ou masculina–, e a outra
é receptiva (–) –ou passiva, ou feminina–, enquanto a terceira, ou eixo
central, eqüidistante de ambas, é neutra e permanentemente as conjuga. À
energia ativa corresponde a Coluna da Força, composta, como podemos ver,
pelas sefiroth Hokhmah (2), Hesed (4) e Netsah (7). À energia passiva, a
Coluna da Forma, que está composta pelas sefiroth Binah (3), Gueburah (5)
e Hod (8). A coluna ou pilar central ou axial, constituída pelas sefiroth
Kether (1), Tifereth (6), Yesod (9) e Malkhuth (10), é neutra, e perenemente
realiza a assimilação dos contrários, dando lugar a novas possibilidades de
desenvolvimentos indefinidos. É chamada pilar ou Coluna do Equilíbrio.
Esta é a imagem da ordem permanente da Criação, segundo a Cabala.

12 A TRÍADE
A forma geométrica do triângulo eqüilátero também pode simbolizar o dito
anteriormente sobre a Alquimia e a Árvore Sefirótica, pois toda idéia
manifestada pelo símbolo pode ser expressada não só pelas figuras
geométricas e pelos números, mas também por um ritmo, um gesto ou um
som. Os Princípios Universais, representados pela tríade superior da Árvore,
estão sintetizados também pela figura do triângulo eqüilátero, pois ela
mostra instantaneamente as energias-força contidas na Idéia, revelando-nos
assim seu conhecimento e as indefinidas sugestões a que dá lugar.

Este triângulo pode igualmente ser transposto aos conceitos de Criação,


Conservação e Destruição (ou melhor, Transformação), presentes em todas
as cosmogonias tradicionais, por exemplo, na tradição hindu, onde esses
Princípios conformam a Trimûrti, manifestada por Brahmâ, Vishnu e Shiva.

Também no símbolo da roda encontramos uma triunidade1 de conceitos,


expressados da seguinte maneira:

Este mesmo pantáculo (ou "pequeno todo") manifesta, localiza e valida o


homem na criação, como intermediário e vínculo das energias cósmicas:

Referente diretamente à Árvore da Vida, damos este outro diagrama, que de


um só golpe de vista nos mostra a irradiação do Princípio no seio da criação,
ou seja, a das energias que a Árvore Sefirótica simboliza, adotando o Centro,
ou ponto virtual do círculo, como o imanifestado, e a circunferência, ou
periferia, como sua manifestação:

1
N.T. – A palavra “triunidad” em espanhol não tem correspondentes em português. Por
este motivo foi traduzida como “triunidade” para que não se perdesse sua significação
mais profunda.

13 MITOLOGIA
Os mitos, junto com os símbolos e com os ritos, constituem a trilogia
sagrada e reveladora com que os povos arcaicos e as civilizações da
Antigüidade expressaram toda sua cultura, seu próprio ser. Se o símbolo
representa a "fixação", numa determinada substância, de um Pensamento ou
Idéia arquetípica, e o rito não faz senão pôr em movimento através do gesto
ritmado e generativo a energia do símbolo, o mito evoca o tempo das origens
primordiais e sacras dos povos, bem como as gestas e façanhas dos heróis e
deuses civilizadores que os criaram. Na origem de qualquer civilização,
religião ou cultura, sempre existe um Ser mítico, um deus feito homem ou
um homem transfigurado em deus, que lhes revela as ciências e as artes
sagradas. Sendo assim, e segundo nos diz a Tradição Unânime e Universal, o
relato mítico é um ensino que transmite, utilizando a linguagem emotiva da
poesia, uma história "exemplar", uma história-modelo a ser imitada pelos
homens. Neste sentido, diremos que todo relato mítico desperta uma emoção
intelectiva que aflora das profundidades mais recônditas de nosso ser,
transladando-nos, por seu intermédio, a um tempo onde o profano, linear e
sucessivo não existe. O tempo mítico é em verdade um não-tempo, no
sentido ao menos em que o computamos de ordinário, o que quer dizer que
está ocorrendo sempre, neste mesmo instante, pois na realidade do Ser
Universal também existem origens atemporais.

Viver o mito é voltar a recuperar a "memória" de nossa origem não-humana


(a anamnesis ou reminiscência Platônica) onde tudo é novo e virginal, e a
idéia de anterior e posterior fica anulada por um presente sem duração
cronológica possível. Utilizando a analogia simbólica, frente ao poder
destruidor e dissolvente do tempo horizontal, que vem num fluxo e refluxo
perene, o acontecimento mítico possibilita uma ponte vertical que se enlaça
com uma ordem de realidade diferente, supra-histórica por sua própria
natureza. A mensagem que se desprende dos mitos é, pois, algo relacionado
com o processo cosmogônico, com a criação do mundo a partir de um caos
primitivo. Em nosso próprio trabalho interno, podemos advertir este
processo arquetípico no ordenamento que se vai implantando em nossa
confusa psique quando se produz o entendimento das Idéias expressadas
pelo ensino da Ciência sagrada, levando-as posteriormente à sua efetivação
prática, vivenciando-as e as experimentando na própria cotidianidade.
Advirtamos, por último, que as lendas iniciáticas e esotéricas, e num grau
menor, os contos e fábulas que pervivem no folclore popular, são outras
tantas formas que adota o relato mítico para expressar verdades universais.

14 NOTA:
Talvez haja conceitos que por inabituais nosso leitor rejeite. No entanto,
insista neles e trate de relacioná-los com outros presentes nesta mesma
Introdução. Quiçá em outras ocasiões lhe resulte estranho a linguagem em
que se encontram expressados, já que a analogia se representa por imagens
e configura uma poética sempre presente. Trate de assimilar e fazer sua esta
linguagem própria do discurso da vida, da arte e da magia. Pense na
possibilidade de que por meio deste trabalho possa aceder às raízes das
coisas e ao seu entendimento cabal, a par que amplia seu panorama interno
através de uma atitude de acréscimo, cultivo e superação de suas
possibilidades pessoais. Por outra parte, esta atitude, que se refletirá
inconscientemente em outros âmbitos de você mesmo, igualmente lhe
ajudará a triunfar sobre os momentos em que se apresenta, como uma crua
realidade, sua solidão. Ou você se permita sentir compaixão de si mesmo.

15 HERACLES-HÉRCULES
Esta figura, protótipo do herói triunfante, do homem que através de uma
série de esforços e aventuras consegue "divinizar-se", ou melhor, retornar a
suas origens divinas (já que é filho de Zeus-Júpiter), é talvez a mais
importante e exemplificadora da Antigüidade greco-latina. Sua simbólica
inclui não só os doze famosos trabalhos e provas em que deve realizar as
exigências de Hera-Juno, a contraparte feminina de Zeus-Júpiter (este
último, símbolo do espírito fecundador), senão igualmente uma série de
fabulosas vitórias que correm casadas com suas nutridas fraquezas. Esta
oposição entre as energias masculinas, celestes e espirituais, e as femininas,
terrestres e materiais, prefiguradas pelo casal olímpico Zeus-Hera (Júpiter-
Juno para os romanos), marcará a vida de Heracles-Hércules, nascido
humano e que, por meio dos combates purificadores de toda sua existência, é
recebido no Olimpo como o filho preferido de seu Pai celestial, em razão do
continuado sacrifício mediante o qual não só venceu a inumeráveis inimigos
externos, senão que pôde sair vitorioso dos combates internos contra suas
indefinidas tendências para a densidade, reflexo de seus inumeráveis egos,
antes de aceder ao conhecimento e à paz, emblemas da imortalidade da alma
e da vida eterna que finalmente consegue por seu espírito combativo,
sublimado pela busca constante do Espírito e da Verdade, através de um
percurso limitado por erros, retificações e conquistas.

Narrar os trabalhos, façanhas e aventuras deste herói levaria pelo menos um


volume. Limitar-nos-emos a dar aos leitores alguns dos elementos da rica
simbólica deste personagem mítico, lembrando que todos seus infortúnios e
quedas são provocados por Hera, imagem de seus impulsos destruidores e
descendentes, já que esta divindade lhe amaldiçoou pelo fato de ser filho de
seu esposo Zeus (o espírito ascendente), que lhe foi infiel ao procriar a
Heracles fora de seu olímpico casamento, razão pela qual o herói humano
deve ser objeto de sua vingança e sua nefasta influência. É importante
lembrar que o nome Heracles significa "a glória de Hera". Assinalaremos
que todos estes "trabalhos" ou combates têm o discurso de um poema
continuado e se referem à purificação do espírito graças à vitória sobre os
escuros impulsos "materiais", ou seja, entre a oposição e a complementação
do mais sutil e do mais denso.

Em suas primeiras ações Heracles domina o javali de Erimanto, vence ao


touro de Creta e afoga ao leão de Nemea. Todos estes animais simbolizam as
forças vivas das paixões, às quais o herói deve se impor sem as negar, já que
as deve enfrentar como obstáculos em seu caminho. Igualmente subjuga a
rainha das amazonas, ou seja, a sua parte passiva e escura, um de seus egos
inestáveis. Também mata a hidra de Lerna, imagem desses egos serpentinos
aos que é quase impossível cortar a cabeça, trabalho que se lhe facilita por
ter anteriormente limpado do esterco as cavalariças de Augias. Logo, impor-
se-á sobre o gigante Gerião e sobre Anteu e Diomedes, símbolos da
bestialidade e do antiespiritual, e pode assim caçar os emissários celestes, os
pássaros do lago de Estinfalo, o que lhe permitirá obter vivo ao veado dos
pés de bronze, imagem da ligeireza, leveza e rapidez. Finalmente, chega ao
jardim das Hespérides, onde obtém o fruto áureo de seus esforços, o que lhe
facilita dominar o cachorro-monstro de três cabeças, Cérbero, guardião do
Tártaro (como o dragão em outras tradições), último de seus obstáculos no
caminho da reintegração ao Si Mesmo.

fig. 2

16 CABALA
A Cabala ensina que as energias percorrem a Árvore da Vida desde a
Unidade, Kether, marcada pelo número um, até a manifestação formal e
substancial, o mundo e a matéria tal qual os conhecemos e os percebem os
sentidos. Estes fluxos de energias, ou vibrações, quase imperceptíveis, são
chamados emanações, e conformam qualquer manifestação, seja qual for o
gênero, a espécie, forma, o tipo ou a dimensão em que ela se expresse. As
energias das sefiroth –todas elas invisíveis, menos Malkhuth, síntese e
recipiente de toda a Árvore– realizam um caminho descendente sucessivo
desde a unidade (1), Kether, até a década, a Terra, ou o Mundo, Malkhuth
(10), que é um reflexo invertido de Kether (10=1+0=1). As demais sefiroth,
ou numerações, são tomadas como intermediárias entre a imanifestação e a
manifestação. E se as considera como os distintos aspectos, ou atributos, de
uma só e mesma energia, tal qual as formas que tomasse um fio de água ao
baixar da montanha (manancial, ribeiro, remanso, cascata, afluente, rio, etc.)
até chegar ao mar.
17 ETIMOLÓGICAS
Um tema de interesse, e que amplia nosso campo investigativo, é o da
etimologia das palavras. As origens culturais são sagradas, já que um deus
ou uma deusa patrocina e revela sempre as artes, as ciências, as indústrias, a
organização, etc., e isto é unânime para todos os povos. Também a
linguagem foi ensinada aos homens num tempo mítico. Por isso, ao homem
foi dada a potestade de nomear, ou seja, de recriar, já que os nomes, para a
Cabala e o esoterismo em geral, designam a essência das coisas; e esta
potestade do Verbo se encontra implícita em toda linguagem. Isto quer dizer
que não há dissimilitude entre a coisa e seu nome, já que este significa a
realidade da coisa, a energia que esta representa e que o nome confirma e
revela. Não é, pois, a língua uma convenção, nem as palavras jogos
artificiais ou primitivos balbucios, que manifestam exclusivamente
necessidades "físicas" ou utilitárias. As origens das palavras são
importantíssimas e iluminadoras, pois as raízes de onde provêm, bem como
os diferentes sentidos que elas têm, ou podem ter, e as relações a que estas
analogias nos levam, configuram um estudo revelador acerca dos conceitos
de onde elas derivam, que por seu uso profano se desgastaram e perderam
assim seu imenso valor evocador e anímico, até se fazerem consumíveis e
insignificantes. Um simples dicionário que traga a etimologia das palavras é
tudo o que precisamos para começar nossa busca de raízes e origens, que nos
proporcionará mais de uma bela e agradável surpresa. Também, e em outro
sentido, averiguar o significado de nosso nome profano, o porque o levamos,
e a biografia daquele ou daqueles que se chamaram com o mesmo símbolo
apelativo. Por outra parte, na vida cotidiana há concatenações de palavras
relacionadas com a Astrologia, a Alquimia, a Cabala, a Magia, a Metafísica,
etc. Os dias da semana constituem um exemplo evidente: Segunda-feira
(lunes) = Lua, Terça-feira (martes) = Marte, Quarta-feira (miércoles) =
Mercúrio, Quinta-feira (jueves) = Júpiter, Sexta-feira (viernes) = Vênus,
Sábado = Saturno, Domingo = Sol (em inglês Sunday) (*).

(*) N.T.: Os nomes dos dias da semana, em espanhol, fazem a evocação referida pelo
Autor. Tal característica, contudo, se perde na tradução em português. Contudo, entre
parênteses, foram mantidos os nomes em espanhol para a devida comparação.

18 CABALA
O modelo da Árvore da Vida Sefirótica ordena de maneira prototípica as
forças verdadeiras que constantemente produzem o fato criacional, ou seja, o
descenso das emanações espirituais que conformarão posteriormente aquilo
que vulgarmente chamamos matéria, ou plano físico, ou hylico. Portanto,
graças à familiarização com estas energias, ou seja, com sua apreensão, pode
se tecer o sentido analógico de vibrações e correspondências que mantêm,
entre si, ligado o Universo em seus aspectos visíveis e invisíveis, materiais
ou imateriais, com o propósito de ascender a outros planos de identificação
com o Ser Universal por meio dos veículos Herméticos e da doutrina
tradicional. Na continuidade, oferecemos outras correspondências
astrológicas e alquímicas do diagrama. Também incluímos nele o En Sof
(Sem Fim), que se acha acima de Kether, simbolizando o Não-Ser, o
autenticamente metafísico e supra-cósmico, inclusive o não manifestado nem
sequer como Princípio.
Com o objetivo de ir "carregando" às esferas da Árvore da Vida com idéias
que sirvam de suporte à meditação e promovam a realização, queremos
adicionar alguns elementos referentes a suas relações astrológicas, que nos
ajudarão a compreendê-los melhor. Elas estão vinculadas com as nove
esferas da Cosmogonia tradicional, sete delas correspondentes aos planetas.

En Sof, o Não-Ser, assimilado pelos cabalistas muitas vezes ao Nada supra-


essencial, ou seja, à Vacuidade, encontra-se além do firmamento, e a ele se
chega atravessando Kether, a quem se pode atribuir o simbolismo da estrela
polar, como Porta dos Deuses, verdadeira pedra filosofal da qual pende o
prumo do Arquiteto do Universo. Este astro reina no empíreo, lugar do fogo
puro e eterno, lugar do céu em que os arcanjos, anjos e bem-aventurados
gozam da presença perene da Suprema Deidade, pois nele converge o eixo
central, sendo as estrelas fixas e incorruptíveis assimiladas a Hokhmah. A
Binah se lhe relaciona com Saturno ou Cronos, o Tempo Vivo e sempre
presente, que devorando seus filhos, a criação inteira, regenera-a
perenemente e faz possível que os seres manifestados regressem a sua
imanifestada morada eterna, sendo este o pai de Zeus ou Júpiter –Rei do
Olimpo– que como Hesed governa e legisla a Criação inteira. Gueburah, o
rigoroso destruidor, é assimilado a Marte, deus guerreiro. E Tifereth, a
Beleza divina, Centro dos Centros, relaciona-se claramente com o Sol,
doador da vida, luz e calor, através do qual acedemos àqueles mundos
superiores.

Os três planetas interiores, que se encontram, com relação à Terra, mais


próximos do que o Sol, e cujos ciclos são mais rápidos, são colocados no
mundo de Yetsirah, e se relacionam com as esferas deste plano. Netsah,
como já sabemos, corresponde a Vênus, deusa do Amor, amante de Marte, a
quem "desarma" pelo delírio passional. Ela, como as Musas e as Graças, é
inspiradora dos artistas, e dá a vitória aos que a compreendem, sendo então
emissária da beleza e da união. Hod é relacionado com Hermes-Mercúrio, o
rápido mensageiro alado dos deuses, que distribui na Terra seus ensinos e
sinais. É representado com asas nos pés, que se referem a sua velocidade e a
sua relação com o que voa. E, por isso mesmo, com o símbolo do Caduceu,
as duas serpentes que ascendem pelo eixo vertical, que têm um par de asas
que nos indicam seu aspecto volátil. Este último passou a ser o símbolo da
medicina, pois como dissemos Hermes-Mercúrio –e os deuses, anjos e
espíritos que se lhe relacionam– foi sempre considerado como um médico de
corpos e almas, o curandeiro divino, promotor dos ritos e da morte iniciática,
graças à qual recuperamos a saúde. Finalmente, a Yesod se lhe relaciona a
Lua, a rainha da noite que, unanimemente, foi vinculada com a mãe celeste,
a ilusão das formas as águas inferiores e os mares –bem como com todos os
líquidos– e sobretudo com a fecundação e a fertilidade que se concretiza na
Terra.

19 EXERCÍCIO PRÁTICO:
Desenhe uma Árvore Sefirótica. Carregue-a com concentração e paciência,
ou seja, trabalhe-a utilizando os conhecimentos e energias rudimentares que
obteve até agora. É oportuno dizer que os símbolos "despertam" quando se
os começa a invocar, e que as energias latentes neles começam a se revelar
em nós na medida em que estamos construindo uma via entre nosso ser e as
realidades que eles expressam. Por outra parte o símbolo, como expressão
da Idéia arquetípica, tem uma realidade própria, revelada àqueles que
puderam compreendê-lo, que por sua vez carregam a este símbolo com a
própria vivência. A vivificação do símbolo tem também uma leitura
terapêutica em cada um dos níveis em que se expressa: físico, psíquico e
intelectual-espiritual.

20 ASTROLOGIA
Vêem-se aqui algumas características a respeito dos sete
planetas que, como já vimos, articulam-se perfeitamente
no diagrama cabalístico:

SATURNO: Saturno é o planeta mais afastado da terra, mas também o mais


elevado. Na astronomia judiciária (Astrologia) costuma-se vê-lo como lento
(efetivamente o é) e pesado (a Alquimia o equipara ao chumbo) e, portanto,
é associado à velhice em seus aspectos negativos, em oposição com a
agilidade e ductibilidade de mercúrio. No entanto, e pese que as vibrações
deste astro são percebidas psicologicamente como um estado de melancolia
e desassossego espiritual, é o preâmbulo de realizações profundas, ligadas ao
que está mais além, ao mais elevado, misterioso e oculto. A experiência e a
inteligência são alguns de seus atributos que devemos relacionar igualmente
com a velhice, e inclusive com a Antigüidade. Todos os planetas têm um
aspecto maléfico e outro benéfico, tal como cada uma das sefiroth: uma
metade luminosa que olha para Kether, e outra escura que olha para
Malkhuth.

JÚPITER: Entidade benéfica e generosa; Pai dos deuses e filho de Saturno,


esta precedência nos está dando não só a idéia de energias que se
estabelecem hierarquicamente, senão também a de uma ordem invariável.
Alimenta constantemente a fogueira da vida, e seus eflúvios regeneradores
procriam continuamente novos seres, idéias e coisas, sem mais limitações do
que o exercício que às vezes provê com sua arma: o raio.

MARTE: Marte destrói no palco do Mundo tudo o que já é inútil e


desnecessário, ainda que a simples vista não seja sempre claro seu papel
regenerador. Deus da guerra, imprescindível para uma perpétua renovação
universal, sua influência pode advertir-se não só nas lutas humanas senão
igualmente nas perpétuas batalhas macrocósmicas.

SOL: É o intermediário direto entre o imanifestado e a manifestação. Sua


energia, extraída do mais oculto das possibilidades do céu, é projetada sobre
o plano da criação, produzindo todas as coisas manifestadas, das quais é o
Pai a nível criacional, incluído o homem. Sua energia radiante e sua
localização central são imprescindíveis para a vida, à qual sela e
conforma.

VÊNUS: Conhecida deusa do Amor, encarrega-se nada menos que unir aos
fragmentos dispersos do ser e do universo. Em seu aspecto mais alto se
relaciona com os mistérios espirituais e místicos do amor, e o coito com os
deuses. Seu aspecto mais baixo se acha em relação com a personalidade e se
expressa pela posse do outro e a energia genital.

MERCÚRIO: Emissário dos deuses, suas energias são assimiladas pelos


mortais como revelações que sua versatilidade imprime na inteligência. É,
portanto, um iniciador e sua rapidez mental –prata viva– permite-lhe
valorações intuitivas imediatas, que às vezes podem nos complicar; lembre-
se que, por isso mesmo, é o númen de charlatões, comerciantes, e inclusive
ladrões.

LUA: Astro evidente e noturno, está relacionado com a Terra –da qual ela é
uma imagem celeste–, com a fecundação e com a potência essencial dos
eflúvios vitais. Sua identificação com as águas e com a obscuridade resultam
singelas de compreender. Preside a noite, e sua débil luz, e a periodicidade
de seus ciclos, anunciam-nos a presença de outras realidades ocultas, mais
além dos fenômenos psíquicos que constituem seu reinado.

TERRA: Nela amadurecem as energias dos astros que concretizam a


"matéria" do mundo. Portanto, é símbolo da densidade e da atração da
gravidade para “baixo”. Em seu seio bulem energias análogas às das estrelas
e em sua cratera se cozinham as coisas mais evidentemente substanciais..

21 ALQUIMIA
Os 4 Elementos - É conhecida a divisão em quatro elementos que a
Antigüidade greco-romana estabeleceu em suas cosmogonias. Como nossos
leitores sabem eles são Fogo, Ar, Água e Terra, e se encontram presentes em
tal ou qual proporção em tudo aquilo que consideramos como matéria. Aliás,
estes elementos formam uma corrente, ou série sucessiva, já que o Fogo se
equipara ao princípio vital que o Ar transporta e a Água difunde, até se
concretizar na Terra. Há, por isso mesmo, distintas relações entre estes
elementos, a ponto de que a série pode alterar sua ordem, inclusive invertê-
la. E assim vemos que a Terra, equiparada ao sólido (gelo) pode se
liquidificar, para logo se evaporar e transformar-se em Ar (hálito vital)
emanado diretamente do Fogo (elemento radiante), verdadeiro agente
criacional, mediante sua dupla manifestação: luz e calor. Deve-se apontar
que estes elementos encontram em sua ronda um denominador comum ao
qual se referem e que é a sua essência, da qual dependem. Esse elemento
misterioso do qual os princípios radiante, aéreo, fluídico e compacto
dependem –já que é sua origem perpétua–, e que por sua vez os sintetiza, é
chamado pelos alquimistas quintessência. Aliás, o Fogo é seu primeiro
representante, já que toda ação cozinhada no Atanor ou cratera, tanto do
macro como do microcosmo, precisa de sua participação, capaz de gerar e
também de destruir, às vezes completamente. Pelo que um uso atinado e,
sobretudo, regulado deste elemento é imprescindível em qualquer operação
alquímica, já que todas elas, divididas em dois grandes temas, dissolver e
coagular, efetuam-se a partir da quantidade de fogo (luz e calor) utilizada ou
não em diferentes procedimentos transmutatórios.

Deve-se acentuar que estes "elementos" aos quais nos referimos não são
estritamente materiais, senão símbolos de Princípios Universais e não
substâncias concretas tomadas em sentido literal. Devemos esclarecer que
isto também é válido para os sete metais, identificados com os sete planetas
astrológicos, com os quais a Alquimia trabalha, já que tanto o ferro como o
mercúrio, etc., excedem os limites de sua designação com relação ao que
ordinariamente se entende por estas nomenclaturas.

Também se costuma combinar amiúde os três princípios alquímicos,


Enxofre, Mercúrio e Sal, com os quatro elementos, e de diversa forma. Em
Aritmosofia isto se expressa assim: 3 + 4 = 7; 3 x 4 = 12. Resulta óbvio que
esta formulação está ligada à simbologia astrológica e, portanto, também a
ritmos e ciclos que da mesma forma obedecem a Princípios Universais.
22 CABALA
Quando nas diversas tradições se fala de deuses, nomes divinos, arcanjos e
anjos, em realidade se está fazendo referência a determinadas energias
intermediárias que, de modo escalonado, situam-se entre a Unidade
Suprema, verdadeiramente imanifestada, e a variedade indefinida de suas
manifestações fenomênicas. Na Cabala, estas energias, ou atributos divinos
como já vimos, são as sefiroth, cujo desenvolvimento constitui o que se
costuma chamar de “Doutrina das Emanações”. Como sabemos, as sefiroth
percorrem a Árvore da Vida de cima para baixo, do mais sutil ao mais denso
e grosseiro, conformando a própria estrutura do Cosmo, dividida em quatro
planos ou níveis hierarquizados, que o homem pode vivenciar em si mesmo
através de sua realidade física, psicológica e espiritual.

Estes quatro planos começam com o mais alto, Olam Ha Atsiluth, que
significa Mundo das Emanações, e a ele pertencem as sefiroth Kether (1),
Hokhmah (2) e Binah (3). Esta triunidade de princípios compreende às
realidades ontológicas, referidas ao conhecimento do Ser Universal,
precedendo, portanto, à manifestação e progressiva solidificação de todas as
coisas. As energias mais invisíveis e profundas emanam desta tríade
suprema, que começa a se manifestar a partir do Mundo da Criação, Olam
Ha Beriyah, constituído pelas sefiroth Hesed (4), Gueburah (5) e Tifereth
(6). Como seu próprio nome indica, neste Mundo são geradas as primeiras
formas criacionais em seu aspecto mais sutil e informal, manifestadas através
do Mundo das Formações, Olam Ha Yetsirah, constituído por sua vez pelas
sefiroth Netsah (7), Hod (8) e Yesod (9). Esse processo de emanação finaliza
no Mundo da Concreção Material, Olam Ha Asiyah, constituído só pela
sefirah Malkhuth (10), que de toda a Árvore é a única visível e perceptível
aos sentidos, sendo a partir dela que começa nosso processo ascendente de
retorno à Unidade.

Na continuação, vê-se a Árvore Sefirótica dividida nos quatro mundos


cabalísticos, relacionados igualmente com os elementos alquímicos
recentemente tratados:

Estes quatro mundos, planos ou níveis, podem igualmente ser considerados


como três, já que Beriyah (Mundo ou Plano da Criação) e Yetsirah (Mundo
ou Plano das Formações) podem ser tomados como um só. Beriyah
corresponderia ao que a Antigüidade denominou “Águas Superiores”, e
Yetsirah às “Águas Inferiores”, que estão separadas –e unidas– pela
“superfície das águas”, tal e qual aparece no gráfico. As primeiras se
vinculam com o elemento ar e são consideradas como constitutivas da
abóbada celeste, e as segundas com o elemento água, conformando os rios e
os oceanos, unidas ambas na linha do horizonte. Estes dois planos podem ser
tomados como um único nível e correspondem à intermediação entre o
primeiro (Atsiluth) e o último (Asiyah). É neles onde se realiza todo o
trabalho interno e hermético. Por isso mesmo, estas seis sefiroth chamadas
em Cabala de "construção cósmica", correspondem-se no ser humano com
seu psiquismo superior (Beriyah) e o inferior (Yetsirah).

Desta forma, deve se ter presente que em cada plano há uma Árvore
Sefirótica completa: uma no mundo de Asiyah, outra no de Yetsirah, outra
mais em Beriyah, e finalmente outra no de Atsiluth. Nossa visão da Árvore
Cabalística adquire então tridimensionalidade, ou seja: podemos visualizá-la
(sem que por isso perca sua unidade essencial) em quatro níveis de leitura,
que estão em todas as coisas, inclusive em nós mesmos. Também os textos
sagrados e revelados de todas as tradições admitem ser lidos desta maneira.
Ditos níveis são, pois, graus hierarquizados de conhecimento. Por agora,
trabalharemos com a Árvore no nível de Asiyah, ou seja, da sefirah
Malkhuth, o plano físico e da concreção material, que é o do homem
condicionado por suas identificações egóticas e de seus sentidos, e daí,
invocando Kether, ascenderemos gradualmente por distintos mundos, do
mais grosseiro ao mais sutil, da casca ao núcleo, o que nos permitirá
conhecer outros estados de nossa consciência, que desta maneira vai se
universalizando, até sua plena identificação com o Ser, o Adam Kadmon ou
Adão Primordial.

Nota: É de rigor, e como exercício importante, aprender e memorizar estes


nomes em hebraico e português, bem como a disposição das sefiroth que
constituem a Árvore. Desenhe este diagrama várias vezes sobre o papel e
trate de reter uma imagem clara do mesmo.

23 A INICIAÇÃO
A Iniciação nos Mistérios supõe uma completa transmutação que terá de se
operar gradualmente no adepto, em diversos níveis, durante o caminho para
o conhecimento de si mesmo; é uma via gradual na qual se conhecerão,
pouco a pouco, os distintos estados do ser.

O termo "iniciação", derivado do latim initium, significa "começo" e também


"entrada". Por um lado, supõe o início de um processo de conhecimento da
realidade Metafísica e, por outro, o ingresso num caminho verdadeiramente
espiritual que terá de conduzir a uma real "deificação" daquele que o possa
empreender e continuá-lo até o fim.

O iniciado deverá morrer para o mundo profano e ilusório e perder a falsa


identidade com seus aspectos puramente individuais, passageiros e mortais, e
simultaneamente ressuscitará para um mundo sagrado e verdadeiro que lhe
identificará melhor com o real e imutável, com aquela essência pura e
imortal que constitui seu verdadeiro Ser. Este percurso supõe uma viagem
interior, e irá acompanhado do conhecimento de outros mundos que estão
aqui e agora, mas que a mente ordinária nem sequer pode imaginar.

Para que a Iniciação ocorra, será necessário que o adepto permita que os
símbolos e ritos sagrados, proporcionados pela doutrina da Tradição
Unânime, penetrem em seu interior e operem essa transformação integral,
que terá que se produzir quando estes instrumentos despertadores da
consciência ordenem a inteligência e toquem as fibras mais sutis e
imperceptíveis que se conectam com as verdades eternas. Ela comporta um
desenrolar de potencialidades ocultas e misteriosas, que jazem em nossa
própria interioridade, e um desenvolvimento das possibilidades
verdadeiramente espirituais, que no estado ordinário se encontram
adormecidas. O estudo dos códigos simbólicos tradicionais –como aqueles
que são proporcionados por nosso Programa–, bem como a meditação e a
concentração –e a prática dos rituais iniciáticos–, serão veículos adequados
para que esta transmutação e despertar da consciência sejam produzidos e se
substituam progressivamente os apegos e as falsas identificações por aquilo
que se denomina a Suprema Identidade.

Este processo, simbolizado claramente pela transmutação dos metais que


propõe a Alquimia, bem como pelas diversas etapas contempladas no
simbolismo construtivo, supõe duas fases: a primeira delas é chamada
iniciação virtual e vai desde o começo da Obra até a consecução do estado
de "homem verdadeiro", passando por diversos graus que suporão a
superação de provas que terão de determinar se o candidato está qualificado;
a segunda –chamada Iniciação real ou efetiva– supõe o conhecimento e a
experimentação de estados supra-humanos e atingir o estado de “homem
transcendente".

O candidato à Iniciação é como uma semente que, contendo todas as


possibilidades de desenvolvimento e procriação, não as poderá plasmar
enquanto não penetrar o interior da terra –a caverna iniciática–, descendo aos
infernos e morrer, para nascer de novo. É por isso que o recém iniciado é
chamado "neófito", ou planta nova (neo = nova; fito = planta), pois já venceu
a primeira morte e está pronto para empreender seu desenvolvimento vertical
e ascendente.

Esta morte comporta uma completa dissolução dos estados anteriores, que
deverá ser repetida cíclica e gradualmente –em diversos níveis cada vez mais
sutis e elevados– durante o curso do processo iniciático, até que renasça o
homem novo, o homem verdadeiro, totalmente regenerado, que terá
desenvolvido o leque de suas possibilidades humanas e estará pronto para
transcender aos estados supra-individuais e recobrar seu verdadeiro Ser. Terá
assim retornado ao estado virginal das origens, à pátria celeste.

Não queremos terminar sem dizer algo muito importante para se ter em
conta no processo iniciático ou de conhecimento: o de não confundir o plano
psicológico com o espiritual, erro que é muito freqüente hoje em dia. Isto
acontece porque o espiritual foi negado ao se fazer uma diferença cortante
entre alma e corpo, outorgando-se-lhe então a tudo o que não é material, ou
corporal, uma categoria espiritual, ou pseudo-espiritual.

24 A ANALOGIA
O Selo Salomônico. A realidade, sendo una e universal, apresenta-se, no
entanto, a nossos olhos como múltipla e fragmentária, particular, efêmera e
limitada. Esta visão de "superfície" implica, aliás, numa dualidade que
convém resolver, já que como tal não poderia realmente subsistir, estando
em si mesma dividida. As analogias e correspondências simbólicas são os
laços que permitem articular, dentro de uma mesma esfera inteligível, duas
realidades, estados ou mundos aparentemente díspares e inconexos. A
conhecida figura do Selo Salomônico, ou Estrela de David, sintetiza
esotericamente esta realidade, o desenrolar integral do Cosmo através da
cópula indissolúvel dos dois aspectos polarizados e complementares de uma
mesma entidade Universal. A projeção triangular dos princípios universais
do Ser (triângulo superior) no "espelho das águas" ou substância universal
(triângulo inferior) produz a "reflexão cósmica" de todas suas possibilidades
existenciais, o mundo em sua indefinida variedade e continuidade.

No caso do símbolo da cruz, a oposição dos dois triângulos que, no fundo, é


uma complementação onde se resolvem as contradições, produz-se de duas
em duas, dando lugar às leis da simetria no homem e no Cosmo.

As inter-relações dos símbolos entre si promovem processos mentais, nos


que se geram códigos para a comunicação, vale dizer para a recepção e
transmissão de mensagens, dando lugar ao discurso do mundo e do homem.

Assinalaremos também que o Selo Salomônico se encontra presente em


tradições tanto do Oriente como do Ocidente, e na Tradição Hermética é um
dos símbolos que melhor grafam a conhecida sentença da “Tábua de
Esmeralda”, fundamento das leis da analogia e das correspondências: "o que
está acima é como o que está abaixo, o que está abaixo é como o que está
acima". Deve-se ter em conta, ainda, uma preeminência hierárquica do de
cima (o Céu) com respeito ao de baixo (a Terra), pois como dissemos, o
triângulo inferior (invertido) é um reflexo do triângulo superior (direito).

Cabalisticamente o valor numérico deste símbolo é 6 (3 + 3), o que o põe em


relação com a sefirah Tifereth que, como sabemos, constitui o coração e o
centro da Árvore da Vida, pois nela confluem, entrelaçam-se e se equilibram
as energias das sefiroth restantes. Por isso, também é considerado um
símbolo da harmonia e da síntese, que se fazem presentes em nosso interior
quando nos abrimos às verdades eternas e nos deixamos fecundar por elas.
Lembraremos, neste sentido, que o triângulo invertido deste "Selo" é
precisamente um dos símbolos do coração e da copa, recipiendários dos
eflúvios celestes.

25 ALQUIMIA
Já dissemos que toda a transmutação alquímica, seja material, psicológica ou
espiritual, é produzida pelo fogo. Quem aspira ao Conhecimento tem de
saber que seu fogo interior –a sede pela Verdade e seu amor a ela– tem que
ser constante e contínuo, ou seja, que não se acenda tanto que por sua causa
arda e se perca nosso ânimo, e também que não diminua a ponto de se
apagar. É o delicado jogo dos equilíbrios de que falavam os alquimistas
medievais e renascentistas, os quais também aconselhavam que em todas as
operações deviam prevalecer as virtudes da paciência e da perseverança. Na
manutenção desse fogo e no controle natural de sua potência, radicam os
princípios fundamentais da Alquimia. Não obstante, para harmonizar essas
energias é imprescindível conhece-las e experimentá-las, sem negá-las nem
dá-las por supostas. Muito pouco sabe o homem ordinário do conhecimento
de outras realidades e de si mesmo, mesmo no mais elementar. Considera
que sua "personalidade" (quer dizer, seus egos, fobias e manias) é sua
verdadeira identidade, sem perceber que extraiu esses condicionamentos do
meio, de modo imitativo, carente de significado e de transcendência.

A Ciência Sagrada representa uma guia e um caminho que existe para


canalizar nosso processo para o Conhecimento. O aprendiz alquimista tem
de compreender que a mente condicionada não pode consigo mesma, e que é
necessário reconhecer nossa ignorância, que muitas vezes não é senão
afeição a descrições da realidade puramente ilusórias, por meio das quais
organizamos nossa existência. A Doutrina Tradicional constitui uma garantia
neste sentido, pois facilita e concentra a manutenção desse fogo interno
através do entendimento gradual que em nossa aprendizagem vamos obtendo
de seus ensinos.

26 A ÁRVORE DA VIDA
Queremos aqui insistir sobre o mandala da Árvore Sefirótica com a qual
trabalhamos. Sugere-se efetuar ritualmente a construção de uma nova árvore
por sua mão e carregar nela todos os elementos que foram mencionados até o
momento. Igualmente tem que se buscar memorizar os nomes, sua tradução,
as equivalências entre distintas disciplinas, e se exercitar nelas. Tome lápis e
papel e se concentre neste trabalho. Pode também levá-lo ao tridimensional.
Os nomes hebreus das sefiroth têm um sentido mágico e teúrgico que excede
sua simples tradução à língua profana. Estes nomes de poder devem ser
memorizados corretamente e invocados em alta voz, seja de maneira
metódica, ou quando se julgue oportuno em relação a fatos e momentos
cotidianos. Por esta razão, localizar determinados acontecimentos externos e,
sobretudo, realidades internas nos distintos níveis de si mesmo, são
atividades sumamente convenientes. Cada plano, mundo ou nível de
consciência corresponde a uma realidade íntima que vai do mais periférico,
concreto e conhecido (Asiyah), ao mais sutil, invisível e desconhecido
(Atsiluth). Estas divisões do diagrama plano são também mundos ou níveis
que os homens portamos dentro de nós. Do conhecido e grosseiro ao
profundo e desconhecido.

Para finalizar, oferecemos uma divisão tradicional dos planos da Árvore da


Vida em tríades. O leitor deve buscar observar atenciosamente o modelo e
gravá-lo dentro de si, sem pretender extrair conclusões racionais. Os efeitos
deste aprendizado são vividos de modo secreto, e a Alquimia cabalística se
efetua no jardim químico da mente e, sobretudo, no mais íntimo do coração.
Não se pode pretender com os conhecimentos que atualmente possuímos ter
uma idéia clara do processo no qual se está envolvido.

Nota: Observe-se que os três planos superiores são equivalentes a três


tríades, ficando a última sefirah (Malkhuth), exclusivamente em conexão
com o plano de Asiyah. Daremos uma última correspondência. A que
relaciona às sefiroth da Árvore com as distintas partes do corpo humano,
divisão comum a distintas Tradições e que no Ocidente se expressa
particularmente desde a Idade Média. Lembraremos que para a Cabala o
Cosmo é um homem gigantesco chamado Adam Kadmon, e o ser humano
uma miniatura dele:

– Kether, Hokhmah e Binah constituem sua cabeça, estando estas duas


últimas sefiroth vinculadas ao olho esquerdo e direito, respectivamente;
desta forma, correspondem a cada um dos hemisférios cerebrais.

– Hesed é relacionada com o braço esquerdo, e Gueburah ao direito,


enquanto o coração, ou centro da Árvore, deve atribuir-se a Tifereth.

– A Netsah a perna e o quadril esquerdo e a Hod a do lado direito, sendo


Yesod a que se relaciona aos genitais, ficando finalmente Malkhuth em
relação com os pés.

Temos de lembrar que de acordo às leis da analogia e da natureza dos


símbolos, o que é direito desde um ponto de vista pode ser esquerdo de
outro. Portanto, pode também se ver à Árvore de maneira invertida, como
indicado, correspondendo nesse caso à coluna do amor o direito e à do
rigor o esquerdo, ou seja, a imagem de um homem paradigmático vista de
frente ou de modo posterior.

Pode o leitor se exercitar em tratar de visualizar estas sefiroth em


correspondência com centros sutis de seu corpo. Se o consegue, é
interessante pensar em próximas práticas, incluídas as de inversão de
polaridades de energia.
27 ASTROLOGIA
A Astrologia (Astronomia judiciária) na Antigüidade era a mesma ciência
que a Astronomia, só que seu interesse se centrava na observação dos ciclos
e suas reiterações, com propósitos essencialmente prognosticadores. Assim,
a Astrologia lia os destinos particulares com base nos ritmos cósmicos e nas
coordenadas celestes. Em todo caso, Astronomia e Astrologia têm como
ponto básico comum a roda zodiacal, composta de 12 signos, ou estádios que
o Sol em seu percurso anual toca. Na realidade, o zodíaco é imaginário, pois
se trata da partição em 12 segmentos da abóbada celeste e constitui um plano
ideal paralelo à eclíptica, ou seja, tangencial ao eixo do mundo. Se a abóbada
celeste está representada pelos 360 graus da circunferência, cada uma destas
12 partes ou símbolos, quase todos animais, contará com 30 graus, e estas se
sucederão regularmente ao longo do ciclo anual. O zodíaco é, pois,
fundamentalmente, uma medida do tempo (enquanto os astros se referem
mais especialmente ao espaço) e como tal deve se tomar. Por outra parte,
lembraremos que zodíaco significa "roda da vida" e é óbvia a vinculação
com o movimento.

A sucessão dos signos é a seguinte: Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão,


Virgem, Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes. Os 12
signos zodiacais, por sua vez, admitem uma divisão tradicional quaternária
em correspondência com os elementos da Filosofia, da Ciência da
Antigüidade e da Alquimia. A saber:

FOGO: Áries Leão Sagitário


TERRA: Touro Virgem Capricórnio
AR: Gêmeos Libra Aquário
ÁGUA: Câncer Escorpião Peixes

Observe-se que a sucessão dos elementos é constante: fogo, terra, ar, água.
Ao terminar a série, voltam a se reciclar na mesma ordem. Ao longo dos 360
graus da circunferência, os 3 signos referentes ao mesmo elemento se
encontram em distintas porções do círculo, formando um trígono. (Ver
figura mais cima composta de 4 trígonos).

28 FILOSOFIA
O termo Filosofia, de origem grega, significa amor (Philo) à sabedoria
(Sophia), ou seja, uma filiação, ou identidade, com o Conhecimento. Sophia
é para os gnósticos uma entidade, um princípio, uma deidade. O homem
pode aspirar a ela, vivenciando-a como um estado de sua consciência. Não
esqueçamos que para a Cabala esta esfera é Hokhmah, Sabedoria, um dos
princípios ontológicos do Ser, o que conjuntamente com sua parelha
feminina, Binah, a Inteligência, conforma a base da primeira tríade da
Árvore da Vida, e é atributo, ou nome, da divindade. A autêntica sabedoria,
a Filosofia da Antigüidade, não só é uma Ontologia, e também uma
Cosmogonia, senão que toda sua estrutura tende à Metafísica. Em verdade,
poder-se-ia dizer que esta Filosofia é uma Teosofia.

Utilizaremos o termo "Teoria" em sua acepção etimológica, ou seja, o


Conhecimento da deidade, ou o atributo de sua sabedoria, como estado
vivido na própria consciência; e o de “Metafísica" (mencionado mais atrás)
como aquilo que está mais além da física, incluindo não só o mundo
material, senão o psicológico, e mesmo o dos princípios do Ser (ontologia), e
que se acha desde logo muito longe do percebido pelos sentidos, e do
expressado pelos fenômenos, segundo a apreciação corrente que
costumamos ter dos mesmos. Este amor à Sabedoria, atributo do Ser
Universal, leva à identificação com esse princípio, que se Conhece e que se
percebe no interior da consciência. O mesmo é válido para a compenetração
com a Inteligência Universal. Desgraçadamente, com o obscurecimento
gradual dos tempos em que vivemos, a Filosofia tem perdido sua luz
primigênia e terminou por se converter num mero jogo dialético, ou num
exercício retórico e racional que não pode se evadir de sua própria
sistematização.

29 CABALA
Em nosso último diagrama, vimos a divisão em tríades das sefiroth da
Árvore da Vida. Ali se pode perceber que aquelas se correspondem com os
três mundos cabalísticos mais elevados, ficando a última numeração
(Malkhuth) como receptáculo das emanações sefiróticas, que por esta divisão
em tríades incluem em sua forma os três princípios: ativo, passivo e neutro
que caracterizam as colunas ou pilares de nosso modelo cabalístico.

Lembraremos que a primeira tríade, conformada pelas "numerações" mais


elevadas (1, 2, 3), ou Princípios Universais, está composta por Kether
(Coroa), Hokhmah (Sabedoria) e Binah (Inteligência), conformando o
mundo de Atsiluth, ou das Emanações, simbolizado também pelos três
primeiros números da escala decimal. Kether é a Unidade e, como tal, a
primeira determinação; costuma-se chamar a Hokhmah de “Pai” e a Binah de
“Mãe”, como geradores do desenvolvimento cósmico.

Ainda que três em aparência desde o ponto de vista do manifestado, estes


Princípios conformam em si mesmos a Unidade do Ser, a ontologia suprema,
à qual precisamente eles simbolizam. Como dissemos, Kether é o
Conhecimento, ou o Bem, enquanto Hokhmah é o sujeito ativo e Binah o
objeto passivo (receptivo) desse Bem ou Conhecimento essencial.

A segunda tríade (4, 5, 6) está composta pelas sefiroth Hesed (Graça, Amor,
Misericórdia), Gueburah (Rigor), também chamada Din (Juízo), e Tifereth
(Beleza ou Esplendor). Elas conformam o Mundo prototípico de Beriyah, ou
da Criação, reflexo direto do mundo arquetípico de Atsiluth, como bem o
expressa o triângulo invertido, que simboliza o descenso das energias divinas
no seio da manifestação. Hesed é o princípio construtor, enquanto Gueburah
representa o princípio destruidor, ainda que ambos surjam simultaneamente
da tríade superior como duas energias necessárias, que se neutralizam e se
equilibram em Tifereth. Se do seio de Hesed surgem todas as criaturas e
seres que têm de se manifestar (os que ele assinala com seu Amor e
Misericórdia inesgotáveis), de Gueburah emana o Rigor imprescindível que
põe limites à energia expansiva de Hesed, discriminando assim tudo o que é
supérfluo e desnecessário no processo criativo. Tifereth, a Beleza divina,
aparece então como o Centro onde esses opostos aparentes se conciliam,
manifestando a Unidade e o Ser em todas as coisas.

A terceira tríade (7, 8, 9) da Árvore da Vida está composta pelas sefiroth


Netsah (Vitória), Hod (Glória) e Yesod (Fundamento). Elas constituem o
Mundo de Yetsirah, ou plano das Formações, assim chamado porque é nele
onde as idéias informais do plano de Beriyah tomam forma sutil,
constituindo propriamente o domínio psíquico da manifestação.
Corresponde-se então com as "Águas Inferiores", reflexo invertido (e em
certo modo ilusório) das "Águas Superiores" de Beriyah. Netsah e Hod
emanam diretamente de Tifereth, ainda que, como podemos comprovar, por
sua localização nos pilares laterais da Árvore, estão relacionadas com Hesed
e Gueburah, respectivamente. Por isso Netsah é uma energia ativa e
expansiva, onde esses mesmos princípios informais (que são todos os seres
antes de manifestar-se) se refratam numa multiplicidade indefinida, que
adquirem sua forma sutil graças à intervenção da energia passiva e contrativa
de Hod (a que, no entanto, também lhes dá a morte, ou a transformação,
necessária em seu caminho de retorno à Origem). Desde o ponto de vista do
homem, Netsah é a Arte verdadeira, que nos conduz aos arquétipos e ao
Espírito, e Hod é o Rito com o que sacralizamos o tempo e o espaço e
vivificamos os seres míticos, identificando-nos com eles. A permanente e
mútua inter-relação entre Netsah e Hod gera a sefirah Yesod, que aparece
assim, justamente, como o fundamento necessário, graças ao qual essas
formas descem ao plano físico e material, que é propriamente Asiyah.

Neste último plano, ou Mundo da Concreção Material, só se encontra a


sefirah Malkhuth (10), chamada o "Reino". Ela é a Terra ou Mãe inferior,
que se considera como o recipiente substancial de todas as energias
invisíveis que descem da Árvore, e onde estas adquirem realidade sensorial.
Na Cabala, é considerada como a Esposa do Rei (que é Kether),
manifestando desta maneira a presença da Unidade na corrente sempre
passageira das formas perecíveis.
30 ALQUIMIA
A Arte alquímica, ao tratar da transmutação dos metais, considera estes
como os símbolos das mudanças psicológicas que nos primeiros tempos
operam no aprendiz, que estudando com concentração e paciência os textos
sagrados e os vivenciando em seu Atanor interno, irá observando as
transformações que produz uma nova visão. Desta maneira, perceberá coisas
que se lhe escapavam, detalhes nos quais não reparava, e que se lhe vão
apresentando carregados de significação. O fascinante processo das
transmutações metálicas gera no aspirante uma reverente discrição. Por isso
a ciência alquímica é um espelho em que o aprendiz deve se olhar para
compreender a estrutura do Cosmo, sua própria constituição. Neste sentido, a
busca e a investigação tradicional é especialmente importante.

Por outro lado, relacionamos o processo alquímico com o processo de


iniciação, conhecido e praticado desde sempre pela Tradição Unânime e pela
Antigüidade. Esta é a Alquimia espiritual, que não se contrapõe, mas, muito
pelo contrário, complementa-se com as operações materiais, psicofísicas. A
transmutação interior se expressa na psique como uma revolução ou
regeneração de valores completa, que inclui a morte do velho homem e o
nascimento do Novo Homem. Esta gestação se compara com o nascimento
de um mundo, pelo que se corresponde com a Cosmogonia. Por outra parte,
o Caminho ou Via iniciática é também réplica do percurso da alma post
mortem e inclui a imersão no país dos defuntos. O alquimista, sujeito e
objeto desta ciência, deve velar, forçar-se a compreender, ainda que
paradoxalmente saiba que os resultados de sua arte só se obtêm com suma
paciência e cuidado, e que em ocasiões tem de redobrar esforços. A deidade
é permanente assombro e não se deixa conhecer sem sacrifício, ou seja, sem
um "ato ou ação sagrada", que é o que a palavra sacrifício (do latim sacrum
facere) quer dizer exatamente. Desta forma, é sabido que os alquimistas da
Antigüidade, como os medievais e renascentistas, usavam da oração como
um meio efetivo de transmutação e de comunicação com o espírito e a alma
do mundo, que através de seus eflúvios temperavam seu caráter.

31 ARITMOSOFIA E GEOMETRIA
Os símbolos geométricos têm, como dissemos antes, uma relação simbólica
precisa com as cifras matemáticas. Como se verá, a cada número corresponde
exatamente uma ou mais figuras da Geometria; poderíamos dizer que estas
são a representação espacial das mesmas energias que os números também
expressam à sua maneira.

Como todos os números podem ser reduzidos aos nove primeiros (por
exemplo, o número 8765 = 8 + 7 + 6 + 5 = 26 = 2 + 6 = 8, e desse modo
poderíamos proceder com qualquer número maior que nove), limitar-nos-
emos por agora a descrever sucintamente o simbolismo dos nove primeiros
números, mais o zero.

1 – O número um, e seu correspondente o ponto geométrico, representando


aparentemente o menor, contém em potência, no entanto, todos os demais
números e figuras. Sem ele nenhum outro poderia ter existência alguma. Todo
número está constituído pelo anterior mais um, bem como toda figura
geométrica nasce a partir de um primeiro ponto; ou seja, que este gera todas as
demais.

·
O Um simboliza a Origem e o Princípio único do qual derivam os princípios
universais, e também o Destino comum ao qual todos os seres têm que
retornar. É, segundo a máxima Hermética, "o Todo que está em Tudo", ou
seja, o Ser Total.

Ainda que o ponto e o um sejam uma primeira afirmação (proveniente de uma


página em branco ou do zero, ou do Não-Ser), normalmente se os descreve
melhor em termos negativos, posto que representam o indivisível, o imutável,
ou seja, o motor imóvel, pai de todo movimento e manifestação.

A meta primeira dos trabalhos iniciáticos é atingir a consciência de Unidade

2 – O número dois simboliza o primeiro casal, que se dividindo da Unidade


opõe seus dois termos entre si, ao mesmo tempo em que os complementa.
Diz-se que constitui o primeiro movimento do Um, que consiste no ato de se
conhecer a Si Mesmo, produzindo uma aparente polarização: o sujeito que
conhece (princípio ativo, masculino, positivo) e o objeto conhecido (passivo
ou receptivo, feminino e negativo). Desde a perspectiva da Unidade esta
polarização ou dualidade não existe, pois o ativo e o passivo (yang e yin no
extremo Oriente) contêm uma energia comum (Tao) que os neutraliza,
complementa, sintetiza e une (já se vislumbra aqui o três); mas desde o ponto
de vista do ser manifestado, esta dualidade está presente em toda a criação:
noite e dia, céu e terra, vida e morte, luz e obscuridade, macho e fêmea, bem e
mal se encontram na própria gênese do ato criacional, e a partir dali, toda
manifestação é necessariamente sexuada.

O dois é representado geometricamente com a linha reta:

3 – Mas como dissemos, para que a dualidade se produza tem de ter sempre
um ponto central do qual nasce a polarização:

O três se corresponde com o triângulo eqüilátero (símbolo da triunidade dos


princípios e representa à Unidade enquanto ela conjuga todo par de opostos.
As três colunas da Árvore, suas tríades e os três princípios da Alquimia de que
falamos assim o testemunham; e podemos também encontrar esta lei ternária
nas três cores primárias (azul, amarelo e vermelho) de cuja combinação
nascem todas as demais; nas três primeiras pessoas da gramática (eu, tu, ele);
nas três faces do tempo (passado, presente e futuro); nas três notas musicais
que compõem um acorde (dó, mi, sol, por exemplo); e nos três reinos da
natureza (mineral, vegetal e animal), etc.:
Na dualidade céu-terra o terceiro elemento é o homem verdadeiro (o Filho)
que os une, conjugando assim o material e o espiritual.

4 – Se o ponto não é dimensionável, a reta expressa uma primeira dimensão e


o triângulo é de duas dimensões (é a primeira figura plana), o número quatro é
o símbolo da manifestação tridimensional, como se vê na geometria no
poliedro mais simples (nascido do triângulo com um ponto central), o
tetraedro regular de quatro faces triangulares:

Diz-se que os três primeiros números expressam o imanifestado e incriado e


que o quatro é o número que assinala toda a criação. Por isso, divide-se o
espaço em quatro pontos cardeais, que ordenam toda a medida da terra (geo =
terra, metria = medida), e se divide todo ciclo temporal em quatro fases ou
estações, como vimos.

A representação estática do quaternário é o quadrado e seu aspecto dinâmico


está expresso no símbolo universal da cruz:

Queremos lembrar aqui o que mencionamos referente aos quatro mundos da


Árvore Cabalística e aos quatro elementos alquímicos e apontar que estes se
relacionam na tradição judaica com as quatro letras do Tetragramaton ou
nome divino (YHVH).

Também apontar de passagem que, segundo a chamada lei da tetraktys que


estudavam os pitagóricos, o quatro, como a criação inteira, reduz-se
finalmente na unidade:

4 = 1 + 2 + 3 + 4 = 10 = 1 + 0 = 1
5 – O cinco, que é o central na série dos nove primeiros números, na
geometria aparece quando a unidade se faz patente no centro do quadrado e da
cruz:

Este ponto médio representa o que em Alquimia se denomina a quintessência,


o éter, o quinto elemento que contém e sintetiza os outros quatro e que
simboliza o vazio, a realidade espiritual que penetra em cada ser unindo tudo
dentro de si.

No símbolo tão conhecido da pirâmide de base esquadrejada, esse ponto


central se coloca em seu vértice, mostrando assim que essa unidade se
encontra em outro nível ao que conflui o quaternário da manifestação:

O número cinco –que se representa também geometricamente com o


pentágono– é relacionado com o homem ou microcosmo, já que este tem
cinco sentidos, cinco dedos nas mãos e nos pés, e cinco extremidades
(contando a cabeça), pelo que se pode vê-lo inscrito numa estrela de cinco
pontas:

fig. 3

6 – A tríade primordial se reflete na criação como num espelho, o que se


representa com a Estrela de David ou Selo salomônico, e também com o
hexágono:
Se vimos as três cores primárias (azul, amarelo e vermelho) no primeiro
triângulo, as três secundárias, que completam as seis do arco íris, nascidas da
combinação daquelas (verde, laranja e violeta) colocam-se no segundo
triângulo invertido.

Na geometria espacial é o cubo aquele que representa ao senário, já que este


tem seis faces –como se observa no símbolo do dado, de origem sagrada–, das
quais três são visíveis e três invisíveis. A esfera (como o círculo) simboliza o
céu, e o cubo (como o quadrado), a terra:

Por outra parte, se pomos as faces do cubo no plano, produz-se o símbolo da


cruz cristã, que se relaciona também por esse motivo com o seis:

Outro modo de representar geometricamente o seis é por meio da cruz


tridimensional, ou de seis braços, que marcam seis direções no espaço: encima
e embaixo, adiante e atrás, direita e esquerda:

7 – O sete, como o quatro, representa a unidade em outro plano, já que pode


se reduzir ao um da mesma forma:
7 = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 = 28 = 2 + 8 = 10 = 1 + 0 = 1

Na geometria, o setenário pode ser representado com o heptágono e com a


simbolizam o seis seu ponto central ou unidade primordial (observe-se que as
duas faces opostas de um dado sempre somam sete):

São variadíssimas as manifestações do número sete no simbolismo esotérico.


Mencionaremos de passagem as mais conhecidas: são sete os dias da criação
(seis mais o de descanso) em correspondência com os dias da semana, os
planetas e os metais como já vimos. Este número representa uma escala de
sete degraus –relacionada com as sete notas da escala musical e com os sete
chakras do Kundalini Yoga–, bem como com os sete arcanjos e os sete céus
em correspondência com sete estados da consciência:

Diz-se que este número se produz pela soma dos três princípios mais os quatro
elementos, aos que também podemos vincular com as sete artes liberais da
Tradição Hermética, constituídas pela soma do trivium (gramática, lógica e
retórica) e do quadrivium (matemática, geometria, música e astronomia).

8 – Se na geometria plana, como apontamos, o círculo é símbolo do céu e o


quadrado da terra, o octógono vem ser a figura intermédia entre um e outro
através da qual se consegue a misteriosa circulatura do quadrado e a
quadratura do círculo, que nos fala da união indissolúvel do espírito e da
matéria.

O oito, diz-se, é símbolo da morte iniciática e da passagem de um mundo a


outro. Por isso o encontramos no simbolismo cristão, tanto nas pias batismais
(na passagem entre o mundo profano e a realidade sacra) e na divisão
octogonal da cúpula (que separa simbolicamente a manifestação e o
imanifestado) bem como no símbolo da rosa dos ventos, idêntico ao timão das
embarcações:
9 – Considera-se o nove como um número circular, já que é o único que tem a
particularidade de que todos seus múltiplos se reduzem finalmente a ele
mesmo (ex.: 473 x 9 = 4257 = 4 + 2 + 5 + 7 = 18 = 1 + 8 = 9).

Este número (que é o quadrado de três) representa-se na geometria com a


circunferência, a que se assinalam 360 graus (3 + 6 + 0 = 9) e que se
subdivide em duas partes de 180º (1 + 8 + 0 = 9), em quatro de 90º (9 + 0 = 9)
e em 8 de 45º (4 + 5 = 9).

No entanto, a circunferência não poderia ter existência alguma se não fosse


pelo ponto central do qual seus indefinidos pontos periféricos não são senão
os múltiplos reflexos ilusórios a que esse ponto dá lugar.

Se adicionarmos à circunferência seu centro, obteremos o círculo (9 + 1 = 10)


com o que se fecha o ciclo dos números naturais.

32 A RODA E A CRUZ
O símbolo da roda (a esfera, na tridimensionalidade) está estreitamente
associado com o do círculo, do qual já falamos. Tal como este, também se
encontra em todos os povos tradicionais, o que nos fala de sua
primordialidade, atestando assim sua importância como veículo para o
entendimento dos mistérios da Cosmogonia, considerada como um suporte
vivo que nos permite ter acesso ao conhecimento da Metafísica e das
verdades eternas. Aliás, ambos os símbolos se referem às mesmas idéias, pois
respondem à idêntica estrutura: um ponto central e a circunferência a que este
dá lugar por sua irradiação.

Lembraremos que o ponto central simboliza a Unidade, o Princípio Supremo,


e a circunferência, a manifestação universal, o mundo ou Cosmo entendido
em sua totalidade, que uma vez manifestado graças à emanação do Princípio,
retorna novamente a ele, cumprindo assim um duplo movimento de expansão
e concentração, centrífugo e centrípeto –solve et coagula da Alquimia–, que
encontramos presente no próprio ritmo cardíaco e no expirar e aspirar
respiratório.

Queremos destacar também as vinculações da roda com outros símbolos,


como o da cruz, que precisamente conforma sua divisão quaternária
fundamental, como já se disse, e que constitui sua estrutura interna, que
permite conectar o ponto central com a circunferência ou, o que dá no
mesmo, a Unidade com a manifestação universal, caracterizada pelo
movimento incessante, o que é promovido justamente pela rotação da cruz
em torno do centro, que, no entanto, permanece totalmente imóvel,
simbolizando desta maneira a imutabilidade do Princípio.

Esse movimento criacional gera também o espaço e o tempo (e com eles a


possibilidade da vida em todas suas expressões), ordenados pelos raios da
cruz, como muito bem expressam as quatro direções e as quatro estações, as
que por certo estão assinaladas pelas respectivas posições do sol, cujo
símbolo astrológico, e também alquímico, não é outro senão o ponto e a
circunferência.

A roda, com a cruz em seu interior, é igualmente a imagem de todo ciclo, que
se divide segundo o modelo quaternário: as quatro fases da lua, do dia e do
ano, as quatro idades da vida do homem, as quatro grandes divisões do ciclo
cósmico (chamado Manvántara pela tradição hindu), que compreendem a
manifestação inteira do mundo e da humanidade, etc.

Naturalmente o círculo admite também outras divisões, que se adicionam a


sua simbólica e a enriquecem, como é o caso da partição em seis, oito e doze
raios. Neste último caso temos o do zodíaco, que além de “roda da vida", em
outras tradições também significa "roda dos signos” e ”roda dos números".

33 CONSTRUÇÃO DA ÁRVORE DA VIDA


Primeiro passo: trace o pilar central ou
eixo vertical.

Segundo passo: trace 4 círculos


segundo o modelo, utilizando o eixo
vertical e os pontos de intersecção com
este dos círculos precedentes, como
ponto central dos seguintes.

Terceiro passo: trace as sefiroth


utilizando as intersecções exteriores dos
círculos como pontos centrais, tal e qual
aparece no gráfico.

34 O SÍMBOLO DA HORIZONTAL E DA VERTICAL


Entre os símbolos geométricos que revelam a estrutura do Cosmo
encontramos o da horizontalidade e o da verticalidade. Ainda que se trate de
uma só linha reta, esta, ao adotar duas posições distintas, permite-nos
compreender outras tantas leituras da realidade que, no entanto, se
complementam, tal qual podemos observar em outros símbolos
fundamentais, como é o caso da cruz e do esquadro, que se formam pela
união num ponto da linha horizontal e da vertical.

À primeira vista, a horizontal simboliza a terra e a matéria, o tempo


sucessivo que progride indefinidamente num plano ou nível de realidade sem
possibilidade aparente de sair dele. Refere-se, em suma, à leitura literal e
puramente fenomênica que o homem tem de si e do mundo. No entanto,
graças ao duplo sentido que possui todo símbolo, também simboliza a
submissão à lei que regula a retidão em nosso comportamento.
Esotericamente representa um estado de passividade e quietude interior que
faz possível a receptividade das influências espirituais.

São precisamente essas influências que simbolizam a vertical. E se a


horizontal se refere ao tempo sucessivo, a vertical, por sua vez, representa o
tempo simultâneo e sempre presente que, ao ser percebido na consciência,
libera-nos dos condicionamentos e limitações terrestres. No homem, esse
eixo vertical, essencialmente ativo, incide diretamente sobre seu coração, o
centro de seu ser, e a partir daqui é que começa a ascender e conhecer outros
estados cada vez mais sutis de si mesmo, do Universo e do Ser.
Tudo isto está perfeitamente representado no simbolismo construtivo (do
qual mais adiante trataremos), onde a horizontal equivale ao nível e a
vertical ao prumo. Assim, a horizontal (a terra) é o plano de base do templo,
que o homem percorre em sucessivas etapas até atingir o altar ou centro
desse plano, no qual se encontra o ponto de conexão com o eixo vertical, que
o comunica diretamente com a chave de abóbada da cúpula (o céu), que
representa o centro do Ser total, além da qual se encontram seus estados
supra-individuais e supra-cósmicos, aonde achará sua autêntica Libertação e
Suprema Identidade.

35 OS TRÊS GUNAS
Conquanto a Tradição Hermética constitui uma via do Ocidente para o
Conhecimento, isso não significa que não guarde estreitas analogias com
outras tradições que também manifestam o mesmo. Tal é o caso da tradição
hindu, sua Teogonia e Cosmogonia. Dela queremos destacar os três Gunas,
que representam energias ou princípios presentes em todas as coisas. A
primeira é Sattwa, assimilada à energia sutil e celeste, à qual se opõe Tamas,
identificada com a atração gravitacional da densidade da Terra. A força de
uma é invertida com relação à outra. Mas ambas em um ponto se unem,
complementando-se. Sattwa e Tamas se encontram sobre um mesmo eixo
vertical em diferentes níveis. E a distância média entre elas é o lugar em que
se conjugam. Esta identificação e neutralização dá lugar a uma terceira
energia, gerada pela expansão da potência das outras duas, gestando um
plano de irradiação horizontal, listras, que é a projeção das energias opostas
do plano vertical, a qual junto com elas, e como princípios presentes em
todas as coisas, no Cosmo inteiro, dará lugar ao Mundo.

36 A RESPIRAÇÃO
A respiração é a forma que tem o homem de se conectar com o universo.
Respiração é vida e bem se diz assim quando se fala do hálito vital. É
também a maneira com a qual o universo se comunica conosco, da qual
colhemos a energia necessária para a existência. A respiração é rítmica, e isto
é o primeiro que percebe aquele que quer tomar consciência dela. Estes
ritmos respiratórios, divididos em duas grandes categorias, conhecem-se
como a aspiração e a expiração. Pela primeira, sabe-se, o homem recebe o
alento cósmico. Pela segunda o devolve, uma vez que obteve por seu meio o
sustento imprescindível. Desde o ponto de vista do macrocosmo ou do
universo, seu expirar corresponde à aspiração do homem e sua aspiração à
expiração deste. Homem e mundo, microcosmo e macrocosmo, participam
da só e única realidade do Verbo. A respiração é, pois, algo transcendente, da
qual é importante tomar consciência, já que, como se vê, é um meio
poderoso e singelo ao alcance de qualquer um para poder entender em nosso
pequeno espaço, em nosso laboratório alquímico, e com nossas imagens, as
realidades cosmológicas que se refletem no homem, pois este foi gerado com
o próprio modelo do Cosmo.

Como se vê, esta alternância dos ritmos conforma um ciclo binário


igualmente válido para toda criação:

Como se pode observar, estes opostos se complementam, e um não poderia


ser sem o outro. Por outra parte, é sabido que os ciclos respiratórios estão em
correspondência direta com outros do corpo humano: a circulação do sangue
(diástole e sístole), e também com a assimilação alimentícia (ingestão e
excreção).

Todos estes movimentos naturais, assinalados pelo binário, manifestam-se


também no quaternário, que os fixa, equilibra e harmoniza, refletindo-o dois
a dois. Esta figura do círculo, dividida por uma cruz, será a figura central
com a qual agora trabalharemos e sobre ela meditaremos e praticaremos
nossas concentrações.

37 ASTROLOGIA
Os signos zodiacais admitem uma divisão quaternária relacionada com os
elementos da tradição greco-romana e alquímica (ver N.º 21).

Os três de Fogo:

ÁRIES: O Cordeiro é o primeiro signo da roda zodiacal, aonde esta começa


sua rotação retrógrada. Sua energia é vital, e tem que ter a força necessária
para mover toda a roda sob seu impulso. Seu regente é Marte, deus da guerra
e se lhe costuma fazer ligação com a violência, mas sempre com a energia
necessária a toda ação paciente e duradoura. Se a paixão é um de seus
atributos, a experiência leva a temperar o caráter de Áries e a enriquecer suas
virtudes.

LEÃO: Colocado no centro do solstício de verão, a localização de Leão (o


leão, o Rei da Selva) no meio do ano e em metade do verão, fazem dele um
signo tão ardente como resplandecente. O amarelo dourado do leão, o sol
(que o rege), e o ouro, conjugam-se no brilho de Leão, que o leva à
maturação dos frutos.

SAGITÁRIO: O fogo de Sagitário (o arqueiro) não é arrebatador, nem se


deixa ganhar por uma excessiva euforia. Os grandes ardores passaram, e o
calor vem dando lugar à luz clara de Sagitário, onde os contornos das coisas
se perfilam como mais nítidos. Sagitário, regido por Júpiter, envia sua flecha
para o Sol, devolvendo a este a seiva da vida que dele recebeu.

Os três de Terra:

TOURO: É caracterizado pelo touro, animal obviamente relacionado com a


terra, cuja força de trabalho, teimosia e insistência são conhecidas. A
extraordinária vitalidade de Touro supera seus próprios esforços e, vez por
outra, arremete sobre seus propósitos e contra seus inimigos, obtendo assim
conquistas e resultados constantes. O touro é um símbolo interno de
abnegação e luta, que com o tempo tem de terminar com sucesso, pois sua
fortaleza está unida à perseverança. É um signo regido por Vênus.

VIRGEM: É conhecido por sua sensatez e sua paciência, à qual une um


caráter prático e sereno. É singelo e muito afeiçoado a suas maneiras, e
pensa não precisar da imaginação porque sabe que esta pode perturbá-lo. O
planeta Mercúrio rege o signo da Virgem e lhe agrega uma mobilidade
imprescindível e apenas suficiente

CAPRICÓRNIO: A cabra firma seus pés sobre a terra e em delicado


equilíbrio se impulsiona para o mais alto do morro, descobrindo caminhos
praticamente inacessíveis para todos os outros animais. Se for importunada,
investe sem se fixar. Se for deixada livre, ascende por sua própria natureza
destemida, constante e escaladora. Saturno rege este signo e o faz profundo.

Os três de Ar:

GÊMEOS: Os gêmeos constituem o primeiro signo de ar e, como tal, se


expandem ao longo do ano. Regidos por mercúrio, são dois redemoinhos de
vento que se unem num ponto, manifestando a imobilidade e a
evolução. Os análogos se atraem e se repelem e, nessa constante
dança cósmica, as coisas se reproduzem de maneira natural.

LIBRA: Aporta em sua balança o segredo do equilíbrio. Regido por Vênus,


seu ar é um sopro contínuo, uma brisa temperada e conservadora. No entanto
é versátil, e o menor influxo pode fazê-la mudar. Reta na intenção, chega às
vezes ao desequilíbrio, para voltar a se harmonizar.

AQUÁRIO: Se o ar se estabilizou, pode, no entanto, transformar-se


repentinamente num redemoinho, num ciclone ou num Furacão. O vento do
signo do Aguador é criador, e dele surgem as possibilidades germinais de
outras realidades. Passados os efeitos do furacão, a terra nasce como nova e
beneficiada.

Os três de Água:

CÂNCER: A água irriga com sua fertilidade as maravilhas da terra, às quais


fecunda. A água é passiva com respeito ao fogo, e como tal se a pode ver em
lagos e rios. A imaginação e a criação assinalam o signo do caranguejo como
a potência generativa, ou núcleo das grandes possibilidades. Seu regente é a
lua.

ESCORPIÃO: Signo de água, o Escorpião se revolve sobre si mesmo, e


finca sua cauda envenenada em seu próprio corpo, que permanentemente
ressuscita. Seu veneno é fatal, e o caráter deste signo, vinculado com os
genitais, surpreende por sua complexidade e profundidade. Seu regente é
Marte. Talvez seja o signo mais forte do zodíaco, sobretudo na época atual.

PEIXES: Simboliza águas mais mansas do que as de Escorpião. Os peixes


nadam cômoda e relaxadamente sem se preocuparem demasiado pelas
coisas. Sua comodidade lhes é quase indispensável, já que sem ela não
podem viver, tal é seu costume. Seu caráter aparece como frágil e com
fluidez se manejam pelo mundo.

38 RESPIRAÇÃO: OS CICLOS
O estudo dos ciclos predispõe a mente a uma forma de conceber o tempo de
maneira diferente, não linear, senão circular, engrandecendo assim nossa
percepção, nosso espaço consciente, universalizando-o. O ciclo binário, e
sua potencialidade criativa (4 = 22), é o que conforma qualquer ciclo
quaternário de ida e retorno e a ele trataremos de adequar nossa respiração.

EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO:

a) Sente-se cômoda e corretamente. Faça-o à oriental (com as pernas


cruzadas debaixo das cadeirinhas), ou à ocidental (retamente numa
cadeira), é muito importante conservar a vertical.
b) Uma vez relaxado, feche seus olhos e imagine um círculo, com seu ponto
central destacado e sua circunferência. Melhor ainda, se possível, construa
previamente esta figura em papel, cartão ou outro material e a observe fixa
e atenciosamente durante alguns minutos. Logo, com os olhos fechados,
projete-a sobre um fundo imaginário. Concentre-se alternativamente sobre o
ponto central e a circunferência. Sinta pouco a pouco o fluir de sua
respiração.

c) Figure-se que é você o ponto central de uma circunferência gigantesca.


Esse círculo é uma esfera, e você é o centro e o eixo dela. Com sua
respiração ela se contrai e se dilata, desce e ascende a energia, e se
escurece e clareia essa esfera ao ritmo respiratório.

Isto é tudo por agora. Tomem-se entre 15 e 30 minutos ao todo para efetuá-
los. Não é conveniente fatigar-se. Não se ponha demasiado eufórico ou se
desanime pelos resultados obtidos. A persistência diária é necessária e o
melhoramento neste treinamento é progressivo.

39 ASTROLOGIA
Como se sabe, o signo ao qual pertence uma pessoa é o natal, ou seja, o
assinalado pela época em que o Sol, em seu passo anual, toca a roda zodiacal
no ponto correspondente ao momento do nascimento. Damos, na
continuidade, as datas às quais pertencem os distintos signos do ano, com
referência ao calendário civil:

ÁRIES: 21 de março a 20 de abril - Touro: 21 de abril a 20 de maio -


GÊMEOS: 21 de maio a 20 de junho - CÂNCER: 21 de junho a 20 de julho -
LEÃO: 21 de julho a 21 de agosto - VIRGEM: 22 de agosto a 21 de
setembro - LIBRA: 22 de setembro a 21 de outubro - ESCORPIÃO: 22 de
outubro a 20 de novembro - SAGITÁRIO: 21 de novembro a 20 de
dezembro - CAPRICÓRNIO: 21 de dezembro a 20 de janeiro - AQUÁRIO:
21 de janeiro a 19 de fevereiro - PEIXES: 20 de fevereiro a 20 de março.
(Revisar, pois varia a cada ano).

Outra coisa muito importante na determinação astrológica é o signo


ascendente, que está em correspondência com a hora do nascimento, e
também com o lugar em que este se produziu. As posições da lua e dos
outros planetas também põem uma importância chave em sua carta natal. O
Horóscopo é a interpretação desta carta de acordo a coordenadas e
parâmetros harmônicos e ritmos estelares.

É interessante conhecer o próprio horóscopo, como meio indireto e sugestivo


de perceber nosso caráter e circunstâncias temporais.

40 ALQUIMIA
Os princípios alquímicos, bem como os metais, não devem confundir-se com
as substâncias que os simbolizam. O alquimista aprendiz, conjugando e
ordenando estas energias sutis, experimenta a transmutação que sua Ciência
promove, utilizando para isso o Atanor, esse forno ou caldeira onde
cozinhará sua obra.

O Cosmo todo pode ser observado como um grande Atanor no qual estas
forças se inter-relacionam, opondo-se e se conjugando perpetuamente, tal
qual o afirma o Corpus Hermeticum. No interior do alquimista (microcosmo)
ocorre o mesmo: estes princípios e elementos se combinam entre si
produzindo desequilíbrios, combustões, alterações e contradições. Mas o
iniciado sabe que no constante desequilíbrio das partes em que
aparentemente o Cosmo se divide, radica o equilíbrio do conjunto, a ordem
do todo.

Temos de dizer também que o Atanor está construído em quatro níveis


sobrepostos, e pode ser considerado como uma reprodução em miniatura do
macrocosmo, e igualmente do microcosmo, ou seja, do universo e do
homem. Estes quatro níveis se equivalem aos quatro planos ou mundos da
Árvore Sefirótica, pelo que seria muito interessante serem feitas as
respectivas correspondências entre um e outro. No primeiro nível se encontra
o fogo indispensável para a Obra. O segundo e o terceiro, onde se cozem
propriamente as substâncias, são verdadeiramente transformadores, e às
vezes se os costuma considerar como um só corpo. No quarto nível, as
formas e a matéria se volatilizam e existem de uma maneira distinta e
transcendente. Os gases, que ocupam a parte superior do Atanor, estão
vinculados com o sutil, enquanto a substância da Grande Obra se relaciona
com o denso. Este processo de perpétuo refinamento e reciclagem de
energias é a chave da Alquimia, que costuma trabalhar a favor do Tempo. A
transformação da matéria num modo de realidade diferente é o propósito do
sábio alquimista.

Isto, no entanto, é ignorado pelo homem ordinário, que se deixa levar pela
corrente da manifestação universal, que vai do sutil ao grosseiro, do único ao
múltiplo. Esta corrente, que está destinada a destruir, separar e dividir, é a
que impera no mundo profano; mas o adepto avança num sentido inverso: do
denso ao etéreo, construindo a ordem a partir do caos, unindo os fragmentos
dispersos da multiplicidade da manifestação transitória e aparente e sempre
procurando, e finalmente achando, a perfeição que simboliza o ouro, o
"elixir da imortalidade" ou a Pedra Filosofal, a realidade única que
transcende toda manifestação.

41 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Volte a repetir os três exercícios a, b, e c do N.º 38.

Adicionaremos um exercício respiratório a esta sucessão.

d) Sincronize a respiração com as pulsações sanguíneas, que podem ser


percebidas nos pulsos, ou na garganta (na jugular). Conte 4, 6 ou 8
pulsações –o lapso no qual se sinta mais cômodo– e aspire nesse mesmo
ritmo. Logo, expire num intervalo semelhante, assim tenha você tomado
como protótipo qualquer número de pulsações, a sua eleição (4, 6 ou 8,
etc.). Acomode-se, aspire e expire nesse ritmo constante durante 5 a 10
minutos, tratando de que seja com naturalidade. Siga conscientemente o
ciclo respiratório sem abandonar os exercícios de visualização precedentes.
Trata-se de conjugá-los. Deixe-se fluir. Você está relaxado, sentado
comodamente, com seus braços e mãos descansados. Suas preocupações o
abandonam e o mesmo vão fazendo seus pensamentos, e você com eles.
Permita-se que brote, ainda que seja incipientemente, pouco a pouco, seu
manancial interno. Nada, em verdade, salvo os fantasmas de sua mente,
pode impedir seus propósitos.

Realize-os durante 15 a 30 minutos diários.

Queremos dizer algumas palavras sobre o aspecto cerimonial de nossos


estudos e trabalhos, pois estamos acostumados a viver num mundo que não
faz distinções entre o sagrado e o profano, e que, portanto, desconhece as
hierarquias espirituais internas.

Não é raro que o velho homem que coexiste conosco negue toda
possibilidade de salvação de maneira inconsciente, ou trate de "consumir" o
conteúdo deste programa. Há um tempo e um espaço sagrados, que se
correspondem com os aspectos mais altos do ser, cada vez mais livre de seus
inumeráveis egos e paixões que tratam de subjugá-lo. É sumamente
conveniente fomentar a realização desse espaço e tempo diferentes e para
esse efeito o rito e a invocação, e o respeito pelo sagrado, devem se
modificar, desde o princípio, em nossa vida diária. Para o caso destes
trabalhos e práticas, aconselha-se uma hora determinada –que bem pode
ser noturna, quando as vibrações do meio se calam– e um lugar para as
realizar –localizado de preferência olhando para o norte ou para o oriente–
por pequeno que seja. Desta Forma, sublinhamos o conveniente de ter um
lugar especial relacionado com o material de Agartha. Isto se deve à
necessidade de distinguir, em qualquer nível, a diferença que existe entre
duas visões, ou leituras absolutamente distintas da realidade. A do homem
ordinário, ou profana, e a do aspirante ao Conhecimento, ou sagrada.
Fazendo-se a escusa de que o sagrado, ou metafísico, não é o que hoje em
dia se entende por "religioso", ou "piedoso", e que o profano não é aquilo
que o "moralismo" possa condenar como tal. O sagrado, ou metafísico,
excede amplamente o fenômeno "religioso", ou o "devoto", ou a superstição.
E a ética supera as "moralidades" locais, geralmente motivadas para impor
seus interesses e pontos de vista, tão passageiros quanto às modas ou às
mutações dos usos, costumes e gostos das personalidades.

42 O CICLO LUNAR E A RESPIRAÇÃO


Muitas das práticas e exercícios que estamos dando neste curso podem se
efetuar seguindo o ciclo quaternário lunar. Devemos remarcar que o que
interessa é a observação e a experimentação dos ritmos lunares, sejam
ascendentes ou descendentes. No entanto, é muito interessante começar
determinados labores no período ascendente, ou seja, o que nasce com a lua
nova e culmina com o plenilúnio.

A Lua é nova quando se encontra em conjunção com o Sol. Ambos os astros


se acham na mesma casa zodiacal e a luz solar impede a visibilidade do
satélite. A partir deste ponto, a lua sai, cada dia que passa, 52 minutos mais
tarde, refletindo os raios solares cada vez com maior intensidade, até que na
metade de seu período se encontra cheia, no signo oposto ao Sol. Logo irá
descendo, aproximando-se-lhe, e ao cabo de 29 dias voltará novamente a se
unir com ele, completando seu ciclo, que se costuma "arredondar" em 28
dias, determinando a divisão do tempo em semanas de 7 dias, que se repetem
4 vezes ao longo do mês lunar (7 x 4 = 28).

43 CABALA
Tomamos certos pontos da ciência cabalística, apropriados para efetuar
nossos trabalhos com a Árvore da Vida Sefirótica, que relacionamos com
outros símbolos tradicionais e disciplinas herméticas, e igualmente com
outros exercícios e práticas que funcionam como meios ou despertadores
para ir observando, conhecendo e adquirindo, pouco a pouco, pela reiteração
destes rituais, outro grau de consciência ou uma leitura diferente da realidade
e da descrição que temos da mesma. Igualmente, devem anotar-se certos
riscos inerentes à queda de uma série de estruturas que, de não serem
substituídas pelos elementos que nos brinda a Doutrina Tradicional, levar-
nos-iam só a uma estéril vacuidade, ou a uma desesperação gratuita.
Adverte-se uma vez mais sobre a discrição e seriedade que devem rodear
nossos trabalhos, conselho repetido invariavelmente pelos adeptos da
Ciência e da Arte. Voltaremos a concentrar uma e outra vez sobre o
diagrama cabalístico, verdadeiro modelo do universo, com o ânimo de
interiorizá-lo, compreendê-lo, e intuir o cúmulo de imagens que nele estão
contidas e cuja manifestação promove. Desta forma, queremos lembrar que,
segundo o Sefer Yetsirah (ou Livro das Formações, verdadeiro clássico
cabalístico) reitera repetidamente, os sefiroth são dez. Não nove, senão dez.
Não onze, senão dez.

Seguindo com o projeto de aproximar nossos leitores a um conhecimento


dos símbolos tal qual se expressa nas gravuras herméticas, cabalísticas e
alquímicas, oferecemos aqui uma ilustração antiga da Árvore da Vida. Como
já advertimos, o ir "fazendo-se o olho" é um preâmbulo para acrescentar o
conteúdo da autêntica mensagem do símbolo e desentranhar as verdades e
energias-força nele contidas. Com otimismo, também se poderia dizer que
desta forma se está acessando uma introdução à "visão".

Como pode se observar, trata-se da meditação de um iniciado sobre nossa


Árvore Cabalística dentro de um espaço fechado, recolhido. O recinto é
cúbico e sua porta se abre por meio de duas colunas, o que é uma
representação da caixa do Cosmo. Kether, a sefirah mais alta e elevada,
coroa e toca a abóbada desse oratório ou gabinete de trabalho, e prenuncia a
saída para o supracósmico. O adepto está sentado num cadeirão cuja parte
mais alta é um recipiente que olha para cima, e cujas "pernas" se voltam para
a terra, sendo, no entanto, ambas as partes do móvel análogas, ainda que
invertidas.

fig. 4

Os pés do cabalista estão firmemente apoiados sobre o solo (significando a


realidade), enquanto que uma de suas mãos sustenta com firmeza o diagrama
da Árvore Sefirótica (ação) e a outra repousa com serenidade (contemplação)
a par que de toda sua figura se desprende uma atitude de atenção concentrada
e serena.

44 LITERATURA
Já observamos que as origens da cultura são sagradas. Isto é particularmente
notório nas artes, já que tanto a dança, como o teatro, a música e as artes
plásticas se remontam dos começos míticos e rituais do homem, e foi sempre
uma deidade a reveladora e patrocinadora destas disciplinas. Na
Antigüidade, as obras de arte eram anônimas, como seguem sendo ainda
entre diversos povos, e só a partir do Renascimento é que se conhece seus
autores em forma individualizada. Criar é repetir e reproduzir a situação da
Criação original. A literatura não escapa a este princípio, e as grandes obras
em verso e em prosa são aquelas que despertam e fazem pressentir a aflição
e o deslumbramento do Conhecimento. O poeta, bardo, ou vate (daí a
palavra “Vaticano”), é um transmissor inspirado das energias do sublime, e
sua linguagem se articula com um ritmo preciso e particular. Os textos
sagrados de todas as tradições dão conta cabal disso. A beleza da forma é a
roupagem e a atração da Beleza do Princípio e, portanto, reflete-o
harmonicamente. A arte é um veículo e uma maneira de conhecer, e são
numerosos os esoteristas que se expressaram por seu intermédio.
Lembremos que a sefirah Tifereth é Beleza, e que se acha no caminho
ascendente que vai de Malkhuth a Kether.

Num sentido amplo, todo escrito é literatura. Mas há alguns nos quais a arte
na maneira de dizer, a transparência das imagens com que se diz, a clareza e
a ordem dos conceitos, ainda que permaneçam velados, fazem-nos
memoráveis e os ligam a nós com laços emotivos e sutis. Assim, na memória
dos povos as lendas transmitem seus mitos. Os contos de fadas e de bruxos
nos aproximam a uma realidade prodigiosa. A poesia épica (a Ilíada, a
Odisséia) nos revela uma mensagem heróica. O classicismo de Dante e
Virgilio é completamente outra coisa sob uma leitura Hermética,
acrescentando desta maneira seu conteúdo e sua estética. As histórias do
Santo Graal, as gestas de cavalaria, as fábulas (como a Metamorfoses, ou
Asno de Ouro, de Apuleio), ou a produção Metafísica de um Dionísio
Areopagita, entre muitíssimas outras, são alguns dos exemplos da
potencialidade da Arte como transmissor de Conhecimento e promotor de
Iniciações espirituais.

A mensagem da Filosofia perene tomou todas as formas possíveis para se


difundir. Inclusive os provérbios e ditos "populares", foram cunhados como
lembranças de princípios de sabedoria; ainda que como todas as coisas,
tenham sofrido com o tempo um processo de degradação.

45 CABALA
Surgida no século II de nossa era, no povo de Israel, a Cabala se
desenvolveu na Alta e Baixa Idade Média, em países cristãos como França e
Espanha, particularmente neste último, onde no século XIII foi escrito nada
menos que O Zohar, o grande livro cabalístico, brilhando na Itália durante o
Renascimento sob sua forma cristianizada, e passando aos países do norte e
centro da Europa, à Inglaterra, Polônia, etc., em distintas épocas, e onde
ainda hoje se mantém viva, bem como em Jerusalém e muitas outras cidades
do mundo moderno, entre judeus e não judeus. Isto quanto ao que se refere à
Cabala histórica.

O termo dabar em hebraico significa ao mesmo tempo "palavra" e "coisa".


Nesse sentido, para os hebreus o nome de Deus, constituído pelas quatro
letras sagradas, é impronunciável, por respeito a sua imanifestação, e porque
o pronunciar de seu nome o revelaria em sua tremenda majestade e grandeza.
Estas quatro letras são: Iod – letra a partir da qual surgiu todo o alfabeto
hebreu, que é considerada um ponto e cujo valor numeral é dez; Hé –
chamada a primeira Hé para distinguí-la da segunda que compõe o nome
divino, de valor numeral cinco; Vau – de valor numeral seis; e Hé – a
segunda, de idêntico valor cinco. A soma das letras do Nome Divino dá vinte
e seis, e este número é de particular importância no esoterismo e na
Cosmogonia cabalística. Abordaremos tão logo as letras do alfabeto hebreu.
Estes elementos são muito importantes para determinadas operações. Não se
trata aqui de dar um curso de hebraico, senão de nos familiarizarmos com os
símbolos e valores cabalísticos. Se nossos leitores tivessem oportunidade de
estudar hebraico, sugerir-lhes-íamos que o fizessem para aumentar as
fronteiras das relações e sua ressonância em nosso trabalho hermético.

46 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Nas mesmas condições em que efetuamos os exercícios anteriores e os que
seguirão, realizaremos agora uma prática nova: você já se familiarizou com
uma respiração simples de duas fases (aspiração-expiração). Agora
subdividiremos este ciclo em quatro. Desta forma, você se acostumou a
produzir tanto a aspiração como a expiração num determinado lapso igual
de tempo (4, 6 ou 8 pulsações, etc.). Trate de fazer este exercício que damos
na continuidade, outorgando a cada uma das quatro fases o mesmo número
de pulsações já eleitas. Vejamos o seguinte diagrama:

Aspire em 1, retenha o ar em 2, expire-o completamente em 3 e fique com os


pulmões totalmente vazios em 4, até que tenha necessariamente que voltar a
aspirar em 1. Mantenha o ritmo durante 15 ou 20 minutos. O segredo deste
exercício é expulsar todo o ar sem que nos fique nada nos pulmões. Esta
respiração é a que sugerimos para os próximos exercícios, pelo que seria
muito prático poder realizá-la.

Nota: É provável que tenha algumas dificuldades porque agora o exercício


se pratica em quatro fases. Se for assim, pode-se diminuir o número de
pulsações de cada fase para efetuá-lo.

Se quiser, você pode seguir praticando os exercícios preparatórios.


Posteriormente daremos outros novos.
47 O SÍMBOLO DO CORAÇÃO
O órgão fisiológico do coração não é, como se crê de ordinário, a sede do
sentimento e do sentimentalismo mais pacato, senão que ele foi tomado em
todas as tradições como um dos símbolos mais patentes e claros da idéia de
centro. No cristianismo isto é óbvio, pois quando se fala do "Sagrado
Coração" de Cristo se está fazendo referência à parte mais central dessa
tradição, à própria fonte de onde emana a essência de sua doutrina e seus
mais profundos mistérios.

Sua representação iconográfica em forma de triângulo invertido faz dele um


recipiente onde descem, e se depositam, os eflúvios celestes que vivificam a
totalidade do ser individual, fazendo possível que este tome verdadeira
consciência de seu Ser arquetípico. Por isso se fala do coração como o lugar
onde reside simbolicamente o Princípio Divino no homem, o Espírito
Universal que, com respeito à manifestação, aparece como o menor, sutil e
invisível, como bem assinala a conhecida parábola evangélica quando fala
do "Reino dos Céus", assemelhando-o ao grão de mostarda, equivalente na
tradição hindu ao "germe contido no grão de milho", idênticos ao éter ou
"quintessência", que é também o centro ou coração da cruz elementar,
tomada neste caso como um símbolo de todo o mundo manifestado.

É desse Princípio de onde, efetivamente, o homem recebe o hálito vital, ao


mesmo tempo em que a luz da Inteligência, ou autêntica intuição intelectual,
permite-lhe conhecer de maneira direta, simultânea e sem reflexos (ou seja,
não dual, racional ou cerebral) a Unidade em todas as coisas. Neste sentido,
lembraremos que na Cabala a sefirah Tifereth (que na simbólica construtiva
corresponde ao altar do templo) é chamada o coração da Árvore da Vida,
pois ao estar situada no próprio centro do pilar do equilíbrio faz possível que
nela se unifiquem e sintetizem as restantes sefiroth. Por isso, esta sefirah
também é chamada "Harmonia", entendida como a autêntica expressão da
"concórdia" universal, palavra que precisamente significa "união dos
corações".

48 MOISÉS
O nome de Moisés evoca imediatamente a idéia do povo judeu, que ele
encarna e ao mesmo tempo gera. Efetivamente, tendo nascido no Egito, é
considerado como da família do Faraó, pois aparece como filho da irmã
deste e, como tal se diz, é iniciado pelos sumos sacerdotes nos mistérios
mais profundos de Isis e Osíris, onde se sobressai por seus conhecimentos.
Desde jovem, sente um chamado cada vez mais claro para algo que ainda
não se define, mas que não está relacionado nem com Egito, nem com a
posição invejável que ostenta, que, por outra parte, cada vez se lhe faz mais
difícil, pelos ciúmes, inveja e desconfiança de seu tio Ramsés II, e de seu
primo, que lhe sucederá no trono. A "casualidade" faz com que Moisés, ao
defender um escravo judeu injustamente tratado, mate o agressor e tenha que
fugir pois, para casos como o seu (Moisés era ministro do culto de Osíris), a
justiça do Faraó aplica as penas máximas. Refugia-se onde encontra outro
personagem chave: Jetro, rei de Salém, grande sacerdote e iniciado e pai
espiritual de numerosos povos nômades que povoavam os desertos e terras
entre as civilizações do Egito, Caldéia, Babilônia, etc., compostos por
semitas, árabes, etíopes, etc.

Estes foram os judeus, aqueles que saindo de seu cativeiro em terras


estrangeiras do Egito, levantam-se um dia e empreendem uma gigantesca
emigração pelo deserto, sob a orientação de um chefe que os sintetiza e
encarna, e sob cuja condução, como intérprete direto de seu deus Jahvé, têm
de se constituir definitivamente como povo eleito, e chegar a um destino que
se dá no próprio Moisés, nome cuja tradução é "O Salvo", e que ele imprime
em seu meio, no povo ao que se lhe deu a missão de constituir e dirigir.
Moisés é, pois, conjuntamente, um personagem histórico e um símbolo,
como todos os protagonistas da História Sagrada. É também um ser humano,
e ao mesmo tempo o receptor das energias e das mensagens de uma entidade
sobre-humana, Jahvé, ao qual adora e faz adorar, quando não é o próprio
deus o que atua diretamente. Como ser humano, padece por quarenta anos
toda sorte de infortúnios e necessidades, a maior parte delas provocadas pela
ignorância e a bestialidade dos seus. Como agente divino, aviva e fixa o
monoteísmo e implanta a fogo sua lei, que sela com mandamentos. Termina
sua peregrinação, e em vista da terra prometida deixa como herança A
Bíblia, da qual escreve os cinco primeiros livros, síntese magistral que
fundamenta a vida de um povo e de uma religião, o que posteriormente
engendrará o cristianismo e o islamismo. A energia assombrosa de Moisés,
seu diálogo constante com a deidade, a força de seus poderes, transferidos e
compartilhados com setenta discípulos que conformam o núcleo interno de
sacerdotes e sábios, iniciados e iniciadores, aos que entrega a Cabala, fazem
possível sua sucessão até o final deste ciclo. Cumpre-se, pois, o Destino que
Moisés inicia e que terminará com a gloriosa vinda do Messias, esperada
também pelos cristãos e islâmicos, e anunciada em todos os textos e
tradições orais das culturas unânimes.

49 HERMES
Referir-nos-emos agora a Hermes, deidade chave na tradição egípcia, grega e
romana. Thot, o Hermes egípcio, que na Alexandria é conhecido como
Hermes Trismegisto, ou seja, o possuidor das três quartas partes da sabedoria
universal, é identificado igualmente com o Hermes grego e com o Mercúrio
romano. Sempre se considerou este deus como uma imagem da transmissão,
e a isso se deve que os atributos com os quais é identificado, capacetes e
sandálias aladas, estejam relacionados com o vento. Uma de suas
características é a rapidez de seu deslocamento, o que na Alquimia pode ser
observado, de forma análoga, quanto ao metal do mesmo nome, que
conhecemos como Mercúrio em sua versão latina.

Bem se diz que Hermes é eterno, seja este ou aquele o nome que lhe
dispensaram os distintos povos. Unanimemente é transmissor de ensinos e
segredos, chame-se Thot, Enoch, Elias ou Mercúrio, como já dissemos. Sua
revelação pelo batismo da inteligência se produz naqueles que encararam
sem preconceitos nem muletas o Conhecimento e se filiam intelectualmente
a seu patrocínio; sua invocação, a concentração e a aplicação dos distintos
métodos de sua ciência estabelecem uma comunicação direta com esta
altíssima entidade, que se manifesta internamente em qualquer grau nas
individualidades dispostas a isso. Como se sabe, esta deidade se manifestou
–e o segue fazendo– na história do Ocidente por meio da Tradição Hermética
e das disciplinas que a conformam.

Espírito protetor dos viajantes, dos comerciantes e peregrinos, sua influência


se faz sentir como a própria energia que nos transmite as mensagens mais
rápidas e ligeiras no caminho iniciático. Seu poder é tal que sem ele nada
seria, já que, como iniciador nos mistérios da vida e do Cosmo, suas
vibrações protetoras –e também dissolventes– atuam como um catalisador
dos efeitos da viagem do Conhecimento. Mercúrio é sutil e ligeiro, mas ao
mesmo tempo leva em sua mão a vara do caduceu, símbolo do eixo e das
duas correntes que se enroscam simultaneamente nele. Sua missão é
específica e nos aguarda em todas as encruzilhadas de nossos caminhos. Seu
pensamento é sábio e revelador, como bem o atesta o Corpus Hermeticum,
um dos documentos mais excelsos da Antigüidade, emanado da Alexandria
nos primeiros tempos do cristianismo, e do qual queremos extrair este texto:

"Já que o Demiurgo criou o mundo inteiro, não com as mãos, senão pela
palavra, concebe-lhe, pois, como sempre presente e existente, e tendo feito
tudo e sendo Um Só, e como tendo formado, por sua própria vontade, os
seres, porque, verdadeiramente, é este seu corpo, que não se pode tocar, nem
ver, nem medir, que não possui dimensão alguma, que não se parece a
nenhum outro corpo. Já que não é nem fogo, nem água, nem ar, nem alento,
mas todas as coisas provêm dele. Agora bem, como é bom, não quis dedicar-
se esta oferenda só a si mesmo nem enfeitar a terra só para ele, senão que
enviou aqui para baixo, como ornamento deste corpo divino, o homem,
vivente mortal, ornamento do vivente imortal."

fig. 5
50 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
É importante que se habitue a este exercício, ao que inclusive se lhe deve
dar um caráter ritual. Pode ser que as distintas fases respiratórias não
possam ser realizadas exatamente de acordo com o mesmo número de
pulsações. Por exemplo: que a aspiração e a retenção precisem tempos
diferentes, bem como a expiração e o vazio subseqüente. No entanto, tanto
os movimentos número 1 (aspiração), como o número 3 (expiração), devem
ser feitos em tempos iguais. Assim, a retenção e o vazio (fases números 2 e
4) devem se efetuar em igual tempo. A saber, que se a aspiração é realizada
em seis pulsações, a expiração deve corresponder a esse mesmo número.
Igualmente, se a retenção se faz em quatro pulsações, o vazio se efetuará no
mesmo tempo.

Seria muito conveniente que esta respiração começasse a ser para você
como uma forma ritual, à qual pudesse recorrer em qualquer momento,
distinguindo nitidamente do mundo da respiração ordinária este outro
espaço, no qual você efetua seu exercício. Ao se acostumar a fazê-lo à
vontade, começa o organismo a reconhecer outra possibilidade de si mesmo.
Se no princípio teve alguma dificuldade, não abandone. E reitere os esforços
para consegui-lo. Lembre-se de que o segredo desta prática radica em
expulsar totalmente o ar que possa ter em seus pulmões, na fase número 4,
produzindo-se assim uma morte simbólica, à qual necessariamente tem de
seguir um renascimento marcado por uma nova respiração. Lembre também
que os exercícios têm de se efetuar aspirando o ar pelo nariz e expulsando-o
pela boca. Se você consegue com estas práticas uma certa perfeição, poderá
ampliar um pouco os minutos do dia para lhe dedicar, e inclusive exercitar-
se nela em distintas ocasiões de sua jornada, e não só em seu gabinete de
trabalho e em postura ritual. Se você consegue incorporar esta nova
respiração a momentos determinados de seus horários ordinários, adquirirá
uma certa mecanicidade em sua prática e execução. Isto tem valor, já que
você está controlando à vontade sua recepção e entrega de energias, e sua
respiração já não é algo inconsciente, arbitrário e casual, senão algo
consciente, ordenado e efetivo. Ainda que não o tenhamos percebido, demos
um pequeno grande passo para a concentração de nossos esforços na busca
e reedificação de outras realidades adormecidas. Reitere e habitue-se a
estes exercícios, que facilitarão outras muitas potências latentes em seu
interior. Por certo, antes de se entregar a estas práticas, tem de ter um
mínimo de relaxamento e tranqüilidade indispensáveis.
51 PITÁGORAS
Na Antigüidade existia uma lenda segundo a qual Pitágoras foi engendrado
no seio materno graças a uma intervenção direta do deus Apolo, também pai
das Musas e herdeiro da lira de Hermes. Destacava-se assim a origem celeste
e divina de sua doutrina, máxime tendo em conta que Apolo (númen da Luz
inteligível, da Harmonia e da Beleza) era considerado uma deidade de
origem hiperbórea, o que o punha em relação com a Tradição Primordial. O
mesmo nome de Pitágoras procede da Pítia do templo de Delfos (dedicado a
Apolo) que profetizou seu nascimento como um bem doado aos homens,
nascimento que aconteceu aproximadamente no ano 570 a.C., na ilha grega
de Samos. Tendo recebido os mistérios órficos próprios da antiga tradição
grega, Pitágoras abandona sua pátria natal para realizar uma série de viagens
que o levarão por todo o mundo antigo, especialmente Fenícia, Babilônia e
Egito, país onde residiu durante um longo período de tempo, sendo iniciado
pelos sacerdotes egípcios, guardiões da sabedoria de Hermes-Thot.
Amadurecido seu pensamento, e depois de realizar a síntese de todo o saber
recebido, Pitágoras regressou a Samos trinta e quatro anos depois, preparado
para cumprir com o alto destino predito em seu nascimento, e que não era
outro senão o de criar as bases sobre as quais se assentaria a cultura grega, e
posteriormente a civilização ocidental.

Em Samos fundou sua primeira escola, que seria o germe das que mais tarde
se estabeleceram por toda a planície mediterrânea, especialmente na Magna
Grécia (Sicília), em cuja cidade de Crótona esteve o centro mais importante
na vida de Pitágoras. Seus ensinos (cosmogônicos, esotéricos e metafísicos)
articulavam-se em torno ao Número, onde residia a origem da Harmonia
Universal, pois através dele se revelam as medidas e proporções de todas as
coisas, celestes e terrestres, idéia que Platão recolhe no Timeu, seu livro
pitagórico por excelência. Para Pitágoras "tudo está disposto conforme o
Número" encontrando na tetraktys, ou Década, o número perfeito, e a
própria expressão dessa Harmonia, pois "serve de medida para o todo como
um esquadro e uma corda em mãos do Ordenador". Harmonia manifestada
fundamentalmente também por meio da música e das formas geométricas,
como atestam seus famosos teoremas e a estrela pentagramática ou pentalfa,
distintivo da própria fraternidade pitagórica, que continuou subsistindo
durante longo tempo, ao menos até a Alexandria dos séculos II e III d.C.,
onde acabou se integrando na Tradição Hermética, chegando assim até
nossos dias através das diversas artes e ciências que tendem à transmutação
do ser humano mediante a Sabedoria, a Inteligência, o Amor e a Beleza.

52 O SIMBOLISMO DO TEMPLO
O templo reúne dentro de si o espaço e o tempo sagrados. Apenas
traspassamos sua porta, faz-se evidente a diferença entre o mundo exterior e
profano onde o tempo decorre linearmente e em forma indefinida e amorfa, e
o recinto sacro, onde se percebe um tempo mítico e significativo: o "tempo"
das origens do ser humano, a eternidade e a simultaneidade, conhecidas e
compreendidas na interioridade do homem que estabelece esta comunicação
ritual desde as profundezas do templo. Por outra parte, o templo é um
modelo do Universo, ao qual imita em suas formas e "proporções" e, como
ele, tem por objeto albergar e ser o meio da realização total e efetiva do ser
humano. Nas tribos mais primitivas, encontramos a choupana ritual (ou a
casa familiar) como lugar de intermediação entre o alto e o baixo.
Efetivamente, nela o teto simboliza o céu e o chão, a terra; os quatro postes
onde se assenta são as colunas onde se apóia o macrocosmo. É muito
importante assinalar que sempre nessas construções há um ponto zenital que
está aberto a outro espaço. Exemplo: a pedra caput ou cimeira, que não se
colocava na construção das catedrais, ou o orifício de saída da choça
cerimonial (na casa familiar esta saída é simbolizada pela chaminé, o lar).
Esta construção, imagem e modelo do Cosmo, tem, pois, uma porta de
entrada que se abre ao percurso horizontal do templo (transposição da porta,
passagem pelas águas do batistério, perda no labirinto cuja saída desemboca
no altar, coração do templo), e posteriormente um orifício de saída sobre o
eixo vertical, desta vez localizado na sumidade, simbolizando o Coroamento
da Obra e o rendimento a outro espaço, ou mundo, inteiramente diferente,
que está "mais além" do Cosmo, ao qual o templo simboliza. É também o
templo uma imagem viva do microcosmo e representa o corpo do homem,
criado à imagem e semelhança de seu criador; inversamente, o corpo do
homem é seu templo. O centro de comunicação vertical é o coração, e ali,
nesse lugar, acende-se o fogo sagrado capaz de gerar a Aventura Real da
transmutação, após as provas e experiências de Conhecimento que levam até
lá. Em nosso diagrama Sefirótico, a porta horizontal se abre de Malkhuth a
Yesod, enquanto a vertical de Tifereth a Kether. Ou seja, que todo o trabalho
prévio, encaminhado ao Conhecimento, tem que ter por objetivo imediato a
chegada ao coração do templo, o fogo perene do altar sobre o qual se assenta
o tabernáculo, espaço vazio construído com as réguas e proporções
harmônicas do próprio templo, e do qual é sua síntese. Terá então terminado
com a primeira parte dos Mistérios Menores (mistérios da terra) e começará
sua ascensão simultânea pela segunda parte (os mistérios do céu), ficando
para além do templo, ou seja, para o supracósmico, os Mistérios Maiores,
que por serem inefáveis não podem ter aqui análise e nem comentário. Na
realidade, este processo é prototípico e válido para qualquer mudança de
plano ou estado, onde se manifesta à sua maneira.

53 O SÍMBOLO DO LABIRINTO
O símbolo do Labirinto exemplifica perfeitamente o processo do
Conhecimento, ao menos em suas primeiras etapas, naquelas em que o ser
tem de se enfrentar com a densidade de seu próprio psiquismo (reflexo do
meio profano em que nasceu e vive), isto é, com seus estados inferiores,
separando alquimicamente o espesso do sutil, que a alma experimenta como
sucessivas mortes e nascimentos –solve et coagula–, destinando ao mesmo
tempo numerosas provas e perigos que somente fazem traduzir o próprio
conflito ou psico-drama interior. Esse desassossego é próprio daquele que,
tendo abandonado suas seguranças e identificações egóticas, descobre ante si
um mundo completamente novo e, portanto, desconhecido, mas para o qual
se sente atraído, porque na verdade intui que ao atravessá-lo é que poderá se
reencontrar com sua verdadeira pátria e destino. Essa impressão indelével de
estarmos totalmente perdidos tem que nos levar imperiosamente a encontrar
a saída, ajudados sempre pela Tradição (e seus mensageiros: os símbolos),
que neste caso nos chega por meio do Agartha que, tal como um guia ou
eixo, tem de nos conduzir (desde que nossa atitude seja reta e sincera) a um
estado de virgindade, a um espaço vazio imprescindível, apto para a
fecundação do Espírito, o que se vive no mais interno e secreto do coração.

Devemos assinalar que muitos labirintos representados na arte de todos os


povos são autênticos mandalas ou esquemas do Cosmo, ou seja, da própria
vida, com suas luzes e sombras, o que nos permitirá compreender que esse
processo labiríntico é na realidade uma viagem arquetípica, uma gesta, em
suma, que todos os heróis mitológicos e homens de conhecimento têm
realizado, e que nos servirá de modelo exemplar a imitar, tal e como estamos
vendo na série "Biografias". Na verdade, a viagem pelo labirinto é uma
peregrinação ligada à busca do centro, e neste sentido é importante destacar
que em muitas igrejas medievais figurava um labirinto (como em Chartres,
em meio do qual aparecia antigamente o combate entre Teseu e o Minotauro)
que percorriam de forma ritual todos aqueles que, por uma ou outra razão,
não podiam cumprir sua peregrinação ao centro sagrado de sua tradição (por
exemplo, Santiago de Compostela, ou Jerusalém), o que era considerado um
substituto ou reflexo da verdadeira "Terra Santa", onde os conflitos e lutas se
finalizam, possibilitando assim a ascensão pelos estados superiores até
conseguir a saída definitiva da Roda do Mundo.

fig. 6

Como dissemos anteriormente, falando da simbólica do Templo, esses


labirintos se encontravam justo após a pia batismal (Yesod), e antes de
chegar ao altar (Tifereth, o coração), ou seja, entre o batismo de água –
relacionado com a regeneração psicológica e as viagens terrestres– e o
batismo de fogo, vinculado por sua vez com o sacrifício pelo espírito e as
viagens celestes, horizontais uns e verticais os outros. Na Árvore Sefirótica,
o labirinto corresponde, pois, a Yetsirah, ou plano das formações, ou das
"Águas inferiores", que o aprendiz tem de atravessar em sua viagem pelos
estados e mundos da Árvore da Vida.
Adicionaremos, para finalizar, que no Adam Kadmon microcósmico, ou seja,
o homem, este labirinto tem de ser localizado na zona ventral, área que se
destaca tanto por suas combustões e revoluções, como pela analogia que
apresentam seus órgãos internos com a representação geral do labirinto.

54 PLATÃO
Como no caso de Pitágoras, Platão é herdeiro da Antiga Tradição Órfica e
dos mistérios iniciáticos de Eleusis. Platão sintetiza, dá a luz, revela este
pensamento, recebido da boca de Sócrates e adquirido através de viagens e
estudos de toda índole ao longo de anos. A influência de Platão é decisiva
para a Filosofia, que a partir dele e de um de seus discípulos, Aristóteles,
gera-se. Sublinhe-se que a Filosofia promove a história do pensamento, e
que de sua aplicação prática em diversos níveis (que vão desde os
acontecimentos cívicos, econômicos e sociais, aos usos e costumes, a moral
e a religião, para acabar determinando as modas, as ciências, as técnicas e as
artes), surge o mundo em que os ocidentais vivemos, queiramo-lo ou não.
Apropriadamente, chamou-se "divino" a Platão. Na Antigüidade não se
tomava este apelativo como alegórico, senão que se acreditava na divindade
de Platão, ao qual também se considerou uma entidade, porque em seus
diálogos (que ocorrem entre vários personagens da Grécia clássica, que
expõem suas idéias, enquanto Sócrates as ordena e as rebate) não aparece
jamais. Os erros denunciados diretamente por Sócrates, e os mostrados por
Platão através dos distintos interlocutores, e da fina trama do diálogo, são,
curiosamente, os que, desenvolvendo-se desde então de maneira equivocada
e em progressão geométrica, desembocaram na crise do mundo moderno.
Nas obras de Platão está perfeitamente explicada a Cosmogonia Tradicional
e seu pensamento Filosófico e esotérico está tão vivo hoje em dia como no
momento em que o Mestre escreveu. Basta nos aproximarmos de suas idéias,
para se penetrar, quando é lido com suma concentração e sem preconceitos
culturais e formais, num mundo de imagens e signos que vamos percorrendo
levados por sua mão.

Símbolo dos atenienses e da cultura grega, Platão nasceu em 429 a.C.


Igualmente a Pitágoras, descreveu um mundo de Idéias, ou Arquétipos (os
"números" pitagóricos, as "letras" da Cabala) que geravam todas as coisas, e
nas quais as coisas se sintetizavam. Como seu Mestre Sócrates, sofreu, se
não a morte por veneno, a amargura do exílio, a desgraça e o cativeiro.

55 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Devemos repetir nossa prática respiratória assinalada nos dois capítulos
anteriores, à qual adicionaremos agora uma visualização singela, mas não
menos efetiva. Com os olhos fechados, trate de imaginar que a habitação, ou
espaço, no qual nos dispomos a efetuar este exercício, vai se enchendo de
uma fumaça de cor vermelha brilhante que emana suavemente de algum
ponto dela. Colocamo-nos, pois, em nossa postura costumeira, e enquanto
relaxamos, começamos lentamente a perceber que esta fumaça, ou este ar
vermelho brilhante, vem nos rodeando lentamente, e começamos a aspirá-lo,
retê-lo, expulsá-lo e a ficarmos sem ele, à medida que vamos ritualizando as
fases do exercício.

Em 1 absorvemos lentamente pelo nariz esta fumaça brilhante no tempo de


pulsações que elegemos para nossa comodidade. Em 2 o retemos e nos
inunda por completo. Em 3 o exalamos lenta e suavemente. E finalmente em
4, ficamos totalmente vazios, até que por imperiosa necessidade voltemos a
tomá-lo com suavidade e doçura, ao ritmo que nos impusemos.

56 ARTES E ARTESANATOS
Para uma sociedade arcaica, tradicional, arte é tudo aquilo que o homem cria
com suas mãos partindo do modelo arquetípico que contém em seu interior,
e que pode observar nas leis sutis que regem as produções da natureza,
manifestação da própria harmonia e da ordem universal. Esse modelo não é
outra coisa que a idéia de Beleza considerada como a mais alta expressão da
própria Arte do Criador, de quem se diz que a tudo fez "em número, peso e
medida". Por isso todo ato criativo, quando é conforme a esse modelo, imita
o rito original da criação do mundo a partir da substância amorfa e caótica,
ainda que essa atividade se trate de arquitetura, de artes visuais (escultura e
pintura), de artesanatos em madeira ou outros materiais, de ourivesaria, da
cerâmica, da cestaria e da tecelagem, da ebanisteria, de costura, de tapeçaria,
etc.

Alguns destes artesanatos ainda se conservam vivos em bastantes lugares, e


neles se mantêm seus segredos de ofício, os que são transmitidos por meio
de uma iniciação, tomando-se, portanto, como suportes da realização
interior, pois é a esta, em definitivo, que esses segredos se referem, já que
são os próprios da Cosmogonia em sua permanente recriação na alma
humana. Este é o sentido profundo dos símbolos e dos ritos próprios de cada
ofício, e que fazem deles uma atividade sagrada. Na realidade, todo homem
é um artista, e é sua própria vida a que constitui aquela substância amorfa,
ou pedra bruta, que tem de ser "trabalhada" pacientemente mediante a
permanente atualização dos ensinos recebidos pela Tradição, exercendo o
rito da memória e da concentração, até acabar integrado plenamente na
harmonia da Grande Obra Universal.

Nas antigas corporações de construtores medievais, o conhecimento do


ofício se dividia normalmente em três etapas ou graus de iniciação, que
correspondiam ao aprendiz, ao companheiro (oficial) e ao mestre, dando
assim uma idéia do desenvolvimento gradual de tal conhecimento. Há que se
dizer que aquelas corporações (estreitamente ligadas à Tradição Hermética)
deram lugar, durante o curso do tempo, à atual Maçonaria, que continua
conservando a mesma estrutura iniciática de seus longínquos predecessores.

57 ÍSIS
Na continuidade, queremos reproduzir uma oração à deusa egípcia Isis,
esposa de Osíris, associada à primeira iniciação, lunar, enquanto seu parceiro
se encontra vinculado com a segunda iniciação, solar, e ambos os dois se
acham conjugados na terceira e última iniciação, a polar, que faz possível a
realização do supracósmico, do não humano. Apuleio a inclui em sua obra
“As Metamorfoses” (ou O Asno de Ouro, século II d.C.) onde nos dá notícias
de que este antigo mito egípcio sobrevivia incólume na Roma de seu tempo.
Esta invocação é pronunciada uma vez que se efetua o descenso aos
infernos, onde se percebe diretamente e de modo potencial tudo o que
seguirá, do qual este descenso é só uma prova. Lembremos por último a
vinculação da deusa Isis com o arcano do Tarot, chamado “A Papisa” ou “A
Sacerdotisa”.

"Tu, em verdade santa, perpétua protetora do gênero humano, sempre


generosa em favorecer os mortais, Tu tens pelas tribulações dos
desafortunados um doce afeto de mãe. Não há um dia, uma noite, nem
sequer um pequeno instante que passe, sem que hajas prodigalizado teus
benefícios, sem que hajas protegido os homens na terra e no mar, sem ter
alongado tua salvadora mão, após afastar os embates da vida. E com essa
mão desfazes a inextricável e retorcida urdidura da Fatalidade, aplacas as
tempestades da Fortuna e neutralizas a influência funesta dos astros.
Veneram-te as divindades do céu, respeitam-te as do inferno; Tu dás o
movimento de rotação ao mundo; ao Sol, tua luz; ao mundo, tuas leis, com
teus pés pisas o Tártaro. A ti respondem os astros; por ti voltam as estações,
alegram-se os deuses, mostram-se dóceis os elementos. A uma indicação tua
sopram os ventos, incham-se as nuvens, germinam as sementes, crescem os
germes. Temem a tua majestade os pássaros que cruzam os céus, os animais
selvagens que vão errantes pelos morros, as serpentes que se ocultam sob
terra, os monstros do oceano. Mas eu possuo um pobre talento para cantar
teus louvores, e um reduzido patrimônio para oferecer-te dignos sacrifícios;
não possuo a facúndia necessária para expressar os sentimentos que me
inspira tua majestade; não possuo nem mil bocas, outras tantas línguas, nem
um inesgotável manancial de infatigáveis palavras, mas terei sempre diante
de minha imaginação, guardando-os no mais recôndito de meu coração, teu
rosto divino e teu santíssimo númen."

Isis é associada ao princípio feminino (e, portanto, vinculada à Terra e à


Lua), presente em todas as coisas, e se manifesta com as roupagens da
energia passiva, imanente e potencial. Diz-nos Plutarco num dos títulos de
seu “Ethika”:

"Isis é, pois, a natureza considerada como mulher e apta para receber toda
geração. Este é o sentido em que Platão a chama 'Nodriza' e 'Aquela que a
tudo contém'. A maior parte a chama 'Deusa de infinitos nomes', porque a
divina Razão a conduz a receber toda espécie de formas e aparências. Sente
amor inato pelo primeiro princípio, pelo princípio que exerce, sobre todo
supremo poder, e que é idêntico ao princípio do bem; deseja-o, persegue-o,
fugindo e rejeitando toda participação com o princípio do mal. Ainda que
seja tanto para um como para o outro matéria e habitáculo, inclina-se sempre
voluntariamente para o melhor princípio; a ele se oferece para que a fecunde,
para que semeie em seu seio o que dele emana e o semelhante a ele.
Regozija-se ao receber estes germes e treme de alegria quando se sente
prenhe e cheia de germes produtores. Efetivamente, toda geração é imagem
na matéria da substância fecundante, e a criatura se produz a imitação do ser
que lhe deu a vida."

58 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Situe-se exatamente no centro da habitação em que realiza suas práticas
respiratórias. Observe atenciosamente as coordenadas que formam o espaço
onde se acha e coloque-se no eixo onde todas elas coincidam. Imagine que
você está localizado na sefirah Kether. Feche os olhos e comece a regular o
ritmo de sua respiração, aspirando pelo nariz e expirando pela boca,
segundo o modelo que estamos praticando. A fumaça ou gás vermelho
brilhante é emanado desse ponto e você o aspira suavemente. Sincronize as
distintas práticas que simultaneamente está praticando. De En Sof, do Nada
infinito, surge uma débil esfumatura que você aspira e com a qual se
alimenta. Ao expirá-la, esta vai lentamente inundando toda a habitação com
seu resplendor claro e luminoso. Você é Kether e se alimenta da luz não
manifestada. Você é o começo dessa luz que exala e expande toda a Árvore
da Vida, a Criação Universal. Por seu intermédio se vai conformando
Hokhmah e este dá lugar a Binah, para voltar finalmente a você,
visualizados como uma triunidade de Princípios. Aspire e exale a fumaça
vermelha brilhante e, ao se identificar com as sefiroth, às que visualiza,
retorne a si mesmo, sendo um com a totalidade do Cosmo.

Exemplo: Ao aspirar à realidade de En Sof, possibilidade de tudo o que é


existente, você se constitui em Kether, princípio da luz da manifestação
universal. Ao expelir, você se conforma a Hokhmah, princípio ativo do
Cosmo. Ao inalar novamente, você é esse Hokhmah, ao que se conforma, e
ao voltar a exalar, está criando Binah, receptáculo, ou princípio de toda
possibilidade. Finalmente você é Binah e aspira a energia de Kether, e ao
exalar seu ar, devolve a Kether essa possibilidade para que tudo possa
novamente voltar a começar.
59 BIOGRAFIAS
Estamos oferecendo uma série de esboços "biográficos" (Heracles-Hércules,
Moisés, Hermes, Pitágoras, Platão, Isis) de “pessoas", seres ou entidades que
encarnaram estados espirituais e necessariamente os têm derramado sobre o
meio, segundo era seu destino e sua função. Não nos interessam destas
histórias arquetípicas os traços humanos e anedóticos nem as valorações a
que esses enfoques se prestam. Cremos que são importantes ao serem
simbólicas, ou seja, como reveladoras de determinadas pautas esotéricas,
perfeitamente assimiláveis –quanto são exemplares– ao homem em geral,
por serem universais e não sujeitas por isso ao espaço e ao tempo senão de
modo secundário. Têm também outra função: a de ir preparando o caminho
para o conhecimento e o entendimento de outra história, secreta para os que
não são capazes de aprofundar e estabelecer relações entre símbolos e se
sentem satisfeitos com as cômodas e inverossímeis histórias oficiais. A
verdadeira história é outra coisa. E os ocidentais podemos ler na nossa, como
numa simbólica de ritmos e ciclos, uma dança de cadências e
entrelaçamentos, não casuais por certo, e onde todos e cada um dos fatos
adquirem um significado na harmonia do conjunto, que se contempla sob
uma leitura diferente, banhada por uma nova luz. Ademais, e é o importante,
isto é especialmente válido para ser aplicado a nossa própria vida, às
anedotas, acontecimentos e histórias relativas de nossa existência, que têm
de ser consideradas sob um enfoque simbólico e nunca como um conjunto de
posses personalizadas e exclusivas com as quais nos identificamos.
60 MUSAS
Para todo povo há entidades intermediárias, às vezes são os próprios deuses,
outras semideuses. As Musas, habitantes do Olimpo, são deusas.

Filhas de Zeus e Mnemósine, sua quinta esposa, com a qual se uniu sob a
aparência de um pastor, foram engendradas em nove noites distintas, longe
dos demais imortais, com o objeto de que tivesse quem celebrasse a vitória
dos Olímpicos sobre os Titãs.

Deusas da Memória (do céu) e da inspiração poética, atribui-se-lhes o poder


de dar os nomes convenientes a todos os seres. Guardiãs do oráculo de
Delfos , dizem "o que é, o que será e o que foi".

Ainda que tenham nascido no morro Pierio, e ainda que visitem o Olimpo,
onde alegram as festas dos imortais com seus cantos com que fazem
resplandescer o palácio de seu pai, gostam de se reunir no cume do monte
Helicão, de onde se aproximam na noite até a morada dos homens, que
podem ouvir assim, na quietude, a melodia de suas vozes. Elas comunicam
também aos olímpicos os males e sofrimentos destes, o canto de cuja criação
é uma alegria para Zeus.

Estas entidades femininas, capazes de tomar indefinidas formas, e de não as


tomar, e de revelar aos homens –se assim elas o desejarem–, seja através da
harmonia daquelas, ou mediante o ritmo e o número, ou diretamente de sua
própria voz, os mistérios da geração dos deuses, da ordem da Cosmogonia,
das façanhas dos heróis em procura do céu e da cosmificação da terra, têm o
poder de transformar a realidade, pois a audição de seus cantos faz do
sensível símbolo da harmonia da Alma do mundo, manifestação e imagem
do deus polar, Apolo.

Elas unem o homem com o sagrado porque estão diretamente vinculadas


com o segredo e a harmonia da Criação (Cosmogonia) que revelam na alma
humana, onde a reproduzem (poiésis = criação), e que conduzem assim ao pé
do eixo que une os mundos, simbolizado na fonte, na pedra, na azinheira1,
que aparecem no começo do canto de Hesíodo, a Teogonia. Como no
Museu, onde se acham os produtos daquela audição e, portanto, da Memória,
ao abrir um livro inspirado se abre também seu templo, ou mansão.

Ainda que apareçam como virgens, algumas tiveram filhos com deuses e
homens; no entanto os destinos desta descendência assinala como o
verdadeiro fim a geração espiritual, supracósmica, às vezes de forma trágica,
como é o caso de Lino, filho de Urânia e de um mortal, ou, segundo alguns,
de Apolo e Calíope –ou Terpsícore–, a quem este matou ao ser desafiado no
canto; outras, como exclusiva geração do amor, como o de Himeneo,
nascido da união de Apolo e Calíope.

Sendo ao começo três, quando nos tempos arcaicos, seu número ficou fixado
em nove segundo a Teogonia de Hesíodo, a quem elas mesmas a revelaram,
e seus próprios nomes estão unidos a sua função:

Clío: que preside a História, e que canta a "glória" dos homens e a


"celebração" dos deuses, sendo seus atributos a trombeta heróica e a
clepsidra.

Eutherpe: "a que sabe agradar", e que preside a música de flauta e outros
instrumentos de sopro.

Thalía: a comédia, "a que traz flores", ou "a que floresce", nome também de
uma das três Graças, representada com a máscara da comédia e o bastão de
pastor.

Melpómene: a tragédia, a que canta "o que merece ser cantado", representada
com a máscara trágica e a clava de Hércules.
Terpsícore: a música em geral e a dança, a que "ama a dança", cujo atributo
é a cítara.

Erato: a poesia lírica e os cantos sagrados, acompanhada pela lira e o arco,


cujo nome procede de Eros, o primeiro deus que apareceu após Gea, nascida
de Caos e geradora dos demais deuses.

Polimnia: a arte mímica, a que inspira a união dos “múltiplos hinos", e se


vinculam a ela a retórica, a eloqüência, a persuasão, representando-a com um
dedo nos lábios.

Urânia: a "celeste", a astronomia, a contemplação da harmonia do céu,


representada com um trípode junto a ela.

Calíope: a poesia épica, a de voz "mais bela" ou "verdadeira", a que


reproduz a imagem do som primordial que se ouve no centro de todo ser, e
que só depois de determinado estádio do ciclo se acha na cúspide da
Montanha (Helicão), que deve ascender aquele que realiza o caminho de
retorno, haja vista que o Olimpo é o lugar dos deuses imortais (os estados
supra-individuais do ser), montanha celeste à qual elas mesmas se dirigem
desde a anterior, após ter presenteado os homens, enquanto deixam ouvir
depois de si um "encantador som que surge de seus passos".

1
N.T. – Azinheira = Quercus ilex - Árvore de até 27 metros, de copa ovóide ou
arredondada. Ritidoma não suberoso e escamoso-gretado. Ramos principais eretos.
Raminhos estreitos e tomentosos. Folhas persistentes, orbiculares. As juvenis são serradas,
as adultas são inteiras. Bolotas de maturação anual, aquénios e cúpula, com escamas
imbricadas mais ou menos aplicadas e tomentosas.

61 MAGIA
Falaremos da palavra magia e de seus possíveis equívocos. A vida inteira,
que se está manifestando em todas as ordens neste mesmo momento, é desta
forma uma função permanente de magia, ou seja, que a realidade na qual
vivemos é mágica. Nesse mesmo sentido nossa atuação nela também o é, de
modo natural, e a participação do homem neste processo é parte integrante
do próprio processo. A vida e nossa existência se estão fazendo
permanentemente e nós podemos participar ou influenciar nela de acordo a
determinadas pautas, relacionadas com certos ritos especiais. Pois no caso do
rito sucede o mesmo que com o símbolo: conquanto toda manifestação é
simbólica e igualmente a vida um perpétuo rito, no entanto existem certos
símbolos e ritos particulares que em forma mágica atuam sobre nós, sempre
que o sujeito que pratique determinados exercícios se encontre no estado
adequado para os realizar e sejam sensatas e sãs suas intenções. A Tradição
Hermética trabalha constantemente com símbolos e também utiliza
determinadas "cerimônias", para vivificar esses símbolos trazendo-os assim
ao plano da ação. Determinados "métodos", gestos ou formas de trabalho,
capazes de promover em nós, e em nosso meio, determinadas situações e
energias aptas para serem moldadas por uma vontade lúcida e retamente
ordenada na triunidade Verdade-Beleza-Bem.

62 TROPEÇOS E DIFICULDADES
Sem dúvida o leitor que nos segue atenciosamente deve ter encontrado ao
longo deste curso variadas e diversas dificuldades. Isso é próprio de qualquer
aprendizagem, e se agrava numa deste tipo, aonde em algumas ocasiões se
vai contra muitas das formas de ver próprias do homem contemporâneo e da
sociedade que este formou (e na que nós criamos), que não crê na realidade
do Espírito, nem na de outras possibilidades da criação e do homem, salvo
naquelas estritamente ligadas com a comprovação estatística, a análise
empírica, e com a manifestação exclusivamente visível e fenomênica. Neste
sentido, nosso interesse por temas ocultos e espirituais pode nos criar
algumas dificuldades com respeito ao meio, que não sempre compreenderá
nossa vocação, ou nos crerá enganados e até defeituosos de razão. Isto vem
adicionar-se a nossos próprios tropeços internos e à aparição de dúvidas,
incapacidades, paixões latentes e desconhecidas que surgem, vacilações,
fobias, manias, etc., que jazem no fundo de si mesmo e que começam a
despertar –na sábia economia do Universo– a par que nos alumiam outras
tantas áreas com a luz que provém do Conhecimento. Os símbolos revelam e
velam ao mesmo tempo.

63 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Seguindo com nossa série de práticas respiratórias, trataremos de ir
interiorizando em forma inconsciente, o segundo plano cabalístico. Sente-se
novamente no centro de sua habitação. Agora você imagina que é Hesed, a
sefirah N° 4. Em verdade você é tal qual uma árvore, neste caso a Árvore da
Vida, que extrai seu corpo do alimento que o ar lhe brinda. Aspira, pois, do
plano dos Princípios Eternos, seu nutriente vital, e conforma com ele seu
próprio corpo, ou seja, o de Hesed. Quando exala sua energia, passa a
Gueburah, conformando-o. Logo você mesmo é Gueburah, que inala a força
de Hesed, a retém e a expele para Tifereth, dando-lhe existência dessa
maneira. Agora você é Tifereth, a síntese de toda a luz incriada da Árvore
da Vida e conjuga toda a possibilidade da manifestação Você e a fumaça
vermelha esplendente são uma mesma e única coisa. Ao inalar a energia
sucessiva do plano ou mundo de Atsiluth, você concentra toda a energia do
plano da Criação arquetípica, o que tem de sustentar a ordem em que se
produzem as formas invisíveis.
64 DANÇA
Desde a mais remota Antigüidade, e de maneira unânime em todos os povos,
aparece a dança como expressão do sentir do homem, e como um ato natural
nele. Unida sempre à música e ao canto, como uma trilogia rítmica
indissolúvel, ela constitui um gesto espontâneo que se articula com o ritmo
universal. Este se colocar "no ritmo", este "ritmar" com o Cosmo, é a
essência e a origem da dança, cujas coreografias e movimentos circulares se
inspiram na ordem dos planetas e seus efeitos e correspondências na
manifestação. O homem, o dançarino, é o intermediário entre céu e terra, e
seus passos repetem e representam a Cosmogonia primordial à qual
imediatamente assinala um caráter repetitivo e ritual. Graças a estes gestos e
figuras ideais, ou "patronos" simbólicos, e à total entrega à dança, o ser
humano se vê transportado a outro mundo, a outro espaço mental, onde sua
participação ativa no presente através do movimento faz com que se conecte
com uma só e única onda, ou vibração, compartilhada pela criação inteira.
Quando isto é assim, é que se compreendeu o sentido mágico da vida, da
qual é parte.

65 A NAVE
A nave, por sua estrutura, aparece como uma imagem simbólica do Cosmo.
Seu mastro central representa o Eixo do mundo, que vai do zênite ao nadir, e
a gávea, que em muitas ocasiões o rodeia circularmente por cima, equivale
ao "olho do domo" das catedrais e de todo edifício construído seguindo o
mesmo modelo cósmico. Advirtamos que o espaço interior do templo cristão
também se denomina nave, sendo esta precisamente um dos emblemas dos
pontífices católicos, também chamados "pastor e nauta". Desta forma, a nave
está orientada segundo os quatro pontos cardeais: a direção proa-popa
assinala o eixo vertical norte-sul, e a direção estibordo-bombordo o eixo
horizontal este-oeste. É também uma imagem da Arca boiando sobre a
superfície das Águas Inferiores, contendo os germes de um novo ciclo, pelo
que também é relacionada com a copa, a matriz, e por extensão com o
coração e a caverna.

Lembraremos que o antigo lema dos marinheiros: "Navegar é preciso, viver


não é preciso", ilustra-nos perfeitamente acerca do sentido profundo da
navegação, do peregrinar pelas Águas Inferiores em busca do Centro,
simbolizado pela ilha ou continente mítico das origens. Efetivamente, a vida
não tem nenhum sentido, nenhuma “orientação”, se ela não está concebida
como uma aventura em busca do Conhecimento, para o qual é necessário,
como se diz no I-Ching, atravessar as "Grandes Águas", ou o "Mar das
paixões” inerentes à individualidade humana, como se afirma no hinduísmo,
e em geral em todas as tradições.
66 AS COLUNAS E A PORTA
As colunas são evidentemente símbolos do eixo. Estão expressando a idéia
de ascensão vertical que une a Terra e o Céu. Quando se tratam de duas
colunas rematadas em sua parte superior por um arco ou cimbre, este último
simboliza ao Céu, enquanto o retângulo que formam as colunas simboliza a
Terra. A porta é também uma esquematização da estrutura completa do
templo, especialmente visível nos pórticos das catedrais e mosteiros cristãos.
Esse semicírculo do arco simbolizando o Céu se encontra no coro do altar ou
abside, que é a projeção sobre o plano de base horizontal da cúpula ou
abóbada. E o resto do templo, da porta ao altar, representa a Terra.

A porta (emoldurada pelas duas colunas), com sua dupla função de separar e
comunicar dois espaços (o espaço profano do espaço sagrado), está em
relação com os ritos de "trânsito" ou de "passagem", ligados por sua vez com
os mistérios da Iniciação, que constituem os mistérios da vida e da morte.
Trata-se de um simbolismo primordial que se encontra, sob distintas formas,
em todas as tradições.

As duas colunas são um símbolo da dupla corrente de energia cósmica,


ativa-passiva, masculina-feminina, rigor e graça, que articula o processo da
criação universal em todas suas manifestações. Traspassar o umbral do
Templo-Cosmo é ser penetrado por esta dupla energia que convenientemente
harmonizada nos conduzirá, através de uma viagem regenerativa e por
etapas, à saída do mesmo por outra porta, desta vez pequena (a "porta
estreita" do Evangelho, ou "olho da agulha" como se diz na tradição hindu),
situada na "chave de abóbada", e, portanto, na sumidade da cúpula. "Eu sou
a Porta", diz Jesus Cristo, "e quem por mim passa vai ao Pai". A porta de
entrada ao templo, e a que está simbolicamente na sumidade da cúpula, são
respectivamente, e utilizando a simbologia da Antigüidade greco-latina, a
"porta dos homens” e a ”porta dos deuses", as duas portas zodiacais de
Câncer e Capricórnio. Pela "porta dos homens", há o nascimento ou a
entrada no Cosmo; pela "porta dos deuses", deixa-se ele, acessando à
realidade supracósmica, além do Ser, não condicionada por nenhuma lei
espaço-temporal, e da qual nada pode se dizer.

Por sua relação com a caverna iniciática, o templo é semelhante ao corpo da


Grande Mãe, sob seu duplo aspecto telúrico e cósmico. As duas colunas são
também as duas pernas da Mãe parturiente, em cuja matriz o neófito, que
vem do mundo das "trevas profanas", morre para sua condição anterior,
renascendo na verdadeira Vida. Trata-se naturalmente de uma iluminação na
esfera da alma, do nascimento do Homem Novo que habita em cada um de
nós.

Pela Iniciação, o Cosmo, com todos seus mundos e planos, aparece como a
autêntica casa ou morada do homem, na qual já não se sente estranho ou
alheio, pois morreu para o velho homem, e se reintegrou ao pulsar do ritmo
universal, do qual toma parte.
67 CABALA
Anteriormente, demos a idéia do simbolismo das colunas e da porta. Na
continuação, queremos transpor este simbolismo para nosso diagrama da
Árvore Sefirótica, ou Árvore da Vida cabalística:

68 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Como nas duas lições anteriores, referentes aos exercícios respiratórios do
plano ou mundo de Atsiluth e do de Beriyah, respectivamente, começamos
tomando os cuidados convenientes para nossa prática. Agora tomemos
nosso alento diretamente da fonte da luz e do calor: Tifereth, o Sol. Este,
por sua vez a toma do espaço infinito e a emana diretamente para nós.
Agora estamos localizados em Netsah, a sefirah N° 7, e aspiramos essa
energia que nos inunda e se faz evidente na zona baixa de nosso plexo solar.
Começamos a expirá-la suavemente para Hod, a sefirah N° 8, percebendo
que o vermelho brilhante se faz mais intenso, bem como a sensação de
“corporalidade" em todo o exercício. Retemos toda essa força e a exalamos
para Yesod, a sefirah N° 9, e notamos como desce e se vai coagulando, até
ficar estática, sinal de que a transmissão se efetuou. A copa ficou prenhe de
frutos, e a receptividade de Yesod passa agora a cumprir um papel
generativo e fecundador. Expelimos então nosso alento para o plano ou
mundo de Asiyah, para a Concreção material, fruto e manifestação sensível
das emanações, e efetivização das energias de toda a Árvore da Vida
cabalística.

69 MITOLOGIA CABALISTICA
Todos os povos, desde a mais remota Antigüidade, conservaram a realidade
do mito como um componente essencial de sua concepção do mundo, de sua
Cosmogonia e Teogonia. Por muito longe que nos remontemos na história
das civilizações tradicionais, sempre encontramos nelas uma rica profusão
de relatos e lendas relacionados com seres míticos, que servem de
comunicação entre a Terra e o Céu, entre o de baixo e o de cima. A tradição
cabalística também conserva um grande número de gestas míticas vinculadas
com o descenso à Terra das energias celestes, angélicas ou espirituais.
Assim, na Cabala se acha com freqüência o nome de Metatron, que se
identifica com o arcanjo Miguel, também chamado o "Príncipe das Milícias
Celestes".

A Cabala considera o Metatron como o princípio ativo e espiritual de


Kether, a Unidade, que com as tropas divinas sob seu comando (as sefiroth
de construção cósmica) empreendem a luta contra as potências do mal e das
trevas (que constituem seu próprio reflexo escuro e invertido, as "cascas",
"escórias" ou keliphoth) dissipando a dúvida e a ignorância no coração do
homem, fecundando-o, simultaneamente a essa mesma ação, com a
influência espiritual que transmitem. Em algumas representações da
iconografia cristã e Hermética pode se ver este combate mítico nas figuras
do arcanjo Miguel e das hostes angélicas, lutando contra os demônios e Satã,
o "príncipe deste mundo", segundo a conhecida expressão evangélica.

Com o mesmo significado, mas a nível humano, encontramos o cavaleiro


São Jorge combatendo o Dragão terrestre, símbolo das paixões inferiores e
do "caos". Precisamente, a lança ou espada (símbolos do eixo) de São Jorge
atravessando o corpo do monstro, sugere a "penetração" das idéias celestes,
verticais e ordenadoras, em dito "caos". Esta variante do mito é análoga à
luta que o homem acomete na busca do Conhecimento, o que lhe dá a
possibilidade de viver um processo mítico idêntico ao dessas mesmas
energias cósmicas e telúricas, celestes e infernais, em permanente luta e
conciliação.

Relacionado em certo modo com as origens da Tradição Hermética, e


intimamente vinculado com o que vimos dizendo, encontra-se o mito dos
"anjos caídos", que igualmente é relatado no Gênesis bíblico. Considerado
desde o ponto de vista da Ciência esotérica –que tende a resolver os opostos
e, portanto, exclui, por insuficientes, o simplesmente moral e sentimental,
bem como as leituras demasiado literais das coisas, que estão incluídas no
ponto de vista simplesmente religioso e exotérico– a "queda dos anjos"
representa, ante tudo, um símbolo do descenso das influências espirituais no
seio da própria vida e da natureza humana.

Certos anjos caíram acesos pelo amor que professavam às filhas dos homens
às quais, diz-se, "encontraram formosas e belas". De seu casamento,
nasceram seres semidivinos (os antepassados míticos), que revelaram aos
homens as ciências e as artes teúrgicas, mágicas e naturais, ou seja, todas
aquelas disciplinas que, como já sabemos, integram os textos sagrados dos
“Hermética” e do “Corpus Hermeticum”.

70 A MONTANHA E A CAVERNA
A montanha, junto com a pedra (forma reduzida desta) e a árvore, com que
se encontra associada, é um símbolo natural do "Eixo do Mundo". Por ser na
realidade uma elevação ou protuberância da terra, a estrutura imaginal do
homem sagrado vê na montanha um símbolo da sua própria natureza, que
aspira verticalmente para o superior ou celeste. Em geral todas as montanhas
têm esse significado, mas existem algumas que, devido a certas
correspondências espaciais relacionadas com a topografia sagrada estão
"carregadas" de influxos espirituais. Estas são as denominadas "Montanhas
Santas" ou "sagradas", morada de entidades espirituais. Por isso, muitos
templos e santuários (como é o caso, por exemplo, do Partenon grego) foram
construídos nos cumes de determinadas montanhas, ou seja, ali onde a Terra
parece tocar o Céu.

Assim a montanha, quanto a sua estrutura, é um arquétipo do templo, o que é


especialmente visível nas pirâmides egípcias e pré-colombianas e nos
zigurates babilônicos. Relacionado com isto, é significativo o fato de que
Dante, na Divina Comédia, situe ao Paraíso Terrenal, ou Jardim do Éden (do
qual todo templo é uma imagem simbólica), no cume de uma montanha, que
é a "Montanha Polar", "Celeste" ou "Mítica", comum a muitos povos
tradicionais, como é o caso do monte Meru entre os hindus, o Alborj entre os
antigos persas, o Sinai e Moriah entre os hebreus, a montanha Qaf entre os
árabes, ou o morro Urulu (ou ¨Ayers Rock¨) entre os aborígines australianos,
etc. A vinculação da montanha com o Paraíso nos sugere seu caráter
primordial, pois este, ou seu equivalente em qualquer tradição, é considerado
como o começo ou origem mítica da humanidade (a "Idade de Ouro"),
quando todos os homens sem exceção participavam do Conhecimento e da
Verdade. O Paraíso era também a residência da Grande Tradição Universal,
conservadora da doutrina e da sabedoria perene, e toda montanha sagrada,
como o Éden, é o símbolo do Centro do Mundo. Mas a partir de certa época,
e devido às condições cíclicas adversas, o Conhecimento deixou de pertencer
à totalidade dos homens, ficando em posse tão só de umas minorias que, para
o salvaguardar e o manter através dos tempos, criaram as culturas
tradicionais, conformadas pelos ritos e símbolos sagrados. O Conhecimento
se repregou no interior de si mesmo, no coração da montanha, ou seja, na
caverna, um lugar que por sua situação está oculto e protegido.

Por tal motivo o mundo "supra-terrestre" gerou, em certo modo, o "mundo


subterrâneo". Fez-se invisível. Ocultou-se, mas não desapareceu. A
vacuidade escura da caverna substituiu à luminosidade da cúspide da
montanha. A Verdade, que nos primeiros tempos era espalhada aos quatro
ventos e estava na boca de todos, converteu-se num segredo só percebido no
mais interno. A caverna (como o ovo) é também um símbolo do Cosmo, um
"Centro do Mundo" igualmente à montanha. Porém, assim como nesta [a
Verdade] se manifesta em todo seu desenvolvimento e amplitude, à vista de
todos, na caverna, o Centro se mantém invisível, virtual e potencial. O
templo é igualmente uma caverna, ainda que esta se encontra mais bem
representada pela cripta, situada em muitas catedrais debaixo do Altar, ou
seja, sobre o mesmo eixo perpendicular que parte da "chave de abóbada", ou
seja, da sumidade. Na caverna sagrada se produzem as hierofanias e se
celebram os mistérios da Iniciação, o mesmo que as "revelações" e
"aparições" da divindade. Lembremos que Jesus Cristo nasce num estábulo,
equivalente da caverna. Por outro lado, o mesmo esquema simbólico
tradicional para representar a caverna é idêntico ao do coração e ao da copa,
ou seja, um triângulo eqüilátero com o vértice para baixo, dando a imagem
de um recipiente que recolhe os eflúvios espirituais. O símbolo geométrico
da montanha é por sua vez um triângulo, mas com o vértice para cima.

Existe aqui uma aplicação deste símbolo, que completa o que se disse até
agora, e é que como a caverna está no interior da montanha, podemos ver
que a reunião de ambos conforma o símbolo já conhecido do "Selo de
Salomão" ou "Estrela de David". Este é, como já sabemos, o símbolo da
analogia, que faz que o de baixo seja complementar com o de cima e vice-
versa. Portanto o triângulo invertido é um reflexo do outro, exatamente igual
que o microcosmo é um reflexo do macrocosmo, ou que a realidade relativa
do manifestado é um reflexo da Realidade Absoluta do imanifestado.

71 O SÍMBOLO DA PEDRA
Entre os materiais de construção, o mais importante é naturalmente a pedra.
Mas esta, como tudo o que forma parte do Templo, tinha para os
construtores das civilizações tradicionais que utilizaram esse material (pois
se sabe que antes dele se edificava com madeira), um sentido simbólico bem
preciso, que é o que lhe dá toda sua importância desde o ponto de vista
sagrado.

A pedra expressa dois aspectos bem distintos. Por um lado, e devido a sua
tosquedade e arestas, simboliza a natureza grosseira e imperfeita do homem
profano. Por outro, graças a sua solidez e estabilidade, reflete mais do que
nenhuma outra coisa a presença imutável de Deus no seio da Criação. E isto
é precisamente o que faz que uma determinada pedra seja venerada como
sagrada. É o caso dos betylos-oráculos2, que eram geralmente aerólitos, ou
pedras "descidas do céu", e associadas, portanto, com o raio e com a luz.
Adicionaremos que "betylo" procede de Beith-El (que significa "Casa de
Deus"), nome dado ao lugar onde Jacob repousou sua cabeça e teve o sonho
no qual via descer e ascender anjos por uma escada que unia o Céu e a Terra.
(Essa mesma palavra, Beith-El, converteu-se posteriormente em Beith-
Lehem, ou Belém, a "Casa do Pão", e designou a cidade na qual devia nascer
Cristo, o Verbo descido no seio da substância terrestre).

Por tal razão houve épocas e culturas onde se estava terminantemente


proibido talhar as pedras destinadas a um culto especial, pois estas eram
consideradas como a própria expressão da substância indiferenciada (a
matéria prima) e virginal da natureza divina. Mas este não é o caso dos
templos que, como as catedrais, precisam para sua solidez pedras
completamente talhadas, esquadrejadas, polidas e trabalhadas com o martelo
e o cinzel. A pedra já não expressará essa virgindade indiferenciada, mas o
caos amorfo do profano que precisa ser ordenado pelas réguas e métodos da
Arte.

Ao polir a pedra bruta, o aprendiz construtor estava realizando um trabalho e


um gesto ritual consigo mesmo. A pedra era ele mesmo, e a transformação
desta em pedra talhada e cúbica simbolizava a transmutação qualitativa de
todo seu ser.
2
N.T. – Betylo - Pedra sem lavrar, ou toscamente talhada, à qual rendiam culto os povos da
antiguidade, considerando-a como a representação de uma divindade, ou como a própria
divindade.

72 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Pratique os exercícios aos que já está acostumado durante uns vinte
minutos. Logo sinta como a energia sutil penetra suavemente por sua coroa
(Kether) e desce agora até seu coração (Tifereth), expandindo-se logo para
sua zona ventral e os genitais (Yesod). Sinta, ao ritmo de sua respiração,
como as energias descem até Yesod e finalmente se concretizam no plano
material (Malkhuth), e logo ascendem e retornam pelo mesmo caminho a
sua origem e são expelidas para fora de Kether através de um processo
evolutivo. Sua coluna vertebral é o eixo por onde começou a se enroscar a
serpente Kundalini, que, situada na base de sua coluna vertebral, começa a
se desenroscar; o que é o mesmo que o retorno das energias criativas a sua
Origem.

73 ARQUITETURA
A Arquitetura, ligada à arte da construção, nasce simultaneamente como
uma necessidade material e uma necessidade espiritual. Como necessidade
material, foi imperioso, num determinado momento da história, pôr-se a
coberto e abrigado das intempéries meteorológicas e de toda classe de
perigos e condições adversas. E como necessidade espiritual, porque toda
edificação, quaisquer fossem os materiais e os modelos arquitetônicos
utilizados, tinha e tem uma significação unida ao culto religioso e sagrado.
Um exemplo deste é o próprio Templo ou Santuário, do qual já falamos,
ainda que também estava, e está presente aonde ainda se conserva uma
cultura tradicional, na própria moradia, na qual destaca o lar ou fogo central
análogo ao Altar. Em ambos os casos a arte da construção se baseia na
contemplação de um gesto divino primordial: a Criação do Mundo. O
Cosmo físico, criação do divino Arquiteto, proporcionava ao arquiteto
humano o modelo de sua própria morada. Céu e Terra constituem a parte
superior e inferior do edifício. Neste sentido, sendo a realidade concreta do
Cosmo uma manifestação dos mundos invisíveis, a construção da casa
familiar e cultual deve cumprir uma função similar, ou seja, servir de
recipiente e suporte às energias criadoras do Universo, plasmando-as na
configuração de seu traçado e em cada uma de suas partes e elementos. E já
vimos que essas energias se expressam simbolicamente por meio de módulos
numéricos e geométricos, estreita e harmonicamente vinculados entre si.
Catedrais e mosteiros, por exemplo, são verdadeiros compêndios da vida
universal, onde estão representados na pedra os diversos reinos da natureza,
do mundo intermediário, e do mundo espiritual ou angélico, em suma, o
"Livro do Universo". Por isso os Mestres arquitetos e os operários a suas
ordens, divididos em diversos graus, tivessem um conhecimento perfeito da
Metafísica, a ontologia, a cosmologia e as ciências naturais. As próprias
ferramentas e elementos utilizados para a edificação são simbólicos, além de
práticos, e entre eles merecem ser destacados o compasso, o esquadro, o
nível, o prumo, a régua, a colher de pedreiro, o martelo e o cinzel.

74 A HIERARQUIA
Um dos maiores erros do homem atual, filho da sociedade contemporânea, é
acreditar numa suposta igualdade totalmente ausente na vida e na própria
natureza, já que todos os "reinos" e espécies se encontram perfeitamente
hierarquizados. Por este expediente igualitário se nega toda possibilidade de
superação, já que se atribui aos demais a pequena mediocridade do meio que
se vive e encarna, e as pessoais densidades e pesadelos que constituem a
existência individual dos que integram uma sociedade dessacralizada.
Projeta-se assim uma imagem rasteira, sem ter em conta nem por um
momento a experiência, a sabedoria, a idade, os estudos e as viagens
daqueles com os quais se pretende equiparar, numa comparação absurda que
se produz pelo fato de "crer" numa "igualdade" que é tomada como um
autêntico "bem" em si mesmo, e mesmo como um progresso cívico e
democrático.

É comum ver em povos e províncias que às pessoas, que por algum motivo
se destacam, trata-se de lhes "puxar o tapete”, ou de lhes “descer do
pedestal”. Esta última imagem é muito plástica: há que fazer "baixar o nível"
do outro quando não se pode ou não se quer ascender a seu nível.

Não há maior igualdade que aquela que temos os homens, a de albergar a


deidade no interior de cada ser, possibilidade que levamos os seres humanos
sem exceção e que constitui o que verdadeiramente une. Ou seja, a igualdade
ante e no Ser Universal da qual todos os seres de alguma maneira somos
partícipes, e a liberdade de conseguir a fusão nesse Ser Universal que deu ao
ser particular uma Origem e um Destino comum.

75 ARTES MARCIAIS
As bem chamadas "artes" marciais constituem a possibilidade da consecução
permanente na conquista do equilíbrio através da ação-reação. Esta dança,
reflexo da [dança] cósmica, permite a defesa e o ataque e o intercâmbio
rítmico das energias amigo-inimigo, eu e o outro, no qual um deles deverá
necessariamente impor-se para que possa se perpetuar a harmonia universal
por meio da desarmonia do vencedor e do vencido.

As artes marciais tradicionais jamais consideraram o extermínio do


adversário, senão que, pelo contrário, costumam utilizar a energia do inimigo
para deixá-lo desarmado e, portanto, indefeso e rendido, mesmo tendo em
conta o seu furor.

Alguns estrategistas afirmam que uma boa defesa consiste num bom ataque e
alegam importantes razões a seu favor. Igualmente na guerra às vezes os
vencedores costumam ser os vencidos. Não se pode entrar na batalha com a
onipotência do que não respeita as leis da guerra, e muito menos se não se
tem a convicção de vencer.

Há dois grandes princípios na estratégia que podem ser a causa da


impecabilidade de um guerreiro: a) não subestimar o adversário; b) não
mostrar as armas ao inimigo (Tao Te King). Ademais, deve saber o guerreiro
de que suas emoções são secundárias sempre que sua causa seja justa. Na
eleição dessa causa e no conhecimento que isso supõe está a chave do
sucesso final. Caberia também enumerar uma terceira regra: deixa as
pegadas necessárias para que tenham que se enfrentar contigo. O perseguidor
está sendo perseguido. Conquanto isto não é o fim de nossos estudos –que
aspiram à Metafísica- não deixam de ser úteis estas advertências em certas
ocasiões.

76 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Ensaiaremos um exercício respiratório baseado na primeira Tríade da
Árvore da Vida. Não só o diagrama Sefirótico se divide em quatro planos
(Atsiluth = Fogo, Beriyah = Ar, Yetsirah = Água, Asiyah = Terra), mas
também cada uma de suas colunas (a da Força ou ativa, a da Forma ou
passiva, e a do Equilíbrio ou neutra), por sua vez representa: o princípio
ativo do fogo, expressado pela letra mãe hebraica Shin; seu oposto, o
princípio passivo da água, significado pela Mem; e o neutro do ar que
corresponde à letra Alef. Por isso, Kether, pertencendo à coluna central, ou
neutra, tem de levar à toda a Árvore o hálito vital, que recebe desde seus
inícios a contradição do fogo (coluna da Força formada por Hokhmah,
Hesed e Netsah) e da água (coluna da Forma constituída por Binah,
Gueburah e Hod).

Assim, pois, você, localizado no eixo polar da Árvore Cósmica e do mundo,


aspirará a energia infinita de En Sof, que ao ser expelida conformará
simultaneamente o fogo positivo de Shin e a água negativa de Mem, os
quais num ponto deixarão de se opor para se multiplicarem e sobrevirão
finalmente em Malkhuth, a Rainha (equiparada ao princípio do elemento
terra) no plano ou mundo de Asiyah.

Da terra, voltará a ser aspirada pelo vento de Kether, a letra Alef, a


primordial, da qual tudo é exalado e na qual tudo é reabsorvido. Você é o
criador da Árvore da Vida, que se articula e se harmoniza através de seu
próprio processo respiratório, que volta novamente a você, para ser
reintegrada no Si Mesmo.
Inale a luz incriada de En Sof e com sua expiração, lenta e prolongada,
converta-se no vento original que impulsiona a máquina do mundo. O ativo
e o passivo tendem a desequilibrá-lo vez por outra, mas você conserva seu
rumo independente, absolutamente eqüidistante de ambos. Seu caminho é
dificultoso e deve ultrapassar todos os obstáculos. Leve as emanações e
vibrações mais sutis das sefiroth da Árvore e faça com que elas se
materializem na terra, para assim poderem ser reintegradas a você mesmo,
pois é o alimento e a energia da qual precisa se reabastecer para viver.

Você é Kether, e seus lados esquerdo e direito, Hokhmah e Binah. A Terra é


o firme embasamento de seus pés e esta totalidade do conjunto dos
elementos se transfere a seu corpo e você é capaz de perceber a idéia da
plenitude, e da totalidade.

77 CIÊNCIA
A Antigüidade não estabelecia diferenças nítidas entre Ciência, Arte e
Filosofia. Igualmente os alquimistas medievais se autodenominavam tanto
artistas como filósofos, e ao se referirem a suas atividades, faziam-no
chamando-as Ciência. Desse modo a vinculavam com a Ciência sagrada e
tradicional que não excluía as disciplinas cosmológicas nem a meditação
Metafísica, e tampouco o rito e a oração, segundo pode se ver em todos os
documentos emanados de suas mãos, que unanimemente o atestam.

A Ciência, tal qual a conheciam os antigos, não tinha nada que ver com um
método literal, como a concebem nossos contemporâneos (nascida esta idéia
com Descartes no Discurso do Método, aparecido recém no século XVII) e
menos ainda pensavam em sua substituição pela "técnica" ou "técnicas",
modos de ver estes exclusivamente empíricos e racionais, em contraposição
com a universalidade da autêntica Ciência. A chamada ciência moderna,
fundamentada na estatística e na comprovação de um mesmo fenômeno em
circunstâncias "ideais" não é de nenhuma maneira exata, como bem o sabiam
os alquimistas medievais (que repetiam um mesmo experimento centos de
vezes, sabendo que as circunstâncias eram sempre distintas, para obter
finalmente resultados palpáveis de transmutação natural), pois é sabido que
as mesmas coordenadas espaço-temporais não se dão de uma mesma
maneira indefinida num suposto mundo imóvel, frio e irreal (o que se
entende equivocadamente como "matemático"), e a melhor comprovação
disso é a observação atenciosa da terra e do céu, do macrocósmico e
microcósmico, sempre em contínuo movimento e perpétua geração de novas
formas de vida.

Por outro lado, queremos destacar que esta ciência "moderna", à qual
estamos nos referindo, é na verdade um esquema "antiquado" do século
XIX, que paradoxalmente permanece vigente nas casas de estudo oficiais.
No entanto, as comprovações da mais moderna ciência, ocorridas
aproximadamente desde uns 50 anos para cá, com uma concepção
absolutamente diferente do racionalismo mecânico, tocam-se com as
concepções da Antigüidade e descrevem uma cosmologia análoga à das
doutrinas tradicionais de todos os lugares e tempos, segundo daremos algum
exemplo em subseqüentes séries e capítulos.

78 O ALTAR
Arquitetonicamente, o Altar ou Ara é a "pedra fundamental" do templo.
Ainda que na prática, e desde o ponto de vista microcósmico, o trabalho de
construção material e de processo do Conhecimento, se realize de baixo para
cima, da multiplicidade à Unidade arquetípica, na realidade deve ter-se
sempre presente o ponto de vista metafísico, que considera o processo
cosmogônico como um passo dessa mesma Unidade à multiplicidade ou de
cima para baixo.

Neste sentido, a pedra fundamental do altar, por estar situada no centro do


próprio quadrado, ou retângulo, da base, é a projeção direta e vertical da
pedra angular ou pedra cimeira, que constitui a autêntica peça chave da
abóbada do templo. Por sua vez, as quatro pedras de fundação das esquinas
ou ângulos do edifício, são outras tantas projeções ou reflexos horizontais da
pedra fundamental. Obtém-se assim um esquema simbólico onde o altar
ocupa uma posição intermediária e central entre o mundo terrestre e o
celeste.

O altar está, pois, no Centro do Mundo, ou seja, no lugar geométrico ideal e


simbólico onde se produz a ruptura de nível, que comunica o homem com os
estados superiores e as realidades invisíveis. A este respeito, a palavra altar
quer dizer "alto", lugar elevado, o que a relaciona à montanha, e mais
concretamente à Montanha Sagrada.

Nos templos-montanhas, como certas pirâmides pré-colombianas e os


zigurates babilônicos, os altares se situam na cúspide, simbolizando a idéia
de lugar privilegiado próximo ao Céu. Nos templos cristãos, as
arquibancadas (graus) que elevam e separam o altar maior com relação ao
resto da nave, têm este mesmo significado: o altar cristão, como seu
antecessor, o altar hebreu, está simbolicamente no alto da montanha do
Paraíso. Se o templo é um organismo vivo, o altar é propriamente seu
coração. Nele se concentra e se expande, como se da sístole e da diástole
cordiais se tratasse, toda a energia sutil que dá coesão ao conjunto do
edifício. O altar é o ponto sensível, o nódulo vital que reúne as energias
horizontais e verticais do templo, por meio das quais, ao percebê-las em sua
própria natureza, o homem é conduzido a participar da despojada beleza que
emana de todo ele, revelador do equilíbrio e harmonia da criação.

Por isso no Templo de Jerusalém –feito construir pelo sábio rei Salomão–, a
Arca da Aliança, em cujo interior eram simbolicamente recolhidos os
eflúvios divinos, estivesse depositada em cima da pedra chamada Shetiyah,
equivalente ao altar.

É também a “ara” a pedra de sacrifício, ali onde se consuma o ato sagrado


por excelência: a morte ritual do homem velho, e o nascimento e ressurreição
à verdadeira Vida. Na pedra sacrifical, ou alma humana, que chegou ao
centro de si mesma, isto é à "união" com o Espírito, é crucificada e oferecida
aos deuses, ou à divindade, instituindo por esse ato primordial uma aliança,
ou um laço comum, indissolúvel.

79 OS SONHOS
Em todas as cosmogonias tradicionais, os sonhos sempre foram considerados
como veículos intermediários entre a realidade concreta e sensível e a
realidade espiritual e Metafísica. Isto se deve à razão de que os sonhos
pertençam precisamente ao estado sutil intermediário, ou seja, ao plano de
Yetsirah ou das formações, participando portanto da dualidade inerente ao
citado plano, o que os faz suscetíveis de oferecer um aspecto escuro e
inferior, ligado ao orgânico e, por conseguinte, ao plano de Asiyah, e outro
aspecto, pelo contrário, luminoso e superior, relacionado com o plano de
Beriyah e o mundo das idéias. Não seria um erro dizer que é ao primeiro
destes dois aspectos ao que presta todo seu atendimento a psicanálise
freudiana, que se cinge exclusivamente ao fenomênico, aprofundando nisso,
enquanto é o segundo o que verdadeiramente é importante e significativo,
pois as imagens que constituem seu conteúdo não são senão idéias revestidas
de formas mentais, podendo ser consideradas então, efetivamente, como
autênticos símbolos veiculares e reveladores do que está mais além do
individual e, por conseguinte, do fenomênico, ou seja, que abrem a
determinadas possibilidades de realização interior, com a vantagem de que o
ser, no estado de sonho, encontra-se liberado de certas condições implícitas
na modalidade corporal e, portanto, espacial, de sua individualidade. Temos
o exemplo do conhecido "sonho" de Jacob, durante o qual este vê anjos (os
estados superiores) ascender e descer por uma escada, que é o Eixo do
Mundo unindo terra e céu, sem esquecer da importância concedida a
determinados sonhos em todas as vias iniciáticas, e muito especialmente nas
xamânicas de qualquer parte do mundo, que quase sempre se tratam do
recebimento de um desígnio, ou de uma revelação concedida pelos espíritos,
númenes ou deuses.

80 REALIDADE OU FICÇÃO?
Se a vida é ilusão para o hinduísmo, para o budismo, e desta forma os
mestres herméticos o afirmam, o que será então a realidade? E, igualmente, o
que será esta ficção? Se o homem é estrangeiro nesta terra, e como tal vive
ao começar um trabalho interno alheio aos outros, qual é o critério de
"verdade" ou "mentira"? Que soleira sutil se transpassa entre uma forma de
ver e a outra? Pois, embora o que se considere mais estranho no homem
contemporâneo (do qual somos ainda parte) é sua maneira de se aferrar e se
identificar com as coisas, aqueles que se permitem esta atitude interna ou
extraterrestre são considerados igualmente estranhos para o meio. Ao se
abrir uma porta e dar um passo à frente, as coisas estarão banhadas de uma
outra luz e de um outro conteúdo. Se fecharmos essa porta e dermos um
passo para trás, essas mesmas coisas aparecerão familiares em seu nível
rasante e cotidiano. Realidade ou ficção? Permitir-se ver é algo castigado
pela sociedade que não aspira a estes projetos. Do mais íntimo do coração
alguém se pergunta quem tem razão. Mas será a razão o instrumento
adequado, ou a ferramenta que nos permitirá elucidar estas experiências
pessoais? Ou será que simplesmente a experiência justificaria toda nossa
ação?
fig. 7

81 MITOLOGIA
Das que ainda se tem lembrança de sua existência, a civilização grega é,
quiçá, uma das que alberga o maior número de deuses e mitos. Efetivamente,
o panteão (palavra que deriva de pan, "todo", e theon, "deuses") grego é
verdadeiramente fecundo e prolixo, só comparável ao das culturas hindus, e
das pré-colombianas, especialmente a asteca e a maia. O próprio nome
“mito" é de origem grega, e sua raiz é a mesma da palavra "mistério",
derivando ambas da palavra “muein”, que significa "fechar a boca", "calar-
se", aludindo sem dúvida ao silêncio interior em que se recebem os segredos
da iniciação. Desde os mistérios órficos, passando pelas iniciações de
Eleusis, das quais participaram Pitágoras, Sócrates e Platão, até o crisol de
culturas que representou a Alexandria dos séculos II e III de nossa era, a
mitologia grega nutriu o universo sagrado de todas as culturas do Ocidente
mediterrâneo, particularmente a do Império de Roma.

Cada ciência e cada arte, bem como qualquer atividade manual, racional e
intelectual do homem, estava sob a proteção e influência de um deus, musa
ou gênio astral, o que redundava numa convivência harmônica com as forças
ordenadoras do Cosmo. Os gregos, como qualquer povo tradicional,
entendiam que os deuses e as entidades invisíveis eram modos ou formas de
ser da existência, e reuniam toda a variada gama de possibilidades essenciais
e arquetípicas da conduta e do pensamento humanos. Neste sentido, uma
filiação profunda une a deuses e a homens: todos surgem do casal de Urano
(o Céu) e Gea (a Terra). Assim, os deuses olímpicos representam os estados
superiores do homem, e os homens os estados terrestres dos deuses E isto é,
uma vez mais, uma aplicação da lei de analogia, que faz que "o de cima seja
como o de baixo, e o de baixo como o de cima”, conformando um todo
harmonioso e ordenado.

As relações íntimas entre os deuses e os homens têm, nas tradições greco-


romanas, um caráter ambivalente de reconciliação e luta, claramente
vinculado com a idéia de empresa heróica, e de reconquista da imortalidade
por parte destes últimos; não se faz senão representar, por meio das lendas
dos heróis, o próprio processo da Iniciação.

Isto está exemplificado pelo conhecido mito de Ulisses, cantado na Odisséia


por Homero, que após uma viagem labiríntica, por mar e terra, cheio de
perigos e vicissitudes, atinge por fim sua "terra natal", a ilha de Ítaca.
Igualmente por Hércules (ver N.º 15), herói solar, que após sofrer diversas
provas e trabalhos, consegue penetrar no Jardim das Hespérides, outro dos
nomes dados ao Centro do Mundo.

82 ASTROLOGIA
Todos os planetas percorrem aparentemente a roda do zodíaco, e a duração
desse percurso é a que determina o ciclo particular de cada um deles, sendo
claros os dos dois chamados "luminares", o Sol e a Lua, que produzem os
ciclos anuais e mensais. As influências que estes planetas exercem na terra
variam, segundo se encontrem numa ou noutra casa zodiacal, pois as
qualidades destes signos podem ser afins, indiferentes ou hostis aos diversos
influxos planetários.

Seguindo o modelo cíclico solar sobre o qual trabalhamos, o primeiro


gráfico, representado mais adiante, é a roda dos signos no céu tal como se
vê olhando para o norte: Capricórnio corresponde ao inverno e à meia-noite,
Áries à primavera e ao amanhecer, etc. O movimento da roda celeste (em
sentido oposto aos ponteiros do relógio) é inverso ao do sol, que se desloca
sobre ela em sentido contrário (retrógrado), tal qual o podemos ver na
seguinte figura, de uso corrente para efetuar os horóscopos. O movimento
do sol é sempre retrógrado, porque se move em sentido contrário ao das
estrelas.

Capricórnio se encontra no extremo norte da eclíptica (de onde se deslocará


durante 30 dias, até deixar lugar para o signo seguinte) ao meio-dia do dia
que corresponde ao solstício de inverno, bem como à meia-noite do
correspondente ao solstício de verão, como pontos especialmente
destacáveis do ciclo anual, posição celeste que é a que correspondem estas
figuras. Entre os demais dias do ano e, portanto, no simbolismo que
expressa dito ciclo, assinalam-se igualmente os momentos do amanhecer no
equinócio de primavera e o do crepúsculo no equinócio do outono, ainda
que sempre há um momento do dia em que se dá esta posição das
constelações pois, como sabemos, a roda zodiacal dá uma volta completa
em 24 horas.

Já fizemos a advertência de que, para nossos estudos e cálculos


astrológicos, unicamente utilizaremos os sete planetas tradicionais, com
exclusão de Urano, Netuno e Plutão, já que estes três últimos foram
introduzidos recentemente e os estudos sobre os mesmos são incompletos.

Cada planeta tem um ou dois signos zodiacais que constituem seu


domicílio, e se diz que eles regem ou governam nestas casas e que suas
influências são complementares. Segundo se depreende do seguinte
esquema, os luminares têm um só domicílio, enquanto os outros cinco
planetas têm dois, um diurno e outro noturno:
Se o planeta se encontra no signo oposto ao de seu domicílio, diz-se que
está em “exílio", sendo suas influências contrárias ou desfavoráveis. Além
disso, quando a influência planetária é afim à do signo em que se encontra,
diz-se que o planeta está em “exaltação", e quando está no oposto suas
energias são hostis e o planeta se acha em "queda". Isto se compreende
melhor com o seguinte quadro:

PLANETAS DOMICÍLIO EXÍLIO EXALTAÇÃO QUEDA


SOL Leão Aquário Áries Libra
LUA Câncer Capricórnio Touro Escorpião
MERCÚRIO Gêmeos-Virgem Sagit.-Peixes Aquário Leão
VÊNUS Touro-Libra Escorpião-Áries Peixes Virgem
MARTE Aries-Escorpião Libra-Touro Capricórnio Câncer
JÚPITER Sagitário-Peixes Gêmeos-Virgem Câncer Capricórnio
SATURNO Capric.-Aquário Câncer-Leão Libra Áries

83 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Você extrai do próprio Nada supra-essencial, incriado e eterno, de En Sof,
sua respiração, seu hálito vital, que é a própria da atmosfera vermelho
brilhante de Kether, que você exala mediante dois canais: a coluna ou braço
esquerdo, e a coluna ou braço direito da Árvore da Vida, que percorre,
conformando-o, resolvendo permanentemente a contradição alternada do
restritivo e do efusivo, e ultrapassando estas polaridades que não se
excluem, mas se correspondem. À tarefa respiratória, adicionaremos a esta
prática o gesto. Sente-se na posição costumeira, conservando-se na vertical
e relaxado. Junte suas mãos sobre seu peito à altura do coração. Aspire de
En Sof o alimento que a você o corresponda, e exale-o para a coluna da
força, ou de Shin; o Fogo, para Hokhmah. Simultaneamente tem de fazer um
pausado gesto com sua mão para a esquerda, que tem de durar todo o tempo
de sua exalação, até se deter. Na próxima aspiração, voltará seu braço e
sua mão ao seu peito, respeitando exatamente o mesmo tempo.

Na expiração seguinte, como se efetuou no caso anterior, estenda seu braço


e sua mão direita correspondente à coluna da Forma ou do Rigor, Binah,
Mem, ou Água. Subseqüentemente, elas regressarão a você, juntando-se
sobre seu peito quando aspire.O mesmo gesto tem de se repetir na próxima
expiração e seu retorno se realizará na aspiração subseqüente, alternando
logo a mão e o braço direito, que repetirão o gesto de ida e retorno com o
ciclo respiratório. Você está agora trabalhando com a energia de Beriyah e
a emanará para o limite da produção de fenômenos e a Concreção material.
Assim o faz ao reiterar o lento gesto de desprendimento e expansão que você
efetua com sua mão e braço esquerdo, e o regresso ao peito com o mesmo
braço, ou concentração de energias que isso está simbolizando. Igual com o
gesto correspondente ao braço direito, de acordo ao mesmo ritmo
respiratório. Após tê-lo efetuado três vezes com cada braço, nas seguintes 3
expirações, você move simultaneamente ambas as mãos e braços em atitude
de dar e oferecer, dando nascimento, na primeira, a Tifereth, na segunda a
Yesod, e na terceira a Malkhuth: ao Cosmo inteiro, que como um balão,
uma bola de energias, você sustenta em suas mãos. Cada vez os regressará
ao centro de seu peito, para Kether, na atitude de receber e apreender. Pode
repetir este ciclo várias vezes, e com a última aspiração para Kether dará
por finalizado este exercício. É importante conseguir a coordenação de
ritmos, imagens e movimentos.

84 CABALA
Divisão dos 4 planos da Árvore de Vida em correspondência com outras
linguagens simbólicas presentes em textos sagrados hebreus:

Os termos hebreus Arik Anpin e Zeir Anpin –Macroprosopos e


Microprosopos–, em grego querem dizer, respectivamente, "Face Maior" e
"Face Menor". Estes se encontram separados por um fosso imenso chamado
o Abismo (Tehom). Entre eles se costuma situar a sefirah "invisível", ou não-
sefirah, Daath, Conhecimento. Efetivamente, na Árvore da Vida, Daath está
no pilar do meio, justo entre Hokhmah (Sabedoria) e Binah (Inteligência),
pois se diz que ela surge da união ou combinação destas duas sefiroth,
constituindo o próprio conhecimento que a Unidade (Kether) tem de si
mesma, o qual se transmite às restantes sete sefiroth (o Microprosopos)
através dos canais ou caminhos que as comunicam entre si, dando lugar à
criação propriamente dita.
85 AS PEREGRINAÇÕES
A aventura do Conhecimento se descreve muitas vezes como uma viagem ou
peregrinação. "Uma viagem de mil milhas começa ante teus pés".
Essencialmente, a peregrinação se relaciona com a busca do Centro do
Mundo, onde se estabelece a comunicação interna com os estados superiores
do próprio ser. Trata-se de atingir a Pátria Celeste, que é a verdadeira
morada do homem, pois, como mencionam diversas tradições, o homem é
um estrangeiro nesta terra. A palavra "peregrino" não quer dizer senão isso:
estrangeiro. "Vós não sois deste mundo". Assim, desde que intuímos que não
somos “daqui", a própria vida, com seus avatares, suas lutas, suas paixões,
luzes e sombras, converte-se num símbolo exemplar dessa busca interior. A
partir desse momento qualquer acontecimento revelará sempre algo, tornar-
se-á significativo e simbólico.

Mais concretamente, as denominadas peregrinações aos lugares santos ou


sagrados, consideram-se como as etapas do processo iniciático, vinculado à
idéia de labirinto e de “perder-se para se encontrar".

Também as provas simbólicas da Iniciação se denominam "viagens" em que,


além da influência espiritual que transmitem, são psico-dramatizadas
ritualmente as inibições e tendências negativas do ego, esgotando-as ao
emergir para o exterior. Apesar de suas múltiplas dificuldades, o peregrino,
em sua viagem interna e externa, percorre um caminho arquetípico, aonde o
símbolo é vivido (ritualizado) e se lhe revela com toda a potência de sua
energia ordenadora, permitindo-lhe conhecer simultaneamente a realidade de
um tempo mítico, no que o prodigioso se faz coetâneo com a realidade
horizontal.

Tudo se dá na "roda da vida", espelho e receptáculo das energias do Cosmo,


que o peregrino, efetivamente, tem que reconhecer em si mesmo para chegar
ao centro ou coração imóvel da roda, ali onde se produz a identificação com
o Universal e o retorno a sua verdadeira origem.

86 ASTROLOGIA
Para realizar os cálculos astrológicos, além de observar as influências que
exercem os planetas nos distintos signos zodiacais, é importante também
tomar em conta as relações que eles têm entre si, segundo as distâncias em
que se encontrem uns dos outros. Isto determina o que se chamam os
"aspectos", entre os quais se destacam os seguintes:

– Conjunção: dois planetas estão em “conjunção", quando se encontram


juntos, no mesmo grau de longitude na eclíptica. Em geral se considera uma
influência construtiva.

– Oposição: quando estão separados 180º, dividindo o círculo pela metade, o


aspecto é inverso ao da "conjunção" e se chama "oposição", aspecto que em
geral se considera "maléfico", produtivo de fricção.

– Trígono: este aspecto é o que produzem dois planetas separados entre si


por 120º, dividindo ao círculo em três partes. Considera-se como o mais
favorável de todos e junta dois planetas em signos que correspondem ao
mesmo elemento.

– Quadratura: se a separação entre ambos os planetas é de 90º, diz-se que


estão fazendo quadratura, aspecto que se julga como o mais desfavorável,
ainda que muitas vezes se trata nada mais que de uma prova severa cuja
superação se faz necessária.

– Sextil: é o aspecto que se produz quando estão separados 60º, considerado


"benéfico", gerador de atividade e mudanças. Os planetas, neste caso, se
encontram em signos harmônicos.

– Quincúncio: a 150º de separação se produz este aspecto, considerado em


geral inconexo e contraditório.

Existem também outros aspectos de menor importância, que evitamos


mencionar no momento. As distâncias que se dão aqui indicam o aspecto em
seu ponto exato e ideal. A influência pode produzir-se ainda que as
distâncias difiram um pouco da indicada (às vezes até 5 e 10 graus de
diferença). Deve-se entender que as qualificações que se outorgam aos
distintos aspectos, de “benéfico" ou "maléfico", são-no de maneira geral, e
que para determiná-los precisamente é necessário observar o mapa zodiacal
em conjunto Um aspecto "maléfico" pode redundar em “benefícios" e vice-
versa.

87 EXERCÍCIO RESPIRATÓRIO
Demos nesta Introdução, determinados exercícios de concentração,
respiração, visuais, e inclusive gestuais, todos eles relacionados com os
ciclos e os ritmos e vinculados diretamente com a Árvore da Vida Sefirótica.
Todas estas práticas favorecem o entendimento do que está mais além do
fenômeno e da matéria evidente. Se você não conseguiu realizar alguma
destas práticas, queremos lhe sugerir que volte a elas. Às vezes, o mais
singelo é o mais complicado, e é necessário voltar atrás para reencetar
nosso trabalho. Não desfalecer é o que se necessita. O mesmo quando nos
referimos ao entendimento intelectual, que às vezes nos excede, mas que
chega a nós através da perseverança, chave de nossos estudos e de suas
projeções posteriores. Não podemos imaginar o inimaginável. Portanto,
programamos ações e não resultados, que se darão tempo a tempo e por
acréscimo. A Fé, que se traduz em fatos e obras, é capaz de mover às
montanhas.
88 O RITO
Em diversas ocasiões falamos do rito como um componente básico do
conhecimento simbólico e, portanto, da própria vida, que na indefinida
variedade de suas formas sempre passageiras é a permanente reiteração de
uma ordem arquetípica invariável e eterna. Precisamente a palavra rito, que
procede do latim ritus, o que por sua vez deriva do sânscrito rita (raiz rt),
não significa outra coisa do que "ordem". Em verdade o rito é o próprio
símbolo em ação, pelo que sua reiteração constante em todos os atos de
nossa vida vai permitindo que o gradual entendimento das idéias -veiculadas
pelos símbolos–, acabem finalmente por incorporar-se em todo nosso ser,
balizando assim o processo que nos conduz ao Conhecimento. Por isso
quando falamos de ritos, não nos estamos referindo a cerimônias "mágicas",
civis ou religiosas. Os ritos iniciáticos de determinadas tradições ainda estão
vivos, ainda que seja difícil o acesso a eles. Algumas religiões ou
instituições tradicionais conservam os símbolos –e mesmo os ritos–, mas
estes carecem de todo conteúdo verdadeiro e estão como vazios, sendo
desconhecidos sua essência e esoterismo, ou seja, sua realidade e
significação. Para a Tradição Hermética são ritos os estudos efetuados a
partir de modelos Herméticos, a concentração que isso implica, a meditação
que promove, as práticas que efetivam a visão e o imaginário, a oração
incessante do coração como invocação permanente, a contemplação que
produzem a beleza e a harmonia da natureza e do Cosmo, e os trabalhos
auxiliares encaminhados à conquista do Conhecimento. Neste particular,
queremos trazer à memória que há uma identidade entre o ser e o
conhecimento. O homem é o que conhece. Que outra coisa poderia ser senão
a soma de si mesmo? Ser é conhecer. A saber: que sendo o que conhecemos,
a reiteração constante do rito, que sustenta o conhecimento de outras
realidades, mundos ou planos do Ser Universal, é uma garantia quanto à
identificação com esse Ser e seu conhecimento, através de um caminho
hierarquizado, povoado de espíritos, deuses, cores e energias mediadoras.
Fim do Módulo I
INTRODUÇÃO À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha
MÓDULO II

1 RECORDAÇÃO
Nos capítulos anteriores, o leitor teve oportunidade de ver como se articula
este curso, onde as inter-relações das diferentes disciplinas da Tradição
Hermética (Simbolismo, Alquimia, Filosofia, Astrologia, Numerologia,
Cabala, Teurgia, etc.) têm um papel fundamental em nossos estudos. Na
verdade, igualmente ao que acontece com a evolução de qualquer planta e
seu desenvolvimento, o germe se encontra de maneira potencial nestas
primeiras páginas, às quais o leitor tem de voltar constante e ciclicamente, ou
seja com as características próprias de um rito. Não será demais advertir que
a reiteração deste rito, o tempo que se lhe dedica e a concentração que se
emprega nele, são diretamente proporcionais com o fruto que se obtém com
isso. Às vezes parecemos dispostos a efetuar empresas heróicas, e no entanto
não somos capazes, por fantasmas mentais, de realizar coisas singelas que
precisam de uma atitude conseqüente e perseverante. Se o estudante é capaz
de viver como objeto de seus experimentos, amparado na Doutrina e nas
diferentes disciplinas que toma a Tradição para se manifestar, poderá obter
satisfatórios resultados e benéficos dividendos, tanto físicos, como
psicológicos e espirituais. Ainda deve ser dito que estas ciências e artes só
podem ser usadas no mais alto nível, o que na Cabala seria Kether em
Atsiluth ou ainda mais longe, se assim se pode dizer, ou seja, ao do supra-
cósmico, (o que inclui, decerto, ao do "supra-microcósmico"). A meta das
investigações é muito elevada e não se devem confundir os objetivos
metafísicos com os fenômenos psicológicos que se poderão observar no
caminho. Os propósitos da Ciência Sagrada são verdadeiramente profundos.
A vida é coisa séria, apesar das imagens que o consumismo mental e a
dessacralização do mundo poderiam fazer supor.

O Agartha constitui uma rede invisível de vontades, unidas por laços tão
reais e indestrutíveis como os que unem à própria estrutura do Cosmo,
considerada um modelo arquetípico de manifestação. Esta corrente de união
transmite a mensagem da Philosophia Perennis, ou seja da Ciência Sagrada,
que por atemporal foi conhecida por todos os povos da Antigüidade, cujos
fragmentos ainda mantêm e conservam vivo ao próprio homem moderno
(inclusive ao ocidental e ao habitante das grandes cidades) ainda que este o
negue ou o desconheça, já que as raízes culturais das artes e das ciências
derivam de Princípios metafísicos e de Idéias Eternas.

2 NOTA:
Seguramente são muitas as perguntas que você se fez na dinâmica de nosso
curso. O I Ching ou "Livro das Mutações", livro de sabedoria e verdadeiro
oráculo chinês, diz que o mais difícil é formular as perguntas das quais se
quer obter resposta. Isto se deve em parte à multidão de interrogações que
as pessoas se fazem em relação com os temas tradicionais e com tudo aquilo
que se quereria saber de uma vez e para sempre. Desta forma, é exato que
na pergunta está implícita a resposta. Igualmente é comprovável que se
utilizamos o recurso da paciência, as respostas vão se produzindo por si
mesmas, sem necessidade de forçar as situações. Já sabemos que a semente
é a potencialidade da árvore e que esta pode crescer sã e vigorosa regando-
a com constância e podando as maldades que possam impedir seu
desenvolvimento.

3 CABALA
Não falamos ainda em nosso Programa de En Sof, (ainda que o tenhamos
citado de passagem) pois nos interessava apresentar primeiro o modelo da
Árvore da Vida e trabalhar com ele, para que o estudante se familiarizasse
com sua estrutura e ao mesmo tempo jogasse com as diferentes relações a
que dá lugar, o mesmo que com as letras e com outras imagens propriamente
cabalísticas. Queremos recordar que este modelo da Árvore corresponde
exatamente a Adam Kadmon, o homem total, e nos referimos primeiro a ele
para tratar de entender certas proporções que nos levarão à idéia do que é En
Sof para os cabalistas. Estamos falando de suas medidas, chamadas em
hebraico Shiur Koma, pois a Cabala identifica a Adam Kadmon com o
cosmos. A "altura dos calcanhares deste ser é de trinta milhões de
parasangas", afirma-se laconicamente. Mas depois se explica que "uma
parasangae do Criador tem três milhas, uma milha tem dez mil metros e um
metro três empans, e um empan contém o mundo inteiro".

Sem dúvida estas medidas abarcam todas as possibilidades do Universo,


quaisquer que estas sejam. No entanto a idéia de En Sof supera, se assim
pode se dizer, todas estas possibilidades. Com relação ao diagrama da
Árvore da Vida, modelo do Cosmo, e a localização de En Sof nele,
remetemos o leitor ao Módulo I, N.º 18.

Como se verá, sua posição é supra-cósmica, chama-se-lhe o Antigo dos


Antigos (Deus Ignotu). Não pode ser nem sequer imaginado pelo homem.
Expressa-se através do cosmos, do homem celestial, do criador, que mal é
um ponto residual de seu nada infinito. A palavra Ayin (Nada), utilizada às
vezes pelos cabalistas e pelo Zohar como idêntica a En Sof, entranha uma
idéia de vazio absoluto. Mas este nada e este vazio não são "algo" no sentido
da expressão moderna, a saber: algo que possa ser percebido ou se expresse
como uma negação de outra coisa. Na verdade, En Sof não é nada do que
pudesse ser algo, tal a Majestade Imensurável desta doutrina cabalística. Pelo
que as três primeiras sefiroth correspondem à Triunidade dos Princípios do
Ser Universal, e portanto também as do ser individual. Correspondem-se
com os princípios celestes que, por sua vez, geram os terrestres, tal qual no
simbolismo construtivo a cúpula e a base do templo. Trata-se da natureza de
Deus, se convém utilizar esta forma de dizer, que se sintetiza na Unidade, à
qual Deus se assemelha. Estes estados são supra-individuais e estão
assinalados no diagrama da Árvore da Vida como supra-cósmicos, já que
estão por cima das sefiroth de "construção" (cósmica). No entanto, ainda se
encontram determinados pela numeração que se lhes atribui, começando pela
Unidade. Efetivamente, a Unidade é a síntese onde se pode encontrar a
essência e o sentido da totalidade da Criação; mas ao mesmo tempo esta
assunção do Si (chamado também Bem e Só) é, por sua vez, o único meio de
passagem a outros "espaços", estes sim, autênticos e verdadeiramente supra-
individuais e supra-cósmicos (metafísicos), claramente assinalados na
Cabala com o nome de En Sof, equivalentes ao Não-Ser, dos quais não se
fala, já que por definição são inefáveis. Também esta simbolização de uma
sucessão de graus de Conhecimento se acha implícita na própria planta do
edifício do Templo, por meio da porta, do labirinto, do altar e do sancta-
sanctorum, que delimitam zonas simbólicas específicas que se articulam, do
menor ao maior, no percurso iniciático que a construção propõe.

4 O NÍVEL E O PRUMO
O nível e o prumo ocupam um lugar eminente no momento de se pôr "mãos
à obra" e de levantar os alicerces do labor construtivo. Com o nível se
comprova que a base do edifício está completamente plana, evitando assim
que possam existir desníveis e deformidades no terreno. Trata-se de que a
obra se erga com sua base perfeitamente horizontal, e todas suas partes
niveladas entre si, já que qualquer descuido neste sentido acabaria, tarde ou
cedo, com o desabamento de toda a edificação. Por sua vez, o prumo
desempenha um papel fundamental, pois graças a ele o edifício se eleva
vertical e perpendicularmente. Desta forma, nível e prumo se relacionam
com a horizontal (energia passiva) e com a vertical (energia ativa), e tudo o
que já se disse de ambos os símbolos pode ser aplicado aos ensinos que
derivam destes dois instrumentos. (ver Módulo I, N.º 34). A união do nível e
do prumo configura por isso o símbolo da cruz, que resulta do cruzamento de
um eixo vertical e de outro horizontal, os quais durante a construção do
edifício vão criando sua estrutura.

No templo universal, que é o Cosmo visível, o extremo superior do eixo do


prumo "cósmico" está situado na estrela polar (o zênite do Mundo), desde a
qual, efetivamente, desce um eixo imaginário –mas não menos real– ao redor
do qual gira todo o universo. No templo propriamente dito, esse prumo é o
eixo perpendicular (representado, ou não, visivelmente) que cai da
extremidade da "chave de abóbada" até o centro do retângulo da nave onde
está situado o Altar ou Ara, a "pedra fundamental". É, pois, o prumo um
símbolo do "Eixo do Mundo", aquele que, sustentado pela mão do Arquiteto
construtor, atravessa os três mundos, o Céu, a Terra e o Inferno, ou Infra-
mundo. No microcosmo sutil do homem também existe um eixo vertical
(chamado sushumnâ na tradição indiana) que atravessa os diversos estados
de consciência (simbolizados pelos chakras ou "rodas"), desde o inferior,
situado simbolicamente na base da coluna vertebral, até o superior,
localizado no topo da cabeça ou chave de abóbada craniana.
Isto está estreitamente relacionado com o próprio processo do Conhecimento
e da Iniciação, pois esta trata, como já sabemos, de um recordar paulatino
desses estados de consciência, análogos aos do Ser Universal. O prumo
representa aqui o símbolo da busca da Verdade que penetra até as
profundidades mais recônditas de nosso ser, com a ajuda naturalmente desse
nível interno que nos obriga a uma total submissão à Vontade Superior que
aflora em nós, e sem a qual toda tentativa de busca espiritual é uma quimera.
"Se o Eterno não edifica a casa, em vão trabalham aqueles que a constroem".
Ou bem, recordando a fórmula hermético-alquímica V.I.T.R.I.O.L., "Visita o
Interior da Terra (de ti mesmo) e Retificando Encontrarás a Pedra Oculta".

5 IMAGENS E SÍMBOLOS
Existe uma natural e lógica relação entre imagem e símbolo. Quando se
tratam de símbolos cujo marco de expressão é o espaço, como por exemplo
os geométricos, arquitetônicos e iconográficos, sua vinculação com a
imagem é óbvia. E quando se desenvolvem no tempo, como a música ritual e
sagrada, a poesia e os relatos orais dos mitos, estes geram, simultaneamente
a sua audição, imagens e visões simbólicas. E isso é assim porque, como
dizia já Aristóteles, o homem conhece por meio de imagens, ou seja que sua
natureza anímica e intelectual está especialmente capacitada para
compreender através das representações simbólicas. Desta forma a
linguagem sintética e universal das imagens simbólicas libera a psique da
dualidade de toda dialética existencial, onde o puramente mental e cerebral
prima sobre a verdadeira intuição intelectual que reside no coração, o que
equivale a uma purificação regeneradora, cujo fim é nos devolver a pureza
mental e a inocência virginal das origens; uma transmutação da consciência
tal que harmonize perfeitamente com o ser do mundo e das coisas.

O homem tradicional vê também no universo, e em tudo o que lhe rodeia,


uma exteriorização de si mesmo, uma imagem do mundo que habita em seu
interior. Isto se deve a que ambos, Cosmo e homem, estão feitos de igual
substância vivificada pelo mesmo Espírito. Esta certeza conduz a uma
identificação com as forças invisíveis e as energias numinosas que animam a
matéria, à que imprimem uma forma ou estrutura inteligível, que devirá o
símbolo ou o signo dessas potências criadoras. Eis o erro moderno de
considerar o mundo como algo plano e homogêneo, quando na verdade
encerra dentro de si uma variedade inesgotável de possibilidades de ser que
constantemente manifestam a realidade dos atributos divinos. De maneira
velada ou evidente, tudo conserva a impressão do sagrado, pois como diz o
Zohar: "o mundo subsiste pelo mistério".

6 O SÍMBOLO DA ESCADA
A escala ou a escada é, junto à árvore, um dos símbolos mais notórios do
Eixo do Mundo, e também dos mais difundidos em todas as tradições. Ainda
que mais adiante trataremos este importante símbolo com maior
desenvolvimento, relacionando-o com o simbolismo de passagem, baste-nos
por agora dizer que a escala está unida sobretudo à idéia de movimento de
ascensão e descenso ao longo de dito Eixo, conectando a terra (e o infra-
mundo) com o céu, e vice-versa, através dos diferentes níveis, mundos ou
estados do ser que conformam o conjunto da manifestação universal, níveis
representados pelos degraus horizontais que unem as duas traves laterais ou
montantes verticais, os quais se correspondem de maneira evidente com as
duas colunas laterais da Árvore Sefirótica, que pode ser visualizada desta
forma como uma escala. Dessas colunas, uma deve considerar-se como
ascendente e a outra como descendente, o que se realiza em torno ao eixo
central ou pilar do equilíbrio, que é o autenticamente axial. Este último faz
lembrar o símbolo da dupla espiral (presente na escada de "caracol"),
exemplificação das duas correntes de energia cósmica que se enrolam ao
redor do eixo central, tal e como podemos observar no Caduceu de Hermes-
Mercúrio.

Tem de se adicionar que o número dos degraus é normalmente de sete,


relacionados com os sete céus planetários, e também com as sete virtudes e
as artes e ciências liberais, consideradas como os degraus que permitem
subir de forma "gradual" (efetiva) pelos graus do Conhecimento. Neste
sentido, recordaremos que entre os índios de América do Norte e outros
povos arcaicos ainda vivos, a ascensão e descenso pelo eixo cósmico se
realiza através da árvore ou poste ritual, ao longo do qual se encontram uma
série de cisões que representam os diferentes mundos ou estados que têm de
ser atravessados até atingir a cúspide ou sumidade, que por sua vez equivale
ao "olho do domo" no simbolismo construtivo, por onde se produz a saída
definitiva do Cosmo e a união com a Realidade transcendente.

7 O SÍMBOLO DA ESVÁSTICA
Entre as representações simbólicas do Centro do Mundo, a da esvástica tem
que ser especialmente destacada, pois além de ser um equivalente do
símbolo da cruz e da roda, e participar, portanto, de suas significações gerais,
nela aparecem outras variantes que nos confirmarão na certeza de que os
símbolos constituem autênticos veículos do Conhecimento.

Por se encontrar na arte de todos os povos tradicionais desde a mais remota


Antigüidade, a esvástica é um dos símbolos que remetem diretamente à
Tradição hiperbórea ou primordial. Ela é, efetivamente, uma cruz, só que a
essa cruz se lhe adicionam quatro linhas em seus extremos, formando assim
outros tantos ângulos retos ou esquadrias, de tal maneira que ditas linhas
sugerem ou levam implícito o movimento de giro em torno a seu centro,
gerando assim à circunferência. Agora bem, devido a que essa circunferência
(que, recordemos, simboliza a manifestação universal) não está figurada de
forma expressa na esvástica, esta, mais do que um símbolo do cosmos,
aparece como um símbolo da ação vivificante que sobre ele exerce o
Princípio, considerado como o autêntico "Motor imóvel". Efetivamente, o
mais importante na esvástica é o ponto fixo, símbolo do Centro, o qual
permanece inalterável e imutável, e no entanto é o que transmite sua energia
à Roda Cósmica, gerando-a e dando a vida a todas as coisas, seres e mundos
contidos nela, os quais depois de cumprir o desenvolvimento completo de
todas suas possibilidades retornam novamente a ele. Como se vê, estas
significações não têm absolutamente nenhuma relação com o uso político
que se fez deste símbolo nos tempos modernos.

Adicionaremos que, aos quatro ângulos ou esquadrias da esvástica, também


podemos observá-los nas quatro posições cardeais que a constelação da Ursa
Maior descreve em seu ciclo diário em torno da estrela polar, a qual, devido
à posição central que ocupa no céu –pois todos os corpos estelares
rotacionam a seu redor– se considerou efetivamente como a morada
simbólica do Princípio, também chamado a Grande Unidade em outras
tradições. Em nosso modelo da Árvore Sefirótica, a estrela polar se
corresponde com Kether, como já sabemos (ver capítulo N.º 18), e não deixa
de ser interessante recordar a este respeito que no Zohar a Ursa Maior recebe
o nome de Balança (também na antiga tradição Chinesa recebia este nome),
adicionando que esta se acha "suspensa num lugar que não existe", o que
equivale a dizer no imanifestado, que é onde reside verdadeiramente o
equilíbrio e harmonia de toda a manifestação. Na tradição indiana, ademais,
a esvástica aparece como um dos signos distintivos dos brahmanes, e de fato
nessa mesma tradição se afirma que as sete estrelas que compõem aquela
constelação representam a cada um dos sábios (chamados rishis) que
transmitem o Conhecimento de um ciclo a outro da humanidade.

8 TARÔ
O Tarô, origem do jogo de naipes, é um oráculo, um livro sagrado escrito
não em palavras senão em setenta e oito páginas ou lâminas desenhadas em
cores, cada uma com suas múltiplas e precisas correspondências e profundos
significados, que ao serem primeiro estudadas e depois "embaralhadas" ou
colocadas de diferentes formas simbólicas, atuarão magicamente no interior
do aprendiz, servindo como veículo despertador da consciência e
computador da inteligência; ou seja, como suporte simbólico do
conhecimento metafísico.

A cada carta se lhe denomina "arcano", já que conecta com um mistério,


com uma força sobrenatural, com um arquétipo que se revela nela, tanto
quanto em qualquer símbolo sagrado, permitindo assim que esta energia
superior tome uma forma capaz de tocar os sentidos humanos e permitir que
o homem, partindo dessa base sensível, possa elevar-se para o conhecimento
do que está além do mundo material, e inclusive além do mundo psíquico, ou
seja, os planos arquetípico e espiritual.

As setenta e oito lâminas do Tarô se dividem em três grupos da seguinte


maneira: o primeiro grupo está constituído por quarenta cartas denominadas
"os arcanos menores"; o segundo está composto de dezesseis lâminas
chamadas "cartas da corte"; e o terceiro por vinte e duas ilustrações
conhecidas como "os arcanos maiores". Costuma-se estudar em primeiro
lugar estas últimas vinte e duas.

9 CABALA
Oferecemos a seguir as 22 letras do alfabeto hebraico para que o leitor vá se
familiarizando com elas. Igualmente é demonstrado o valor numérico
correspondente a cada letra. No hebraico antigo, as vogais não eram
sinalizadas, nem pontuadas, como se faz no presente. Portanto, as palavras
escritas só com consoantes podiam ser lidas de várias maneiras, ou com o
auxílio de diferentes vogais, aumentando assim seu poder evocativo e
semântico em múltiplas valorações e sentidos. As letras têm vinculações
também com outros símbolos, muitos deles animais, e de diferente natureza e
índole, o que se associa com o alfabeto, a palavra e a metafísica da
linguagem.

Alef Beth Guimel Daleth Hé Vav Zayin Heth Teth Iod Kaf
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 20

Lamed Mem Nun Samekh Ayin Fe Tsade Qof Resh Shin Taw
30 40 50 60 70 80 90 100 200 300 400

Recomendamos que se copiem esmeradamente as letras do alfabeto hebraico.


Desta maneira não só memorizaremos os nomes das letras, os signos
alfabéticos, e suas valorações numéricas, senão que trabalharemos com
símbolos sagrados carregados de Idéias e energias mágicas e teúrgicas.

Está claro que se conhecemos o valor esotérico das letras, suas conotações
numéricas, e as transposições e permutas a que elas podem dar lugar no
contexto das palavras e das orações, a leitura de qualquer texto sagrado –em
particular A Bíblia– no qual o alfabeto hebraico se encontre presente, passará
a ter outro sentido que o comum, literal e exotérico, e adquirirá um relevo e
uma profundidade tanto mais rica quanto mais ampla. E é por estas
associações e correspondências entre números e letras, e as relações a que dão
lugar, que se produzem iluminações surpreendentes na raiz metafísica da
linguagem humana, as quais são chamadas pela Cabala "centelhas divinas".

O Sefer Yetsirah, ou "Livro das Formações", é também conhecido pelo nome


de "Livro da Criação", pois ali estão plasmadas as mais antigas concepções
cosmogônicas judaicas, que serviram por gerações para fundamentar o
pensamento metafísico e esotérico do misticismo hebreu e cristão
(especialmente durante a Idade Média e o Renascimento) e da Cabala em
particular. Nele se encontram especificamente assinaladas em forma de breve
e apertada síntese, determinadas concepções cabalísticas que já fomos
oferecendo ao longo desta Introdução, entre elas, a "doutrina" das dez
sefiroth, como intermediárias entre o "Santo, bendito seja", e a Shekhinah (a
imanente presença divina, da qual proximamente falaremos), e também a da
Criação Universal através das vinte e duas letras do alfabeto hebraico, o que
equivale a considerar ao Cosmo inteiro como escritura divina. Essas letras se
subdividem em três grupos: as três mães, similares, como já vimos, a ar, água
e fogo; as sete duplas ou redobradas, e as doze simples, identificadas
posteriormente com os sete planetas e com os doze signos zodiacais,
respectivamente.

Três letras mães: Alef, Mem e Shin.

Sete letras duplas (ou redobradas): Beth, Guimel, Daleth, Kaf, Fé, Resh e
Taw.

Doze letras simples: Hé, Vav, Zayin, Heth, Teth, Yod, Lambei, Nun, Samekh,
Ayin, Tsade e Qof.

Uma idéia nova é a da união das dez sefiroth, cifras, ou números, às vinte e
duas letras do alfabeto hebraico, que conjuntamente constituem os trinta e
dois caminhos da sabedoria.
10 ALGUNS EXERCÍCIOS PRÁTICOS:
Muitos dos exercícios aconselhados ao longo dos trabalhos herméticos são
com o fim de se adquirir consciência, tanto de si mesmo, quanto da situação
na qual se está envolvido. Os homens tendemos ao sonho e à modorra, por
isso a necessidade de se velar e estarmos vigilantes. Trata-se, pois, do
emprego de singelos despertadores, ou exercícios de tomada prolongada de
consciência. Exemplo: trate de manter uma medalha ou moeda em seu
punho fechado, tendo clara a idéia deste fato. Por quanto tempo pode você
manter fixa a atenção? Exercite-se nesta prática tratando de elevar suas
médias. Muitas vezes pensamos que somos capazes de grandes esforços
quando em verdade não podemos levar a cabo coisas aparentemente
pequenas. Trate de ir caminhando pelo mesma Senda à exata hora do dia
(por exemplo, ponha o despertador às 7 horas da manhã) ao banheiro,
durante um mês seguido. Muito dificilmente poderá efetuá-lo. A armadilha
deste exercício está em que depois da quinta ou sexta vez que se realiza (ou
da décima - quarta ou a décima - quinta) pode acreditar que é sumamente
singelo e que não custará nada cumpri-lo. Assim, desta maneira, não o
efetua. Este é o tipo de armadilha mental que nos impede de fazer um sem
número de coisas e obstaculiza o processo liberador e criativo.

11 SIMBOLISMO VEGETAL I
A vegetação, na indefinida variedade de suas espécies, formas, cores e
fragrâncias, constitui um mundo inesgotável de significações simbólicas
conhecidas por todos os povos desde a mais remota Antigüidade.
Recordemos, neste sentido, que o Paraíso terrestre é descrito como um
jardim ou um vergel, ao cuidado do qual estavam os primeiros homens. Por
este motivo, a agricultura (a "cultura do agro") é considerada como o
primeiro ofício nascido da sedentarização da humanidade, que dá lugar à
aldeia e posteriormente à cidade em pedra e à civilização tal qual a
conhecemos. Não esqueçamos que a palavra cultura deriva precisamente de
“cultivo”, o que está relacionado evidentemente com o vegetal. A isto se
deve, sem dúvida, o porquê do homem arcaico e tradicional ter incorporado
o vegetal na descrição simbólica de sua cosmogonia e de sua visão sagrada
do mundo. Efetivamente, nada há que expresse melhor o desdobramento da
vida universal do que uma planta em seu pleno desenvolvimento, como por
exemplo a árvore, que é também um dos símbolos naturais mais difundidos
do Eixo do Mundo, e o que mais claramente alude à estrutura cósmica e seus
diferentes planos ou graus de manifestação. Baste recordar a Árvore da Vida
Sefirótica, semelhante, quanto a sua significação essencial, a outras muitas
árvores sagradas pertencentes às mais diversas tradições de todos os tempos
e lugares, como a ceiba [N.T.: Ceiba Pentandra Gaertin, árvore existente na
América Central] entre os maias, o carvalho (ou encina [N.T.: Quercus ilex])
entre os celtas, a oliveira entre os povos mediterrâneos, a árvore Yggddrasil
entre os escandinavos, a palmeira entre os antigos egípcios e os árabes, etc.

A mesma função simbólica desempenham determinadas flores, como o lótus


nas tradições orientais e a rosa ou o lírio nas ocidentais. Todas elas são
símbolos do Centro e do Mundo, e o abrir-se de suas pétalas expressa o
desenvolvimento da manifestação a partir da Unidade primordial, por isso
também que se as relacione com o simbolismo da "roda cósmica", estando o
número de pétalas em correspondência com os radios ou raios que conectam
o centro da roda com sua periferia. Não esqueçamos tampouco que as flores
em geral estão vinculadas ao simbolismo da copa, e por conseguinte ao
aspecto passivo e receptivo da manifestação, à pureza virginal da
"quintessência", por exemplo quando se fala do "cálice" de uma flor.

12 SIMBOLISMO VEGETAL II
Dos três reinos da natureza, o vegetal é quiçá o que está mais diretamente
unido ao fluir dos ritmos e ciclos do Cosmo, refletidos na renovação
periódica e anual das plantas, na regeneração da potência fértil e fecunda de
sua seiva, propiciando desta maneira a alimentação e o sustento necessário a
homens e animais. Mas o realmente importante é que esta relação está na
própria base de muitos mitos e ritos agrários, cuja estrutura simbólica
reproduz as leis universais de correspondência e analogia (ou seja, de
harmonia) entre a ordem terrestre e a celeste, ou entre a ordem visível e a
invisível, não sendo, em suma, o mundo vegetal, ou melhor ainda a natureza
em seu conjunto, senão um símbolo vivo e sempre presente do sobrenatural e
do transcendente. Por isso mesmo, a germinação, desenvolvimento,
florescimento e doação dos frutos das plantas não deixa de ser um fato
assombroso e verdadeiramente mágico e misterioso para quem vive imerso
no sagrado, como era o caso dos habitantes das sociedades tradicionais, que
viam nisso a ação combinada de forças telúricas e cósmicas personificadas
nas deidades lunares e solares, terrestres (e infra-terrestres) umas e celestes
as outras, recebendo a planta o influxo das energias passivas e ativas,
femininas e masculinas do Cosmo através dos nutrientes substanciais da
terra e da água, a vivificação do ar, e o calor e a luz procedentes do fogo
solar. Daqui deriva a dupla natureza do vegetal, "asúrica" por sua vertente
subterrânea e "dévica" por sua parte aérea e vertical (axial), termos estes
pertencentes à tradição indiana, e que designam respectivamente às energias
telúricas e celestes conciliadas no ato mesmo da criação da planta. Isto cobra
um relevo especial nas chamadas "plantas sagradas", utilizadas nos ritos de
iniciação aos mistérios, e cuja ingestão (bebida ou comida) põe ao ser em
comunicação com seus estados inferiores e superiores, realizando a "viagem"
pelos diferentes planos de manifestação, descendo e ascendendo pelo Eixo
do Mundo.

Essas plantas seriam, pois, um suporte ou veículo de Conhecimento, e em


muitas ocasiões a própria planta, ou seu fruto, considera-se como o objetivo
a conseguir para aceder a dito Conhecimento, por isso a expressão "licor de
imortalidade" ou "fruto de imortalidade" que recebem determinadas
substâncias vegetais, como por exemplo o vinho ou ambrósia nas culturas
greco-romana, hebraica, cristã e islâmica, semelhante ao soma ou amrita
indiano, idêntico por sua vez ao haoma dos antigos iranianos, do que se diz
que só podia recolher-se na "montanha sagrada" Alborj, equivalente ao Eixo
do Mundo. Igualmente na Alquimia vegetal se fala do "elixir de longa vida",
que se corresponde com a "pedra filosofal" na Alquimia mineral, sendo o
elixir a essência própria da planta, como o vinho é a essência da videira,
outra figura do Eixo do Mundo. Neste sentido, recordaremos que o vinho
simboliza precisamente a doutrina esotérica e metafísica, ou seja o
Conhecimento, e seguramente a isto alude a expressão o "espírito do vinho",
ou aqua vitae (água da vida), ou "bebidas espirituosas", que ainda se
conserva na linguagem popular de diversos lugares, ainda que seu sentido
profundo já passe totalmente despercebido na maioria dos casos.

Também há que se mencionar o trigo (equivalente ao milho nas tradições


pré-colombianas, ou ao arroz entre as extremo-orientais), e em conseqüência
ao pão, que junto ao vinho constituem as duas espécies eucarísticas do
Cristianismo, ou seja do corpo e do sangue, ou a substância e a essência
reunidas no Verbo ou Homem Universal, arquétipo do iniciado, o que é
comparado precisamente a uma planta, tal e como indica a palavra "neófito",
que tanto significa "novo nascido" como "nova planta". Este é, desta forma,
comparado a uma semente ou germe que tem de "morrer" no interior da terra
para renascer ao mundo de cima e da luz, que é sua verdadeira origem pois,
ao contrário do vegetal, o homem tem suas "raízes" no Céu, tal e qual nos
relata Platão no Timeu quando diz que "o homem é uma planta celeste, o que
significa que é como uma árvore invertida, cujas raízes tendem para o céu, e
os ramos para baixo, para a terra".

13 ALQUIMIA
A ciência alquímica se expressa fundamentalmente por imagens gráficas e
gravuras. O símbolo, às vezes parcialmente oculto na iconografia, manifesta-
se assim de modo livre e sem comentários. O provérbio diz que "para o bom
entendedor meia palavra basta". Continuando com o sistema didático de
Agartha, onde se lhe presta bom atendimento ao ensino visual, o que
coadjuva assim mesmo a aprender a Ver, oferecemos aqui algumas gravuras
dos Adeptos à Arte da transmutação. Trata-se neste caso de signos dos
quatro elementos (ver Módulo I, N.º 21), aos quais se agregam outros
detalhes ornamentais diretamente referidos à Ciência dos Filósofos, ou Arte
Real.

fig. 8

14 SIMBOLISMO ANIMAL I
Os animais, além de expressar a parte instintiva e irracional da alma humana
(os impulsos, desejos e emoções do anima), sempre ocuparam um lugar
destacadíssimo na cosmogonia de todos os povos e culturas tradicionais, que
unanimemente viram neles manifestações das forças cósmicas e divinas em
sua ação sobre o mundo, constituindo-se em veículos e oráculos
transmissores da realidade do numinoso e, portanto, em mensageiros ou
intermediários entre o Espírito e o homem. Eles conformam, pois, um código
simbólico de suma importância, uma linguagem através da qual o homem
pôde e pode ler as chaves que lhe permitem compreender as leis e mistérios
do universo e, por conseguinte, conhecer-se a si mesmo, pois sendo um
microcosmo feito a imagem e semelhança do macrocosmo, contém dentro de
si todas as formas, o que é possível pela posição central que ocupa em seu
mundo, e que lhe foi designada pelo Criador. Neste sentido, os textos
tradicionais afirmam que os primeiros homens tinham a potestade de pôr
nomes a todos os seres e coisas, o que não seria tal se estes não formassem já
parte de sua natureza integral. Por isso, a língua adâmica e primordial foi
chamada a "língua dos pássaros", não sendo estes, efetivamente, senão os
mensageiros das realidades superiores, o que guarda relação com a
"languedoc" (d’oc), considerada na Idade Média e no sul de França como o
jargão simbólico utilizado pelos alquimistas, construtores, trovadores e
jograis para transmitir o Conhecimento. A "languedoc", ou a "língua dos
pássaros", é verdadeiramente a linguagem dos símbolos.

Poderíamos dizer que os animais (sobretudo os selvagens), em certo modo


conservam ainda a pureza virginal das origens: são o que são, e na
espontaneidade de seus gestos participam, junto à natureza inteira, da
harmonia e do rito perene da criação. Recordemos que em diversas culturas
das hoje chamadas "primitivas" ou xamânicas é muito importante a figura do
"animal iniciador", vinculado com a idéia de um "alter ego" animal no
homem; ademais, em ditas culturas geralmente o ancestral mítico e
civilizador é um animal, e sua dança, ou rito, criacional é a que se reitera e
imita nas cerimônias de acesso ao sagrado. Conhecida é também a existência
de certos animais "psicopompos" (por exemplo o cachorro e o cavalo) que
guiam o defunto em sua viagem post-mortem, considerado análogo ao que
tem de se realizar durante as provas pelo labirinto iniciático; sem esquecer
que os "guardiões do umbral", cuja função é impedir, ou permitir aos que
estão qualificados para isso, a entrada ao mundo invisível, aparecem
revestidos com formas animalescas, em ocasiões com aparência monstruosa
e "terrível". Tal é o caso, por exemplo, do Mákara e do Kala-Mukha
indianos, ou do Tao-Tie chinês, que figuram ao Ser Supremo em seu aspecto
de animal monstruoso, cujas fauces abertas podem ser, efetivamente, tanto as
"fauces da Morte" como a "porta da Libertação". A Esfinge, e concretamente
a Esfinge egípcia com cabeça de homem e corpo de leão, teria também o
mesmo sentido de "guardião do umbral".

15 SIMBOLISMO ANIMAL II
É importante ademais destacar que quase todas as divindades zodiacais, não
importa de que tradição, estão representadas com formas de animais, e
recordaremos novamente que a palavra Zodíaco não quer dizer senão "roda
dos animais", ou "roda da vida", o que está obviamente unido à idéia de
movimento e de geração surgida do Ser universal, ou melhor, de sua energia
criadora, que permanentemente se recria a si mesma, neste caso através das
indefinidas formas animais. Isto concorda perfeitamente com a idéia, muito
difundida entre as civilizações pré-colombianas de que o Cosmo, isto é a
Vida universal, é um animal gigantesco, do qual todos fazemos parte
integrante (tal é o caso também da serpente alquímica Ouroboros), e isso
explicaria o porquê entre ditas culturas a Deidade criadora estar em bastantes
ocasiões representada como um animal (como ocorre na tradição indiana,
com o deus com forma de elefante Ganesha), ou bem caracterizada com as
partes mais significativas de um animal, geralmente a cabeça, como é o caso,
por exemplo, dos deuses assírio-babilônicos e do antigo Egito. Nas tradições
Centro-americanas o deus Quetzalcoátl quer dizer "pássaro-serpente", ou
"serpente emplumada", conjugando em sua natureza as energias aéreas que
tendem para o céu (o vertical), e aquelas que reptan e se movem pela terra (o
horizontal). A águia e a serpente são, efetivamente, os dois animais que
melhor representam esse antagonismo e complementaridade entre o celeste
urânico e o terrestre ctónico e telúrico.

Por outro lado, junto com o cordeiro, o pelicano e o peixe, a águia e a


serpente são os animais-símbolos mais representativos de Cristo, conquanto
isto teria que se estender a quase todos eles (inclusive os fabulosos), como o
demonstra o riquíssimo bestiário de Cristo (dentro do qual se inclui o
Tetramorfos), tão amplamente desenvolvido na arte da Idade Média. Dito
bestiário compreende praticamente todas as espécies repartidas em quatro
grandes grupos, em correspondência com os quatro elementos: os répteis à
terra, os peixes e anfíbios à água, as aves ao ar, e os mamíferos ao fogo,
sendo o mesmo Cristo (o Filho do Homem) o elemento central, ou
"quintessência", pois dele emanam, enquanto expressões dos atributos de seu
Verbo ou Logos criador.

16 NOTA:
Já observamos que a cultura (cuja raiz, e origem, é sagrada), é uma
intermediária entre o homem e a Deidade. E é desde este ponto de vista e
não desde a vaidade erudita, o enciclopedismo agrilhoador, ou a
literalidade mnemônica, que ela é iluminadora e um veículo especialmente
apto para o Conhecimento. Sem a essência da Cultura, que é o autêntico
saber, todo o resto do enfeitado aparelho cultural é só letra morta.
Igualmente isto é válido para os ritos, que às vezes são confundidos com
determinadas "cerimônias", totalmente vazias de conteúdo. Isto é assim
também para os exercícios, tanto intelectuais como físicos, que Agartha
promove.

17 A COROA
Numa primeira leitura, a coroa simboliza as virtudes mais elevadas que
existem no homem, eis o motivo de cingi-la sobre a cabeça, a "cúspide" do
microcosmo humano, isto é, naquela parte do mesmo que se corresponde
com o Céu, cuja forma circular a coroa reproduz. Mas, precisamente por
isso, a coroa também expressa o que está por "cima" ou "além" do Cosmo e
do homem: a realidade do divino e do transcendente. Poder-se-ia dizer que
no significado da coroa coincidem, pois, as qualidades mais nobres e
superiores do ser humano e, ao mesmo tempo, aquilo que as transcende por
constituir o arquétipo das mesmas. No caminho do Conhecimento, ou via
iniciática, ditas qualidades se vão desenvolvendo depois de um longo
processo de transmutação alquímica, durante o qual o aspirante a ele vai
tomando gradualmente consciência da sacralidade de sua existência, ou de
sua realidade no universal, até se identificar plenamente com esta.

Essa identificação se visualiza muitas vezes como a "conquista" de um


estado espiritual (ou supra-individual), que é o que, efetivamente, "coroa" a
realização de dito processo, ou seja, "legitima-o" (ou o faz verdadeiro e
certo, que é o que esta palavra significa realmente), investindo a quem o
complementa de uma autoridade que emana diretamente do próprio poder de
Deus, o Rei Supremo, ou Rei do Mundo. Este é o sentido que tinham na
Antigüidade os ritos de coroamento dos reis, os chefes de um povo ou de
uma comunidade tradicional, que eram tais porque antes tinham chegado a
ser os reis e chefes de si mesmos, governando de acordo com a Vontade do
Céu, à qual representavam ante seus súditos. O verdadeiro coroamento (que
é uma "consagração" ou assunção plena do sagrado) ocorre no mais secreto,
no coração, onde se estabelece a "aliança" que sela a união com a Deidade,
sendo então a coroa um signo externo e distintivo que confirma a posse da
autêntica realeza interior.

Por outro lado, não podemos deixar de mencionar as estreitas vinculações


que se dão entre a coroa e os cornos, os quais também se cingiam sobre a
cabeça, e simbolizam exatamente o mesmo que aquela. Os cornos são um
atributo da potência do Espírito que "desce" à natureza do homem, ao qual
fecunda e transfigura integrando-o na entidade superior, que é seu verdadeiro
Si Mesmo. Igualmente, é evidente a relação que existe entre os cornos e o
raio, e desta forma com o relâmpago, e recordaremos, a este respeito, que as
coroas mais antigas estavam enfeitadas de pontas que se assemelhavam aos
raios luminosos. O mesmo poderia se dizer da coroa de espinhos que portava
o Cristo Rei durante sua Paixão. Com tudo isso, busca-se destacar o aspecto
solar destes símbolos, que também aparece na coroa de louros (símbolo
eminentemente solar) levada pelos imperadores romanos e com a qual eram
coroados os heróis, mas sem esquecer que dito aspecto se complementa com
o simbolismo polar, que é o mais primordial.

Efetivamente, ambas as palavras, coroa e cornos, procedem de idêntica raiz


lingüística, KRN, a mesma de Kronos, ou Cronos, que é o nome grego de
Saturno, a mais alta e elevada das esferas planetárias e considerado como o
rei da Idade de Ouro. Também a achamos em Karneíos, que era um dos
nomes que recebia entre os gregos o Apolo hiperbóreo (Apollón Karneíos), o
deus do "alto lugar" (Karn), sendo esse lugar a própria cúspide da Montanha
sagrada do Pólo (o Eixo do Mundo), sede da Tradição e da humanidade
primigênia. Aparece deste modo na palavra crânio, que é, efetivamente, a
parte mais elevada da coluna –ou eixo– vertebral. Sendo o crânio um
símbolo da abóbada celeste, seu extremo superior equivaleria então à Estrela
polar, chamada o "ápice" do Céu porque ela "coroa" todo nosso universo
visível, e além disso é considerada em todas as tradições como o lugar por
onde simbolicamente se acede aos estados superiores do ser, essencialmente
supra-cósmicos e metafísicos. Recordemos, neste sentido, que Kether, a
Unidade, significa precisamente a "Coroa", cingida pelo Adam Kadmon ou
"Homem Universal".

Esta idéia do supra-cósmico é a que representa também o Sahasrâra chakra


na tradição indiana e budista. Todo este simbolismo polar e axial convém
perfeitamente ao da diadema papal (de origem muito remota), que é uma
coroa de três andares sobrepostos, e cuja parte superior aparece arrematada
por uma cruz, outra figura do Eixo do Mundo (ver por exemplo o arcano V
do Tarô). Se a coroa propriamente dita é o símbolo da autoridade temporal
exercida pelo rei (o guerreiro), a diadema simboliza a autoridade espiritual
assumida pelo sumo pontífice ou sacerdote, que na Antigüidade tradicional
ocupava a cúspide da hierarquia iniciática, exercendo sua função sobre os
três mundos, ou seja, sobre o conjunto da Existência manifestada, tal qual o
Deus Hermes Trismegisto. Ele era, é, a ponte ou eixo que comunica a Terra
com o Céu, e o Céu com a Terra, o que transmite as bênçãos ou as
influências espirituais e o que possui íntegros a Doutrina e o Ensino
tradicional. Isto explicaria o porquê de, durante a Idade Média ocidental, os
reis serem coroados pela autoridade espiritual, reconhecendo-se assim a
superioridade do metafísico sobre o temporal, do divino sobre o humano.

18 O MENOR É O MAIS PODEROSO


Na via de realização pessoal que este manual propõe, a afirmação do título
nos indica pôr especial atendimento a tudo aquilo que passa despercebido,
mas que no entanto tem uma enorme importância quando se trata de
conhecer a causa e a origem das coisas. Numerosas expressões tradicionais
fincam pé na superioridade do poder do pequeno, sutil e invisível, sobre o
visível, grosseiro e grande. "Semelhante é o Reino dos Céus a um grão de
mostarda, que tomando-o um homem o semeou em seu campo (em si
mesmo), o qual é a menor de todas as sementes, mas quando se desenvolveu
é maior de todas as hortaliças e se faz uma árvore, de maneira que vêm as
aves do céu (símbolo dos estados superiores) e aninham em seus ramos"
(Mateus, XIII, 31-32).

Igualmente todos nossos gestos, o que somos e seremos, estavam já


contidos, em potência, na célula seminal que nos engendrou e nos deu a
vida. Estas proporções entre o pequeno e o grande não são só quantitativas,
senão qualitativas, e obedecem às leis da analogia, que nos faz conhecer a
idéia do Todo por uma de suas partes. Mas aqui falamos melhor das relações
hierárquicas entre o Princípio e sua manifestação, que aparecem invertidas
quando passamos da ordem celeste, ou espiritual, ao terrestre ou corporal,
tendo sempre presente que o primeiro é causa do segundo. O maior no Céu é
o menor na Terra, e o maior na Terra é o menor no Céu.

O Cosmo é o desdobramento do "Ovo do Mundo", que alberga os germes de


tudo o que existe e se manifesta ciclicamente. Desta forma, o Espírito,
quando se quer dar a conhecer, não o faz através do pomposo e cerimonial,
nem de nada que venha do exterior, senão que o realiza por meio do silêncio
interno e do inominável, como uma força que brota do mais profundo e se
expande por todo nosso ser, alumiando-o interiormente e ordenando-o
conforme a seu arquétipo eterno. O verdadeiramente universal, o supremo,
não tem dimensões, nem está sujeito a nenhum tipo de lei terrestre e humana.
Aninha oculto e secreto no coração dos seres, que sem ele careceriam de
toda realidade, da mesma forma que a circunferência não existiria sem o
ponto, nem a série numérica sem a Unidade aritmética. Assim, quanto mais
identificados estejamos com as coisas "deste mundo" menos participaremos
da comunhão salvífica no Ser. "Faz que teu 'eu' seja menor e limita teus
desejos". "Renuncia ao conhecimento (quantitativo e profano) e não
sofrerás" (Tao Te King, XIX). "Os últimos serão os primeiros e os primeiros
os últimos" (Mateus XX, 16). "O menor entre todos vocês, esse será o
maior" (Lucas, IX, 48). "Se algum quer ser o primeiro, que seja o último de
todos e o servidor de todos" (Marcos, IX, 35).

19 TARÔ
Logo a seguir, oferecemos alguns significados sintéticos dos vinte e dois
Arcanos Maiores.

É importante não esquecer, ao estudar as cartas e trabalhar com elas, o que


dissemos sobre as disciplinas relacionadas com o Tarô. Estas lâminas têm
relação com as sefiroth da Árvore da Vida e as letras do alfabeto hebraico,
bem como com os planetas, metais e signos zodiacais, etc. Recordemos
também constantemente seus vínculos com o simbolismo das cores e
especialmente com o significado dos números. Se conseguirmos estabelecer
estas relações de modo adequado, veremos que cada arcano é um mundo, e
observaremos que nossa inteligência se acorda e o ângulo da visão se abre.

Toca ao interessado ampliar, com a informação que tenha a seu alcance, os


significados das cartas. O conhecimento de cada uma delas pode se
aprofundar a níveis insuspeitados.

Permita que estas lhe falem de um modo mágico e as verá atuar em seu
interior como veículos iniciáticos e adequados transmissores de um
Conhecimento Vivo e de uma Tradição Primordial, com os quais você
poderá se unir desta maneira.
20 TARÔ
I — O MAGO: É a primeira carta do
Tarô; simboliza o Homem Verdadeiro
cuja missão é conseguir a união do
espírito e da matéria. Com sua mão
esquerda sustenta uma varinha mágica
que aponta para o céu, e com a direita
uma moeda de ouro, símbolo da terra, na
qual seus pés se encontram bem
plantados. A inversão das cores azul e
vermelha de suas roupas assinala o
equilíbrio dos opostos; e este personagem
empreende a obra alquímica trabalhando
com 3 princípios e 4 elementos
(simbolizados nas 3 pernas e nos 4
ângulos da mesa) para o qual se mantém
permanente-mente alerta. Para ele,
sempre, hoje é o primeiro e o último dia
da criação, à qual se soma, cooperando
com o Criador. O sentido mais elevado
da carta é determinado pelo seu número,
que indica o motor imóvel, o Princípio de
todas as coisas; ainda que seu chapéu em
forma de “oito deitado” [N.T.:
lemniscata] seja o signo do movimento
contínuo.

DIREITA INVERTIDA
Princípio – Começo Inércia - Quietude – Passividade
Sutileza - Maleabilidade Imobilidade - Auto-engano
Inteligência desperta - Rapidez Ausência de interesse - Torpeza
Despertar da consciência Falta de atenção - Divagação
Vigília - Estado de alerta Preguiça - Negligência - Inconveniência
Movimento - Atividade - Brilho Charlatanice - Brutalidade
Espontaneidade - Habilidade Estelionatário - Enganador - Sonho
Boas empresas - Agilidade Politicagem - Irresponsabilidade

21 A CIDADE CELESTE I
À mentalidade moderna resulta virtualmente impossível conceber a idéia de
uma Cidade celeste, em contraste com a mentalidade, plenamente
sacralizada, dos povos antigos e tradicionais, que não só creditavam sua
existência, mas também além disso viam nela a origem de sua cultura e
civilização, como muito bem o explicam as crônicas e textos sagrados que
nos legaram, nos quais se diz que dita cidade é a morada onde habitam os
deuses e os antepassados míticos, o que expressa deste modo a idéia de uma
genealogia espiritual, Por isso os nomes de "Terra dos Vivos", ou "Terra dos
Imortais" ou "Terra dos Bem-aventurados", como também se designa à
Cidade do Céu. Recordemos, neste sentido, que as cidades tradicionais,
sempre se construíram conforme ao modelo dessa Cidade mítica, quer dizer,
como a projeção no tempo e no espaço do mundo das Idéias e dos
Arquétipos, como é o caso de Teotihuacan (a "Cidade dos Deuses") dos
antigos toltecas mexicanos, ou de Jerusalém, chamada a "Cidade da Paz",
que representa a Jerusalém celeste descrita pelo profeta Ezequiel e
posteriormente por João no livro do Apocalipse. O Ming-tang chinês, cujo
nome significa "Templo da Luz", reproduz igualmente a estrutura
arquetípica da Cidade celeste, denominada na tradição extremo-oriental a
"Cidade dos Salgueiros", habitada pelos "Imortais".

Em geral, essa estrutura está presente em todos os centros espirituais


destinados a serem símbolos da manifestação do Céu na Terra, e portanto da
conjugação e íntima união entre ambos, até tal ponto que não existe
diferença alguma que os separe. Convém recordar também que muitas vezes
era um país ou região inteira a que se considerava a imagem mesma do Céu,
como é o caso da antiga China, chamada precisamente de "Celeste Império",
ou o Egito faraônico, que era assimilado a um coração, símbolo também do
Céu, como nos diz Plutarco em seu livro Ísis e Osiris: "Os egípcios figuram
o Céu, que não pode envelhecer porque é eterno, por um coração", e o
mesmo afirma Hermes Trismegisto no Corpus Hermeticum: "Ignora, Oh,
você, Asclépio, que o Egito é a imagem do Céu e a projeção neste mundo de
todo o ordenamento das coisas celestes? Para falar a verdade, nossa terra é o
templo do mundo inteiro".

22 A CIDADE CELESTE II
Também é importante advertir que a fundação das cidades, com seus
templos e santuários, era um símbolo que expressava a constituição ou
consolidação de uma doutrina tradicional, convertendo-se assim a cidade
terrestre na própria expressão dos princípios cosmogônicos e metafísicos
revelados por tal doutrina, pois esta sempre foi considerada como a
emanação direta da Doutrina do céu, que não é outra que a própria Sabedoria
Perene, Lei Eterna, ou Sanatana Dharma, contida na Tradição Primitiva, ou
o que é o mesmo, no Centro Supremo. Este, embora em um princípio era
acessível a todos os homens, tornou-se, por razões de ordem cíclica, oculto e
inacessível para a grande maioria, Por isso que seja através da compreensão
do sentido profundo e essencial do Ensino como se pode realmente
estabelecer a comunicação com tal Centro, quer dizer, quando a "intenção" e
a vontade de todo o ser se oriente para o Conhecimento, e se identifique e
seja um com ele, promovendo assim uma verdadeira transformação interior
casada com a realização de todas as possibilidades contidas no estado
humano, à luz de cuja plenitude todas as coisas aparecem reintegradas na
Unidade do Si mesmo, o qual está em relação com a frase evangélica:
"Procurem e encontrarão, peçam e serão saciados, chamem e se lhes abrirá".
A essa transformação (precedida por numerosas mortes e nascimentos)
refere-se a expressão hermética que sintetiza a consumação da Grande Obra:
"espiritualizar os corpos e corporificar os espíritos", ou "espiritualizar a
matéria e materializar o espírito", como se diz nas primeiras páginas deste
Programa.

O centro do estado humano está representado precisamente pelo coração,


onde, efetivamente, todas as tradições situam a morada simbólica da Cidade
celeste, ou Cidade divina (em sânscrito Brahma-pura), que é o Reino dos
céus (identificado com a Cristianópolis ou o Templo do Santo Espírito, "que
está em todas partes", do hermetismo Rosa-Cruz), do que se diz que não virá
ostensivamente, "Nem poderá dizer-se: hei-lo ali, hei-lo aqui, porque o
Reino de Deus está dentro de vós", Lucas, XVII, 21. É também a Jerusalém
Celeste como dissemos, cujo advento supõe a abolição da condição
temporária, e portanto a restauração do estado primitivo e do sentido da
eternidade ou "presente eterno". Em conseqüência, poderia então se afirmar
que a Cidade celeste é a possibilidade permanente de viver a realidade em si
mesmo, sem reflexos duais, como foi, é e será sempre, constituindo o ponto
de referência vertical que dá sentido e plenitude à totalidade de nossa
existência, que se reconhece no universal, conduzindo-nos da periferia ao
centro através do Eixo que comunica a Terra com a Pátria celeste, que é
nossa origem e destino final: "Eis aqui o Tabernáculo de Deus entre os
homens, e erigirá seu Tabernáculo entre eles, e eles serão seu povo e o
mesmo Deus será com eles", Apocalipse, XXI, 3-4.

23 O COMPASSO E O ESQUADRO
Ao falar da Arquitetura (Módulo I, N.º 73) indicamos a importância que tem
a forma do cosmo físico como modelo no qual se inspiravam os antigos
construtores para a edificação dos recintos sagrados e das moradias
humanas. E entre os principais instrumentos utilizados para tal fim
destacamos o compasso e o esquadro. Ambos são os símbolos respectivos do
Céu e da Terra, e assim os contempla em diversas tradições, ou mais
precisamente, iniciações, como o Hermetismo, a Maçonaria e o Taoísmo. O
círculo ao qual desenha o compasso, ou seu substituto a corda, simboliza o
Céu, porque este efetivamente tem forma circular ou abobadada, qualquer
que seja o lugar terrestre de onde o observe. Por sua vez, o quadrado (ou
retângulo), que traça o esquadro, simboliza a Terra, quadratura que lhe vem
dada, entre outras coisas, pela "fixação" no espaço terrestre dos quatro
pontos cardeais assinalados pelo sol em seu percurso diário. Além disso, a
Terra sempre foi considerada como o símbolo da estabilidade, e a figura
geométrica que melhor lhe corresponde é precisamente o quadrado, ou o
cubo na tridimensionalidade.

Para a Ciência Sagrada, o compasso designa a primeira ação ordenadora do


Espírito no seio da Matéria caótica e amorfa do Mundo, estabelecendo assim
os limites arquetípicos deste, quer dizer, criando um espaço "vazio", apto
para ser fecundado pelo Verbo Iluminador ou Fiat Lux. Na Gênese bíblica, a
separação das "Águas Superioras" (os Céus) das "Águas Inferiores" (a Terra)
deu nascimento ao cosmo, cuja primeira expressão foi a criação do Paraíso,
que como se sabe tinha forma circular. A este respeito se diz nos textos
hindus: "Com seu raio (rádio) mediu os limites do Céu e da Terra", e nos
Provérbios de Salomão, pela voz da Sabedoria se diz: "quando (o Senhor)
riscou um círculo sobre a face do abismo...". Igualmente em um quadro do
pintor e poeta inglês William Blake, vê-se o "Ancião dos Dias" (o Arquiteto
do Mundo) com um compasso na mão desenhando um círculo.
fig. 9

O compasso é pois um instrumento que serve para determinar a figura mais


perfeita de todas, imagem sensível da Realidade Celeste, que é precisamente
o que está simbolizando a cúpula ou abóbada do Templo. O compasso é o
emblema da Inteligência divina, do "Olho de Deus" que reside
simbolicamente no interior do coração do homem, a luz do intelecto superior
que dissipa as trevas da ignorância e nos permite acessar o interior do
sagrado. Por isso mesmo, o conhecimento da "ciência do compasso" implica
uma penetração nos arcanos mais secretos e profundos do Ser. Entretanto, o
conhecimento plenamente efetivo desses mistérios seria tal a culminação, se
assim pode se dizer, do próprio processo da Iniciação.

Mas no momento de pôr "mãos à obra", a casa não se começa pelo telhado.
O trabalho começa por baixo, em definitivo pelos alicerces, pelo
conhecimento das coisas terrestres e humanas. Aqui entra em função a
"ciência do esquadro", tão necessária para riscar com ordem e juízo os
planos de base do edifício e seu posterior levantamento, dando-lhe a
estabilidade e comprovando o perfeito talhado das pedras que servirão de
suporte e fundamento à abóbada, teto ou parte superior.

No trabalho interno é imprescindível, para que este siga um processo regular


e ordenado, "enquadrar" todos nossos atos e pensamentos na via assinalada
pela Tradição e pelo Ensino, separando o sutil do grosseiro. É isto
precisamente o que assinala o Tao-Te-King: "Graças a um conhecimento
convenientemente enquadrado, caminhamos sem dificuldades pela grande
Via". Recordaremos, neste sentido, que em latim esquadro também se diz
"norma", que é também uma das traduções da palavra sânscrita dharma, a
Lei ou Norma Universal pela que são regidos todos os seres e o conjunto da
manifestação cósmica. Poderíamos então dizer que o esquadro é o compasso
terrestre, posto que não é mais que a aplicação na terra e no humano dos
princípios e idéias simbolizados pelo compasso.

Por outro lado, esta união do círculo celeste e do quadrado (ou cruz)
terrestre, está em relação com o enigma hermético da "quadratura do círculo"
e a "circulatura do quadrante", que sintetiza os mistérios completos da
cosmogonia. Efetivamente, na "ciência do compasso" e na "ciência do
esquadro" estão contidos a totalidade dos "pequenos mistérios", cujo
percurso é, em primeiro lugar, horizontal (terrestre), e posteriormente
vertical (celeste). Com tudo isto, queremos indicar que na realidade existe
uma aplicação filosófica da Geometria, que poderíamos denominar a
"Geometria Filosofal", que era perfeitamente conhecida pelos construtores
medievais, os companheiros e maçons operativos, como por todos aqueles
que se dedicaram à Arquitetura ou ordem do cosmo como meio de elevar-se
ao conhecimento do que o ponto primitivo simboliza. Sem fatuidade, Platão
fez pôr sobre o frontispício de sua escola: "Que ninguém entre aqui se não
for geômetra", indicando assim que seus ensinos só podiam ser
compreendidos por quem conhecia o aspecto qualitativo e esotérico da
geometria.

Desde outro ponto de vista, o trabalho com o compasso e com o esquadro


sintetiza igualmente todo o processo alquímico da consciência, do que a
edificação e construção não são mais que símbolos. Por isso que em alguns
emblemas hermético-alquímicos se vê o Rebis, ou Andrógino primitivo,
sustentando em suas mãos o compasso e o esquadro, quer dizer, reunindo na
natureza humana as virtudes e qualidades do Céu e da Terra, harmonizando-
as em uma unidade indissolúvel.

fig. 10

24 CABALA
Já sabemos que as letras hebraicas, como as de qualquer língua sagrada, são
simbólicas, e como tal temos que as considerar em nossos estudos e
meditações. Efetivamente, tais letras têm uma forma ideogramática, quer
dizer que expressam idéias e princípios, intimamente relacionados com os
números e as figuras geométricas. Ao mesmo tempo, essas letras são sons
invertebrados de um Verbo único, as quais em suas múltiplas combinações
geram a totalidade da linguagem, ou seja, do que pode ser expresso, pois o
inexprimível pertence ao puramente metafísico e imanifestado.
Este é o caso da letra Iod (ou Yod), que constitui a primeira do
Tetragramaton, YHVH, o Nome Divino inefável. Essa primazia está
indicada por sua própria pequenez, que evoca um ponto, ou um germe,
simbolizando assim a essência indivisível, oculta e secreta da divindade. Esta
última a põe em relação direta com o centro geométrico e, é obvio, com a
unidade aritmética, símbolos também do Princípio imanifestado. Do mesmo
modo, temos que o valor numérico da Iod é dez, o qual expressa a totalidade
dos aspectos criados, simbolizados pelas dez sefiroth e pelos dez dedos das
mãos, totalidade que está compreendida dentro da própria unidade, pois 10 =
1 + 0 = 1. Por outro lado se diz que a letra Alef (que é a primeira do
alfabeto), está composta de quatro Iod, estando então relacionada com o
número 40, que por sua vez se reduz de novo à unidade, pois 40 = 4 + 0 = 4,
e 4 = 1 + 2 + 3 + 4 = 10 = 1 + 0 = 1. Tudo isto mostra as vinculações que
existem entre o denário e o quaternário, o primeiro simbolizando o
desenvolvimento completo da manifestação, enquanto que o segundo
expressa o vínculo que une essa manifestação a seu princípio, e vice-versa.
Isto é o que justamente simboliza a cruz inscrita na circunferência. Esta
mesma figura representa também os quatro rios do Pardés (ou Paraíso), que
emanam do centro da Árvore da Vida, distribuindo a unidade a todos os
limites da criação.

Por outro lado, é indubitável a importância que o número 40 tem na Cabala,


pois representa as dez sefiroth nos quatro planos do Árvore. Mas também, tal
número está relacionado com os quarenta anos que passou Moisés no deserto
antes de que o povo do Israel penetrasse na terra prometida. Número que é
também o de um ciclo simbólico atemporal pois, estando todos os planos de
existência unidos entre si, também têm uma expressão cronológica. Por
último, assinalar que para os antigos cabalistas o homem começava a
compreender os mistérios a partir dos quarenta anos, idade que indica a
maturidade necessária para compreender as mais profundas e secretas
verdades.

25 NOTA:
Ainda que pese o processo de dessacralização do mundo moderno, a força
do mito segue presente. Como já se indicou, uma prova disso são os
diferentes folclores, lendas e contos que sobrevivem na alma popular, e que
conservam o rastro dos mitos e símbolos sagrados e iniciáticos, embora é
certo que com freqüência estes apareçam degradados e com fortes doses de
superstição. Porém, também é verdade, que se não fora por essa
sobrevivência, ser-nos-ia virtualmente impossível ter conhecimento algum
de muitos desses mitos e símbolos, pois se teriam perdido para sempre. No
simbolismo astrológico, esta memória se vincula à esfera da Lua –e a
sefirah Yesod–, que na estrutura sutil do cosmo cumpre uma função
conservadora e receptora onde estão "depositados", em estado latente e
potencial, os "gérmens" sutis do ser individual. Uma vez despertadas as
possibilidades superiores contidas nesses germens, seguirá um
desenvolvimento gradual e ordenado cuja plenitude coincidirá com o
nascimento de um homem novo e completamente regenerado, o que equivale
ao renascimento espiritual.
Que o homem não pode prescindir dos mitos, pode-se ver hoje em dia na
grande quantidade de “comics”, novelas e filmes, aonde as histórias de
heróis justiceiros que lutam contra ladrões e assassinos estão perpetuando o
combate das potências luminosas contra as das trevas. O mesmo se pode
dizer do mito do amor (união dos princípios aparentemente antagônicos,
mas complementares, simbolizados pelo homem e a mulher) que é
possivelmente o que com mais força se perpetuou e o que nutre a maior
parte dos filmes e canções modernas populares. E isto é claro indício de que
a energia da deusa do Amor e da Beleza, Vênus, não se extinguiu, mas sim
continua plenamente vigente e cheia de vitalidade na alma dos homens,
como não poderia deixar de ser, já que se trata de uma energia imortal.

26 TARÔ
II — A SACERDOTISA: É a Sabedoria
oculta detrás dos véus das aparências.
Sentada como eixo central entre as duas
colunas do Templo, desentranha as
profundi-dades das coisas graças à
intuição superior e ao intelecto puro, que
são os olhos com os quais lê no Livro da
Vida. Ela nos ensina a olhar no interior de
nós mesmos, a guardar silêncio quando se
faz necessário calar, a penetrar as formas
procurando sempre a essência dos seres, e
a conhecer a Fé. Não as crenças
dogmáticas que só se impõem aos cegos,
mas sim, melhor, aquela certeza que
conhece quem tenha sido tocado pela
experiência espiritual, e que se guarda em
segredo como um precioso tesouro. É a
“Ísis com Véu” dos egípcios, que se
encontra coroada como rainha misteriosa,
cujo coração só pode abrir a chave do
Conhecimento, ao que chegaremos através
do olhar interno que propicia o trabalho
iniciático.

DIREITA INVERTIDA
Sabedoria – Intuição Ignorância - Cegueira – Idéias
Conhecimento - Intelecto puro fixas - Obscuridão – Egoísmo
Interioridade - O invisível, esotérico Miopia - Fixação - Obsessão
e secreto - Oração - Concentração Obcecação - Pessoa ou coisa
Silêncio - Excelente aptidão fechada - Rigidez - Cabeça
Campo fértil – Recolhimento dura - Surdez - Estupidez
O oculto, misterioso – Meditação Obstinação - Constipação
Receptividade - Olhar interno Infertilidade - Egocentrismo
Autoconhecimento Teimosia

27 MITOLOGIA
Os diversos significados dos mitos –assim como os dos símbolos– não se
contradizem, embora se sobreponham, ou dito de outro modo: estes
significados são multifacetados e se referem tanto a distintos planos da
realidade como a diferentes aspectos de sua manifestação. O fato é que um
grau ou tipo de leitura do mito (ou do símbolo) não tem porque
necessariamente excluir a qualquer outro, senão que estes sentidos se
complementam, pois muitas vezes se referem a aspectos da realidade que
coexistem nela intrinsecamente.
O homem moderno está acostumado a proceder em forma absolutamente
binária, ou seja, por “sim” ou por “não” (geralmente pelo "bom" –sempre
diferente e mutável–, o que leva a negar o "mal" implícito em qualquer
manifestação), razão que caracteriza a sua educação lógico-formal, que nos
séculos XVII e XVIII desemboca necessariamente no racionalismo. É o
produto de sua programação histórica, e com estes parâmetros acredita que
está perfeitamente capacitado para julgar e valorar tudo, sem compreender
que é uma vítima de seu baixo condicionamento, cuja ilusória ciência se
atreve a interpretar culturas e pensamentos que não só não foram cunhados
sob essas simplistas e ingênuas perspectivas, senão que, pelo contrário, esses
mesmos pensadores e culturas se encarregaram de advertir os riscos de tais
atitudes desde os começos de sua formulação, posto que os enganos da
sociedade moderna já estão expressos em forma embrionária nos gérmens da
Grécia clássica, ou dito de outra maneira, nos alicerces de todo organismo
vivo (tal qual uma civilização), que em virtude de seu crescimento múltiplo
cada vez se encontra mais afastado de seu estado original, levando em si
implícitos os elementos dissolventes que o precipitarão a sua degradação e
morte final. Por isso a errônea simplificação de positivo ou negativo (bom ou
mau) excluindo sempre um em benefício do outro, não é outra coisa que um
engano, já que as qualificações de que se trata são válidas só de um ponto de
vista –ignorando o contrário– e estão sujeitas à relatividade do tempo (o mau
de hoje é o bom de ontem, o que hoje pudesse considerar-se bom, o mau de
tempos passados, etc.).
O mito, em sua ambivalência, esclarece esta ignorância da que tanto se
vangloriam a maior parte de nossos contemporâneos que tratam de ser
"bons", ou ainda de maneira mais degenerada, "maus", sem compreender que
no conjunto das coisas do cosmo estas valorações arbitrárias estão sujeitas às
determinações individuais de seus próprios egos, cuja conveniência
interessada, seja social ou pessoal, é o produto de seus desejos, que os
sacodem em todas direções.
É este tipo de atitude, ou seja: o desconhecimento das leis da cosmogonia –a
qual os mitos se referem em primeiro lugar–, o que lhes leva a desprezar o
mito, a vivê-lo como fábulas ou fantasias, ou tentar sua classificação
mnemônica e erudita, ou no melhor dos casos a interpretá-lo com um
achatamento e mediocridade digna do pensamento da sociedade em que
vivem.

28 CABALA
A Cabala pode agrupar-se em duas grandes divisões. A primeira é a Cabala
do Bereshit –originada na letra Beth, com a que começa a criação–, e a outra
é a Cabala do Merkabah, ou a Cabala do Carro, relacionada com a
Triunidade das sefiroth supremas. A primeira se refere à Cosmogonia, e a
podemos vincular com as figuras geométricas do quadrado e do círculo, terra
e céu respectivamente, e também com a horizontalidade e a verticalidade.
Por certo, é com a Cabala do Bereshit com a qual você se liga por intermédio
da Agartha. Há cabalistas que vinculam diretamente os vinte e dois Arcanos
Maiores do Tarô com as vinte e duas letras do alfabeto sagrado, fazendo
corresponder à carta l, O Mago, com a letra Alef, e em sucessão as que
seguem. Não todos os hermetistas procedem exatamente da mesma maneira
na questão das equivalências, e isto pode dar lugar a distintos diagramas
sefiróticos em que os atalhos fiquem assinalados por cartas do Tarô distintas.
A seguir damos uma versão, com o fim de que o leitor possa seguir tecendo
relações e equivalências.

29 EXERCÍCIOS DE PACIÊNCIA:
A paciência, o aprender a esperar, é ativar a potência da energia passiva
que jaz em nós. A paciência é também aprender a receber e saber deixar
acontecer aquilo que não é estritamente de nossa incumbência, ou seja, que
igualmente atua como selecionador. São muitos os exercícios que qualquer
um pode efetuar referentes ao cultivo de sua paciência aproveitando a vida
cotidiana. Sugerimos dois para aqueles que conduzem automóvel: 1°)
Quando um automobilista tentar ultrapassá-lo de forma violenta, deixe-o
passar e pergunte-se aonde vai com tanto pressa: ligar o televisor? 2°) Se
você tiver que viajar por uma estrada em uma viagem longa, proponha uma
marcha de absoluta regularidade.

30 EXERCÍCIOS DE SILÊNCIO:
Praticar o silêncio é recorrer a uma das energias mais poderosas de que
pode dispor o homem. A tremenda concentração de uma consciência alerta,
que não desperdiça energia em valores e circunstâncias relativos e fugazes,
dá nascimento à autoconcepção dos mundos, aos que a prática do silêncio
conduz. Calar em uma conversação, ou em uma discussão, sobretudo se o
tema supõe um triunfo de seu ego, ainda que lhe seja negada a razão que
você tenha, é igualmente uma experiência muito interessante, só
reconhecível por aquele que a tenha vivido.
31 TARÔ
III — A IMPERATRIZ: É a Sabedoria
despojada de seus véus, que se vê aqui
refletida a si mesma na Inteligência, a
Virgem Rainha, cheia da Graça que será
derramada a toda a criação. Representa o
princípio feminino, passivo e receptivo,
ao qual se pode ver como uma copa
vazia, que é penetrada e fecundada pelo
Espírito. É doadora de formas, e como
toda mãe, ao dar a vida dá também a
morte, unindo os mistérios gozosos,
dolorosos e gloriosos. Ela é a Mãe Maior
ou matriz universal da qual emanam
todas as criaturas; e a Inteligência
reveladora e criativa, capaz de discernir o
verdadeiro e o falso. Sua beleza e
harmonia se manifestam na Natureza. É a
mulher sedutora e atraente e a esposa fiel
e amante. Igual que a IIII, é uma carta
exterior, relacionada com a graça e a
beleza das formas, bem como com a
nobreza e a autêntica "realeza".

AL DERECHO AL REVES
Inteligência - Energia criativa Falta de inteligência e de graça
Graça - Encanto Aparentar o que não se é
Firmeza - Responsabilidade Vulgaridade - Grosseria - Capri-
Boa disposição de ânimo chos - Afetação - Ridicularidade
Formas - Elegância Dificuldade de dar formas
Nobreza - Riqueza Falta de nobreza - Mau gosto
Facilidade - Alegria Instabilidade - Exagero
Poder de sedução Falsos brilhos e êxitos
Atração Impontualidade - Improvisação

32 CABALA
Quando falamos do simbolismo da letra Iod, indicamos que ela era a
primeira das quatro que compõem o Tetragramaton, ou Grande Nome de
Deus, YHVH, que recordamos é impronunciável, pois expressa um grande
mistério. Na continuidade, queremos propor um tema de meditação que se
refere à identidade dessas letras com as dez sefiroth, e que com toda
segurança ampliará nossos conhecimentos sobre o modelo da Árvore
Cabalística. Segundo o Zohar, a Iod expressa a união indivisível e ontológica
das duas primeiras sefiroth, Kether (a Coroa) e Hokhmah (a Sabedoria). A
ponta ou vértice superior da Iod representa a Kether, a "raiz suprema", que se
submerge e emana de En Sof, o Nada ilimitado e supra-essencial, idêntico ao
Não-Ser e ao Deus Absconditus, do qual extrai toda sua realidade, pois
recordaremos que Kether não é senão um ponto afirmado nessa infinitude.
Desse vértice, de Kether, emana Hokhmah, também chamado o "Pai",
simbolizado pelo resto da Iod, que se prolonga levemente para baixo,
representando o próprio Ser dando origem à manifestação. Mas para que isso
seja assim é necessário que Binah (a Inteligência), também chamada a "Mãe
Suprema", ou princípio passivo de Kether, seja fecundada por Hokhmah, o
princípio ativo, e essa fecundação é a que está expressando a segunda letra
do Tetragramaton, a Hé. A união desta com a Iod (Hokhmah) gera a terceira
letra, a Vav, à que se denomina o "Filho". A forma desta letra, com seu braço
inferior alongado para abaixo sugere perfeitamente a idéia de descenso dos
princípios superiores no seio da manifestação propriamente dita, pois essa
letra representa a síntese das seis sefiroth de construção cósmica, Hesed,
Gueburah, Tifereth, Netsah, Hod e Yesod, as quais, como diz o Zohar,
"transmitem a herança à Filha". Esta não é outra que a segunda Hé, última
letra do Tetragramaton, a qual simboliza a sefirah Malkhuth, o "Reino",
recipiente de todas as emanações sefiróticas, às quais distribui em toda a
ordem criada. A Cabala denomina a estas quatro letras de a "família divina",
esclarecendo que toda ela conforma uma unidade, como a própria Árvore da
Vida, ou a própria realidade do Cosmo, à qual aquela certamente simboliza.

fig. 11

33 O AMOR
A frase: "Deus é Amor", extraída do Evangelho de João, permite-nos
entrever a elevada natureza desta energia, considerada por todas as tradições
como um dos principais nomes ou atributos da Unidade (de Kether),
identificando-se com ela, como o atesta o fato de que em hebraico a palavra
Unidade (Ehad) e Amor (Ahabah) têm o mesmo valor numérico, o 13. Neste
sentido, já o Mestre Eckhart afirmava: "Onde queira que esteja a alma é onde
Deus opera sua obra. Esta operação é tão grande que não é outra coisa que
Amor, mas o Amor não é outra coisa que Deus. Deus se ama a Si Mesmo,
ama sua Natureza, sua Essência e sua Deidade. Mas no Amor com que Deus
se ama a Si Mesmo, ama também a todas as criaturas, não enquanto
criaturas, senão enquanto elas são Deus. No amor com que Deus se ama a Si
Mesmo, ama ao mundo inteiro".

Por isso, do amor se diz que é a força de atração dos contrários ou opostos, o
centro de união onde se conciliam as energias verticais e horizontais, ativas e
passivas do cosmos e do homem, fazendo possível o equilíbrio e a
verdadeira concórdia (ou "união dos corações") universal, por isso os antigos
gregos vissem nele o filho de Afrodite e Hermes (tal como sua irmã, a deusa
Harmonia), de onde nasce também o Hermafrodita, ou seja, o Rebis, que
representa no ser humano a união perfeita e harmoniosa de sua natureza
masculina e feminina, ativa e passiva, yang e yin. Efetivamente, é com o
fogo do amor, e a sutil paixão que ele gera, que se leva a cabo a obra da
transmutação alquímica, porque esse fogo é o próprio amor ao
Conhecimento e à Sabedoria e, como dizia Leonardo da Vinci: "O Amor é
filho do Conhecimento. O Amor é tanto mais elevado quanto o
Conhecimento é mais verdadeiro". A este amor, expressão do amor divino, é
ao que cantavam os trovadores medievais, e o que Dante vê personificado na
figura de Beatriz (que simboliza a Sabedoria), e certamente é o que invoca
Salomão no Cântico dos Cânticos, aonde trata precisamente das "bodas",
"casamento", ou união da alma humana com o Espírito.

Por isso, os humanistas e mestres herméticos do Renascimento, que


recolheram os ensinos de Platão e da mitologia órfica e greco-romana,
falavam dos mistérios do Amor identificando-os com os mistérios da Morte,
que são, afinal de contas, os mistérios da iniciação, e explicavam que morrer
era ser amado por um deus, e vice-versa, que amar era morrer ou ser morto
por um deus. Na realidade, trata-se de um sacrifício (de um "ato sagrado"),
pois não há nascimento à realidade do Espírito, ou seja ao Conhecimento,
sem que isto suponha uma morte ou superação das limitações próprias do
humano. Os amantes da Sabedoria sabem que não podem casar com ela se
não abandonam ou não deixam de se sentir condicionados pela Vênus
Pandemos, ou seja, por seus desejos e amores terrenais, que são
considerados como um reflexo invertido dos amores celestes procurados pela
Vênus Urania. Pico de la Mirandola punha o exemplo do "esfolamento"
sacrifical de Marsias como o modelo a seguir por esses amantes: "Se te
juntas com cantores e harpistas, podes confiar em teus ouvidos, mas quando
te acerques aos filósofos, deves apartar-te dos sentidos, deves voltar-te sobre
ti mesmo, deves penetrar nas profundidades de tua alma e nos rincões de tua
mente, deves adquirir os ouvidos de Tineo (refere-se a Apolônio de Tiana,
filósofo pitagórico), com os quais, ao já não estar em seu corpo, não escutou
ao Marsias terrenal senão ao celeste Apolo, quem com sua divina lira e com
inefáveis modos, entoou as melodias da esferas".

34 METAFÍSICA
O estudo dos textos de nosso Programa –e todos os símbolos e exercícios
que utiliza– tende a conduzir-nos para o conhecimento e para a realização
das possibilidades superiores do ser, às quais definimos como de ordem
metafísica. E convém aqui fazer algumas observações a respeito do que
entendemos por metafísica, ainda que devamos advertir sobre as dificuldades
de expressar algo referente a um domínio que foi sempre considerado como
inexprimível, e a impossibilidade de definir aquilo que essencialmente é
indefinível.

Demos-lhe à palavra "metafísica" a conotação etimológica de "além da


física" e cremos que é a mais clara, se entendermos, como os antigos, que a
física é a ciência que estuda os fenômenos da natureza, em toda a extensão
deste termo, e que o que concerne ao conhecimento metafísico é
sobrenatural, e ao mesmo tempo supra-humano e supra-cósmico, pois
transpassa o sensível e transcende o mundo da manifestação.

Para atingir o metafísico não podemos utilizar os métodos da filosofia e das


ciências profanas, que são racionais, discursivos e indiretos, e totalmente
insuficientes, senão que temos de apelar a um conhecimento direto e supra-
racional, ao qual só se chega pela intuição mais pura. Os símbolos e as
palavras que utilizamos são suportes mágicos nos quais bem podemos nos
apoiar para elevar nosso pensamento às esferas mais sutis do ser; mas o
metafísico –diz-nos a doutrina– encontra-se além de todas as formas e
contingências, e ainda além do Ser, pois pertence ao domínio do Não Ser.

Enquanto o intelecto individual, limitado pelos sentidos, pelo corpóreo e


pelo transitório, acha-se encerrado em seus próprios limites, o intelecto
transcendente e universal conhece diretamente os princípios imutáveis e
eternos. O homem pode atingir este domínio do metafísico, mas não
enquanto ser individual e transitório, senão enquanto que participa desta
inteligência superior e está unido a ela por uma tomada de consciência de
suas verdadeiras possibilidades espirituais, que são mais do que humanas.
Nossa realidade individual mal é uma manifestação momentânea do ser
verdadeiro, um de seus múltiplos estados, e o conhecimento metafísico
transcende ao próprio homem, e ainda ao cosmos, pois é absolutamente
ilimitado. É óbvio que não nos estamos referindo a um conhecimento
ordinário e profano senão a uma experiência de outra ordem, que transcende
tudo o que possa ser imaginado. Enquanto os estados particulares do ser têm
uma manifestação espaço-temporal, o próprio ser, em seu princípio
metafísico, é eterno, e desde a eternidade todos esses estados são agora,
simultaneamente.

É importante assinalar que com isto não estamos negando o físico, nem as
possibilidades individuais do ser. Só queremos recalcar que o metafísico é de
ordem superior, e que o físico se encontra incluído nele.

A verdade metafísica é eterna e única, e sempre tem seres que a conhecem,


pois participam plenamente desse estado de Libertação e União.

35 TARÔ
IIII — O IMPERADOR: A IIII
representa um rei, em tempo de paz, que
legisla e governa seu povo com firmeza e
amor. Com suas pernas realiza o sinal da
cruz, o quaternário que serve de
fundamento às leis do tempo e do espaço.
É símbolo das estruturas sociais,
familiares e de governo, às quais serve de
centro, ordenando-as e harmonizando-as.
Como arquiteto, desenha os planos
construtivos de seu império, que se levanta
e acrescenta sob sua autoridade. Em nosso
interior é aquela energia que nos governa e
controla, ordena nossas idéias, disciplina
as ações, e nos ensina a cumprir uma
missão. Simboliza também a paternidade:
o bom pai que corrige e educa seus filhos
unificando o rigor e o amor. As cartas III e
IIII são opostas e complementares, o que
se observa na posição do cetro e do
escudo, símbolos de comando, domínio e
poder.

DIREITA INVERTIDA
Autoridade - Força Tirania - Absolutismo - Despotismo
Poder - Domínio Arbitrariedade - Usurpação
Governo - Direito - Lei de poder - Falta de direito
Dotes - Missão Materialismo - Horizontalidade
Arquitetura - Construção Desordem - Falta de caráter
Vontade - Disciplina Debilidade - Severidade excessiva
Paternidade Militarismo - Literalidade
Flexibilidade Falta de domínio
Paz - Visão Obstáculo formidável

36 GEOGRAFIA SAGRADA
Para a Tradição, a geografia, tal qual a história, é considerada como uma
ciência sagrada, em contraposição ao que sob este mesmo nome estuda a
ciência contemporânea, que ignora que a Terra é um ser vivo que respira e
sente, e que possui, além de um corpo, uma alma e um espírito. A este
respeito, recordaremos o que nos ensina a Alquimia quando fala da geração e
transmutação dos metais e pedras no interior da Terra, interior que é
considerado como a matriz da Mater Genitrix, receptáculo das energias
verticais e numinosas expressadas através dos ritmos e ciclos cósmicos. Por
isso a geografia se complementa com a cosmografía, ramo anexo à ciência
astrológica, e pela qual é possível conhecer com exatidão o aspecto que o
Céu apresenta em cada momento, bem como as revoluções dos planetas e as
constelações estelares e zodiacais. Muitas vezes a própria toponímia revela
as analogias e correspondências que existem entre a ordem terrestre e a
celeste. Tal é o caso, por exemplo, da cidade de Santiago de Compostela,
palavra esta que precisamente quer dizer "campo de estrelas". O próprio
traçado do Caminho de Santiago se considera como uma projeção terrestre
da Via Láctea, querendo se indicar com isso a origem celeste desse caminho.
Igualmente a forma em que estão dispostos alguns acidentes topográficos –
como rios, montanhas, pedras, cavernas, vales, inclusive países e ilhas–
descrevem em sua configuração, e graças às harmonias sutis, certas
constelações e até o zodíaco inteiro, como o que se encontra desenhado sobre
a paisagem de Glastonbury, na comarca inglesa de Somerset.

Por outro lado, as grandes mudanças cíclicas do universo incidem


profundamente na forma que foi apresentando em sucessivas etapas a
superfície terrestre, que nem sempre teve a mesma configuração. Em certo
sentido, as chamadas eras geológicas se correspondem, no espaço, ao que
são as eras cósmicas no tempo, ou seja às divisões cíclicas (a mais
importante das quais é a precessão dos equinócios, ou sua metade) de que se
compõe uma era completa do mundo e da humanidade, o que na tradição
indiana se denomina um Manvántara. O deslocamento ou inclinação do eixo
terrestre (que na época primordial era o mesmo que o do céu) supôs o passo
de um período cíclico a outro, sendo esta a origem de grandes mudanças
geológicas, bem como da aparição das estações. Obedecendo a essas leis,
continentes inteiros desapareceram (como é o caso famoso da Atlântida, da
qual Platão fala no Crítias), surgindo outros. Assim mesmo, os antigos
mapas cartográficos não descreviam, como os atuais, só o aspecto físico da
Terra, que desde o ponto de vista tradicional é secundário, senão que, antes
de mais nada, estavam expressando uma visão simbólica e mítica da
geografia, e por conseguinte representavam uma fonte de ensino tradicional.

Neste sentido, o estudo e conhecimento da Geomancia (que os antigos


chineses conheceram sob o nome de feng shui, "água-ar", pois se
consideravam a estes dois agentes naturais como os principais modificadores
da paisagem) dá-nos a chave para compreender a verdadeira natureza, ao
mesmo tempo mágica e metafísica, do espaço terrestre. Existem lugares que
são mágicos porque neles, misteriosamente, manifesta-se o eixo invisível do
mundo que comunica o sensível ao suprasensível, conjugando num todo
harmonioso as potências telúricas e cósmicas. Estes lugares se convertiam
em espaços sagrados ou "terras santas", onde se localizavam as cidades e se
erigiam os altares e os templos, orientados segundo determinados pontos
cardeais, especialmente o Leste e o Norte. Adicionaremos que os pontos
cardeais são regiões simbólicas onde residem entidades e atributos divinos
que consagram com suas influências a totalidade do mundo terrestre.

37 A ASTROLOGIA E AS DEIDADES
Para a Ciência Sagrada os planetas são os aspectos visíveis e os símbolos das
entidades numinosas ou deuses, os quais com seu hálito vital lhes animam e
dão movimento. Precisamente no esoterismo judaico-cristão e islâmico se
menciona aos anjos como os verdadeiros regentes das esferas planetárias.
Recordemos que os deuses planetários são ciclos cósmicos que englobam a
outros mais reduzidos como os do homem, aos quais selam com suas
influências. Assim, o que os relatos mitológicos, lendas e teogonias
expressam como lutas, oposições, coincidências e amores entre as diferentes
forças divinas, não são senão o alternar-se de uns ciclos em outros, que ao se
relacionarem com os ritmos zodiacais incidem de maneira notória no plano
horizontal do mundo terrestre, desdobrando-se no espetáculo multiforme da
vida. Igualmente, e desde o ponto de vista da Ciência Sagrada, estas
vinculações entre as deidades configuram um mistério (recordemos que a
palavra "mistério" tem a mesma raiz que a palavra "mito"), ou seja, revelam
um modo de ser arquetípico e uma determinada qualidade da alma universal,
e igualmente da humana.

Da união ou conjugação das energias de Vênus, deusa do amor e da


feminilidade transcendente, e de Marte, deus da guerra e da virilidade
espiritual, nasce uma filha que é chamada Harmonia pois, no dizer dos
filósofos antigos, quando os opostos se unem com a exata e devida
proporção, surge deles uma maravilhosa consonância que mantém num tenso
equilíbrio a ordem dos seres e das coisas. Ou, como diz Platão, a Harmonia
trata de atar e tecer juntos aos que por natureza são opostos e contrários. Do
casal de Zeus-Júpiter, deus do raio iluminador e onipotente pai dos deuses,
com Maya, que personifica a substância plástica e geradora do cosmos, nasce
Hermes-Mercúrio que, como sabemos, representa o númen que comunica o
celeste ao terrestre, o divino ao humano, e vice-versa. Por sua vez, Hermes-
Mercúrio, ao "copular" com Vênus, procria e gera ao Hermafrodita ou Rebis
alquímico que, como seu próprio nome indica, reúne a Sabedoria e o
Conhecimento teúrgico de Hermes com a Beleza e o Amor da filha do céu,
Afrodita, a Vênus Urania. É esta uma união que promove esse amor ao
Conhecimento tão necessário para a realização espiritual.

Quando Saturno-Cronos, o Rei da Idade de Ouro e Antigo Primordial, com a


sábia e profunda maturidade que o caracteriza, relaciona-se com o impulso e
a rapidez de inteligência do jovem Mercúrio, origina-se uma das
combinações mais celebradas pelos mestres herméticos do Renascimento,
que se sintetizou numa frase célebre: "Faz lentamente o urgente", aludindo
com isso à prudência que tem reger em todos os atos e pensamentos do
alquimista, do qual também se disse que é um puer senex, ou seja, um
"menino-velho".

As idéias, chegadas a seu ponto máximo de maturação, são liberadas graças


à intervenção do mistagogo1 e iniciador Mercúrio, pois através de seu
conduto se expressam ao exterior. O deus Zeus, tem uma direta influência
sobre suas filhas as Musas (nascidas de sua união com Mnemósine, a
Memória) relacionando-se freqüentemente com as demais deidades e com os
homens por intermédio delas. Cada deus possui sua Musa e cada Musa
inspira ao homem o conhecimento de uma ciência e de uma arte sagradas.
Deus do fogo e da luz sobrenatural, Apolo, que dirige seu coro, preside o rito
fundamental do sacrifício da alma humana, que é irresistivelmente
arrebatada a sua morada celeste quando "escuta" os maravilhosos acordes e
harmonias que extrai de sua divina lira, presente de Hermes, liberando-se
assim dos laços que a mantêm unida à sua condição terrestre.
fig. 12
1
N.T. Mistagogo - (Do lat. mystagōgus, e este do gr. μυσταγωγός): 1. m. Sacerdote da
gentilidade greco-romana, que iniciava nos mistérios. 2. m. p. us. Catequista que explicava
os mistérios sagrados, especialmente os Santos Sacramentos.

38 APRENDER A LER:
Uma das coisas mais importantes em nossas disciplinas é a de aprender
novamente a ler. Essa nova leitura dos textos, símbolo de outra apreciação
da vida e das coisas, inclui uma atitude diferente com respeito ao que se lê.
As leituras com as quais se nutre o neófito, textos teúrgicos e iniciáticos,
exigem uma adequação especial para que atuem verdadeiramente. Na
prática podemos distinguir uma leitura profana e superficial, de outra
profunda e sagrada. Estudar um texto não é só aprendê-lo de modo literal,
ou de "memória". Também não é passar sobre ele sem o compreender.
Singelamente se trata de apreender.

a) Estamos acostumados a "consumir" o que lemos. Devemos nos fixar


atenciosamente no que lemos. Têm-se de separar netamente os estudos
metafísicos (às vezes um pouco complicados ou fastidiosos) da simples
leitura à qual habitualmente estamos acostumados. Esta nova leitura que
lhe indicamos é também um rito, uma ruptura de nível e a criação de um
novo mundo de símbolos e conceitos com o conseqüente abandono do
espaço e do tempo de sua situação anterior. Tome-se o tempo necessário e
volte sobre o lido. Faça um esforço igualmente para gravar um arquivo de
imagens.

b) Acostume-se também a ler as entrelinhas. Recorde que cada texto tem


uns três, quando não quatro, níveis de leitura.

Movimento l: Deixe-se levar totalmente pela leitura até se introduzir no


mundo que se lhe oferece. Movimento de abertura. Dissolução-expansão.

Movimento 2: Medite sobre o lido. Extraia –ou trate de fazê-lo– o sentido


último do que se expressa. Movimento de coagulação-concentração.

Movimento 3: Estabeleça relações.


39 ACAPITE
V — O PAPA: Chamado também O
Hierofante ou Sumo Sacerdote, é o iniciador
nos Antigos Mistérios, guardião e
transmissor da Tradição Unânime. Com sua
mão direita realiza o sinal do Ensino, e com
a esquerda -coberta com uma luva- sustenta
um cetro que representa, junto com a coroa,
o poder espiritual. Encontra-se, como A
Sacerdotisa, sentado entre duas colunas, e
generosamente ministra a Doutrina a quem
tem ouvidos e olhos, guardando em segredo
elevados conhecimentos. Os personagens de
costas, em atitude receptiva, são o símbolo
da aprendizagem. O vermelho de seus
vestidos o relaciona com Marte, que neste
caso manifesta um profundo rigor
intelectual, necessário para que essa
Doutrina se mantenha intacta e a verdade
não seja deformada. Esta carta simboliza o
mestre interior, ou guia oculto, que nos
conduzirá nas distintas fases do processo
iniciático, de uma vez que é amigo,
conselheiro e confessor.

DIREITA INVERTIDA
Sacerdote - Mestre - Ensino Dogmatismo - Falsos profetas
Aprendizagem - Doutrina - Tradição Tergiversação - Falsificação
Autoridade moral e espiritual Equívoco - Enganos - Prejuízos
Paciência - Perseverança Impaciência - Fanatismo
Rigor - Retificação - Equanimi- Má informação - Rigidez
dade - Calma - Serenidade - Con- Liderança - Condicionamento
fiança - Generosidade - Cons- Mau conselheiro e intermediário
tância - Discrição - Bom sentido Insensibilidade - Competência

40 A BELEZA
Como o Amor –ao qual se encontra indissoluvelmente unida– a Beleza é um
nome ou atributo divino, conforme mostra e exemplifica a sefirah Tifereth,
também chamada Harmonia como sabemos. Devido a seu caráter universal,
a Beleza não é patrimônio de ninguém, e certamente escapa às classificações
da arte e do artista moderno, que só percebem dela o estético e superficial,
quando não simplesmente a negam, apostando pelo realmente grotesco e
confuso. A maioria dos que se autodenominam "artistas" esquecem que a
beleza é um permanente assombro que se acha implícito na textura mutável e
multifacetada da vida, e o que é mais importante, na essência e no próprio
ser das coisas e dos seres. Ela se identifica com o inapreensível, com o que
não pode ser medido nem computado, mas sim experimentado como um tipo
de emoção intelectiva e supra-racional, capaz de produzir aquela necessária
"ruptura de nível", que faça possível o contato direto com as realidades
espirituais que, ademais, toda a criação constantemente revela e sugere. Por
isso sempre foi considerada como uma energia intermediária entre o humano
e o divino, entre o horizontal e o vertical, tal como o símbolo, e como este é
um veículo que nos conduz ao Conhecimento.

União dos contrários aparentes, ou conjugação em uma só entidade do


sujeito que conhece e do objeto conhecido, a Beleza é o reflexo no cosmos
da Unidade Arquetípica que, germinando no coração do homem, leva-o ao
conhecimento de si mesmo e do mundo mediante o arrebatamento que
produz seu contato. Neste sentido, a Beleza participa tanto do êxtase
dionisíaco (relacionado com a atração e a vertigem para as energias telúricas
e terrestres) como do apolíneo, onde este êxtase se transforma em
contemplação para as formas puras. Este é o caso do Platão, para quem as
figuras do círculo e do quadrado proporcionavam a contemplação da Beleza
absoluta.

As artes sagradas e tradicionais aglutinam estas duas maneiras de conceber a


Beleza, que devido ao temperamento dos homens que as realizam podem
expressar uma ou outra forma, ou ambas de uma vez, pois na realidade são
complementares, como o são a Terra e o Céu. Por exemplo: um ícone cristão
e a voluptuosidade de formas de uma deusa pagã podem, no fundo, sugerir a
mesma idéia. Seja como for, intuir a verdadeira Beleza, e ser uno com ela,
pode acontecer em qualquer momento, não importa a causa, pois então já
não seremos os mesmos, com nossos falsos complexos e prejulgamentos,
senão que nos terá dado a graça de participar do rito de uma dança total, da
qual nada, nem ninguém, fica excluído.

41 GEOGRAFIA SAGRADA
Toda Terra Santa, ou Sagrada, própria a cada tradição, é o símbolo da Terra
Arquetípica, que se manifestou visivelmente ao começo do atual ciclo
terrestre e humano. Esta foi a residência do Centro Supremo ou Grande
Tradição Primitiva, a qual teve que se ocultar e se fazer invisível (passando a
outro plano) quando as condições nas que era possível sua existência se
tornaram difíceis. Geograficamente, o Centro Supremo esteve situado
aproximadamente no que hoje é o Pólo Norte, que os gregos denominaram a
Hiperbórea, e que naqueles primeiros tempos conservava condições
climáticas mais benignas que na atualidade: uma "primavera perpétua" como
assinalam algumas tradições. Isto se deveria, como já se disse antes, ao feito
de que o eixo terrestre não estava inclinado com relação ao eixo celeste,
acontecendo que não existissem a sucessão das estações.

É de notar, além disso –e para se perceberem as analogias que existem entre


a ordem física e a espiritual–, que o Pólo Norte representa a região que é
tomada como referência orientadora vertical de qualquer lugar da superfície
terrestre (embora isto seja hoje assim pela globalização cultural e pela
representação da Terra como esfera); o extremo Norte é também o extremo
superior do eixo vertical que atravessa a Terra, e portanto o centro ao redor
do qual se cumpre a rotação desta, sendo o único lugar (junto com o Pólo
Sul) que permanece estável e sem girar em dita rotação. Neste sentido, é
perfeitamente normal que fosse a região polar a primeira em albergar a
Tradição Primitiva, pois esta é também a origem e o centro doutrinal
invariável de todas as demais através dos tempos; seu permanente ponto de
referência axial. Seu recolhimento e ocultação supôs o surgimento das
diferentes formas tradicionais e o estabelecimento dos respectivos centros
geográficos sagrados, que eram, e seguem sendo, os reflexos do primeiro
(ver "A Montanha e a Caverna", Módulo I - N.º 70). São os casos de
Jerusalém para o judaico-cristianismo, de Meca para o Islã, Delfos para a
Grécia clássica, Roma para as tradições itálicas e ainda para o Catolicismo
atual, Tebas para o antigo o Egito, Babilônia para as culturas
mesopotâmicas, a mítica Aztlán (Atlântida) para as culturas centro-
americanas, Cristianópolis ou a "Cidadela Solar" para o Hermetismo Rosa-
Cruz, etc. O nome originário do Centro Supremo foi o de Tula, ou Thule, a
"Balança", ou também Síria, a "Terra do Sol", expressão que indica uma
transposição celeste e luminosa do espaço geográfico. Tula designa a
constelação da Ursa Maior que com suas sete estrelas –número de perfeição–
assemelha-se a uma arca girando em volta da estrela Polar, morada
simbólica da Grande Unidade ou Arquiteto do Universo. A estrela Polar é o
Topo, o Zênite da Montanha Cósmica, Árvore ou Eixo do Mundo, de onde
partem, segundo as direções do espaço, os quatro rios sagrados portadores da
Água de Vida Celeste.

42 NOTA:
Em diversas tradições, o Paraíso é representado pelo coração, que é o
centro do estado humano, equivalente ao "Coração do Mundo", ao "Santo
Palácio" interno, ou a Brahma-Pura (a "Cidade de Brahma"). Por isso há
que se entender a existência de uma analogia entre a Geografia mítica ou
sagrada e o próprio espaço interior ou espiritual do homem. Nesse espaço
também se encontram comarcas e regiões que são apenas estados de
consciência que o ser vai reconhecendo nas diferentes etapas ou graus de
sua evolução espiritual. "O Reino de Deus está dentro de vós", diz o
Evangelho; e o lamaísmo budista: “Shambala (a Comarca Suprema ou
Paraíso) está em nosso coração". À luz dessas concepções, o espaço
geográfico se transforma em seu arquétipo celeste, onde se vislumbra o
atemporal. A beleza do mundo, de Malkhuth, é o reflexo da Beleza, de
Tifereth. As visões enlevadas de certos místicos descrevem uma geografia
situada em outro plano da realidade, onde se produzem as teofanias e se
revelam as entidades angélicas e divinas. É a "Terra dos Bem-aventurados",
dos "Viventes", dos "Antepassados Imortais", à qual, entretanto, "não se
pode chegar nem com naves nem carros, a não ser somente pelo vôo do
espírito". A este respeito nos dizem os mestres herméticos: "O Paraíso está
ainda nesta terra, mas o homem está longe dele até que não se regenere".
Agartha é a gruta que se oculta na montanha, localizada-se no mesmo eixo
que a sumidade, como a cripta no templo.

43 VISÃO
A prática da Geometria e da Meditação são métodos de purificação do "olho
da alma", que cultivam a capacidade da Visão ou faculdade de contemplar a
Verdade: faculdade chamada também Inteligência do coração, a única que
pode unir o mundo manifestado com sua Origem.

Esta visão difere muito da capacidade visual que ordinariamente usamos e


requer uma penetração da realidade, em mais de um sentido. A vista e o
ouvido, embora relacionados em suas funções, operam de modos muito
diferentes: a inteligência óptica, para pensar, cria uma imagem em nossa
mente, é indireta, analítica e seqüencial, enquanto que a auditiva é direta,
sem imagem, e evoca uma resposta imediata. É ela a que percebe padrões de
relação e configurações no espaço. É, desta forma, ela a que se associa com
o hemisfério direito do cérebro, enquanto que a vista, de caráter temporário,
associa-se com o esquerdo, que mede e analisa de maneira racional, para
empregar uma descrição simbólica. É este "modo direito", ou "maneira reta",
o que permite penetrar no aspecto esotérico do símbolo, e compreender seu
sentido, porque pode perceber opostos em simultaneidade.

Quando a capacidade auditiva e a visual estão "centradas", "escutam-se


cores" ou "vêem-se músicas". Por meio da Geometria, os pitagóricos
conjugavam e equilibravam os opostos perenes e uma vibração escutada
chegava a converter-se em forma visível e igualmente um ritmo visual se
expressava em harmonias audíveis.

44 TARÔ
VI — O ENAMORADO: Aqui se acha
um homem entre duas possibilidades, em
atitude de escolher livremente uma
delas. Uma mulher, que sinaliza as
partes exteriores dele, exerce atração
sobre ele para a corrente do mundo
profano, do materialismo e do engano
dos sentidos, oferecendo-lhe um amor
vulgar, não transcendente. A outra
sinaliza seu coração, atraindo-o para os
sentimentos mais nobres do amor
espiritual e simbolizando a verdade. O
cupido, a cujas costas brilha um sol
radiante, aponta com sua flecha à
segunda, embora o indivíduo se encontre
aqui em liberdade de escolher qualquer
opção, pondo seu coração onde esteja
seu verdadeiro tesouro. Também pode
simbolizar um casal ou um noivado. A
carta invertida denota os dilemas,
dúvidas e vacilações aos quais nos
submetem as tentações do mundo
profano. Mas quando está direita, insta-
nos a melhor decidir.

DIREITA INVERTIDA
Determinação - Livre eleição Vacilação - Dúvida - Dilemas
Amor - Vontade Eleição errônea - Indeterminação
Livre-arbítrio - Decisão Engano - Covardia - Risco
Auto-determinação Caminho equivocado
Movimento da vontade Medo - Indecisão
Heroísmo - Firmeza Indeterminação - Intrigas
Chamados - Nobre paixão Paixões - Sofrimento
Afetos - Sentimentos - Casal Traição - Perda de energia
União do casal - Noivado Impossibilidade - Crise afetiva

45 A ANALOGIA
No Módulo I, título N.º 24, dedicado à analogia, referíamos-nos à inversão
de duas ordens simbolizada pelo Selo de Salomão. Só adicionaremos que o
único aparece misteriosamente como múltiplo, assim que se reflete no
prisma da manifestação, e até muito mais quando o faz nas modalidades do
individual. Por isso as conhecidas reservas da Tradição a este respeito, ao
reiterar o caráter ilusório e relativo das aparências, que sendo imagens
reflexas e invertidas da realidade, são tomadas infelizmente por ela mesma.
Confundimos o símbolo com o simbolizado. A mesma proposição
hermética: "o que é acima é abaixo", exige uma interpretação correta das
correspondências, já que o de "cima" se acha simbolicamente expresso pelo
de “baixo”, mas em sentido inverso. "Os últimos serão os primeiros e os
primeiros serão os últimos". O pecado, o engano e seu comum denominador,
a ignorância, são apenas a idolatria do irreal e ilusório. Um puro absurdo que
deixa de sê-lo na medida em que o ser toma consciência efetiva do
verdadeiramente real e eterno.

O veículo por excelência do pensamento é o símbolo, e a essência deste a


analogia. Efetivamente, a analogia não é uma mera associação de conceitos
mentais, assim como o símbolo não é tampouco uma "definição", já que
como tais não escapariam então às limitações racionais e morais humanas. A
própria presença inteligível da Idéia evoca e sugere indefinidos aspectos de
si mesmo, despertando sempre novas e distintas perspectivas da realidade,
engastadas permanentemente em sua síntese sagrada. Como instrumentos de
aplicação, tal qual os números e as letras, símbolo e analogia permitem
articular por meio de relações de semelhança, feitos ou realidades que a
primeira vista nada têm em comum, a não ser sua própria contingência. A
relação necessária de continuidade entre o todo e a parte, entre Deus e o
mundo, e vice-versa, é por certo o número de ouro da Criação. Um arcano
intuído sempre, que a Tradição revela. É a lógica verdadeira que como
"graça divina" opera além da lógica convencional ou formal. Esta
permanente ligação que une os mundos, seja de maneira visível ou invisível,
permite a possibilidade perpétua do "despertar", de uma volta ao sentido
universal da existência, operativamente uma saída do tempo-espaço
ordinário e amorfo, e uma entrada no "extraordinário" e sagrado. A função
dos ritos não tem outro fim que dinamizar e atualizar esta possibilidade
sempre latente. A ela se vincula especialmente a intuição intelectual e o Eros
ou Amor divino, não a "razão" propriamente dita, analítica e discriminativa
por natureza.

46 O ARTISTA
A tarefa do artista é a de mediador entre a essência do símbolo (ou Verbo) e
sua manifestação no mundo temporário (obra do Verbo Criador). Dentre
todas as criaturas, só ao homem é dado o tomar consciência deste papel e,
através dele, é o Universo que se faz consciente de si mesmo. O propósito da
educação tradicional consiste em levar a cabo esta tomada de consciência,
despertando as capacidades latentes que todo homem leva ocultas, sendo esta
a função que cumpre o grêmio dos artistas, dirigido por um mestre que
conhece os princípios que governam a Arte.

O processo de aprendizagem é hierárquico e provê o artista da linguagem


simbólica. Inclui as ciências e as artes sagradas; trata-se da Alquimia do
próprio ser e de um verdadeiro caminho de Iniciação. O apoio simbólico
prepara o caminho do processo criativo através de rituais prescritos. A
beleza do símbolo consiste em revelar o "Tesouro", sem cuja mediação não
se poderia conhecer jamais. O rito tem sua base na cosmogonia e é o símbolo
em movimento. O mito vive em um Tempo de ação ritual perene. O
propósito destes rituais é o de criar um estado de consciência que permita ao
artista mover-se no espaço interno da alma. Uma parte essencial deste estado
meditativo é obter que a harmonia dos ciclos vitais penetre na existência
inteira experimentando os ritmos da natureza, sua solidão e serenidade.

É por meio da contemplação que se pode acessar o espaço interno do


coração, onde tem lugar, para o artista, a única experiência de realidade. É
então que pode expressar: "na verdade, tanto quanto é extenso o espaço,
também o é o vazio que há no interior do coração". Chegou à fonte e
contemplou, face a face, a realidade, contemplou-se a si mesmo. Já não
existe o tempo; vidente e visão são um. Todo o universo concentrou seus
raios em um ponto cuja incandescência voltou ao Si-Mesmo.

Sons, formas, linhas, cores e materiais serão os meios para a alma desperta
que busca expressar-se em sua descida pelo arco do ciclo criativo,
devolvendo a forma visível, audível ou tangível ao vivido. Passivo com
relação ao Princípio do qual é servidor, e ativo com respeito a sua Arte, o
artista cria uma relação harmoniosa entre o universal, que anima sua obra, e
a particular maneira de dar forma a sua criação. A obra será a amostra da
perfeição alcançada pelo artista e, na medida em que esteja conforme com a
Origem, poderá lhe chamar original. Originalidade compreendida no amplo
sentido da palavra: a realização de uma concepção original e não só a
transitória originalidade individual.

"Esta parte terrestre do mundo é mantida pelo conhecimento e pela prática


de Artes e Ciências, das quais não quis Deus que se privasse o mundo para
ser perfeito (...) E acertadamente a divindade suprema enviou aqui para
baixo, entre os homens, o coro das Musas, para que o mundo terrestre não
parecesse muito selvagem, privado da doçura da música, mas, pelo contrário,
para que os homens oferecessem seus louvores mediante cantos inspirados
pelas Musas àquele que só o é Tudo e pai de todos e, assim, aos louvores
celestiais respondesse sempre, também sobre a terra, uma suave harmonia.
Certos homens, poucos em número, dotados de uma alma pura, receberam
em participação a augusta função de elevar seus olhares para o céu" (Corpus
Hermeticum, Asclépio 8-9).

47 NÃO É POR MUITO MADRUGAR…


Um dos temas nos quais se faz insistência no percurso iniciático é o dos
inimigos ocultos, ou seja, naqueles que não são evidentes para o aprendiz,
ou que se disfarçam aparentando virtudes quando não são mais do que
formas do homem velho, e graves inimigos no caminho do Conhecimento.
Muitas vezes, soem se apresentar com a roupagem da moral e do
oficialmente admitido como virtuoso e até "religioso", ao que
graciosamente denominam "tradicionalismo". Outra das desagradáveis
maneiras em que soem se apresentar estes demônios, diretamente associada
com a que acabamos de mencionar, é o fato de supor uma virtude o
despertar cedo pelas manhãs, especialmente nas grandes urbes, onde o
corpo perdeu toda conexão com os ritmos da natureza. Este fato
completamente normal é tomado por indivíduos simplórios como uma
grande coisa, exemplo digno de ser emulado, embora deva se impor pela
força, como no caso dos internatos, cárceres e quartéis. Embora não se leve
em conta que este “'madrugadores” se levantam para jogar lenha ao fogo
da máquina da sociedade moderna que nos está devorando, que eles
criaram e alimentam constantemente com sua diligência.

O adagiário cunhou duas sentenças muito conhecidas com relação a este


fato. A primeira diz "Deus ajuda a quem cedo madruga". Isso pode ser
entendido como uma piada de humor negro, quando se pensa que os
homens de hoje em dia, direta ou indiretamente, despertam dispostos a
trair, mentir, murmurar, caluniar, roubar, destruir, etc., com o beneplácito
e o patrocínio das entidades oficiais em meio da aprovação geral.

O segundo refrão deu título a esta nota e diz: "Não é por muito madrugar
que amanhece mais cedo". Nele se adverte o oposto ao anterior, ainda que
se o note muito mais elaborado, já que nega de fato a simplória crença
literal que o primeiro sustenta, e aparece como uma clara sentença a um
dos enganos (pecados) maiores e difundidos dos contemporâneos: o de que
através das ações dos homens vai poder se obter o que sempre foi chamado,
inversamente, a Graça de Deus.

"O espírito sopra onde quer" pode ler-se no texto sagrado. Sim, onde quer o
espírito e não onde determinam os homens, ou em qualquer lado, por azar,
como poderia compreender um literal, ou um “justo” muito madrugador.
Um provérbio chinês diz: "Ao abusar da eficácia se produzem violências".
48 TARÔ
VII — A CARRUAGEM: Nesta carta
vemos um cocheiro conduzindo seu
veículo para uma meta prefixada. A livre
decisão que estava implícita na carta
anterior, foi já tomada, e o Iniciado se
encontra aqui em atitude de triunfo e de
vitória, ganhando a guerra entre os
contrários. Os cavalos e as rodas,
parecem dirigir-se para lugares opostos;
mas o chofer real, sem necessidade de
rédeas, leva-os pelo meio, superando os
obstáculos do caminho, unindo as
contradições e conjugando as oposições.
Nos galões se vêem duas máscaras, uma
que chora e outra que ri, representando a
tragédia e a comédia. A carta nos dá a
idéia de viagem, relacionada com a
primeira fase do processo iniciático; trata-
se das primeiras viagens que nos
prepararão para as viagens maiores, logo
depois das quais o movimento cessará e
se atracará à região do repouso. Não
confundir o veículo com a meta.

DIREITA INVERTIDA
Direção - Movimento Ausência de direção - Pressa
Superação de contradições Viagem adiada - Imobilidade
Triunfo - Vitória - Obtenção de Retrocesso - Derrota - Pesar
Êxito - Manejo de opostos Veículo ou caminho equivocado
Viagem - Mudança - Nova vida Ausência de escrúpulos - Fracas-
Superação de obstáculos so - Perda de controle - Estanca-
Objetividade - Reestruturação mento - Impossibilidade de chegar
Bom veículo ou Ruptura - Insatisfação
caminho Desespero

49 HISTÓRIA SAGRADA
A História se articula como uma série de acontecimentos no tempo onde se
projetam, tal como na Geografia, as energias e potências verticais. Assim
entendida, a História está balizada de feitos significativos que supõem uma
ruptura do nível temporal, ordinário e profano, que nada tem que ver com as
crônicas e estatísticas, às quais estão acostumados nossos contemporâneos,
que só são capazes de se fixarem em determinadas anedotas devidamente
documentadas (sempre com um propósito interessado, em particular no
político, econômico, racial ou religioso). Como o espaço, o tempo não é
homogêneo, mas tem cisões e fissuras por onde se revela o supra-histórico.
Por outro lado, o centro sagrado geográfico e espacial, simbolizado pela
Terra Sagrada, –e dentro de cada qual por seu próprio coração– é também o
centro do tempo, do atemporal, onde se faz efetiva a comunicação com os
estados superiores.

É o mito o que faz significativa a história de um povo; a criação de uma


cultura ou civilização tradicional sempre parte de um acontecimento mítico e
supra-humano, no qual uma entidade espiritual se manifesta (quase sempre
Através de intermediários simbólicos, sejam animais, vegetais, minerais, ou
graças a determinados personagens humanos, como estamos vendo nos
títulos sobre Biografias), dando origem ao desenvolvimento dessa
civilização. Como no caso de que se tratasse de um sutil cordão umbilical,
esta vinculação íntima, que mantém uma cultura com o invisível e
atemporal, é o que possibilita a regeneração periódica e cíclica dos homens
que a integram. A verdadeira história de um povo, ou de um homem, reside
em sua capacidade de compreender e sentir em toda sua plenitude a presença
do sagrado, de estar reintegrado nisso, como uma unidade indissolúvel
entretecida de múltiplas relações e da qual depende toda sua vida. Por isso
existiram culturas que não tiveram história, tal como a entendemos hoje em
dia, porque para estas o único válido, o único real, é o que não está sujeito às
leis implacáveis do devir. Estas servem, em todo caso, como suporte
horizontal onde se cumpre o destino histórico dessas culturas e civilizações.
Mas para que este destino tenha sentido, devem depender inteiramente da
ordem que expressam as leis universais, que são invariáveis e eternas.

50 A TRADIÇÃO
A multiplicidade das tradições é uma forma evolutiva que reveste aquela
Tradição Única das origens, no processo cíclico de queda através das idades
históricas. E assim como na Árvore Sefirótica quatro planos
progressivamente densos separam à Primeira Deidade do Reino deste
Mundo, assim também no tempo as quatro idades –do ouro, da prata, do
bronze e do ferro– marcam a progressiva ocultação daquela Tradição
Primitiva sob o disfarce de tradições diversas e cada vez, na aparência, mais
distintas, até o ponto de chegar a admitir contradições entre elas no plano de
sua literalidade, que é o único que está ao alcance da generalidade dos
homens na atual idade obscura. A isso se refere o mito bíblico da Torre de
Babel, relativo ao momento em que o gênero humano começa a se interessar
pelo desenvolvimento da civilização –as artes, os ofícios e as grandes
empresas técnicas– e é "castigado" com a confusão das línguas.

Efetivamente, toda solidificação ou materialização implica multiplicação e


divergência. Mas a multiplicidade de tradições é só aparente, e pertence ao
plano ilusório que o budismo denomina Samsara, e o hinduísmo identifica
com o Véu de Maia. A variedade de tradições pertence ao círculo exterior do
símbolo da Roda. Elas são os raios que conduzem ao Cubo ou Centro, onde
está se localizada a Tradição Unânime, da qual não deixaram de ser
testemunhas os sábios e iniciados de todo tempo e lugar.

A Tradição (do latim tradere, transmitir) é a transmissão do conhecimento,


entendido este em seus princípios imutáveis e universais, embora também
em suas aplicações a todas as esferas da vida. Por isso a distinção entre
esoterismo e exoterismo, que de um modo ou outro se dá no seio de todas as
tradições. O último é o que se ocupa de organizar moralmente as sociedades
humanas (pois como afirma Platão, e Face à visão moderna, moral e política
são a mesma coisa). O primeiro mantém viva a chama da Verdade última,
mediante a cadeia iniciática ininterrupta (que o sufismo chama silsilah) para
aqueles que são capazes de acessar à realização espiritual propriamente dita.

Há portanto uma hierarquia entre caminhos funções da Tradição: as formas


externas ou esotéricas degeneram e se extinguem quando perdem contato
com seu núcleo esotérico. Equivalha como exemplo o ocorrido com o
cristianismo a partir do século XIII: a desvinculação do papado e da
hierarquia eclesiástica com respeito às organizações iniciáticas deixou à
cristandade indefesa ante o assalto do pensamento profano e "científico", que
tentou nestes últimos séculos corrigir e "melhorar" de fora uma doutrina
tradicional efetivamente castrada de suas bases intelectuais, bases que não
pertencem à organização exotérica e que são patrimônio do saber iniciático.
Daí a contradição atual do Ocidente, dividido entre um "cristianismo
insuficiente" e um saber "científico" que pretende completá-lo, mas que
troca –como todo o profano– suas "verdades" ao som da moda.

51 GEOGRAFIA SAGRADA
Já dissemos que a geografia (grafia da terra) concebida como espaço mítico
destinado a ser reflexo da ordem celeste, é comum a todas a culturas
tradicionais. Queremos recordar que esse espaço mítico é o Centro do
mundo, onde o tempo (a história) também se contempla como não-sucessivo,
sendo sempre novo e a regeneração uma realidade permanente, ao não perder
a capacidade de assombro sua virgindade original. Na verdade a geografia
sagrada é invisível, pois existe a "idéia" de uma terra ilimitada e primitiva,
de uma "Terra Pura" ou de um Jardim edênico, que não esgota suas
possibilidades generativas ao estar unida e fecundada pelo Espírito. A
geografia é então um estado da alma (de se viver a própria existência
inserida no universal), que, efetivamente, pode ser manifestada
simbolicamente numa paisagem, no topo de uma montanha, no vazio de uma
caverna, ou em qualquer topografia significativa. Os templos e cidades se
erigiam nesses lugares, e sua construção se realizava segundo leis precisas
derivadas de uma ciência sacerdotal, revelada pelos deuses.

52 NOTA
Esperamos que à medida que foi avançando no curso dos ensinos e
exercícios contidos neste manual, ao qual se deve repassar freqüentemente,
você possa ter agora novos pontos de partida para a investigação, ao
mesmo tempo que a leitura destes textos lhe possa resultar muito mais
sugestiva, e talvez reveladora. De toda maneira, são os preâmbulos de nosso
trabalho integral, ao qual se deve dedicar igual firmeza e ardor que até o
momento. Você avançou um passo, embora não saiba de tudo. Acaso tenha
se feito evidente, redobre seus esforços, pois está fazendo algo por você
mesmo e sua superação, e sempre esta dedicação é recompensada de uma
ou outra maneira.

Pode ser que por falta de tempo, ou por outras razões muito específicas, o
leitor não tenha efetuado todas as práticas e exercícios que demos e
seguiremos dando. Nesse caso lhe sugerimos que vá anotando em uma ficha
aqueles que não realizou, e os ordene por temas. Certamente chegará o
momento em que possa efetuá-los e, então, você poderá praticá-los de forma
ordenada. Trate de não omitir nada do que Agartha lhe oferece e deixe que
o Ensino penetre completamente em você. Posteriormente, e de forma
natural, ir-se-ão selecionando em nós os caminhos particulares e os tipos de
temas de nossa inclinação, que deste modo podem se desenvolver em um
leque de possibilidades.

Se algum ponto doutrinal lhe resultar ainda obscuro ou dificultoso,


igualmente a certos exercícios, sugere-se passar adiante, sempre que se
tenham efetuado certos esforços para superar a situação. Chegará o
momento de se repassar estas lições, e então descobrirá que essas
dificuldades foram se resolvendo, ou já não existem. Passado um tempo, o
voltar para material de Agartha, desde o início, é extremamente proveitoso.
Por outra parte, a leitura destes textos pode lhe aparecer nesse momento
como nova, ou pode-se encontrar nela alguns pontos, ou temas, em que não
havia reparado.

53 TARÔ
VIII — A JUSTIÇA: Aqui nos mostra
uma mulher sentada, que sustenta uma
espada com sua mão direita e uma balança
com a esquerda. Embora esteja
acostumado a se representar à justiça com
os olhos vendados, dando a entender que a
lei se aplica por igual a todos os homens,
sem restrições de nenhuma classe, aqui a
vemos com os olhos muito abertos,
indicando a objetividade com a qual emite
seus julgamentos. A espada se acha em
posição vertical, ascendente, pronta para
penetrar as aparências das coisas e atracar
aos estados superiores do ser; e a balança
está sustentada pelo eixo ou fiel, símbolo
do equilíbrio e da harmonia que se obtêm
quando se encontra o justo meio. Os
significados favoráveis desta carta estão
relacionados com as virtudes de um
verdadeiro juiz, objetivo, neutro e
desapaixonado; quando está ao contrário,
fala de seus vícios e em geral nos mostra
os desequilíbrios.

DIREITA INVERTIDA
Lei - Ordem - Objetividade Injustiça - Parcialidade
Imparcialidade - Regularidade Desequilíbrio - Aburguesa-
Justiça - Harmonia - Consciência mento - Desordem - Violência
Integridade - Equilíbrio Pleitos - Discussões
Rigor - Organização Arbitrariedade
Economia - Administração Ladrões - Corrupção
Desapaixonamento Bandidos - Esbanjamento
Bom critério Problemas econômicos
Neutralidade Falta de administração

54 ASTROLOGIA
Freqüentemente se confunde hoje em dia a Ciência da Astrologia com a
simples confecção de horóscopos, que sempre foi considerada pela Tradição
como secundária, derivada e contingente. Isto não quer dizer que careça de
interesse conhecer as influências planetárias que regem o dia e a hora de
nosso nascimento, cuja investigação pode se realizar como prática para nos
familiarizarmos com esta disciplina; mas é importante não perder de vista
que o fundamental é conhecer os princípios e as normas que governam o céu,
os quais se vêem também refletidos na ordem natural da terra. Não devemos
esquecer que é graças aos astros que temos a possibilidade de compreender
as leis que regulam o tempo e o espaço. Por um lado, é o lugar de saída do
Sol e dos planetas que nos permite ter uma orientação espacial,
conseqüentemente são também as esferas celestes que nos fazem ter a
concepção de dia e noite, semana, mês ou ano, ou seja, da durabilidade do
tempo.

Sempre partindo de um ponto de vista geocêntrico, e até mais, tomando ao


observador –o homem– como o ponto central e imóvel a partir do qual
fazemos nossos cálculos, o símbolo do zodíaco nos ensina a realizar a
divisão "espacial" do tempo, quando nos mostra ao norte no Solstício de
Inverno (Capricórnio), ao sul no de Verão (Câncer), a Leste no Equinócio da
Primavera (Áries) e a oeste no de Outono (Libra). Estes quatro pontos ou
signos cardeais estão em relação simbólica com a divisão quaternária do dia,
do mês e do ano, com as quatro etapas da vida do homem e das civilizações,
e com as quatro idades da humanidade (de Ouro, Prata, Bronze e Ferro),
dando-nos portanto a possibilidade de estabelecer relações e analogias entre
os ciclos naturais, históricos e cósmicos.

A Roda do Zodíaco realiza na aparência um percurso completo de 360° cada


dia, ou período de 24 horas que demora a terra em girar ao redor de seu
próprio eixo; o Sol, por sua parte, faz uma viagem ao redor dos 12 signos
durante o ano, marcando as quatro estações que regem as leis da agricultura
e da vida do homem. Mas os antigos também observaram graças aos
planetas, a possibilidade de entender outras dimensões temporais, o que os
levou a conhecer as Eras cósmicas ou "tempo dos deuses". Um exemplo
disto o constitui o período de 25.920 anos, conhecido por todos os povos e
explicado tanto pelos hindus como pelos pitagóricos e Platão, configurando
o ciclo chamado pela Astronomia de precessão dos equinócios, que sempre
se viu em relação com os períodos históricos da humanidade. Tomando
como ponto de referência o Equinócio da Primavera, o Sol percorre durante
esse lapso (de 25.920 anos, chamado "o grande dia de Brahma" pela tradição
hindu) os 12 signos zodiacais, em um movimento circular invertido ao dos
ciclos anual e diário, demorando 2.160 anos em cada um deles. As culturas
deixaram claras amostras do conhecimento desse ciclo, e a Era de Touro foi
simbolizada pelos egípcios (o boi Apis) e cretenses, assim como a de Áries
(o Cordeiro) foi anunciada por Moisés ao povo judeu, e a de Peixes (os
Peixes) pelo cristianismo que se identificou com esse signo. Sabemos graças
aos conhecimentos que nos lega a Tradição, que estamos vivendo atualmente
o ponto de transição entre o Peixes e Aquário, o qual indica claramente que
nos encontramos no fim de um período cósmico, e que se aproxima a Idade
de Ouro ou reino de Saturno (planeta que rege para a Antigüidade Aquário e
Capricórnio).
fig. 13

55 O SIMBOLISMO DA ESPADA
Mais que nenhuma outra arma, possivelmente seja a espada a que melhor
serve para representar a luta que qualquer aspirante ao Conhecimento tem
que empreender em um determinado momento de seu processo contra
aqueles que constituem seus autênticos inimigos: os que leva em si mesmo.
Dito combate é a "grande guerra Santa" da que fala o profeta Mahoma
quando em uma de suas sentenças diz: "voltamos da pequena guerra Santa à
grande guerra Santa", indicando assim que a primeira não é mais que uma
representação exterior ou um símbolo da segunda. Não terá que esquecer,
neste sentido, que a espada é o principal atributo do deus Marte, o númen
que infunde o espírito guerreiro no homem, dotando-lhe, ao mesmo tempo,
do rigor necessário para que saiba distinguir o engano da verdade e negar a
negação. De fato, quase todos os heróis e deuses solares e civilizadores
vencem as potências das trevas e do caos (representadas em todos os mitos
pelas entidades ctônicas e telúricas como os Titãs, os dragões ou as
serpentes) ajudados com espadas, ou com qualquer outra arma semelhante,
como a lança, as flechas, o machado simples ou de duplo fio. Neste sentido,
todas estas são armas que tradicionalmente se associaram ao raio e à
luminosidade fulgurante do relâmpago, ou seja, que têm uma conexão direta
com o simbolismo da luz, entendida como uma energia essencialmente
fecundante, ao mesmo tempo que destruidora de tudo o que se opõe ao
superior, isto é, a escuridão tenebrosa e a ignorância. Com esse espírito
combate o herói germânico Sigfried, ou o cavaleiro cristão São Jorge,
reflexo humano de São Miguel arcanjo, o chefe das tropas celestes.

Todos eles constituem os modelos exemplares desse combate interior, o


mesmo que é sugerido por Cristo (que é a "luz verdadeira que, vindo a este
mundo, ilumina a todo homem", conforme se lê no Evangelho de João)
quando, ao expulsar aos mercadores que profanam o Templo de Jerusalém,
adverte-lhes que não veio “trazer a paz, mas espada ". E essa espada que ele
traz não é mais que o poder de sua Palavra ou Verbo, da qual emanam a
Verdade e a Justiça (ver Apocalipse I, 16), e ante as quais nada pode a
escuridão da ignorância, representada por esses mercados que comercializam
com o mais sagrado. Estes seriam os verdadeiros inimigos –egos– ocultos
(que em ocasiões aparecem em forma de personagens externos), aqueles que
nos mantêm sujeitos aos estados mais inferiores, e de quem nos haveremos
de liberar ou "desligar" para aceder à verdadeira Vida prometida pela
Iniciação e pelo Ensino. A eles, terá que vencê-los, pois, com a força que
outorga o Conhecimento, isto é, no plano das Idéias, pois na medida em que
entreguemos a elas é que os poderemos reconhecer e identificar e, portanto,
expulsar do Templo que edificamos no interior de nosso coração.

A este respeito, mencionaremos que a espada, tal como a lança, é um


símbolo complementar da taça, como é o caso da lenda do Santo Graal, e
sendo esta, como o próprio Graal, um símbolo da Doutrina e do
Conhecimento, a espada o é da via que deve se seguir para alcançá-lo, quer
dizer, aquilo que nos ordena a inteligência e a conduta, fazendo possível que
tomemos verdadeira consciência de nosso eixo interno, e com ele da "Via do
Meio" que assinala a direção vertical para a qual temos que tender
permanentemente. De fato, a espada (como as diversas armas mencionadas
anteriormente) foi considerada por todas as tradições como um símbolo do
Eixo do Mundo, idéia que está presente quando a espada toma o lugar do fiel
da balança, símbolo universal da Justiça e do equilíbrio cósmico, isto é da
harmonia entendida como manifestação da paz. Esta significação "axial" da
espada não terá que perdê-la nunca de vista, pois é a que lhe dá seu sentido
mais profundo, já que dita paz, nascida da conciliação dos opostos, não só se
expressa na ordem externa e social, mas também, e especialmente, no
interno e no espiritual, que é, no fim e ao cabo, o objetivo que persegue a
"grande guerra Santa".

56 NÃO É POR MUITO MADRUGAR…


Um dos temas nos quais se faz insistência no percurso iniciático é o dos
inimigos ocultos, ou seja, naqueles que não são evidentes para o aprendiz,
ou que se disfarçam aparentando virtudes quando não são mais do que
formas do homem velho, e graves inimigos no caminho do Conhecimento.
Muitas vezes, soem se apresentar com a roupagem da moral e do
oficialmente admitido como virtuoso e até "religioso", ao que
graciosamente denominam "tradicionalismo". Outra das desagradáveis
maneiras em que soem se apresentar estes demônios, diretamente associada
com a que acabamos de mencionar, é o fato de supor uma virtude o
despertar cedo pelas manhãs, especialmente nas grandes urbes, onde o
corpo perdeu toda conexão com os ritmos da natureza. Este fato
completamente normal é tomado por indivíduos simplórios como uma
grande coisa, exemplo digno de ser emulado, embora deva se impor pela
força, como no caso dos internatos, cárceres e quartéis. Embora não se leve
em conta que este “'madrugadores” se levantam para jogar lenha ao fogo
da máquina da sociedade moderna que nos está devorando, que eles
criaram e alimentam constantemente com sua diligência.

O adagiário cunhou duas sentenças muito conhecidas com relação a este


fato. A primeira diz "Deus ajuda a quem cedo madruga". Isso pode ser
entendido como uma piada de humor negro, quando se pensa que os
homens de hoje em dia, direta ou indiretamente, despertam dispostos a
trair, mentir, murmurar, caluniar, roubar, destruir, etc., com o beneplácito
e o patrocínio das entidades oficiais em meio da aprovação geral.

O segundo refrão deu título a esta nota e diz: "Não é por muito madrugar
que amanhece mais cedo". Nele se adverte o oposto ao anterior, ainda que
se o note muito mais elaborado, já que nega de fato a simplória crença
literal que o primeiro sustenta, e aparece como uma clara sentença a um
dos enganos (pecados) maiores e difundidos dos contemporâneos: o de que
através das ações dos homens vai poder se obter o que sempre foi chamado,
inversamente, a Graça de Deus.

"O espírito sopra onde quer" pode ler-se no texto sagrado. Sim, onde quer o
espírito e não onde determinam os homens, ou em qualquer lado, por azar,
como poderia compreender um literal, ou um “justo” muito madrugador.
Um provérbio chinês diz: "Ao abusar da eficácia se produzem violências".
56 TARÔ
VIIII — O ERMITÃO: A carta novena é
solitária e melancólica. O antigo Saturno
se apresenta aqui como um ancião sábio, o
Pai e Mestre interno, conhecedor dos
aspectos mais ocultos. Vê-se um homem
de idade, que caminha lentamente,
sustentando um abajur (símbolo da luz
interior) em sua mão direita, e levando um
bastão com a esquerda (que representa o
eixo). Um manto azul -com amarelo em
sua parte interior- cobre suas vestimentas
vermelhas, e um capuz também vermelho
cai sobre suas costas. Relaciona-se a carta
com Cronos, o Tempo, que devora a seus
filhos, e com a Antigüidade e a velhice,
que a Tradição sempre concedeu a maior
importância, respeito e veneração; e com a
experiência, a lentidão, a paciência, a
solidão, e, em geral, com as belas virtudes
da ancianidade. Ao contrário, esta carta
indica os vícios próprios de uma velhice
carente de espiritualidade.

DIREITA INVERTIDA
Tempo - Velhice - Tranqüilidade Irrealidade - Velhice - Solidão
Sabedoria - Solidão - Sensatez Misantropia - Indiferença
Interioridade - Experiência Falsas crenças - Ocultismo
Conhecimentos ocultos - Paciên- Ausência de generosidade
cia - Iluminação - Lembrança de Si Obscuridão - Amnésia
Desapaixonamento - Perseve- Ignorância - Avareza
rança - Generosidade - Filantro- Impaciência - Lentidão
pia - Silenciamento das pai- Certezas que não são tais
xões - Austeridade - Bondade Mau humor - Atitude senil

57 O JANTAR
Para este Programa, os mantimentos que nutrem o corpo físico são
considerados como símbolos dos espirituais, que são os que alimentam a
alma do ser humano. Este aspecto, que a sociedade moderna desconhece, é o
que dá a toda comida ou alimentação um caráter ritual e sagrado. O
estômago, que ocupa a parte média e central do corpo, representa um
verdadeiro Athanor alquímico a forja de Vulcano, no qual as substâncias
positivas dos mantimentos se sutilizam passando ao sangre (vivificador de
todo o organismo), e as negativas e imprestáveis grosseiras passam aos
condutos labirínticos do intestino para sua posterior evacuação. Quer dizer,
que se realiza a operação de separar o espesso do sutil. Já sabemos que para
qualquer cultura tradicional o corpo é uma entidade sagrada e seu
funcionamento está em correspondência com os ciclos e ritmos do universo,
constituindo também um receptáculo dos eflúvios divinos. Ao comer, o
homem assimila o cosmo exterior a seu próprio cosmo corpóreo e sutil, quer
dizer, integra-se harmonicamente com o mundo que o envolve e do qual
forma parte. E esta comunhão produz uma alegria, análoga em outro plano à
experimentada pela emoção que gera a contemplação da Beleza, pois
também viver de Beleza e Amor é alimento. Este, e não outro, era o sentido
que tinham as bacanais grego-romanas e a alimentação realizada pela
comunidade em determinadas festas de todas as tradições, que eram acima
de tudo comidas rituais coletivas onde se oferecia culto às energias celestes
por intermédio da manifestação das energias da vida e da natureza.

Um sentido especialmente significativo é o que reveste o Jantar. Por seu


caráter noturno e por anteceder ao sono, que é símbolo da morte e do
ingresso em outro estado do ser, teve, e segue tendo, uma particular
importância entre as diversas tradições, como é o caso do Cristianismo. A
Santa Ceia que Jesus Cristo ofereceu aos apóstolos (antes de sua
crucificação) instituiu o mistério da Eucaristia sob as espécies do Pão
(corpo) e do Vinho (sangue-espírito), produtos vegetais extraídos da
natureza e elaborados e fermentados pelo Fogo, origem da luz e do calor. A
Santa Ceia, além do aspecto sacrifical e espiritual que representa, é um
símbolo do laço íntimo de solidariedade e amor fraterno que deve unir a
todos os homens que assumam sua condição de tais. Neste sentido a palavra
cenáculo, que provém de jantar, indica o lugar onde se reúnem homens que
compartilham essencialmente as mesmas idéias, em relação com as quais os
sentimentos e paixões próprios do humano têm que se encontrar em perfeita
harmonia.
58 A LIRA DE APOLO E A FLAUTA DE ORFEU
Conceber o tempo sem o espaço como referência é impossível, pois só
quando se entra em relação com ele, através do movimento, torna-se
inteligível. Isso se deve a que possui por natureza uma qualidade superior, ao
estar de algum modo menos determinado que aquele [N.T.: o espaço]. A
música, arte do ritmo e da harmonia por excelência, é sem dúvida a que de
maneira mais óbvia e bela revela o caráter cíclico e recorrente do tempo,
desmentindo a absurda concepção linear, uniforme e quantitativa que dele
forjou a mentalidade profana. O número é a estrutura do ritmo, e como tal é
"qualidade" manifesta que se distingue nitidamente da pura agitação, como a
música e a melodia o fazem do ruído; esta concepção "auditiva" do cosmo
nos aproxima do invisível, ao sutil, a tudo aquilo que está além da
constatação sensível em geral.

A potência divina cria pois o cosmo a partir de ritmos, de alteridades, que


ora se equilibram, ora se desequilibram, sem sair jamais do diapasão divino.
A Beleza, um dos nomes divinos, ao se manifestar o faz através da perfeição
das formas, e estas, antes de suceder grosseiras, configuram idealmente a
ossatura sutil e formativa do universo, a arquitetura invisível do cosmos.
Dita arquitetura é realmente uma linguagem divina e maravilhosa cuja
apreensão está diretamente vinculada à intuição intelectual do coração,
sacrário do templo humano e sede de todas as teofanias. A música platônica
das esferas ilustra de maneira perfeita esta concepção ao descrever o cosmo
como uma imensa caixa de ressonância, que não faz mais que amplificar
energias virtuais até as levar a sua concreção efetiva para, em seguida,
devolvê-las a sua origem, como faíscas, brilhos ou reflexos transitórios de
um arquétipo imutável. Solve et coagula são na Alquimia hermética (ou
condensação-dissipação no extremo oriente), a fórmula deste duplo
movimento simultâneo, que faz possível a maravilha da existência universal
e individual e suas indefinidas inter-relações.

As qualidades dos sons, ligadas, como vimos, aos planetas, estão-no também
aos elementos. E igualmente os instrumentos que os reproduzem: de sopro,
corda, percussão, etc., têm ao ar e à terra como módulos terrestres, e ao fogo
como celeste, já que é o despertar do "fogo interno" a missão principal da
música, especialmente a sagrada. Como manifestação da Harmonia
Universal, a música contém em si potencialmente todas estas energias. E é
pelo fato de que "o semelhante atrai o semelhante" que sua ação sobre a
psique humana desperta logicamente seus respectivos homólogos, assim
como também o poder de os ritmar entre si. Os diferentes tempos e marchas
reconhecidos nas partituras clássicas ocidentais somente traduzem o efeito
das energias da alma sobre a criação musical e vice-versa: andante, alegro,
patético, brio, moto, são apenas estados da alma que revelam de por si um
drama interno entre vários ritmos e personagens, cuja descrição alegórica a
encontramos imemorialmente em todos os mitos e cosmogonias antigas.

59 NOTA:
Ocorre, às vezes, que há momentos neste trabalho onde aparentemente não
acontece nada. Em ocasiões, queixamos-nos dos tempos em que estamos
agitados; tudo nos move e as tormentas nos cambaleiam. Mas há outros
ainda piores nos quais não acontece absolutamente nada. São aqueles
períodos em que os navegantes da busca, da aventura do Conhecimento,
denominam "calmaria". A imobilidade aqui é pura rigidez e desesperança.
Este nada não é o En Sof da cabala hebraica, apenas seu reflexo invertido.
Tudo se apresenta como uma via morta, uma porta fechada ou uma
banalidade. Não há coisa mais dura que estar estagnado sem receber o
sopro ou o vento do Espírito, ou dos espíritos, ao menos. Aqui é onde
devemos redobrar nossos esforços. Este é o momento em que devemos
reiterar uma e outra vez nossos ritos e tomar consciência de que não há
vida, nem trabalho, sem sacrifício. Lutar nestes momentos é uma
necessidade e quanto mais encarniçado, inteligente, concentrado e honesto
seja nosso combate interno, maior é a possibilidade da vitória.

60 TARÔ
X — A RODA DA FORTUNA: Com o
décimo arcano termina o ciclo dos nove
números naturais mais o zero, e se
anuncia um novo ciclo. Carta de
mudança e de movimento, representa a
roda da vida e das encarnações (o que no
budismo se denomina Roda de Samsâra)
da qual teremos que nos liberar graças ao
processo iniciático, subindo a outras
regiões do ser. Dois animais giram ao
redor da roda –um desce e o outro sobe-
e sobre ela, mais à frente do movimento,
encontra-se uma esfinge, símbolo, entre
outras coisas, da união dos quatro
elementos. A circunferência se encontra
unida por seis raios ao ponto central da
roda -de cor vermelha-, da qual sai uma
manivela -a mão é invisível- que a faz
girar. A base, em forma de escada, fala-
nos das possibilidades da ascensão.
Relaciona-a também com a sorte e com a
fortuna, com o fortuito e com o azar.

DIREITA INVERTIDA
Mudança - Movimento Reiteração - Retorno
Circunstâncias favoráveis Lábia
Possibilidade de ascensão Irresponsabilidade
Saída do retorno - Forma ou Ma- Manias - Hábitos
neira de aproveitar oportunida- Rotina - Costumes
de - Boas possibilidades Instabilidade - Precipitação
Boa fortuna - Azar - Sorte Vagabundagem - Preguiça
Acontecimentos fortuitos Azar - Fortuna menor
Nova perspectiva da realidade Indolência – Boêmia

61 OS QUADRADOS MÁGICOS
Vimos em reiteradas ocasiões que o símbolo da Terra é o quadrado. Esta
figura geométrica de quatro lados iguais é a expressão do conceito de
quaternário e nos transmite imediatamente a idéia de ordem, harmonia e
equilíbrio entre as distintas tensões de suas partes, que se conjugam e
neutralizam em um ponto comum de onde igualmente emanam de maneira
permanente.

Sabemos também que o quadrado no tridimensional se converte em um cubo,


e é evidente que este corpo constitui um símbolo do sólido e um exemplo
nítido do que é uma estrutura. Todas estas imagens mentais se associam
imediatamente quando se trabalha esotericamente com o quadrado que é a
representação, no plano, da Terra, tomada esta palavra em seu sentido mais
amplo, ou seja: as coordenadas espaço-temporais (verticais e horizontais)
aonde o homem está inscrito, as que também sinalam e limitam
simbolicamente à figura do quadrado. Nas civilizações tradicionais, esta
figura era sagrada –como sua complementar o círculo– por ser um símbolo
transmissor e receptor das energias-força do desconhecido, às quais
manifesta, sendo o depositário de uma carga mágica poderosa, suscetível de
ser transformada e utilizada para diversos fins rituais e cosmológicos. E se
essa carga mágica se multiplica e se projeta simetricamente criando o
quadriculado (delimitado deste modo dentro de um quadrado), onde os
possíveis elementos dispersos se unem e coerem em um todo, graças a uma
ordem invariável e a diversas particularidades que se convertem em leis
gerais, aumenta-se o poder generativo e protetor desta figura, que encerra
dentro de si as mesmas leis universais da Criação íntegra, e que as traduz
com igual discurso, fato de que são testemunhas os símbolos numéricos e
geométricos e todos aqueles que se possam relacionar com eles na harmonia
matemática destas associações.
Quase todos os povos e tradições utilizaram estes quadrados mágicos e os
consideraram tanto instrumentos de conhecimento, como potentes talismãs
capazes de ordenar e também de desatar as indefinidas energias e forças que
constantemente estão articulando o cosmo. O mais definido destes pantáculos
ou mandalas, presente, entre outras tradições, na China, no Islã, no
misticismo judaico, e igualmente entre os adeptos da Tradição Hermética, é o
que damos a seguir, chamado o quadrado mágico de 15, ou quadrado natural,
no que a soma dos números de 1 a 9, inscritos dentro dos fichários, (efetue-se
em sentido vertical, horizontal ou diagonal) resulta sempre 15. Ilustrando,
diremos que a civilização chinesa derivou desta estrutura a organização
social e política de seu império.

Deste modo, na Cabala hebraica estes números são suplantados pelas letras
de valor correspondente, abrindo o campo a toda sorte de imagens e
conceitos relacionados com as palavras e suas raízes, o que equivale a
trabalhar com a Ciência dos Nomes.

Igualmente os alquimistas associavam quatro formas de construir


numericamente este quadrado, com os quatro elementos, e o vinculavam com
os três princípios essenciais (tem três colunas), que em uma dança contínua
produzem a ilusão da matéria.

Também os astrólogos trabalharam com estes quadrados carregados de


símbolos numéricos, alfabéticos e cosmogônicos, e os associaram com os
planetas e com o mapa do céu (assim como os alquimistas com os metais).

Oferecemos a seguir a correspondência entre os distintos planetas e os


quadrados mágicos correspondentes: o quadrado natural, ou de base 15, é o
atribuído a Saturno. o de 4 colunas e de base 34 (de acordo aos números
atribuídos aos fichários correspondentes, os que sem repetir-se nunca somam
em qualquer sentido essa cifra), está consagrado a Júpiter. O quadrado
mágico de 5 colunas, cuja base numérica é 65, a Marte. Ao Sol se associa o
de 6 por 6 colunas, cuja cifra base é 111. O de 7 colunas é atribuído a Vênus
e sua base é 175. O quadrado mágico de Mercúrio contém 8 colunas por lado
e seu número base é 260. E finalmente o da Lua, de 9 colunas, é baseado no
número 369. Como se poderá observar, as relações com a Árvore da Vida
Sefirótica são evidentes, o que nos leva a compreender que na verdade todas
as disciplinas que se conformam à Tradição Hermética, a Magia inclusive,
não fazem senão expressar uma só e única Ciência, que se manifesta em
diversas linguagens, ordens e formas.
62 EXERCÍCIO DE SOM:
Devemos recordar que de acordo ao que aqui se disse com relação à
respiração, à vibração, à voz e ao som, estes temas se referem à afinação
do homem, como instrumento musical, por intermédio da voz, tomada esta
como imagem do som harmônico das esferas celestes. Utilizaremos neste
caso um mantra, ou seja, uma emissão sonora muito singela. Ela será, para
os efeitos desta prática ritual, o som da letra "A", primeira dos alfabetos
latino, grego, hebraico e árabe, e também do nome de nosso Programa.

Coloque-se sentado mantendo suas costas eretas e comece a se concentrar,


utilizando os exercícios que tenha praticado. Logo depois de se concentrar,
comece a relaxar, a tal ponto que se possa sentir como uma cana vazia, ou
um tubo, que conecta com o mais profundo. Inale suavemente e leve o ar
para o interior do estômago. Deixe que desta interioridade surja o som por
meio de sua voz, claro e uniforme que, ao emanar, ressonará na caixa
torácica. Permita que a garganta e a boca modulem a forma do "A", e que a
vibração invada e encha todo o âmbito.

Ou seja, aspirar o som inaudível, depositá-lo no mais fundo de nós, e deixar


que surja lentamente a voz e se expresse de forma completa, comunicando-
se energeticamente com o Cosmo inteiro. Repita esta prática durante 10 ou
20 minutos diários.

Letra A

63 TARÔ
XI — A FORÇA: Vemos aqui uma
bela mulher, que sem esforço aparente,
e sem exercer nenhuma violência, abre
as fauces de um leão, dominando-o.
Simboliza a força da inteligência, capaz
de dominar as paixões graças ao fogo
interno do amor e da vontade. O fato de
representá-la com uma figura feminina
nos indica que não se trata de uma força
bruta ou física, mas sim de uma energia
sutil, como a da mente, muito superior
em qualidade e elevação. Esta carta
significa o influxo espiritual que
penetra os corpos, transformando-os. A
matéria alquímica já está preparada, e o
fogo da paixão se acende para dar início
à obra da transmutação; esta poderá ser
obtida se o fogo permanece aceso.
Relaciona-a também com ocupação
manual e com a indústria, e nos ensina a
aceitar a responsabilidade que implica o
trabalho interior.

DIREITA INVERTIDA
Força interior - Inteligência Luta - Guerra
Força do amor e a paixão Conquista violenta
Influxo espiritual - Sutileza Luto - Incêndio - Cólera
Força da palavra - Localização Reações inesperadas
Força da Vontade - Adapta- Violência - Desgarra-
ção - Persuasão intangível mento
Dominação da matéria - Indús- Negatividade - Estupidez
tria - Artesanato - Aplicação da Desejos
ciência - Aceitação de Densidade
responsabilidade Operação cirúrgica

64 A LUZ
Quando nos diversos textos tradicionais se fala da Luz, terá que entendê-la
sobretudo como um símbolo da Inteligência, constituindo o aspecto material
seu suporte sensível e simbólico. Entendida desta maneira, a Luz representa
uma força ou energia divina, o núcleo central, interno e gerador do que se
irradia toda a vida do ser cósmico e individual. Essa Luz inteligível e sutil
procede do fogo do Espírito, como a luz física provém da enorme massa de
fogo que é o Sol. Daí que constantemente se faça uma transposição
simbólica entre um e outro. Esta qualidade da luz está claramente assinalada
pelo próprio processo da Iniciação, pois esta se concebe fundamentalmente
como uma progressiva “iluminação interior” que dissipa as trevas da
ignorância, que são assimiladas ao profano e infra-humano.

Em escala universal, este processo é análogo ao Fiat Lux (Faça-se a Luz)


cosmogônico, produzido no princípio dos tempos pelo Verbo ou Logos que
dá origem à criação. "No princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus e
o Verbo era Deus... Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens, e a luz
brilha nas trevas, mas as trevas não a receberam." (João I, 15). "O povo que
habitava em trevas viu uma grande luz e para os que habitavam na região de
mortais sombras uma luz se levantou." (Marcos, IV, 16). Estas citações
evangélicas se referem naturalmente a Cristo, pois ele encarna, na tradição
cristã, essa ação iluminadora do Espírito que penetra na matéria tenebrosa e
substancial, fazendo-a passar da potência ao ato, ou do caos à ordem. O Sol
repete diariamente este rito quando, ao sair pelo Oriente, ilumina o mundo
submerso na escuridão da noite. É interessante advertir que o termo "dar a
luz" ou "iluminação" se aplica por igual ao parto carnal e ao nascimento
espiritual, com a diferença de que o primeiro necessita de um suporte
exterior, enquanto que o segundo se cumpre na mais completa solidão, na
própria pessoa, no mais secreto da caverna do coração.

65 ALIMENTAÇÃO E SAÚDE
Estes dois termos do parágrafo estão intimamente relacionados com o
natural, e cabe perguntar-se o que é que cada um entende por isso.
Igualmente no que se relaciona ao conceito atual de saúde. Efetivamente, nos
povos tradicionais, ou primitivos, o conceito de saúde-enfermidade (dois
opostos que não se contradizem) é bem diferente do conceito moderno, que
só se refere a ele como ao funcionamento hipotético de um corpo físico
"ideal" que constitui nossa posse, e não toma em conta a inter-relação deste
corpo com o Universo e com as múltiplas forças que o conformam. Sendo
que, além disso, o oficialismo contemporâneo exclui do binômio saúde-
enfermidade a esta última, por uma espécie de associação com o mal, ao qual
o homem moderno nega, atribuindo a esse "mal" as características do que lhe
desagrada e não quer reconhecer em si, motivo pelo qual o bem não é a
conjunção constante de opostos, mas um imaginário estado a se alcançar,
que troca com os ventos da moda e da relatividade dos usos e costumes.
Neste sentido, seria interessante nos fazermos uma pergunta: qual é a
estranha associação que se faz atualmente entre a saúde e certos esportes?
Que relação guardam certas ginásticas e movimentos forçados, verdadeiros
castigos corporais, com a saúde?

Melhor ainda: no processo da Iniciação, que corresponde a uma inversão


completa de nossa vida (pois as concepções profanas começam a converter-
se em sagradas), e que por certo inclui um descida aos infernos, os sintomas
que se percebem não são "saudáveis" (como o testemunham as vidas míticas
e exemplares dos grandes mestres, iniciados e filósofos), nem "belos" em
uma leitura estereotipada destes termos, mas se apresentam como grandes
choques, dos quais de maneira nenhuma estão ausentes a enfermidade, a dor,
e por certo a morte.

Por outra parte devemos nos enfrentar com a imposturada instituição da


higiene como moral, a convenção como moral, o "saudável" do trabalho pelo
próprio trabalho, as "boas" e "corretas" atitudes e costumes como
equivalentes ao bem. No mesmo sentido, compreende-se o "sentir-se bem" e
o "conforto espiritual" e, igualmente, a bonança econômica como o "bom".
Também se considera como boa ou saudável a oficialização de uma atitude
solene, digna e pomposa, ao extremo de confundi-la com o sublime. São
exemplos disso certas cerimônias civis, onde a impostura e o fingimento que
conduz este tipo de atitude, baseada numa absoluta falta de crença nos mais
elementares valores, fazem-se patentes. Pelo que, tudo isto deve ser
simulado para que não se descubra o engano (atuado em um tablado dentro
da farsa), que definitivamente não tem importância, posto que assim é o que
se considera a "vida", em que terei que tomar determinadas posturas para ser
respeitado, ou ao menos não ser criticado pelos vizinhos, e onde o mais
desonroso não seria cometer delitos, e sim perder a "dignidade" por isso, o
que equivaleria a aparecer no periódico por esta circunstância. Ou seja
envergonhar-se por ser descoberto e fazer o ridículo na atividade delitiva
generalizada. Assuntos e derivações que, na nossa maneira de ver e entender,
não têm relação com a "saúde mental" nem com a "higiene moral".

O que são definitivamente saúde e enfermidade? Sinceramente, é difícil


definir a "saúde" e o mais provável é que ela seja indefinível. Em todo caso,
se a saúde for algo, ou ao menos um estado, este seria de harmonia e
conjugação no permanente desequilíbrio. E isto só se obtém a nível
espiritual, em que se pese que o corpo sofra os achaques da dor e as
premonições da morte. O que é veneno para uns, para outros (ou para eles
mesmos em diferentes condições e circunstâncias), é medicina salvadora.

66 NOTA:
Esperamos que tenham seguido com atenção o desenvolvimento do Ensino e
que ele tenha produzido seus efeitos em cada um. Igualmente nos felicitamos
de que tenhamos chegado conjuntamente a um ponto que constitui uma
baliza em nossa meta. Propomo-nos aprofundar e ampliar os temas que se
foram esboçando e destacando, com o fim de obter os frutos que este manual
se propõe. Para isso, devemos contar necessariamente com a participação
espiritual ativa do leitor e de sua sede renovada de conhecimentos, assim
como com sua vontade decidida, sua paixão pelo que faz, e o equilíbrio e a
paciência requeridos para a efetivação do trabalho alquímico.

67 TARÔ
XII — O ENFORCADO: Aparece nesta
lâmina um homem enforcado por um pé,
realizando o sinal do quaternário com as
pernas e o do ternário com os braços (3 x
4 = 12). É a carta da iniciação, que
simboliza o começo do processo vertical,
contra a corrente (como o salmão, que
nada em direção contrária procurando sua
origem e destino), e que leva toda a
intensidade do impulso inicial, nesta
viagem para outros planos e níveis do ser,
que sendo invertidos com relação ao
mundo ordinário, são também
complementares com este. Aqui há o
significado da determinação e do
sacrifício (sacrum facere) que realiza
quem se abandonou confidencialmente à
Vontade suprema, começando a desdobrar
e desenvolver suas potencialidades e
talentos, como uma boa semente, que
tendo sido semeada em boa terra, começa
a germinar, anunciando os frutos que se
produzirão com a perseverança.

DIREITA INVERTIDA
Iniciação - Determinação Dúvida - Vacilação
Movimento ascendente Girar no vazio
Intensidade Frustração - Esterilidade - Trai-
Abandono - Heroísmo ção - Detenção - Ausência
Reestruturação - Confirmação Ansiedade - Desconforto
Começo de um processo Vazio
Sacrifício com sentido Infertilidade
Boa semente - Crescimento Terra erma - Aridez
Semente - Fertilidade - Boa terra Sementes que não frutificam

68 DEUS EXISTE?
É lógico que se o conhecimento e a consciência que tem o homem de si
mesmo e do mundo não supera o horizonte de seus sentidos, este fracasse na
tentativa empírica e dialética de encontrar uma resposta ou demonstração a
tudo o que lhe ultrapassa e transcende. A própria noção de Deus não faz
senão englobar e resumir em uma palavra esse “tudo”. Como ser criado e
existente o homem não pode conceber senão o que existe ou é de algum
modo; a esta condição temos que acrescentar outra não menos importante: a
forma. Se o informal ou supra-individual escapa ao entendimento racional
imerso nos limites da sucessão temporal e da dualidade, tanto mais difícil lhe
será conceber o ilimitado, a um não-algo, ou seja, ao não manifestado, ao
que transcende por completo toda existência condicionada? O Um e sem par,
só pode ser conhecido necessariamente por si mesmo, como poderia Deus, o
Criador ou o Sujeito Universal por excelência, ser objeto de conhecimento
de alguém que não seja o Si-mesmo?

A afirmação unânime da Unidade por parte de todas as tradições não se


apóia na existência ou não existência de Deus, a não ser na Não-Dualidade
Absoluta e Metafísica de todos seus possíveis aspectos, sejam estes
imanifestados ou manifestos. Toda afirmação supõe uma noção preexistente,
e a negação, uma prévia afirmação. Sem a idéia anterior e primitiva de um
Princípio Universal, não existiriam nem deístas, nem ateus, nem politeístas.
O ateu, por exemplo, para negar a Deus necessitou primeiro supor sua
existência (seu Ser). Não obstante, ante esta confusão, se um certo deísmo
fica justificado exotericamente ante a necessidade de evocar ao objeto último
da fé, igualmente se justifica um certo ateísmo se o entender, claro está, não
como uma pura e absurda negação para tudo o que não se compreende, mas
sim como um lógico rechaço aos estereótipos morais e sentimentais que de
Deus oferece atualmente a religião oficial. As doutrinas metafísicas orientais
e as tradições arcaicas, por exemplo, não são deístas nem atéias. A prolífica
multidão de deuses que povoam os panteões tradicionais revelam tão
somente a infinita riqueza de matizes e aspectos que possui o Único e
Inominável, e nada tem que ver com a versão atual do politeísmo. O nome
completo e verdadeiro de Deus, diz a tradição cabalística, é impronunciável,
tão somente pode soletrar-se (YHVH). As indefinidas combinações a que se
emprestam suas letras (às que contempla a ciência cabalística da Temurah)
criam e produzem deste modo todos seus nomes e aspectos possíveis
enquanto entram em relação com o manifestado.

Realmente Deus não existe se por existência entendemos qualquer modo


condicionado do Ser; se neste sentido Deus existisse, já não seria Infinito e
Eterno (nem tampouco o Criador, o Supremo Artífice), mas apenas uma
criatura, algo criado, em suma. Gêmea à sua infinita transcendência está sua
absoluta imanência; Deus é tudo sem exceção já que nada poderia sair da
Unidade indivisível de Tudo e ser um "outro" à parte. "Não há mais
divindade (ou realidade) que Allah", reza a sentença islâmica. Certamente as
limitações da linguagem humana e racional são as primeiras em obstaculizar
a expressão de noções que estão mais à frente do alcance da definição e da
dialética, pois toda definição já é uma limitação da Realidade Ilimitada. Do
núcleo à periferia do Ser, existem inumeráveis estados intermédios
graficamente representados por indefinidos círculos concêntricos ao redor de
um só ponto.

Naturalmente o Centro ou Deus em Si mesmo não é a periferia, tanto quanto


nosso corpo não é nosso verdadeiro ser, mas sim tudo é uma única e mesma
realidade inseparável, Ser e Não-Ser, anterior ou posterior, princípio e fim,
são parâmetros humanos de compreensão que se unificam na Via do Meio.
Todos os seres são letras cuja reunião forma um discurso que prova a
existência de Deus (ou seja a presença de Deus em tudo), quer dizer a
"Inteligência" que pronuncia esse discurso; já que não pode haver discurso
sem verbo, nem nada escrito sem escritor.
69 ESPÍRITU-ALMA-CORPO
No Título N.º 65 deste Módulo, sob o genérico de "Alimentação e saúde",
advertimos sobre certos enganos e modos de ver literais que podem se
constituir em verdadeiros obstáculos do Conhecimento. Tratava-se ali de
temas como o da substituição do sobrenatural pelo natural e de equivocados
conceitos sobre a saúde-enfermidade (relacionados de modo simplificado
com o bem e o mal) e deste modo com errôneos critérios sobre o
"misticismo" e a "espiritualidade", aparentando-os com determinadas
práticas profiláticas e higiênicas e até com algum tipo de moral (equivalente
a meros sentimentalismos e devoções) em substituição do autêntico caminho,
portador dos segredos da Ciência Sagrada. Estes equívocos possuem um
denominador comum: a pretensão de materializar o espiritual (até com bom
ânimo, ou seja: fazê-lo mais acessível, o que de todas maneiras é uma
impossibilidade), engano que é próprio da sociedade atual, que crê
exclusivamente no materialismo, que quer ser profana e dessacralizada e que
não faz outra coisa que negar o Espírito, comungando com o que não é. A
seguir referiremos a certas apreciações referentes a espírito-alma-corpo e
também ao que se pode compreender pelo interno-externo; porque pensamos
que, ao redor destes temas, podem se produzir confusões, algumas delas
derivadas de problemas de terminologia, na maior parte das vezes de
apreciações superficiais, certamente enraizadas em idéias limitadas, daquelas
que circulam hoje tão profusamente.

Em primeiro lugar, diremos que o binômio espírito-corpo não é tal para a


Doutrina Tradicional, que reconhece um terceiro elemento, a alma (o ânima
ou psique) entre ambas. Em termos do código cabalístico em que estamos
nos expressando e que nosso leitor conhece, diremos que a primeira tríade,
com Kether à cabeça, ou seja o plano de Atsiluth, poderia ser equiparada ao
espírito, enquanto que a de Asiyah e o reino de Malkhuth seriam similares ao
corpo. A alma (alma ou psique) seria o que os cabalistas denominam as seis
sefiroth de "construção", ou seja, o grande plano intermédio, subdividido por
sua vez em dois mundos: o de Beriyah e o de Yetsirah, o psiquismo superior
e o inferior, respectivamente. Como nosso leitor já sabe, todos estes planos
se complementam e conformam as emanações do "Um sem par" no seio da
manifestação. Entretanto a cultura moderna, sobretudo depois de Descartes,
estabeleceu uma dualidade antinômica entre espírito-corpo (excluindo
sempre um em benefício do outro), pelo que se chegou ao desconhecimento
do verdadeiro Espírito, que foi suplantado pela alma (o anímico ou psíquico)
como uma impostura do espiritual. Tudo isto agravado pelo fato de que, nos
tempos atuais, este psiquismo se expressa muito mais em seu grau inferior
que no superior. Entretanto, –em que pese este engano da alma que se faz
passar pelo espírito, sobre o qual logo voltaremos– os termos
contemporâneos de espírito e corpo são o suficientemente gráficos e claros
para que possamos dizer algo a respeito. Sobretudo quando na atualidade há
uma série de "escolas" que cunharam certas frases publicitárias como "ama
seu corpo", que são objeto de admiração e até de culto, igual que o corpo
físico ao que se referem e com o que pretendem (Oh, paradoxo!) passar a
outros "estados" (aos que eles virtualmente negam), por uma espécie de
"crença" que supõe que, por meio da exaltação reiterada e mecânica da
matéria se pode chegar a algum lado que não seja ao próprio culto ao
corporal, ao relativo e limitado, o que equivale à exaltação de um de nossos
egos, tão falacioso como os outros. Neste sentido, deve se dizer que espírito
e corpo estão invertidos um com relação ao outro. Do ponto de vista do
espírito, este é o primitivo. Do ângulo de visão do corpo, ele é o primeiro.
Deste modo, desde Kether, Atsiluth é o primeiro plano e Asiyah o último.
Desde Malkhuth, Asiyah é principal e Atsiluth final.

Queremos esclarecer que em nenhum texto sagrado tradicional se fala de


"ama a seu corpo", concepção impossível de encontrar na Antigüidade,
embora não desconhecida por ela. Há exemplos notórios do contrário; no
Evangelho cristão, verbi gratia, o primeiro grande mandamento é o de amar
ao Senhor (seu Deus) por sobre todas as coisas. Estas palavras têm por outra
parte uma razão essencial de ser e são prevenções que não terá que esquecer:
a da primazia da ordem espiritual sobre a ordem corporal-material-
superficial, o que sempre se deve recordar para não cair no equívoco social
que hoje nos tocou viver. Também queremos incidentalmente dizer que, o
que atualmente muitos entendem por "sentir", como garantia de certeza, é
extremamente relativo. Esse "sentir" que é sua garantia poderia estar tão
condicionado como o "pensar" ou "acreditar" na sociedade de consumo ou
em qualquer outra nimiedade ou assunto. O "sentir" pode ser só uma
exaltação desmedida do ego, e se chega a "sentir" –e a fomentar esse
"sentimento"– por qualquer coisa. Os sistemas totalitários e as quadras de
esportes de futebol dão bom exemplo disso.

O mesmo acontece com o interno e o externo. Talvez seja singelo para


alguns dizer o que é o externo, associando-o a sua corporalidade. Mas o que
é o interno? O verdadeiramente interno seria o plano de Yetsirah, associado a
nosso psiquismo inferior, ou até o de Beriyah ligado ao superior? Ou seriam
esses dois mundos apenas degraus para atracar a nosso autêntico Ser? O mais
interno não seria o mais autêntico e profundo e também o mais
desconhecido?

Não é através de quão natural os povos e os homens conheceram o


sobrenatural, a não ser ao reverso: do sobrenatural, quer dizer, da
compreensão da Unidade Transcendente e Eterna, e até do Não-Ser
metafísico, é que derivaram suas condutas e apreciações sobre eles mesmos,
o que equivale a entender sua própria natureza e a do mundo que os rodeia.
Igualmente, não é por intermédio do "corpo" –e menos ainda do que se
entende hoje em dia pelo corporal– que se chega ao Espírito, mas sim pelo
contrário, uma visão literal e fixa da corporalidade conforma um obstáculo
definido para a percepção do autenticamente espiritual. E muito pior ainda é
o que ocorre quando se separa nitidamente ao corpo do espírito, outorgando
a este último características que caem diretamente no plano do anímico, o
que equivale a confundir o psicológico e suas complexas tortuosidades com a
verdadeira espiritualidade.

70 NOTA:
A esta altura do Ensino, pode ser que você ainda não soubesse ou
compreendesse com clareza o que é verdadeiramente o conteúdo deste
manual. Não o dê então por sabido como está acostumado a ser o habitual
e volte a estudá-lo, relendo em profundidade e com suma lentidão
(retardando o tempo) tudo o que nele se contém. É muito mais nobre e
produtiva esta humildade, ou melhor, esta franqueza para com a gente
mesmo, que supor o que ainda não se sabe, ou colocar uma rápida etiqueta
naquilo que se quer despachar para sair outra vez do passo. Estas
releituras lhe brindarão com mais de uma surpresa e lhe oferecerão
numerosas perspectivas, com as que neste momento, acaso, você não
acreditava contar. Pensamos que é válida e nos está permitida a sugestão
anterior avalizada pela experiência na realização de nosso Programa.
71 TARÔ
XIII — A MORTE: Nesta carta, em que
predomina a cor negra da imanifestação,
vê-se um esqueleto "vivo", que ceifa com
uma foice, cortando os membros dos
seres manifestados, dispersando-os. No
processo iniciático é necessário
experimentar em vários níveis o paradoxo
de viver a morte, morrendo aos aspectos
inferiores e renascendo "de cima" aos
estados superiores do ser. O adepto pensa
constantemente nela, tomando
consciência do ilusório desta vida
transitória, e sabendo que nos mistérios
da morte estão ocultos os da imortalidade.
Ela é uma aliada que nos ensina a meditar
no metafísico e no transcendente; é
regeneradora, e junto com a vida é nossa
verdadeira iniciadora. A idéia da morte
está ligada à de ressurreição, pois sempre
ocorre em um plano, terminando um ciclo
e dando lugar a um novo em outro nível.

DIREITA INVERTIDA
Ressurreição - Mudança de pele Fim necessário
Investigação - Metafísica Aniquilação - Imobilidade
Processo de desenvolvimento Morte em um plano
Vislumbre de consciência - Chamados Ausência - Detenção
Passo fundamental - Assinale Prazo que vence
Desenvolvimento cíclico Caminho sem saída
Morte em um plano Sonambulismo - Desvelo
Nascimento - Indicações Enfermidade
Movimento cíclico Enfermidades crônicas

72 ALQUIMIA
Há momentos no processo do conhecimento que a Alquimia denomina
putrefação e nigredo. Estas são etapas e estados dissolventes aonde o adepto
visita as vísceras da terra e perambula pelos corredores das trevas interiores.
Este perambular é análogo ao que se descreve no Bardo Todol ou Livro dos
Mortos Tibetano (e também de maneira similar no Livro Egípcio dos
Mortos, chamado por outra parte O Livro da Saída da Alma à Luz do Dia).
Trata-se da viagem de além-túmulo que se equipara ao percurso iniciático e
ao caminho que vivencia nos povos "primitivos" o Xaman em seu êxtase.
Percorrido que, tanto nas grandes civilizações como nas tradições arcaicas,
descreve-se como uma aventura cheia de perigos e lutas, em que se travam
batalhas e se produzem dificuldades (como o ter que cruzar rios) e se
referem tanto ao percurso da alma post-mortem, como à morte dessa alma
nesta vida.

fig. 14

Esta viagem entre rajadas de sombras e luzes está representada na


iconografia alquímica de distintas maneiras, já que esta ciência relata,
vivenciando-o, o processo de Iniciação (abertura da Consciência e
Conhecimento), por intermédio das nossas próprias obscuridades, com as
quais não devemos nos identificar; menos ainda, negá-las.

Isto está em relação igualmente com a idéia de Karma, ou seja com a de


ação-reação, e a de purgar pelos próprios enganos (pecados) e a
responsabilidade que nos cabe neles. O que poderia ser obtido graças à
purificação que produzem estes ritos catárticos ou, em termos da Arte Régia,
ao calcinar estas umidades pútridas ou, como dizem alguns dos estudantes de
hoje em dia, "alquimizá-las", valha a expressão.

fig. 15

73 O NASCIMENTO DA HISTÓRIA I
A História, entendida como consignação escrita dos fatos e acontecimentos
mais relevantes que ocorrem em uma determinada época, é relativamente
recente, e mais ainda se tivermos em conta a duração real que corresponde
ao ciclo completo da humanidade. Devemos retroagir até aproximadamente
o século VI antes de nossa era para encontrar os primeiros testemunhos
escritos, propriamente históricos. É interessante assinalar que, segundo os
dados tradicionais, o século VI A. C. criou um momento crítico no
desenvolvimento do ciclo humano, um período em que se produziram
grandes mudanças e reajustamentos da tradição, não só no Ocidente, mas
virtualmente em todos os povos e civilizações da antigüidade.

Para citar alguns exemplos dentre muitos, terá que se dizer que nessa época
vem se configurando a civilização de Roma, que acontece a era dos reis
legendários a seu período histórico propriamente dito; na Grécia aparece o
pitagorismo que em seu núcleo essencial herda os antigos mistérios órficos,
e se assiste ao surgimento da época clássica; é destruído o Templo de
Jerusalém e o povo judeu sofre o cativeiro de Babilônia, que parece ter
representado uma perda irreparável de uma parte importante da tradição de
Israel, como foi a de sua língua escrita original. Na China a antiga tradição
perde a unidade que conservava dos tempos primitivos, e se divide em duas
formas muito diferentes conhecidas como o Taoísmo e o Confucionismo,
conservando a primeira delas a parte dessa tradição que correspondia à
doutrina metafísica (esotérica) e à iniciação, enquanto que a segunda se
ocupava de seus aspectos puramente sociais e organizativos (exotéricos),
embora seus ritos e símbolos fossem herdados da primeira. Em geral, deu-se
um passo a mais no processo de solidificação que, desde os tempos
primitivos, vinha ocorrendo em todos os âmbitos da existência e da vida
espiritual do ser humano. E para que a lembrança de muitas coisas não
desaparecesse para sempre, foi necessário resguardá-la nos livros históricos
e sagrados.

Esta barreira no tempo, que sem dúvida representa o século VI A. C., é um


dos motivos pelos que, em seus estudos, a maioria dos investigadores atuais
encontram uma verdadeira dificuldade quando tentam classificar
cronologicamente –e, é obvio, conhecer com alguma veracidade– o que
aconteceu nos períodos precedentes a esse século. E esta dificuldade se vê
acrescentada pelo fato de que quase tudo o que nos legaram os autores
clássicos está expresso em uma linguagem onde a realidade concreta das
coisas se entretece harmoniosamente com a poética do mito, da lenda e do
símbolo; uma linguagem que certamente não podem compreender os
historiadores "oficiais", saturados como estão de um racionalismo
claramente caduco e insuficiente.

Não ocorre o mesmo com a maioria dos historiadores antigos, que em seu
ofício foram autênticos intérpretes e conhecedores à perfeição da doutrina
tradicional, pelo que o estudo de suas obras é de uma ajuda inestimável para
compreender a história real, a sagrada, dos povos e civilizações. Neste
sentido, na história que relatam estes autores, pode ser vista uma expressão
maior da alma dos homens (análoga à alma do mundo); do gênio e do
espírito que preside o nascimento e da permanente regeneração de uma
cultura e de uma civilização.

E se nestes relatos o mito aparece como uma parte constitutiva dos mesmos,
é porque este é a conexão vertical com o atemporal e acronológico, e
portanto a possibilidade sempre presente de estabelecer um laço salvífico
com os princípios divinos e celestes dos quais dependem todas as coisas,
incluída, naturalmente, a própria História que, definitivamente, não deixa de
ser um símbolo de outra coisa, e neste caso um símbolo ou receptáculo onde
se armazena, por assim dizer, a memória do mundo. Por isso em alguns
documentos medievais e renascentistas pertencentes a determinadas
organizações iniciáticas, o conhecimento da História era tão imprescindível
como o das Ciências Naturais, das Matemáticas e da Geometria.

74 O NASCIMENTO DA HISTÓRIA II
No Ocidente, é na Grécia onde a História é contada por escrito. E em
primeiro lugar, terá que se mencionar a Heródoto, que é conhecido como o
"Pai da História" que, com seu livro chamado precisamente "História",
recolhe os acontecimentos havidos dos tempos lendários até o momento em
que ele escreve, no século IV a.C. Neste livro são relatados não só os
episódios históricos dos gregos, mas também igualmente dos egípcios,
persas e outras culturas, pois [Heródoto] viajou por quase a totalidade do
mundo conhecido. O livro consta de nove volumes (recordemos que o nove é
o número circular por excelência, e relacionado, portanto, com o cíclico e
com o temporal), sendo bastante significativo que cada um deles estivesse
dedicado a uma Musa, como se tivessem sido inspirados diretamente por
elas. Temos que recordar, a este respeito e como um dado extremamente
revelador, que a Musa que preside a História, Clío, é nascida do matrimônio
do Zeus-Júpiter com Mnemosyne, a Memória.

Séculos mais tarde achamos Plínio, o Velho, que escreveu uma "História
Natural", um estudo dos seres da natureza (incluídos os fabulosos) em seus
três reinos: animal, vegetal e mineral; e também a seu quase contemporâneo
Josefo, que nos legou uma "História Antiga" dos judeus; e a Plutarco, com
"Ísis e Osiris", ou "Vida dos doze Césares". Mais próximo se encontra
Alfonso X, o Sábio, autor, dentre outras coisas, de uma inacabada História
da Espanha e de uma mais extensa História Geral, que em realidade, e
tomando como fonte de consultas à Bíblia e todas as crônicas antigas que
pôde reunir, resume a História Sagrada do gênero humano desde seus
começos até o século XIII, época em que reinou.

Por tudo que foi exposto, pode-se dizer que qualquer tentativa para
reconstruir o passado histórico, que se empreenda na atualidade, deve passar
necessariamente por um conhecimento da doutrina tradicional dos ciclos,
que inclui também uma compreensão dos símbolos e dos mitos que,
invariavelmente, foram se repetindo em qualquer parte.

fig. 16

Nota: Já se comentaram as relações entre História e Geografia no


transcorrer deste Programa. Queremos insistir na inter-relação entre
Tempo (História) e Espaço (Geografia) porque entre ambas as coordenadas
alguma vinculação tem que existir para que a existência cósmica seja
possível.

Na figura anterior, pode se apreciar o mapa do mundo dividido em 4 partes


emanadas de um centro virtual, perfeitamente equiparável com as 4 grandes
idades temporais e sua divisão –válida para qualquer subciclo– projetadas
de uma quinta idade mítica. A existência deste tempo mítico e deste espaço
virtual, coexistindo perenemente em suas origens, é o que permite e justifica
qualquer tentativa de estabelecer analogias entre o que hoje chamamos
Geografia e História, sem a qual elas careceriam de sentido.

Para os antigos isto era assim; e respondendo estas ciências, de modo


manifesto, a suas concepções de Tempo e Espaço, qualquer outra ciência
moderna que procurasse as relações entre estas duas coordenadas, deveria,
em seu direito, prestar atenção a esta inter-relação e a essas concepções,
conhecidas por todas as culturas sempre, e não considerar o Tempo e o
Espaço como assuntos diferentes.

75 TARÔ
XIIII — A TEMPERANÇA: É o
símbolo da ressurreição e da nova vida.
Aqui vemos uma mulher alada, em
atitude de vôo, mesclando o conteúdo de
duas vasilhas, combinando as energias
contrárias, às quais complementa, o que
também está simbolizado pelas cores de
seus vestidos. Pode-se ver nela as Musas
e as Graças que inspiram ao artista e, em
geral, a Arte como veículo do
conhecimento. Abre nossa mente a novos
aspectos do ser, cada vez mais profundos
e sutis. Esta carta manifesta as
potencialidades ocultas que se vão
desdobrando, e as faculdades que se
desenvolvem e solidificam, assim como
as decisões que se tomam
confidencialmente e os estados de ânimo
produzidos pela calma e da harmonia. No
processo alquímico, representa os corpos
luminosos e nobres que surgem logo a
seguir da morte e da putrefação da
matéria vulgar.

DIREITA INVERTIDA
Combinação de contrários Derramamento - Insegurança
Mistura - Coisas que concretizam Impossibilidade de combinar
Vida Nova - Calma contrários - Incomunicação
Harmonia - Esperança - Ser Abatimento - Impotência
Paciência - Decisões felizes Congelamento - Dispersão
Vôo - Aspectos novos do Inconexão
conhecimento - Eqüidistância Fragmentação
Amalgamento - Intrepidez Falta de agilidade
Confiança - Inspiração artística Desatenção
Fluir - Boa disposição Incompetência
de ânimo - Forças que se Ausência de relações
complementam Detenção no fluir

76 AS SETE ARTES LIBERAIS I


Dentre os numerosos legados da Idade Média, recebidos por sua vez de
gregos e romanos, acham-se as denominadas "artes liberais", sete disciplinas
que aglutinaram todo o saber da época, e que se dividiam da seguinte
maneira: Gramática, Dialética (às vezes substituída pela Lógica), Retórica,
Aritmética, Geometria, Música e Astronomia. As sete artes liberais
representaram a coluna vertebral em torno da qual girava o conjunto da vida
cultural da sociedade medieval. E quando dizemos cultural não nos estamos
referindo só à atividade intelectual e especulativa, tal e como se ministrava
nas universidades e centros escolásticos que existiam nas mais importantes
cidades da Europa cristã, mas também à própria atividade manual e
operativa exercida nos colégios, oficinas e corporações artesanais.

Na Idade Média, ainda não se havia produzido o divórcio entre a teoria e a


prática, o espírito e a mão, a ciência e a arte. E esta imbricação entre a arte e
a ciência está claramente assinalada no famoso adágio: "A ciência sem a arte
não é nada". Por exemplo, na construção de uma catedral ou monastério se
conjugavam sinteticamente a atividade intelectual e a manual: a idéia
concebida no espírito se plasmava na pedra graças ao esforço e habilidade da
mão, sendo isto mesmo válido para qualquer outro ofício e artesanato. A
origem das artes e ciências liberais se remonta às escolas gregas e romanas,
especialmente às de Atenas e de Roma, sem esquecer o importante aporte da
cultura islâmica. Chamavam-se "liberais" porque, como dizia o grande rei
espanhol Alfonso X, o Sábio, "querem totalmente livre de todo outro
cuidado e estorvo ao que desejava aprender", ou seja, que se necessitava uma
plena e total dedicação a seu estudo e investigação.

Entre cada uma das artes liberais se estabeleciam permanentes


correspondências analógicas, até o ponto de que uma continha e
compreendia às demais. Entretanto, isto não impedia que fossem também um
todo perfeitamente hierarquizado, uma escala que permitia ao estudante
avançar ordenada e gradualmente pelo caminho de sua evolução interior.

77 AS SETE ARTES LIBERAIS II


Neste sentido, as artes liberais estavam divididas em dois grupos bem
delimitados: o trivium (a tríplice via) e o quadrivium (a quádrupla via). Ao
trivium correspondiam a Gramática, a Dialética e a Retórica, e ao
quadrivium, a Aritmética, a Geometria, a Música e a Astronomia. Com as
três primeiras se aprendia a pensar e raciocinar devidamente por meio do
conhecimento e significado da língua (Gramática), a coerência lógica da
mesma (Dialética), e finalmente, por sua aplicação ao discurso e a palavra
(Retórica), verdadeiros suportes e veículos todos eles do pensamento. Só
através do trivium, das palavras, vozes e nomes das coisas, podia se acessar
às ciências do quadrivium, que eram superiores a aquelas por quanto que
expressavam, e expressam, um conhecimento mais essencial e profundo. As
quatro ciências do quadrivium se referiam diretamente ao estudo dos ritmos
e dos ciclos, da proporção e da medida que, como sabemos, conformam a
estrutura prototípica de todas as coisas. Ao trivium e ao quadrivium se
acrescentava às vezes o bivium, que compreendia a Alquimia e a Astrologia.
Por outro lado, para o esoterismo cristão, as sete artes liberais se
correspondiam com os sete graus iniciáticos, análogos aos sete céus
planetários, que representam uma hierarquia de estados espirituais. A
Gramática se assimilava à Lua, a Dialética a Mercúrio, a Retórica a Vênus, a
Aritmética ao Sol, a Música a Marte, a Geometria a Júpiter, e a Astronomia a
Saturno. Notemos bem que o meio das sete artes está ocupada pela
Aritmética e pela esfera do Sol, que efetivamente ocupa o centro dos
planetas na Astronomia. Isto é importante, pois a Aritmética é, do ponto de
vista esotérico, a ciência dos números, Numerologia ou Aritmosofia. E assim
como o Sol ocupa o centro de seu sistema, levando a luz a todos os limites
deste, a Aritmética organiza e ordena todas as outras ciências, e contribui
para as unir e relacionarem entre si. Isto está claro no que respeita às relações
numéricas, que unem a Música à Geometria (união que se expressa
diretamente nas proporções das formas arquitetônicas) e também ao
conhecimento da Astronomia pela harmonia das esferas celestes. Mas deste
modo, esta importância do número está presente na construção do discurso
falado e escrito, das vozes e das palavras, como é fácil comprovar na poesia.

Em tudo isto se adverte uma herança da tradição pitagórica no seio da cultura


medieval e das sociedades e agrupamentos iniciáticos. Finalmente, este
aspecto cosmogônico das artes liberais não era senão o próprio suporte que
permitia acessar à realidade ontológica e metafísica.

fig. 17
78 NOTA:
Observou-se que a idéia de um trabalho e de um rigor estão presentes neste
manual, que são fundamentalmente intelectuais, no sentido maior que
estivemos outorgando a este termo.

Entretanto, essa mesma concentração rigorosa em nossos estudos não tem


que nos impedir o tratar –a esta altura do Ensino– de ir nos manifestando
em nosso meio de acordo às medidas das possibilidades de cada um. E
embora a Tradição Hermética põe o acento na aprendizagem individual,
esta pode se efetuar de maneira grupal, sempre que se tenham a guia e o
apoio de um eixo intelectual. Neste sentido, esta Introdução à Ciência
Sagrada cumpre com estes requisitos e pode ser tomada como base para o
trabalho. Segundo a promessa cristã, quando duas ou mais pessoas se
reúnem invocando o Santo Nome, o Cristo estará entre elas.

De outro lado, observou-se que o Programa suporta uma didática, vale


dizer, uma estrutura ordenada o suficientemente maleável e rica em
possibilidades como para que possa ser seguida por distintos
temperamentos e em diferentes âmbitos culturais.
79 TARÔ
XV — O DIABO: Temos às vezes uma
idéia deste símbolo, condicionada pelos
preconceitos morais que nos fazem ver
unicamente seu aspecto invertido e
maléfico. O diabo não é só o mal, senão
que a tradição melhor o relacionou com
a estupidez e a ignorância, assim como
com a mediocridade e a indiferença. Mas
este símbolo adquiriu para os iniciados
uma conotação mais profunda,
relacionada com a lenda de Lúcifer, o
arcanjo caído que luta com Miguel, que
representam aspectos opostos,
complementares e simultâneos do ser.
Herdeiro do Baco romano e do Dionísio
grego, o Baphometh dos Templários e o
amo dos bruxos e bruxas medievais, ou
bode, é símbolo do vinho e do sangue e
chefe das entidades da terra ou
inframundo. Representa a energia sexual
e a paixão, ou fogo interno, que a
transmuta do denso ao sutil.

DIREITA INVERTIDA
Energia sexual Desequilíbrio dos sentidos
Paixão - Desejo Desejos - Desordem - Sobre-
Atração - Magnetismo Excitação - Paixões desenfreadas
Intensidade - Energia oculta Escravidão dos sentidos
Possibilidades - Passos em falso Erros - Ignorância
Transbordamento de sentimentos Surpresas desagradáveis
Possessão de energias exacer- Achatamento - Pequenez - Ódio
bantes - Eros - Sensualidade Estupidez - Infantilidade
Vinho - Êxtase Mediocridade - Vaidade

80 QUADRADOS MAGICOS
Falamos dos quadrados mágicos, e em particular do quadrado natural de 9
casas, ou de Saturno (Ver N.º 61). Trabalharemos agora com os quadrados
correspondentes aos sete planetas, tomando-os como instrumentos para
começar a decifrar o inscrito dentro deles, advertindo que são tanto síntese
de sabedoria, como mapas da cosmogonia e, por sua vez, poderosos talismãs,
ou amuletos repletos de energias.

Damos aqui os quadrados mágicos atribuídos aos distintos planetas,


incluindo números e letras do alfabeto sagrado. Como dissemos, o
prototípico de três colunas de lado é atribuído a Saturno, o de quatro a
Júpiter, o de cinco a Marte, o de seis ao Sol, o de sete a Vênus, o de oito a
Mercúrio e o de nove à Lua, em perfeita vinculação com as equivalências
entre astros e sefiroth da Árvore cabalística e suas respectivas numerações.

Embora a colocação dos números em cada casa pareça à primeira vista


caótica, estas cifras, pelo contrário, estão colocadas de modo tal que refletem
assombrosamente a harmonia do universo e o caráter mágico-teúrgico destas
estruturas simbólicas, que se observa no fato de que a soma dos números de
todas as casas horizontais, verticais e diagonais é sempre idêntica. No caso
do quadrado de Júpiter, ou quadrado de quatro, de dezesseis casinhas,
observa-se uma perfeição ainda maior, tendo em vista que também os quatro
números centrais, os quatro das esquinas e os que se opõem dois a dois no
centro das horizontais e das verticais, somam também 34. Recomenda-se o
exercício de calcular o valor numérico das letras do alfabeto hebraico que
figuram em cada casinha e comparar dito valor com o número atribuído a
essa casinha. Este exercício de substituir as letras por seus equivalentes
numerais, tomando como modelo o quadrado de Saturno, poder-se-á repetir
nos distintos quadrados mágicos planetários que mostramos a seguir.

Recorde-se o leitor que o alfabeto hebraico se lê da direita para a esquerda, e


que assim têm que se ler os valores representados por mais de um dígito.

Recordamos aqui que os pitagóricos juravam não só pela Sagrada Tetraktys


mas também pelo Quadrado de Quatro.

SATURNO: Quadrado de base 15; o total de números das casas soma 45:
JÚPITER: Quadrado de base 34; o total das colunas soma 136:

MARTE: Cifra de base 65; soma números casas 325:

SOL: Quadrado base 111. O total das colunas é 666:

VÊNUS: Cifra de base 175. Número do total 1225:

MERCÚRIO: Base 260. Total soma 2080:


LÚA: Baseado no número 369. Soma 3321:

81 NOSSO PROGRAMA:
Nosso Programa tem uma estrutura didática circular e portanto, uma vez
que se seguiram as primeiras seqüências do Agartha e se conseguiu ligar
com seu ritmo particular, este pode ser repassado e ser relido em ordem
diferente, mesmo nos exercícios que o Programa contém, que poderão ser
praticados de maneira alternativa.

Entretanto, interessa-nos, como método de conhecimento, a comparação e a


inter-relação de todas as formas tradicionais como modos de expressão de
uma mesma realidade que se manifesta ao longo da História, e em toda a
extensão da Geografia. Da confrontação e vinculação entre os símbolos
tradicionais surgem faíscas e energias que nos fazem compreender muitos
dos pontos que são objeto de nossos estudos.

O Taoísmo e a Tradição Hermética –amém que sejam ambas reveladas por


uma Tradição Primitiva e Trans-histórica– têm algo em comum que as faz
afins: o fato de que não tenham derivado em formas religiosas ou
exotéricas, tal qual foi o caso do Judaísmo, Cristianismo, Islã, ou de modos
"quase" religiosos, como certas formas do budismo e hinduísmo, etc. Ambas
põem a ênfase na Alquimia como realização individual, o que lhes outorga
um marco de grande amplitude, e não sublinham a via emocional como
forma virtualmente única de acesso ao espiritual. Tem-se dito que este
último caminho se converteu quase em puro sentimentalismo nos tempos
atuais, e não desemboca no Conhecimento.

82 TARÔ
XVI — A TORRE DE
DESTRUIÇÃO: Aqui vemos uma torre
construída com tijolo (como a de
Babel), cuja cabeça está sendo cortada
por um raio celeste. É o símbolo da
destruição dos velhos esquemas, que
propicia a construção de outros novos.
A ira divina, que destrói a ilusão e a
mentira para implantar a verdade. Dois
personagens estrepitosamente caem a
terra, representando os falsos egos que
vão caindo por seu próprio peso para dar
lugar ao verdadeiro Eu, oculto e
essencial. O raio representa a luz do
espírito; e as borbulhas brancas, azuis e
vermelhas, os eflúvios celestes que
descendem à terra. É relacionada,
também, com o betilo (ou pedra do raio
caída do céu), com o martelo de Thor e
com o raio de Zeus; geralmente é
comparada às energias marciais e aos
deuses guerreiros e seu rigor. Invertida,
pode anunciar desgraças e cataclismos.

DIREITA INVERTIDA
Destruir para construir - Escala Destruição - Queda
Poder manifestado em forma Orgulho -
muito forte - Destruição de Impossibilidade de
esquemas - Fim definitivo de construir - Dor -
uma coisa - Corte Separação
Separação cortante - Ciclo dolorosa - Energias
Esquecimento de si mesmo - Sintoma de contrárias
enfermidade - Consciência Violência - Enfermidade
Iluminação - Explosão não pro- aguda
vocada pela vítima - Benefício Inimigos ocultos -
dos erros de outros Confusão
de línguas - Calamidades
- Ira
Cólera - Explosão
Vertigem - Catástrofe
Operação
cirúrgica

83 O BOSQUE
Dante inicia o primeiro canto de sua Divina Comédia com estas palavras: "à
metade da viagem da vida me encontrei em uma selva escura por me haver
afastado do caminho reto. Ah! Quão penoso me seria dizer o selvagem,
áspera e espessa que era esta selva cuja lembrança renova meu temor, temor
tão triste que a morte não o é tanto". A existência vulgar e profana oferece
aos olhos de Dante um aspecto análogo ao que nos ofereceria uma selva ou
bosque intrincado no qual seria angustiosa a sobrevivência, que nos evoca a
concepção platônica da vida terrestre como exílio da celeste. Efetivamente,
graficamente, a verticalidade de árvores e troncos, a horizontalidade dos
ramos, e a densa presença de plantas, flores e folhas, conformam um tecido
análogo ao da cotidianidade e suas veredas, dentro de cuja complicada
espessura existem, não obstante, clareiras e fissuras pelos quais penetra a
luz.

Esotericamente, o bosque, a selva, ou a natureza selvagem e virgem, como


lugares especialmente primitivos e sem cultivar, oferecem um cenário
simbólico de nossa própria natureza interna e externa, superior e inferior,
seja em seu sentido primordial de exuberante fecundidade, seja em seu
aspecto grosseiro, inculto e heterogêneo (o infraconsciente), em ambos os
casos, um cenário feminino telúrico.

Em muitos povos e culturas, cuja própria configuração geográfica assim o


exige, o bosque ou a selva adquire um papel muito importante e significativo
quanto a lugar reservado ao culto, às iniciações e à contemplação. A
elevação de dólmens, e as construções funerárias no interior dos bosques,
especialmente em clareiras e lugares limpos, é muito habitual nas culturas
arcaicas. Muitos usos e ritos ancestrais, mantidos pela memória popular,
seguem se repetindo periodicamente nestas paragens. Os mitos e lendas
antigos estão cheios de alusões a bosques mágicos, onde transcorre a trama
de seus argumentos e onde em geral habitam seres, ou entes, não humanos,
cuja relação com os heróis e os homens está vinculada simbolicamente ao
próprio processo alquímico e espiritual. Um clássico deste gênero é o conto
de Branca-de-Neve. Custodiada por sete anões em um bosque (psique),
acha-se semi-morta por ter comido o fruto que, astutamente, ofereceu-lhe a
bruxa feiticeira, o mesmo que outrora Eva comera no paraíso; enquanto
espera o "despertar" através do beijo do príncipe (Eros).

Efetivamente, a tradição faz dos gnomos, dos silfos, das ondinas e das
salamandras habitantes mágicos dos bosques, que nos oferece uma descrição
figurada de nossas próprias potências anímicas e terrestres. Estes seres estão
alquimicamente relacionados com os quatro elementos, respectivamente a
terra, o ar, a água e o fogo, assim como Branca-de-Neve se assemelharia, no
exemplo, ao quinto, o éter, cada um simbolizando a consciência e função
específica de cada elemento, consciências que habitam potencialmente
dentro de nossa própria natureza microcósmica, revelando-se como impulsos
e tendências elementares.

O bosque, ou a selva, como templo natural e espaço sagrado, oferece-nos


dentro de sua imensa riqueza de matizes (a fonte, a gruta, a mina, a
montanha, etc.), inesgotáveis temas de meditação. Toda uma cosmogonia
que nos fala simbolicamente da fauna, da flora e da topografia de nossa
própria natureza interna e invisível.
84 ASTROLOGIA
Assinalaremos seguidamente, em um quadro, as relações entre os doze signos
zodiacais, os quatro elementos e suas qualidades, e o temperamento humano
que lhes atribui:

Signo Elemento Qualidades Temperamento


Áries-Leão-Sagitário Fogo quente-seco bilioso
Touro-Virgem-Capricórnio Terra frio-seco nervoso
Gêmeos-Libra-Aquário Ar quente-úmido sangüíneo
Câncer-Escorpião-Peixes Água frio-úmido linfático

Damos a seguir as relações entre o corpo humano e os signos do zodíaco:

ÁRIES: a cabeza e o rostro

TOURO: o pescoço e a garganta

GÊMEOS: ombros, braços, mãos

CÂNCER: pulmões, peito,


estômago

LEÃO: costas, coração, figado

VIRGEM: ventre e intestinos

LIBRA: rins e vias urinárias

ESCORPIÃO: órgãos genitais

SAGITÁRIO: coxas e nádegas

CAPRICÓRNIO: joelhos

AQUÁRIO: pernas

PEIXES: os pés
fig. 18

85 MOMENTOS DE INCERTEZA:
Há momentos de incerteza no caminho do Conhecimento ou Iniciação, e o
aspirante sofre o tormento da dúvida e da angústia de se sentir incapaz de
enfrentar o monte de maravilhas e boas novas que vislumbra. Para esses
momentos, permitimos-nos citar aqui um fragmento do Corpus Hermeticum,
capítulo XI:

"Tendo posto em teu pensamento que não há nada impossível para ti,
considera-te imortal e capaz de compreender tudo, toda arte, toda ciência,
o caráter de todo ser vivente. Ascenda mais alto que toda altura, desça mais
baixo que toda profundidade. Reúna em ti mesmo as sensações de todo o
criado, do fogo e da água, do seco e do úmido, considerando que estás, por
sua vez, em todas partes, sobre a terra, no mar, no céu, imagina que ainda
não nasceste, que estás no ventre materno, que és adolescente, velho, que
estás morto, que estás além da morte. Se abrangeres com o pensamento
todas essas coisas de uma vez, tempos, lugares, substâncias, qualidades,
quantidades, podes compreender Deus."
86 TARÔ
XVII — A ESTRELA: Carta da
natureza, é também da beleza, da poesia
e da naturalidade. Uma mulher nua, que
pousa um joelho na terra, derrama o
conteúdo de duas vasilhas vermelhas em
um rio (água), ao mesmo tempo em que
escuta a linguagem sutil do pássaro (ar) e
recebe os eflúvios das estrelas (fogo). Ela
não luta contra a natureza, mas sim se
harmoniza e se integra com ela em
unidade, o que lhe permite conhecer suas
leis e as experimentar, mostrando-nos
também o caminho para o sobrenatural. É
relacionada com a cor verde da esperança
e da regeneração, e com a boa fortuna
(boa estrela) que sua atitude propícia. Em
seu sentido invertido, representa esse
falso "naturismo" e "misticismo", tão em
voga entre aqueles que se supõem
possuidores de uma pretendida
"bondade", em que se esconde um
prejulgado moralismo próprio das seitas
dogmáticas.

DEREITA INVERTIDA
Natureza - Harmonia Artificialidade - Desarmonia
Naturalidade - Verde Antinaturalidade - Desespe-
Esperança - Beleza - Poesia rança - Impudor - Ideologias
Conhecimento da lei Escapismo - Materialismo
natural Falta de escrúpulos
Vida - Reintegração - Estar Romantismo - "Idealismo"
Boa fortuna "Projeções" - Falsas
Espontaneidade ilusões - Especulações
Tranqüilidade - Sinceridade Problemas corporais e de
Regeneração - Simplicidade ordem higiênica - Hipocrisia
O sobrenatural Estagnação
87 NÔMADES E SEDENTÁRIOS
Sendo o núcleo sagrado e espiritual essencialmente idêntico –por seu caráter
atemporal e metafísico– para todas as civilizações tradicionais, existem
entretanto em cada uma delas certos rasgos e particularidades que as fazem
diferentes entre si. Isto se deve a múltiplos causa (diversidade de etnias,
habitats, climas, etc.), mas possivelmente a diferença mais marcada e a mais
importante seja o que algumas destas culturas pertenceram aos povos
nômades e outras aos sedentários. Esta primeira grande diferença se produz
no preciso momento em que a humanidade abandona seu Centro Primitivo e
se pulveriza por toda a superfície do planeta. Os nômades, acostumados à
peregrinação constante por serem povos dedicados ao pastoreio,
desenvolveram uma cultura sensivelmente diferente à desenvolvida pelos
sedentários, que eram basicamente agricultores, ao permanecerem
enraizados em um determinado lugar. Estas duas formas de vida, com todos
os matizes que entranham, influíram poderosamente na maneira em que uns
e outros encararam a vida e o mistério do sagrado, e portanto na própria
constituição e estrutura de seus ritos, símbolos e mitos cosmogônicos. Isto
está claramente exemplificado no que respeita às artes e aos ofícios.

Os nômades, em permanente movimento pelo espaço, criaram, entretanto,


uma arte baseada principalmente no ritmo e na fonética, como a música, a
poesia e o canto, isto é, em artes que se expressam sucessivamente, pelo que
estão estreitamente vinculadas ao tempo e ao sentido do ouvido. Na mesma
gramática e linguagem desses povos, e seus herdeiros atuais, adverte-se
multidão de expressões ricas em movimento e ritmo que não se encontram
entre os sedentários.

Estes, assentados pelo contrário no espaço, geraram uma arte mais


puramente geométrica e plástica baseada na proporção e na medida, como a
arquitetura, a pintura, a escultura, a escritura (os nômades transmitiam suas
tradições verbalmente), ou seja, artes e ciências que se desdobram no espaço,
mas feitas para perdurar no tempo, e diretamente relacionadas com a
faculdade visual. Sendo os agricultores sedentários, a maior parte do
simbolismo vegetal provém deles, enquanto que quase todo o simbolismo
animal procede dos nômades. Nos ritos sacrificais, por exemplo, os
primeiros ofereciam espécies vegetais a suas divindades, e os segundos
espécies procedentes do reino animal. Estas vinculações com os dois reino
da natureza, o vegetal e o animal, tiveram que influir poderosamente na
estrutura mental desses povos, e portanto nos símbolos que conformaram sua
cultura ao longo da história. Na Bíblia, duas formas de vida estão
representadas respectivamente por Caim e Abel, cuja luta tem que se ver
melhor como um símbolo das diferenças específicas que existiram
secularmente entre os sedentários e os nômades.

É significativo comprovar igualmente que as vivendas dos nômades,


construídas com materiais fáceis de transportar, faziam-se com forma
circular, e o círculo é, como sabemos, o símbolo que melhor expressa a idéia
de movimento, e também o signo do celeste e de tudo aquilo que se refere
aos ciclos e ritmos.

Por seu lado, os sedentários, utilizando materiais pesados como a pedra


(embora com antecedência a esta utilizaram a madeira como elemento de
construção), tendiam mais a edificar em quadrado, isto é, conforme à figura
geométrica que simboliza melhor que nenhuma outra o terrestre e a
estabilidade por excelência. Neste sentido, foram os sedentários os primeiros
a construírem cidades, e com eles nasce o conceito de civilização (civis =
cidade) tal qual chegou até nós. Graças a que tenham realizado obras para
perdurarem no tempo nos é possível ter acesso ao conhecimento de sua
concepção e de sua metafísica do mundo, o que certamente não acontece
com a cultura dos nômades que, vagando livremente pelo espaço sem
limites, não tinham necessidade de fixar nada, e a idéia do futuro, como a
concebem os sedentários, era-lhes alheia por completo.

Não obstante, tudo o dito até aqui, não se deve ver entre estas duas formas de
vida um antagonismo radical que na verdade jamais existiu. A arte e a
simbólica áudio-visual são patrimônios de qualquer sociedade tradicional,
seja esta nômade ou sedentária. São, voltamos a repetir, as condições de
existência as provocadoras de que um simbolismo se desenvolva mais que
outro. Por outro lado, sempre houve entre ambos os povos permanentes
contatos (por exemplo, através do comércio, e inclusive através do rito
sagrado da guerra, que era também uma forma de comunicação) que
facilitaram e promoveram o intercâmbio de idéias, usos e costumes. Com
freqüência, isto representou uma opção regeneradora que evitou, ao menos
até certo período histórico, uma excessiva "petrificação" por parte dos
sedentários devido a seu assentamento, e uma excessiva "dissolução" entre
os nômades devido a seu constante ir e vir.

Deste modo, muitos povos originais acabaram por se instalarem


definitivamente, o que originou em todos os modos de expressão de sua
cultura uma síntese entre as artes do tempo e do espaço, do ritmo, da
proporção e da medida. E esta assimilação do nomadismo por parte do
sedentarismo é uma constante vital na história da humanidade, além de ser
algo necessário que obedece a leis cíclicas. Diversos povos acharam seu ser
e seu destino histórico ao se concretizarem e se solidificarem, fato que
motivou a espacialização de seu centro sagrado e, portanto, uma
concentração de energias tal que deu causa ao florescimento de civilizações
com um alto grau de desenvolvimento cultural, como foi o caso da árabe, da
judaica, da romana, da asteca, maia, etc. etc.

88 AS TRÊS GRAÇAS
Hesíodo diz em sua Teogonia que a Zeus: "Eurínome, filha de Oceano, de
sedutora beleza, deu-lhe as três graças de belas maçãs do rosto: Aglaia,
Eufrósine e a encantada Talia. Quando olham, brota de seus olhos o amor.
Belos são os olhares que lançam sob suas sobrancelhas!".
Efetivamente, essas três fêmeas foram identificadas como Beleza, Amor e
Prazer. Espargem alegria em qualquer parte e inundam os corações dos
homens. Vivem no Olimpo em companhia das Musas, com as quais soem
cantar muito belas melodias e também acompanham a Apolo quando este
tange sua lira. Costuma-se representá-las como três jovens nuas, unidas pelos
ombros; geralmente, duas delas olham em uma direção, e a do meio, na
direção oposta. Teceram o véu de Harmonia e são companheiras de Ateneu,
Afrodite, Dionísio e Eros; podemos invocá-los a todos eles com confiança.

Sêneca se perguntou no De beneficiis "por que são três as graças, por que são
irmãs, por que se colhem da mão?" e se responde: "Pelo triplo ritmo da
generosidade, que consiste em dar, aceitar e devolver", adicionando: "como
gratias agere, significa 'dar as graças' (agradecer); as três fases (desta
operação) devem estar encerradas em uma dança, como o estão as Graças; a
ordem dos benefícios requer que sejam dados em mão, mas que retornem ao
doador". Para os cabalistas cristãos do Renascimento, este símbolo
expressava as emanações celestes que os deuses enviam à terra, que
produzem uma inspirada vivificação nos seres, ou conversão, a partir da qual
estes as devolvem (ou se elevam) para seu lugar de origem. Descreve-se,
pois, um percurso triangular e se retorna ao princípio. Deve aqui se ter em
conta a identidade entre a figura do triângulo e o círculo e seu uso indistinto,
embora haja uma superioridade do primeiro relação ao segundo (32 = 9).

fig. 19

89 ARITMOSOFIA
A escola pitagórica considerava sexuados os números, ou seja portadores de
cargas energéticas positivas e negativas. Assim, os números ímpares eram
ativos, expansivos, masculinos (yang, em termos extremo orientais), e
semelhantes ao céu, enquanto que os pares eram passivos, contrativos,
femininos (yin), e representativos da terra. O número um, manifestação da
unidade metafísica, não era considerado nem como ativo nem como passivo,
e correspondia sexualmente, em termos platônicos e alquímicos, ao
"Andrógino Primigênio". Isto é válido também para a dezena, a centena, o
milhar, etc.

Deste modo, ficava especial interesse nos números chamados quadrados e


triangulares. Os últimos se formam adicionando números inteiros sucessivos
a partir do um, ou seja, que se adicionam os consecutivos da série; exemplos:
1 + 2 + 3 = 6; 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 = 21. Seis e vinte e um são números
triangulares. O mais conhecido destes números é o dez (1 + 2 + 3 + 4),
perfeitamente representado em forma de triângulo na famosa Tetraktys.
Desta disposição triangular é que estes números recebem seu nome, assim
como os quadrados recebem o sua por sua disposição e representação
quadrada, já que eles se formam de maneira semelhante aos triangulares,
começando pela unidade, à qual se adicionam sucessivamente números
ímpares; exemplos: 1 + 3 = 4; 1 + 3 + 5 = 9; 1 + 3 + 5 + 7 = 16; 1 + 3 + 5 + 7
+ 9 = 25. Faz-se notar que 4 é 22, que 9 é 32, que 16 é 42 e 25 = 52, ou seja
que são os "quadrados" desses números.

Os primeiros dez números triangulares são 3, 6, 10, 15, 21, 28, 36, 45 e 55.
Os primeiros dez quadrados: 4, 9, 16, 25, 36, 49, 64, 81, 100 e 121. Pode
observar-se que o número 36 (igual, proporcionalmente, aos 360), é ao
mesmo tempo quadrado e triangular.

De outro lado, quer se destacar que o número cinco era de importância vital
para os pitagóricos, enquanto soma do dois (par, passivo e feminino) e do
três (ímpar, ativo e masculino), motivo pelo qual era chamado "Número
Nupcial". Na Tradição Hermética, este número simboliza o microcosmo e é
representado geometricamente com o pentagrama.

Como dado interessante se adiciona que a soma de um número par com outro
ímpar é necessariamente ímpar, enquanto que o produto da multiplicação de
um par com um ímpar dá necessariamente um número par. Além disso, que a
soma de dois números é forçosamente par se estes números forem ambos
pares ou ímpares. Por outra parte o produto de uma multiplicação, quando é
ímpar, é o resultado forçoso de que seus dois fatores sejam ímpares.

90 TARÔ
XVIII — A LUA: Símbolo da noite,
representa o princípio feminino ou
matriz universal, esposa e mãe doadora
de formas, embora que, por sua vez, seja
deusa da imaginação, da fantasia e da
ilusão. Sua relação com os líquidos é
evidente (a lua determina as marés, a
circulação do sangue e da seiva das
plantas, assim como os ciclos
femininos), e isto a conecta com o
mundo psíquico e os mutáveis estados
do ânimo; como a água, é uma energia
maleável que toma a forma de seu
recipiente. Não tem luz própria, mas
reflete como em um espelho os raios
solares. Foi relacionada com as viagens,
em particular aquelas que se realizam
através das águas e que simbolizam as
mais profundas viagens interiores. E é a
carta da virgindade, ou a vacuidade
necessária para que o espírito fecunde.
Invertida, simboliza o sonho e o
psiquismo desordenado.

DEREITA INVERTIDA
Maternidade - Esposa Ilusões - Fantasias
Fidelidade - Receptividade Negação de sensibilidade
Imaginação - Fantasia Fantasmas - Sonhos - Evasão
Espiritualidade - Intuição Afastamento da realidade
Relação com água - Viagens Instabilidade - Viagens
Maleabilidade - Adaptabilidade Caprichos - Vaidades
Interioridade - Sensibilidade Transtornos psíquicos - Escape
Psiquismo Neurose - Histerias
Câncer - Espelho Subconsciente - Inconsciente

91 MAGIA
Entende-se aqui por Magia (sem desconhecer formas menores, ineficazes e
perversas desta ciência) toda atividade ritual intermediária dedicada a atrair
as energias celestes à realidade terrestre, de acordo com a doutrina
cabalística das emanações, que subordina o mundo elementar e corporal ao
mundo anímico e astral, e ambos ao plano estritamente espiritual ou, em
outra terminologia, intelectual ou pneumático.

Por este motivo, tanto as práticas cultuais, como os encantamentos,


exercícios práticos, concentrações, estudos e meditações, e especialmente a
oração, devem ser efetuados tendo o ânimo e a inteligência postos nas
verdades mais elevadas, no Deus supremo e incognoscível, além de sua
própria criação. Isto fará com que estas práticas teúrgicas, que pressupõem
um conhecimento cosmogônico e metafísico, sejam eficazes e adequadas
proporcionalmente às necessidades cuja satisfação se invoca.

Por outro lado, este movimento descendente de energias e forças que se


estabelece tem que ser completamente interno, ou seja, do exclusivo
interesse do sujeito que as pratica em íntima relação com o benefício do
Conhecimento. Sua característica tem que ser a da realização de um rito
ressonante e rítmico com o universo, e estas correspondências e analogias
que se pretende represar têm que ser efetuadas com um total desinteresse
sobre coisas particulares; ou seja, com um alto grau de "esvaziamento" e de
impessoalidade, para que os eflúvios do mais alto se derramem sobre o
"operário" ou aprendiz de mago, que deste modo pode acessar as realidades
mais sutis e recônditas e as esferas mais altas do intelecto divino, a um
ponto tal que seu próprio ser se encontre identificado, em todo tempo e
lugar, com as mais transparentes emanações do cosmos, e advirta sua
unidade e majestade em todas as coisas de uma maneira natural, pois estas
verdades já são consubstanciais com seu próprio ser. Neste tipo de
identificação com o universo e com o que está além dele, tem um papel
extraordinariamente eficiente a meditação sobre a Árvore da Vida
Sefirótica, como modelo do universo e instrumento veicular e revelador
(como o TARÔ) das energias intermediárias entre a Deidade mais alta e os
seres e as coisas manifestadas de forma elemental, ou material.
92 TARÔ
XVIIII — O SOL: É o centro ou
coração de nosso sistema, ao redor do
qual giram os planetas. Os antigos
renderam culto ao sol, não em um
sentido idolátrico, como se acredita, mas
sim porque viam nele o signo da luz
interna do espírito, e à fonte de toda
vida na terra. Predomina nesta carta a
cor amarela, símbolo do brilho e da
inteligência criadora. Representa um pai
do qual emanam raios de várias cores,
retos e flamígeros -luz e calor- cujas
energias alimentam e fazem crescer a
seus filhos, figurando também a união
da família e do casal, assim como toda
classe de uniões, sociedades e
fraternidades. Em sentido invertido (o
soberbo sol de meio-dia, sua queda e seu
ocaso) é a vaidade, a falsa aparência e o
engano dos sentidos. Também, como
vimos, é relacionado com o ouro, e em
geral com os metais e a mineração.

DIREITA INVERTIDA
Luz - Vida - Calor Escuridão - Deserto – Frieza
Inteligência Falta de sentido - Engano dos
Arte - Criatividade sentidos - Seca - Tristeza
Razão - Energia radiante Falta de espírito criativo
União - Matrimônio - Casal Racionalismo - Vaidade - Sober-
Família - Criação ba - Presunção - Falsa juven-
Fraternidades tude - Decorado brilhante
Sociedades - Associações Brigas - Rixas - Inimizade
Irmandades - Sociedade civil Falso artista - Falsa aparência
93 OS CICLOS E A HISTÓRIA
O processo histórico das civilizações e das culturas está assinalado em
realidade pelas leis dos ciclos e dos ritmos que, como sabemos, são as
mesmas que regem em todas as ordens da manifestação universal. O simples
fato de comprovar que uma civilização, como todo ser, nasce, cresce, decai e
morre, é um exemplo a mais, e bastante gráfico, de que esta segue e repete a
seu nível correspondente a lei quaternária em que se fragmenta todo ciclo.

Servindo-nos uma vez mais das analogias e correspondências simbólicas,


podemos comprovar que os ciclos das civilizações estão todos
compreendidos dentro de um ciclo maior que abrange o da existência
completa da humanidade, que se divide em quatro períodos ou grandes
idades, que os hindus chamam um Manvántara, e que compreende a Idade
de Ouro, a Idade de Prata, a Idade de Bronze e a Idade de Ferro, segundo
termos que tiramos da antigüidade grego-latina. Seguindo com a mesma lei
analógica, os ciclos históricos estão inexoravelmente vinculados ao fluxo e
vazante do tempo cósmico em sua perpétua recorrência. Neste sentido, as
eras astrológicas, nas que um signo zodiacal domina com sua influência um
determinado período histórico, verifica o que dizemos.

Considerada globalmente, a história da humanidade nos apresenta como um


imenso cenário ou cenário (o teatro do mundo) no qual se pode observar
como povos inteiros aparecem e desaparecem obedecendo a uma lei
inexorável. Igualmente podemos ver a história como um grande corpo (tal
como o próprio cosmos) cujos órgãos, e o indefinido de células que o
compõem, têm a missão de fazê-lo funcionar. E assim, como o corpo físico
está animado por um coração que lhe insufla a vida, de igual maneira a
existência e a própria razão de ser das sociedades humanas foram possíveis
por terem albergado em seu interior o depósito sagrado do Conhecimento e
da doutrina metafísica, que não é outra que a Ciência Sagrada.

Sem a presença dos símbolos, ritos e mitos reveladores do supra-humano –e


mediante os quais se pode escapar da recorrência cíclica dos nascimentos e
mortes assinalados pelo Deus Tempo que a tudo abarca– a história careceria
de sentido e seria tão somente um absurdo, pois lhe faltaria o mais essencial,
que é o Espírito; ou sucederia uma mera formulação de dados e datas
enquadrados em compartimentos estanques sem relação entre si, quando na
verdade é justamente o contrário: uma poética onde fica impressa a alma de
homens e de povos.

Se o cosmos inteiro obedecer a um plano e a uma ordem que respondem aos


desígnios divinos e nos quais tudo desempenha uma função e um destino
específico, é óbvio que as civilizações e as culturas tradicionais participaram
da realização e cumprimento desse plano, perpetuando-o em cada ciclo
particular com suas formas e características próprias, avivando e mantendo
assim o fogo inextinguível da Sabedoria das origens. Neste sentido existe
necessariamente um fio de continuidade sutil e invisível entre todas as
civilizações e especialmente entre aquelas que se manifestaram em uma
mesma área geográfica ou continente.

Quando uma civilização, ao esgotar suas possibilidades existenciais, está a


ponto de perecer, outra, mais jovem e com elementos novos vem substituí-la,
produzindo-se com freqüência uma espécie de osmose espiritual ou
transferência dos princípios sagrados de uma para a outra.

94 JANO
Janus-Bifrons, deus romano, de origem assírio-babilônica, e que se encontra
também em outras tradições muito arcaicas, olhe com seu rosto dual nas
direções opostas do espaço e do tempo calendárico. Espacialmente, marca o
eixo Norte-Sul; temporalmente, os solstícios de inverno e de verão. É pois
um mediador entre céu e terra, enquanto faz corresponder ao céu com o
Norte e, inversamente, à terra com o Sul. Igualmente, é a deidade que abre
no hemisfério Norte a porta do ano no inverno –movimento ascendente do
Sol– e a fecha no solstício de verão, quando o astro começa seu curso
descendente. De um ponto de vista iniciático o solstício de verão
corresponde à porta dos homens e constitui a entrada aos pequenos mistérios
da antigüidade, enquanto que o de inverno se vincula com a porta dos deuses
e os chamados grandes mistérios.

Astrologicamente, o verão, associado ao meio dia, corresponde-se com o


signo de Câncer, enquanto o inverno o faz com o de Capricórnio. O Natal
cristão (urânica) celebra-se em 24 de Dezembro, e em 24 de Junho se festeja
a noite de bruxas (ctônica). Nestas mesmas datas, na Maçonaria se recorda
aos dois "São João", o que abre a história evangélica e o que recebe a
mensagem testamentária.

fig. 20

Toda classe de fatos assombrosos e heróicos atribuíram os romanos a Jano,


um dos maiores deuses de seu panteão. Entre outras coisas teria governado
Roma em uma idade de ouro, onde tudo era perfeito. Também era o protetor
da cidade e em tempo de guerra as portas de seu templo se deixavam abertas
para que pudesse ir a ajudar a seus habitantes. Deidade intermediária que
com sua dupla face a tudo assinala, símbolo da ambivalência, em particular
do homem, seus atributos eram a chave e o barco, herdados pelos pontífices
católicos.

Seu rosto central, invisível, está vinculado com o não-tempo, ou tempo


primitivo das origens, e se corresponde no espacial e construtivo com o eixo
de simetria, e portanto com uma via ou caminho de união, de permanente
conjunção de opostos, o que explica que presidisse nos Collegia fabrorum,
os grêmios e iniciações dos artistas e artesãos romanos.

95 SOBRE A GRAMÁTICA, DIALÉTICA E RETÓRICA:


Precedentemente, falamos sobre o tema das sete artes liberais. Então,
dizíamos que ao Trivium (a tripla via) corresponde a Gramática, a
Dialética e a Retórica, ou seja, as palavras, vozes e nomes das coisas e que
no esoterismo cristão se assimilavam respectivamente às esferas da Lua, de
Mercúrio e de Vênus. Para o Alfonso X, o sábio, a primeira destas ciências
"limpa a língua gaga" para que fale de forma reta; a segunda "lima a
ferrugem da falsidade"; a terceira "entalha a obra néscia e a compõe de
formosuras". Igualmente, a primeira "dá ao homem o entendimento"; a
segunda "induz-lhe na crença das coisas" (ou seja: na verdade); a terceira
"admoesta e traz as outras pa acabar os feitos que elas querem" ou
despertam. Do mesmo modo: "a primeira nos ensina a falar diretamente; a
segunda, a ser úteis e agudos; a terceira a dizer admoestando e
ordenadamente".

Com respeito à Gramática, dizia Aristóteles que ela era "escrever o que se
enuncia"; em todo caso, isto tem pouco a ver com o que hoje se entende por
gramática. E está bem claro que ela existia antes que sua mera codificação,
como é óbvio –para estabelecer uma similitude– que o direito existiu antes
que as leis romanas. A pretendida ciência moderna inclui certas rigidezes
que é preciso destruir; a gramática castelhana, tal qual a conhecemos,
nasce no século XVIII e é contemporânea de Descartes e do racionalismo.
Este problema vem de longe: Horácio afirmava que o uso é o árbitro e
senhor das línguas e as normas um artifício auxiliar. Esta mesma crítica é
válida a respeito da lógica, tomada como ciência, e sua assimilação, ora à
dialética, ora à retórica, e pode se pensar com razão que este engano da
mania classificatória vem do fundo da filosofia grega, em grande parte
iniciado pelo próprio Aristóteles, o que deu lugar aos "sistemas" dos
modernos (em especial depois do século "das luzes") e que desgraçadamente
hoje se identificam com a "filosofia".

96 TARÔ
XX — O JUÍZO: Este arcano, por seu
número, foi associado ao século XX. Vê-
se um anjo tocando uma trombeta e
sustendo uma bandeira com uma cruz
amarela. É o símbolo cristão da
ressurreição dos mortos e do juízo final.
Os três personagens nus que se levantam
da tumba, representam o matrimônio
alquímico do enxofre (masculino), do
mercúrio (feminino) e do sal (neutro),
estando o último de costas, representando
o sacerdote que os benze. É a carta dos
anúncios e das revelações, dos chamados
do espírito, e do despertar da consciência.
O esotérico, que por sua própria natureza
secreta se manteve oculto, aqui se faz
visível e sai à luz, anunciando o advento
de um mundo novo no qual a verdade será
acessível a todos os seres, como era na
origem. Símbolo de ritos e cerimônias,
invertida significa a superstição e a
idolatria.

DIREITA INVERTIDA
Revelações - Anúncios Falso espiritualismo - Bulha
Despertar - Realização Ruídos - Propaganda - Escânda-
Coisas esperadas que chegam los - Dificuldade na realização
União - Realidade Impossibilidade de obter a união
Coisas ocultas Superstição - Fanfarronice
O oculto que aflora Espiritismo - Satanismo - "Ritos"
Perfeição - Misticismo Obscurantismo - Idolatria - Fei-
Chamados - Sinais tiçaria - Bruxaria - "Misticismo"
Integridade - Ritos Malefícios - Fantasmas

97 CABALA
A Cabala dá fundamental importância à aparente contradição entre a
transcendência infinita de Deus e sua presença imanente na terra. Em sua
transcendência, o Supremo não pode ser compreendido nem conhecido; sua
imanência, sua criação deste mundo e sua habitação nele, é explicada pela
Cabala, como estivemos vendo ao longo deste manual, por uma série de
emanações sucessivas que constituem o cosmos e a Árvore da Vida
Sefirótica, ou seja, os atributos divinos conformando o Universo.

Mas essas emanações, ensina a Cabala, foram por sua vez originadas pela
Tsim Tsum. Para fazer lugar à criação, Deus se retira e deixa um espaço
descoberto, no qual brilha um pequeno ponto luminoso, a concentração da
luz divina que fará possível a primeira emanação, Kether, e dali no mais, o
fluxo permanente das emanações criativas e reveladoras. Esta é a teoria (no
sentido etimológico do termo) da Tsim Tsum cabalística. Uma "contração"
no espaço interno da deidade, que ao se retirar deixa um resíduo de si
(reshimu), que se converte por dilatação em sua força expansiva e criadora, e
as emanações que dela se desprendem são as que explicam a criação inteira,
o desdobramento do manifestado, e portanto a presença de Deus no Mundo,
a imanência divina.

98 ASTROLOGIA
Como já sabemos, há três signos zodiacais atribuídos a cada um dos
elementos, ou seja: fogo, terra, ar, água. Assim ao fogo correspondem os
signos de Áries, Leão e Sagitário; à terra, Touro, Virgem e Capricórnio; ao
ar, Gêmeos, Libra e Aquário; e à água, Câncer, Escorpião e Peixes, como se
pode apreciar na preciosa gravura logo abaixo.

fig. 21

Algumas especulações astrológicas e herméticas consideram que os signos


zodiacais correspondentes a um elemento se dividem por sua vez em três
tipos de energias ou cargas energéticas: positiva, negativa e neutra; assim,
por exemplo, dos três signos zodiacais associados ao fogo, Áries seria o
positivo, Leão o negativo ou passivo e Sagitário o neutro. Damos a seguir
uma tabela dos signos, sua vinculação com o elemento e sua carga energética
dentro desse mesmo elemento.

Áries Fogo Ativa Libra Ar Ativa


Touro Terra Passiva Escorpião Água Passiva
Gêmeos Ar Neutra Sagitário Fogo Neutra
Câncer Água Ativa Capricórnio Terra Ativa
Leão Fogo Passiva Aquário Ar Passiva
Virgem Terra Neutra Peixes Água Neutra

Ver-se-á então nos signos da terra que Touro é passivo com relação a
Capricórnio, que é ativo, enquanto que Virgem aparece como neutro;
igualmente nos de ar, Libra é ativo, Aquário é passivo e Gêmeos neutro. O
mesmo nos de água aonde Câncer exerce como energia ativa, Escorpião
como passiva e Peixes como energia neutra.

99 A CONFUSÃO ENTRE METAFÍSICA E ASCETISMO:


Muitas pessoas sofrem um pecado que é preciso esclarecer, que pode ser a
raiz de muitíssimos outros males, e que, inclusive, seja-lhes um impedimento
para sua realização. Este equívoco trata-se da tremenda limitação de
compreender o sagrado tão só como santidade, e portanto como algo
inalcançável do qual só são dignos aqueles poucos escolhidos
completamente fora de série, chamados "Santos" (sejam de uma ou de outra
tradição, em particular se o demonstraram com fenômenos, milagres ou
questões paranormais), com toda a carga devota, piedosa, beata e
supersticiosa que essa idéia traz aparelhada. Estes Santos ou santarrões –e
melhor seria se fossem ascetas– seriam os autênticos "mestres" e não os
sábios ou os guerreiros e menos ainda os artistas ou comerciantes, que
certamente são apreciados, e até respeitados, mas aos quais não lhes dá
uma categoria mais que secundária –quase profana– pelo fato de que, em
última instância, estas pessoas às quais estamos nos referindo associam
"espiritualidade" exclusivamente com "santidade", e até com castidade e
outras coisas piores, ou seja: com o "religioso" e com o "moral", e não com
o metafísico.

Quer-se deixar assentado que as vias de realização espiritual são várias, e


distintos os caminhos que a ela levam. E não só são diferentes as formas
tradicionais mas também dentro de cada uma delas há caminhos diferentes
de iniciação. Este manual nos dá numerosos exemplos disso. O que interessa
é a realização do Conhecimento e a obtenção da Sabedoria, o que não
exclui o emocional, nem nenhuma outra experiência encaminhada a esse
fim, e tampouco se opõe ao "religioso", e menos ainda ao moral, sempre e
quando estes conceitos não pretendam usurpar o território do metafísico e
tratar de reduzi-lo, no melhor dos casos, a um mero "misticismo" e, no pior,
a uma moral baseada em certas normas de conduta convencionais que são
julgadas oficialmente como "boas". Normas que dariam sua aprovação
hipotética ao que se deve entender por sagrado de acordo a parâmetros que
esta fixa, baseada na dissimulação derivada do engano de pretender
conhecer o sagrado, quando na realidade ele é suplantado pelo religioso e
pelo moral e, por desconhecimento, identificado sempre com a "santidade"
ou com o "ascetismo", os quais são apenas alguns dos caminhos, quando o
são, na viagem do Conhecimento.
100 TARÔ
XXI — O MUNDO: Esta é a carta do
mundo novo que desce do céu à terra (ver
Apocalipse XXI). Todo o ciclo concluiu e
a obra criacional foi finalmente coroada.
Uma mulher, que faz com suas pernas o
sinal da cruz, encontra-se rodeada de uma
grinalda e de quatro figuras nas esquinas,
que representam aos evangelistas, e dos
elementos e signos zodiacais que lhes
correspondem. O touro é o elemento terra
e o signo astrológico de Touro; o homem -
ou anjo- é o ar e o de Aquário; a águia, a
água e Escorpião; e finalmente o leão, o
fogo e Leão. O umbigo da mulher é o
omphalos do mundo, quintessência, centro
e síntese de toda a criação. Assim como
esta carta direita é extremamente
favorável, em sentido invertido é muito
adversa, indicando as energias próprias do
mundo velho e as forças contrárias que
nos impedem a realização.

DIREITA INVERTIDA
Fim de todo o ciclo – Meta Impossibilidade de chegar à
Coroação da obra meta - Adversidade - Forças
Êxtase - Glória contrárias - Desorientação
Segurança - Apoteose Falta de iniciativa
Perfeição Impossibilidade fatal
Recompensa - Êxito completo Projetos que nunca se
Sentido - Verticalidade realizam - Caminho equivocado
Outro mundo Mundo velho
Circunstâncias favoráveis Multiplicidade - Indisposição
Irredutibilidade - Centro Acontecimentos
Síntese - Boas notícias desagradáveis - Detenção
Chegada a bom termo Trocar-se por ninharias

101 OS CICLOS E OS RITMOS


Pusemos ênfase reiteradamente na necessidade de perceber o tempo não em
forma linear –que é a ordinária– mas sim de modo circular, ou cíclico, que
nos permita ampliar nossa visão. Ainda mais, recomendamos simbolizá-lo
em forma de espira, ou como uma dupla espiral, que nos faça perceber seu
movimento do centro à periferia, e desta novamente à unidade. As tradições
antigas assim conceberam o universo: como o resultado de uma "explosão"
(produzida por um som ou verbo) de uma minúscula partícula de energia,
que continha dentro de si todas as possibilidades latentes desse universo. A
partir desse fato original, o mundo se expande até seus próprios limites,
chegando a um ponto em que finalmente "o tempo se detém" para
empreender um percurso em sentido inverso, contraindo-se, em busca
novamente da origem central, do qual "explode" novamente. Na verdade, da
perspectiva desse mesmo centro, que é eterno, esse duplo movimento é
simultâneo e sempre presente, e é nesse ponto onde devemos tratar de nos
localizar quando fizermos nossas meditações a respeito.

O nascimento e a expansão até chegar ao limite, e seu retorno ou contração


na origem, também percebida como uma morte ou novo nascimento, é uma
lei natural que regula não só o universo como um todo, mas também
qualquer ser ou manifestação particular. A célula, a molécula, cada entidade
dos variados gêneros da natureza, o homem, as civilizações, a terra, o
sistema solar, a galáxia etc., são uma unidade em perpétua harmonia e ritmo.
Cada qual em sua própria dimensão vive ciclos quaternários que se
expressam claramente nas fases do dia e da lua, as estações do ano, as etapas
da vida do homem, dos animais e das plantas, todos os ritmos da natureza e
da história, e, em termos mais amplos, os do cosmos, no qual os antigos
puderam conceber –e calcular– as grandes eras.

Os ciclos astronômicos, como sabemos, são enormes; mas dentro desses


ciclos estão inseridos outros menores, que por sua vez contêm outros, e
assim sucessivamente, até chegar aos menores. Veremos, logo, dois destes
períodos que tomaremos como "módulo" para entrar no tema do que a
tradição chamou "as quatro idades da humanidade".

102 ANGEOLOGIA I
É pela intermediação Angélica que o Absoluto se nos faz visível. "A Deus,
ninguém lhe viu jamais" diz o texto sagrado; mas há um rosto que Deus
mostra ao homem e esse é o Anjo da Face no qual repousa o Nome Divino
Supremo.

Os Anjos são o suporte dos Nomes do Inominável. São Deus e ao mesmo


tempo são cognoscíveis; habitam, ou são, as fronteiras entre o visível e o
invisível, e é por isso que lhes chama mensageiros (em hebreu Malakh).

O mundo angélico é 'Deus em função'; Deus como sujeito ativo. A


criatividade divina se manifesta por seu intermédio, determinando a
diversificação dos seres que, sem se separarem de Deus, garantem a
presença do Divino na terra (Shekhinah). É por isso que sua função é
teofânica.

E assim como a Geometria descreve a 'ordem da terra', a 'ordem celeste' está


constituída pelo mundo angélico e sua estrutura invisível governada pelo
Metatron.

Proporções geométricas e harmonias musicais novas (equilíbrios e conjuntos


de significados) são as primeiras manifestações perceptíveis ao homem que
toma contato com seu ser essencial: com seu anjo. Um Anjo é a realidade
essencial de qualquer ser, ou seja, seu 'sendo' em seu grau mais elevado; e é
por isso que se pode falar do anjo de uma paisagem ou de qualquer obra
criativa. "Teu Senhor Divino e pessoal, é teu Anjo pelo qual Deus te fala de
boca para ouvido"; é também o nome próprio e o 'aroma', a 'melodia'
pessoal.

Os Arcanjos, como arquétipos que são, habitam o mundo beriyáhtico (ou


plano da Criação) no qual se desenvolve o primeiro capítulo do Gênesis. A
denominação de 'anjo', embora seja genérica, dá-se aos espíritos revestidos
de roupagem formal que habitam o plano de Yetsirah (ou Mundo das
Formações).

Os quatro arcanjos que são mencionados costumeiramente (Miguel, Rafael,


Gabriel e Uriel) surgem de e são mobilizados pelo Verbo criador, para levar
a cabo o desdobramento da palavra nos quatro mundos que fluem das quatro
letras do nome de YHVH, e mantêm igualmente guardados os quatro pontos
cardeais ou "quatro campos da Shekhinah".

103 A TRADIÇÃO UNÂNIME:


Muitas vezes o leitor, com o passar do Programa, encontrou-se com a idéia
de uma Tradição Unânime e Universal que, manifestando-se por meio das
culturas e civilizações, adquire distintos modos e conforma diferentes
historias particulares, apesar de que, e além da dissimilitude de seus
aspectos e de uma leitura literal e chã dos mesmos, encontra-se uma
identidade essencial. Isso se deve a que essa Tradição Universal e Unânime,
que se apresenta como algo anterior e horizontal na história, é desde outro
ponto de vista algo vertical e arquetípico, que existiu e existirá para sempre,
ou seja, como algo a-histórico. Nessa ordem de realidades, a Tradição
estará viva perenemente, pois se acha entretecida na própria trama da vida
e é consubstancial com o homem, amém das distintas roupagens em que se
expressa, de acordo às diferentes coordenadas e variáveis de tempo e lugar.

Um dos exemplos mais nítidos desta "coincidência" é a correlação macro-


microcosmo, quer dizer, a inversão (exterior-interior) e conjunção
indissolúvel sempre presente entre o homem e o mundo, sustentada por
todas as tradições.

Esta perspectiva e convicção, que faz do homem um pequeno todo, um


reflexo das energias divinas, manifesta-se também ao longo de seu
organismo físico, recipiendário e contentor das emanações cósmicas, que se
encontram potencialmente vivas em seu espaço corporal. Entretanto, deverá
ter presente que as distintas formas tradicionais, ao nos falarem destas
correspondências, não se estarão referindo exclusivamente ao corpo
humano em seu nível mais denso e elementar, mas sim aos quatro planos e
leituras em que se dividem todos os seres e coisas existentes, dos quais o
mero organismo físico, sua saúde e sua musculatura, é a parte mais
periférica e superficial e, portanto, quase um objeto de culto da extraviada
mentalidade contemporânea.

104 TARÔ
O LOUCO: É uma carta que não tem
número, mas se lhe atribui o 0 ou o 22,
representando o princípio e o fim. Origem
do curinga ou Joker, serve de vínculo
tanto dos Arcanos Maiores entre si, como
entre estes e os Arcanos Menores.
Desprendido de todas suas posses, leva
unicamente uma pequena mochila com
seus instrumentos mágicos, e um bastão
ou báculo, que lhe serve de sustento e
equilíbrio, assim como de união entre a
terra e o céu. Caminha à borda de um
abismo, e um cão -que representa os
perigos- espreita-o; mas ele vai crédulo
no Espírito, como um menino ou um
"primitivo" em estado de inocência,
mantendo a abertura de sua mente e de
seu coração a possibilidades indefinidas,
recebendo assim os eflúvios celestes. O
louco não tem razão, nem pretende
demonstrá-la; embora esteja claro que
não se trata de um estado patológico mas
sim de uma loucura de amor à Vida e ao
Conhecimento.

DIREITA INVERTIDA
Possibilidades indefinidas Eterno retorno
Inocência - Capacidade de Inconsciência - Multiplicidade
assombro - Caminho Caminhante sem rumo - Andar
Peregrinação - Aventura sem sentido - Sensibilidade
Desprendimento - Desapego adormecida - Anestesia
Busca do Sonho - Apegos - Ataduras
conhecimento - Busca Pessoa adormecida
da verdade - Movimento Auto-engano - Infantilidade
Abertura da mente Acreditar-se qualquer conto
Busca do Viagem sem sentido
milagroso e sem meta

105 ARITMOSOFIA
A aritmética tradicional prestava grande importância aos números
"proporcionais", quer dizer, a aquelas cifras que os caracterizavam, sem
importar, salvo de forma secundária, o agregado de um ou mais zeros. Assim
os números 26.000, 2.600, 260 e 26, sendo o primeiro deles a quantidade
"arredondada" correspondente à precessão dos equinócios (ver neste
Módulo, N.º 54), cuja metade é 13.000, ou seja, a quantidade de milhares de
anos do Grande Ano Caldeu e Grego. Quanto a 260, esta é a cifra do
calendário ritual centro-americano; com respeito aos 26, recordaremos que
este número é a soma das letras Iod = 10, Hé = 5, Vau = 6, e Hé = 5,
componentes do sagrado Tetragramaton hebreu IHVH (o nome do Iahvé, ou
Iahveh equivalente ao do Jehová ou Jehovah), nome que por respeito, ou
seja por temor de Deus, não se pode pronunciar, a não ser tão somente se
escrever, de acordo com a tradição cabalística.
De outro lado, e sempre com referência a estes números "proporcionais",
assinalaremos que multiplicar por cinco é o mesmo que dividir por dois. Ex.:
O número vinte e cinco mil novecentos e vinte (correspondente aos anos
exatos da precessão equinocial) dividido entre dois, resulta doze mil
novecentos e sessenta (25.920 ÷ 2 = 12.960); multiplicado por cinco resulta
cento e vinte e nove mil e seiscentos (25.920 x 5 = 129.600). Só há um zero
de mais. Inversamente, multiplicar por dois é igual a dividir entre cinco:
(25.920 x 2 = 51.840); (25.920 ÷ 5 = 5.184). Aqui a diferença é um zero
tirado à cifra-raiz numérica.

Queremos dar um exemplo de trabalho numérico, partindo da base de que se


entende que os números são sagrados e portanto nada tem que arbitrário
neles, nem tampouco nas operações que com eles se efetuam, que produzem
às vezes resultados que assombram, os que a mente primitiva ou tradicional
vive como mágicos, ou carregados de uma energia especial por algum
motivo. Isso se deve a que, de acordo a essa mentalidade, tudo no universo é
solidário e está unido por uma série de relações, às vezes invisíveis, pela
qual nada tem que "casual" neste mundo.

Exemplo: a prática mais simples a observar referida ao expresso


anteriormente é, sem dúvida, uma comprovação geométrica, ou seja: que o
raio de um círculo divide à circunferência, sempre, em seis partes iguais.
Imagine o que é para a mentalidade tradicional esta comprovação efetuada
com uma simples corda com a qual se risca a circunferência, cuja longitude
está contida seis vezes exatas no perímetro esboçado. Sem dúvida isto
obedece a uma realidade mágica, ou melhor, metafísica, e tem uma razão
profunda de ser, e não são simples dados sem nenhum sentido. Este fato é
excepcional para o primitivo e esta comprovação assombrosa aparece
carregada de significados.

Podemos agora fazer uns exercícios numéricos, só com o ânimo de mostrar


alguns aspectos curiosos ou surpreendentes da cábala numérica, aritmosofia
ou numerologia: se ao chamado número vinte e cinco mil novecentos e vinte
o dividimos entre dois, obtemos o doze mil novecentos e sessenta (25.920 ÷
2 = 12.960). Se a esse mesmo número o dividimos por cinco obtemos o
cinco mil cento e oitenta e quatro (25.920 ÷ 5 = 5.184). E se somarmos este
número com o mil duzentos e noventa e seis (proporcional do doze mil
novecentos e sessenta) obteremos o seis mil quatrocentos e oitenta (5.184 +
1.296 = 6.480). Se a esse resultado o dividimos por cinco nos dá OH
surpresa!, Novamente o mil duzentos e noventa e seis (6.480 ÷ 5 = 1.296).
Mas o curioso deste exemplo é que o número seis mil quatrocentos e oitenta
é proporcional aos sessenta e quatro mil e oitocentos, que segundo a tradição
hindu é o número correspondente ao grande ciclo de um Manvántara, que se
subdivide em quatro subciclos relacionados proporcionalmente com as
quatro idades da humanidade: a de ouro dura 25.920 anos, ou seja, a cifra da
precessão equinocial ou o "ano" da terra; a segunda, ou de prata, dura 19.440
anos; a terceira de bronze, 12.960; e a última, de ferro ou Kali Trampa,
6.480 anos. É interessante observar que esta proporção numérica
corresponde à da Tetraktys pitagórica: 4 + 3 + 2 + 1, o que por certo dá 10
de resultado.
106 ASTROLOGIA
No N.º 84 deste mesmo Módulo, dávamos a correspondência dos signos
zodiacais com respeito aos quatro elementos, e ao mesmo tempo a carga
energética que cada um deles possui em relação aos outros dois signos com
os que compartilha dito elemento.

Queremos agora adicionar uma tabela de origem medieval onde se associam


os signos zodiacais com as características de determinadas pedras presentes
na inteira natureza. Desejamos destacar assim a assimilação tradicional entre
a Astrologia e a Alquimia, e recordar que os metais e as pedras são a
maturação das energias dos astros e estrelas sobre a face da terra, e
Analogicamente compartilham as mesmas propriedades e características.

Quente e seca pedras de Áries


Fria e seca pedras de Touro
Quente e úmida pedras de Gêmeos
Fria e úmida pedras de Câncer
Quente e seca pedras de Leão
Fria e seca pedras de Virgem
Quente e úmida pedras de Libra
Fria e úmida pedras do Escorpião
Quente e seca pedras de Sagitário
Fria e seca pedras de Capricórnio
Quente e úmida pedras de Aquário
Fria e úmida pedras de Peixes

Assim por exemplo, ao signo de Escorpião correspondem trinta pedras de


características frio-úmidas, cada uma em relação com um grau desse signo e
com uma estrela especial que tem poder sobre ela. Igualmente é muito
importante o planeta que rege o signo, neste caso Marte, como característica
energética fundamental de todas as pedras frias e úmidas associadas a
Escorpião.

fig. 22
107 TARÔ: INDICAÇÕES PARA SEU USO
As cartas se batem, ou se embaralham, sobre a mesa com ambas as mãos,
deslocando-as com movimento circular, preferivelmente da direita para a
esquerda, como se escreve o alfabeto hebraico (isto deve ser feito assim para
que se mesclem umas com as outras, direitas e invertidas).

As cartas devem ser cortadas, sempre, com a mão esquerda, conforme é


costume.

As cartas têm que ser tiradas do maço da parte de cima, e colocadas sobre a
mesa. Ao abrí-las, dever-se-á ter a precaução de o fazer virando-as
verticalmente (pegando-a, para isso, por seu extremo mais afastado) e
levando a carta para você. Este ponto é particularmente importante porque,
conforme saiam as cartas nas tiragens –quer dizer, direita ou invertida– seus
significados variam completamente posto que se acham invertidos entre si.
Deve se considerar que a carta está direita ou invertida, de acordo a como se
ache com relação ao que lê a tiragem de cartas.

Envolva seu TARÔ em um pano de seda da cor de sua preferência, e


dedique uma caixa especial de madeira para guardá-lo nela.

Acreditamos que você já tem a informação necessária para começar a


praticar este maravilhoso "jogo". Entretanto, antes de começar a explicar as
primeiras tiragens, queremos acrescentar algumas idéias e recomendações
que nos serão úteis para sua melhor compreensão, e conseguir dele maior
proveito. Em primeiro lugar, recordemos que o TARÔ, como todos os
oráculos sagrados, foi desenhado através de símbolos que expressam uma
doutrina cosmogônica; por essa razão, recomenda-se utilizá-lo
fundamentalmente para realizar consultas doutrinais, e só em modo
secundário para fazer perguntas de ordem pessoal, as quais, de todas as
maneiras, serão respondidas. Sugerimos também, muito especialmente
conseguir uma boa versão do TARÔ. Nós utilizamos, como já se viu, o
TARÔ de Marselha, e este é o que recomendamos em primeiro lugar. Ocorre
com todos os livros sagrados que, algumas vezes, foram "traduzidos" com
graves enganos e sérias tergiversações, que em ocasiões até invertem o
sentido original da escritura. O mesmo aconteceu com o TARÔ, e
freqüentemente nos encontramos com certas versões que mais bem parecem
ter sido realizadas para confundir, muitas das quais levam implícitas
"segundas intenções", quando não são o produto de meros fins comerciais.

É muito importante não se afastar em nenhum momento dos Princípios que


se encontram implícitos nas lâminas; às vezes, temos a tendência de ficar no
sentido preditivo dos oráculos, e nos esquecermos a origem de seus
símbolos. Para isto, é recomendável recordar constantemente os significados
numéricos, geométricos, cabalísticos, astrológicos, etc., de cada carta, o que
nos permitirá ter uma compreensão mais cabal deste "Livro". Todos os
símbolos sagrados transmitem também as energias dos sábios e homens de
conhecimento que neles meditaram, o que poderemos comprovar com a
experiência.

Em muitas escolas que utilizaram o TARÔ como veículo iniciático,


costuma-se conhecer primeiro os vinte e dois Arcanos Maiores, antes de
começar a jogar com os Menores e as Cartas da Corte. Para começar, jogue
só com os vinte e dois Maiores. Não utilize as outras cinqüenta e seis
lâminas até que esteja seguro de ser apto para isso.

PREPARAÇÃO

É recomendável guardar o TARÔ –e todos os objetos e livros sagrados– em


um lugar escolhido, fora do alcance dos profanos. É ideal, se você tiver, uma
mesa especial para lê-lo –redonda ou quadrada– e que possa cobri-la com
um pano que lhe facilite o embaralhar as cartas.

É também muito conveniente que você realize um rito –ainda que seja uma
simples cerimônia– quando receber pela primeira vez seu TARÔ. Espere
para abri-lo em um dia de lua nova, ou de lua cheia, e faça-o preferivelmente
em horas da noite. Acenda uma vela (fogo), um incenso (ar) e ponha uma
taça com água. O maço de cartas e a mesa simbolizarão a terra. Tire as cartas
do pacote em que venham guardadas, e logo siga os seguintes passos:

a) Limpeza das cartas: tome todo o conjunto sustentando-o firmemente entre


os dedos polegares e índice da mão direita, e sacuda-o com força por sete
vezes seguidas (em forma similar a como se sacode um termômetro para
baixá-lo), pronunciando em voz alta os nomes dos sete planetas. Pode seguir
a ordem dos dias da semana: Lua, Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus, Saturno
e o Sol.

b) Concentração e visualização: uma vez limpa as cartas, passe-as uma a


uma, concentrando-se em todas as lâminas por um momento. Cada carta é
um mandala e pode servir como suporte para a meditação.

Você já está preparado para realizar sua primeira tiragem. Siga os passos e
recomendações que lhe demos, um a um, com atenção. Faça-o lenta e
relaxadamente.

Em todas as ocasiões que você vá consultar o TARÔ, procure ter os objetos


que lhe indicamos sobre a mesa. Também deve realizar a limpeza das cartas
cada vez que vai se fazer uma nova consulta. Como no princípio só se
utilizarão os vinte e dois Arcanos Maiores, guarde as restantes cinqüenta e
seis lâminas em seu pacote. Nas próximas tiragens, unicamente faça a
limpeza e a concentração com as primeiras vinte e duas. Antes de fazer uma
nova tiragem, ponha sempre as 21 cartas numeradas em ordem de 1 a 21. A
carta sem número, O Louco, coloca-se em primeiro ou em último lugar.

Pergunta: Já limpas as cartas, e depois de se haver concentrado em cada


uma delas, junte-as todas e as ponha sobre a mesa. A pergunta feita ao
TARÔ é muito importante, pois muitas vezes é ela que determina o nível da
resposta. Ponha sua mão direita sobre o maço, procurando tocar as lâminas
com as polpas dos dedos. Concentre-se bem e faça a pergunta clara e
confidencialmente. Com segurança, o oráculo vai lhe responder –
possivelmente, no princípio, a níveis inconscientes–, e esta resposta deverá
ser aceita como solução ao que se pergunta. Se nas primeiras tiragens não
compreende claramente o que tem o TARÔ para lhe dizer, não se preocupe.
Com a prática entenderemos cada vez melhor e retificaremos nossos enganos
de interpretação.

Como embaralhar: Uma vez formulada a pergunta, proceda a revolver as


cartas em forma circular e da direita para a esquerda (como já lhe indicamos,
contra os ponteiros do relógio). Embaralhe-as bem. Saiba que está
transmitindo suas energias ao TARÔ, e que na verdade é de você mesmo de
quem está saindo a resposta. Havendo-as já revolvido pela primeira vez,
junte todas as cartas em um só maço e as ponha com as ilustrações para
baixo sobre a mesa. Corte-as em três grupos com a mão esquerda e as junte
de novo procurando que fiquem em posição diferente de como estavam antes
de cortar. Faça o mesmo um total de três vezes, embaralhando e cortando
cada vez. Logo depois de ter cortado e juntado as cartas pela terceira vez,
ponha-as no centro da mesa. Você já está preparado para fazer a tiragem.

Tiradas ou tiragens: Até este ponto, a cerimônia é sempre a mesma.


Procure repetí-la de igual forma, porque a reiteração do rito lhe outorgará
cada vez maior força e vigor. Daqui em diante o que varia é a forma de
colocar as cartas, ou seja, as diferentes tiragens ou tiradas. Há muitas
maneiras de fazê-lo, e todas elas têm em sua estrutura figuras geométricas.
Se dissemos que cada carta é um mandala, devemos mencionar que cada
forma de as colocar em uma tiragem também o é.

Indicar-lhe-emos a seguir como fazer algumas tiragens, para que comece a


praticar. Recorde que estes trabalhos estimulam a paciência e a
perseverança. Estamos aprendendo uma nova linguagem com a qual, pouco
a pouco, iremos nos familiarizando. De momento, abramos nosso coração e
permitamos que o TARÔ nos transmita sua luz.

A TIRAGEM DA CRUZ

A tiragem da cruz é a mais simples de todas e por sua vez a mais sintética, e
possivelmente a mais perfeita. É excelente para começar a aprender o
TARÔ, e nos será sempre útil quando quisermos obter uma resposta clara e
concisa.

1) Como se realiza a tiragem:

a) Coloque 4 cartas para baixo, fazendo uma cruz, pondo-as na ordem que se
mostra, começando pela de cima.
b) Abra-as uma a uma, como lhe indicamos, virando a carta verticalmente e
para você.

c) A carta central, ou quintessência, é obtida somando os números das quatro


cartas que saíram. Se a soma der 22 ou menos, tire a carta que tenha o
número resultante e ponha-a no centro da cruz, como se dirá. Se soma mais
de 22, faça a redução numérica, obtendo assim a carta central. Se a soma
desse, por exemplo, 68 (20+17+21+10 = 68 = 6+8 = 14), coloca-se a carta
número 14 no meio. Se a carta "O Louco" –à que se atribui valor zero ou
22– sair entre as quatro primeiras, tomará por zero, ou seja, não se somará.
Mas se a soma das quatro dá 22, deve-se pôr "O Louco" no meio.

d) A carta central se coloca direita ou invertida, segundo a posição das outras


quatro cartas. Se a maioria (3 ou 4 cartas) está direita, coloca-se a quinta
dessa maneira. Se a maioria sair invertida, assim se colocará a central. Se
saírem duas direitas e duas invertidas, deverá colocar a quinta deitada
horizontalmente e ler de ambas as maneiras.

Se a soma das quatro cartas desse por resultado o número de alguma que já
tenha saído, isto significa que o oráculo se nega a responder. (Exemplo: se
saíssem as carta números 7, 13, 11 e 3, a soma nos daria 34, que se reduz
3+4 = 7, e este número 7 já está fora). Neste caso junte as cartas, volte a
fazer a pergunta, baralhe e corte uma vez mais, e tente de novo. Se chegar a
se negar outra vez, prove uma última oportunidade. Se isto ocorrer por três
vezes seguidas, indica que o oráculo se nega a responder definitivamente.
Essa negativa já é uma resposta. Guarde seu TARÔ para outra ocasião.

2) Como se interpreta:

a) A carta da esquerda, que colocamos no número 2, indica as energias que


se encontram favoráveis ao consulente; aquelas que lhe beneficiam e que lhe
convém atrair.

b) A da direita (N° 4), assinala as energias que se acham em oposição e que


deve temer e rechaçar. Acontece muito freqüentemente que uma carta
invertida sai favorável, ou que uma direita apareça em posição contrária.
Este é um dos paradoxos –tão próprios dos oráculos e livros sagrados– que
devemos aprender a compreender. Salvar estas contradições é parte
importante do trabalho.

c) A carta de cima (N° 1) é uma síntese das duas anteriores –tese e antítese–
e se deve compreender relacionada com elas. Por sua vez, as duas primeiras
serão mais claras à luz desta terceira.

d) A de baixo (N° 3) é o conselho que dá o TARÔ ao consulente a respeito


da pergunta formulada. Também pode se dar o paradoxo de que, no
conselho, saia uma carta invertida.

e) A carta do centro (N° 5) é a síntese de toda a resposta. Está influenciada


pelas quatro exteriores e, por sua vez, exerce influência sobre elas.

Devemos nos acostumar a ler as cartas relacionando-as umas com outras, e


não isoladamente. Também devemos saber que nem todos os significados
dados a cada arcano são aplicáveis à totalidade das perguntas. Se assim
fizéssemos, estaríamos realizando uma leitura literal que jamais nos
permitiria captar o que o TARÔ nos está transmitindo. Embora convenha
estudar, e até memorizar, as distintas acepções de cada uma das cartas, o
mais importante é despertar pouco a pouco a intuição, para poder reconhecer
a que estão se referindo. As significações que demos variam segundo a
ocasião, ajustando-se à pergunta formulada, e de acordo às relações das
cartas entre si. Pouco a pouco, captaremos o "sentido" dos arcanos, que está
além da soma de seus significados. Na leitura do TARÔ nada deve ser
considerado como "fixo". Uma carta, que em determinadas circunstância nos
diz uma coisa, pode nos dizer algo distinto em diversas situação ou desde
outro ponto de vista. O artista do TARÔ não simplifica nem reduz sua
perspectiva.

Recordemos além que o TARÔ é tão somente um veículo, ao qual nunca


deveremos confundir com a meta a que nos conduz. Também saibamos que
as respostas destes oráculos não devem ser tomadas como um
predeterminismo, nem devemos entender as indicações que obtenhamos para
o futuro como algo que necessariamente ocorrerá. O TARÔ –como acontece
também com a Astrologia e com os influxos planetários– dá-nos certas
pautas a respeito das influências que as energias invisíveis exercem sobre
nós. Possivelmente, o desconhecimento delas –ou sua simples negação, por
ignorância– faz com que certamente nos determinem; mas o conhecê-las
através do oráculo permite nos liberar daquelas que impedem nossos
crescimento e realização espiritual, e aproveitar melhor as que nos
beneficiam.

A TIRAGEM DO ARCO

A tiragem da cruz se refere sempre ao presente. Esta outra forma de colocar


as cartas nos permite observar, além disso, o passado e o futuro. É chamada
também "tiragem do sim e do não", porque as cartas que saem direitas são
consideradas afirmativas, e as invertidas, negativas.

l) Como se realiza a tiragem:

Coloque as cartas, sempre para baixo, na ordem que se mostra:

2) Como se interpreta:

As três primeiras cartas se referem ao passado, sendo a N° l o passado mais


remoto (a origem da situação pela qual se pergunta), a N° 2 o passado
intermédio e a N° 3 o passado imediato, intimamente ligado com o presente.
A N° 4 é o presente, síntese de toda a tiragem. E as três últimas se referirão
ao futuro, da mesma maneira, isto é, a N° 5 ao imediato, a N° 6 ao
intermédio e a N° 7 ao remoto.

Se a tiragem da cruz pode ser vista como uma radiografia ou uma fotografia
do presente, esta deve ser lida mais horizontalmente, como se fora um filme
cinematográfico em que uma imagem vai se sobrepondo à outra,
sucessivamente, a anterior influenciando à seguinte, tal qual acontece com a
ritualidade do carma.

A TIRAGEM DO ARCO E DA CRUZ

Você pode fazer as duas tiragens explicadas anteriormente de maneira


simultânea, colocando-as na seguinte ordem. São lidas em interação umas
com as outras:
TIRAGEM DA ESPIRAL

Esta tiragem leva esse nome pela ordem em que se colocam as cartas, tal
como se pode observar no diagrama. Sua estrutura é o quadrado de 4,
chamado também "quadrado mágico de Júpiter". Esta é uma forma muito
completa de tirar as cartas, pois permite diversos modos de interpretação que
podem ser feitos sucessiva ou simultaneamente.

Uma vez realizada a cerimônia, tal como se explicou, coloque as cartas na


seguinte ordem:

As 12 primeiras cartas, que ficam colocadas na parte de fora do quadrado,


indicam os aspectos mais exteriores da resposta; as cartas colocadas nos
locais 13 a 16 se referem aos mais interiores e ocultos. Divida o quadrado
geral em 4 pequenos quadrados de 4 cartas cada um, e interprete a resposta
da seguinte maneira: a carta situada no posto 13, estará intimamente ligada
com a 12, a 1 e a 2; a 14, com as 3, 4 e 5; a 15, com as 6, 7 e 8, e a 16 com as
9, 10 e 11. Isto quer dizer que as energias simbolizadas pelas cartas de
dentro, influem nas de fora que, por sua vez, se vêem influenciadas por
estas.

As cartas localizadas nas casas de 1 a 4 se referem ao passado, sendo a 1, ao


mais remoto; a 2, ao intermédio; a 3, ao passado imediato, e a 4, ao ponto de
intercessão com o presente, ao que também se referem as posições 5, 6 e 7.
As numerada de 7 a 10 correspondem ao futuro, do mais imediato até o mais
remoto. E as 11 e 12 constituem a síntese da tiragem, que freqüentemente é
contraditória, pois saem cartas que indicam aspectos opostos e
complementares da resposta.

Também soe fazer-se outra interpretação desta mesma tiragem, vendo nas 4
linhas horizontais da mesma aos 4 níveis ou planos do Árvore Sefirótica,
assim: as casas 4, 3, 2 e 1 se referem ao Mundo de Atsiluth; as numeradas 5,
14, 13 e 12, a Beriyah; as 6, 15, 16 e 11, a Yetsirah; e, finalmente, as 7, 8, 9
e 10, a Asiyah.

Como vemos, a mesma tiragem nos pode servir para fazer uma interpretação
no tempo sucessivo, e também para obter uma resposta do presente em
profundidade. A esta tiragem, como as que lhe seguem, podem acrescentar
os Arcanos Menores, à medida que se compreendam seus significados.

TIRAGEM ASTROLÓGICA

Esta tiragem tem uma estrutura similar à anterior, mas em forma circular,
servindo, neste caso, como base o símbolo do Zodíaco. Soe empregar-se esta
forma de colocar as cartas para investigar a respeito de um ciclo completo,
seja pequeno, como um ciclo diário, ou maior, como o do ano, ou para
observar ciclos históricos ou até ciclos cósmicos.

Alguns recomendam fazê-la no dia do aniversário de uma pessoa, ou no


primeiro dia do ano, ou nos dias dos solstícios ou dos equinócios.

Embora neste caso a resposta se referirá às distintas influencias no tempo


sucessivo, diz-se que todas as leituras do TARÔ têm que se referir sempre ao
presente, vendo pois o passado e o futuro da perspectiva do agora.

Coloque as cartas na ordem que se indica logo a seguir, determinando


previamente a magnitude do ciclo que quer investigar e o tempo ao qual se
referirá cada uma das cartas:

Como na tiragem anterior, as 12 cartas que ficam colocadas fora se referem a


aspectos exteriores, e as 5 de dentro aos mais interiores, estando igualmente
a casa 13 ligada às numero 12, 1 e 2; o 14, às 3, 4 e 5; a 15, às 6, 7 e 8; e a
16, às 9, 10 e 11. Neste caso a carta 17 será a síntese da tiragem, e deverá ser
lida no direito e no invertido, na mesma proporção em que tenham saído as
outras 16 cartas, direitas ou invertidas.

Esta tiragem se presta também para fazer diversas especulações e cálculos


referentes aos simbolismos astrológicos, atribuindo-se a cada uma das 12
cartas exteriores, os 12 signos zodiacais; as 4 cartas da cruz interior
corresponderão aos solstícios e aos equinócios, e a 17 e última será o centro,
síntese e quintessência imóvel da roda cósmica. Recorde-se que a esta
tiragem podem ser adicionados Arcanos Menores, uma vez que se
compreenda seu sentido.

A TIRAGEM DAS CASAS ASTROLÓGICAS

Assim como o zodíaco, em seu ciclo anual, divide-se em doze signos


mensais, se o virmos em um ciclo diário, a roda zodiacal fará também um
percurso aparente completo ao girar a Terra ao redor de seu próprio eixo.
Alguns astrólogos consideram que, durante as vinte e quatro horas que
seguem ao nascimento de uma pessoa, refletir-se-á toda sua vida. Para fazer
as observações, dividem a roda do zodíaco em doze Casas e fazem
corresponder duas horas a cada uma delas. Isto determinará o signo
ascendente e descendente do indivíduo e diversos aspectos de sua
personalidade.

Estas doze casas são:

I. Vita: é a casa do nascimento que indica as particularidades, tendências,


talentos e potencialidades do indivíduo.

II. Lucrum: refere-se ao plano material, aos bens, riquezas e aquisições,


assim como à alimentação e ao mundo físico.

III. Frates: casa dos irmãos, e também da educação, da instrução e da


adaptação ao meio. Relaciona-se com viagens menores.

IV. Genitor: é a casa dos pais e das características herdadas do meio familiar
e social. Refere-se também ao patriotismo e às sucessões.

V. Filii: esta casa está relacionada com os filhos, e em geral com o que o
indivíduo produz, cria e engendra.

VI. Valetudo: casa dos súditos, dos escravos e dos animais domésticos, é
também do trabalho, dos deveres e das obrigações.

VII. Uxor: refere-se ao matrimônio, aos afetos e às uniões, e também às


alianças e às associações.

VIII. Mors: é a casa da morte e das grandes transformações. É também da


decomposição e da putrefação.

IX. Peregrinationes: casa das peregrinações e grandes viagens, está


relacionada com a espiritualidade, com a filosofia, a religião e o mistério.

X. Regnum, Honores: relaciona-se com os objetivos, as dignidades e a


glória, assim como com a profissão, as ambições e as recompensas.
XI. Amici benefacta: casa dos amigos, benfeitores e admiradores.

XII. Inimici: nesta casa se vêem os inimigos ocultos, a prisão, o exílio, assim
como as enfermidades, debilidades e doenças.

Queremos apresentar a seguir uma tiragem diretamente vinculada com estas


casas ou mansões astrológicas.

Depois de realizar os ritos próprios de qualquer tiragem já explicados,


coloque doze cartas intimamente vinculadas com as casas zodiacais, nos
seguintes postos, desta forma:

Deve ler o significado de cada carta que sai relacionado com os sentidos
atribuídos a cada casa. Ou seja, que têm que se combinar, para a
interpretação, os símbolos das cartas em relação às doze mansões, que
permanecem fixas e inalteráveis quanto a seus valores. Podem-se mesclar os
arcanos maiores e os menores nesta tiragem, assim como utilizar
exclusivamente os maiores.

A TIRAGEM DA ÁRVORE DA VIDA

Esta tiragem é especialmente adequada para estabelecer relações,


principalmente se já tivemos práticas com a Árvore Sefirótica e estamos bem
familiarizados com ela.

Coloque as cartas na ordem que se indica, que é o mesmo da Árvore da Vida


da Cabala:
Observe as diferentes cartas que tenham saído em cada uma das sefiroth, e
estabeleça as correspondências. Isto lhe permitirá inter-relacionar umas com
as outras, pois cada carta, como vimos, corresponde também a uma delas
[N.T. sephirah], e seu simbolismo nos ajudará a compreendê-la melhor.

Costuma-se realizar esta tiragem para fazer uma análise do momento


presente e, muito freqüentemente, para nos observar internamente nas
diferentes fases de nosso processo. Para esses efeitos, divida a Árvore nos
quatro planos –conforme o vimos– e relacione especialmente as cartas que
se encontram em cada um deles, o que lhe permitirá conhecer sua realidade
oculta nos diversos níveis do ser.

Podem ser tirados, também, dois percursos da Árvore da Vida, um de cima


para baixo e o outro de baixo para cima, observando neste caso as energias
descendentes e ascendentes.

Também, se a pergunta assim o requerer, pode se corresponder uma destas


Árvores ao passado e a outra ao futuro, embora, como sempre, vendo-as da
perspectiva do presente.

As cartas do TARÔ podem ser visualizadas, conforme o comprovamos,


desde muito diferentes pontos de vista. Como elas expressam, a sua maneira,
uma cosmogonia, constituem um pantáculo, ou pequeno todo, capaz de nos
fazer compreender o macro e o microcósmico expressando-se em uma
perfeita harmonia. O dito sobre o TARÔ, deve ser entendido –como já o terá
observado o leitor atento– em relação com toda a informação que demos. Os
temas tratados constituem uma unidade, e estão entretecidos de tal maneira,
que as mesmas idéias vão sendo expressas através de diversos símbolos,
obtendo-se sua compreensão e vivência pela reiteração ritual que com o
estudo, a meditação e as práticas que sugerimos, vai realizando no interior da
consciência de cada um. As cartas cumprem a função de evocar pensamentos
e relações que despertam a inteligência, e também a de nos recordar –graças
ao estímulo visual do símbolo– as idéias que estão nelas contidas. Fizemos
especial ênfase nas relações dos arcanos com a Árvore da Vida Sefirótica,
pois esta constitui sua estrutura essencial e invisível, e nos permite conectar
as cartas com os princípios da Numerologia, da Astrologia e da Alquimia, e
todas as demais artes e ciências sagradas, gnósticas e herméticas, como uma
unidade, em forma global.

Recordemos que o TARÔ é um livro sagrado, e que além disso é um oráculo


e, à vez um magnífico conselheiro. É por meio da prática, e sempre tratando
de encará-lo no nível mais alto, que descobriremos suas múltiplas virtudes.
As idéias e relações expressas a respeito de cada um dos arcanos, são só
chaves que o estudante deverá utilizar por si mesmo, abrindo com elas as
portas do entendimento. Sendo suas possibilidades virtualmente ilimitadas,
aos interessados corresponderá a tarefa de desenvolvê-las e de ampliá-las, o
que redundará –estamos seguros– numa melhor compreensão e realização do
trabalho interno que toca a cada um, segundo suas possibilidades. "Conhece-
te a ti mesmo".

108 MEMORANDUM
A disciplina fortalece o caráter e preludia a fecundação e a realização
espiritual. O abandono do meio e a mais profunda solidão se fazem
necessários, até se tornarem imprescindíveis em determinados momentos,
onde o silêncio é autêntico refúgio e o isolamento, protetor castelo interior.
Para isso, então, já se advertiu a impostura de considerar à solidão como um
tabu angustiante, ou como a ausência de uma "felicidade" (tão inexistente
como cobiçada); mas, pelo contrário, [deve se considerar a solidão] como a
predecessora de um mundo encantado de imagens mágicas, de sombras e
luzes da memória do universo, refletidas no cenário da consciência. (Tudo
isto é algo novo, ou simplesmente estava aqui e não fomos capazes de vê-lo
porque tínhamos uma descrição diferente e equivocada da vida?).

Mas, a par de descobrir estas maravilhas, o aprendiz observará que o meio


tratará de marginalizá-lo, talvez em proporção direta com seu interesse em
fazer partícipes aos outros, indiscriminadamente, do real conteúdo espiritual
de suas novas experiências, achados e conhecimentos. Motivo pelo que o
silêncio, não só como disciplina, mas como norma efetiva e prática de
comportamento, foi sempre recomendado no trabalho hermético. Isto choca
com a necessidade de expressar a doutrina na época em que vivemos, onde
se converteu em um algo quase imprescindível dada a ausência de vozes que
se elevam para fazer conhecer, difundir e defender a ciência sagrada,
virtualmente esquecida pelo homem de hoje, e desconhecida pela maior
parte dos contemporâneos.

Por outra parte deve se destacar que às vezes os neófitos, sumidos em seus
profundos trabalhos de realização metafísica, mágica e espiritual, esquecem
o exilados que estão nesta terra, e podem chegar a acreditar que os demais,
que todo mundo, participa da realidade de suas crenças, quando isto
obviamente não é assim mas, pelo contrário, muitas das coisas ligadas à
Tradição são olhadas pelo mundo moderno com um ódio revulsivo, uma
repugnância irracional, ou um desprezo olímpico, tão exatamente invertidas
estão as coisas entre o mundo sagrado e o profano, entre o Conhecimento e a
ignorância.

Fim do Módulo II
INTRODUÇÃO À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha
MÓDULO III

1 TARÔ
As 16 cartas chamadas "da Corte", somadas aos 22 Arcanos Maiores e os 40
Menores, completam os 78 arcanos do Tarô.

A estrutura destas dezesseis cartas está em relação com o quadrado de quatro


(4 x 4 = 16), símbolo que foi venerado na Antigüidade, particularmente entre
os pitagóricos.

Este grupo de lâminas está constituído por 4 figuras: Rei, Rainha, Cavaleiro
–ou Cavalo– e Pajem que se repetem em cada um dos 4 naipes do baralho.

Já dissemos que estes naipes ou cores –Paus, Espadas, Copas e Ouros–


correspondem-se de modo preciso com os 4 mundos ou planos da Árvore da
Vida: Atsiluth, Beriyah, Yetsirah e Asiyah, e portanto também com os
respectivos elementos (fogo, ar, água e terra) que, segundo estudamos, estão
vinculados de modo geral com quatro estados do ser (espírito, alma superior,
alma inferior e corpo).

Cada uma das figuras da corte se faz corresponder também a um elemento e


a um mundo: o Rei ao mundo do fogo e do espírito; a Rainha, relacionada
com o ar, à alma superior; o Cavaleiro (água) à alma inferior; e o Pajem se
localiza no mundo material, figurado pelo elemento terra.

Estes quatro mundos, planos, estados ou níveis, não estão separados, mas
constituem uma unidade e, portanto, são inter-relacionados intimamente até
o ponto de, como explicamos, em cada plano da Árvore da Vida se achar
uma Árvore inteira com seus quatro mundos.

Os 16 Arcanos da Corte nos levam ao conhecimento dessas relações que têm


os 4 elementos entre si, de modo semelhante a como o faz também a
Astrologia e alguns outros oráculos como o I Ching.

Para compreender melhor como se estabelecem ditas relações utilizando


estes arcanos, poremos dois exemplos: o Rei de Copas estabelece um vínculo
entre o mundo do espírito (Rei) e o psiquismo inferior (copas). Segundo a
linguagem cabalística que temos utilizado, poderíamos chamar esta carta de
"Atsiluth em Yetsirah", já que relaciona o fogo (Rei) com a água (copas), e
nos pode ajudar a decifrar a influência do espírito em nosso psiquismo
individual; outro: um Pajem de Espadas (Asiyah em Beriyah), estar-se-á
referindo, pois, à relação do mundo material com os arquétipos puros da
criação, ou seja, da terra com o ar; desta maneira, cada uma das 16 Cartas da
Corte se vinculará então a 2 elementos e dois mundos, vendo-se também
nelas as influências que um plano exerce em outro.

As Cartas da Corte são também (como os elementos e os mundos) o símbolo


da hierarquia quaternária que rege e ordena o universo, a natureza, as
sociedades e os homens. Disse-se que estas últimas 16 cartas respondem a
um quaternário referente ao que a tradição indiana entende pelas castas,
inclusive as relacionando com a influência e o poder que essas castas têm no
devir histórico. Desde esse ângulo de visão, os reis corresponderiam aos
sacerdotes (ou imperadores-sacerdotes), as rainhas à nobreza e aristocracia,
os cavaleiros à burguesia comercial, política e administrativa, e os pajens aos
camponeses, peões, funcionários e pessoal de serviço. Conquanto essas
divisões existem, e são fundamentalmente espirituais e simbólicas, nada têm
que ver com as concepções atuais de classe, baseadas no econômico, cultural
ou racial. Desde faz muitos séculos os filhos de um mesmo casal podem
pertencer a castas espirituais diferentes.

2 AS QUATRO IDADES
Para a tradição indiana, "de cada poro de Brahma brota um universo a cada
instante", e um ciclo de vida de um universo é chamado Kalpa, ao qual se
representa como uma respiração desse Ser invisível. Um Kalpa está por sua
vez dividido em quatorze Manvántaras, sendo cada um destes últimos um
ciclo humano completo de existência, ou um “dia” da terra, o qual por sua
vez é subdividido em quatro yugas, ou sub-ciclos, tal como às quatro idades
dos gregos.

Podemos encontrar nas mitologias dos povos a recordação de um tempo


primordial; um paraíso perdido –ou Idade de Ouro– na qual o homem vivia
em perfeita harmonia com o cosmos e a natureza, em “estado de graça” e
perene presença do Espírito. Nesse illo tempore, que os indianos denominam
Satya Yuga, os homens se identificavam com os deuses, e a verdade, como a
montanha, era visível para todos. Foi desses antepassados míticos que a
humanidade herdou a cultura verdadeira e os valores espirituais mais
elevados. No entanto, em razão das leis cíclicas, esse tempo foi seguido por
outras idades, cada vez mais restringidas, nas quais se foi perdendo, pouco a
pouco, o estado virginal das origens, os deuses caíram e a verdade teve que se
ocultar no interior da caverna, no mundo subterrâneo, e revelar-se
unicamente a uns poucos.

À Idade de Ouro ou Satya Yuga, seguiu uma de Prata ou Treta Yuga; depois
veio a de Bronze ou Dvapara Yuga; e finalmente a de Ferro ou Kali Yuga
que, segundo dados astrológicos tradicionais, está a ponto de chegar a seu
fim.

Observemos agora dois ciclos: um, o de 25.920 anos, ao qual nos referimos
no Módulo II, título 54; o outro, mais amplo, de 64.800 anos, relacionado
numericamente com aquele. Uma maneira de vê-los é divididos em quatro
partes iguais, em cujo caso a cada uma das fases do primeiro seria de 6.480
anos e as do segundo de 16.200. Mas outra forma tradicional de subdividir
estes ciclos, que nos dá outra perspectiva sobre os mesmos, é a qual obtemos
utilizando a lei da Tetraktys pitagórica (10 = 1 + 2 + 3 + 4), em cujo caso se
atribui a cada uma das idades os seguintes números:

10 = Ciclo de: 25.920 anos 64.800 anos


4+ Satya Yuga = 10.368 + 25.920 +
3+ Treta Yuga = 7.776 + 19.440 +
2+ Dvapara Yuga = 5.184 + 12.960 +
1 Kali Yuga = 2.592 = 6.480 =
25.920 64.800

Por isso, desde o ponto de vista do primeiro ciclo pode se ver o começo do
Kali Yuga numa data muito próxima ao século VI a.C. (faz 2.592 anos),
enquanto desde a perspectiva do segundo esse começo se remontaria a 6.480
anos antes do fim de ciclo. Em todo caso é notável observar que os dados da
tradição nos mostram que ambos os ciclos estão chegando a seu final, e que
nos encontramos num ponto de transição, fato que a sua vez anuncia o
advento de uma nova Idade.

3 ARITMOSOFIA
As Magnitudes Lineares e Suas Proporções. As civilizações do Extremo
Oriente e as pré-colombianas tomaram o número cinco como seu modelo
matemático. Os pitagóricos o fizeram com o número dez. Isto supõe uma
perfeita concordância já que o cinco corresponde ao módulo dos dedos de
uma mão e o dez ao das duas. A mão, ou as duas mãos (e ainda em alguns
casos a soma dos dedos das mãos e os pés = 20), constituiu o modelo
numérico de onde derivaram todos seus conhecimentos macrocósmicos e
microcósmicos, que desde então não são pouca coisa, já que com este
módulo foram construídas as extraordinárias civilizações que hoje nos
assombram e que chegaram a calcular as distâncias e revoluções das estrelas,
inclusive o terceiro movimento, como de pião, da terra, chamado precessão
dos equinócios, que ela efetua cada 25.920 anos. Isto se deve às analogias
que estabeleceram entre todas as coisas e que a ciência mais moderna e seu
instrumental confirmam, pois é óbvio que inumeráveis gerações de homens –
ainda que vivessem 900 e 700 anos como na Bíblia se afirma– não poderiam
ter uma experiência deste último fato. Daremos só um breve exemplo das
proporções lineares referidas às potências de dez (as duas mãos).
fig. 23

Se o homem é dez elevado a zero (100), poderíamos dizer que sua habitação é
101. Dez à segunda potência (102) seria o campo que lavra um agricultor e
que rodeia sua casa. 103 seria equiparável à comarca que habita, enquanto 104
constituiria sua província e 105 seu país. Dez à sexta potência (106) seria seu
continente e 107 o mundo inteiro. 108 constituiria o sistema solar e 109 o
Universo infinito; nesse caso dez à décima potência que seria?

Quer-se destacar que a série decimal é especialmente apta para as medidas


lineares, enquanto a baseada no seis –ou em sua metade o três, e seu dobro o
doze– e particularmente no nove (igual a 32 ou a 3 + 6) está relacionada com
as medidas ou módulos circulares, ou seja aqueles que têm evidente conexão
com o perímetro da circunferência (360°).

4 ALGUMAS ADVERTÊNCIAS BASICAS


– Todos os sábios e todas as antigas e altas civilizações destacaram o
símbolo e a via simbólica, como veículo esotérico e mágico de realização,
para aceder aos arcanos mais secretos e ocultos dos mistérios
cosmogônicos, ou seja, do Homem e do Universo.

– Devemos considerar a diferenciação que há entre o esotérico e o


exotérico, como duas leituras diferentes –e opostas– da realidade. O
esotérico se relaciona com o invisível, oculto e secreto, tal o ponto central
do círculo (ou eixo da roda); e o exotérico com o periférico, superficial,
externo e com a circunferência (que se realiza tomando o ponto como
princípio de partida) e assim mesmo com o movimento mutável da roda.

– O menor é o mais poderoso.

– Como bem se diz, o Ensino chega quando o estudante está a ponto para
recebê-lo. A saber: quando sua necessidade é absolutamente imperiosa.

5 NOTA:
A esta altura do Ensino, há a possibilidade de que você ainda não saiba ou
compreenda com clareza qual é verdadeiramente o conteúdo deste manual.
Não o dê então por sabido –como costuma ser o habitual– e volte a estudá-
lo relendo em profundidade e com suma lentidão (retardando o tempo) tudo
o que nele se contém. É muito mais nobre e produtiva esta humildade, ou
melhor, esta franqueza para consigo mesmo, que supor o que ainda não se
sabe ou colocar uma rápida etiqueta àquilo que se quer despachar para sair
outra vez do passo. Estas releituras lhe brindarão mais de uma surpresa e
lhe oferecerão numerosas perspectivas, com as quais, neste momento, talvez,
você não creia contar. Pensamos que é válida e nos está permitida a
sugestão anterior avalizada pela experiência na realização de nosso
Programa.

6 O MESTRE
Queremos aqui dizer umas palavras sobre alguns mal-entendidos vinculados
ao "mestre", próprios da confusão em que se existe, que obedecem a uma
dialética descendente do ciclo que o Ocidente e sua influência mundial
exemplificam, já que este pensamento profano se infiltrou no mundo inteiro.
Não nos referimos exclusivamente a determinadas apreciações que se fazem
sobre o particular, envolvidas com o simples poder pessoal em qualquer de
suas formas, nem às versões "cinematográfico-televisivas" sobre o tema.
Tampouco a uma forma de "sublimação", tanto seja esta dos temas que se
ensinam, como daqueles que os distribuem. Teme-se sempre, nestes casos,
uma falsa perspectiva com respeito à autêntica espiritualidade, que é
suplantada por adesões afetivas, ou empanadas pela penumbra de uma
"crença" demasiado materializada. Todas estas possibilidades podem se
enquadrar numa perspectiva linear e estreita, numa visão literal e –ainda que
não se queira– racionalista, quando não sentimental e seguramente
dependente. Estamos nos referindo às falsas idéias a respeito do "Mestre
Superman", aquele que possui maiores poderes físicos e psíquicos do que os
demais mortais, e ao tabu dos "dons" e do "ascetismo" deste personagem, ao
que se lhe destaca por seus egos, e não por seus Ensinos Metafísicos
diretamente conectados com o Espírito. Para pior, como alguns destes
"poderes" e "dons" simbólicos são verídicos quanto àqueles que vão
superando suas provas de Iniciação –ainda que jamais vistos desde uma
perspectiva grosseiramente materializada– criam-se muitas confusões que,
tal como são, não somos capazes de resolvê-las.

A rigor, na Tradição Hermética e na Alquimia, a Doutrina e o Ensino que o


estudante aprende são um só, e este é o Conhecimento da Cosmogonia, a
saber: a interpenetração de outros tempos, espaços, ritmos e estados de
consciência diferentes dos ordinários, que são realidades tão autênticas –
quando menos– como as concepções tomadas do cúmulo de esfumaturas e
ineficiências que se nos oferece a sociedade contemporânea. Nesta tradição,
os introdutores e iniciadores não são considerados "mestres" no sentido de
exercer uma função de tipo psicológico ou de autoridade institucional, ou
mesmo de exemplaridade em determinados usos e costumes que o mundo
pode mudar uma e outra vez a seu desejo, de acordo a suas modas que
perenemente ficarão na relatividade das formas. Não se faz, pois, tanta
questão quanto ao "mestre", porque se ensina que a Realização é individual e
que se a deve conseguir cada qual por si, inevitavelmente. Pelo que se
aconselha ao leitor que não ponha em outros o que em verdade deve
trabalhar em si.

Devemos recordar que, segundo Platão, seu mestre Sócrates identificava sua
função com a de um obstetra, o que equivale a dizer que não considerava seu
ofício como algo idealizado e magisterial segundo o imaginam nossos
contemporâneos. O verdadeiro Mestre é uma energia celeste que se faz em
nós, já que em nossa interioridade existe essa possibilidade. O autêntico
Mestre é divino, é o Cristo interno, como o foi para os cristãos primitivos e
como o é para todos aqueles que não têm uma visão infantilóide das coisas.
A dificuldade de aceitar os ensinos deste Programa e realizá-los reside nesta
questão, ou seja, que o leitor deve fazer seu trabalho por si, à intempérie, em
solidão, sem o amparo que lhe brinda o que vulgarmente se entende por um
mestre, a identificação com uma etiqueta ou esta ou aquela "instituição" mais
ou menos aceita pelo meio.

7 EGITO
"... dado que o país santo de nossos antepassados se acha no Centro da Terra
e corresponde à zona média do corpo humano, santuário do coração,
habitáculo da alma, por esta razão, filho meu, os humanos desta região, não
menos dotados do que os demais pelo que faz ao resto do corpo, são
excepcionalmente mais inteligentes do que os restantes e mais sábios, dado
que nasceram e cresceram no lugar do coração." (Hermes Trismegisto,
Ensinos Secretos de Ísis a Hórus.)

A importância do Egito na história de nossa tradição é fundamental, já que


Kemi (nome dado ao Egito antigo, que significa "terra negra", origem da
palavra Alquimia), é berço de toda a cultura ocidental e particularmente do
Hermetismo.

Segundo Plutarco, os egípcios comparam sua terra a um coração que


representa também o céu. Esta visão, que concebe ao espaço habitado pelo
homem como um reflexo do celeste e como uma região central e sagrada, é
comum a toda civilização que provém da Tradição Primordial, como é o
caso da egípcia, que compartilha com as altas culturas as verdades
essenciais.

Thot, o deus egípcio que posteriormente tomará entre os gregos o nome de


Hermes, é o que ensina a Ísis a arte sacerdotal que esta deusa transmitirá a
seu filho Hórus. Estes mistérios são passados aos hierofantes, guardiões e
transmissores de uma Sabedoria divina e esotérica, que se deposita e se
revivifica nos símbolos, mitos e ritos dessa grande cultura, que com outras
formas será também conhecida por gregos e romanos e pelo Ocidente
medieval e renascentista.

O esquartejamento de Osíris nas mãos de Seth e a restituição que de seu


corpo realiza Ísis, unindo o disperso, foi no Ocidente o modelo simbólico da
Iniciação (morte e ressurreição). Guiados por Hermes e com o auxílio de
Ísis, viajam os mortos para a verdadeira morada, num trajeto que é análogo à
viagem iniciática. Ísis, no Egito, como Deméter em Elêusis, é a que institui
as iniciações entre os homens e a que ensina seus ritos.

É clara a relação entre Egito e a cultura judaica. Recordemos que José, o


filho de Jacó, foi vendido por seus irmãos a uns mercadores ismaelitas que
lhe levaram ao Egito e, graças a seus dotes adivinhatórios, chegou a ser vice-
rei, governando como outro faraó. Ali recebeu posteriormente seu pai e seus
onze irmãos (Gênesis, 37 a 50) e, a partir deles, as doze tribos de Israel se
engendraram em terras egípcias nas quais permaneceram até tempos de
Moisés que, como é sabido, foi educado na corte faraônica.

É interessante também observar que José e Maria com o menino Jesus, por
conselho de um anjo que apareceu em sonhos, fugiram ao Egito para escapar
da matança de Herodes, “a fim de que se cumprisse o que tinha pronunciado
o Senhor por seu profeta, dizendo: “Do Egito chamei o meu filho” (Mateus,
2, 15)”. Alguns afirmam que Jesus regressou a esse país durante sua vida
oculta.

Existe um paralelismo indiscutível entre os deuses egípcios e os das


mitologias grega e romana, o que demonstra uma clara influência da
cosmovisão egípcia sobre a greco-romana, que se confirma com o fato de
que vários pensadores pré-socráticos, encabeçados por Pitágoras, receberam
boa parte de sua formação diretamente dos iniciados egípcios, que teriam
transmitido a este último muito dos conhecimentos matemáticos,
geométricos, musicais e astronômicos que nutriram nossa cultura até o dia de
hoje.

Também é notável que tenha sido em Alexandria, no delta do Nilo, onde se


desse uma assombrosa reunião de sábios de diversas tradições, nos séculos
II, III e IV de nossa era, produzindo-se uma síntese da gnose egípcia, grega,
romana, judaica e cristã, que dali passou ao Ocidente medieval, alumiando
toda a história da Europa e do Próximo Oriente.

O antigo Egito se localiza na origem do Kali-Yuga e com segurança é a


ponte que une esta era com as anteriores. As similitudes entre esta
civilização e as culturas americanas pré-colombinas (especialmente no
simbolismo construtivo) fizeram pensar a muitos que ambas provêm da
desaparecida Atlântida.
8 PERFEIÇÃO OU PERFECCIONISMO?
Por quê? Por que o infinito amor do Universo se manifesta na confrontação
de suas criaturas? Por que o terremoto da ilusão? Para que existe um
mundo imperfeito onde o mau e a injustiça dominam?"

Tratemos de reflexionar: quem é o que fala, o que divaga desta maneira?


Resposta: um perfeccionista, um interessado em mudar o rumo das coisas,
do plano divino. E poderíamos reperguntar a esse personagem: De que
serviria criar o melhor de acordo às normas de uma organização ilusória
baseada nos benefícios da ciência e da saúde? Quem poderia "melhorar" de
acordo ao estabelecido por uma entidade imaginária? Em todo caso, por
que se deveria "melhorar", e em que aspecto? E quem seria capaz de
certificar essas "melhorias", esse status anímico, esse "conforto espiritual"?
Todo homem é mortal, tarde ou cedo acaba; sua viagem verdadeira é um
retorno às origens. O ego chamado, hoje, desejo de "perfeição" relativo a
certos tesouros, que não são sempre o sexo ou o dinheiro, senão que
constituem para cada qual o que imaginariamente crê ser, ou suas
aspirações a respeito, é algo perigosíssimo; uma mania que pode ser
assassina.

Educar a outros no erro, seja no de uma psicologia higiênica, ou no de uma


moral legalista, ou uma cultura desodorizada (quando não se os lança a
uma concorrência sem meta verdadeira) é aceder ao caos ainda que pareça
o inverso. É pretender "o melhor" deixando o bom de lado.

Se a perfeição é boa e desejável, o perfeccionismo pode chegar às vezes a


ser o contrário dela. Por outro lado, a perfeição é algo difícil de obter e o
perfeccionismo algo demasiado fácil de conseguir, até o ponto de constituir-
se em algo mecânico, completamente afastado da sensibilidade. Toda
perfeição de alguma maneira é uma imagem da Perfeição e portanto uma
aspiração por aquilo que se desconhece e se anseia receber. O
perfeccionismo é ativo e pretende efetuar lucros para utilizar dividendos.
Esta atitude é racional enquanto a primeira é intuitiva. Em termos cristãos a
perfeição aspira à Vontade do Pai, enquanto o perfeccionismo tende à
vontade do homem. Nesses mesmos termos se afirma: "Sede perfeitos como
vosso Pai Celestial é Perfeito", mas está bem claro que esse Pai Celestial
não está preocupado por fomentar sua própria perfeição, constituir a
demagogia nem por "cultivar seu espírito". Desde que haja uma identidade
entre esse Pai e o Cosmos, porque de jeito nenhum Ele está fora de sua
própria expressão. Se o leitor de Agartha tende à perfeição, não é por um
perfeccionismo auto-suficiente que presume de bastar-se a si mesmo,
impressionar a terceiros, ou instituir fábulas. Pelo contrário, seus estudos,
meditações, exercícios e práticas tendem à identificação com as leis e
entendimento do Cosmos, pois deste modo conhecerá a perfeição do Pai.

9 O TRABALHO
No terceiro capítulo do Gênesis se narra como Yahvé disse a Eva:
"Multiplicarei sobremodo os sofrimentos da tua gravidez", e a Adão: "Por ti
será maldita a terra, com trabalho comerás dela todo o tempo de tua vida;
dar-te-á espinhos e abrolhos e comerás das ervas do campo. Com o suor de
teu rosto comerás o pão."

É importante destacar que isto acontece por conseqüência da tentação da


serpente e da ingestão do fruto proibido, ou seja, como uma pena,
imediatamente antes de serem expulsos do Paraíso. Em outros lugares deste
manual se mencionou o significado da Queda em relação com as Eras e
Ciclos, e o do simbolismo do Paraíso, vinculado a um "estado edênico",
onde, por verdadeiro, todo esforço resultava desnecessário, estado que se
espera recuperar. No entanto nos interessa tratar aqui o tema do trabalho, e
em particular assinalar o conceito totalmente equivocado que sobre ele
possui a sociedade em que vivemos, o que constitui às vezes um verdadeiro
impedimento para o Ensino que esta Introdução à Ciência Sagrada propõe.

Referir-nos-emos em primeiro lugar à primazia da contemplação sobre a


ação, idéia presente no hinduismo, no budismo, no judaísmo, no islã e, em
geral, em todas as tradições. No cristianismo isto resulta nítido. Conta
Mateus (VI, 26-30) que Jesus disse, no célebre Sermão da Montanha: "Olhai
como as aves do céu não semeiam, nem ceifam, nem encerram em celeiros,
e vosso Pai celestial as alimenta. Não valeis vocês mais do que elas? Quem
de vocês com suas preocupações pode adicionar a sua estatura um só
côvado? E quanto ao vestuário, por que vos preocupar? Aprendei dos lírios
do campo, como crescem; não se fatigam nem fiam. Pois eu vos digo que
nem Salomão em toda sua glória se vestiu como um deles." É conhecida
também a vinculação simbólica que as duas irmãs de Lázaro, Marta e Maria
(a ação e a contemplação), têm a respeito, e o juízo do Mestre sobre qual das
duas leva a melhor parte.

Por outro lado, podemos observar, sem nos esforçarmos demasiado, que esta
preferência pela contemplação é totalmente alheia ao meio no qual vivemos,
assinalado por uma incessante ação, por uma projeção de desejos que, por
serem tais como são, jamais poderão se cumprir, por uma angústia e
insatisfação permanentes que desembocam na ignorância e necessariamente
na violência e na destruição. Mas o que verdadeiramente é alarmante é que
esta ação –qualquer que seja o sentido que ela tenha– é considerada como
um bem em si; a tal ponto que a discutir, ou não, praticá-la é ser mau visto,
ou condenado por esse meio, pois o tema passou a ser uma questão moral
nascida da associação trabalho-bondade. No entanto, queremos esclarecer
que nada temos contra um trabalho que seria verdadeiramente sagrado, e
portanto autenticamente dignificante, se estivesse guiado pela Vontade e
pelo Livre Arbítrio. O que se critica é o conceito moderno do trabalho pelo
próprio trabalho, ou seja, sem nenhuma finalidade de ordem metafísica, e
sua equiparação a um fim e não a um meio veicular. Conquanto esta última
crítica poderia ser aplicada a outras áreas da atividade contemporânea (a arte
pela arte, a ciência pela ciência, o psíquico e o emocional, simplesmente
pelo psíquico e emocional, etc., etc.), o conceito moderno do trabalho –que
em termos sociais só faz do homem um fator da produção econômica,
individual ou coletiva– tem um ônus de alta potência destrutiva, quanto sua
obrigatoriedade e necessidade geram no alma uma série de turbações morais
e impedimentos materiais numa sociedade tão injusta como a qual vivemos.

Numa sociedade tradicional ou primitiva os "trabalhos" não são tais como


conhecemos, pois não levam implícita a insatisfação do que só deve ser
efetuado com sofrimento, a desagrado, ou sob a pressão de um peso
arbitrário e alienante ao qual não se lhe encontra finalidade última, senão
mal a mera subsistência num mundo sem sentido. Pelo contrário, nas
sociedades arcaicas os homens realizavam seus trabalhos de maneira ritual e
de acordo com suas funções, nascidas de suas possibilidades, que os fazia
mais aptos para aqueles ou estes labores, que cumpriam então com gosto,
em perfeita relação e interdependência com os outros do organismo social. É
paradoxal que em certos manuais escolares e ainda em certos textos
universitários se fale ainda da "escravatura" como uma etapa historicamente
superada quando, um simples olhar ao meio em que habitamos, faz-nos ver
que nossos contemporâneos não só são escravos do trabalho, e como tais
vivem, senão das funestas conseqüências desse trabalho sem razão,
começando pelas correntes da acumulação de riqueza –individual e social–
pela própria riqueza, a saber: novamente a substituição de um meio por um
fim. Queremos recordar aqui outro fragmento do Sermão da Montanha:
“Não acumuleis para vós tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem
corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntai para vós tesouros no
céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam, nem
roubam; porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração."

O trabalho é para o homem, não o homem para o trabalho. A vida é para o


homem, não é o homem um devedor ou um escravo da vida. "O sábado foi
estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado;"
(Marcos II, 27).

fig. 24
10 CABALA
Já falamos das três letras mães, as sete duplas e as doze simples do alfabeto
hebraico. Logo a seguir, apresentamos três quadros onde essas letras figuram
com seu lugar no alfabeto, seu valor, e em particular com um determinado
signo ao que estão vinculadas de modo simbólico.
Recorde-se o leitor que a Cabala constitui um manancial de inter-relações e
associações de imagens que possibilitam a faculdade de conhecer de maneira
intuitiva e direta.

As três mães são:

LUGAR NOME VALOR SIGNO


1 Alef 1 O homem
13 Mem 40 A mulher
21 Shin 300 A Flecha

As sete duplas são:

LUGAR NOME VALOR SIGNO


2 Beth 2 A boca
3 Guimel 3 A mão que pega
4 Daleth 4 O seio
11 Kaf 20 A mão que aperta
17 Fe 80 A boca e a língua
20 Resh 200 A cabeça do homem
22 Tav 400 O tórax

As doze letras simples são:

LUGAR NOME VALOR SIGNO


5 He 5 O alento
6 Vau 6 O olho e a orelha
7 Zayin 7 O camelo
8 Heth 8 Um campo
9 Teth 9 Um telhado
10 Iod 10 O índice
12 Lamed 30 O braço aberto
14 Nun 50 Um fruto
15 Samekh 60 Uma serpente
16 Ayin 70 Um laço
18 Tsade 90 Um telhado
19 Qof 100 O machado

Nota: Em diferentes interpretações cabalísticas, estes signos adquirem


diversos significados em virtude das diferentes associações às quais se
prestam e fundamentalmente quanto à pluralidade de sentidos que os
símbolos possuem, sem que tenham porque se invalidar uns em benefício dos
outros.

11 A ALMA
Números e letras conjuntamente formam um código gráfico cuja origem é
teúrgica, já que nas primeiras expressões deste tipo as grafias são "mágicas"
para passarem, posteriormente, a ser ideogramáticas, ou seja, que expressam
seus próprios sentidos conceituais. A multiplicação destes signos e sua
alteridade fazem possíveis (por exemplo, na escala numérica pitagórica)
todas as combinações e, portanto, seu discurso indefinido, ou seja, que fixam
simbolicamente a totalidade cósmica, mediante um "sistema" no qual nada
fica excluído, salvo o que nunca poderá ser exprimido, origem de qualquer
manifestação. Esta é a realidade do símbolo, que revela a ordem criacional
na qual todos os seres se acham compreendidos (e numerados como nas
cédulas de identidade, onde se utiliza ademais uma convenção como as
impressões digitais, que também não podem repetir-se em sua combinatória,
valha a comparação). Os pantáculos (pequeno todo) igualmente condensam e
cristalizam, tal qual a simbólica alquímica e hermética (Boehme, Agrippa,
etc.). Deve ser assinalado que esta atividade talismânica se encontra em
todos os povos. Só destacar a escritura maia e os hieroglífos egípcios. Desta
forma se encontra viva na atualidade entre os povos "primitivos".

Segundo isto, a alma humana também seria um número que se


individualizaria numa cifra –ou selo– onde sempre está presente a unidade,
como a deidade está constantemente implícita de modo imanente no
desenvolvimento de qualquer discurso genésico.

Mais além deste discurso, nada entra nem sai, nem nada existe de nenhuma
forma, inclusive a alma individual ou universal, a qual, portanto, não vai a
nenhum lugar. Pelo que, unida a alma à manifestação, devemos situá-la no
plano intermediário entre o Criador e sua obra. Se isto é assim, a alma deve
conquistar para si, ou seja, adquirir-se um "corpo de luz", pois esse é o meio
"plástico" (por dizê-lo de alguma maneira) que nos leva ao Ser, que é
identificado de modo natural com a Unidade aritmética, o que é, por sua vez,
o passo necessário para a concepção do Não Ser –o En Sof da Cabala– e
finalmente a da Não dualidade, que é verdadeiramente o que os indianos
entendem como Suprema Identidade. Nesta última tradição, igualmente que
em muitas outras, esta conquista ou "ativação" das potências da alma (o
"polimento da pedra" na Maçonaria), é uma possibilidade que cada ser porta
em si mesmo, e também uma realidade que compete especificamente ao
homem, daí a necessidade unânime de trabalhos, provas e ritos que efetivam
esta União com o Ser, a ontologia como passo prévio ou suporte da
metafísica, ou seja o sacrifício desse Ser (que desde então já não é um
simples ego) no altar da "nuvem do não saber". Supõe-se que esta é a última
entrega e também o sentido da alma individual, como veículo, símbolo, ou
número, ou seja, como a assinatura do Criador –Verbo ou Logos– no mundo;
um veículo de acesso ao Espírito, quer dizer, para a dissolução naquilo que
tudo fundamenta, mas que, desde então, não existe, tal qual os objetos que os
sentidos percebem ou o cérebro elabora. Desta forma, notar a grande
quantidade de confusão que se produz com respeito a estas noções que, em
geral, as religiões abraâmicas desconhecem.

Se o Mistério mais profundo, ou seja, a manifestação do Não-Ser no seio da


Criação, é compatível –e ainda coetâneo– com o Imanifestado, igualmente a
alma, que, em seu conjunto, não é individual, concentra-se num ponto onde
se sintetiza, constituindo o Ser, como o símbolo mais claro da Unidade, a
partir da qual tudo é gerado, ainda no âmbito das possibilidades
supracósmicas.

Com freqüência se esquece que todas as coisas podem ser e não ser ao
mesmo tempo. Depende às vezes de que se adote um ou outro ponto de vista.

A conquista da alma é chegar ao próprio Destino, ou seja, ser o que sempre


se foi.

12 GRÉCIA
No ponto de intersecção entre o extremo da Europa, Ásia Menor, e África
(Egito), a origem dos povos gregos ou helenos é indo-européia e, através
desta e da corrente tradicional (Apolínea) vinda do Norte, a Tradição Grega
expressa uma das confluências da Tradição Primordial e da Atlante. Esta
união das tradições é uma origem, um oriente [articulado dos séculos VII a
V] para um tempo posterior, que através do Império Romano, e das
sucessivas recorrências à Antigüidade que se darão na história, levará os
mistérios ao Ocidente, numa base de pensamento mítico. O pensamento
antigo, representado por Homero (Ilíada, Odisséia) e Hesíodo (Teogonia, Os
Trabalhos e os Dias), recolhe uma Teogonia e uma Cosmogonia arcaicas,
expressadas também através de uma geografia sagrada que é a da Antiga
Grécia, e nas quais se conserva a memória das 4 Idades da Humanidade,
designadas com os nomes dos metais que simbolicamente lhes
correspondem, Ouro, Prata, Bronze e Ferro. À ordem, ou cosmos tradicional
estabelecido por aquelas, unir-se-á mais tarde Apolo, deus da luz, da unidade
polar e portanto da harmonia, sendo Delfos o centro de toda Grécia, o
omphalos (umbigo), sustento da unidade dos povos que a formavam,
enquanto Elêusis e outros santuários análogos constituíam o coração, sendo
os depositários e transmissores dos Mistérios, nos quais se acham também as
origens sagradas do teatro, pois eles constituíam a representação das
façanhas dos deuses e dos homens no cumprimento do destino, que tem por
modelo a consecução de uma plenitude que corresponde a sua Identidade
Suprema. São os mistérios de Dionísio, vinculados com os Órficos,
anteriores, e traduzidos posteriormente na epopéia da alma do homem e do
mundo, recriada nos de Elêusis; e são desta forma expressados de outra
maneira, os do Número, que constituíram a essência do pensamento
pitagórico e que se reproduzirão na Teoria das Idéias de Platão.

Sócrates, mestre de Platão e herdeiro da essência supraformal do


conhecimento, será o que articulará esse pensamento na adaptação a que teve
lugar simultaneamente em todo o globo, no século VI antes de Cristo; sua
dialética, não obstante, será a arte do obstetra, como ele definia sua função.
O pensamento grego, recolhido por Roma e revivificado pelos hermetistas e
neoplatônicos do Renascimento, transmissor também do pensamento egípcio
graças a Hermes, é um dos que formam o Ocidente. Tanto hoje como ontem,
superar sua leitura profana, representada ultimamente na história dos
recentes quatro séculos, é ter acesso ao âmbito do espaço sagrado,
regenerado pela Iniciação que remonta o homem à Idade de Ouro. Já em seu
tempo, a visão platônica foi irrealizável, como a própria morte de Sócrates
anunciava, e os males da Grécia histórica, o materialismo, o racionalismo, a
falsa dialética, e a preeminência outorgada à quantidade, são como outros os
de um fim de ciclo, e os de um mundo profano que não vai em seus estudos
além de Aristóteles, com o qual a ontologia se reduz a uma perspectiva
materialista, e a identidade do ser e do conhecer só se acentua em seu reflexo
analítico, ainda que lhe corresponda também ao ordenamento de boa parte
dos aspectos particulares, que é tal quando não progride à sistematização.

Sua mitologia, as histórias de seus deuses e seus heróis e heroínas,


informaram a alma do Ocidente e alimentaram as imagens de nossa cultura,
e tudo isso ainda quando a "estética" tenha ocultado o símbolo e, inclusive,
tenham sido invertidos os autênticos valores que eles encarnavam.

13 ROMA I
Roma aparece no palco da história quando os povos da Hélade grega, que
descendiam em grande parte da Tradição primordial (o culto que estes
professavam ao Apolo hiperbóreo e ao Zeus olímpico é um exemplo disso),
estão em plena decadência crepuscular. Já nas origens míticas de Roma
encontramos a importante herança dos povos helenos, pois como conta
Virgilio na Eneida, o príncipe troiano Enéas –herói solar como Herakles-
Hércules– é eleito por Júpiter para fundar na região do Lácio ("onde antanho
Saturno manteve seu cetro...") uma colônia da qual surgiria posteriormente
Roma. Por outro lado, na mesma Eneida (livro VI) conta-se que de Enéas
surgiria a estirpe da qual descenderão os maiores estadistas e imperadores
romanos, entre os quais destacamos a Julio César e seu sobrinho César
Augusto.

Da mesma forma, quase todos os nomes dos deuses romanos foram versões
latinizadas dos gregos: Saturno por Cronos, Júpiter por Zeus, Marte por
Ares, Mercúrio por Hermes, Vênus por Afrodita, Minerva por Atenas, Baco
por Dionísio, etc. A mesma influência está presente nas artes, na literatura e
na filosofia. Neste sentido é notória a influência de Platão e seus sucessores
sobre Cícero, Varrão, Sêneca, Ovídio, Horácio e o já mencionado Virgílio, o
"príncipe dos poetas latinos", sem nos esquecer de todos aqueles filósofos e
teúrgos romanos ou romanizados que como Nigidius Figulus, Ário Dídimo,
Quinto Sextius, Cornelius Celsus e Apuleio (iniciado nos mistérios dos
sacerdotes egípcios e conhecedor das doutrinas herméticas surgidas em
Alexandria), fizeram parte da escola neoplatônica e neopitagórica,
contribuindo à difusão de seu pensamento por todos os cantos do Império.
Inclusive alguns imperadores, como por exemplo Juliano, participaram
inteiramente das idéias platônicas.

fig. 25

Pesando tudo isso, não se deve pensar que a civilização romana fora uma
cópia calcada da grega. O que, sim, é verdadeiro é que a partir de um dado
momento ambas constituíram uma só cultura, a greco-latina, que longe de
desaparecer continuou viva no Ocidente até os próprios alvores dos tempos
modernos.

No entanto, se nos referimos à tradição romana em si mesma vemos que esta


pertence ao grande tronco da civilização indo-européia, do qual surgiriam
também os povos celtas, indianos, gregos, germânicos e tantos outros, todos
os que tinham um vínculo mais ou menos direto com a tradição primordial.
Esse vínculo se manifesta claramente nas origens históricas de Roma com a
existência dos sete reis legisladores, que são análogos aos sete Rshi da
tradição indiana, seres míticos encarregados de conservar e transmitir a
Sabedoria e o Conhecimento em cada novo ciclo da humanidade. E isto é o
que representam os sete reis com relação a Roma: transmitem a esta as
idéias-força que permitirão o desenvolvimento de sua civilização. Este é o
caso de Numa, que cria o colégio sacerdotal e o primeiro calendário, e é
significativo que seu nome esteja invertido silabicamente com respeito ao de
Manu, que na tradição indiana simboliza o Ancestral e Legislador
primordial, como se efetivamente a função de Numa em relação a Roma fora
idêntica à de Manu com respeito ao conjunto da humanidade.

Mas o fundador de Roma, aquele que traça os limites sagrados da cidade e


do qual deriva o nome da mesma, não é outro que Rômulo, o primeiro dos
reis legisladores. Foi capaz, com a força espiritual que outorga o saber-se
possuidor de um destino unido ao supra-histórico e transcendente, de
infundir nos povos itálicos (contando entre eles os etruscos e os sabinos) a
idéia do Império sob o estandarte protetor da águia, ave celeste e divina por
excelência. Na realidade, o Império corresponde a uma antiqüíssima
concepção tradicional que se remonta às próprias origens da humanidade, e
segundo a qual aquele representa a expressão da ordem celeste e urânica
sobre a terra. Nas mais altas culturas tradicionais se menciona, sob diferentes
nomes, um mítico "Império do Meio" onde reside o Monarca Universal (o
Chakravartî hindu e budista), o Rei de Justiça e de Paz, o Rei do Mundo,
que não é outro que o Verbo divino do qual emana a Lei Eterna reguladora
da harmonia e da ordem da criação.

14 AS MUSAS II
No cume do Helicon, montanha sagrada ao norte do Olimpo, achava-se o
altar de Zeus, e em seus declives, as fontes que davam a inspiração poética a
quem bebia delas (como a de Hipocrene, surgida da rocha por um coice de
Pégasus, ou a de Aganipe), de cujas azuladas águas (da cor do éter) também
as Musas bebem quando, cansadas, renovam seu vigor depois de dançar em
seus prados, nos quais às vezes se manifestam aos homens; também se
encontrava naquele Monte o sepulcro de Orfeu, as estátuas dos principais
deuses, e o bosque sagrado dedicado a elas e onde, anualmente, eram
celebradas junto a Cupido. Em seus brincos se acham as plantas fragrantes,
que têm a propriedade de privar às serpentes de seu veneno; em seus
declives, como nos do Pindo e do Parnaso, costuma apascentar Pégaso.
Também neste último Monte, brotam as fontes da inspiração profética: a de
Castália, cujas águas se utilizavam como purificação em Delfos, e se davam
ali de beber à Pythia, mana em meio a dois cumes, um dos quais está
consagrado a Apolo e às Musas e o outro a Dionísio-Baco. A ambos, invoca-
os Dante quando começa a cantar a ascensão que narra a terceira e última
parte de sua Comédia.

De suas batalhas, diz-se que venceram em duelo às nove filhas de Pierio,


humanas e mortais, que as tinham desafiado no canto, e a quem privaram de
seu nome. Também que num duelo semelhante despojaram às Sereias de
suas asas e se coroaram com suas plumas, caindo aquelas ao mar. Não
obstante é importante assinalar que para Platão (no Mito de Er) e os
Neoplatônicos (Proclo) cada Sereia se relaciona com uma das esferas e seu
canto à rotação destas, que movem com suas asas, enquanto as Musas
presidem sobre cada uma delas na ascensão vertical. Segundo os platônicos,
não ouvimos aquelas notas porque soavam quando nascemos e não dispomos
de um silêncio capaz de contrastá-las; daí, no entanto, o silêncio sagrado
revelado no interior do bosque e vinculado para os gregos com o deus Pã. E
bem como a luz solar é um símbolo da Luz Inteligível, há um som não
sensível que é a imagem do Logos, da Palavra ou Verbo criador, cujos
intervalos ou proporções encontram seu eco no coração do ser humano,
veiculando os ensinos que só as Musas outorgam, pois o Cosmos é a Música
revelada ao homem:

"Ser instruído na música, não consiste senão em saber como se ordena todo o
conjunto do universo e que plano divino distribuiu todas as coisas: pois esta
ordem, na qual todas as coisas particulares foram reunidas num mesmo todo
por uma inteligência artista, produzirá, com uma música divina, um concerto
infinitamente suave e verdadeiro" (Asclépio, 13).

15 MITRA
Deidade de origem índo-iraniana e caldaica (vinculado a Varuna, o Céu, e
formando em ocasiões casal com Ahura-Mazda, o deus salvador, em sua luta
com Ahrimán, o aspecto tenebroso da criação), Mitra foi adotado por Roma
como um de seus principais númenes tutelares, até o ponto de ser
considerado como o "protetor e sustento do Império". É de destacar que a
época de seu maior apogeu (entre os séculos I e IV) coincide com o
florescimento das doutrinas herméticas, gnósticas e neoplatônicas
alexandrinas, com as quais o mitraísmo teve sem dúvida seus contatos,
beneficiando-se de muitas de suas idéias. Contatos que também existiram
com o cristianismo incipiente, como o demonstram as numerosas analogias
entre as figuras de Mitra e de Cristo, já observadas por alguns pais da Igreja,
como Justino e Tertuliano.

Sua festa principal se celebrava no 25 de dezembro, dia do solstício de


inverno, coincidindo assim com o nascimento do "sol invencível" e vitorioso
das trevas (dies natalis Solis invicti Mitra). Segundo a lenda, Mitra nasce da
"pedra" (petra genitrix) à beira de um rio, portando em suas mãos a espada e
a tocha, símbolos associados à Justiça e à purificação pelo fogo e pela luz da
Inteligência. Trata-se, pois, de uma deidade eminentemente solar (os gregos
chegaram a vinculá-lo com o próprio Apolo, e também com Hércules), o que
está claramente indicado na própria raiz mir constitutiva de seu nome, que
significa "sol". Assim o testemunha o imperador Juliano (iniciado nos
mistérios mitraicos pelo filósofo neoplatônico e pitagórico Máximo de
Éfeso) quando se dirige a Mitra nestes termos: "Este Sol, que o gênero
humano contempla e honra desde toda a eternidade, e cujo culto faz sua
felicidade, é a imagem viva, animada, razoável e benfeitora do Pai
Inteligível". Outro significado de seu nome é o de "chuva", mas entendida
em seu aspecto de "orvalho" vivificador, símbolo do descenso das
influências espirituais.

Num antigo hino iraniano se diz que Mitra está sempre desperto e vigilante,
observando cuidadosamente todas as coisas. Vai à chamada dos débeis, e seu
poder é empregado sempre a favor do gênero humano. Mitra é, efetivamente,
o amigo e protetor dos homens, o que lhes infunde as virtudes heróicas: o
valor, a força interior, a lealdade, a fraternidade, e como deidade
intermediária entre o mundo superior e o inferior, é também (tal qual
Hermes) o guia que os conduz em sua ascensão para a origem através das
esferas planetárias. Neste sentido, assinalaremos que entre os romanos os
mistérios de Mitra se dividiam em sete graus, em correspondência com a
escala planetária, mas disposta na ordem seguinte: Lua, Vênus, Marte,
Júpiter, Mercúrio, Sol e Saturno. Ditos graus recebiam os nomes de Corvo
(Corax), Oculto –ou Noivo– (Cryphius), Soldado (Miles), Leão (Leo), Persa
(Perses), Correio –ou Companheiro– do Sol (Heliodromus), e por último Pai
(Pater). Os três primeiros constituíam um período de preparação, durante o
qual o adepto devia morrer para sua condição anterior, o que está claramente
expressado pelo Corvo, cuja cor escura simboliza precisamente a fase de
nigredo ou morte alquímica. Durante esse período, era instruído pela "força
forte das forças" e pela "Reta incorruptível", instando-lhe a um "persistir da
potência da alma numa pura pureza". Os mistérios culminavam com a
obtenção do grau do Pai, através do qual –como hierofante (pater sacrorum,
pater patrum) e chefe da comunidade mitríaca– atingia-se o Princípio
incondicionado, morada dos Bem-aventurados, "aonde já não existe um aqui
ou um ali, senão que é calma, iluminação e solidão como num oceano
infinito".

Os ritos se celebravam em cavernas e criptas subterrâneas chamadas


mitreums, que constavam de dois níveis, um superior e outro inferior,
representando respectivamente o céu e a terra. Nessas criptas se encontravam
figurados os símbolos fundamentais da cosmogonia hermética: os círculos
planetários, a roda zodiacal, e os ciclos dos elementos, onde o fogo aparecia
como o principal agente purificador. Em cima do altar, encontrava-se a
efígie de Mitra no momento de imolar com sua espada o touro primordial
("Mitra tauróctono"), cujo sangue vertido em terra a fecundava, surgindo
dela o trigo e o "pão de vida", alimento de imortalidade. Como manifestação
da potência geradora da natureza, este animal é também o símbolo dos
influxos lunares e telúricos, que determinam a existência do mundo inferior,
e que no homem se expressam através de sua ânima ou energia vital. É dita
energia, em seu estado de "pedra bruta", que Mitra "doma" e "sacraliza"
quando cavalga o touro, direcionando-a num sentido superior, até convertê-
la no motor ou fogo sutil que faz possível a transmutação e a regeneração.

16 EXERCÍCIO PRÁTICO: MEDITAÇÃO EM AÇÃO


Demos uma seqüência constante de exercícios práticos de concentração,
meditação e visualização, utilizando especialmente a Árvore da Vida como
modelo ou mandala para os realizar. Também, seguimos com as práticas
referentes ao Tarô, ao mesmo tempo em que ampliamos seu conhecimento.
Os exercícios sobre o Tarô são particularmente interessantes, pois este
extraordinário veículo esotérico promove tanto a visão como a
sensibilização necessárias –em alguns casos quiçás imprescindíveis– para a
efetivação dos textos e ensinos dados em Agartha, enquanto ele mesmo é um
iniciador nas disciplinas herméticas.

No entanto, queremos agora insistir sobre um tema fundamental unido às


disciplinas que nosso curso e suas lições comunicam. Referimo-nos a que
todos os exercícios (que, como se pôde apreciar, estão unidos uns com os
outros, entre si) têm por finalidade o trazer estas práticas à cotidianidade,
ou seja, o efetuá-las em nossa vida habitual, qualquer que seja a
circunstância na qual nos tenha tocado viver. Portanto, não devem ser
tomados como rígidos, ou seja, como um fim em si mesmos, senão que
devem ser considerados como veículos de Conhecimento. Qualquer
advertência neste sentido não é demais, pois se considera importantíssimo
não confundir o fim com os meios adequados para produzi-lo. Por outro
lado, uma atitude dúctil com respeito a estes exercícios é recomendável, não
quanto à perfeição desejável em sua realização, ou igualmente à
conveniência e utilidade de efetuá-los, senão que esta flexibilidade seja uma
adaptação que, de maneira individual, cada aluno faça em sua esfera
própria. Dito de outra maneira: consideramos aos exercícios como
valiosíssimos, já que se trata de meios de realização, mas queremos insistir
na responsabilidade de nossos leitores no sentido de que estas práticas
podem ser perfeitamente transladadas às múltiplas circunstâncias de sua
vida cotidiana e efetuadas com uma margem de interpretação criativa,
enquanto se atam aos mesmos modelos tradicionais que Agartha oferece, e
sejam executadas com a boa vontade e o rigor que elas merecem, sem que
somente os alunos se rejam pela literalidade de seu exercício, aferrando-se
a elas, como quem se identifica só com a letra morta de determinados textos.

Os exercícios podem ser feitos em movimento: tanto caminhando, como


correndo, ou ao ritmo de uma "ginástica" que o aluno possa adaptar ou
recriar. Também estas práticas de respiração e visualização podem fazer-se
em postura horizontal e efetuar-se tanto no solo como no leito ou na
banheira. O importante é não as descuidar por um só momento em nosso
dia, e realizá-las com fé e alegria quando tenhamos tempo disponível para
isso.

17 JESUS
Jesus nasce no seio do povo judeu, e sua linhagem se remonta aos reis de
Israel, à casa de David, da qual descende. Seu nome hebraico, com o
agregado do grego Cristo, identificam àquele que, enviado do Pai para a
Redenção e a Salvação da humanidade, gostava de se chamar "Filho do
Homem", evidenciando assim sua dupla natureza, divina e humana,
arquétipo da composição dual do homem, símbolo vertical e axial da
comunicação céu-terra, fato a imagem e semelhança de seu Criador. Jesus
nasce oculto num humilde lugar e é visitado e adorado por três reis e magos
que, seguindo a luz da estrela, chegaram a conhecê-lo. Depois vai crescendo
em sabedoria e bondade e depois de atravessar vários perigos, nos quais seus
pais o protegem, quer ser batizado por seu primo João, o asceta que vive no
deserto, que batiza com água, enquanto ele batizará com fogo, com seu
sangue sacrifical simbolizado pelo vinho. Dali em diante, desenvolve-se uma
história iniciática recolhida pelos Evangelhos pontualmente e onde prima o
sentido esotérico sobre qualquer outra coisa, a tal ponto que se não fora por
este sentido resultaria absurdo o que se afirma neles, por contraditório,
obscuro e confuso. Nos Evangelhos floresce o conhecimento da autêntica
tradição de Israel, aquela que deu forma a Moisés, o Egípcio, e que o
Salvador herda e plasma de acordo ao desenvolvimento do tempo e dos
ciclos e ritmos de todo processo. Tudo está nos Evangelhos quando se os
sabe ler. Seu enorme conteúdo emocional, e sua beleza excedem às
interpretações racionais e materiais e nos apresentam a tremenda e magnífica
semelhança do Homem-Deus e o paradoxal percurso de sua vida, que
acabará no coração da cruz, depois de ter sido recebido triunfalmente em
Jerusalém e depois de ter passado por provas e atravessado o Jordão várias
vezes. Ali entrega finalmente a vida e o tempo e renasce definitivamente na
Vida Eterna em comunhão com seu Pai com o que forma uma só e única
substância revestida de um Corpo de Glória. Tal é aquele homem histórico e
arquetípico, imagem viva do Cristo interno, Universal e Eterno, que disse:
"Eu sou o caminho, a verdade e a vida"; também deixou dito: "Procurai e
encontrareis".

18 ROMA II
No Ocidente, foi necessária a chegada de Roma para que esta concepção
sagrada do Império se fizesse uma realidade histórica, difundindo o ideal de
civilização superior que encarnava e ao qual estava predestinada desde suas
origens lendárias. Da Ásia Menor e Oriente Próximo até a Hispania, do
Norte da África até os países germânicos, celtas e anglo-saxões, Roma
implantou sua cultura e sua visão unitária do mundo, e graças à Pax romana
os povos que estiveram sob sua órbita conheceram uma época de grande
esplendor e florescimento cultural. E conquanto essa implantação se realizou
muitas vezes mediante o uso das armas é porque para Roma (como para
muitos outros povos tradicionais) a guerra tinha um sentido completamente
diferente ao que se tem hoje em dia, começando porque se tratava de um rito
ou um ato sacralizado. Essa concepção transcendente da guerra explicaria
também por que Roma respeitava as tradições e os costumes ancestrais dos
povos que conquistava.

Em relação com este último, um fato importante para se ter em conta é que
antes de entrar em combate os romanos invocavam, mediante ritos
apropriados, a presença ativa de seus deuses, com o fim de que fossem estes
quem submetessem aos deuses respectivos de seus inimigos; ou seja, que a
guerra se produzia primeiramente no plano invisível e espiritual, pois a
conquista de um território, cidade ou país, implicava antes o domínio sobre
seus deuses, que passavam a fazer parte do panteão romano, e à manutenção,
portanto, da unidade do Império. Os antigos romanos sabiam perfeitamente
que para conseguir essa unidade não bastava só com invocar a energia
guerreira e combativa de Marte, senão que, acima desta, devia existir a
energia integradora e benéfica de Júpiter, o pai dos deuses e legislador
celeste dos homens, cujos distintivos são precisamente a águia imperial, o
raio (eixo), a coroa e o trono.

O imperador encarnava em sua função e em sua pessoa essas energias, que o


transfiguravam num ser dotado de poderes sobrenaturais e num
intermediário entre o céu e a terra, assumindo a responsabilidade de
governar seu povo segundo os atributos da Misericórdia e da Justiça divinas.
Daí o título de Pontifex Maximus que ostentava. Por isso mesmo, quando os
imperadores perdem essa função intermediária (os exemplos de Nero e
Calígula são muito ilustrativos ao respeito) pode se dizer que Roma entra em
sua decadência anunciando assim o fim de sua civilização.

Devemos considerar também o importante papel exercido por Roma no


conjunto global da história sagrada, no sentido de que soube estender uma
ponte entre Ocidente e Oriente, recolhendo neste sentido a herança deixada
por Alexandre Magno. Uma divindade romana, Jano, (ver Módulo II, título
N.º 94) aludia também a esta vinculação entre Ocidente e Oriente, ou seja, à
complementação de opostos. Dos dois rostos que Jano possuía um deles
olhava à esquerda (Ocidente) e o outro à direita (Oriente), abarcando com
seu olhar os dois extremos do mundo, como projeção horizontal do eixo
vertical único.

Jano era também o deus que presidia as iniciações artesanais, especialmente


as quais tinham lugar entre os collegia fabrorum, ou corporações de
construtores. Estes foram sumamente importantes no desenvolvimento da
civilização romana, que, como já indicamos, assumiu grande parte da cultura
grega, sobretudo no terreno da filosofia e das artes, e dentre estas,
particularmente, a arquitetura. Precisamente a origem dos collegia fabrorum
se remontava à época do rei Numa, que fora contemporâneo de Pitágoras, e
receptor também de seus ensinos, como o atesta que em sua tumba
aparecessem escritos de conteúdo inteiramente pitagórico. De fato estes
collegia recebem do pitagorismo as ciências sagradas do número e da
geometria, que eles plasmaram nos templos, basílicas e edificações de todo
tipo, e que constituem o legado de uma cosmogonia (baseada no simbolismo
construtivo) que permaneceu viva na cultura ocidental, graças a qual foi
transmitido aos construtores medievais e renascentistas, dos que derivaria,
junto ao aporte decisivo da Tradição Hermética, a Maçonaria que chegou até
nossos dias.

19 ALEXANDRIA
Quando no ano 332 a. C. Alexandre Magno chega ao Egito em sua
expedição conquistadora para Oriente, funda no delta do Nilo, e depois de
visitar no oásis de Siwa o oráculo do deus Amon (semelhante a Zeus-
Júpiter), a cidade que leva seu nome: Alexandria. Esta aparece como o
último grande centro da cultura clássica, o que determinará seu destino como
cidade-ponte, que fará possível a comunicação da antiga sabedoria ao novo
período histórico, que se abriria no Ocidente depois do desaparecimento
definitivo do Império Romano. Por outro lado, seu famoso farol ficou na
memória como um símbolo do que Alexandria representou para seu tempo:
um foco de luz intelectual que irradiou sua força civilizadora para todos os
confins do mundo mediterrâneo. Por essa razão sua influência se deixasse
sentir em quem, mesmo não vivendo em Alexandria, não obstante estavam
vinculados a ela como "farol" de sua época, tal o caso de Sêneca, Cícero,
Virgilio, Ovídio, Moderato de Cádiz, entre tantos outros.

Sem dúvida ao esplendor cultural de Alexandria contribuíram de maneira


decisiva a criação da Biblioteca e o Museu (Museion: "Templo das Musas"),
que já desde sua fundação no século III a. C. atraíram sábios, filósofos,
magos e teúrgos vindos de todos os lugares, chegando-se a conformar num
momento dado a escola matemática de Alexandria, onde o pensamento
científico e filosófico da tradição pitagórico-platônica se conjugou com o
antigo saber egípcio e caldeu. Ali se ensinavam as artes liberais e
cosmogônicas como a aritmética, a geometria, a música e a astronomia, de
onde surgiram obras tão importantes como os Elementos de Euclides, que
deram seu fundamento à geometria ocidental. A essa escola pertenceram
igualmente o físico Arquimedes, os astrônomos e geógrafos Apolônio de
Pérgamo (chamado por seus contemporâneos o "grande geômetra"),
Eratóstenes, Aristarco de Samos, Hiparco de Rodes (descobridor para
Ocidente da precessão dos equinócios, importantíssima para o conhecimento
das leis cíclicas), Claudio Ptolomeu (a quem se deve o Almagesto ou
Composição Matemática), Demetrio de Falera e Nicómaco de Gerasa, autor
de uma Introdução à Aritmética e de um Manual da Harmonia (exposição da
teoria musical pitagórica), que tanta influência exerceriam sobre Boécio, e
através deste em toda a Idade Média e no Renascimento.

Alexandria brilha com especial intensidade nos três primeiros séculos de


nossa era, já que nesse momento se vive um ressurgimento do
neoplatonismo, ao mesmo tempo que se acaba de formar a Tradição
Hermética graças à síntese dos ensinos do mítico Thot-Hermes Trismegisto
com o próprio neoplatonismo, sem nos esquecer da presença de elementos
procedentes das doutrinas orientais e das gnoses judaica e cristã. Podemos
dizer que a partir desse momento o hermetismo e o neoplatonismo
constituirão as duas referências fundamentais do esoterismo ocidental, e
nenhum movimento ou individualidade que tenha sustentado e transmitido a
Ciência Sagrada ao longo dos últimos dois mil anos foi alheio às idéias do
Deus Hermes, de Pitágoras e Platão, conciliadas no "crisol alexandrino".
Entre os muitos que encarnaram essas idéias devemos destacar, no século I,
Fílon de Alexandria (que fez uma síntese entre o judaísmo e o
neoplatonismo, antecipando-se nisso a muitos cabalistas medievais) e
Apolônio de Tiana (que viajou pelo Oriente e pela Índia, e autor também de
uma vida de Pitágoras); no século II a Téon de Esmirna, Máximo de Tiro,
Apuleio (que escreveu As Metamorfoses), Numenio e Plutarco de
Queronéia, autor de Ísis e Osiris e Vidas Paralelas; e no século III temos a
Ammonio Saccas, fundador da escola platônica de Alexandria, considerada
como a herdeira das que existiram na Grécia e na Itália nos tempos de
Pitágoras e Platão.

À dita escola pertenceram nada menos que Plotino, Porfírio, Hermias e


Jâmblico (que em seus Mistérios do Egito afirma que foi nos livros
herméticos onde descobriu a libertação da alma de todos os laços do
destino), Edésio de Capadocia e Plutarco de Atenas. Eles, e outros muitos,
estenderam a doutrina por todo o mundo greco-latino, fundando escolas em
Roma, Sicilia, Pérgamo, Éfeso, Sardes, Apamea (Síria) e Atenas, para citar
as mais conhecidas. Na Academia de Atenas, e entre os séculos IV e V,
sobressaem as figuras do já mencionado Plutarco, de Sinesio e de Proclo,
iniciado nos mistérios platônicos e teúrgicos por Asclepigênia, filha de
Plutarco. Proclo é autor de uma ingente obra entre a qual destaca seus
Comentários aos livros de Platão e a Teologia Platônica, em cujo prefácio
diz que este tratado é "um elogio não só de Platão, senão também daqueles
que o sucederam na tradição filosófica". Proclo aparece assim como aquele
que dá depoimento dessa tradição, realizando uma síntese do pensamento de
todos os que foram seus transmissores ao longo do tempo, e que tanto
influíram nos primeiros representantes do esoterismo cristão, como
Clemente de Alexandria, Orígenes, Lactâncio, Dionísio Areopagita e
Máximo, o Confessor, todos eles embebidos das idéias platônicas e
herméticas.

Mas é importante sublinhar que a escola de Alexandria, e as que se criaram


sob sua influência, se tomarão como o modelo das que surgiram em
Bizâncio, na Idade Média (Toledo, Chartres e Oxford especialmente) e no
Renascimento, começando pela Academia Platônica de Florença, onde sob a
direção de Marsílio Ficino se traduziu do grego ao latim todo o Corpus
Hermeticum, Platão, Proclo, Jâmblico e a praticamente todos os filósofos
alexandrinos, feito este fundamental para que a "corrente áurea" continuasse
viva na cultura de Ocidente, prolongando-se até nossos dias.
20 O HERMETISMO ALEXANDRINO
Como dissemos no capítulo anterior, foi na cidade egípcia de Alexandria
onde a Tradição Hermética acabou por se constituir num corpo de doutrinas.
E não é casual, senão devido a razões histórico-geográficas e simbólicas, que
fosse no Egito, e não em outro lugar, onde esta tradição começaria a irradiar
sua influência a todo Ocidente. Como assinala Plutarco, nos tempos dos
faraós este país recebia também o nome de Kemi, que significa "terra negra"
como já sabemos, de onde provém –com o adicionado do artigo árabe al– a
palavra Alquimia, a ciência hermética que contém os sagrados mistérios dos
sacerdotes egípcios, que na realidade formavam uma entidade intelectual,
cuja autoridade espiritual emanava diretamente do deus Thot, o mensageiro
do Conhecimento, deidade essencialmente civilizadora (doa aos homens a
escritura junto com as ciências e as artes da Cosmogonia), que entre os
gregos tomou o nome de Hermes e o de Mercúrio entre os romanos.
Também, existe outro dado tradicional de origem árabe que vem confirmar o
que dizemos: trata-se da expressão "A Tumba de Hermes", que é como se
designava antigamente à maior das pirâmides do Egito, expressão que
também pode se estender às duas outras que estão a seu lado. Neste sentido,
essa mesma fonte tradicional assegura que em dita pirâmide se encerra a
Ciência Sagrada transmitida por Hermes (identificado com o profeta Idris ou
Henoch) desde os tempos antediluvianos, em clara alusão à civilização
Atlante, remontando-se através desta até a própria Tradição Primordial.
Afirma-se também que a referida pirâmide guarda essa Ciência não em
forma de documentos ou inscrições hieroglíficas, senão "fixada" em sua
própria estrutura exterior e interior, pois na verdade se trata de um autêntico
modelo simbólico do Cosmos, ao qual reflete em todas suas proporções e
medidas. Por conseguinte, é ao conhecimento do que esse modelo expressa
ao que em realidade alude "A Tumba de Hermes", expressão que também
sugere o caráter secreto e velado que dito conhecimento tomou a partir de
um momento dado no devir da história humana.

Por tudo isso, não deve resultar estranho que esse ressurgir da Arte e da
Ciência de Hermes, acontecido nos primeiros séculos de nossa era, ocorresse
precisamente em Alexandria, ou seja, em terras do Egito, ao qual contribuiu
notavelmente a influência grega, sobretudo através da filosofia platônica e
pitagórica, em grande parte herdeira dos mistérios órficos e das tradições dos
antigos povos helenos, de origem igualmente primordial. A isto teria que
adicionar o aporte recebido de outras correntes tradicionais, como o
judaísmo, o recém nascido cristianismo, o gnosticismo não dualista e a
cosmologia astral dos sacerdotes caldeus, que chegaram a Alexandria, junto
com outros sábios orientais (principalmente indianos e budistas), através das
grandes rotas traçadas vários séculos antes por Alexandre Magno. Mas a
Tradição Hermética, sob a forma que adotou a partir de então e tal e como
chegou até nossos dias, é fundamentalmente de origem greco-egípcia, o que
lhe permitiria propagar-se com rapidez por todos os países onde estava
implantada, desde tempos mais antigos, a cultura grega, ou melhor greco-
latina: praticamente por toda a planície mediterrânea, a Ásia Menor e o
Oriente Próximo. Daí as constantes referências a Hermes e à doutrina
hermética entre os filósofos, magos e teúrgos dos mais diversos países e
regiões, o que deu lugar a uma comunidade de pensamento, ligada à
"corrente áurea" imemorial, que sob o influxo espiritual-intelectual do
Mensageiro dos deuses nutrirá e estará presente em todas as correntes
esotéricas e sapienciais forjadoras da identidade cultural do Ocidente.

Todo esse cúmulo de sabedoria e conhecimento os mestres herméticos


alexandrinos o verteram através de uma série de livros que chegaram até nós
sob o nome dos Hermética, entre os quais se contam o Corpus Hermeticum,
integrado, por sua vez, por outros escritos que como o Poimandrés, o
Asclépio e a Koré Kosmou, pertencente aos Extratos de Estobeo, descrevem
o conjunto da Revelação de Hermes, cujo fim último é conseguir que com a
aprendizagem e conhecimento da Cosmogonia, da gênesis do mundo e da
alma humana, ou seja do Plano Intermediário, o adepto vá acordando em si
mesmo o Nous (o Espírito universal), e a possibilidade com isso de
contemplar a realidade do que está além do cosmos, ao Um e Só, no que
reside o verdadeiro Bem. Dentro dos Hermética, temos de considerar
igualmente os Oráculos Caldeus, de Juliano, o Teúrgo e , claro, todos
aqueles livros e tratados de caráter astrológico, alquímico e mágico que
falam das correspondências e analogias entre o homem, os diferentes reinos
da natureza (mineral, vegetal e animal) e o mundo celeste: os planetas, o
zodíaco e as constelações estelares, caracterizando tudo isso uma visão do
cosmos considerado como um todo, onde as partes que o integram
respondem a estímulos semelhantes, manifestando desta maneira a Unidade
que os une entre si e da qual procedem pois, como dizem os textos, "o
conhecimento (a gnose) é a culminação da ciência".

Falamos, por exemplo, do Livro de Hermes Trismegisto, O Transe de


Salomão, O Livro Sagrado de Hermes a Asclépio, O Livro das virtudes das
ervas, as Kyranides, etc. Destacar também a Hieroglyphica, cujo autor,
Horapolo (nome integrado por Hórus e Apolo, as duas divindades solares de
Egito e Grécia) fala-nos da serpente ou dragão Uroboros, ideograma
alquímico que foi considerado posteriormente pelos hermetistas medievais e
renascentistas como um dos símbolos da Grande Obra. Deixar constância
também da figura de Bolos de Mendes, que viveu no século II a.C. e autor
do Livro das Simpatias e de Física e Mística, onde se descrevem as
correspondências entre a ciência da natureza e a ciência divina. E desde já
não devemos esquecer do alquimista Zósimo de Panópolis e de duas de suas
principais obras: Conta Final e Questões Alquímicas, nas quais deixou
escrito que "a raça dos filósofos está acima da fatalidade", evocando ao
mesmo tempo ao "três vezes grande Platão e ao infinitamente grande
Hermes".

21 COSMOVISÃO HERMÉTICA ALEXANDRINA


O universo foi criado por uma vibração sonora primordial, emitida no
princípio, quer dizer, agora mesmo (pois a revelação é coetânea com o
tempo), pela Palavra, Verbo ou Logos spermatikós, que é também o
Mediador através do qual o Ser Supremo, o Pai, concebe o modelo do
mundo. Este Mediador ou Intermediário entre a Unidade primigênia e o
mundo hílico (material) recebe o nome de Nous Demiurgo ou Espírito da
Construção Universal. Por sua vez, o Nous Demiurgo governa sobre as
divindades astrais que regem cada uma das esferas planetárias, que
organizam, junto às divindades zodiacais, a Roda do Destino, na qual se
projeta a existência dos seres e das coisas. Este é o plano no qual atua
diretamente o Anima Mundi, ou segundo 'Demiurgo' (o Adão Protoplastos),
que conjugando as energias contrárias e duais implícitas já nessas
divindades, gera o fluir perene e harmonioso dos ciclos e dos ritmos
cósmicos. Finalmente, essas energias celestes descem ao plano hílico ou
Corpus Mundi, ao qual insuflam vida e ordem a partir das qualidades
respectivas dos quatro elementos em suas variadas combinações. A natureza
torna-se então um recipiente onde se refletem os diversos níveis da
existência universal. E é pelos signos reveladores que se expressam nela
(como se de um oráculo se tratasse) que o homem pode se remontar a sua
origem, ascendendo pelos degraus da Escala Filosófica, pois conserva em
seu interior a semente da alma imortal. Mas essa ascensão se faz efetiva
mediante a ciência teúrgica, que põe o homem em comunicação com os
deuses e as entidades angélicas que, mediante o rito e a invocação,
transmitem sua inteligência e sabedoria ao coração do adepto.

Temos assim, muito resumido, o conteúdo cosmogônico do Corpus


Hermeticum, que o estudante de nosso Programa já conhece pelas estreitas
vinculações que tem com a Árvore da Vida cabalística.

22 A IDADE MÉDIA
O qualificativo de "idade obscura", que por parte da maioria dos
historiadores modernos se atribui ao Medievo, é uma prova a mais do
espesso véu que cobre à excessivamente materializada mentalidade atual,
que em seu desconhecimento a tudo confunde e inverte. No entanto, desde
algum tempo já, e desde diversos campos da investigação, voltou-se a pôr
este ciclo histórico no lugar ao qual corresponde, cuja característica mais
notória foi o esplendor e a presença do sobrenatural e do sagrado em todas as
expressões de sua cultura.
Para entender a Idade Média, tal como qualquer época histórica, há que
saber visualizá-la dentro do conjunto do ciclo ao qual pertence. O Medievo
europeu corresponde ao ciclo particular da tradição cristã, e representa um
segmento ou parte desse mesmo ciclo, exatamente sua metade, daí a
denominação de Idade Média. Com ela se atinge –entre os séculos VIII e
XIV– o ponto álgido, a culminação da idéia de civilização especificamente
cristã, que não obstante se gestara durante o curso dos séculos anteriores
(que não devem de jeito nenhum se desconhecerem), e concretamente desde
o momento em que, depois da morte de Cristo, os apóstolos e seus discípulos
começaram a difundir a mensagem por todo Ocidente, chegando até a
Inglaterra.

Este foi o caso de José de Arimatéia e de Nicodemo, de quem se diz eram


portadores da copa do Graal que continha o sangue e a água (o espírito e a
alma) que emanaram da ferida de Cristo na cruz. Esta viagem de José de
Arimatéia às ilhas britânicas constitui sem dúvida uma das chaves mais
importantes para compreender o autêntico espírito que animou à cristandade
medieval, pois, com toda segurança, produziu-se uma assimilação da antiga
tradição celta –e muito especialmente do aspecto mais interior (esotérico) e
iniciático desta, cujo conhecimento estava em posse dos sacerdotes druidas–,
com o cristianismo. A conhecida e importante lenda do Graal, que circulou
por toda a Idade Média (e na qual se relatam as gestas heróicas e iniciáticas
do Rei Artur e dos Doze Cavaleiros da Távola Redonda) [talvez] não
houvesse sido possível sem a herança celta.

Também, muitos outros elementos procedentes de outras tradições se


encontraram na Idade Média. Temos o importante aporte da civilização
romana, especialmente no que se refere à organização social e jurídica, na
arquitetura e na arte (o românico, por exemplo), na constituição das
corporações de construtores, semelhantes aos Collegia Fabrorum, e também
na idéia do Império e do Imperador como detentor supremo da autoridade
espiritual e do poder temporal (recordemos neste sentido a criação do Sacro
Império Romano, auspiciada pelo imperador Carlos Magno, e com o qual se
dá começo propriamente à Idade Média), ainda que desde o ponto de vista
exotérico estas funções estivessem às vezes assumidas pelo papado e pelos
reis, respectivamente.

No âmbito puramente ontológico que assentou as bases da filosofia


medieval, há que se mencionar, entre os séculos IV e V, os chamados Pais da
Igreja, como Dionísio Areopagita, Clemente de Alexandria, Santo
Agostinho, Orígenes e Máximo, o Confessor, conhecedores todos eles das
doutrinas herméticas, platônicas e gnósticas, das quais extraíram o mais
essencial.

Mas a Idade Média não poderia compreender-se em sua totalidade se não


tivéssemos em conta igualmente às outras duas tradições abrahâmicas: a
judaica e a árabe. Quanto à primeira, é evidente que o cristianismo, por suas
origens, procede diretamente do Antigo Testamento, e a expressão judaico-
cristã convinha perfeitamente a certas organizações do esoterismo cristão, às
quais não eram desconhecidos os ensinos da Cábala, cujo maior apogeu se
deu também durante este período, sobretudo na França e na Espanha. No que
respeita à tradição islâmica, é notória a influência que esta exerceu entre as
artes e as ciências, e se conhece a importância que teve na propagação dos
textos alquímicos e da Tradição Hermética em geral.

Neste sentido, há que se assinalar o papel que teve a península Ibérica, já que
fundamentalmente, através dela, a extraordinária riqueza da cultura árabe (e
com ela a recuperação da antiga filosofia grega, especialmente Pitágoras,
Platão e Aristóteles) foi conhecida em toda Europa. Por outro lado, temos os
intercâmbios mantidos pelos iniciados muçulmanos e os cristãos durante a
época das Cruzadas, fato que propiciaria uma comunicação de ordem
doutrinal entre Oriente e Ocidente, que perduraria além da Idade Média,
chegando até o Renascimento, depois do que se imporiam definitivamente as
filosofias e ciências racionalistas inspiradoras da era moderna, sem dúvida a
autêntica "idade obscura".

23 O HERMETISMO MEDIEVAL I
Coincidindo com a queda do Império Romano do Ocidente, durante os
séculos VI e VII se produz um período de ocultamento do pensamento
tradicional que contrasta com o apogeu conhecido nos séculos anteriores,
que, como assinalamos, teve em Alexandria seu foco de irradiação mais
importante. Este ocultamento também afetou a Tradição Hermética, que
depois do desaparecimento da escola de Alexandria e de Atenas se
concentrará em determinadas cidades do Próximo Oriente, e especialmente
em Bizâncio (Constantinopla), naquela época capital do Império Romano do
Oriente, já completamente cristianizado. Efetivamente, Bizâncio aparece
como a herdeira mais importante do legado hermético e neoplatônico, e em
definitivo da cultura clássica, que ali viverão um novo florescimento,
perdurando até bem depois do início da Idade Média. Essa herança está
presente, por exemplo, na obra do bizantino Miguel Psellos (século XI),
grande comentador do Corpus Hermeticum, de Platão, Proclo, Dionísio
Areopagita, etc., e que posteriormente exercerá uma notável influência na
tradição renascentista.

Mas o Hermetismo medieval ressurge com força sob o impulso da nascente


civilização islâmica, que em menos de cem anos se estende da China e da
Índia até a Península Ibérica. Efetivamente, existem numerosos adeptos
árabes que traduzem para sua língua os livros herméticos (sobre Alquimia,
Astrologia, Magia, Matemáticas, Medicina, e as ciências da natureza em
geral), o que faz possível que estes se conservem e passem a ser traduzidos
posteriormente ao latim, permitindo assim sua difusão por toda Europa. Isto
se acompanha com as traduções do "divino" Platão e de toda a tradição
filosófica emanada de seus ensinos. Tudo isto, como dissemos, passará ao
Ocidente, que na época de expansão do islã (séculos VIII-IX) vivia sumido
na difícil transição da Idade Antiga à Idade Média.

Por outro lado, não é mera casualidade, senão algo que depende dos
desígnios divinos que entretecem a estrutura invisível da história, que
simultaneamente à penetração árabe na Península Ibérica (século VIII),
estivesse sendo gestada a unidade política, cultural e religiosa da cristandade
sob a autoridade temporal e espiritual do Sacro Império Romano, instituído
por Carlos Magno, e com o qual começa definitivamente a Idade Média,
como vimos no capítulo anterior. Esta unidade vai facilitar que, através da
Espanha muçulmana (país que recebe a denominação de "Porta Real da
Alquimia" e "Porta Solar"), a arte e a ciência sagrada de Hermes cheguem
efetivamente a Europa. Por cima das diferenças que possam afetar às
relações que entre si mantêm os exoterismos das civilizações tradicionais,
sempre prevalecerá o ponto de vista esotérico e metafísico, que as identifica
no essencial. O Califado de Córdoba e, mais tarde, Toledo são as cidades nas
quais se produz o verdadeiro renascimento medieval, e onde frutiferamente
vão conviver as três tradições do livro: judaísmo, cristianismo e islã. Mas é
especialmente com a escola de tradutores de Toledo que começa a se verter
ao latim o hermetismo acumulado e desenvolvido pelos árabes. Sábios
vindos de todos os países da cristandade (por exemplo Miguel Escoto e
Gerardo de Cremona) coincidem na cidade imperial, "crisol de alquimistas".

Junto a Toledo temos de ressaltar a enorme importância das Escolas de


Chartres e de Oxford (Séculos XII e XIII) na difusão das idéias herméticas e
platônicas. À primeira pertenceram Bernardo de Chartres, Guilherme de
Conches e Bernardo Silvestre, todo eles continuadores da obra de João
Escoto Erígena (século IX), monge irlandês que recebe por sua vez a herança
do hermetismo alexandrino e do platonismo cristão de Dionísio Areopagita.
Na segunda encontramos ao já mencionado Miguel Escoto, alquimista e
astrólogo, a Robert Grosseteste e Roger Bacon, conhecido como o "Doutor
Mirabilis" pela grande síntese que realizou de todos os ramos da Ciência
Sagrada.

Pela importância que tiveram no desenvolvimento do Hermetismo medieval


merece destacar-se a tradução do Livro de Morieno, no qual se relata a lenda
segundo a qual Hermes Mercúrio, o "Pai dos Filósofos" recuperou as
ciências e artes sagradas depois do dilúvio. Traduz-se também a Tábua de
Esmeralda, texto fundamental da Alquimia greco-egípcia posto sob a autoria
do próprio Hermes Trismegisto, e cujos doze pontos constituem um resumo
sintético de todo o ensino da Grande Obra. Não menos importante é a
tradução da Multidão dos Filósofos, onde se descreve, em forma de diálogos
alquímicos, o acontecido num congresso imaginário de filósofos gregos
como Pitágoras, Sócrates, Demócrito, Parmênides, etc. Também o livro
alquímico e astrológico Picatrix, tradução que se faz durante o reinado do rei
sábio Alfonso X, ao qual se deve a redação do Lapidário, onde se fala das
propriedades mágicas do mundo mineral posto em relação com as energias
astrais e planetárias. O mesmo ocorre com o Livro da Misericórdia, do
célebre alquimista árabe Geber. Séculos mais tarde, em pleno Renascimento,
Cornélio Agrippa, influenciado pelos ensinos deste autor, escreve em Da
Filosofia Oculta: "Ninguém pode sobressair na arte alquímica sem conhecer
os princípios em si mesmo, e quanto maior o conhecimento de si mesmo,
maior será o poder de atração adquirido, e se realizarão mais coisas grandes
e maravilhosas". Este é o fundamento da Alquimia natural e espiritual, que o
grande metafísico sufi Ibn Arabi desenvolverá em sua obra A Alquimia da
Felicidade Perfeita, mostrando as etapas que o iniciado deve atravessar em
sua “viagem", descendo primeiro aos planos elementares até retornar, numa
ascensão vertical, a "A Força do Elixir" da Sabedoria Divina. Em dita
ascensão, a alma do peregrino percorre os céus planetários revestindo-se da
luz cognoscitiva que mora em cada um deles, chegando finalmente ante a
presença do "Trono Divino", "motor imóvel" ou Arquétipo Supremo no qual
será absorvido numa plena identificação.

No hermetismo cristão esta descrição do universo espiritual se representará


iconograficamente com uma série de círculos concêntricos, com a terra em
seu centro, girando em torno dela os três elementos restantes mais o éter, os
sete planetas, o zodíaco, o céu das estrelas fixas ou Empíreo, morada do fogo
puro e eterno, em cima do qual aparece a figura da Divindade. Esta imagem
do mundo, enraizada na astrologia de Ptolomeu e no Timeu de Platão,
influirá notavelmente em Dante, que escreveu a Divina Comédia baseando-
se em parte nos ensinos do sufismo islâmico, e especialmente em quem foi
um de seus máximos representantes, o já nomeado Ibn Arabi. Este era
considerado "Filho de Platão" e o "Mestre por Excelência", que tinha
atingido o grau de "enxofre vermelho", que não é outro que o estado
espiritual, que em linguagem alquímica cifrada serve para designar àquele
que chegou de maneira definitiva ao Conhecimento mediante a obtenção da
"Pedra Filosofal".

24 DIONÍSIO AREOPAGITA
Durante toda a Idade Média e Renascimento, foi extraordinária a influência
deste autor, representante do pensamento neoplatônico e da autêntica
espiritualidade cristã. Supostamente se apresenta nosso personagem como
discípulo direto de São Paulo, que serve para difundir seus escritos e evitar
censuras por parte da igreja “oficial”. Sua “teologia negativa” na corrente de
Proclo e Plotino, influiu diretamente em toda a Idade Média anterior a São
Tomás (o que inclui vários séculos), em particular (para citar um só
exemplo) na escola do Chartres, e igualmente em mestre Eckhart (e em
Tauler e Suso), em Nicolás de Cusa e São João da Cruz, entre outros tantos
sábios, teólogos e teósofos ocidentais. Escreveu um tratado sobre Os Nomes
Divinos e outro texto sobre Teologia Mística, além de um livro sobre
Astronomia. Conservam-se, também, algumas de suas epístolas.
Reproduzimos aqui duas de suas cartas dirigidas a adeptos.

“A Doroteu, Ministro:

A treva divina é aquela luz inacessível na qual, diz-se, Deus habita1. E como
aquela seja inapreensível por causa da difusão exuberante de sua luz
sobrenatural, entretanto, nela descansa qualquer que mereça conhecer e ver
Deus, e pela mesma razão pela qual não vê nem conhece, este mesmo existe
naquele que transcende qualquer visão e conhecimento, sabendo só do que
está além das coisas sensíveis e inteligíveis, dizendo de uma vez que o
profeta: ‘para mim é admirável sua ciência, tão elevada que jamais poderei
alcançá-la’2.

Deste modo é como se diz do divino Paulo, que conheceu Deus quando
soube que ele existia transcendendo toda ciência e inteligência; deste modo
diz (ele) que seus caminhos são indecifráveis e inescrutáveis seus juízos3,
inenarráveis seus dons e sua paz ultrapassa a todo entendimento4, já que
descobriu Aquele que é totalmente transcendente e soube, de um modo que
ultrapassa qualquer inteligência, que Aquele que é autor de todas as coisas, é
também superior a todas elas.”
1
I Tim., VI 16.
2
Salmo 139 (Vulgata, 138), 6.
3
Romanos, XI, 33.
4
Filipenses, IV, 7

“A Sosipatro, Sacerdote:

Não te julgue vitorioso, venerado Sosipatro, por atacar aquele culto ou


opinião que não te parece legítima pois, se arguíres retamente contra eles,
não por isso demonstrarás o valor positivo de tuas afirmações; pode ser que,
tanto para ti como para outros, escape-te a verdade, que é, por sua vez,
oculta e verdadeira, a favor das aparências.

Pois não é bastante que um objeto não seja vermelho ou brilhante, para que
seja branco; nem, se alguém não for cavalo, não por isso necessariamente é
um homem. E assim, se me quer escutar, isto é o que fará; desiste de falar
contra seus adversários, e que tudo o que diga seja para estabelecer a
verdade de tal maneira que não sejam válidas as coisas que se digam contra
ti.”

25 O SIMBOLISMO HERÁLDICO
A heráldica representa uma expressão mais da simbólica tradicional do
Ocidente. Propriamente dita, ela aparece com a constituição das ordens de
cavalaria medievais, pelo que tudo o que a ela se refere está diretamente
relacionado com a casta dos guerreiros e da nobreza em geral. Muito
apropriadamente era chamada a "ciência heróica" ou a "nobre ciência", ainda
que também é verdadeiro que existia uma arte heráldica eclesiástica e das
corporações de artesãos, esta última muito estendida durante o
Renascimento. O rico e complexo simbolismo heráldico seria mais uma
antiqualha se realmente não encerrasse um sentido esotérico e
fundamentalmente sagrado, que precisamente é o que lhe dá todo seu relevo
e importância, e sobretudo o que o converte em plenamente atual e vivo.
Sem dúvida a peça central e mais importante da heráldica é o brasão ou
escudo. Etimologicamente, o termo brasão deriva do verbo alemão blasen
que significa "sopro", revelando com isso a presença de uma inspiração
espiritual e divina na elaboração do mesmo. Neste sentido, antes do advento
de uma arte escrita e figurada, o brasão era clamado pelo heraldo de armas
no campo de batalha e nos torneios, utilizando para isso também a música,
ou seja, que era transmitido por meio da palavra e do som. E tudo o que já
dissemos no Programa Agartha sobre a semelhança e a complementaridade
entre o simbolismo sonoro e oral e o simbolismo geométrico e visual, cabe
neste caso particular. Em primeiro lugar, no escudo heráldico se plasma a
arte da divisa e do emblema. A divisa é uma sentença, uma frase
criptogramática que constitui a alma do que aparece no mesmo, enquanto o
emblema é a figura ou o corpo.

Em geral todo o mundo da natureza, os animais (incluídos os fabulosos


como o dragão e o grifo), as flores e plantas, as pedras, os metais, os planetas
e as estrelas participam da plástica e da simbólica do brasão. Uma figura
freqüente neste é o castelo ou qualquer outra fortaleza; iniciaticamente, são
símbolos da alma regenerada, da cidade, recinto ou palácio interior fechado
às influências profanas. Na realidade, a arte do brasão, sua técnica espiritual,
consistia em estabelecer um sistema de correspondências e analogias entre o
plano visível e o invisível, o natural e o sobrenatural, tratando-se pois de
uma ciência e de uma arte verdadeiramente hermética, e vinculada portanto à
idéia de "o que está acima é como o que está abaixo". Não se deve esquecer
que para a mentalidade do homem tradicional e arcaico a natureza inteira é
uma hierofania, ou seja, uma manifestação do sagrado. Neste sentido as
diferentes espécies naturais representadas no brasão estão expressando seus
correspondentes arquétipos espirituais, e num grau menor as diferentes
tendências psicológicas a elas adscritas. E em tudo isto, o homem como
intermediário, já que é ao próprio universo interior deste que se refere todo o
código heráldico. Por exemplo, se a águia é um animal eminentemente
celeste, a atitude com a qual geralmente se lhe representa (as asas abertas,
que em ocasiões abarcam todo o escudo como se o contivesse) não faz senão
simbolizar o vôo do espírito para as regiões superiores. Também, a atitude
de galhardia e fereza do leão, animal terrestre, evoca e infunde o valor
interior imprescindível para combater contra as potências obscuras e caóticas
do inconsciente. E o grifo (metade águia e metade leão) supõe um estado
intermediário no processo que conduz do terrestre ao celeste. Também se
deve considerar o brasão como um instrumento não só para se defender dos
inimigos físicos, senão, o que era mais importante, como um marco protetor
contra as sutis influências inferiores.

Em todo caso a aquisição de um brasão estava em relação direta com a


evolução espiritual daquele que o pretendia, o que sem dúvida eximia de
qualquer privilégio fictício e oportunista. Igualmente o significado esotérico
dos símbolos, figuras e cores revelava o grau espiritual que tinha atingido
seu possuidor; e isto mesmo se fazia extensivo ao escudo heráldico de uma
corporação, cidade, reino ou nação. Neste sentido, para conhecer a
verdadeira essência e personalidade espiritual de uma cidade ou região nada
melhor do que pesquisar nos símbolos presentes em seus brasões.
Compreende-se então a importância destes porquanto eram receptores e
transmissores de idéias-força e autênticas imagens-mandalas, contendo
alguns deles conhecimentos de ordem metafísica muito elevados.
fig. 26
26 ARQUEOLOGIA
É freqüente ver em quase todas as grandes e médias cidades do mundo
museus arqueológicos que recolhem os monumentos e as artes da
Antigüidade. Embora as origens da Arqueologia se remontem à Itália do
Renascimento, podem encontrar-se vestígios dela em certos autores
clássicos, como, por exemplo, o historiador Dionísio de Halicarnaso, que pôs
o título de Arqueológica a uma de suas obras; entretanto, somente no século
XIX que a Arqueologia se converte em ciência oficialmente aceita. Por outro
lado é durante esse século que surgem quase todas as ciências que se
dedicam ao estudo do passado do homem e da terra; assiste-se ao nascimento
da antropologia ou etnologia, da paleontologia, da história das religiões, da
geologia, etc. Poderia quiçá perguntar-se o porquê deste repentino interesse
pelo passado, pelo pretérito, pelo antigo, e responderemos que isso só foi
possível pelo fato de que no século XIX, e sobretudo no Ocidente, ter-se
virtualmente perdido todo vestígio da Tradição, ao menos de uma maneira
visível e externa, pelo que era perfeitamente lógico que o homem começasse
a esquadrinhar nos fragmentos de seu passado histórico para assim
reconstruir o que foi a vida de seus antepassados, pois a sua própria sumia
em uma cada vez mais estéril mediocridade. Acontece também que no século
XIX é quando se acabam de consolidar definitivamente o positivismo
materialista e o racionalismo, que vinham sendo incubados desde já fazia
tempo, que deviam influir decisivamente na mentalidade da época. Deste
modo, pode ser dito que tais ciências foram o resultado dessa visão
excessivamente voltada para o exterior, que por certo é a que ainda impera
na maioria dos arqueólogos oficialistas, que a projetam nos próprios objetos
de seu estudo. Estes se empenham em não ver em seus achados outra coisa
que restos mais ou menos interessantes e curiosos, aos quais terá que
classificar (e enquadrar) segundo uns parâmetros que eles mesmos
estabeleceram para sua comodidade investigadora.
fig. 27

Outra conseqüência igualmente equivocada, produto dessa mentalidade


positivista, é a de não se atentar para as diferenças qualitativas que se dão
entre os homens e civilizações das diferentes épocas e períodos históricos,
como se o tempo transcorresse uniformemente e fora homogêneo. Assim,
segundo esse critério, a mentalidade do homem moderno, alheio por
completo a qualquer intuição e sentimento sagrado e transcendente, seria
idêntica à do homem das sociedades tradicionais, que pelo contrário
considerava que todos os atos de sua existência cotidiana estavam
impregnados de sacralidade. Se a Arqueologia, através das análises e
trabalhos de escavação, trata da reconstrução da vida das sociedades antigas,
essas mesmas investigações não deveriam estar desvinculadas de um
rigoroso conhecimento da história e da geografia sagradas, quer dizer, do
tempo e do espaço qualitativos, como tampouco serem alheias às relações
que existem entre os diversos modos e comportamentos culturais e
espirituais dos homens que integraram essas mesmas sociedades.

Visitar um museu de Arqueologia é em certo modo recuperar o sentido da


atemporalidade. Todas as peças, numeradas e catalogadas, estão ali como
resistindo ao tempo, negando-se a deixar de existir definitivamente. Alheios
a qualquer prejulgamento, daremos conta de tudo o que o homem, inspirado
nos princípios metafísicos que formaram sua civilização, é capaz de criar, de
fazer, de edificar, em definitivo de plasmar na pedra ou qualquer outra
matéria ou substância, refletindo a beleza de seu mundo interior. Pois essas
colunas e arcos, essas esculturas, pinturas, cerâmicas, baixos-relevos,
mosaicos são símbolos e gestos que o rito do trabalho artesanal
pacientemente elaborou e fixou: de repente toda a cultura humana está aí
representada. Um museu arqueológico é na verdade um discurso onde se
expressa o antigo (este é precisamente o significado etimológico de
arqueologia), termo que não deve ser confundido com o velho e o caduco;
melhor se relaciona com tudo aquilo que é perene e que reflete as idéias ou
arquétipos universais. Neste sentido, o antigo é perfeitamente atual. E um
museu arqueológico pode ser um lugar excelente de meditação (assinalemos
que a palavra Museu procede de Musa) se o abordarmos não com olhos de
"especialista", mas sim como se tratasse de uma evocação poética onde com
toda probabilidade encontraremos uma parte ou aspecto esquecido de nós
mesmos.

27 ALFONSO X, O SÁBIO - I
Por razões históricas e geográficas, Toledo é o centro da Península Ibérica.
Também o é por razões simbólicas e metafísicas, e a Tradição assinala, por
um lado, a antigüidade desta cidade, que se remonta à origem dos tempos, ou
seja, do tempo mítico, e por outro, a sua relação com a Atlântida, também
presente nas raízes TL de seu nome. Queremos nos referir neste trabalho a
Alfonso X, o Sábio, verdadeiro ponto central da história da Espanha (à qual,
por outra parte, recompilou), como o monarca mais importante de Castela,
que deu à Espanha sua unidade, sua língua, e inclusive sua época de
hegemonia mundial, incluindo a conquista da América.

Na história da Espanha medieval se sobressai a figura eminente do rei


castelhano (1221-1284), filho por sua vez de outro grande rei, Fernando III,
o Santo. Alfonso X era chamado o Sábio sem dúvida devido aos vastos
conhecimentos que possuía sobre as diversas disciplinas e ramos do saber.
Ele deixou escrito que um rei, para ser considerado como tal, deve ser o
primeiro dos homens em conhecimento e sabedoria, pois só assim advém o
reflexo na terra da Inteligência Suprema. Além disso, Alfonso X, por sua
dupla condição de rei e sábio, reunia em sua pessoa a síntese entre o poder
temporal e o espiritual, que como já sabemos constituem as qualidades
principais de todo verdadeiro Imperador. Possivelmente esta foi a razão
(além de questões dinásticas e de herança nas quais não entraremos) pela
qual, durante grande parte de seu reinado, pretendeu a coroa do Sacro
Império Romano-Germânico. Acreditava ser descendente da linhagem
imperial que vem desde Alexandre Magno, passando pelos imperadores
romanos, até seu tio Frederico II. E, além disso, para Alfonso X esta
linhagem tinha origens celestes, já que tinha sido instituída pelo próprio
Júpiter, a quem via como uma prefiguração greco-romana de Cristo. Se não
o conseguiu foi devido às disputas e interesses da política que em ocasiões
empanaram os vínculos entre a realeza e o papado.

Com toda segurança, o que aconteceu posteriormente na história européia


teria tomado outros rumos se Alfonso X tivesse sido entronizado como Rex
Romanorum. Não obstante, isto não foi óbice para que o frutífero trabalho do
rei sábio exercesse uma notável influência no terreno da filosofia, das artes e
das ciências de seu tempo e, o que é mais importante, que esse trabalho
estendesse uma ponte entre as culturas tradicionais do Oriente e do Ocidente.

Graças à Escola de Tradutores de Toledo (auspiciada por seu pai Fernando,


quem tomou como modelo as criadas séculos antes pelos califas omíadas de
Córdoba), a riqueza da civilização e cultura islâmicas (e através destas, da
filosofia grega) puderam ser conhecidas na Europa cristã. Nesta escola, a
mais importante da época, participavam por igual doutores e sábios árabes,
judeus e cristãos, o que refletia o espírito de convivência que caracterizou,
durante grandes períodos da idade média hispânica, às três tradições do
tronco abraâmico.

Os livros e tratados sobre astronomia, alquimia, música, medicina,


geometria, agricultura e outras artes e ciências herméticas, hebraicas e
árabes, foram traduzidos ao latim e às diversas línguas românicas e
vernáculas faladas na Europa. Igualmente o idioma castelhano, ao qual
também foram traduzidas muitas dessas obras, experimentou um enorme
enriquecimento graças, sobretudo, à influência árabe, convertendo-se
também no veículo de uma cultura.

fig. 28

28 A CIZÂNIA
A parábola evangélica da cizânia (Mateus XIII, 24-30 e 36-43), entre outras
significações de ordem espiritual, também nos ilustra a respeito da dualidade
implícita no processo iniciático, ao menos até certa etapa deste.

Na iconografia alquímica, representa-se com freqüência a imagem de um


agricultor que pulveriza sementes em seu campo, já preparado para o arado,
que é acompanhado por um anjo (princípio supra-humano ou Eu do homem)
que parece lhe sussurrar palavras celestes ao ouvido. O campo é nossa alma,
e o grão de trigo é a semente do Ensino e do Conhecimento, sendo
necessário, para nossa saúde interior, que frutifique e se faça poderosa.

Mas em nós também existe o mau semeador, que de maneira furtiva, e


amparado nas sombras da noite e da ignorância, tenta destruir, semeando
cizânia, a obra começada, desviando-nos do caminho que a razão e intuição
superior nos diz que é o que devemos seguir. Este mau semeador é o "ego", a
alma inferior, cujo alimento e sustento são os frutos "deste mundo".

Entretanto, a mesma parábola nos explica que não devemos nos precipitar e
cortar a cizânia recém brotada, pois se corre perigo de cortar deste modo o
broto de trigo. No princípio, e enquanto se desenvolvem, terá que os deixar
crescer juntos.

Para a economia divina, que se expressa como ordem cósmica, o bem e o


mal, ou melhor, clemência e rigor, supõem uma dualidade fundamental e
imprescindível, deixando entrever por isso mesmo a idéia da unidade ou
equilíbrio conciliador dos opostos no Amor e na Beleza inteligíveis. De
entrada, não devemos desprezar quão negativo há em cada um de nós, pois
sua presença nos oferece o contraste da sombra e do reflexo invertido.

Levado ao plano psicológico, "não dever cortar a cizânia até que tenha
crescido" quer dizer que é necessária a manifestação de todas as tendências
inferiores que levamos dentro, já que as ocultar poderia supor, por um lado,
o desconhecimento de uma parte de nosso ser, e por outro –haja vista que, de
uma maneira ou outra, essas tendências existem–, é provável que ao final, se
não forem expressadas ao exterior, acabem escavando o melhor de nós
mesmos.

Mas é importante o não esquecer que isso deve ser feito amparado na
Doutrina e na Tradição, que atuam como moldura protetora (sagrada). Só
assim o inferior poderá ser canalizado, purificado e transmutado (pelo fogo
sutil) num elemento superior, que na parábola fica exemplificado pela
dourada espiga de trigo, fruto que simboliza o estado de regeneração
iniciática e espiritual.

fig. 29

29 GEOMETRIA
O universo inteiro é uma dança cujo sentido só se pode achar nos traçados
invisíveis que ela forma. A Geometria se ocupa do estudo destes padrões e
ordens harmônicos que, longe de serem estáticos, são reflexos de idéias
geradoras. O Oriente desenvolveu estes padrões que irradiam de um centro e
que em sânscrito se chamam mandalas, como suportes para a meditação.

A Divina Comédia, escrita nos inícios do século XIV, apresenta uma viagem
através dos padrões do destino de acordo com as concepções cristãs
medievais. O inferno, o purgatório e o céu são concebidos como imensos
mandalas.

Recordemos que o estudo da Geometria foi recomendado por Platão como


um verdadeiro caminho de iniciação, já que não é mais que a manifestação
visível de harmonias invisíveis que podem ser percebidas como sensações
num espaço fisiológico, como emoções num espaço psicológico, ou como
formas geométricas num espaço abstrato. O tipo de relação determina o ser
que se concebe e é por isso que ser e conhecer são equiparáveis.

Só a consciência é capaz de perceber a transparência entre as formas


geométricas insubstanciais e as formas mutáveis e transitórias deste mundo.
A arquitetura da existência está determinada por um mundo invisível e
imaterial, composto de forma e por isso de geometria.

Efetivamente, como o testemunha toda a Sabedoria Tradicional, existe uma


unidade profundamente arraigada, que subjaz às múltiplas diversidades
aparentemente caóticas deste mundo.

Esta ordem preexiste, manifesta-se em simples relações proporcionais,


criando padrões que em sua harmonia refletem à totalidade e dão forma
tangível a uma ordem intangível. No mundo manifestado, a unidade se
reflete como polaridade, já que só pode conceber-se em termos de "mais
algo" e "menos algo". Entretanto a polaridade se refere aos opostos, mas sem
indícios ainda de que algo nasce deles. A proporção é o que nasce desses
limites compartilhados: é uma relação e por sua vez um limite que nos abre a
porta ao ilimitado.

Por harmonia entendemos uma ordenada e agradável união de diversidades;


já a origem da palavra harmonia o diz: do grego armos = juntar.

Os mil e um seres nascem da união entre opostos que se complementam, e a


aparência material não é mais que o entrelaçamento de energias e
polaridades em diferentes proporções e harmonias, que produzem a
variedade de qualidades desta.

O Livro das Mutações ou I-Ching está baseado no reconhecimento de que as


diversidades sempre mutáveis da existência têm uma unidade subjacente de
ordem, no qual tudo está relacionado com tudo. O fundamento desta ordem é
a unidade dos princípios escuro (Yin) e luminoso (Yang) que, combinados de
todas as maneiras possíveis, simbolizam as diferentes situações básicas da
vida.
fig. 30

30 ALFONSO X, O SÁBIO - II
Foi precisamente sob o reinado do Alfonso X quando a Cabala conheceu sua
época de maior esplendor, escrevendo o Zohar e outros textos sagrados da
tradição judaica. Digamos que, sem a visão universal do acontecer histórico
que possuía Alfonso X, o Ocidente tivesse entrado em um processo de
decadência muito mais acentuado e rápido que o que se conheceu entre os
séculos XIV e XVII, decadência que encontra sua expressão mais clara em
nossos dias. Tampouco tivesse sido possível, com a intensidade com que se
produziu, o ressurgimento das doutrinas herméticas durante o Renascimento.
Por exemplo os sistemas astronômicos e astrológicos elaborados naquela
época tinham suas fontes nas traduções alfonsinas.

Uma das obras nas quais Alfonso X interveio mais diretamente, além da
História Geral foi o Setenario, onde se recolhem diversas matérias
cosmológicas, teológicas, históricas, jurídicas, além de alguns dogmas e
sacramentos próprios da tradição cristã. Mas Alfonso, o Sábio, destacou-se
também como um poeta que cantava a alma do Mundo, sua beleza e
harmonia, que viu encarnada na figura da Virgem Mãe. Alfonso X se
considerava um humilde trovador da Virgem, e em suas Cantigas da Santa
Maria são narrados alguns dos milagres intercedidos por nossa Senhora,
inclusive vários deles acontecidos na própria pessoa do rei. Entretanto terá
que assinalar que o culto à Virgem não tinha na Idade Média o caráter de
beatice simplória que teve posteriormente, e embora exotericamente sua
influência espiritual mantivesse um laço de união entre a devoção popular e
o sagrado, esotericamente era considerada como a "Rainha do Mundo", e
portanto mãe espiritual dos iniciados. As Cantigas de Alfonso o Sábio não
estavam tingidas de um vago misticismo; mais ainda, ao serem musicadas
advieram com freqüência verdadeiros hinos oferecidos a Vênus Urânia, a
deusa da Sabedoria, do Amor e da Beleza, três virtudes celestes que sem
dúvida este grande rei quis que fossem as pedras angulares de sua extensa e
importante, também para nós, obra cultural.
fig. 31

31 A TRADIÇÃO E A MENSAGEM
A tradição se transmite de maneira horizontal e fecundou diferentes
civilizações e individualidades. Mas isto foi possível mercê à permanente
reatualização vertical da Tradição Universal, que se revela com novas
formas (de acordo a um concerto de forças que se entrelaçam
harmonicamente e que incluem em sua orquestração as circunstâncias
pessoais daquele, ou daqueles que a encarnam e a transmitem),
regenerando assim a Tradição Originária, o que permite a continuidade da
cadeia de união ao longo da História e a possibilidade sempre presente da
iniciação, da realização espiritual, da metanóia. Por outra parte esta
urgência de transmitir a seus semelhantes esta Mensagem, que sentem
aqueles em quem a doutrina e o símbolo se vivificaram, encontra-se
particularmente aguçada nos tempos atuais, onde um fim de ciclo obriga a
redobrar energias na realização vertical, como igualmente na difusão
horizontal.

32 O HERMETISMO MEDIEVAL II
No Ocidente, o século XII representa a expansão das ordens monásticas e da
cavalaria, entre as quais se destaca a do Templo, que são as que detêm
praticamente a totalidade da doutrina e do saber tradicional. Não é de se
estranhar, pois, que fossem em sua grande maioria clérigos, abades e homens
de igreja os que, em suas peregrinações, serviram de enlace na propagação
do Hermetismo no continente, sem esquecer as relações que entre si
mantiveram a cavalaria cristã e islâmica. Mas a tradição de Hermes, com
seus mistérios mágicos e teúrgicos, infunde no espírito do homem medieval
um amor para a natureza que no Ocidente não se conhecia desde a
Antigüidade greco-latina; amor que é motivado também pela influência que
nesse tempo exerceu o "Cantar dos Cantares" de Salomão. "Redescobre-se",
por assim dizer, a dimensão sagrada da Natureza, sua beleza transcendente,
que se concebe como uma hierofania onde o divino e sobrenatural se faz
presente no próprio seio da “matéria”. Natureza, enfim, visualizada como
uma Mulher ao mesmo tempo Virgem –Natura Naturans– e também Mãe –
Natura Naturata–, que ao receber em sua substância as sementes do Espírito,
procria e dá vida (e por isso mesmo devora e mata) às inumeráveis formas
que manifestam a unidade do cosmos, pleno assim de significado simbólico.
Por tudo isso, o corpo humano, o microcosmos, é dignificado e devolvido a
sua função analógica de refletir em cada uma de suas partes à totalidade do
macrocosmo, seguindo nisto a máxima hermética de que "o de baixo é igual
ao de cima...".

Tendo sempre presente esta imanência do divino na Natureza, as obras do


Alain de Lille, Hildegarde de Bingen, Bernardo Silvestre, Honorius
Augustodunensis, e tantos outros, abundam em correspondências simbólicas
entre o homem e o Cosmo. Os ossos, as unhas, os cabelos e os sentidos se
relacionam com as pedras, as árvores, as plantas e ervas, os animais... Na
cabeça, redonda como o firmamento estrelado, reside a inteligência e a mens
luminosa, comparando-se com o céu das estrelas fixas que rodeiam o
zodíaco, e cujo giro perene é impulsionado pelo sopro divino. O peito, e
mais concretamente o coração, alberga as emoções e sentimentos superiores
vinculados com os deuses e as entidades angélicas. A parte inferior e
instintiva corresponde propriamente ao homem físico e à terra. Todas estas
correspondências são reveladoras de uma cosmosofia que servirá de base
para o posterior desenvolvimento da Filosofia Oculta do Renascimento.

Mas antes deve chegar o século XIII e a definitiva consolidação do


Hermetismo, que de forma sutil e vivificante penetra, como já dissemos, em
virtualmente todos os círculos intelectuais, artesanais e esotéricos. Por outro
lado, não terá que esquecer as diversas correntes da Cabala hebraica, cujo
centro de irradiação está na Espanha e na Provença francesa. Neste século, a
concepção filosófica, cosmológica e teosófica da Idade Média encontra sua
mais plena expressão na catedral gótica, que, como o templo românico,
constitui um compêndio do universo material e espiritual. Esculpidos na
pedra (sentida como matéria viva e não inerte) descrevem-se os diversos
reinos da Natureza elemental, o mundo intermediário com seus monstros
guardiães e seres fabulosos, o gênero humano representando cenas
exemplares e da história sagrada, as hierarquias angélicas e celestes, e
finalmente, presidindo todo este conjunto matizado que se eleva em vertical
para o céu, a figura da divindade em atitude de presença imutável. Esta visão
escalonada de baixo para cima e de cima para baixo, sugere a idéia de uma
transmutação alquímica ligada deste modo à descrição de uma geometria
sutil do cosmos que a própria catedral expressa, com a planta quadrada (ou
retangular), as colunas, e a cúpula circular arrematada com a "chave de
abóbada". O círculo (céu) que engloba o quadrado (terra) ou o quadrado que
emoldura o círculo, simbolizam a interpenetração do tempo e da eternidade
no devir da existência manifestada. Esta geometria filosofal formava parte
dos ensinos pitagóricos e platônicos transmitidos em grande medida pelo
Hermetismo aos arquitetos construtores, que não eram outros que os maçons
e companheiros operativos. Efetivamente, junto aos grêmios de construtores,
trabalhavam em perfeita harmonia os astrólogos, magos e mestres
alquimistas; e essa convivência, selada na catedral, era uma amostra da
definitiva síntese que durante séculos se forjou entre a filosofia hermética e a
espiritualidade cristã, de onde surgiu o chamado hermetismo cristão e do
qual deveria sair também o código do TARÔ, tal e como chegou até nossos
dias. Igualmente, dessa confluência doutrinal entre ambas as tradições,
nasceram várias organizações heterodoxas e iniciáticas que, como os
“Irmãos do Livre Espírito” e os “Fiéis de Amor” (estes últimos estreitamente
vinculados com a Ordem do Templo) propugnavam uma iniciação baseada
nos mistérios do amor (cantados também por jograis e trovadores) como uma
forma de aceder ao Conhecimento: a mulher como personificação da Sophia
(sabedoria) divina, que tão somente se descobre ao homem quando a alma ou
psique foi alquimicamente reduzida à “matéria prima”.

Assim que à abundante e bela criação literária da época, o rastro hermético


se deixará sentir poderosamente, como no célebre "Romance da Rosa", de
conteúdo épico e cavalheiresco, onde se descreve a gesta iniciática da busca
do Templo interior (a Jerusalém Celeste), prefigurada já na arquitetura do
Templo do Salomão. Mas o hermetismo cristão também estaria presente em
homens de Igreja da talha de Mestre Eckhart, São Alberto Magno, São
Boaventura, Roger Bacon, Michel Scot, Robert Grosseteste, e inclusive em
papas como João XXI e Silvestre II (este no século XI). De novo na
Península Ibérica encontramos o médico e alquimista catalão Arnau de
Vilanova, em cuja obra "O Rosário dos Filósofos" destaca as
correspondências existentes entre a paixão, morte e ressurreição de Cristo e
os processos da Grande Obra. Pela mesma época, na Espanha também, o
judeu Moisés de León escreve o Sefer Ha Zohar ou "Livro do Esplendor",
obra fundamental, junto com o Sefer Ha Yetsirah, da Cabala hebraica. A
Cabala teve uma notável influencia no filósofo e teurgo marroquino Ramón
Llull, criador de um sistema astrológico-alquímico, o “ars combinatoria”,
baseado nas combinações e permutações entre as diversas letras, nomes e
atributos divinos relacionados com as figuras geométricas primitivas do
triângulo, do círculo e do quadrado, figuras que simbolizam cada um dos três
mundos. Este é um sistema doutrinário completo e coerente que recolhe o
essencial da teosofia cristã (especialmente dos neoplatônicos Dionísio
Areopagita e Scoto Erígena), da Cabala (Moisés de León e Abraham
Abulafia) e também do Islã. Graças ao “ars combinatoria” o adepto pode
comunicar-se com todos os planos do universo, ascendendo e descendendo
pela escada da Arte do nível mais inferior até a Deidade inefável. De algum
jeito Ramón Llull foi o primeiro em combinar os nomes divinos hebreus e
cristãos, e com toda segurança em sua obra se inspiraram os magos e
humanistas do Renascimento que iluminaram o importante movimento
hermético da Cabala Cristã.

33 METATRON
No Módulo I, título N.º 69, falávamos do Metatron e o associávamos com o
arcanjo Miguel; queremos ampliar aqui um pouco o tema desta figura
enigmática da doutrina cabalística. Começaremos dizendo que seu nome é
equivalente numericamente no nome Shaddai (314), que significa "o Todo-
poderoso", e em certas ocasiões o vê como o par da Shekhinah, a imanência
divina. Tal é sua importância que às vezes o confundiu com o princípio
chamado Moisés e até com o próprio Demiurgo.

Indefinido e sutil, é o grande intermediário, guardião, enviado e mediador; é


Sar Ha Gadol, "Grande Príncipe", e Kohen Ha Gadol, "Grande Sacerdote",
segundo René Guénon, que regula as relações do céu com a terra. Percorre a
Árvore da Vida desde Kether a Malkhuth, morando alternativamente em
Tifereth (e aqui se o assemelha com Cristo) e Yesod. Suas ascensão e descida
são axiais.

Mas também a Cabala reconhece um lado escuro em Metatron e portanto na


Shekhinah. Ao separar o mal do bem, as escórias (Keliphoth) formaram um
Adão invertido: Adam Belial, e portanto há um Metatron invertido, a face
escura do anjo Mikael: Samael, anjo que tem submetidos a inumeráveis
demônios, entidades ctônicas e não urânicas, terrestres e não celestes, que
são invocadas às vezes nos ritos mágicos.

A Shekhinah é a imagem de Deus –emanada d'Ele mesmo– que o faz


inteligível, e está implícita em toda a Criação. Seu par masculino, Metatron,
é a potência divina em ação.
34 HISTÓRIA SAGRADA
O parêntese entre o final da Idade Média (que a tradição data em 1.314 com
o desaparecimento da Ordem Templária) e os inícios do Renascimento,
caracteriza-se por um período em que as estruturas da sociedade tradicional
se debilitam e degeneram rapidamente. É uma época relativamente obscura,
que assiste ao nascimento da Inquisição e ao início das censuras eclesiásticas
contra qualquer expressão do verdadeiro esoterismo. De certo modo, a
Tradição Hermética –junto com outras organizações iniciáticas– volta a se
retrair sobre si mesma, seguindo o ritmo marcado pela inexorável lei cíclica
de expansão-concentração a que estão sujeitos todos os movimentos da
história e da vida. Além disso, à sombra desta tradição surgiram numerosos
falsos alquimistas (os “sopradores de carvão”, como depreciativamente se
lhes chamavam) que só pretendiam a fabricação do ouro físico, ignorando ou
desprezando a vertente cosmogônica e metafísica do Ars Magna. Estes
personagens (que hoje passariam pelos [chamados] "tradicionalistas", de
diferente qualidade) fizeram bastante dano, pois com sua avareza e sua visão
limitada ao puramente material desprestigiaram o trabalho dos verdadeiros
adeptos, que por sua culpa tiveram que suportar diversas bulas papais
condenatórias e inclusive perseguições e encarceramentos. Mas isto é tão
somente o lado negativo que apresentam todas as épocas de transição, e em
contrapartida o espírito do hermetismo continuaria iluminando as diferentes
facetas da cultura do Ocidente. Assim, e apesar da cobertura protetora que
sempre brinda uma civilização tradicional ter quase desaparecido, isso não
impediu que numerosas individualidades (laicas ou pertencentes a ordens
religiosas) continuassem mantendo e difundindo a ciência e o conhecimento
herméticos, que terão uma grande difusão nas cortes européias, onde reis,
príncipes e senhores se convertem em mecenas de alquimistas, magos,
teúrgos e astrólogos. Deste modo prosseguem os contatos, nunca
interrompidos, entre o hermetismo e as diversas ordens de cavalaria que
subsistiram ou se criaram depois da dissolução da Templária. As gestas e
aventuras iniciáticas contidas na literatura cavalheiresca dessa época
manifestam uma clara influência da Alquimia, pelo que se deduz que o
esoterismo hermético-cristão continuou existindo embora de forma mais
secreta e velada. Outro tanto se pode dizer no referente à arte que, com
exceção da arquitetura, conheceu uma particular difusão através da
ourivesaria e das artes plásticas, ofícios que se inspiraram na mensagem
cosmogônica e espiritual da Grande Obra. Aparecem também as primeiras
gravuras coloridas, com as quais se introduz o elemento da luz e da cor na
rica iconografia alquímica, que adquire assim uma indubitável beleza
estética e simbólica. Mestres herméticos como João de Rupescissa, Nicolas
Flamel, Hortulano, Basilio Valentim e Bernardo Trevisano, testemunharam
com suas vidas e obras o vigor da Arte Real.

Deve se destacar que nestes tempos se estava produzindo a paulatina


expulsão dos judeus não conversos da Espanha, efetivada em 1492. Este
novo êxodo de um povo que já habitava a Península Ibérica (à qual
chamaram de Sefarad, daí “sefardim”) desde vários séculos antes de Cristo
(segundo algumas crônicas desde a primeira destruição do Templo de
Jerusalém), fez possível que a Cabala penetrasse no resto da Europa,
especialmente na Itália, França, Inglaterra e Alemanha. Nestes países,
criaram-se importantes comunidades cabalísticas que intensificaram ainda
mais, se é possível, os vínculos com o hermetismo. Por outro lado, foram
judeus espanhóis que traduziram quase todas as obras herméticas do árabe ao
latim e línguas vernáculas, graças a que adquiriram profundos
conhecimentos sobre estas ciências. Muitos destes sábios foram também
alquimistas e astrólogos. Assim, pelo conduto dos judeus a Tradição
Hermética recebeu toda uma série de elementos doutrinais procedentes da
Cabala, ficando definitivamente assimilados por ela, e se constituindo em
parte integrante dela a partir de então.

35 O NOME I
Tudo o que escapa à atualidade de nosso conhecimento permanece como
inexistente ao não poder nomeá-lo. Nomear é, pois, dar existência inteligível
às coisas, resgatando delas sua identidade, sua qualidade e seu sentido
universal. A esta faculdade exclusiva do homem sempre se considerou como
um legado divino vinculado à intuição espiritual; não é sem motivo que seja
o próprio Jehovah (YHVH) no relato da Gênese, quem outorga a Adão o
poder de nomear todas as coisas, ou seja, o de atribuir função e destino a
todos os seres e elementos deste mundo em relação a sua natureza essencial.

E embora o próprio mundo e a realidade nos antecedam, é enquanto


possibilidade indefinida de descobri-los, de recriar a multidão de suas
diferentes, mas articuladas, significações, que a vida adquire sentido. Todo
verdadeiro conhecimento começa, efetivamente, pela evocação ou
reminiscência de um significado cuja plenitude se pretende enlaçar; e os
significados por sua vez cristalizam em um nome –equivalente a um signo,
símbolo, código ou marca que sempre sintetiza um aspecto da realidade
cósmica e universal, realidade cuja plenitude (unidade) é Deus ou o Ser em
Si mesmo.

A linguagem, em especial a sagrada, não é mais que a articulação ritmada de


todas as possibilidades inteligíveis dos nomes. Dada a universalidade das dez
sefiroth, a doutrina cabalística lhes atribui a função e o papel de nomes –
além da de numerações–, vinculados à identidade e o poder próprio de cada
aspecto ou atributo determinado da divindade que eles expressam; outro
tanto ocorre com o importante papel dado aos 99 epítetos sublimes de Allah
na tradição islâmica.

Na Cabala, os nomes arquetípicos adotam cosmologicamente um papel


polifacético, ao serem tanto relações ou energias vinculantes, quanto
veículos da criatividade divina. Eis o motivo de que sejam considerados
indistintamente como: inteligências, poderes angélicos (construtores e
transformadores), idéias-força, proporções imutáveis, etc.; não é por isso
casual que a ciência dos nomes e a arte de sua invocação formem parte
essencial da metodologia e dos rituais iniciáticos de todas as tradições. O que
no budismo é a recitação salmodiada dos mantras, é o japa no hinduísmo, o
dhikr no islã, a própria oração em todas; em resumo, formas particulares de
invocação ritual do nome divino.

Em um sentido menos universal, o nome segue também revelando, inclusive


literalmente, a essência de seu portador. Pelo nome o indivíduo se diferencia
dos outros indivíduos, sendo o que é e não outro. Pela forma se identifica,
pelo contrário, com a espécie, da que é um representante particular.
Paralelamente, os termos Nama-Rupa (nome e forma) designam, no
hinduísmo, a essência e a substância de todo ser individual: as medidas
cosmológicas de sua natureza específica, ou seja aquilo mediante o qual este
ser participa simultaneamente –a seu nível– do universal (celeste) e do
particular (terrestre); o nome, neste caso, simboliza a personalidade
essencial, por assim dizer, o Si-mesmo deste ser que, sendo único e idêntico
ao de todo ser, tem uma conotação propriamente universal, enquanto que a
forma, sendo "específica", vincula-se a sua individualidade psicossomática
particular, condicionada sempre pelos limites e leis do estado de existência
que ocupa dentro da realidade cósmica.

Ultrapassar, neste sentido, as condições do nome e da forma, equivale a


escapar das limitações próprias da individualidade e da espécie, acedendo ao
informal e supra-individual, ou seja, aos estados superiores do ser.

36 ASTROLOGIA
Tal como vimos o zodíaco em seu ciclo anual, dividido em doze signos
mensais, também podemos vê-lo em um ciclo diário no qual a roda zodiacal
faz um percurso aparente completo ao girar a Terra ao redor de seu próprio
eixo. Alguns astrólogos consideram que, durante as vinte e quatro horas que
seguem ao nascimento de uma pessoa, refletir-se-á toda sua vida. Para
fazerem as observações, dividem a roda do zodíaco em doze Casas e fazem
corresponder duas horas a cada uma delas. Isto determinará o signo
ascendente e descendente do indivíduo e diversos aspectos de sua
personalidade. Deve tomar-se em conta, ao realizar o cálculo das Casas, a
latitude do lugar de nascimento, o dia do ano e a hora do dia. As Casas não
são, como os signos, de 30° exatos, mas sim oscilam entre os 17° e os 60°.

Lembraremos o simbolismo das Casas e mostraremos como realizar os


cálculos para confeccionar o Horóscopo. Mas repitamos que o fundamental é
o conhecimento dos princípios, dos quais derivam as manifestações
particulares.

I. Vita: É a casa do nascimento que indica as particularidades, tendências,


talentos e potencialidades do indivíduo.

II. Lucrum: Refere-se ao plano material, os bens, riquezas e aquisições,


assim como à alimentação e ao mundo físico.

III. Frates: Casa dos irmãos, e também da educação, a instrução e da


adaptação ao médio. Relaciona-se com viagens menores.

IV. Genitor: É a casa dos pais e das características herdadas do meio familiar
e social. Refere-se também ao patriotismo e às sucessões.

V. Filii: Esta casa está relacionada com os filhos, e em geral com o que o
indivíduo produz, cria e engendra.

VI. Valetudo: Casa dos súditos, os escravos e os animais domésticos, é


também do trabalho, os deveres e as obrigações.

VII. Uxor: Refere-se ao matrimônio, os afetos e as uniões, e também às


alianças e as associações.

VIII. Mors: É a casa da morte e das grandes transformações. É também da


decomposição e da putrefação.

IX. Peregrinationes: Casa das peregrinações e grandes viagens, está


relacionada com a espiritualidade, a filosofia, a religião e o mistério.

X. Regnum, Honores: relaciona-se com os objetivos, as dignidades e a


glória, assim como com a profissão, as ambições e as recompensas.

XI. Amici benefacta: Casa dos amigos, benfeitores e admiradores.

XII. Inimici: Nesta casa se vêem os inimigos ocultos, a prisão, o exílio,


assim como as enfermidades, debilidades e doenças.

37 HISTÓRIA SAGRADA: O RENASCIMENTO - I


Em parágrafos anteriores, vimos como todas as épocas históricas de que
temos notícia desempenharam uma função específica no conjunto global do
ciclo humano. O que se denominou “Renascimento”, e apesar de sua duração
de apenas dois séculos, marcou definitivamente o que deveria ser a historia
posterior da Europa e por extensão do mundo.

Com o desaparecimento do modelo de sociedade tradicional que na verdade


representou a Idade Média, produziu-se uma crise de valores que penetrou
em todos os âmbitos da vida e da cultura, manifestando-se, uma vez mais,
um desses períodos críticos que de forma repetitiva e cíclica se dão na
história da humanidade. O Renascimento surge como uma resposta a essa
crise, mas por alguma razão que só é possível compreender quando se tem
uma visão global e sintética das leis cíclicas, também preparou o caminho
que inelutavelmente devia conduzir até a era de subversão anti-tradicional
que representa o mundo moderno.

Na realidade, durante o Renascimento se produziu um fato que iria modificar


radicalmente as estruturas sociais, políticas e religiosas que até então tinham
imperado no Ocidente. Ao se fragmentar a unidade política de caráter supra-
nacional que se conheceu na Idade Média –unidade fundamentada na
convivência harmoniosa entre o poder temporal e a autoridade espiritual–
surgem os estados e as nações, com a conseguinte afloração dos interesses
egoístas e particulares dos governantes, unida ao poder cada vez mais amplo
de um novo corpo social: a burocracia administrativa e a burguesia; o
exoterismo religioso aguça seu dogmatismo, o que traz consigo uma ruptura
com o esoterismo, que desde a desaparição da Ordem do Templo tinha visto
diminuir enormemente sua influência espiritual.

Tudo isto traz aparelhado indevidamente um desconhecimento das relações


simbólicas e sagradas que o homem mantinha com o universo. Nasce um
conceito novo até então impensável: o humanismo, que reduz todas as coisas
ao ponto de vista simplesmente humano, excluindo de seus esquemas
qualquer intervenção direta do sobrenatural e divino.

Quando já não se compreende em toda sua extensão o símbolo, e seu poder


evocador de outras leituras verticais desaparece, é perfeitamente lógico que o
desejo de conhecimento, inato no homem, oriente-se e procure as respostas
no plano exclusivamente horizontal e material. Esta é uma das razões pelas
quais o Renascimento se caracterizou como a época dos grandes
descobrimentos geográficos, e que se começasse a investigar o aspecto
puramente mecanicista das coisas, deixando de lado ou ignorando o espírito
que as anima.

Já ao final do Renascimento, homens como Descartes, com suas teorias


empíricas e racionalistas, encarnaram essa visão dessacralizada do universo e
do homem. Entretanto, tudo o que se disse até aqui não deixa de ser o ponto
de vista mais exterior e periférico desta época de grandes contrastes que foi o
Renascimento. Este também supôs uma continuação do pensamento
tradicional do Ocidente, que não se perdeu de uma maneira definitiva, mas
sim adotou outras formas de se expressar de acordo às novas condições de
existência que se estavam gerando.
fig. 32

38 HISTÓRIA SAGRADA: O RENASCIMENTO - II


Não é sem razão que a palavra Renascimento quer dizer um "voltar a nascer"
de algo que já era, e não outra coisa distinta. Assiste-se nesta época a um
poderoso ressurgimento da Tradição Hermética e das ciências a ela
vinculadas como são a Alquimia e a Astrologia. Vemos igualmente como
esta tradição se converte no receptáculo para onde confluem diversas
correntes esotéricas e tradicionais. Assim, além da herança deixada pelo
hermetismo cristão medieval (sobretudo através das ordens de cavalaria
ainda vivas e de certas organizações iniciáticas como os "Fiéis de Amor", à
qual pertenceu Dante) encontramos a importante contribuição da Cabala
hebraica, que como conseqüência da paulatina expulsão dos judeus da
Espanha, expandiu-se por quase todos os países da Europa, e em primeiro
lugar na Itália, como dissemos. Ao mesmo tempo se conciliou a sabedoria
cabalística com o cristianismo, que deu origem à chamada Cabala Cristã,
cujo principal inspirador foi Pico de la Mirandola, discípulo de Gemisto
Pleto e de Marsilio Ficino.

Um fato também significativo foi a queda do Império Bizantino em mãos


dos turcos em 1.453, data que é habitualmente considerada como o início do
Renascimento. Isto produziu que numerosos antigos textos gregos e
alexandrinos (platônicos, pitagóricos e gnósticos) chegassem a Itália e se
difundissem rapidamente, graças especialmente ao invento da imprensa, uma
das grandes conquistas do Renascimento.

Em todo este conjunto de influências devemos destacar o "redescobrimento"


da cultura greco-latina, que se evidenciou notoriamente na arquitetura, na
pintura, na escultura e no pensamento filosófico. As novas técnicas da
gravura que nascem com a imprensa são aproveitadas para plasmar o
Conhecimento tradicional, dando-lhe ainda adornos de uma grande beleza
plástica e simbólica, como foram o caso das gravuras de Dürer, Michael
Maier, Basilio Valentino e tantos outros. O Liber Mundi (chamado do
mesmo modo "Livro Mudo" por conter só imagens) dos Rosacruzes é uma
clara amostra da utilização da gravura como meio de transmissão da
doutrina. Criam-se em qualquer parte numerosas oficinas e escolas onde se
acostumam as disciplinas cosmológicas e herméticas tomando para isso
como suporte as artes e os ofícios.

Paralelamente a todas estas atividades criadoras, numerosos mestres


herméticos do Renascimento foram homens de espírito e de disposição
liberal, que tomaram parte ativa nos acontecimentos políticos e religiosos de
sua época, que se caracterizou pela mais refinada sutileza em todas as formas
culturais do que são ilustração e exemplo eloqüentes nas artes plásticas:
Boticelli, Michelangelo, Leonardo, Benvenuto Cellini, etc., etc., arte toda ela
carregada de sentido esotérico e onde as "figuras" e as "imagens" do discurso
pictórico estão ligadas a idéias perfeitamente claras e de intenção didática e
cosmogônica, tudo isto sem mencionar as maravilhosas técnicas formais
destes artistas, e a magia de que faziam ornamento em sua realização, que
através do tempo segue manifestando-se na atualidade.

fig. 33

39 NOTA: MAGIA
Entende-se aqui por magia (sem desconhecer formas menores, ineficazes e
perversas desta ciência) toda atividade ritual intermediária, dedicada a
atrair as energias celestes à realidade terrestre, de acordo à doutrina das
emanações cabalísticas que subordina o mundo elemental e corporal ao
mundo anímico e astral, e ambos ao plano estritamente espiritual, ou em
outra terminologia: intelectual. Por este motivo tanto as práticas cultuais,
como os encantamentos, exercícios, concentrações, meditações, estudos, e
especialmente a oração, devem efetuar-se tendo o ânimo e a inteligência
postos nas verdades mais elevadas, no Deus supremo e incognoscível, além
de sua própria criação. Isto fará com que estas práticas mágicas, ou melhor
teúrgicas e celestes, que pressupõem um conhecimento cosmogônico e
metafísico, sejam eficientes e adequadas proporcionalmente às necessidades
invocadas. Por outro lado, este movimento descendente de energias e forças
que se provoca tem que ser completamente subjetivo e interno, ou seja de
exclusivo interesse do sujeito que as pratica em íntima relação com o
benefício do Conhecimento. Sua característica tem que ser a da realização
de um rito simpático e rítmico com o universo, e estas correspondências e
analogias que se pretendem estabelecer devem ser efetuadas com um total
desinteresse sobre coisas particulares; ou seja com um alto grau de
"esvaziamento" e "impessoalidade", para que os eflúvios do mais alto se
derramem sobre o "operário" ou aprendiz de mago, que desse modo possa
aceder às verdades mais sutis e recônditas e às esferas mais altas do
intelecto divino, a um ponto tal que seu próprio ser se encontre identificado
em todo tempo e lugar com as mais transparentes emanações do cosmo e
advirta sua unidade e majestade em todas as coisas, de uma maneira
natural, pois estas verdades são já consubstanciais com seu próprio ser.
Neste tipo de identificação com o universo e com o que está além dele, tem
um papel extraordinariamente eficiente a Árvore da Vida Sefirótica, como
modelo do universo e instrumento veicular e revelador (como o TARÔ) das
energias intermediárias entre a Deidade mais alta e os seres e as coisas
manifestados de forma material, ou elementar.
40 MAGIA E ARTE
Uma representação pictórica é uma cerimônia congelada, um gesto
prototípico capaz de engendrar um sem-número de outros gestos igualmente
harmoniosos. Assim concebiam a Arte os mestres do Renascimento, e esse é
o caso da maior parte de suas criações, por exemplo, "A Primavera" de
Boticelli, cujo conteúdo mágico e esotérico é evidente, transmitindo as
emanações do doce mistério da vida, percebido plenamente pelo autor. Por
certo que Leonardo participava deste mesmo tipo de concepção, e se
encarregou de demonstrá-lo não só por meio de sua obra plástica, mas
também com sua ciência e com o matrimônio desta com sua arte em
representações mecânico-teatrais, onde manifestou o modelo cosmogônico
mediante um grandioso espetáculo que ofereceu na corte de seus protetores.
Shakespeare utilizou também da poesia e do teatro para expressar o
esotérico, como deste modo o fizeram os artistas renascentistas, não só
italianos, mas também alemães, franceses, flamengos e ingleses (com
expressões tão aparentemente afastadas como a construção de jardins
simbólicos herméticos, ou engenhos animados, etc. etc.), até o começo do
século XVIII. A arte era, pois, um rito, uma cerimônia mágica encaminhada
a estabelecer uma comunicação entre céu e terra, em altares de uma
harmonia energética universal designada com o radiante nome de Beleza.

Igualmente Magia e Arte têm que ser conectadas de forma direta com o
Amor, como sinônimo de União, que na prática cotidiana não só tem que se
identificar com ideais românticos mas também com a faustuosa genitalidade
da fêmea prototípica (vez por outra individualizada).

Não há nada mais valioso que a aventura do Conhecimento e sua seqüela, a


energia do Pensamento, ou seja, os instrumentos motores da Arte que
resolvem no prazer inefável da Contemplação. Eles não têm preço, na
verdade, e se houver algo que pode ser chamado luxo é esta magia, que
paradoxalmente se encontra ao alcance imediato de todo aquele que é capaz
de interessar-se verdadeiramente nela; a qual, de mudança em mudança, vai
produzindo uma autêntica transmutação interior.

Na realidade o Agartha, além de ser um método de Autoconhecimento é um


tratado de arte teúrgica que se reconhece nas imagens ordenadas de uma
cosmogonia e que se revela na organização da imaginação, mediante um rito
preciso e, ai!, extremamente purificador, ao ponto de tocar os limites
individuais e transpassá-los, prorrompendo no luminoso âmbito do
Conhecimento e da metafísica, origem e fim de todo poder. Isto é válido
tanto para as figuras do TARÔ, associadas a imagens mentais, como para
tudo o que o aprendiz trabalhou com o modelo cabalístico da Árvore da
Vida. O leitor possui agora um arquivo dinâmico de imagens e figuras às
quais pode recorrer em qualquer momento. Inclusive esses símbolos
repercutirão de maneira inconsciente nele e serão causa de novos efeitos que
ao se transformarem outra vez em causas, assegurarão um trabalho mágico
ininterrupto de participação no cosmo mediante arquétipos tradicionais que
possibilitam a constante regeneração do plano do artista divino. Estas
práticas rituais de recriação de imagens mediante a memória, levam à
recordação do si mesmo, à "reminiscência" platônica; sobretudo quando a
meditação sobre o objeto mágico que se deseja recordar se faz não só
mediante a atenção concentrada, mas também quando esta, uma vez
exercida, pode ser liberada e voar atrás de uma imaginação que nada tem de
arbitrária, pois foi provocada e modelada por idéias-forças universais,
energias sutis e vivas que finalmente terminam se manifestando em gestos
existenciais, ao extremo não só de assinalar ideários definidos, mas também
igualmente de determinar maneiras de ser e viver, critérios morais e normas
de conduta. A palavra “re-conhecer”, que empregamos neste texto, quer
dizer “conhecer duas vezes”. Em particular a utilizamos no sentido de voltar
a conhecer o que já sabíamos, o que é o mesmo que descobrir a verdadeira
identidade, intrínseca união com o Si Mesmo e seus indefinidos reflexos, que
perenemente modificam e reconstroem o cosmo. Esse re-conhecer ritual,
reiterado, é a razão de ser deste manual, sua autêntica essência, sua novidade
permanente, e o propósito daqueles que o desenharam. Assinalaremos,
embora não seja mais que uma coincidência, que o termo "reconhecer", em
castelhano [N.T.: “reconocer”], é uma palavra rebis [N.T.: palíndromo], ou
seja, que se pode ler tanto da esquerda para a direita, como da direita para a
esquerda, o que constitui um exemplo cabal do que se entende por inversão.

41 CABALA: O NOME - II
Para a Cabala o nome indica a essência do renomado e, portanto, a
identidade. Isto é assim porque ela configura uma metafísica da linguagem, e
como tal, as letras do alfabeto são produtos do Verbo e da Grafia divinos, de
sua Palavra e de sua Escritura.

O nome divino, o Schem, está dotado de um misterioso poder total, e todo


aquele que conhece ou participa de algum modo do conhecimento desse
nome se encontra compartilhando automaticamente desse poder.

Não é, portanto, nada estranho que o nome de Yahvé não pudesse


pronunciar-se (e inclusive escrever-se corretamente), posto que violar esta
proibição equivaleria a brincar com um poder incontrolável, além de todo
limite ou proporção. Por tal razão, tratava-se de nomear indiretamente, ou só
por alguns atributos, à deidade –e em determinadas circunstâncias–, posto
que todo nome sagrado leva um poder intransferível, um segredo que
compartilha com todos os nomes; com qualquer coisa nomeada e até com a
possibilidade de se nomear.

Isto outorga uma importância extraordinária à palavra e a sua expressão: a


escritura, o que comporta transferir esta suprema valoração aos textos
sagrados, em particular aos cinco primeiros livros de Moisés, e à Bíblia em
geral, que será herdada pelas religiões "do livro": tanto pelo cristianismo
(com o agregado do Novo Testamento) quanto pelo islã (Corão), o que se
projeta em toda a cultura ocidental. Fazendo a condição de que estes textos
não são letra-morta, mas sim palavra viva, permanente e atual, e o livro um
organismo, com uma energia íntima, do qual constantemente surge uma nova
luz, a verdade, para iluminar os segredos cosmogônicos e metafísicos,
revelados e velados ao mesmo tempo. Certamente que isto modifica de
forma substancial a relação entre o homem e a escritura e, portanto, a do
homem com a leitura (reflexo por sua vez da que mantém com o nome e com
a palavra), derivadas do pensamento e da consciência, que distinguem e
singularizam o fenômeno humano. Por tal motivo, a concepção cabalística
sobre o homem se encontra estreitamente ligada com a possibilidade de
nomear, o que equivale dizer à de criar, ou re-criar, à de formar e re-formar o
cosmo, que definitivamente não é mais que um conjunto de nomes
proferidos pela Palavra divina.

Na letra está, pois, o sentido da criação, que foi realizada precisamente pelas
combinações e permutações dos signos do Santo Alfabeto Cósmico, grafados
pela pluma de Deus, cujo nome se tece de maneira oculta em cada uma
dessas letras e em todas as palavras e nomes, inclusive nos espaços vazios
que deixam livres os signos entre si.

Diz Orígenes que, tal como a magia, o nome e seu poder não são vãos e sem
importância, mas, pelo contrário, uma ciência temível; desta forma, terá que
utilizar com prudência e circunspeção estes nomes mágicos, cuja eficácia
deriva de sua pronúncia em sua língua original, porque é precisamente o som
o que atua.

Os doutores hebreus desenvolveram extensamente estes estudos,


fundamentalmente orais, embora haja numerosos escritos destinados a
despertar os gênios adormecidos mediante o chamado e a escritura de seus
nomes, ou atributos, como o efetuaram todas as culturas tradicionais ou
primitivas, embora não tenham produzido necessariamente uma linguagem
alfabética, por se terem expressado por glifos ou emblemas ideogramáticos,
ou de outra maneira análoga, mediante símbolos que fixavam o nome e,
portanto, o que este representava, em perfeito acordo com a ordem cósmica.

fig. 34

42 O LABOR COTIDIANO
Insiste-se novamente sobre a necessidade –quase urgência– do trabalho
diário interno a aqueles que vão em busca do Conhecimento.
Desgraçadamente a natureza do homem é tal que tende a esquecer o que
verdadeiramente lhe interessa e procurou sempre, e é traído pelos sentidos,
ao que se soma a determinação do meio social contemporâneo,
absolutamente profano e afastado da autêntica realidade do que o mundo e
o ser humano são e representam. Este condicionamento a uma imagem fixa,
literal e falsa do que somos e o que nos rodeia, faz com que sejamos
absorvidos pela inegável força da mediocridade do meio, que de indefinidas
maneiras, inclusive com a violência e a "chantagem", trata de nos fazer
participar do achatamento de seus valores.

O leitor de Agartha sabe que deve empregar todas suas energias nessa luta
surda com o social (que está acostumado a se manifestar, às vezes, através
da família) ao se enfrentar com essas concepções que ele, queira-o ou não,
tem internalizadas mediante uma aprendizagem tão falsa quanto
equivocada, estando a se enfrentar consigo mesmo e seus próprios enganos
e misérias.

Várias armas tem o aprendiz de alquimista para vencer nesta guerra. A


primeira é a paciência, uma forma de compassar o tempo; deste modo,
possui distintos veículos para obter seus propósitos, que se foram indicando
ao longo de nosso Programa. O objetivo destes trabalhos, deste treinamento
que nos provê este manual, é obter a atenção concentrada, a reminiscência e
lembrança de nós mesmos, e o conhecimento dos segredos cosmogônicos,
com relação a abordar a metafísica e a contemplação, efetuando
determinadas práticas e exercícios, como o estudo e a meditação e,
igualmente, o cultivo de certas potências anímicas referentes às imagens
visuais e mentais que se produzem em nós e que atuam como despertadores
de consciência.

Mas o aprendiz do teúrgo sabe a esta altura do caminho percorrido que é


obrigado à perseverança cotidiana, que se podem obter conquistas
duradouras em sua realização. Por isso, vez por outra, insiste em seus
trabalhos e fadigas, impulsionado pela fé na promessa que lhe foi dada
(aquela de que obterá cem vezes mais do que tinha,) apesar de suas
amarguras e graças a seu sacrifício. Razão pela qual é capaz de dizer
“Redobro!”, em especial em circunstâncias difíceis, ou seja, naquelas em
que se faz imprescindível um sobre-esforço e onde se vê não só como
conveniente, mas sim como imprescindível, a realização do rito cotidiano, a
única salvação em um mundo como o que nos tocou viver.

fig. 35

Por tudo isto é que nos permitimos recomendar novamente aos nossos
leitores a releitura do Programa Agartha. Não só porque terá uma visão
diferente do que aqui se diz, mas também porque em muitas coisas ela será
como nova, a tal ponto você foi capaz de modificar seu critério, seu ângulo
de visão. Este exercício lhe permitirá estabelecer comparações entre suas
antigas concepções e as novas e estabelecer assim seu grau de
"adiantamento", ou melhor: a porção do caminho espiral ascendido. Sua
elevação do plano da visão literal, às sutis percepções de outras formas da
consciência, que se constituem numa atmosfera diferente para o
desenvolvimento do ser, a tal ponto que pode então se falar de um antes e
um agora, de um homem velho e, portanto, de um homem novo, de uma
metamorfose ou, muito melhor, de autêntica metanóia .

Deve-se, pois, seguir confiando na memória, que devidamente treinada pelo


exercício e pelo estudo, pela escritura interna que imprimimos nela,
constituir-se-á em uma energia constante, que atuará por si mesma, como se
manifestasse uma ordem mágica e divina.

43 QUIROLOGIA
À mão, que cumpre uma função de modelo simbólico, a Cabala lhe outorga
um profundo sentido sagrado. Da mesma forma, outras tradições, como a
Hermética ou o Islã (ver nesta última, por exemplo, a importância
talismânica que possui a mão da Fátima, a filha do Profeta). As duas mãos
unidas com seus respectivos cinco mais cinco dedos são uma imagem do
modelo do denário arquetípico e, portanto, da realidade que expressa a
Árvore da Vida Sefirótica. Mas o que hoje se entende por quiromancia ou
quirologia (do grego kheir, mão) é um vestígio, muito desfigurado –como é
também a Astrologia moderna–, pelo que outrora fora uma ciência de
alcance espiritual e oracular. Haveremos, pois, de insistir em que todas as
artes mânticas e adivinhatórias em geral assumem o verdadeiro sentido e
função que lhes compete só enquanto emolduradas dentro de uma
perspectiva espiritual e iniciática, do homem e do mundo, alheia a toda
superstição e literalidade. Embora que isto seja assim, é obvio que nas mãos
está impresso o mapa de nosso próprio destino e natureza, como também no
rosto ou na própria configuração física. Em qualquer caso, já se sabe que
todo o âmbito terrestre e corporal é um reflexo ou rastro de um modelo
celeste, pelo que cada parcela de sua geografia é portadora de uma
mensagem simbólica que está apenas manifestando esse modelo num nível
(assim é, por exemplo, quando recém-nascido o Buda Sakyamuni, os
sacerdotes decifraram seu importante destino espiritual partindo dos 32
signos impressos em sua pele).

fig. 36

A cada dedo, linha e região da mão se lhes atribui, efetivamente, uma


correspondência com uma deidade determinada, vinculada, sobretudo, ao
simbolismo astrológico e alquímico: o polegar a Vênus, o índice a Júpiter, o
médio a Saturno, o anular ao Sol e o mínimo a Mercúrio. Entretanto, à hora
de decifrar os diferentes sentidos e analogias simbólicas dos signos terá que
se considerar a mutabilidade –e portanto relatividade– do mundo sensível e
corporal, próprio do fenômeno e da mudança. Os signos da topografia física
trocam de configuração em seus pormenores ao trocar constantemente
também o próprio organismo e ainda mais até seu aspecto externo.
Estabelecer, pois, sistemas muito rígidos de interpretação é se arriscar
indevidamente a cair no engano de tomar algo relativo por algo absoluto. De
fato, e tal e qual no caso da fisiognomia, cada tradição ou povo possui
variantes próprias de interpretação, válidas na maioria das vezes para sua
própria raça e ligadas a seus próprios parâmetros simbólicos, o que não quer
dizer que, no fundo, não exista entre eles uma unanimidade essencial de
sentido. Digamos, por último, que a mão esquerda está relacionada com o
ancestral e a herança psíquica do indivíduo, com suas possibilidades latentes,
enquanto que a direita o está com sua personalidade e sua atualidade, ou seja
com a concreção efetiva de tudo o que, na esquerda, é potencial e instintivo;
relação análoga à de toda a simetria microcósmica.

44 CABALA
No começo de nosso Programa (Módulo I, título N.º 26), mostramos as
correspondências entre o modelo do Árvore da Vida e o corpo humano. Ali
propúnhamos umas correspondências e sugeríamos as visualizações
adequadas a elas. Também dizíamos ali que em futuras práticas tentaríamos
a inversão de polaridade de energias. Isso é o que faremos agora de acordo
ao seguinte quadro:

Kether: o alto da cabeça


Hokhmah: olho e hemisfério cerebral direito
Binah: olho e hemisfério cerebral esquerdo
Hesed: braço direito
Gueburah: braço esquerdo
Tifereth: coração, plexo solar
Netsah: perna e quadril direitos
Hod: perna e quadril esquerdos
Yesod: as genitálias
Malkhuth: base, planta dos pés

No futuro, regularemos e ordenaremos nossas visualizações e exercícios


respiratórios assim como nossas “especulações” (o espelho reflete sempre
as imagens invertidas, tais como estão nossas mãos uma com relação à
outra, e deste modo as duas metades dos hemisférios cerebrais) de acordo à
presente versão, que não só é cabalista mas também se acha em
correspondência com outras tradições.
Portanto a mão direita já não representará o rigor e a justiça, mas a
misericórdia e a graça (Hesed) e será a mão de benzer. Igualmente
Hokhmah será o olho direito e o hemisfério cerebral que representará a reta
(ou direita) intenção (ver Módulo II, título N.º 43) e a coluna da esquerda se
relacionará com o passivo, com o limitante e constritor. Esta é uma maneira
radical de conjugar os contrários, por meio de um exercício prático que
deve necessariamente unificar os opostos no eixo central.

A orientação que damos agora é especialmente válida para os povos do


hemisfério norte e tem como referência a estrela polar, situada nesse ponto
cardeal, o norte, para o qual se olha. A orientação que seguimos até o
momento enfrenta o sul, e tem como guia o Cruzeiro do Sul, visível nesse
hemisfério. O oriente e o ocidente se correspondem em ambas as situações
com distintos braços no homem embora obviamente não trocam seu
conteúdo essencial identificado com a saída e ocaso do sol.

45 A ESTRELA E A ESPIGA
A viagem reiterada pelas dimensões do mundo do homem, à luz da estrela
entrevista no segundo de um outro tempo, mais atemporal, próximo às
origens, viagem de reconhecimento das direções qualitativas da caixa-cubo
do cosmo, é também o reconhecimento da obra de arte sagrada, que possui a
qualidade do holograma, obra também da luz, em que a parte contém
imanentemente o Todo. O mundo do homem é um todo unitário, um jogo de
relações e tensões que se equilibram em seu centro sempre virginal. Essas
viagens não são distintas da compreensão que a alma realiza reconhecendo
suas qualidades, seu desenho, sua forma prototípica, assinalada pela divina
proporção que nasce da relação da Estrela com a circunferência de seu
limite. Essa regra de ouro, ou proporção áurea, é o verdadeiro nome das
coisas, sua realidade no Homem primordial, que as resgata devolvendo o
mundo a seu Princípio, na síntese de sua morada originária.

Mas o encontrar a Estrela, selo da verdadeira vida do mundo do homem, é


também encontrar a morte, não como a entende o mundo profano, mas sim
no nome de outra luz, mais que inteligível, não cósmica, com relação à qual
a anterior não é mais que um pálido reflexo. Efetivamente, o mesmo que dá
a vida, sinalizada por isso mesmo com a morte. A afirmação do ser oculta
tudo aquilo que só pode ser expresso em termos negativos, por ser inefável.
No coração do templo, o altar, centro onde se equilibram as influências do
celeste e do terrestre, do vertical e do horizontal, pode ser produzido um
sacrifício secreto, caracterizado pelo abandono de todo reflexo, no qual o
oficiante e a vítima sejam um só. Tudo foi dado e tem que ser devolvido,
com a gratuidade própria de uma Realidade que nunca se viu a si mesma
como proprietária, pois é Não-Dual.

A espiga, que o Sol fez crescer, mostrando-se sobre o meridiano, não poderia
seguir crescendo indefinidamente. Seu próprio peso, que deve à Terra,
inclina-a sobre si mesmo, traçando o anagrama de um Nome arquetípico
pelo que são feitas novas todas as coisas.
46 ALQUIMIA
Geralmente quando se fala da Ciência Alquímica se pensa naquela referente
ao reino mineral, cujo objetivo é a realização do ouro metálico através da
pedra filosofal. Esta forma da Arte Régia é a transmutação que se produz no
atanor ou forno por meio de diferentes procedimentos e etapas que o adepto
relaciona com seu próprio processo iniciático interno, análogo a qualquer
gestação, começando pela do Universo. Entretanto, já mencionamos a
alquimia vegetal como uma possibilidade idêntica, que utiliza o próprio
corpo humano como um atanor e persegue exatamente os mesmos fins, ou
seja, os da plena realização das possibilidades humanas por meio da
constante conjunção das energias opostas, que jazem no fundo de sua alma.
Também devemos mencionar uma alquimia desenvolvida através da
respiração, que pretende fixar o hálito vital (o prana dos hindus) como
alimento constante fluídico e permanente da criação íntegra.

É necessário esclarecer que todas essas formas da alquimia são igualmente


válidas e são referentes a idênticos princípios cosmogônicos que se
manifestam de igual modo essencialmente, embora as formas de se
expressarem sejam diferentes, razão pela qual são válidos os mesmos
símbolos e a sucessão das operações descritas na alquimia metálica
(começando pelo mercúrio), embora a matéria prima a se empregar seja
diferente. Caberia também aqui assinalar a alquimia sexual como outra
modalidade operativa, intimamente ligada ao que no hinduísmo e o budismo
se denomina tantra. Todos estes aspectos têm em comum a idéia de uma
regeneração e por isso estão ligados a conceitos referentes à “longa vida”,
“medicina universal” e inclusive à “imortalidade”, o que é claro no Taoísmo.

Também queremos sublinhar que a alquimia foi chamada a ciência dos


espelhos, e que estas especulações constituem em todos os casos uma ordem
consecutiva de dissoluções e sublimações, dissociações e associações, de
mortes e ressurreições que não são indefinidas nem se perdem no vazio de
um gesto tão reiterado como banal, mas sim aspiram a uma conquista final,
na qual elas, e portanto a alquimia, adquirem seu verdadeiro sentido.

47 VIRGILIO-DANTE I
É bastante freqüente, na história das civilizações tradicionais, o fato de que
quando estas, por imperativos cíclicos, estavam a ponto de desaparecer, a
doutrina metafísica e cosmológica que ordenou sua cultura e sua vida tenha
se refugiado nas obras de determinados personagens chave, e isso com o
propósito de que dita doutrina não se perdesse definitivamente. O destino
dos homens de Conhecimento que vivem durante esses períodos críticos
está, em parte, sujeito a essa missão de salvaguarda. Tal é o caso de Dante
em relação à Idade Média. Foi em "A Divina Comédia" onde Dante recolheu
e plasmou o essencial do esoterismo cristão que estava representado por
certos grupos artesanais, herméticos e cavalheirescos, como a Ordem
Templária. Como já dissemos em um parágrafo anterior, a própria
organização a que pertencia Dante, os "Fiéis de Amor", passava por ser um
ramo da própria Ordem do Templo, pelo que é de se supor que, quando esta
desapareceu em 1314, os "Fiéis de Amor" tenham continuado a manter –
embora em forma mais oculta e velada– grande parte do ensino iniciático e
tradicional que detinham os cavaleiros templários. É esta herança espiritual
que na verdade constitui o eixo medular que sustenta toda "A Divina
Comédia", e qualquer leitura que desta obra se faça deve ter em conta este
dado, quando se deseja conhecer o profundo sentido que encerra.

Entretanto, existe a presença de outras fontes tradicionais no poema de


Dante, coisa que não é de se estranhar tendo em conta a encruzilhada de
culturas que confluíram na época medieval. Concretamente nos referimos à
presença da tradição greco-latina, representada na Comédia por Virgílio, a
quem Dante chama mestre, senhor e guia. Virgílio foi, com respeito à
tradição greco-latina, o mesmo que Dante com relação ao esoterismo cristão:
um iniciado que conservou em suas obras, especialmente no Geórgicas e na
Eneida, o essencial de sua cultura. Na Eneida, por exemplo, encontramos
uma série de dados relacionados com a doutrina dos ciclos, e sem dúvida
Dante se serve deles na Divina Comédia. Tudo isto nos indica que a tradição
representada por Virgílio continuava viva nos tempos de Dante, e
continuaria estando para além destes, como fundamento que é da própria
cultura e da história sagrada do Ocidente, e cuja herança recebemos todos os
nascidos nele, sejamos ou não conscientes disso.

Centrando-nos no ponto de vista do processo iniciático, e considerando que


com respeito a ele a história e a geografia sagradas –assim que expressam as
leis universais– também constituem um dado importante a ter presente, pode
se dizer que a tradição greco-latina representa para Dante o legado de seus
ancestrais ou antepassados; um legado impresso por “consangüinidade
espiritual” na alma do poeta florentino. Quando em sua “viagem” Dante
acede à região intermediária do mundo sutil, simbolizada pelo “limbo”, e
contempla as almas dos justos que ali moram (a de Homero, Enéias, Heitor,
César, Ovídio, Horácio, Orfeu, Pitágoras, Sócrates, Platão, Aristóteles,
Sêneca, Heráclito, Zenão, Diógenes, Anaxágoras, Tales, Empédocles,
Euclides, Ptolomeu, etc.), “re-conhece” em si mesmo essa herança
tradicional, sendo graças a ela, e junto a seu mestre Virgílio, que pode
acometer seguidamente o duro e perigoso descenso pelos círculos infernais,
que supõem uma imersão no aspecto mais tenebroso da psique: os
prolongamentos mais inferiores do estado humano, que devem ser esgotados
definitivamente antes da ascensão ou subida aos céus e aos estados
superiores.
fig. 37
48 O MÉTODO FUNDAMENTAL
O estudo e a meditação sobre os textos herméticos, o Ensino da Cabala
sefirótica, as imagens e a estrutura móvel propostas pelo Tarô, tanto quanto
as da Alquimia e suas operações, assim como a da ciência Astrológica e
Pitagórica, e o discurso platônico, produzem na alma que contempla um
reencontro com a Gnose Perene, conhecimento e sabedoria obtidos a partir
da ascensão paulatina pelas esferas e experimentados de modo vital a partir
de uma teurgia fundamentalmente individual. Ou seja, um método "objetivo"
que se encarna de modo "subjetivo", em forma "mágica".

Isto desde já se deve à correspondência entre todos os planos da realidade,


tanto do macro quanto do microcosmos, e do amor entre suas partes que,
partindo da Unidade Original, primeira determinação do Não Ser, articulam-
se desde a Idéia e do Arquétipo até a materialidade mais concreta de nosso
mundo sensível através do plano intermédio, povoado por entidades
espirituais informais e sutis, que atuam como mensageiras concretas das
emanações mais altas das quais são recipiendárias, e que transmutam em
vibrações que, por sua vez, geram as inumeráveis energias do mais baixo.
Para o Hermetismo, só é preciso reverter este processo descendente (que no
homem se denominou Espírito-Alma-Corpo), isto é, fazê-lo ascendente para
remontar assim até o primeiro Princípio, amparados e protegidos pelo
orvalho celeste, cristalização do supra-celeste.

49 DANÇA: EXERCÍCIO PRÁTICO


Conselho: Deixar se levar pelo movimento e pelos giros constantes da
dança, que nos tiram de nossa percepção ordinária e nos proporcionam um
exercício tão descondicionador quanto ligado a outras leituras das
dimensões do movimento em sua expressão atemporal e espacial, que logo
são observadas nos deslocamentos de maneira direta, não dialética e
racional; os movimentos harmônicos inspirados pelos deuses do ar nos
transpõem, mediante a ruptura de nosso falso controle, a espaços e ciclos
mais amplos daqueles que laboriosa e equivocadamente forjamos em nossos
cotidianidade por problemas de autocensura interna.
50 VIRGILIO-DANTE II
Na simbólica iniciática, a “porta dos infernos”, ou Ianua Inferni, que é
precisamente a “porta dos homens” ou dos “ancestrais”, é a que o ser em
procura de sua realização espiritual deve franquear antes de sair pela “porta
dos deuses”, ou Ianua Coeli, aquela que dá acesso aos estados supra-
individuais ou supra-humanos. Mas com o descenso ao infra-mundo ou
“reino dos mortos”, não termina a função de guia assumida por Virgilio,
senão que esta ainda permanece, em decorrência da não menos penosa
ascensão pela montanha do Purgatório, durante a qual Dante se purifica e se
re-genera dos “sete pecados capitais”, reverso negativo das “sete virtudes”,
setenário este que manifesta as energias ambivalentes dos planetas. Por outro
lado, o percurso pelo qual ascende equivale às provas iniciais. Desta forma, a
estrutura literária da Divina Comédia (e especialmente do Inferno e do
Purgatório) está também inspirada na Eneida virgiliana (concretamente no
Canto VI), onde se relata o descenso do herói troiano Enéias no antro da
Sibila de Cumas. Ademais, este mesmo esquema, que por outro lado é
universal, repete-se nos mistérios órficos e de Elêusis, bem como no
descenso de Ulisses ao antro das ninfas. Igualmente há que se considerar a
influência do islã, e concretamente no que se refere ao relato do mais
importante mestre espiritual do sufismo, Mohyddin ibn Arabi, que em sua
obra Revelações de Meca descreve a "viagem noturna" de Mohamed através
dos três mundos. Esta influência não é de se estranhar, pois, como já se disse
em títulos anteriores, os intercâmbios doutrinais entre o esoterismo cristão e
o islâmico foram bastante freqüentes na Idade Média.

É importante assinalar que Virgílio também simboliza a razão humana que


deve prevalecer firmemente no iniciado, a fim de que não sucumba ante os
três tipos de perigos com os quais deve se enfrentar em sua descida aos
infernos: a queda no lamaçal, a volta para trás e a petrificação. Neste caso, a
razão deve ser entendida como a síntese de todas as faculdades e virtudes
correspondentes ao estado humano e que por isso mesmo refletem e
manifestam a Razão ou Inteligência divina. Curiosamente a palavra latina
ratio designa por igual a razão e o raio que conecta a periferia de uma
circunferência com seu centro. Desta forma, e nos servindo uma vez mais da
analogia geométrica, no contexto iniciático a razão (no sentido que lhe
damos e não no qual lhe outorga o “racionalismo”) representa a via reta, ou
“reta intenção”, que não terá que perder nessa viagem labiríntica da periferia
de nós mesmos, até o centro ou ponto mais interno onde reside nossa
autêntica identidade. É quando Dante alcança o Paraíso terrestre –situado no
topo da montanha do Purgatório– que Virgílio, quer dizer a tradição de seus
antepassados, cumpriu sua missão com respeito à horizontalidade humana.
No Paraíso terrestre (o centro de nosso estado de existência) Dante encontra
Beatriz, encarnação da Sabedoria e da Beleza transcendentes, e junto a ela
empreende a viagem, desta vez vertical, através dos diversos céus
planetários que simbolizam os estados superiores do ser, até alcançar a
plenitude do Conhecimento e do acesso ao Paraíso celeste, onde reside "... o
Amor que move o Sol e as demais estrelas."
51 EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Queremos lhe sugerir, se é que já não o efetuou, que realize o estudo do
Agartha de noite. No começo de nosso Programa é mais indicado (embora
de maneira nenhuma necessário ou imprescindível) realizar os exercícios e
meditações nas horas diurnas, em especial de manhã, antes de enfrentar o
mundo profano e cotidiano. Se isto foi assim, comece agora a praticar nas
horas noturnas. Ao contrário, se até agora se exercitou de noite, deve
começar a praticar os exercícios de dia, pelo menos durante um certo
período. Na realidade, há adeptos que dizem que o trabalho alquímico deve
ser efetuado do meio-dia em diante e outros que por anos trabalham só a
partir da meia-noite, uma vez entenderam com os olhos bem abertos –na
vigília de manhãs e tardes– a natureza de suas operações.

Deve-se esclarecer que não é unicamente que se recomenda este horário


noturno pela maior tranqüilidade que oferece a noite na vida moderna e nas
cidades contemporâneas, mas sim pela energia-força que contém,
intimamente ligada à descida à interioridade da terra, ou aprofundamento
de todos os aspectos e planos de nossa existência, tal qual o efetua o sol em
seu percurso, para renascer em cada amanhecer, coalhado de beleza.

Também representa uma interessante forma de assimilação e aprendizagem


o sonhar com o modelo do universo cabalístico, nossa Árvore da Vida
Sefirótica. Se isto ainda não lhe aconteceu, faça os exercícios de
visualização antes de se deitar, com a firme intenção de que esta aflore em
seus sonhos.

Igualmente queremos indicar outra prática: comece a meditar todas as


noites de lua cheia que possa, ou as que seja capaz. Faça os exercícios de
respiração dados neste manual. Faça-os só ou com outro ou outros
amigos/as que estejam realizando ou tenham seguido o Programa. Tenha a
segurança de que muitas outras pessoas em diferentes partes do mundo
estão fazendo o mesmo que você. Una-se a eles e sinta a força da energia da
Boa Vontade, e a plenitude do Agartha em ação. Dedique de 1/2 a 1 hora a
isto.

Acompanhe-nos nestas práticas cuja única intenção é a entrega completa a


um Poder Superior e a Oração por nossos irmãos perdidos na confusão de
um mundo profano. Carregue suas baterias e desfrute da Paz do Senhor e de
uma vida cada vez menos opressiva.

52 SOBRE O TRABALHO INTERNO


A luta por nos livrar dos condicionamentos que nos marcam e dos que
inconscientemente obedecemos (fazendo-nos seus escravos, quando não seus
cúmplices, por temor a destruir o que pretendidamente somos e a mudar
nossa maneira de ser e existir) deve realizar-se com a assepsia do guerreiro
e invocando a graça das deidades para que os espíritos nos guiem no
intrincado labirinto do destino. O fruto de nosso desejo é a virgindade capaz
de levantar todo nosso pequeno cosmo novamente, depois de morto às
concepções caducas, mas agora edificando sobre uma ordem que
escolhemos. Seria possível pensar que a construção a partir de um modelo
análogo ao próprio universo fosse precisamente nosso condicionamento.
Nesse caso estaríamos governados pelos númens, que sinalizam nosso
caminho e a obediência às vozes interiores seria acessar o seu amor e
misericórdia. Algo que sem dúvida tem que ver com o sagrado em
detrimento do profano, marcado pela leitura egótica e literal, ou pela
interpretação psicológica ou social, ou qualquer outra programação
cultural, que nos faz ser o que o poder e o meio determinam em sua
ignorância. Não houve tirania igual, nem que se assemelhasse sequer no
totalitário ao que se produz na sociedade moderna, embora esta suponha
nos deslumbrar com sua técnica, suas pretendidas democracias e suas
modalidades repressivas tão refinadas que atuam em forma subliminar. Um
mundo envelhecido e sem futuro, sem dúvida.

53 ALQUIMIA
Os Quatro Elementos (2). Os quatro elementos, ou melhor, os quatro
princípios que eles simbolizam (que constituem qualquer possibilidade de
manifestação e, portanto, a de toda matéria, posto que esta é a combinação
desses princípios ou elementos em rotação, alternando-os uns com os outros;
os que são apenas a emanação de um mesmo princípio criador universal que
toma diferentes modos ou formas designadas por distintos nomes) chamam-
se, como já bem sabe o estudante do Agartha, fogo, ar, água e terra. O fogo
simboliza o princípio radiante que é o mais alto de todos. Na Árvore da Vida
corresponderia a Atsiluth, ao ontológico, ou seja, ao Ser e ao Espírito. É a
primeira possibilidade da matéria, o hálito espermático do enxofre capaz de
fecundar a potência mercurial, a penetração pela palavra, ou seja, a luz pura
simbolizada por este princípio radiante, materializado no que significa o
ígneo, do qual o fogo é o emblema. O seguinte elemento, ou estado da
matéria, é o ar, ou energia refrigerante e sutil, correspondente à leveza e
instabilidade do emocional, ao plano de Beriyah, à primeira construção do
cosmogônico, à sublimação do fluídico, à transmissão de toda possibilidade,
ao sopro do ar como causador da generosidade das chuvas e da geração
vegetal, e também à alma superior, a que está por cima da superfície das
águas. O terceiro elemento é a água, gás condensado, ou energia fluídica,
capaz, como já se disse, de gerar, mas também de corroer. Toda matéria é
abrandada pela água, que igualmente sempre encontra um leito e que é capaz
de adaptar-se à forma que lhe toque. Corresponde ao plano de Yetsirah e ao
perigoso e atrativo psiquismo inferior; às belas e às artes. Também a uma
condensação do aéreo e, portanto, a uma progressiva solidificação, a uma
transformação daquele princípio radiante, daquela primeira emanação que se
expressou por um sopro que agora, ao se coagular, apresenta-se em estado
líquido. O último elemento é a terra, que é o receptáculo e ao mesmo tempo
contém em seu seio outros princípios, elementos, ou estados da matéria, e é a
energia solidificada dessa matéria, o summum de sua densidade e de suas
possibilidades de concreção. Corresponde ao plano do Asiyah, a grande mãe,
à potência do ato permanente, ao passivo em contínuo movimento, à última
manifestação da perfeição universal, espelho da perfeição de seu criador.

Há um quinto elemento que é o éter, ao qual se está acostumado a simbolizar


no centro de uma roda da qual irradiam os outros quatro princípios, e ao
redor do qual giram. É pois sua origem para o qual constantemente retornam
e a oculta raiz de tudo, um “motor imóvel” mais relacionado com o Não Ser
que com o Ser, aparentado com o Ain e En Soph: com o autenticamente
metafísico, o invisível, o inexprimível, o verdadeiramente desconhecido, o
que está por cima da coroa, que ainda apóia sobre a cabeça, emblema do
corpo mineral.

Estes quatro elementos estão constituídos pelos três princípios alquímicos: o


enxofre, o mercúrio e o sal, que se interagem constantemente, como por sua
vez o fazem estes elementos entre eles. Houve a intenção de se lhes comparar
com uma roda dentro de outra roda, ou como uma roda que fixa doze
possibilidades (3 x 4), o zodíaco (ver Módulo II, título N.º 98). Estes três
princípios, como sabemos, estão presentes em toda “matéria” ou energia,
apresente-se essa energia em estado radiante, gasoso, fluídico, ou de maneira
sólida. Estes três princípios podem ser associados com o Osíris (+), Ísis (-), e
Hórus (N), filho de ambos que, portanto, contém parte dos dois, aos quais
deve sua existência. Mas sobretudo temos que vinculá-los com a Árvore da
Vida e suas três colunas, que se vão solidificando em quatro etapas
sucessivas coexistindo, entretanto, em qualquer matéria, como os quatro
planos ou mundos do Árvore da Vida coexistem entre si.
Devemos esclarecer que tanto no trabalho hermético, quanto na Alquimia
instrumental, o trabalho interno é invertido com relação às emanações
criativas. Está contra a corrente, e terá que remontar o rio até suas fontes. Por
isso é que se fala precisamente de um trabalho. A matéria física tem que se
descartar e sutilizar, do opaco ao transparente.

54 NOTA: RECORDAÇÃO, CENTRO E PERIFERIA


O “antropomorfo”, como qualquer expressão do mundo acessível aos
sentidos, não tem nenhuma vantagem especial que justifique a prepotência
com a qual o homem moderno visualiza seu status no mundo, que não é
outro senão o que recria com sua atitude. Mas pelo ao contrário, a
insuficiência crônica que lhe faz sobrevalorizar o visível e sensacional
(sensação) sobre o invisível e significante –se é que por algum momento
considera este último– é o próprio expediente que fecha a porta à
possibilidade regeneradora implícita na lembrança do sagrado.

Esse mesmo gesto interno que o encerra nos limites do individual -


particular - literal, sustentado pelo esquecimento cotidiano que o faz
mecânico, oculta seu direito de filiação e não permite que o mundo, do qual
ele pode ser centro, manifeste-se-lhe como uma mandala apta para lhe
revelar sua identidade primordial e intemporal.

Simultaneamente, a multiplicidade dos aspectos egóticos progride


indefinidamente, como é próprio do mundo da quantidade.

Entretanto, o homem primordial, inapreensível pela história, segue sendo


ele em cada uma das imagens simbólicas (que nunca foram vãs) dos filhos
póstumos, nascidos à individualidade nessa dimensão obscura do ciclo na
qual o homem, desligado de suas origens míticas que o aparentam com seus
verdadeiros ancestrais, é lançado, pela própria natureza das coisas, à
periferia da roda, ao mais denso e relativo, sendo vítima, como ser humano
caído, de tudo aquilo que poderia e deveria estar nomeando, conhecendo em
sua fonte primeira.

Agora, quando o indivíduo, talvez graças a uma curiosidade profunda, ou a


uma melancolia ainda lúcida, permite-se a lembrança de um passado
prototípico, quer dizer, de uma origem capaz de ser origem de todas as
coisas, pode verificar que não está sozinho, ainda que exista algo que
apenas ele mesmo poderá realizar, escutando as vozes que só se ouvem no
silêncio, também há uma verdadeira família do espírito, conhecida não só
do passado mas também do futuro, posto que suas vozes trazem a memória
do que sempre excedeu os tempos históricos.

Esses reais ancestrais no domínio do conhecimento, ou seja, do verdadeiro


ser, são, pelo ensino que formulam, a manifestação, variada em aspectos,
única em essência, do motor primitivo que, como professor arquetípico e
secreto, fecunda todos os tempos, dos quais é sempre centro.

A aspiração amorosa do transcendente devolve ao mundo, em forma


imanente, a presença do não-dual, pela qual é regenerado o Livro da Vida,
obra que o espírito realiza ao reconhecer-se no que sempre o esteve
revelando.

Em outros termos, a reunião do disperso não ocorre só no mundo histórico e


geográfico do homem, por sua remissão ao arquetípico; o Coração do
Mundo, ou o que aparece como zênite para um estado do ser como o
humano, não tem mais aspectos separadores que os projetados desde
determinado estado de existência. Em si não é a presença real do divino. É
evidente que o poder vivê-lo assim tem muito que ver com o anonimato
verdadeiro, interno sobretudo, no qual o Si-mesmo não precisa adornar-se
com pronomes pessoais.

O mundo aparentemente já solidificado e terminado, apto para o consumo


entrevisto pelo cárcere da mente, resultado de uma árvore sem raízes,
destruído em um gesto de apropriação típico do ego, poderá se endireitar de
novo na lembrança efetiva daqueles que, graças ao sacrifício reiterado no
Nome do que nunca será acessível aos sentidos, terão recuperado o “sentido
da eternidade”, o qual redime qualquer ciclo, que só do ponto de vista
“profano” aparece como abandonado a si mesmo.

55 OS ASPECTOS DA ALMA
Os graus da alma humana, ou dos planos de consciência nos quais se
manifestam, são três, em correspondência com os mundos da Árvore
Sefirótica, e têm portanto três designações: nefesh, para o hálito vital; ruah,
para a alma interior; e neshamah, para o espírito.

É muito importante recalcar que para a Cabala os três planos estão


compreendidos um dentro do outro, mas por sua vez têm seus próprios nomes
ou domicílios.

No trabalho hermético, a energia motora desperta, ou melhor, é despertada, e


se for bem conduzida (com humildade, paciência e verdade) será capaz de
estimular a nefesh, que por sua vez nos poderá transferir a ruah, ao mundo do
psiquismo superior, ao ponto de inflamá-lo, em cujo caso é muito possível
que nos abra a porta de neshamah, o espírito puro.

Daremos a seguir estas correspondências, representadas na Árvore da Vida.

56 AS CASTAS
Um dos temas menos compreendidos entre as concepções tradicionais é o das
castas devido à confusão que o mundo moderno (nascido no Renascimento,
confirmado nos séculos XVII e XVIII e efetivado no XIX e XX) projetou
sobre este assunto, confundindo-o com suas próprias problemáticas, suas
revoluções políticas e econômicas, suas divisões referentes às classes sociais
(verdadeiros tabus) e posteriormente o enfrentamento destas e portanto a
ruptura do organismo nacional e internacional.

Trataremos de esclarecer algo do tema à luz do que o leitor já sabe sobre o


pensamento tradicional. Embora antes de abordar este equívoco, devem ser
resolvidas certas dúvidas e sentar-se algumas bases necessárias à clarificação:

a) Nada tem que ver o tema das castas com a divisão contemporânea
referente às classes sociais, motivo pelo qual o aspirante ao
Conhecimento, ainda filho de seu condicionamento histórico, não
tem em sua bagagem de imagens nada parecido que possa tomar
como ponto de referência; aconselha-se, portanto, não extrapolar
informações e menos ainda pretender julgar com elementos
exclusivamente contemporâneos, aos que se supõem universais, a
sociedades pretéritas das quais tudo se ignora.
Para pôr um só exemplo, diremos que os homens e mulheres mais
poderosos e de mais status da atualidade, presidentes, primeiros
ministros, líderes, e até reis e nobres, podem ser considerados de
uma perspectiva tradicional, ou seja espiritual, como os integrantes
da casta mais baixa de seres jamais conhecida neste ciclo humano de
existência.
b) A divisão em quatro castas não é um fato arbitrário ou casual, mas
sim está em correspondência com a ordem natural das coisas e com
a divisão quaternária de qualquer manifestação. É, pois, uma
realidade de ordem cosmológica verificável em qualquer sociedade
e/ou cultura.
c) Aos efeitos deste título utilizaremos a terminologia hindu para nos
referir ao assunto por ser a mais clara e conhecida, a que agrupa os
homens em quatro conjuntos denominados Brâhmanes, Kshatriyas,
Vaishyas e Shûdras. O primeiro corresponde ao estado sacerdotal ou
sapiencial. O segundo ao guerreiro e a nobreza; o terceiro aos
artesãos, comerciantes e administradores, e o último aos servos. Os
nascidos nos três primeiros podem renascer na Suprema Identidade,
podem ser iniciados nos mistérios; os que pertencem por nascimento
ao outro estamento, ou casta, estão destinados à reencarnação na
roda das existências, ainda que sejam milionários, chefes políticos,
artistas de êxito, ou talvez precisamente por isso, tomando devida
conta da degradação do mundo em que vivemos. Quer se chamar a
atenção de que esta separação em castas, ou em estados, não só se
apresenta na tradição hindu, mas também é clara na China (e em
todo o extremo oriente e também no oriente médio), na América
pré-colombiana, e inclusive em culturas tribais consideradas tão
“primitivas” como a África negra. Na organização social da Idade
Média ocidental é evidente, herdada não só das concepções cristãs
(o Cristo Rei por exemplo), mas também das antigas culturas
nórdicas e celtas, e deste modo de egípcios, caldeus, gregos e
romanos. Nos hebreus é nítida entre os reis-sacerdotes (ou melhor
sacerdotes-reis) e o séqüito escalonado de suas cortes.

Seguidamente ilustraremos esta concepção com o símbolo do círculo, ou da


circularidade, muito conhecido por nossos leitores que já trabalharam
bastante com ele.
Desde já devemos dizer que nesta representação também cabem todas as
relações ou especulações que já fizemos dela, tal qual se sobrepõem os
distintos significados ou leituras do símbolo.

Agora a desenvolveremos na Árvore da Vida:

Também neste caso, a divisão em castas (expressas aqui com a terminologia


hindu) deve ficar em relação com tudo o que temos visto do modelo
sefirótico.

O predomínio de tal ou qual casta deve ficar em relação com o ciclo e o


tempo histórico por um lado; pelo outro com a hierarquização ou leitura de
níveis, ou graus de consciência, presente em qualquer realidade.

Para finalizar, queremos fazer referência a uma quinta casta: Hamsa. Esta é
na verdade uma não casta e deve ser colocada acima da Árvore da Vida.
Corresponde aos seres não condicionados ou, os que tendo sido
condicionados pelo nascimento, foram liberados de sua determinação. Estes
iniciados são chamados ativarna, utilizando sempre a terminologia hindu.
57 CIÊNCIA
O que se entende hoje por ciência –a ciência profana– tem também uma
origem sagrada (como todas as Artes Liberais) que se foi degradando, desde
seus começos, onde a observação dos fenômenos naturais revelava o
funcionamento da grande máquina do mundo, manifestada pelas grandes
estruturas da cosmogonia, que simbolizava, em última instância, o que
estava além dela. Ou seja, às leis naturais como signos e arquétipos do
sobrenatural e como seu selo nas coisas e nos seres, incluído o humano,
como o fazia a alquimia em virtude da correspondência entre macro e
microcosmo.

E é digno de nota que autores como Tycho Brahe, Kepler, Newton


(sobretudo este último), e um longo “etc.”, vivem seus trabalhos individuais
como diretamente ligados ao Universal, em busca do Conhecimento,
aventurando-se ao limite de suas possibilidades intelectuais inseridas em um
contexto metafísico, como autênticos hermetistas.

Em termos gerais, do Renascimento, o mundo atual materializou


completamente suas suposições e se foi solidificando cada vez mais em
razão de acontecimentos cíclicos, e isto coincide com a aparição da ciência
moderna, ou ciência profana. Porém, os fundadores desta ciência jamais
negaram seus interesses sagrados. Bem pelo contrário, que poderia chamar-
se seu mais longínquo antecedente medieval, Roger Bacon, considerava os
fatos experimentais como formas visíveis de forças invisíveis –o que
fundamenta à analogia e portanto à teurgia– e haveria que se lançar um olhar
sobre sua obra para notar seus interesses. Ou fixar-se no já chamado
Newton, que investia mais tempo e punha maior interesse em suas
investigações bíblicas que em suas buscas propriamente "científicas". Sua lei
da gravidade nos ilustra sobre as correspondências e portanto a respeito da
magia simpática, como ele sabia, embora preferiu emitir sua teoria em
termos mecânicos.

58 CIÊNCIA I
Um conceito linear do universo, do tempo e do espaço faz com que estes
sejam vividos de uma maneira rígida e fixa, em acordo com a literalidade de
um pensamento só capaz de vislumbrar o mais imediato do que percebem os
sentidos. Na época atual, a ciência tomou formas quase exclusivas de
medição quantitativa, reduzindo os problemas científicos a meras
estatísticas, o que equivale a abandonar a busca da essência e as causas dos
fenômenos –de qualquer natureza que sejam– pela comodidade de sua mera
descrição e seus efeitos. Desgraçadamente, esta forma de pensar invalida a
ciência oficial que, empiricamente, enquadra as coisas por suas
características mais superficiais sem contar, tampouco, os fatores de
mudança permanente aos quais está sujeita qualquer manifestação, e
considera o homem contemporâneo, completamente condicionado por seu
meio e ideologia, como um modelo universal válido para ser aplicado em
toda circunstância. O mesmo, na realidade, faz com qualquer fenômeno, seja
este subatômico ou estelar, e termina mecanizando sua visão da vida a tal
ponto que é incapaz de distinguir entre a teoria e o fenômeno em si. Já
dissemos que esta pretendida ciência oficial não está de acordo com as
últimas investigações científicas, nascidas muitas delas a partir das teorias do
Einstein, mas estas ainda não puderam transformar o esquema oficial (ver
Módulo I, título N.º 77).

O universo se encontra em permanente movimento e constantemente se


contraem e expandem sistemas inteiros de estrelas que configuram galáxias e
planetas que, tal qual as partículas subatômicas, formam diferentes sistemas
alternativos a velocidades supersônicas. Isto em perfeita coordenação cíclica
e rítmica com todos os elementos que compõem este universo vivo e em
perpétua expansão.

Assim, em nossa ignorância, os homens vão como aqueles burros aos quais
se lhes sustenta, por cima e diante de suas cabeças, uma vara na qual se
pendura uma cenoura, o que faz com que a besta caminhe e corra com o afã
de procurar seu alimento sem que possa consegui-lo.

A via Láctea é um imenso aro de gases e estrelas que gira perpetuamente


sobre nossas cabeças como uma roda. A matéria física tampouco é inerte e
passiva, mas constantemente vibra em uma ondulante dança, cujos padrões
de movimento estão dados pelas estruturas moleculares, atômicas e
nucleares.

Tudo isto entranha um segredo cuja revelação é a origem do conjunto.


Qualquer obra fala de seu criador se não houver diferença entre o autor e a
obra. A manifestação é a assinatura de Deus e eis a suma importância da
Ciência, cujo ponto de partida é a experiência, que igualmente constitui o
fim último do Conhecimento. Do visível ao invisível, por mediação da
autêntica ciência.
59 ALFABETO E ESCRITURA
Os distintos esoterismos coexistem e são idênticos em essência, enquanto o
exotérico nas diferentes tradições toma formas que as contrapõem entre elas.
Isto é válido para a soma das diversas formas tradicionais e seus símbolos,
ritos e mitos. Enquanto o esotérico é interior e se refere aos princípios
imutáveis, o exotérico faz insistência no superficial e no múltiplo. O
esotérico une, o exotérico divide (ver Módulo I, título N.º 2).

O anterior é notório nas tradições hebraica e árabe, hoje tão contrapostas no


material, o que se traduz em ódios e diferenças religiosas, sociais,
econômicas e políticas. Entretanto, as raízes, e até o tronco, são comuns para
ambas as tradições face às diferenças das flores e frutos, e os iniciados e
esoteristas das duas (sufis e cabalistas) referem-se não só a um mesmo Ser e
a uma idêntica e Suprema realidade, mas também seus métodos de
aproximação dela são nitidamente similares. Adicionemos que os esoteristas
de ambas as tradições foram e são perseguidos pelo exoterismo oficial e
religioso.
Nos alfabetos, é patente esta identidade, assinalando desde já a profunda
analogia que existe entre eles, e fazendo a condição de que, pese a ter o
islâmico 28 letras, corresponde-se perfeitamente com o hebraico (algumas
destas letras são virtualmente iguais). Por outra parte, a cada letra
corresponde um número e se fazem cálculos análogos em ambas as línguas
com relação ao valor dos signos. O Nome Supremo tem quatro letras tanto
entre os judeus como entre os árabes, que são postas em relação com os
quatro elementos, os quatro pontos cardeais, as qualidades do poder divino,
etc.

O magno testemunho do islã (a shahadá) compõe-se de quatro palavras, sete


sílabas e doze letras, tal qual expressa também o Sepher Yetsirah. A criação
é considerada como um livro, do qual as criaturas são as letras. O universo é
uma escritura, um discurso provocado pela expansão do Verbo, o que
configura o livro do mundo. Pelo que, tanto o Corão, quanto a Bíblia são
textos sagrados reveladores que expressam a totalidade do cósmico, sendo
suscetíveis de serem lidos de diferentes maneiras hierarquizadas e ocultas,
que manifestam de modo real o Espírito Supremo.

Os especialistas islâmicos, dedicados à ciência das letras (os hurufis), dão


enorme importância ao Alif, primeira letra do alfabeto, valor um, pois dela
derivam os principais nomes. As letras, como a linguagem, são os atributos
da essência divina e são imanentes a todas as coisas, pois são as
materializações da Palavra, Kalimat Allah e seu discurso criador. O nome,
composto de letras, significa verdadeiramente a coisa nomeada e, portanto,
revela-a (kashf). É no homem onde se manifesta conscientemente esta
escritura divina, da qual, por outra parte, ele é um signo. A escritura é um
exemplo evidente do mistério do ser e uma grafia permanente da mais alta
atividade da pluma do Criador, que se expressa também pela palavra, pela
linguagem, pelo nome e, sobretudo, pelo som, que os antecede.

Desde este ponto de vista, o estudo e a leitura de qualquer texto sagrado, ou


verdadeiramente esotérico, não são absolutamente vãos, senão que tal texto,
ao manifestar em si e por si a potência geradora, não pode deixar de ser –
para quem se abre a ele– autenticamente transmutador e constituir de fato
uma gnose. Isto é patente na Tradição Hermética onde o livro é o veículo por
excelência.

60 CIÊNCIA II
A matéria, tal como se refere a física oficial, na verdade não existe. A
máquina do mundo permanece em constante atividade e ora se esfria, ora se
esquenta conjugando-se permanentemente na ronda dos quatro elementos
que a compõem, que alternativamente preponderam um sobre o outro. O
motor é ígneo: efetivamente é a intensidade do fogo que derrete o sólido,
liquidificando-o, e posteriormente transforma estes líquidos em gases, que
mediante esfriamento começam novamente a se condensarem e se
estabilizarem em sólidos.
Da Antigüidade greco-romana, esta roda de fogo, ar, água e terra preocupou
filósofos e sábios, que jamais consideraram à matéria como algo fixo e
imóvel, mas sim como um conjunto de elementos em permanente mudança e
reestruturação. A unificação matéria-energia, vale dizer, a unicidade da
matéria, foi um axioma alquímico tradicional. O mesmo aconteceu com a
unidade indissolúvel espaço-tempo, presente nas concepções dos povos
arcaicos.

É só recentemente que a ciência tornou a reconsiderar sua concepção


dualista e dicotômica, demasiado mecânica, com a qual se pretendia julgar
os seres e os fenômenos de uma maneira esquizofrênica, própria dos pontos
de vista das grandes cidades modernas. Assim, a física subatômica observa
que as partículas existem e não existem simultaneamente, e que na verdade a
diferença entre dentro e fora não é mais que uma maneira de encarar as
coisas, em perfeita coincidência com as sociedades tradicionais que vêem o
universo como um homem, animal ou organismo gigantesco, que não se
encontra nem cheio nem vazio. Coisas que parecem opostas e incompatíveis
são consideradas hoje como distintos aspectos de uma mesma realidade.

O espaço chamado vazio contém todas as possibilidades virtuais de qualquer


desenvolvimento e possui um número ilimitado de partículas que nascem e
desaparecem espontaneamente. Até o movimento e o repouso, a existência e
a não existência, a força e a energia são considerados como antagonismos
fenomênicos que unicamente podem ser compreendidos sob a noção de
complementaridade. Tampouco há diferença entre o ser e o ato. Todas as
manifestações do mundo procedem da expressão de uma mesma realidade,
que chega a ser e, logo, desintegra-se, transformando-se em outra coisa que,
por sua vez, modifica-se em outra e assim indefinidamente. A
transitoriedade dos objetos, a incessante mutação das coisas e o fluir do rio
da existência são uma realidade viva e tangível além de qualquer metáfora
que, além disso, explica-nos a ilusão permanente do homem histórico e seu
cuidadoso engano.

61 NOTA: SOBRE A MELANCOLIA


A paixão, ou loucura heróica, o furor, como Platão o compreendia e como
motor do Conhecimento, fonte de inspiração e meio do processo iniciático,
produz excelentes resultados, regidos por Marte, quando se sabe combinar
com o temperamento melancólico e sua biliosa e negra expressão, atribuída
ao planeta Saturno.

Deve recordar o sentido real e simbolicamente elevado deste último planeta


e as sutis energias que como tal contém, além de seus aspectos negativos e
das pesadas cargas que se lhe impinge a interpretação supersticiosa
ordinária, incapaz de considerar os distintos aspectos das coisas e portanto
de conciliar opostos. Saturno é também a lentidão e a sabedoria da velhice,
e a entrada em um estado purificador parecido à morte. O Renascimento
valorizou de modo extraordinário a melancolia, e a tristeza com a qual se
manifesta, e considerou que era um estado onde florescia a inspiração, o
berço da compreensão e a sala de espera do êxtase. Grandes pintores como
Dürer e a escola de pintura flamenga a retrataram e destacaram sua
vinculação com o metafísico, o simbólico, o numérico e o esotérico.

Atribuía a este humor ser próprio de heróis, poetas e grandes homens; e em


que pese ser de difícil tolerância pelos interessados nos momentos em que
esta forma de caráter se apresenta, considera-se –e assim o testemunha
Agripa– que gera um frenesi que leva à sabedoria e à revelação.

Os "mistos", segundo a Alquimia, são aqueles iniciados que ainda não


terminaram seu processo e se encontram escarranchados entre o cru e o
cozido, o frio e o calor, o profano e o sagrado. Pode-se assegurar que estes
aspirantes ao Conhecimento experimentaram esse humor na própria carne,
e tiveram que agüentar os embates da tristeza; de Saturno e da melancolia.
Embora devam reconhecer-se, também, os aspectos benéficos destes
estados, por momentos intoleráveis, que acompanham os "mistos" ao longo
do processo de Conhecimento, onde se encontram muito assinalados, e
põem marcos e balizas no caminho da vida.

Tome o estudante do AGARTHA devida conta de tudo isto.

62 AS QUATRO LEITURAS DA REALIDADE


Falamos de En Soph como do supracósmico, ou verdadeiramente metafísico,
no sentido etimológico mais elevado e radical do termo. Queremos aqui
indicar a vinculação das três primeiras numerações ou sefiroth com os
princípios universais do ser tratados pela ontologia. Também com as seis
sefiroth de construção cósmica, referentes à cosmogonia (plano ou mundo de
Beriyah e Yetsirah) e a concreção material ou física (plano ou mundo de
Asiyah).

Diz-se em Teologia que há quatro maneiras de ler a Bíblia, ou melhor, quatro


leituras de seu texto (literal, alegórica, tropológica, anagógica). Dante
também o explica no Prólogo de A Divina Comédia (reparastes neste título?)
referindo-se a sua própria obra que, como sabemos, inclui uma descida aos
infernos, um purgatório e uma posterior ascensão aos céus. Esta concepção
das quatro leituras da realidade (ou três equiparáveis a elas segundo outras
tradições) corresponde aos distintos planos dessa realidade e igualmente aos
graus hierárquicos de seu conhecimento.

No judaísmo, são igualmente quatro os planos ou níveis de leitura dos textos


sagrados, em perfeita coincidência com o modelo da Árvore da Vida, e a
Teoria das Emanações. Inscrevem-se de baixo para cima, de Asiyah a
Atsiluth, e são correlativamente Peshat, Remez, Derash e Sod. Peshat é o
sentido da leitura literal, Remez o alegórico. Derash o sentido reto e Sod o
sentido secreto. Poderá reconhecer-se que as letras iniciais destes quatro
termos PRDS, configuram a palavra PaRDeS, que quer dizer Paraíso ou
Jardim, e se refere a um lugar, ou melhor, a um estado original que só se pode
adquirir quando se completa com a última letra (a “S” final) toda a palavra.
Deve se recordar que esta letra “S” corresponde ao Sod, cuja tradução é
“segredo”.

63 ALQUIMIA
Às vezes a Alquimia se expressa numa linguagem e num simbolismo
complexo e “obscuro”, e isto é assim face aos cuidados de nosso
PROGRAMA que trata de sintetizar, esclarecer e expressar em uma
linguagem clara e atual verdades que, entretanto, necessitam para ser
compreendidas de uma reforma da compreensão profana, o que justifica em
algumas circunstâncias o uso dessa aparente obscuridade ou contradição,
para fazer funcionar os esforços pessoais através de uma série de exercícios
mentais (e físicos) regidos pela coerência interna dos mesmos símbolos e sua
estrutura lógica e, ao mesmo tempo, supra-racional. Por este motivo, a
importância do estudo e da meditação sobre o modelo cosmogônico no
primeiro grau iniciático, tratando de não deixar um oco na compreensão
deste, pois é um trampolim imediato para a integração no ontológico e
metafísico.

O tempo, sobre o qual atua a paciência tanto como a dedicação, é um grande


auxiliar no trabalho alquímico-hermético, e na Cabala se aponta que o
trabalho do neófito começa a maturar quando começa a encanecer, ou
quando passa os quarenta anos (ou ciclos), número este várias vezes
mencionado nos textos sagrados. Mas, sobretudo, tem que se destacar a
intensidade com que o aprendiz encare o Conhecimento, o que o levará,
quando esta é firme, decidida e prudente, às portas de uma segunda
Iniciação, muito mais real e verdadeira, que já não é somente especulativa,
teórica, ou intelectual, mas sim operativa, prática e encarnada.

Na Alquimia chinesa, também existem duas iniciações. A primeira


corresponde ao “homem verdadeiro” (Tchenn-jen), a segunda ao “homem
transcendente” (Cheun-jen). O acesso ao estado de “homem transcendente”
supõe o de “homem verdadeiro”, que o antecede. Este último seria o ser
(ontologia) obtido por meio da iniciação, que por sua vez tem que se
dissolver na infinitude do não-ser (metafísica), ou seja, voltar a morrer e
renascer.

Na primeira etapa o aprendiz tem que se abandonar e abandonar o mundo da


leitura profana e nascer para a realidade simbólica. Esse rechaço do mundo
profano implica uma morte (dissolução) e um renascimento, aonde se vai
formando o ser (coagulação), ou seja, o Conhecimento. Posteriormente, esse
ser deve, de novo, dissolver-se em uma lúcida ignorância e assim poder
gerar uma autêntica nova vida interior, nascida dos planos mais sutis da
consciência e de um conhecimento que se basta por si mesmo. Isto é, se a
graça de Deus, acrescentando sua sede de saber, permiti-lo. Por outra parte,
este é o esquema dialético e prototípico da Alquimia. E estas duas operações
básicas de dissolução-coagulação se repetem muitíssimas vezes no processo
iniciático (ou alquímico) como ciclos pequenos girando dentro de ciclos
grandes; e é de se notar que quanto mais se repitam, mais redundarão em
bem do aspirante, que deve considerar que se encontra em presença de bons
sinais quando estes fenômenos ocorrem.

O taoísmo (extremo oriental) é brando e dissolvente. Os chineses e seus


descendentes culturais sublinham o metafísico; ao contrário, os
mediterrâneos e sua área de influência (ocidental) fazem insistência no
ontológico e cosmológico. Neste sentido, podem ser consideradas
complementares estas duas tradições, em um processo de realização interior,
e também serem conjugados seus ensinos e métodos com amplo benefício.
Mas ambas as tradições consideram as duas iniciações sucessivas, referidas
aqui. O estudante deve investigar não só na Alquimia ocidental (mineral),
mas também na chinesa (vegetal).

Na tradição judaica (e árabe) o “homem verdadeiro” é Adão, fala-se de um


jardim virginal primordial, que se corresponde com um estado análogo
original da consciência; estado ao qual o neófito pode aceder em virtude da
primeira iniciação. O homem transcendente é representado por Enoch,
arrebatado ao céu em um carro de fogo, que ainda está vivo e constitui o
protótipo histórico de todos aqueles que realizaram o Conhecimento em si
mesmos, ou seja, a transmutação alquímica em seu grau mais elevado. No
cristianismo, esta diferenciação é a que há entre o João, o batista, e Jesus, e
suas distintas funções, associadas igualmente com o religioso e com o
metafísico; o primeiro batizava com água, o segundo com fogo.

64 ANGEOLOGIA II
Dizer anjo quer dizer imagem. A imaginação não deve entender-se aqui
como a faculdade que produz o imaginário, o irreal, mas sim o ato pelo qual
se faz real o mundo das Formas e Figuras. O mundus imaginalis se situa no
tempo mítico da percepção visionária e revelação profética. Como diz o
poeta e pintor do século XVIII, William Blake, "quem não pode imaginar de
uma maneira mais real o que seu olho mortal pode ver, não imagina do
todo".

O criador de imagens (nome que se dá ao devoto do islã), identifica-se com a


luz interior dos seres e das coisas do mundo Natural, e com as idéias e
arquétipos do mundo Ideal.

Esta imaginação ativa é uma faculdade do Intelecto ou órgão do


Conhecimento, e conduz à Inteligência do Coração, objeto do Conhecimento
interno direto.

Os arcanjos, como faculdades cognitivas que são, associam-se a estas


funções. A imaginação ativa ao arcanjo Gabriel (anjo Espírito Santo) que no
cristianismo é o anunciador da encarnação do Verbo; a inteligência do
coração, ou intelecto puro, ao arcanjo Miguel (ou Christos-angelos), cujo
nome significa "igual a Deus".

Na Árvore Sefirótica da Cabala, segundo algumas versões tradicionais,


Miguel ocupa o centro (Tifereth); Gabriel o Fundamento (Yesod) e Metatrón
o pólo ou a coroa (Kether). Este último é denominado o “YHVH menor” e é
o arcanjo que aparece a Moisés no meio da sarça. Metatrón é a mesma
palavra "que abre o reino supra-celestial"; é o espírito da visão que anuncia
um Deus que virá; o que em termos gerais é válido para qualquer energia
imaterial e luminosa, quer dizer, Angélica.

fig. 38

65 EXERCÍCIO PRÁTICO
Algo que se deseja recomendar é a leitura em voz alta como exercício
fecundo para se carregar interiormente. Comece a ler com suma claridade e
voz forte, e espaçadamente, qualquer parágrafo deste Programa. Faça-o
entendendo perfeitamente o que lê e acompanhando com sua voz (e até com
seu gesto) o texto. Se tiver em sua casa um gravador, permita-se utilizá-lo e
registrar nele sua leitura. Não só ouvirá vibrar sua voz, mas também sentirá
a aliviada e marcial sensação de estar novamente levantando âncora como
um privilégio concedido a sua decisão responsável. Diga-se para si mesmo:
“Voto a Hércules! Adiante com a navegação!” Além disso, você deve ter em
conta que cumpre uma função, que esta longa efetivação de um processo
interno, esta iniciação no Conhecimento por mediação da alquimia anímica
e espiritual, que nosso Programa oferece, é parte de nosso destino
individual. Uma alternativa que começa a se realizar em obras e se
manifesta de acordo com a nossa capacidade, tanto de compreensão, quanto
de expressão, para que possamos reconhecer em seus rastros o que é aquele
Destino para o qual fomos chamados.

66 MINUTA
Ser pobre, na verdade, é ter medo à pobreza, ou desejar possuir, qualquer
sejam os meios com os quais contemos. Igualmente ser rico é não
ambicionar o que não se tem; o que é o mesmo que estar de acordo –e não
resignado– com o que se é, seja o que for ou possua o que possuir.

Realmente, quando mais se sabe, mais se esquece o aprendido. Deus é


permanente novidade. A posse da psique pessoal é a expressão mais clara
do engano de nos perceber de modo individual. Na deidade não há solidão
nem medo.

67 O HORÓSCOPO
O horóscopo nos permite determinar a posição dos planetas e das estrelas nos
signos e casas zodiacais, em um dia e uma hora concretos. Costuma-se fazer
o cálculo para observar os aspectos astrais no momento do nascimento de
uma pessoa, em cujo caso se denomina “carta natal”; mas também se poderia
realizar a partir de qualquer outro acontecimento, especialmente significativo,
do qual queiramos saber suas influências celestes.

É necessário, para poder elaborá-lo, terem claros e precisos o dia e a hora que
vamos analisar, e o lugar, do qual teremos que obter sua latitude e longitude;
também possuir uma tabela de posições planetárias denominada
“efemérides”; uma tabela de casas em que se possa ver a posição destas na
latitude do lugar que se observa; e uma tabela de logaritmos. Estas pranchas
podem ser adquiridas em livrarias especializadas.

A maioria das pranchas –especialmente nas que podemos conseguir hoje em


dia no Ocidente– apóiam seus cálculos na hora de Greenwich e dão seus
dados ao meio-dia; é necessário, pois, transpor os resultados à hora e lugar
em questão.

Feitas estas observações, daremos uma idéia geral de como elaborar o


horóscopo:

a) Trace com seu compasso um círculo e divida-o em doze


segmentos de 30º cada um, tal como se mostra nos gráficos
das páginas seguintes.
b) Obtenha a “hora sideral” do lugar e do momento que lhe
interessam, seguindo as instruções que nas mesmas
pranchas –ou em livros de Astrologia– poderá encontrar.
Calcule o intervalo transcorrido entre no meio-dia anterior e
a hora que investiga. Para a colocação dos planetas, que
faremos em seguida, obtenha o logaritmo desse intervalo.
c) Abra sua “tabela de casas” na latitude correspondente e olhe
a coluna “Tempo Sideral” em que se vêem horas, minutos e
segundos. Procure nesta coluna o “tempo sideral” que lhe
interessa, e ali poderá observar, nesse tempo, e na latitude
em questão, as cúspides das 10ª, 11ª, 12ª, 1ª, 2ª e 3ª casas.
Trace em seu diagrama os signos e os graus que lhe indica a
tabela, e nos pontos opostos marque as cúspides das 4ª, 5ª,
6ª, 7ª, 8ª e 9ª casas, respectivamente.

Vejamos como traçar, caso a posição resultante fora, por exemplo, a seguinte:

Casa 10.ª 15° Libra Casa 4.ª 15° Áries


Casa 11.ª 20° Escorpião Casa 5.ª 20° Touro
Casa 12.ª 26° Sagitário Casa 6.ª 26° Gêmeos
Casa 1.ª 6° Capricórnio Casa 7.ª 26° Câncer
Casa 2.ª 18° Aquário Casa 8.ª 18° Leão
Casa 3.ª 14° Peixes Casa 9.ª 14° Virgem
Ficam, desta forma, desenhados os signos zodiacais e as casas. A cúspide da
10ª casa é chamada meio do céu; a da 4ª casa, fundo do céu. A da 1ª é o signo
ascendente e a da 7ª o descendente.

Vejamos agora como se inserem os planetas. Utilizaremos a tabela das


“Efemérides” que nos dará a posição de cada planeta em Greenwich e ao
meio-dia, e teremos que transpor ditas posições ao lugar e a hora que estamos
observando. Para isso, será necessário obter o logaritmo dos graus e dos
minutos em que se encontrava cada planeta no meio-dia anterior à hora que
procuramos, conforme nos mostre a tabela, e adicionar em cada caso o
logaritmo permanente que obtivemos do intervalo transcorrido entre o meio-
dia anterior e a hora que se investiga. O logaritmo resultante da soma de
ambos deverá, agora, converter-se em graus e minutos. Repetindo esta
operação com cada um dos planetas, obter-se-ão suas posições exatas. Uma
vez obtidas as posições dos planetas em graus e minutos, vejamos como se
inserem no gráfico anterior, que já nos mostra a cúspide das casas e a posição
dos signos zodiacais. Unicamente utilizaremos os graus, “arredondando” os
minutos e segundos. Suponhamos que a posição dos planetas resulte a
seguinte:

Saturno: 0° Sagitário
Júpiter: 22° Leão
Marte 18° Aquário
Sol: 23° Touro
Vênus: 3° Câncer
Mercúrio: 9° Gêmeos
Lúa: 4° Câncer

Isto se insere no gráfico da seguinte maneira:

Você já tem, em seu gráfico, os elementos necessários para começar a fazer


os outros cálculos e interpretações. Para isso, deverá ter em conta os
significados que demos dos signos zodiacais, das casas e dos planetas, assim
como as influências de cada um deles conforme se encontrem em um ou
outro dos signos e dos “aspectos” dos planetas entre si.

Pela natureza deste manual, vemos-nos obrigados a dar uma explicação


esquemática e sintética da confecção do horóscopo, que obrigará o estudante
a investigar sobre o manejo das pranchas que mencionamos e a exercitar-se,
retificando, até obter o cálculo e a interpretação adequados. É este um
trabalho que recomendamos, pois ao nos conectar com a harmonia e com o
ritmo das energias celestes, e ao nos permitirem observar suas influências na
terra, ajuda-nos a desempenhar o papel –que sempre se atribuiu ao homem
verdadeiro– de intermediário entre o céu e o terrestre, e vice-versa.
68 NOTA
No Módulo II, título N.º 65 , falamos a respeito da alimentação. Sem excluir
nada do que ali se diz, agora nos referiremos deste modo a certos temas
conexos e aos enganos que podem derivar deles, a ponto de se constituírem
em dificuldades, às vezes insolúveis, no caminho do Conhecimento. Dois
exemplos bem nítidos são o preconceito "naturista" e o impedimento
materialista. O segundo está intimamente ligado com a versão que o homem
moderno tem de si mesmo e de todas as coisas, e corresponde, em termos
gerais, à forma de ver da sociedade contemporânea, associada deste modo
com a leitura literal e programada que este homem histórico tem do cosmo.
O primeiro, vale dizer, o preconceito "naturista", é próprio de certas
pessoas e grupos que pretendem "melhorar" sua situação individual dentro
do caos que nos tocou viver. A ele nos referiremos agora, pois muitas das
pessoas interessadas nos temas da Metafísica e do autêntico Conhecimento,
ou seja, aqueles que têm uma inquietação interior, vêem-se freqüentemente
tentados por certos atrativos que lhes oferece uma vida mais "pura",
"natural" e "saudável".

Haveria que se perguntar, desde o começo, o que se entende pelo hoje


chamado "natural" e que conceito se possui na atualidade sobre a natureza.

É bem sabido que, para as sociedades tradicionais e primitivas, que por


certo são as que vivem integradas no cosmo e palpitam junto com os ritmos
e com os ciclos naturais, em um plano perfeitamente universal –e
ecológico–, a natureza não é o que os modernos supõem, ou seja: a
superfície da paisagem ou hipotéticas questões vinculadas com a "saúde",
da que também cabe perguntar-se: o que se entende por tal?

Por outro lado, alguns alimentos específicos são considerados como "bons"
ou "maus" de acordo a determinadas pautas que arbitrariamente fazem do
"natural" seu lema, e de sua saúde "ideal", em uma verdadeira cruzada do
tipo moralista e fanática, sem terem os conhecimentos elementares
necessários para isso, e sem estarem informados da história e da cultura
dos distintos povos que habitam desde sempre o mundo. É muito importante
destacar que em nenhum texto sagrado das diferentes tradições se toma à
alimentação como tema fundamental, e em geral nem o mencionam, já não
como requisito prévio para alcançar determinados estados de consciência,
nem mesmo de autêntica saúde corporal, senão que, em certos livros
sacros, como o Evangelho cristão, esclarece-se que o importante não é o
que entra pela boca, mas sim o que sai do coração do homem.

Um caso muito difundido é o da prédica vegetariana. De fato nenhuma


tradição –a hebraica, a cristã, a islâmica, a budista, a taoísta, etc.– salvo a
hindu, pratica o vegetarianismo, ao que seus seguidores constituíram em
um culto de que são devotos de uma maneira quase moral. Por certo que
são muito bons os vegetais, como também todas as coisas que Deus pôs a
disposição do homem; mas a exclusão de umas em benefício de outras,
como se umas fossem "boas" e outras "más", fazem dessa forma de ver
unilateral algo muito parecido às civilizações dessacralizadas ou profanas,
e não às autênticas doutrinas tradicionais. Sobretudo, quando cai em
extremos de acreditar e tratar de impor ao extremo a idéia de que só as
verduras e frutas cruas são os alimentos autenticamente sãos, apreciação
de maneira nenhuma verificável ao se ter que levar uma dieta prolongada
desta natureza, com as moléstias e inconvenientes que conduz. Neste
sentido, certas práticas e concepções de origem hindu, igual que outras
derivadas do Hatha Yoga, próprias de simples faquires que pretendem fazer
passar suas práticas como autêntica espiritualidade, são consumidas de
maneira literal e vividas de modo pseudo-místico e de forma fanática, tanto
no Ocidente, como no Oriente, assim no próprio seio da Índia atual, onde
numerosas seitas de origem confusa e pensamento sincrético, muito
influídas também pela cultura moderna, pregam determinados "ensinos" (e
isto ainda nas cidades sagradas à beira do Ganges) que têm filiados em
todos os países da Europa e da América, que são impedimentos sérios para
a obtenção do Conhecimento quando estas prédicas e exercícios são
tomados de maneira estritamente linear.

Acreditamos que o "natural" tem que ser transcendido para poder dar lugar
ao sobrenatural.

69 CABALA
A seguir oferecemos um singelo “talismã” numérico (recordemos que os
números são também letras) baseado na Estrela de Davi ou Selo Salomônico,
emblema de Israel.

Poder-se-á observar que a soma das seis fileiras de números dão um mesmo
resultado:

4 + 7 + 9 + 6 = 26 6 + 5 + 12 + 3 = 26
1 + 11 + 12 + 2 = 26 4 + 8 + 11 + 3 = 26
1 + 8 + 7 + 10 = 26 10 + 9 + 5 + 2 = 26

Igualmente, a soma dos números colocados nas pontas da Estrela dá 26 (13


para os dois extremos do eixo vertical e 13 para os 4 restantes). Este número,
como sabemos, é particularmente importante na Cabala hebraica –e em
outras tradições– e corresponde à soma das letras do Supremo Nome
Sagrado YHVH, decomposto desta maneira:

Y = 10, H = 5, V = 6, H = 5. Total = 26

Por outra parte, a soma do hexágono interior dá 52 (26 x 2), os quais


adicionados aos 26 exteriores dão 78 (26 x 3), como o total de todos os
números da figura. Queremos recordar que este é o número de cartas que
possui um jogo completo do Tarô.

70 GEOMANCIA
Respeitamos o nome Geomancia, com que se acostumou a conhecer esta
ciência, embora, rigorosamente, corresponder-lhe-ia o de Geologia, com o
qual o homem contemporâneo designa uma disciplina nascida no século
passado [N.T.: Século XIX]. Em chinês é chamada Feng-Shui e estuda as
energias da natureza, em sua íntima relação com a terra, e por certo que esta
ciência está estreitamente vinculada com a Geografia Sagrada. Na realidade,
todos os povos e sociedades tradicionais utilizaram a geomancia com o fim
de situar em determinados lugares e pontos chave tanto suas cidades, como
seus templos ou casas de culto, e da mesma forma suas moradias.

Para uma mentalidade tradicional, tanto a terra como o céu estão


perfeitamente vivos e se expressam constantemente por mediação das
energias que continuamente os formam. A terra respira, pare, resplandece, e
adquire formas distintas em diversos lugares, assinalados por diferentes
fenômenos (montanhas, vales, planícies, rios, cascatas, etc.), que são
símbolos de idéias arquetípicas, ou melhor, de "outras coisas" existentes
também no mundo do invisível, do espiritual. Por certo que estas concepções
hão de se pôr em direta conexão com a idéia da analogia entre o macrocosmo
e o microcosmo, a que vê na terra um ser vivo, sensível e gigantesco,
expressão natural, como o homem, de um Ser Supremo, oculto em sua
própria criação. Motivo pelo qual as energias cósmicas, e neste caso especial
as telúricas, são igualmente os condutos pelos quais se manifesta a divindade
e, portanto, assinalam lugares específicos de comunicação terra-céu. Esta
circulação da energia, em ambos sentidos, é o que caracteriza, igualmente, à
Geomancia como arte divina-tória, e a que busca por seu intermédio a
localização adequada do ser humano no indeterminado e amorfo, instaurando
uma ordem no caos. Uma das variantes secundárias desta ciência (ou arte)
constitui-se na figura do Zahori [N.T.: Geomante ou rabdomante], que é o
encarregado de encontrar água, ou corrente de energias benéficas
(aproveitáveis), utilizando para isto um bastão ou um pêndulo.
fig. 39

71 FILOSOFIA PERENE
Algumas pessoas, de formação exclusivamente profana, talvez pudessem se
surpreender com a existência de uma "Filosofia Perene", ou seja, de uma
série ordenada de conhecimentos inter-relacionados, de uma doutrina (jamais
de um dogma), capaz de explicar aos homens sua própria natureza e a do
mundo em que vivem. Certamente que esta "panacéia" universal, capaz de
responder a todas as perguntas, acalmar as angústias do mundo moderno e
suprimir o sofrimento provocado pela ignorância, não é uma criação
individual (nem muito menos "coletiva"), mas sim a expressão de uma
revelação espiritual direta, obtida por distintas pessoas em diversos lugares,
que reveste diferentes formas próprias e que, sobretudo, acha-se presente na
própria entranha do ser humano e do cosmo em que este habita. Portanto, a
revelação destes conhecimentos arquetípicos não é só horizontal e histórica,
mas sim fundamentalmente vertical e eterna, como são as "idéias", princípios
que formam o mundo e que se manifestam mediante leis universais, que
foram conhecidas de modo unânime pelas diferentes tradições que formaram
a História da humanidade ao longo de sua Geografia. Esta simples
observação, que qualquer leitor armado de boa vontade pode constatar
pessoalmente, supõe a idéia de um modelo universal, de um jogo de
estruturas imutáveis, visíveis e invisíveis, sem as quais o mundo e o homem
não seriam. Eis a importância de conhecer a cosmogonia como expressão
simbólica da Inteligência Universal, energia subjacente a qualquer
manifestação, tal e qual acontece com o pensamento, que antecede à palavra.
Com efeito, este jogo de estruturas essenciais se expressa simbolicamente, e
é por meio desses simbolismos, e de suas analogias e equivalências, que
podemos entender a realidade última do cosmo e sua instância final: sua
natureza incriada e, no entanto, sempre atuante. É este legado herdado das
grandes tradições da Antigüidade uma autêntica cosmogonia arquetípica que,
como tal, corresponde-se com as distintas simbólicas arcaicas, mediante as
quais se expressa, reatualizando deste modo a realidade do mundo atual que,
ainda órfão de todo conhecimento verdadeiro, segue constituindo uma
autêntica teofania para todos aqueles que são capazes de compreendê-lo.
Ademais, deve-se dizer então que se dedicar ao estudo das disciplinas
tradicionais, e efetuar suas práticas com o propósito de despertar as
potências adormecidas da alma, constitui um método apropriado do
Conhecimento.

72 SIMBOLISMOS DE PASSAGEM
Agartha propõe uma total conversão de nosso modo ordinário de ser e uma
busca perseverante de outros estados mais sutis aos quais devemos aportar.
A aventura do Conhecimento, como vimos, é representada como uma
viagem ou uma peregrinação ao Centro do Ser, para a Cidade Santa, ou seja,
para nossa própria interioridade. Essa viagem, cheia de peripécias e perigos
nos permite "passar", paulatinamente, a outras regiões mais internas, e cada
um desses "passos" supõe uma "recordação", cada vez mais nítida, do Si
Mesmo, da verdadeira identidade que permanece imóvel no meio de nosso
próprio coração. De fato, todo símbolo sagrado, por sua condição veicular,
supõe a possibilidade de uma "passagem", pois tem a característica de poder
transportar o homem da realidade material que lhe mostram os sentidos para
a verdade interior que se oculta detrás da aparência formal das coisas e dos
seres. O símbolo toca os sentidos permitindo que, a partir dessa percepção
sensível, elevemos-nos por seu intermédio para as regiões invisíveis que ele
mesmo representa, tornando possível, portanto, a "passagem" a outros
estados e graus de consciência e de vida.

A ascensão e o descenso perpétuos que o Ser realiza pelas esferas da Árvore


Sefirótica supõem uma "passagem" pelas vias que comunicam as distintas
sefiroth entre si, sendo, de acordo à Cabala, 22 os caminhos que temos que
cruzar (ver Módulo II, título N.º 28), relacionando-se cada um deles com
uma letra do alfabeto sagrado e com uma lâmina dos arcanos maiores do
Tarô.

Há certos símbolos, queremos agora destacar, que se referem


especificamente a estas "passagens" que têm que ser produzidas durante o
processo da realização da Grande Obra. Estes, como o do Octógono, o da
Porta, o atravessar as águas e o da Escada, poderão nos mostrar como
realizar essas travessias pelas comarcas da mente universal. Os pensamentos,
cada vez mais sutis, guiados por estes caminhos arquetípicos, levar-nos-ão
por passadiços mais e mais estreitos, que desembocarão finalmente no En
Sof, o nada ilimitado no qual só é o eterno repouso. "Através de Mim
conhecereis o Pai".

73 AS TRADIÇÕES ARCAICAS
Aqui e ali, em distintos lugares do mundo, convivendo com a civilização
moderna, podem se conhecer distintos grupos que ainda vivem virtualmente
na "idade de pedra" ou na de "bronze", segundo o vocabulário (jargão) da
"ciência" atual. Estes povos que ainda conservam fragmentos mais ou menos
completos de suas tradições originais e vivem de acordo com elas, são
denominados "primitivos" pela ciência oficial, ao se lhe escapar o sentido de
seus costumes e de seus ritos, e ao não poder compreender a mentalidade
tradicional, que vê na natureza uma imagem do supra-natural e no mundo e
no homem uma série de energias invisíveis que constantemente o
determinam; portanto, tem-se suposto que estes seres, aos quais se considera
completamente faltos de inteligência, como estúpidos, ou no melhor dos
casos meninos que não podem sair de sua pretendida ignorância, constituem
uma espécie quase diferente, como de humanóides, muito próxima dos
macacos, existente antes de que o homem tivesse podido ser tal graças aos
adiantamentos e ao progresso instaurados pela ciência.

Tal acontece porque um investigador das tradições arcaicas, que é um cético


em matéria metafísica e considera a presença animada da deidade como algo
pouco sério, jamais poderá entender esse mundo arcaico, e igualmente
acontece com aquele que tem de Deus uma idéia exclusivamente religiosa ou
de tipo moral. Com muita freqüência, estes dois tipos de estudiosos são os
que dirigem a informação oficial, não entendendo eles próprios que sem a
vivência íntima do sagrado é quase impossível a compreensão do que se
acredita ser uma mentalidade tradicional. Uma pessoa, que nega o plano
invisível ou espiritual, verá nos símbolos só elementos utilitários do tipo
literal; por outra parte, um indivíduo religioso-moral quererá ver só o que é
"inferior" a suas crenças, o que desprezará como lixo, ou se adotará o direito
de perdoar a barbárie, ou o que ele supõe é um paganismo ignorante e
supersticioso, incluídos os antigos ritos gregos iniciáticos de Elêusis e os
"oráculos" de Delfos e o de Zeus, em Dodona do Epiro.

Na verdade, este tipo de critério poderia melhor ser aplicado aos habitantes
das grandes cidades, os que, de acordo com a programação do mundo
contemporâneo, só aparecem como autômatos, positivamente escravos de
seus condicionamentos culturais infligidos pela falsa religião da "ciência", o
que equivale a institucionalizar definitivamente a ignorância.

As grandes civilizações são na realidade uma degradação do pensamento


tradicional, onde este, paradoxalmente, alcança seu maior brilho, antes de
sepultar-se com seu próprio ciclo. E pelo contrário, certos povos arcaicos
ainda conservam a "ingenuidade" e o frescor das origens. Deveríamos, nesse
caso, perguntar-nos quais são os "ignorantes", ou os "primitivos", e que
autoridade pode adjudicar, no mundo moderno, respeito a qualquer
classificação em cada ramo de sua "ciência". Nada sabem os representantes
"oficiais" do pensamento moderno, e às vezes se chega ao caso de alguns
que tomam sua própria ignorância –que deveria lhes envergonhar– como um
avanço com relação a um novo mundo do qual, através de sua incapacidade
–institucionalizada como uma objetiva postura científica–, eles seriam a
vanguarda construtora.
74 ASTRONOMIA-ASTROLOGIA
A astronomia é a mais antiga de todas as ciências e é a que determina uma
civilização em sua origem, como o tem feito com todas as da Antigüidade.
Efetivamente, o estudo dos ciclos e dos ritmos dos astros gera as pautas em
que se fundamentará o pensamento religioso, político e econômico, toda a
cultura, afinal, de uma sociedade. A partir daí é possível tirar conclusões
particulares, baseadas em cálculos, relações e analogias, que se
correspondem com um conceito reiterativo e circular do tempo, que dá lugar
às predições sobre acontecimentos cíclicos e, portanto, reincidentes, que são
estudadas pela astrologia, ou astronomia judiciária (como se lhe chamava na
antigüidade). O ciclo mais curto e mais fácil de observar é o lunar que, em
29 dias e fração (28 dias para o pensamento antigo, dividido em 4 semanas
de 7 dias), realiza um percurso e retorna ao mesmo ponto. Isto, sem
considerar o percurso do sol no dia, ou seja, a diferença que existe entre o dia
e a noite. Também a lua admitiu o estudo de ciclos maiores, o de seus
eclipses que, conforme observaram os caldeus, produziam-se na mesma
ordem depois de 223 meses lunares. O mais importante destes ciclos maiores
dos astros é o da precessão dos equinócios, que se reitera a cada 25.920 anos
(26.000 em números "redondos") estabelecido para a cultura ocidental por
Hiparco, de Nicéia, e outros sábios tradicionais. Chama-se abóbada celeste,
ou firmamento, uma semi-esfera cuja linha de contato com a terra é o
horizonte, e cujo centro se encontra no olho do observador. Se este se mover,
o horizonte se desloca. Igualmente, se o espectador contempla um astro, a
reta ou raio visual que vai ao centro do astro, determina um ponto na
abóbada celeste, que é a projeção do astro sobre ela, e como a distância que
vai da terra aos distintos astros é imensa (recordemos que a que separa a
nosso planeta do sol é de 150 milhões de km), em relação com o diâmetro da
terra (6.378 km), supõe-se que os astros se movem em uma esfera ideal, de
raio indefinido, denominada “esfera celeste” e cujo centro, do mesmo modo,
encontra-se no olho do contemplador. Na realidade, o que o observador vê
são as projeções dos astros sobre o firmamento e não os deslocamentos
verdadeiros dos astros. Além disso, considera-se a terra como um ponto
coincidente com o centro desta esfera celeste. Pelo que se pode verificar, que
até a astronomia atual sustenta, e parte do ponto de vista geocêntrico, ou
melhor, antropocêntrico, para construir todas suas especulações –e não
poderia ser de outra maneira– em que pese que a ignorância e a vulgarização
geral ponham uma ênfase pomposa e vaidosa sobre o heliocentrismo
(perfeitamente conhecido pela antigüidade, conforme pode ver-se no papel
primitivo atribuído unanimemente ao sol) como conquista científica, antes da
qual nada se sabia de astronomia. Quer dizer que os que rechaçaram Nicolau
Copérnico (autor de De Revolutionibus, publicada em 1543, em que
sustentava o heliocentrismo, baseado precisamente na astrologia antiga) são
os mesmos ignorantes que afirmam enfaticamente hoje seu sistema como
oficial, sem compreendê-lo, e sem saber inclusive que a astronomia atual se
fundamenta na terra e no homem, e em nenhum momento toma um ponto de
vista alheio a eles, o que por certo seria totalmente absurdo e impossível.
Vale o mesmo uma descrição geocêntrica ou antropocêntrica da terra
(comparada com a heliocêntrica) e na prática a astronomia atual a segue
utilizando; o mesmo aconteceu com relação a Einstein e ao fenômeno da luz.
Entretanto, é tal a confusão do mundo moderno e nossos contemporâneos
"cientistas" que são previsíveis suas aberrações e anomalias hoje
computadorizadas, fomentadas pela má fé e pelo mesmo ódio que levou a
proibir a obra de Copérnico (e, pouco mais tarde, levaram Giordano Bruno à
fogueira e obrigaram Galileu a abjurar) um dos sábios herméticos e
esotéricos do precisamente chamado Re-nascimento em relação com as
culturas da Antigüidade.

Nota: Embora as claves ou chaves das antigas ciências astrológicas parecem


ter sido perdidas, os fragmentos que nos legaram permitem a especulação, e
em muitos casos nos assombram com a justeza de suas interpretações na
aplicação aos fatos cotidianos da existência.

De todos os modos, quer se deixar claro que a Astrologia (derivada da


Astronomia) é um simbolismo perfeitamente válido, como qualquer outro,
para tratar de descrever e "apreender" a "realidade" sempre multifacetada e
pluridimensional. Um sistema classificatório de noções inspirado nos
movimentos cíclicos e rítmicos dos céus e suas influências determinantes no
mundo e no homem. Uma ciência tal, estudada sob a luz da Tradição
Hermética, é um instrumento a mais na busca do Conhecimento.

fig. 40

75 AS TRADIÇÕES
Ao longo de nosso Programa nos referimos com freqüência a muitas das
tradições ainda vivas ou já desaparecidas. E sempre destacamos o fato de que
nessas tradições existe uma identidade quanto a seus símbolos, ritos e mitos
principais, pois todas elas emanam de uma só e única Tradição, chamada
primordial precisamente por sua condição essencialmente vertical e supra-
histórica, o que lhe permitiu subtrair-se às mudanças do devir cíclico,
conservando integralmente o Conhecimento (a Gnose) e a possibilidade
permanente e salvífica de poder ser encarnado pelo homem de qualquer
tempo e lugar. Isto vale também para nossa época em que, apesar de sua
extrema obscuridão, ainda seguem vivas em diferentes lugares da Terra
determinadas culturas tradicionais que não perderam seu vínculo com a
Tradição Primordial, outorgando a influência espiritual-intelectual
imprescindível para iniciar o caminho que nos leve a realização interior e à
identidade com o Si Mesmo.

Entretanto, não podemos desconhecer o fato de que todas as tradições atuais


sofrem, em maior ou menor medida, uma degradação com respeito ao que
foram seus valores originais, embora essa degradação afeta mais à forma
exterior de que necessariamente se revestem (e que não é alheia às condições
espaço-temporais), mas não ao seu fundo, ao seu núcleo e essência metafísica
revelada através de seus códigos simbólicos.

– Por um lado temos às três tradições abraâmicas: o judaísmo, o


cristianismo e o islã, também chamadas as "tradições do Livro": a
Bíblia para as duas primeiras e o Corão para a terceira. Dá-se a
circunstância de que nestas tradições o aspecto religioso ou exotérico
prevalece há muito tempo sobre seu esoterismo (a Cabala para o
judaísmo e o sufismo para o islã), o que é virtualmente desconhecido
para a grande maioria de seus praticantes, apegados à letra mas não
ao espírito de sua tradição. Não obstante, nestas tradições subsistem
ainda pequenos grupos ou individualidades que continuam
transmitindo os ensinos do verdadeiro esoterismo a pessoas que o
buscam com retidão de coração.
– A tradição hindu é de todas as existentes a que talvez conserva de
maneira mais completa a doutrina metafísica, expressa
fundamentalmente através dos Vedas e dos Upanishades, que como
todos os livros e textos sagrados estão inspirados diretamente pelos
deuses, quer dizer que sua origem é não-humana.
– O budismo em suas duas grandes versões: hinayana (ou "pequeno
veículo") e mahayana (ou "grande veículo"). Neste último é onde se
mantiveram com maior pureza os ensinos do Buda, sendo o que
penetrou no Tibete procedente da Índia, onde incorporou elementos
das tradições nativas, dando lugar ao lamaísmo. Atualmente o
budismo lamaísta não só está expandido pelo Oriente, mas também
por diferentes cidades da Europa e da América.
– O taoísmo nasce da antiga tradição chinesa ou extremo-oriental, da
que constitui seu aspecto mais autenticamente metafísico e
cosmogônico, anotando que também existe uma alquimia taoísta (tal
qual uma alquimia hindu) com muitos pontos em comum com a
alquimia ocidental. Na mesma China surgiu o zen, ou zen-budismo,
nascido da síntese entre o taoísmo e o budismo mahayana.
Atualmente a escola zen está arraigada sobretudo no Japão, país que
por outro lado segue conservando sua antiga tradição, o shinto, de
características muito similares ao confucionismo chinês.
– Deste modo temos que considerar a presença da grande tradição pré-
colombiana, ainda viva, embora de forma fragmentária, ao longo de
toda a América, assim como constatar a existência do jainismo hindu
e dos parsis zoroastrianos, sem esquecer os numerosos povos
"primitivos" da África e da Oceania, que em termos gerais constituem
todas aquelas culturas mágico-religiosas que se incluem no que se
entende, ou melhor, que mal se entende, por "xamanismo".
– Mas é particularmente na Tradição Hermética onde pomos nossa
ênfase, já que esta síntese própria dos povos ocidentais –e a mais
apropriada para eles–, não é de maneira nenhuma um sincretismo por
ter uma origem múltipla (como tampouco pode ser considerada tal a
tradição de gregos e romanos, nascida do pensamento egipcio-caldeu,
ou o islamismo, entroncado diretamente com Israel e o cristianismo,
ou o budismo, emanado do hinduísmo, etc.), mas sim uma tradição
viva, que inclusive pode ser rastreada historicamente ao longo da
formação da Europa e da América, que deu inumeráveis adeptos da
Arte: alquimistas, astrólogos, artistas e filósofos, que de maneira
ininterrupta nutriram e marcaram a vida do Ocidente, criando
instituições, que como no caso da Franco-maçonaria, resguardam o
conteúdo da Tradição Unânime.

76 A PORTA
"Tinha um muro grande e alto e doze portas, e sobre as doze portas, doze
anjos e nomes escritos, que são os nomes das doze tribos dos filhos de Israel:
da parte do oriente, três portas; da parte do norte, três portas; da parte do
meio-dia, três portas, e da parte do poente, três portas" (Apocalipse XXI,12-
13).

O despertar gradual da consciência pode ser visualizado como a abertura de


portas que permite que o pensamento "passe" a outras regiões e que o adepto
vá conhecendo os graus invisíveis do ser. A porta supõe sempre uma saída e
por sua vez uma entrada, pois quando a atravessamos saímos de um espaço
mental para ingressar em outro; e são várias as que temos que cruzar, cada
vez mais estreitas, durante o processo da transmutação. A Iniciação nos
Mistérios abre a porta que separa o mundo ordinário e profano daquele
outro, sagrado, onde o espaço e o tempo recuperam sua verdadeira
significação.

Já nos referimos à Porta dentro do simbolismo construtivo, e queremos agora


fazer certas observações sobre a "passagem" que este símbolo evoca. Vimos
o templo como modelo do cosmo e como símbolo do espaço interior do
homem. Sua porta exterior serve de separação –e por sua vez como ponto de
união– entre o átrio –onde preponderam a multiplicidade e o caos do mundo
ordinário– e o espaço interno, no qual reinam a ordem e a harmonia do
sagrado e significativo. O iniciado, graças aos rituais que o qualificam para
entrar, atravessa essa soleira, morrendo aos estados inferiores e exteriores e
renascendo a uma vida interior em que as possibilidades superiores
despertam.

Esta Iniciação, ou porta de entrada aos mundos invisíveis, está representada


na Árvore Sefirótica pela esfera 9, que por sua vez se relaciona com a lâmina
número 12 dos Arcanos Maiores do Tarô. É interessante a relação que
podemos fazer entre esta esfera –Yesod, o Fundamento– e o símbolo cristão
de Pedro (que foi crucificado com a cabeça para baixo, como é a posição de
"O Enforcado") que é a pedra de fundamento sobre a qual a Igreja se levanta.
Neste sentido não é casual que seja o próprio Pedro o portador das chaves –
ou claves– que abrem as portas do reino dos céus.

Por outra parte, esta primeira porta está também relacionada com o símbolo
da caverna e, em ambos os casos, o iniciado, uma vez que ingressou no
espaço interior, deve atravessar pelo labirinto que finalmente o conduzirá –se
não se perde– ao centro ou coração do templo, no qual se localiza a ara ou
altar. No simbolismo cristão, vemos como neste espaço central (guardando o
cálice ou taça, espaço vazio ou receptáculo da Shekhinah), há também outra
pequena porta que só o sacerdote abre e que cobre o mistério dos olhos
profanos. Esta porta se localiza em Tifereth –sefirah central que temos que
transpassar, nascendo de cima, para começar a vislumbrar a realidade oculta
sobre "a superfície das águas".

Havendo recebido o batismo de água que abre a primeira porta, e uma vez
realizado o percurso horizontal e labiríntico entre essa porta exterior e seu
centro, ou coração, no qual se recebe o batismo de fogo, o adepto tem que
iniciar uma "passagem" axial, vertical e ascendente pelo eixo invisível que
conecta o altar com o ponto central da cúpula –de Tifereth a Kether–. Os
ritos "primitivos" de subir a árvore, ou de subir pelo poste ritual,
exemplificam esta ascensão ao final do qual o adepto terá que atravessar a
porta mais estreita que se acha simbolicamente na sumidade do templo. Este
é o buraco da agulha pelo qual não pode passar nenhuma riqueza individual.
A agulha, com efeito, é um símbolo mais do eixo e do rito de enfiar uma
linha na agulha, então, deve ser uma representação desta "passagem" pela
porta estreita.

O homem em sua busca do Conhecimento tem que sair primeiro do mundo


ordinário para entrar em interior do templo; logo, deve se perder nos
labirintos para se encontrar novamente ao atracar no centro; daí, terá que
empreender a ascensão vertical em busca da sumidade e, finalmente, deverá
sair pela porta zenital do templo, ou cosmo, para o supracósmico. Esta saída
final é visualizada como o desatar ou dissolver o nó que nos mantém atados
à individualidade e a um estado particular do ser, e sua conquista constitui
uma fusão absoluta com o todo. "Batei e se vos abrirá".
77 O SÍMBOLO DO CORAÇÃO II
Sede para muitas tradições do valor, do ânimo (alma) e da Inteligência
criadora, análogo no interior do ser humano ao Sol no macrocosmo, a luz e a
vida nascem dele como de uma só fonte, a imagem da origem: "luz e vida,
isso é o Deus e Pai (Noûs) de quem nasceu o Homem. Se aprendes, pois, a te
conhecer como feito de vida e luz, e que são esses os elementos que te
constituem, voltarás a nascer outra vez." (Poimandres, I-21).

Não se pode amar o que não se conhece, e nem todas as formas de união são
um reflexo cabal do Amor.

Pequeno todo, já que é o centro do microcosmo, sintetiza o quaternário


horizontal no eixo vertical e difunde na construção o Não-ser da mesma, sua
identidade supracósmica, que ele reflete diretamente segundo o eixo vertical
e a que o ser conhece através de seu próprio sacrifício (Olho do coração).

É a verdadeira Cidade divina, onde reside indubitavelmente o autêntico


Sujeito incondicionado de todo Conhecimento; nele se acha o germe cujo
desenvolvimento faz efetivos os planos que o diagrama da Árvore da Vida
simboliza, pois é o verdadeiro atanor que absorve o inferior e manifesta o
superior; já que não há manifestação sem centro, nem coisa alguma que
careça de origem. O desenvolvimento deste embrião ou semente, através das
diferentes fases da Obra, sempre alcança no coração uma atualização, uma
realização ou nascimento, pois também há quatro leituras dele, do órgão
físico até o santuário onde se produz a união do criado e o incriado. É a ara
sacrifical e a oblação ou oferenda.

O Centro do Mundo é o banquete do Si mesmo do qual todos podem


alimentar-se sem que se esgote, por isso foi simbolizado por uma Mesa em
que se sentam os deuses e os homens, seja na celebração de um céu
regenerado (Giordano Bruno: Expulsão da Besta Triunfante), ou na de um
matrimônio hierogâmico (as Bodas de Cadmo e Harmonia, quando para a
tradição grega aqueles compartilharam o ágape pela última vez com os
humanos); ou pela Távola Redonda, em cujo centro se acha o Graal, ou a
Mesa de Salomão na Toledo hermética do Século XII, segundo a lenda,
coalhada de pedras preciosas que simbolizam o Zodíaco.

Também é a terra pura, uma vez dissolvida a ignorância que por degradação
cíclica cobre o lugar das hierofanias, que sempre se dão no "centro do
mundo", inaugurando, se for necessário, um espaço ou um tempo ao qual
outorgam essa característica.

Este coração, que é o receptáculo do vertical-espiritual, cuja influência


irradia no horizontal, exercendo assim de intermediário através de seu vazio
central, que o Éter simboliza, é também o receptáculo guardado no sacrário
do templo, construção análoga a este, cuja tampa corresponde à abóbada ou
telhado, e que contém o alimento ou licor de imortalidade, fruto do atanor ao
qual se chegou através do vazio, realidade efetiva de um estado do ser que
transcende à construção, e que pode ser conhecido na abertura do "sentido de
eternidade" e seu desenvolvimento total, embora a individualidade do
homem esteja crucificada no quaternário.

Por seu simbolismo concêntrico, correspondente deste modo à síntese


perfeita da Criação, em seu interior se acha a Presença ou Imanência divina,
que é o verdadeiro Centro de todas as coisas e que as contém, a todas, sem
ser contido por elas: este é assim o autêntico Mestre, com o qual se identifica
o iniciado conforme progride na realização de seu verdadeiro Ser.

78 OS CICLOS I
Como dissemos no título N.º 2 deste Módulo III, um Kalpa representa o
ciclo de existência de um universo ou mundo, nascido do hálito de Brahma,
a Deidade criadora. Não há um ciclo mais extenso que o Kalpa, pois ele
contém todos os ciclos de ciclos possíveis, unidos entre si por esse hálito que
os sustenta e lhes dá a vida. Acrescentaremos que, quando um Kalpa chega a
seu fim, produz-se um Pralaya, a dissolução ou reabsorção desse mundo no
seio de Brahma, no imanifestado. A este respeito, lemos no Bhagavad-Gita,
livro sagrado da Índia: "Ao fim de um Kalpa, de um período de criadora
atividade, os seres e as coisas voltam para Mim". O Kalpa é um dia de
Brahma, e o Pralaya uma noite que, ao finalizar-se, aparece um novo Kalpa,
e assim de maneira indefinida, conformando o que se chama a "cadeia dos
mundos". Cada Kalpa contém 14 Manvântaras, e cada Manvântara
representa o ciclo completo de uma humanidade, que por sua vez se
subdivide em quatro yugas ou idades de desigual duração cada uma delas.
Nosso Manvântara é o sétimo dessa série, e ainda faltariam outros sete para
que finalize o Kalpa atual. Dizer, enfim, que a palavra Manvântara significa
"era de Manu", que é o Legislador universal ou Inteligência cósmica que
promulga, de acordo com a Sabedoria Eterna, a Lei ou Dharma que rege
todo o Manvântara desde seu princípio até seu fim.

Diz-se que o Dharma, simbolizado por um touro na tradição hindu, apóia-se


com suas quatro patas durante o Satya-Yuga ou Idade de Ouro, o que quer
dizer que se manifesta em sua totalidade, significando com isso que a
humanidade em seu conjunto vivia em perfeita harmonia e unidade com seu
Princípio. Recordemos neste sentido que Satya-Yuga quer dizer "Idade do
Ser", ou "Idade da Verdade". A mesma raiz Sat a encontramos em Saturno, o
regente da Idade de Ouro na tradição grego-latina. Por analogia entre a
ordem metafísica e a corporal, esse mesmo sentido de totalidade se expressa
na duração temporal desse Yuga, avaliada como sabemos em 25.920 anos,
que é um período inteiro da precessão dos equinócios ou, o que é o mesmo,
12 "eras zodiacais" de 2.160 anos cada uma (12 x 2.160 = 25.920). Pelo
contrário durante o Treta-Yuga, ou Idade de Prata, a instabilidade e o
paulatino obscurecimento espiritual penetram no mundo, pois o touro do
Dharma se sustenta com três patas (Treta = três). Isto se traduz em um
encurtamento da duração dessa Idade: 19.440 anos, quer dizer, três quartos
da precessão dos equinócios ou, o que é igual, 9 "eras zodiacais" (9 x 2.160
= 19.440). No Dvapara-Yuga ou Idade de Bronze, o touro se apóia tão
somente com duas patas (Dvapara = dois), dando a entender que o Dharma é
compreendido unicamente em sua metade. Precisamente a essa Idade
corresponde uma duração que é a metade da precessão dos equinócios:
12.960 anos, ou 6 "eras zodiacais" (6 x 2.160 = 12.960). E finalmente, no
Kali-Yuga ou Idade de Ferro, o touro do Dharma se sustenta com um só pé,
simbolizando assim o grande desequilíbrio que distingue a última idade do
Manvântara, e muito especialmente às últimas fases deste. A duração desta
Idade é de um quarto da precessão dos equinócios: 6.480 anos, ou 3 "eras
zodiacais" (3 x 2.160 = 6.480). Kali-yuga quer dizer "Idade Sombria", que
começou faz mais de seis mil anos, com o que está a ponto de chegar a seu
fim, e com ela a de todo o Manvântara. Segundo os dados da Ciência
Sagrada esta Idade começou com a entrada na "era zodiacal" de Touro, ao
redor do ano 4.450 A. C.

79 O FIM DOS TEMPOS


Qualquer observador neutro pode comprovar na atualidade certos sintomas
mundiais como terremotos, secas, pestes, guerras, catástrofes, degeneração
social, superpopulação, violências e injustiças, em uma proporção jamais
conhecida pela humanidade. Estes claros sintomas do fim de um ciclo
anunciados pelas escrituras judaico-cristãs até em seus detalhes, também
foram expostos pelas tradições hindu, budista, islâmica, pré-colombiana,
greco-romana, hermética, etc., em abundantíssimos documentos.

Parece que todos estes acidentes se resolverão pelo fogo –por um raio
misericordioso– e que este elemento permitirá a regeneração desta
humanidade que perecerá totalmente e se reintegrará à névoa de onde
proveio, para dar lugar a outra, nascida de suas cinzas e gérmens, que fará
renascer um mundo novo e uma Idade de Ouro, graças aos esforços –e o
sangue– de iniciados e adeptos, que possibilitarão a continuidade da criação.
Certamente que a ignorância contemporânea despreza no público e oficial
este fato, que nega e desconhece –as escrituras dizem que os homens serão
colhidos de maneira imprevista, efetuando seus negócios e mentiras– embora
no privado alguns se sensibilizem, ainda que tendam às imagens literais e
físicas e muitos, inclusive, planejam "salvar-se" em uma espécie de Arca do
Noé material.

Esta última "ingenuidade", ou melhor, ilusão, é tão grave como a outra, e os


que "acreditam" nela –quando se diz que não só haverá uma nova terra, mas
também um novo céu– serão igualmente excluídos do mundo futuro.

A morte de uma civilização é análoga a do ser individual e este nada poderá


levar de material ao outro mundo. Entretanto, o homem ressuscitará em um
corpo de glória se for capaz de aceder ao Conhecimento, ao Ser, e
reabsorver-se no Tempo para ganhar a Eternidade, o que constitui a
verdadeira espiritualidade que o iniciado pretende em vida. E sem dúvida,
este corpo glorioso, ou melhor, esta "entidade", pode se realizar deste modo
de maneira grupal.

Por outra parte, deve se recordar que, na infinita harmonia de todas as coisas,
aonde tudo está contado, pesado e medido, o fim de um ciclo e seus
habitantes está em íntima relação com o começo de outro e o nascimento de
uma nova humanidade, que nada tem que ver com esta, a qual, é óbvio, não
pode subsistir pela própria dinâmica de sua multiplicação.
80 MARSÍLIO FICINO
Quando em 1450 Cosme de Médici confia ao ainda muito jovem Marsílio
Ficino (1433-1499) a criação da Academia Platônica de Florença, estava-se
dando um passo fundamental para o que ia ser um novo ressurgimento da
Tradição Hermética, depois do relativo obscurecimento acontecido do final
do Idade Média. Para encontrar as causas que fizeram possível a realidade
desta Academia (convertida no centro intelectual mais importante da época),
devemos retroceder até o ano 1439 em que, com objetivo de celebrar um
congresso de filosofia, vão a Florença sábios procedentes de diversos países
e religiões, entre os quais se acham também os filósofos neoplatônicos
bizantinos. Estes últimos trazem consigo todo o saber hermético e platônico
conservado intacto na cidade de Bizâncio (anteriormente Constantinopla)
dos tempos alexandrinos, e que só em parte tinha sido difundido pelo
Ocidente Medieval. Entre esses filósofos é Gemisto Pleto o que mais direta
influência exercerá sobre a Academia Platônica, pois por sua mediação
Marsílio Ficino e seu círculo esotérico traduzirão do grego todos os livros do
Corpus Hermeticum (na Idade Média unicamente foi conhecido o Asclépios
em versão latina), os "Oráculos Caldeus", e as obras de Platão, Proclo,
Jâmblico, Plotino, Dionísio Areopagita, Porfírio, Sinésio, para só citar uns
quantos. Deve ser destacado que, para Ficino, traduzir é sobretudo uma
forma de transmitir a tradição, tendo em conta além que estas três palavras –
traduzir, transmitir e tradição– equivalem a uma mesma realidade, já que
todas elas procedem de idêntica raiz etimológica. Neste sentido, convém
recordar que o mesmo conhecimento simbólico transmitido pelas culturas
tradicionais é uma tradução à linguagem e entendimento humanos das
verdades e arquétipos eternos. Assim, traduzindo, comentando e prefaciando
as obras da antiga sabedoria, Ficino se converte em um fiel intérprete dela.
No prólogo que fez ao Poimandres, Ficino estabelece a genealogia mítica e
espiritual que, como uma cadeia de ouro, a "cadeia áurea", unifica acima do
tempo e do espaço a ilustre família dos filósofos herméticos, "...cuja origem
está em Mercúrio e o apogeu em Platão". Retenhamos um parágrafo de dito
prólogo: "No tempo em que nasceu Moisés, florescia o astrônomo Atlas,
irmão do físico Prometeu (filiação esta que sem dúvida se refere à origem
única do céu e a terra), avô materno do antigo Mercúrio, cujo neto foi
Mercúrio Trismegisto, o maior dos sacerdotes e reis". A este rei-pontífice se
lhe deve a instrução "de Orfeu, quem revelou os mistérios a Aglaofemo,
sucedido por Pitágoras, que teve como discípulo a Filolau, mestre de Platão".
Considerando-se a si mesmo como um elo a mais dessa cadeia, Ficino
produzirá uma obra própria, que perpetuará a memória da "raça divina e
heróica", "proprietária dos séculos", adaptando-a às circunstâncias de seu
tempo.

Pelo profundo rastro que deixaram na arte e na filosofia hermética do


Renascimento, merecem destacar-se dessa obra a Teologia Platônica e Da
Religião Cristã, nas quais se manifesta a universalidade de um pensamento,
que foi capaz de combinar os mistérios da cosmologia e da metafísica
platônicas com os da revelação cristã, síntese anunciada já pelos primeiros
Pais da Igreja e seus sucessores medievais, e deste modo por Nicolau de
Cusa (1401-1464), o doutor da douta ignorantia, que tão grande influencia
exerceria sobre o próprio Ficino e seu discípulo Pico de la Mirândola, e
através deles em todos os neoplatônicos renascentistas. Por outro lado, o
esoterismo impulsionado por Ficino pode ser visto como uma reação contra
o "escolasticismo" aristotélico, que em sua degradação estava incubando os
gérmens do que, séculos mais tarde, daria lugar ao racionalismo cartesiano.

Ao dizer de seu discípulo Policiano, Ficino foi "um novo Orfeu que resgatou
dos infernos a Eurídice platônica". Com efeito, o eixo ao redor do qual se
edificou dita obra foram os hinos órficos, nos quais o mestre descobre,
velados sob a linguagem evocadora da poesia, os mais altos segredos, pois
conforme afirmou Dionísio Areopagita, "o raio divino não pode nos alcançar
a menos que esteja coberto de véus poéticos". Esses véus são os próprios
deuses, ou melhor, as emanações que estes manifestam ao homem por
mediação das musas mensageiras –filhas de Zeus e da Memória– e pelas
Graças. Ficino, tal qual Pico de la Mirândola, mantinha que os deuses do
panteão órfico eram deuses "compostos" ou "híbridos", investidos do poder
da mutabilidade, adquirindo com isso todas as formas. Mas essa
mutabilidade é possível pelo auto-sacrifício do Ser que, ao se fragmentar e se
dividir, dá lugar à ordem cosmogônica, regida pelos mesmos deuses. Por
outro lado, que um deus contenha o seu contrário, ou que necessite de seu
oposto para expressar a totalidade de seus atributos, não resulta para nada
estranho a um mago renascentista como Ficino, para quem o universo é uma
estrutura tecida pelas constantes relações, tensões e lutas entre energias
opostas que, entretanto, perpetuamente se equilibram e harmonizam, atraídas
pela força do Amor, inseparável da Beleza, a porta por onde se acede à
identidade com o Conhecimento e a Sabedoria.

Em seu tratado De Amore (comentário ao Simposio do Platão), Ficino deixou


escrito: "Todos os deuses estão ligados uns aos outros por uma espécie de
caridade mútua, de tal maneira que se pode dizer com justiça que o amor é
nó e vínculo permanente do universo". Note-se como se corresponde esta
concepção com o exposto pela doutrina cabalística, pois é em Tifereth (o
Amor ou Beleza), como coração axial da Árvore da Vida, onde acham seu
equilíbrio todas as oposições sefiróticas. Na mesma ordem de idéias, haveria
que se ver o quê a respeito diz o próprio cristianismo, para o qual a caridade,
ou amor, está situada na cúspide das virtudes teologais, que por serem tais
pertencem ao domínio da ontologia, acima da qual só se encontra a
metafísica. Não é casual, pois, que entre os neoplatônicos renascentistas
subsistisse uma secreta filiação que entroncava com o ensino iniciático dos
"Fiéis de Amor medievais". Além disso, representar cega ou com os olhos
enfaixados a deidade do amor (por exemplo, o Cupido de "A Primavera" de
Botticelli, pintor integrado no círculo do Ficino) era uma forma de
exemplificar que os mais elevados mistérios, ocultos nas "trevas mais que
luminosas do Ser", não se podem apreender apenas pelos sentidos corporais,
mas sim por meio da alma purificada, recolhida em si mesma no
arrebatamento do êxtase amoroso que antecede à união com o inefável.
81 A TRADIÇÃO HERMÉTICA
No título N.º 20 deste Módulo aludimos à origem antediluviana e atlante da
Tradição Hermética, recolhendo o que a este respeito se menciona em certas
lendas a respeito da existência de um mítico "Hermes de Hermes" que viveu
"antes do Dilúvio". Essas mesmas lendas referem que desse Hermes
Arquetípico nascem o "Hermes caldeu" e o "Hermes egípcio", quer dizer, as
duas grandes civilizações que dentro do Kali-Yuga, e junto às pré-
colombianas, contam-se entre as herdeiras mais importantes da Tradição
Atlante, em que residia um poder espiritual diretamente emanado do Centro
Supremo ou Tradição Primordial. O Hermes egípcio não é outro que Thot, o
escriba divino e depositário da Ciência Sagrada, aquele que é chamado
"Senhor da Sabedoria", "o Misterioso" e "o Desconhecido", mas ao mesmo
tempo intermediário entre o Céu e a Terra, pois "sem seu conhecimento,
nada pode ser feito entre os deuses e os homens".

Essa função intermediária passará a formar parte do Hermes grego e do


Mercúrio romano, o Deus que encontramos nas encruzilhadas da vida e nos
guia pelo caminho do Conhecimento. Ambos, como sabemos, são
representados com asas na cabeça e nos pés, testemunhando assim essa
natureza intermediária e aérea, que une o inferior ao superior, e levando além
disso o caduceu como insígnia de sua função axial, e com o qual realiza o
vínculo e a união entre os três mundos ou planos da Existência universal,
presentes também no microcosmo humano. Thot-Hermes-Mercúrio conhece,
pois, "tudo o que está oculto sob a abóbada celeste e nas vísceras da terra",
ou seja, a totalidade dos mistérios do Cosmo, e doa esse conhecimento a sua
estirpe (a quem se liga com seu influxo espiritual) mediante a revelação de
um código simbólico que se cristaliza nas distintas artes e ciências da
Cosmogonia (que deram forma à cultura e à civilização do Ocidente),
incluindo os livros sagrados e sapienciais inspirados diretamente pelo
próprio Hermes, como é o caso dos que compõem o Corpus Hermeticum,
sem nos esquecer de todos aqueles que nos foram legados pelos adeptos e
mestres desta Tradição, que continua estando tão viva e atual como o esteve
desde suas origens.

Do Corpus Hermeticum queremos extrair os seguintes fragmentos:

"Detei-vos e recuperai a sobriedade! Olhai ao alto com os olhos do coração –


senão todos, ao menos aqueles que sejam capazes. O mal da ignorância alaga
toda a terra e acaba por corromper à alma aprisionada no corpo, impedindo-
lhe de atracar no porto da salvação. Não vos deixeis arrastar por esta enorme
corrente, aproveitar a vazante, os que possais, e atraqueis no porto da
salvação. Procurai então um guia que vos colha da mão e vos conduza até as
ante-portas do Conhecimento. Ali brilha a luz, limpa de toda obscuridão. Ali
ninguém está embriagado. Todo mundo está sóbrio e observa com o coração
aquele que deseja ser visto, que não se deixa ouvir nem descrever, que não
pode ser visto com os olhos senão com a mente e com o coração. Mas
primeiro deveis lhes arrancar a túnica que levam posta, o vestido da
ignorância, o fundamento do mal, a cadeia da corrupção, a cela tenebrosa, a
morte vivente, o cadáver sensível, a tumba que levam de um lado a outro, o
ladrão que habita em vós, que odeia através do que ama e sente inveja
através do que odeia". Poimandres, VII, 1-2.

"Tal vai ser a velhice do mundo: falta de piedade, desordem, desprezo por
todo o bom. Quando tudo isto aconteça, Asclépio, então, o Senhor e Pai, o
deus cujo poder é soberano, governador do primeiro deus, contemplará esta
conduta e estes crimes insensatos e por um ato de sua vontade –que é a
benevolência de deus–, enfrentar-se-á com os vícios e a perversão de todas
as coisas, endireitará os enganos, purificará a maldade com um dilúvio ou
consumindo-a em chamas, ou acabará com ela difundindo por toda parte
enfermidades pestilentas. Então restituirá o mundo a sua beleza antiga, de tal
modo que o próprio mundo voltará a parecer que merece maravilha e culto,
e, com constantes bênções e cerimônias de louvor, a gente destes tempos
honrará ao deus capaz de fazer e restaurar uma obra tão grande. E esta será a
gênese do mundo: uma reforma de todas as coisas boas e uma restituição
muito sagrada e piedosa da mesma natureza, reordenada no curso do
tempo...". Asclépio, XXVI.

82 OS SIGNOS DA RENÚNCIA
Às vezes este universo se torna muito pequeno, quase como um brinquedo
ou um teatro de marionetes, uma ilusão por cuja realidade, apenas, alguém
apostaria se não fosse porque de momento se encontra dentro, vivendo e
sofrendo em e com ele constantemente. Pois separado de seu sentido
simbólico e teofânico, só é um multicolorido cenário de fenômenos, além do
qual começa o que é verdadeiramente ilimitado e real. Se algo nos "salva"
precisamente deste mundo, permitindo-nos vivê-lo-o mais harmoniosamente
possível, não é ele mesmo ou as coisas que nele existem, mas sim a
compreensão do que o excede e transcende. E só é a fé, nascida da intuição
direta, que nos permite seguir e compreender a ignorância de nossas dúvidas.
E quando dizemos "mundo", referimo-nos também aos dez mil seres que o
povoam, sendo estes uma prolongação sua microcósmica e transitória, assim
como seus afetos, paixões, instintos, ambições e desejos. Prisioneiro de uma
limitada visão de sua existência, dificilmente o homem concebe a idéia de
transpassar a soleira que o separa do "além", tanto como de superar o
sofrimento que implica perder tudo aquilo que ama e que deseja reter. Para
uma cultura que não concebe outra realidade que a material, a morte e o
sofrimento, tanto como a própria vida, são um absurdo completo, uma
interrogação para a qual não há mais resposta que o encolhimento de
ombros, ou as mais desatinadas suposições. É uma visão sem esperança nem
consolo, que termina por fomentar um ódio instintivo e destruidor contra
tudo, contra o próprio mundo, produzindo niilismo e ceticismo.

A impermanência das coisas, a irrealidade do mundo, é que faz intuir desde


o começo a Sidhartha (o futuro Buddha Gautama Sakyamuni), a Liberação
ou a União (Yoga) com a única e verdadeira Realidade Imutável. E é esta a
mensagem básica do budismo, tanto quanto do cristianismo, pregando ambos
a renúncia aos bens ou desditas passageiras deste mundo, a sua ilusória
realidade. Com efeito, nas três primeiras viagens fora do recinto de palácio,
aonde o tem resguardado seu pai, Sidhartha contempla pela primeira vez a
enfermidade, a velhice e a morte. Sua visão confirma suas intuições: tudo é
sofrimento porque toda ação desejosa de "resultados" fixos produz uma
fricção que desgasta. Tudo é um contínuo desgaste ou esgotamento, que se
renova para seguir se desgastando. A única escapatória desta roda inexorável
(Samsara) é a não-ação, ou a renúncia a seus frutos e à "recompensa". E
como sua marcha exterior não pode parar, pois segue pautas cíclicas de
causa-efeito invariáveis, é só pela via interna que pode ser efetuada esta
saída (pois o centro sempre reside no interior das coisas), sendo sua
realidade imutável, não afetada pelas mudanças contínuas da periferia.

Podemos ver que nas circunstâncias cíclicas em que vivemos, esta doutrina é
uma autêntica medicina, um consolo para a alma que hoje, mais que nunca,
intui-se afastada de sua verdadeira pátria, exilada neste "vale de lágrimas".
Com efeito, o desejo e a paixão são os verdadeiros motores da ação (karma),
os quais jamais podem se ver satisfeitos pois a ação, por si mesma, jamais
conduz ao repouso, mas sim gera indefinidamente ações e reações
secundárias. Acabar com os desejos e paixões, mediante o conhecimento da
Cosmogonia como suporte do ser e passagem à metafísica, é deixar de atirar
lenha ao fogo e, portanto, liberar-se da contínua necessidade de fazer ou de
ter.

83 O ATRAVESSAR AS ÁGUAS
"No princípio, criou Deus os céus e a terra. A terra estava sem forma e vazia
e as trevas cobriam a face do abismo, mas o espírito de Deus pairava sobre a
superfície das águas. Disse Deus: ‘Haja luz’; e houve luz. E viu Deus ser boa
a luz, e a separou das trevas; e à luz chamou dia e às trevas noite, e houve
tarde e manhã, primeiro dia.

"Disse em seguida Deus: 'Haja firmamento em meio das águas, que separe
umas das outras' e assim foi. E fez Deus o firmamento, separando águas de
águas, as que estavam debaixo do firmamento das que estavam sobre o
firmamento. E viu Deus ser bom. Chamou Deus ao firmamento céu, e houve
tarde e manhã, segundo dia." (Gênese I, 1-8).

O percurso da alma para os estados mais internos e sutis do ser, é


representado por várias tradições como uma "passagem" através das águas. O
iniciado deve atravessar as águas inferiores de seu psiquismo individual
procurando a chegada às águas superiores que se acham sobre o firmamento.

Entre os antigos egípcios o percurso que faz a alma uma vez que se libera de
sua morada terrestre é representado ritualmente como uma viagem que se
efetua em uma barca, cruzando as águas. Entretanto, é importante recalcar
que, para que esta se realize, não é necessária a morte física, pois a morte
iniciática faz que o adepto obtenha uma verdadeira separação de sua
circunstância individual e de seu corpo carnal e possa empreender em vida
esta viagem através das águas para sua morada eterna.
O modo como se simboliza essa passagem é variada:

a) Algumas vezes se olha como uma viagem da fonte do rio até o mar,
em cujo caso o oceano representa as águas superiores, sendo a
desembocadura como uma "boca" ou uma "porta" pela qual se
passará do cósmico ao supracósmico.
b) Outra forma de visualizar é como o cruzamento de uma margem a
outra do rio, o que se expressa com o símbolo da ponte que une suas
duas margens opostas. Neste caso, cada margem simboliza um grau
diverso do ser, correspondendo uma à terra e à morte e outra ao céu e
à imortalidade. Este símbolo –que também se relaciona com o arco-
íris–, representa aquela entidade intermediária que permite que as
energias celestes desçam ao mundo terrestre e que a terra se
comunique com o céu. A ponte é um lugar de passagem, de provas e
perigos, e o atravessá-la constitui no passar da terra ao céu.
Inversamente essa "passagem" já foi realizada por cada um dos seres
individuais que, provindo de um Princípio único, devieram em
criaturas manifestadas; e o verdadeiro trabalho do homem tem que
ser –segundo a Tradição– a de reencontrar ou "recordar" o caminho
de retorno que o leve a sua origem, atravessando essa ponte invisível
que une estados simultâneos do ser. A palavra pontifex (pontífice),
significa "construtor de pontes", e de fato o próprio Papa ou
Hierofante (ver o número 5 dos Arcanos Maiores do Tarô), sendo um
mediador que conecta o divino e o humano, é ele mesmo, portanto,
uma verdadeira ponte que comunica o homem com sua realidade
espiritual. Diz-se que essa ponte é estreita e –como no simbolismo da
porta– que permite a passagem só aos "eleitos", únicos capazes de
obter a identidade real com os estados mais sutis do Si Mesmo.
c) Outra forma de representar esse passar através das águas, é mediante
o símbolo de remontar o rio até sua fonte original, navegando contra
a corrente. Neste caso o oceano de onde se parte significa as águas
inferiores; a corrente, contra a qual tem que realizar o percurso, são
as forças que tratam de impedir a ascensão; e a fonte é a origem e o
destino –a identidade imutável– do ser verdadeiro e eterno.

Por último, é interessante fazer notar que em todos estes simbolismos do


atravessar as águas se aponta a necessidade de um passar pela morte que as
próprias águas simbolizam.

"É propício atravessar as grandes águas". "É propício ver o Grande Homem".
(I Ching).

84 A INICIAÇÃO
Queremos abordar novamente o tema da Iniciação e sua possibilidade real e
devem ser feitas algumas considerações.
Em primeiro lugar, deve-se esclarecer que a Iniciação verdadeira é um
processo íntimo, secreto, onde o homem troca o conteúdo de suas imagens
mentais através da reforma total de sua psique e portanto inclui uma morte
ao mundo conceitual profano, que é uma reconversão do ser e, desta forma,
vem seguida de um novo nascimento a um estado diferente. Também se
assinalou que há duas destas mortes e portanto três nascimentos, dois
iniciáticos e o profano, e estes nascimentos são perfeitamente efetivos e
reais, claramente indicados por ciclos e sinais, para quem participa deles.

A via é a Simbólica, como ciência das correspondências e das analogias, e


dos ciclos, ritmos, freqüências e cadências em que estes símbolos se
manifestam no ser e seu entorno. Ou seja a via do Conhecimento, apoiada
por práticas físicas e comprovações psicológicas como suportes do Ser e sua
verdadeira realização Metafísica: em suma, a busca e efetivação do terceiro
nascimento, quer dizer, o ingresso aos Mistérios maiores. Para isso, o
Programa conta com os elementos invisíveis –energias espirituais– que
exteriorizados em modo de lições permitem represar o percurso iniciático do
Adepto. Estes elementos tomam a forma da Tradição Hermética, por um
lado, por outro a comparação da mensagem desta Tradição –e as
experiências vitais que o estudo e a imersão nela trazem emparelhados– com
outras manifestações tradicionais –religiosas ou não–, que conformam a
Tradição Original, Universal e Unânime.

85 A TÁBUA DE ESMERALDA
A esta altura de nosso Programa, faz-se quase imprescindível publicar o texto
do mais importante documento Hermético. Trata-se da Tábua de Esmeralda,
legado do mítico e arquetípico Hermes Trismegisto, diretamente vinculado
com a Tradição Egípcia:

1. "É verdade, sem mentira, certo e o mais verdadeiro: O que está


embaixo é como o que está encima, e o que está encima é
como o que está embaixo, para que se operem os milagres de
uma só coisa."

2. "Assim como todas as coisas procedem do Um, pela


contemplação do Um, assim todas as coisas resultam desta
coisa única por adaptação."

3. "Seu pai é o Sol, sua mãe é a Lua, o vento o levou em seu


ventre, sua nutriz é a Terra."

4. "É o pai de toda maravilha no mundo inteiro."

5. "Seu poder é perfeito quando se converte em Terra."

6. "Separa a Terra do Fogo, e o sutil do grosseiro, suavemente e


com todo cuidado."
7. "Sobe da Terra ao Céu, desce de novo à Terra, e une os
poderes das coisas de cima e das de baixo. Deste modo
possuirá a glória do mundo inteiro e toda obscuridade se
afastará de ti."

8. "Este é o poder de todo poder, pois vence tudo o que é sutil e


penetra tudo o que é sólido."

9. "Desta maneira foi criado o mundo."

10. "Por isso, operar-se-ão assim adaptações prodigiosas, cujos


meios se acham aqui estabelecidos."

11. "Por isso sou chamado Hermes Trismegisto, pois possuo as


três partes da Filosofia do mundo inteiro."

12. "Terminado e completo está o que disse com respeito à obra do


Sol."

86 NOTA
A Kundalini é uma energia que sobe da terra para o céu, extremos para os
quais o homem, localizado no centro ou eixo do mundo, é um lugar de
encontro e fusão, energia que o iniciado deve conduzir conjugando os
opostos para obter através dessa ascensão escalonada a União (Yoga) com a
Origem imanifestada do universo, graças ao conhecimento paulatino, por
graus –ou estados do ser– do Todo universal.

Dita operação é o trabalho da união dos complementares e a solução dos


opostos, que se realiza graças à compreensão dos princípios e a apreensão e
contemplação da realidade por intermédio dos símbolos ou veículos
revelados, capazes de despertar em nós as distintas leituras do Mistério que
a conforma: do manifestado ao imanifestado segundo ensina a Tábua de
Esmeralda hermética: "Separa a Terra do Fogo, e o sutil do grosso,
suavemente e com todo cuidado. Sobe da Terra ao Céu, desce de novo à
Terra, e une os poderes das coisas de cima e das de baixo."

Tanto a Tradição extremo-oriental (incluindo sua aplicação no Tai-chi)


como a Maçonaria, são unânimes através de seu simbolismo construtivo: de
um prumo imóvel que pende de um "ponto" imanifestado, desce um eixo
que atravessa o centro de todos os movimentos, corporais, anímicos e
intelectuais; equilíbrio e hierarquia aos quais o ser se adequa por meio do
rito que conduz ao que a primeira denomina a "endogenia do Imortal", cujo
pleno desenvolvimento será idêntico à coroação da Obra, ou obtenção da
Pedra Filosofal.

Graças ao mesmo eixo, conjuga-se a força da gravidade que assinala o mais


baixo, com a via de ascensão que se orienta ao mais alto: a cúspide do Céu
ou Pólo celeste (daí que a "forma" do Tai-chi, a sucessão harmônica de seus
movimentos segundo as distintas escolas, reproduza sinteticamente, entre
outros, os gestos de determinados animais tomados como símbolo dos
movimentos anímicos).

Trata-se nisso da forma cósmica: os três mundos –ou quatro se se dividir o


plano intermédio, o da alma, em superior e inferior– unidos por um eixo
invisível (o centro está virtualmente presente mas pertence, tal como é em si
mesmo, a outro plano que suas manifestações), que, partindo de sua Origem,
dá lugar a todas as coisas por meio da polarização de dois princípios
imanifestados: o Céu e a Terra, constituindo por sua vez o caminho de
retorno. "O Tao do Homem segue o Tao da Terra, o Tao da Terra segue o
Tao do Céu, o Tao do Céu segue o Tao de Taos".

Para o Tantra, a Shakti de Brahma, sua potência criadora e transformadora,


encontra-se simbolicamente, em estado passivo e potencial, no interior do
homem, na base de sua coluna vertebral (Mêru-danda, o "eixo ou cetro do
monte Meru" em sua correspondência microcósmica), ou eixo central de seu
corpo, e a descreve como uma serpente enroscada sobre si mesma, cuja
ascensão e desdobramento (Kundalini-Yoga) pelo interior daquela (com o
passar do sushumnâ, o raio solar análogo no interior do ser humano ao
sutrâtmâ ou "fio do Atmâ" que une o "colar" dos mundos) vai despertando,
vivificando e expandindo os diferentes chakras, ou "rodas", que se
encontram em distintos níveis da medula espinhal, até chegar, por meio do
encéfalo, ao extremo superior da abóbada cranial e abrir-se por sobre ela no
chakra Sahasrâra (o "Lótus das Mil pétalas"); abertura paulatina e sucessiva
que equivale iniciaticamente à tomada de consciência efetiva dos estados
superiores. Em torno do sushumnâ se acham os outros dois nâdîs ("canais")
sutis principais, idâ (feminino, lunar, descendente) e pingalâ (masculino,
solar, ascendente) que em forma helicoidal se entrecruzam seis vezes ao
redor do primeiro, justo ao nível dos chakras correspondentes, e cuja figura
global evoca assim imediatamente a do caduceu hermético; estes se
relacionam fisiologicamente, de baixo para cima, com as regiões coxígea,
sacra, lombar, dorsal-cordial, cervical, encefálica-pineal, e o último com o
alto da cabeça e o que se acha por cima dele. A verdadeira localização destes
"centros" é, efetivamente, sutil e extracorporal, o que não impede a
possibilidade de uma correspondência e interação mútuas e precisas entre
ambas as ordens, tal como ocorre, como vimos, entre os planetas e os metais
que se lhes correspondem. Deste modo, representa-os simbolicamente para a
meditação mediante forma geométricas (yantras) que por sua vez contêm
mantras, tudo isso no interior de lótus cujas pétalas são letras do alfabeto
sânscrito e que, além disso, são considerados morada das correspondentes
deidades e suas shaktis ou potências; a natureza de Kundalinî, sonora e
luminosa, difunde-se por meio dos nâdîs principais e secundários junto com
o prâna (o espírito vital, análogo ao chi da tradição extremo-oriental) na
totalidade do ser individual.

Em nosso caso, é duplamente importante assinalar que esta estrutura da


anatomia sutil do ser humano se encontra igualmente presente no esquema
da Árvore da Vida cabalística, no qual o sushumnâ será seu canal ou pilar
central, e o idâ e o pingalâ, respectivamente, as colunas laterais do rigor e
da graça; é natural que isso seja assim pois se trata de um simbolismo
fundamental que os veículos sagrados das distintas tradições não podem
deixar de testemunhar, ainda com diferenças de detalhe devidas a suas
próprias perspectivas. Igualmente, para o esoterismo hebraico, o núcleo de
imortalidade, descrito como uma luminosa amêndoa indestrutível (Luz),
acha-se situado simbolicamente na base da coluna vertebral.

Se contarmos os pontos assinalados ao longo do Pilar central no diagrama


Sefirótico que inclui os caminhos (ver seguinte diagrama assim como o
Módulo II, título N.º 28), veremos que é em sete níveis do mesmo, indicados
pelas sefiroth do Pilar do Equilíbrio, e os pontos médios entre os que
conformam os Pilares da Graça e do Rigor, onde se encontra a analogia com
os chakras da tradição hindu. Tratam-se dos vértices e o ponto meio das
bases dos triângulos constituídos pelas três tríadas da Árvore mais a sefirah
do último plano (ver Módulo I, títulos 11 e 84). Seguindo as
correspondências deste modelo com o corpo humano, estabelecidas pela
Cabala (ver Módulos I, título 26 e III, 44) vemos que a primeira sefirah,
Kether, a coroa, corresponde-se com o chakra Sahasrâra, situado por sobre
o alto da cabeça e que constitui, segundo o yoga, a porta ou passagem da
manifestação cósmica ao supra-cósmico ou imanifestado. Da união ou
equilíbrio entre o Hokhmah e Binah, sabedoria e inteligência (o olho direito
e o esquerdo e os respectivos hemisférios cerebrais) nasce, segundo a
Cabala, a não-sefirah, Daath, o conhecimento, situado pois entre ambos
como o "terceiro olho" ou "olho do Conhecimento", o chakra âjnâ, cuja
visão destrói –ou conjuga– os opostos na simultaneidade do "eterno
presente". Do mesmo modo, e desde outro ponto de vista, Hokhmah e Binah
são para a Cabala o "Sol dos sóis" e a "Lua das luas", e em diversas
tradições, além da hindu, o olho direito e o olho esquerdo do Homem
universal (o Adam Kadmon da Cabala) são igualmente o Sol e a Lua. Hesed
e Gueburah, a graça e o rigor, relacionados com ambos os ombros, unem-se
no corpo ao nível da zona cervical, a mesma do chakra vishudda situado na
garganta. Tifereth, a beleza, e o chakra anâhata, correspondem ambos ao
coração. Netsah e Hod, os quadris e pernas, ao chakra manipûra, situado na
zona umbilical. Com respeito à Yesod e Malkhuth, as genitálias e a base ou
planta dos pés, dá-se uma variação na posição sefirótica: o primeiro se
corresponde, por seu significado, com o chakra mûlâdhâra ("raiz, suporte,
fundamento"), cuja localização é na base da coluna vertebral, e o segundo, o
"reino", ou morada da Shekinah, com o chakra swâdhishthâna (a "residência
própria" da Shakti).
fig. 41

87 EXERCÍCIO PRÁTICO
No yoga tântrico, a cada chakra corresponde um mantram e também uma
sílaba ou letra sagrada do alfabeto sânscrito, que pronunciada ritualmente,
tal como uma oração, dinamiza e possibilita a abertura do “lótus” ou ponto
virtual de energia contida nesse centro, despertando assim a Kundalini. Na
prática deste exercício, nós faremos o mesmo com os nomes das sefiroth
correspondentes a cada centro, quer dizer, nos remetendo à Cabala. Estes
nomes deverão ser pronunciados rítmica e reiteradamente, imaginando-os
escritos com luz branca sobre um fundo escuro, e girando ao redor de um
ponto. A ordem de começo deve ser de cima para baixo e, logo depois, de
baixo para cima.

88 O OCTÓGONO
Sendo o quadrado representação da terra e o círculo uma imagem do céu, o
octógono é considerado como uma figura capaz de unir ambos e, portanto,
como um símbolo do mundo intermediário, que comunica o inferior com o
superior. Por esse motivo que é relacionado com a idéia do mistério da
“quadratura do círculo” e da “circulatura do quadrado”, que serviu para
expressar o fato da espiritualização do corpo e da “corporificação” do
espírito –ou seja, da união indissolúvel do espiritual e do material–, e que
por sua vez seria utilizado para representar a “passagem” por esse mundo
intermediário. O número oito é freqüentemente relacionado com a morte, e
em particular com a morte iniciática. A carta treze do Tarô, com efeito, é
colocada na sefirah número oito (Hod) e, na Astrologia, a casa oitava é a
casa da morte. Isto nos indica que essa “passagem” terá que implicar na
morte aos estados profanos e na ressurreição aos mundos superiores e, nesse
sentido, o octógono simboliza uma verdadeira regeneração espiritual que
supõe uma transmutação e um novo nascimento.

Com relação com o simbolismo de atravessar as águas, é interessante o fato


de que o timão com o qual se conduz a nave tenha forma octogonal. Por
outra parte, no percurso através das águas são necessários certos pontos de
referência e orientação, e é justamente o símbolo da rosa dos ventos –que se
relaciona também com o das “oito portas”– que se utiliza para designar as
oito direções do espaço (os quatro pontos cardeais e os outros quatro
intermediários) que servirão de guia durante a viagem iniciática. Muitas
vezes, as representações da roda aparecem com oito raios, e em certos casos
com eles se combinam os quatro elementos (terra, água, ar e fogo) com os
quatro estados intermediários da matéria (o seco, o úmido, o frio e o quente).

Na tradição extremo oriental, sempre foi concedida ao octógono uma


importância simbólica fundamental, e é a estrutura básica do “Livro das
Mutações” ou I Ching. Também entre os chineses são comuns os templos de
base quadrada (terra) coroados com uma cúpula semi-esférica (céu), que
aparece sustentada por oito pilares ou colunas (mundo intermediário -
homem).

No simbolismo construtivo cristão, vemos como os batistérios antigos eram


octogonais, como o são também –até agora– as pias batismais. O batismo de
água gera uma passagem real a outros estados e um novo nascimento, e nos
prepara para o batismo de fogo, que se produzirá quando passarmos pela
“sumidade” do templo, pelo ponto central do octógono, que divide sua
cúpula, graças a que transitaremos do cósmico ao supracósmico, do humano
ao supra-humano ou divino. Insistiremos nestes conceitos quando
desenvolvermos outros simbolismos de “passagem” intimamente
relacionados com este e complementares entre si.

fig. 42

89 PICO DE LA MIRANDOLA
Giovanni Pico de la Mirandola, Conde de Concórdia (1463-1494) foi, igual
que Marsílio Ficino, um dos filósofos herméticos mais importantes dos
primeiros anos do Renascimento. Dele se conta que, ao nascer, uma bola de
fogo apareceu de súbito no quarto de sua mãe, sendo que tal, mais que fato
anedótico, pode ser visto como um presságio da função e do destino
espiritual que deveria cumprir. Apesar do breve de sua vida, Pico de la
Mirandola deixou uma obra que seria decisiva para a definitiva consolidação
do Hermetismo renascentista, embora seus escritos não reflitam hoje com
exatidão a transcendência de seu trabalho.

Continuando com o empreendimento de Ficino, Pico de la Mirandola amplia


ainda mais a síntese levada a cabo pelo mestre florentino ao incluir em sua
obra elementos doutrinais procedentes de diversas filosofias e tradições do
Oriente e do Ocidente, e especialmente da Cabala. Este espírito de concórdia
ficará plasmado nas “Novecentas Teses” com as quais Pico provará a
essencial coincidência que aparece no núcleo interior (esotérico) de todas as
tradições, muito acima das diferenças formais e das pretendidas “ortodoxias”
dogmáticas e excludentes. Com isso, quem recebeu os apelativos de “Fênix
de seu tempo” e “príncipe encantador do Renascimento”, converteu-se para
sua época num fiel expoente da Filosofia Perene. As “Novecentas Teses”
(algumas das quais lhe conduziram a sérios enfrentamentos com a cúria do
vaticano) abrem-se, em modo de prólogo, com uma “Oração sobre a
dignidade do homem”, onde com verbo inflamado, Pico expôs a posição
central que o homem ocupa no cosmo. Como já se disse, Pico herda o
pensamento do cardeal Nicolás de Cusa (1401-1484) que, bebendo nas
fontes da metafísica platônica e do hermetismo, desenvolveu a idéia de que
os opostos que os limites da razão não podem superar, encontram seu
equilíbrio conciliador na Unidade, em que igualmente se fundem todas as
doutrinas e religiões.

Trata-se de uma afirmação que corresponde à concepção renascentista do


homem considerado como um teurgo capaz de operar nos distintos planos do
universo, graças ao conhecimento de um saber totalizador, cuja chave estava
na arte e na ciência herméticas. Pode comprovar-se aqui até que ponto
distava esta concepção do simples “humanismo”, com que de forma
unilateral se pretendeu rotular todo o Renascimento sem considerar as
diversas correntes de pensamento tradicional que nele existiram. A
“dignidade” do homem lhe vem dada por se saber um colaborador
consciente na obra da criação, por cujo eixo pode ascender e descender, pois
sua natureza participa por igual do inferior e do superior, “e, se não satisfeito
com nenhuma classe de criaturas (terrestres e celestes), recolhe-se no centro
de sua unidade, feito um espírito com Deus, introduzido na misteriosa
solidão do Pai, que foi colocado sobre todas as coisas, avantaja-las-á a todas.
Quem poderia não admirar a este camaleão?”

Mas, sem dúvida, a mais importante empresa levada a cabo por Pico de la
Mirandola foi introduzir a Cabala na filosofia oculta do Renascimento. E
foram precisamente os judeus chegados na Itália, procedentes da Espanha,
que transmitiram a Cabala ao jovem conde. Dentre esses judeus, alguns eram
conversos e, por conseguinte, conhecedores tanto da Cabala quanto do
cristianismo. Era o caso de Leão Hebreu, Flávio Mitrídates e Paulo de
Heredia, que orientam a Pico no sentido de dar uma interpretação cabalística
do cristianismo, readaptando, de certo modo, uma tradição à outra.
Convencido de que a Cabala confirmava as verdades do cristianismo, Pico
dá forma à Cabala cristã, que se complementa perfeitamente com o
gnosticismo hermético e neoplatônico herdado de Ficino (ver neste Módulo
o título N.º 80). O estudo e conhecimento dos nomes divinos, e a invocação
de suas potências mediante a alquimia da oração, constituíam a pedra
angular do edifício cabalista cristão, pelo que se deduzia uma teurgia que
predispunha o adepto a uma comunicação com os estados angélicos.
Seguindo os rabinos cabalistas e os doutores da Igreja como São Jerônimo,
para os cabalistas cristãos cada uma das palavras, signos, sílabas e pontos
dos livros sagrados (Bíblia, Zohar, Sefer Yetsirah, Bahir, etc.) manifestam a
plenitude da mensagem divina na multiplicidade ordenada e hierárquica de
seus significados. Modificar ou suprimir algo do contido nesses livros supõe
cortar as “raízes das plantas”, e portanto interromper o acesso que conduz à
Árvore de Vida, que se eleva no centro do Pardes. Outra coisa bem distinta é
fazer uso da combinação e permutação entre as letras e palavras do alfabeto
sagrado, pois isso permite descobrir verdades de ordem doutrinal
extremamente reveladoras. Todo o sistema de combinação e permutação
cabalístico procedia das ciências das letras conhecidas como Guematria,
Notarikon e Themurah. Pico assimila o método de combinar as letras
(acrescentando seu correspondente valor numérico) ao ars combinandi de
Raimundo Lulio. O próprio Pico utilizou a “arte combinatória” para
demonstrar, como explica em suas “Conclusões mágico-cabalísticas”
(incluídas nas “Novecentas Teses”) que: “Não há ciência que mais certeza
nos dê sobre a divindade do Cristo que a magia e a cabala”. Isto, que
escandalizou os espíritos fechados do cristianismo, abria, entretanto,
possibilidades insuspeitadas para todos aqueles que procuravam uma via de
realização baseada na Teurgia e na Magia Natural. Por sua vez, na sétima
dessas “Conclusões”, Pico afirma enfaticamente: “Nenhum cabalista hebreu
pode negar que o nome de IESU (Jesus), interpretado segundo os princípios
cabalísticos, significa “Filho de Deus””. E na décima-quarta, conclui-se
dizendo que o nome de Jesus e do Tetragrama são idênticos, mas com
o agregado de uma Shin no meio das quatro letras: . Um
discípulo cabalista cristão de Pico, João Reuchlin, acrescentará anos mais
tarde em seu livro De Verbo Mirifico, que a consoante “s” (Shin) do nome de
Jesus, faz possível a pronúncia, e por conseguinte a audição, do inefável
Tetragrama. Esta era uma forma de demonstrar, cabalisticamente, a natureza
divina de Cristo, Verbo encarnado do Pai. Assim, o que o exoterismo judaico
negou (por ignorância), é afirmado pelo esoterismo. Para Pico e os cabalistas
cristãos, Jesus era o Messias, a culminação histórica e supra-histórica da
revelação sinaítica dada por Moisés ao povo de Israel. De suas Conclusões
reproduzimos as seguintes:

– A unidade metafísica é o fundamento da unidade aritmética.


– A essência e a existência de qualquer coisa são realmente o mesmo.
– O número se encontra precisamente tanto nas coisas abstratas como
nas materiais.
– A essência de qualquer inteligência existe substancialmente para
algo.
– Nada há no mundo que careça de vida.
– A magia é a parte prática da ciência natural.
– O que o mago faz por meio da arte, isso mesmo fez naturalmente a
natureza fazendo o homem.
– Fazer magia não é outra coisa que fecundar o mundo.
– Quem copula à meia noite com Tifereth, obterá que toda sua
geração seja próspera.
– Por meio da Cabala e concretamente por meio do mistério da parte
setentrional, sabe-se por que julgará Deus o século pelo fogo.

90 O HERMETISMO RENASCENTISTA I
Os parágrafos sobre Marsílio Ficino e Pico de la Mirandola serviram-nos de
introdução à filosofia hermética do Renascimento, cuja história, balizada de
visões luminosas e acontecimentos mágico-teúrgicos sempre relacionados
com a busca do Conhecimento, deixou um rastro indelével na cultura e na
alma do Ocidente. Como já apontamos, as sínteses levadas a cabo por Ficino
e Pico, junto com a irrupção do Corpus Hermeticum na Europa latina,
determinaram o começo de uma nova etapa e desenvolvimento da Arte
Régia, enriquecida notavelmente com a contribuição devida à Cabala cristã.
Do foco inicial, centrado na Itália, o Hermetismo renascentista conheceu
uma ampla difusão pela Alemanha, França e Inglaterra, para acabar
implantando-se virtualmente em todo o continente, incluída a, naquela
época, Espanha inquisitorial. Da Alemanha, precisamente, era oriundo o já
mencionado João Reuchlin (1455-1522), que em suas viagens à Itália contata
com os círculos neoplatônicos e cabalistas cristãos, representando o tipo de
humanista hermético na linha do Ficino e Pico. Reuchlin estuda e se
aprofunda nos mistérios da Cabala e da língua hebraica, desenvolvendo a
partir desses conhecimentos aspectos fundamentais da Cabala cristã,
assinalados por Pico nas Conclusões e no Heptaplus. A Reuchlin, grande
conhecedor da cultura grega (foi chamado “Pitágoras redivivo”), é devido o
ter trazido a numerologia pitagórica à teosofia cabalístico-cristã, por outro
lado já implícita nesse sistema graças à cosmologia e à metafísica platônicas.
Recordemos que Pico havia assinalado que “no número pode encontrar o
modo de investigar e compreender tudo o que é possível saber”. Vemos,
assim, que em sua primeira obra, De Verbo Mirífico (“O Verbo
Maravilhoso”), Reuchlin afirma a analogia entre o Tetragrama e a Tetraktys
pitagórica, e entre esta e as dez numerações e nomes divinos da Árvore da
Vida, diagrama que, a partir de então, passa a integrar-se definitivamente na
cosmovisão hermética, fora do âmbito estritamente judaico. Mas é com sua
segunda obra, De Arte Cabalistica, onde Reuchlin expõe a doutrina integral
da Cabala cristã, passando a ser o manual de estudo e meditação para todos
os adeptos da Ciência Hermética. Em De Arte Cabalistica se diz que a
Cabala é uma alquimia que transmuta o mundo das aparências externas em
percepções internas, produzindo uma cada vez maior sutilização das
faculdades humanas, até sua definitiva transformação em espírito e luz.

Entretanto, ao mesmo tempo que se difundiam as idéias herméticas e


cabalísticas, apareceram núcleos de violenta reação contra estas e seus
representantes, ataque que procediam sobre tudo de alguns teólogos e da
filosofia escolástica em franca fase de degradação e incompreensão para com
os princípios tradicionais. Este enfrentamento será constante em todo o
Renascimento, vendo-se acrescentado com a aparição da Reforma
impulsionada por Lutero e Erasmo. Neste sentido, não será demais assinalar
que a Reforma se apoiou, no início, em certos conceitos extraídos da Cabala
cristã, ao mesmo tempo que muitos cabalistas cristãos viram com esperanças
o movimento reformista, que advogava por uma volta à pureza primitiva dos
Evangelhos. Isto foi assim até que, por sua vez, a Reforma protestante decaiu
em um estéril puritanismo religioso a serviço dos postulados racionalistas e
anti-tradicionais que iluminaram o mundo moderno. Mas também existiram
homens de Igreja que se interessaram vivamente pelo hermetismo
cabalístico, e inclusive participaram de sua difusão. É o caso do cardeal
Egídio de Viterbo (1465-1532), que protegeu e se rodeou de sábios versados
em Cabala e hermetismo, tal como fez outro cardeal, Bessarion, na época de
Ficino e Pico. Tradutor do Zohar, Egídio de Viterbo deixou uma obra
considerável, destacando por seu conteúdo a que leva por título Shekhinah,
em que é notório o rastro de Reuchlin. Para o Viterbo, a Shekhinah (a
presença real da divindade) é a própria voz da Sabedoria, que se manifesta
no coração do justo, mostrando-lhe os celestes mistérios. Ele a compara ao
Espírito Santo, por cuja mediação a Lei foi sendo revelada através dos
séculos aos profetas e apóstolos. Como se diz no Zohar: “Quando dois ou
três se reúnan ao redor da Torah, a Shekhinah estará em meio deles”. Com
palavras que evocam a “Tábua de Esmeralda” hermética, Viterbo põe nos
lábios da Shekhinah: “Porque este é meu segredo: tanto na terra como no
céu... Para que haveria eu criado o céu, os elementos, as pedras, os metais, as
ervas, as árvores, os quadrúpedes, os peixes, os pássaros, os homens, senão
para que ocorra o mesmo na terra como no céu, e que o mundo sensível
imite ao inteligível: e tenho inscrito signos na matéria tal como o imitaram
os egípcios”.

Um dos mestres herméticos mais destacados nessa primeira metade do


século XVI italiano foi o monge Francesco Giorgi (ou Zorzi) de Veneza
(1460-1540), cidade esta que, depois de Florença, passou a ser a capital da
filosofia oculta do Renascimento. Bebendo das fontes neoplatônicas,
pitagóricas, cabalísticas e na teologia do Dionísio Areopagita, Giorgi escreve
Da Harmonia Mundi, talvez a obra que, junto à de Reuchlin e Agrippa,
maior influência terá sobre os cabalistas herméticos de toda a Europa. Em
Da Harmonia Mundi são constantes as correspondências mágico-teúrgicas
entre as hierarquias angélicas (também sefiróticas), zodiacais e planetárias,
quer dizer, de todo o conjunto da ordem celeste, que indevidamente se reflete
no mundo sublunar ou terrestre.

Para o Giorgi, a harmonia do universo, sua beleza, põe ao homem em


disposição de compreender e perceber a perfeição da Mônada ou Unidade
Suprema. Todos os planos e níveis da criação, do superior até o elementar,
vibram ao mesmo acorde, tangido sobre o diapasão do Arquiteto divino,
embora em diferentes tons ou graus de intensidade. O homem capta essa
sutil harmonia por meio dos módulos geométricos e numéricos, que acham
suas mais formosas e essenciais expressões na arquitetura e na música.
Precisamente, em alguns edifícios renascentistas se aplicaram as concepções
geométrico-numerológicas recolhidas em Da Harmonia Mundi, e na
construção dos quais interveio diretamente Giorgi, como foi o caso do
convento de São Francisco da Vinha, em Veneza. Da Harmonia Mundi foi
traduzida ao francês pelo poeta hermético Guy Le Fèvre de la Boderie
(tradutor também de Pico), a quem descreveu como um tesouro de “belas
semelhanças... que se diria que o conjunto está composto de um só bloco de
pinturas várias (as diversas fontes doutrinais em que se inspirou),
embelezado e enriquecido com arte”. Esta tradução teve grande influência
sobre Guilherme Postel e sua escola, que representava o principal foco de
expansão da Cabala cristã na França, país este que, dito seja de passagem,
desempenharia um importante papel na conservação das idéias tradicionais
até nossos dias. Não menos notável foi a influência de Giorgi na Inglaterra
de Elisabete I, que na segunda metade do século XVI era na verdade uma
“ilha” de tolerância para com a filosofia e a ciência herméticas, tolerância
que contrastava com o que ocorria no resto do continente, onde aquelas
estavam sendo perseguidas com crescente crueldade pela Inquisição e pela
Contra-reforma.

91 O HERMETISMO RENASCENTISTA II
Tanto quanto à Cabala cristã, a Alquimia também participou do
desenvolvimento e difusão do Hermetismo renascentista. Como é natural,
ambas as disciplinas eram e são inseparáveis e, de fato, a Grande Obra
alquímica facilitava aos cabalistas cristãos o conhecimento da natureza,
concebida como uma entidade mágica, mediante a qual se restabelecia a
realidade dos contatos com o plano ontológico e metafísico. Quer dizer, que
a Alquimia representava, em certo modo, o método “prático” para conseguir
a imprescindível transmutação interior que possibilitava a ascensão pelos
graus da scala philosophorum.

Talvez quem expôs mais nitidamente as vinculações entre a Cabala cristã, a


Alquimia e a Magia natural foi Cornelio Agrippa (1485-1535), sobretudo em
seu famoso tratado Filosofia Oculta. Esta obra se divide em três partes,
correspondendo-se cada uma delas com os três mundos: o Elemental, o
Celeste e o Intelectual, segundo definição dada pelo próprio Agrippa. Tendo
sempre presentes as permanentes relações e a unidade entre os três planos
cosmogônicos, na primeira parte de seu livro –intitulada “A Magia Natural”–
Agrippa detalha cuidadosamente as virtudes e propriedades dos seres e das
coisas que habitam na esfera sub-lunar, ou Corpus Mundi. É dada toda classe
de indicações e regras para interpretar adequadamente, “como ensinam os
Magos e Filósofos”, os reinos telúricos mineral, vegetal e animal à luz de
seus protótipos celestes. Na segunda parte –“A Magia Celeste”– descreve-se
o Anima Mundi ou Anima Vitae, governada pelas potências das estrelas, dos
planetas e do zodíaco. Esta parte está quase toda ela consagrada ao número e
à geometria, pois, para a Agrippa como para o Giorgi, a geografia sutil da
maravilhosa “máquina celeste” está regida e animada pelas Idéias que
manifestam os números e as formas geométricas. Evidencia-se, assim, a
influência platônica e pitagórica. E, por último, o terceiro livro, Agrippa o
dedica a “A Magia Cerimonial”, que é precisamente a magia invocatória dos
anjos e nomes divinos, que conformam o Spiritus Mundi, doador da palavra
fecundante e luminosa, que vivifica com seu influxo sobrenatural o cosmo
inteiro. Recolhe-se aqui o essencial da Cabala cristã, pois além de oferecer
uma exaustiva interpretação das emanações sefiróticas, fazem-se constantes
referências ao nome do Jesus, “que tem toda a virtude do nome de quatro
letras, expande seu poder e virtude, pois este pai Tetragrama lhe deu poder
sobre todas as coisas”. Da mesma forma, alude-se extensamente aos quatro
“furores” divinos que o mago invoca em suas operações teúrgicas: o
proveniente das Musas, o de Dionisios, o de Apolo e o de Vênus. E como
advertindo as dificuldades e paradoxos que apresenta a via hermética para
todo aquele que nela entra, Agrippa conclui com estas palavras extraídas do
texto bíblico: “Quando procurar o Senhor seu Deus, encontra-lo-á se o busca
de todo coração e em toda a tribulação de sua alma”. Infatigável viajante,
Agrippa leva a mensagem por sua a Alemanha natal, Itália, França,
Inglaterra... Em todos esses países ensina, forma discípulos, cria escolas,
entrando em contato com os mais importantes núcleos herméticos e
cabalistas. É também perseguido e tachado de enganador e feiticeiro pelos
eternos inimigos da doutrina, contra os quais se defende argumentando que o
mago “não é sinônimo de enganador, de supersticioso ou de demoníaco, mas
sim equivale a sábio, sacerdote ou profeta”, tão elevada era a concepção que
tinha de seu ministério e função.

Entre os que foram influídos por seu pensamento, merece destacar-se ao


gravador e pintor Alberto Dürer, cujas duas obras, “Melancolia I” e “São
Jerônimo em seu estudo”, constituem autênticos tratados hermético-
alquímicos. Assinalemos que Dürer foi, além disso, mestre de um
agrupamento esotérico de tipo artesanal, tal como seu contemporâneo
Leonardo Da Vinci, o que era bastante freqüente em uma época que, como
estamos vendo, e apesar de suas contradições e complexidade, reivindicou
com força os valores perenes do espírito tradicional do Ocidente. Por outro
lado, muitos alquimistas do século XVI deixaram perseverança da
cosmovisão hermética em pinturas e gravuras de grande riqueza simbólica e
iconográfica, continuando assim uma forma de expressão que se remontava à
época alexandrina e, sobretudo, Medieval. Digamos que a utilização das
artes plásticas e visuais como meios de transmitir a Grande Obra ainda
perduraria entre os adeptos dos séculos XVII e XVIII, a alguns dos quais nos
referiremos em posteriores títulos.

92 ALQUIMIA
Continuando com os mestres alquimistas do XVI, devemos mencionar
também ao grande médico Paracelso (1493-1541). Como alquimista, sua
experiência médica se centrou no estudo e observação da natureza e mais
exatamente na forma em que esta urde suas operações ocultas e invisíveis,
pois, em definitivo é o espírito, e por meio deste a alma do mundo e do
homem, o único que pode sanar os corpos doentes. Tomando como princípio
o postulado hermético de que “a magia é natural porque a natureza é
mágica”, a medicina do Paracelso se funda nas correspondências e analogias
entre o macrocosmo e o microcosmo, que formam um só organismo “no qual
as coisas se harmonizam e simpatizam reciprocamente”. Ambos “não são
mais que uma constelação, uma influência, um sopro, uma harmonia, um
tempo, um metal, um fruto”. Este íntimo laço entre o invisível e o visível,
que contribui a edificar a arquitetura do cosmo e da vida, Paracelso o resume
da seguinte maneira: “Os astros não influem diretamente sobre os corpos,
mas sim sobre a força vital. Por isso os órgãos não são em si mesmos senão
representações (símbolos) corporais de energias invisíveis que atuam em
todo o organismo. Na realidade, o verdadeiro fígado é uma força que circula
em todas as partes do corpo, mas que tem sua sede em um órgão ao qual
chamamos assim”. A enfermidade aparece no momento em que se produz
uma dissociação no seio dessa unidade macro e microcósmica, pois cada
órgão ou parte do corpo está em correspondência com um planeta ou signo
zodiacal, os quais, por sua vez, influem em determinados minerais, metais,
plantas e animais. Por este motivo, ao se resultar de uma carência um órgão
doente, haja compensação administrando –ou anulando a influência se, pelo
contrário, tratar-se de um excesso– o conseguinte produto natural com o que
dito órgão simpatize. Entretanto, segundo Paracelso, a enfermidade não é
unicamente excesso ou carência de algo (que seriam só o efeito), senão que
se trata de um “ser” ou de uma entidade do plano anímico intermediário,
vinculada, tal como a velhice, ao poder dissolvente e corrosivo do tempo,
pelo que a medicina alquímica e tradicional persegue “extrair a
‘quintessência’ das coisas, descobrir seus arcanos, preparando os elixires
capazes de devolver ao homem a saúde perdida”; e, o que é mais importante,
reintegrá-lo ao estado primordial. A enfermidade seria, pois, não um mal em
si mesmo, senão um suporte como outro qualquer para “remontar-se ao
plano divino”, conciliando os opostos que surgem de sua ação.
93 A ESCALA
Quando Jacob fugia de seu irmão Esaú, detendo-se para passar a noite,
tomou uma pedra que pôs de cabeceira:

“E teve um sonho; sonhou com uma escada apoiada na terra, e cujo topo
tocava os céus, e eis aqui que os anjos de Deus subiam e desciam por ela. E
viu que Yahveh estava sobre ela...” (Gênese, XXVIII, 12).

Pela escala, simbolicamente, sobem e descem as energias da criação, pois


esta é como uma ponte vertical que comunica a terra com o céu, o material
com o espiritual. Por ela as energias sutis e invisíveis descem aos homens,
que por sua vez têm a possibilidade de subir por seus degraus para a pátria
celeste.

No processo iniciático este símbolo tem o duplo papel tanto no processo de


“descer” como no de “subir”. A descida aos infernos, ou visita ao interior da
terra, que se tem que produzir na primeira etapa da iniciação, é às vezes
representada como uma escala que conduz ao subsolo; por outra parte, os
deuses, enviados ou energias celestes que visitam a terra, descem por uma
escala misteriosa. Mas, em geral, seu significado é mais ascendente,
representando a elevação escalonada da consciência no caminho do
conhecimento.

Há uma similaridade e complementaridade entre o simbolismo da escala e o


da porta, já que ambas indicam uma “passagem” a outros estados, e a
primeira, em muitos casos, precede à segunda. Tal é o caso do simbolismo
do templo cristão: primeiro se vêem os degraus entre o átrio e a porta
exterior; em seguida, estão de novo antes da chegada ao altar; e finalmente, a
mais importante é a escala invisível que comunica o altar com a cúpula, em
cujo centro se acha a porta estreita à qual já nos referimos. Por outra parte,
também na arte cristã se vê freqüentemente a relação da escala com a árvore
e de ambos com a cruz, todos símbolos axiais cuja função consiste em
enlaçar o de cima e o de baixo. A verdadeira escala está plantada no centro
do mundo, e, como sabemos, qualquer espaço sagrado pode representar esse
centro. Entretanto, todas as idéias de centro nos devem conduzir a nossa
própria interioridade, que é de onde tem que sair a escala que nos permitirá
aceder –quando chegarmos a seu topo– ao mundo dos deuses.

Também se relaciona este símbolo com o da espiral –o que é notável na


escada em “caracol”–, pois ambos se referem às hierarquias da existência, os
níveis do Conhecimento e os graus de leitura da realidade. Cada um de seus
degraus representa um distinto “céu”, um estado do ser; e o escalá-los indica
a ascensão gradual da alma que busca a fusão com o espírito único.

No simbolismo construtivo a escala é por um lado um instrumento de


trabalho (escada) e pelo outro forma parte integral da própria construção
(degraus). A própria estrutura da pirâmide, por exemplo, fala-nos da
escalonada subida para o centro do ser; e é interessante também a relação
desta com a montanha, que em determinados casos se escala ritualmente e
cuja ascensão tem o mesmo significado.

O número de degraus ou degraus da escala é importante e varia segundo o


que esteja simbolizando. As mais comuns são as de três e sete degraus;
embora as encontra também freqüentemente em número de nove, dez, doze,
trinta e trinta e três, etc. A de três degraus se relaciona em geral com os três
graus (de aprendiz, companheiro e mestre) da iniciação. A de sete também
tem esse sentido, quando –como no caso do simbolismo dos sete chakras– os
graus são nesse número. Esta última é claramente visível na escala musical,
que por sua vez se encontra ligada com a dos planetas, a dos metais, a das
cores –o arco íris é às vezes representado como uma escala– e os sete dias da
semana, símbolos todos que nos falam da ascensão progressiva pelos sete
“céus” planetários –que as sete artes liberais e as próprias sefiroth
exemplificam– que temos que visitar em nossos percursos iniciáticos e cuja
realização sempre suporá uma expansão gradual da consciência.

No corpo humano, o simbolismo natural que mais claramente se relaciona


com a escala é o das trinta e três vértebras que compõem a coluna vertebral,
eixo axial que lhe dá o ponto de equilíbrio; embora também a divisão
simples do corpo em cabeça, tronco e extremidades, tem um sentido
escalonado e hierárquico.

Com efeito, o símbolo da escala nos ensina que a criação é hierarquizada,


que essas hierarquias são na verdade internas, e que temos que as conhecer,
as escalando dentro de nós mesmos, para despertar e conhecer nossas
verdadeiras possibilidades espirituais.

A palavra escala tem uma relação também com a idéia de “proporção”, e


nesse sentido pode se ver o ser humano como criado “à escala” do universo.
Com efeito, o homem tem limites pois seus sentidos unicamente lhe
permitem perceber uma determinada escala da realidade (não vêem nossos
olhos as cores infravermelhas nem as ultravioletas; nem percebemos a olho-
nu os planetas mais afastados de Saturno; nem escutam nossos ouvidos as
escalas musicais mais baixas e mais altas). Entretanto, primeiro o
reconhecimento desses limites, e logo a ascensão escalonada pelos graus do
ser, permitir-nos-ão chegar ao ilimitado, onde a idéia de hierarquia perde
realidade e só reina a igualdade pura da essência.

94 A TRADIÇÃO PRÉ-COLOMBIANA
Em finais do século XV e no XVI, os europeus “descobriram” a América.
Entretanto, a Tradição Pré-colombiana existia há muito e era conhecida essa
existência pela antigüidade segundo testemunho de Platão, que, falando da
Atlântida, continente-ilha desaparecido por uma catástrofe, diz-nos que suas
colônias se achavam pulverizadas pelo ocidente em pequenas ilhas,
arquipélagos e terra firme. Do mesmo modo, outras das colônias deste
continente se achavam na África e na Europa e delas são herdeiros nada
menos que o Egito (e por seu intermédio a Grécia e todo Ocidente), Caldéia
(de ingerência fundamental nos povos do Oriente-Médio e mediterrâneos) e
os celtas (de particular influência na Espanha, Irlanda, Inglaterra e França).

Entretanto, durante séculos, foi tabu o cruzar as Colunas de Hércules e


penetrar o oceano Atlântico (a raiz Atl, encontra-se ainda hoje muito
difundida entre os povos Nahuatl) o que, finalmente, por imperativos
cíclicos e históricos, foi levado a cabo pela Espanha, seguida de Portugal e
posteriormente da Inglaterra, França, Holanda, etc. Foi assim como se
“descobriu” a América e, a partir desse momento, ela se converteu no
objetivo econômico de toda a Europa, deslumbrada exclusivamente pelo
ouro e pelas riquezas destas terras, a tal ponto que não souberam emprestar
nenhuma atenção à cultura desse imenso continente, à sua tradição e seus
homens, que foram exterminados fisicamente, e menosprezados seus ritos,
mitos, símbolos, usos e costumes, expressões vivas de sua concepção
cosmogônica e teogônica. Esta última situação se prolongou até nossos dias,
e só uma minoria de estudiosos (em particular desde meados do século XIX
e no transcurso do XX) dedicou-se a resgatar os valores tradicionais pré-
colombianos, que se encontram em número indefinido e em qualquer parte,
nas centenas de povos (e línguas) distintos que se acham pulverizados desde
o Alasca à Terra do Fogo. Entretanto, todas estas nações, que incluíam tanto
a povos nômades ou semi-nômades como a medianas ou grandes
civilizações, têm uma óbvia origem comum, apesar de suas diferenças
culturais, muitas delas surgidas como adaptações geográficas e históricas
diversas, e inclusive por possíveis contatos com outras sociedades.

O estudo da Tradição Pré-colombiana é muito importante tanto para aqueles


que, por uma ou outra razão, tiveram contato com a América, como para os
investigadores das tradições, religiões e filosofias comparadas.
Particularmente dos símbolos, ritos e mitos, pois se poderá comprovar, com
surpresa, como esta cosmogonia e teogonia se identificam com as
mediterrâneas (a tal ponto que os sacerdotes cronistas da conquista não
deixam de destacar as estreitas relações com o judaísmo e com o
cristianismo) e até com as da Índia e da China, para dar só um par de
exemplos, demonstrando-se a identidade essencial de todas as tradições,
vivas ou mortas, como é este último o caso da Pré-colombiana, cujos
símbolos esperam ser revivificados para transformarem-se em energias
atuantes no desenquadrado e crepuscular mundo moderno. Deve, entretanto,
o leitor atuar com suma prudência e não deixar-se tentar por falsos indícios
ou entusiastas aspirações. Talvez poderia tomar a reconstrução deste imenso
quebra-cabeças que traçam as antigas culturas indígenas, ou outras
igualmente pouco conhecidas, como auxiliares na própria Iniciação;
sobretudo, se pudesse compreender a simbólica desta Tradição como
arquetípica, e portanto capaz de manifestar-se e atuar em nossa psique, em
nossa própria vida. Fechamos com um fragmento do Peri Agamaton de
Porfírio, apropriado para a idéia da vivificação de uma Tradição
virtualmente morta.

“Desvelo noções de uma sabedoria teológica; é Deus e as potências de Deus


o que os homens revelaram mediante estas noções. Têm-no feito através de
imagens apropriadas aos sentidos, imprimindo as coisas invisíveis nas obras
visíveis, para aqueles que aprenderam a decifrar nas representações o que se
encontra gravado referente aos deuses, da mesma maneira que se faria nos
livros. Além disso, nada tem de estranho em que os mais desprovidos de
instrução tomem às estátuas por blocos de pedra ou de madeira, exatamente
como aqueles que não sabem ler não vejam nas estelas, as pranchas ou os
livros, mais que pedras, madeiras ou papiro encadernado”.

95 O RENASCIMIENTO ELISABETANO
Em meados do século XVI se produziu um certo declinar do movimento
hermético que com tanta força emergiu cem anos antes na Itália. Neste fato,
tiveram muito que ver as ações levadas a cabo pela contra-reforma, que, em
seu pretendido afã por conservar e defender o que ela entendia pela “pureza”
da religião católica, perseguia todas aquelas idéias que não correspondiam a
seus limitados critérios. Só nas nações onde os respectivos estados
abraçaram a Reforma persistia a tolerância religiosa, tal o caso da Alemanha,
Boêmia e Inglaterra. Mas as particulares circunstâncias geográficas deste
último país fizeram possível que ali se desse, mais que em nenhum outro, um
novo ressurgimento tradicional, propiciando o que com razão se deu em
chamar o Renascimento Elisabetano, no qual também participou o
hermetista e neoplatônico italiano Giordano Bruno, que residiu durante
vários anos na Inglaterra, e ao que se devem obras tão importantes como De
umbris idearum, Da causa, princípio e um, Dos heróicos furores, De
innumerabilibus, immenso et infigurabili, Do infinito, do universo e dos
mundos, Expulsão da besta triunfante, etc. Com efeito, sob o reinado de
Elisabete I, que vai de 1558 a 1606, a antiga Albion conheceu sua maior
época de esplendor no terreno cultural, e no qual certamente exerceram uma
notável influência as concepções herméticas. Do mesmo modo, deve-se
considerar que na Inglaterra daquela época sobreviviam algumas correntes
do cristianismo templário e cavalheiresco, que seguiam mantendo vivo o
antigo ideal medieval do Império cristão, encarnado ali na figura mítica do
rei Artur e seus doze cavaleiros da “Távola Redonda”, cuja lenda está
baseada também nas antigas tradições celtas. Assim, as favoráveis condições
que naquela época vivia a Inglaterra e sua decidida oposição ao poder quase
exclusivamente temporal em que havia caído a Igreja Católica, foram fatores
decisivos para que essa idéia da monarquia imperial renascesse com força. O
suporte doutrinal no qual se apoiaria dita monarquia não seria outro que o
Hermetismo e a Cabala cristã.

Por outro lado, e do ponto de vista em que aqui nos situamos, pouco importa
que a tão esperada reforma universal não chegasse a cumprir-se totalmente,
tal e como desejavam seus promotores. Longe de ter sido em vão, esse
intento gerou toda uma plêiade de escritores, poetas, artistas e cientistas
profundamente interessados na Ciência Sagrada. Baste recordar a
Shakespeare, cujas peças teatrais transluziam uma visão do mundo fundada
na cosmogonia hermética e cabalista cristã, especialmente em “A
Tempestade”, “O Mercador de Veneza” e “O Rei Lear”. Sem esquecer
tampouco a Edmund Spenser e seu poema épico “A Rainha Fada”,
intensamente saturado de neoplatonismo hermético e claramente alusivo à
função reformadora da monarquia Tudor. Mas o personagem chave do
Renascimento Elisabetano é sem dúvida John Dee, até tal ponto que resulta
impossível compreender este período da história esotérica do Ocidente sem
ter em conta este mestre, de quem se diz que possuía uma enorme biblioteca
abrangendo todos os ramos do saber hermético. Renomado matemático, Dee
desenvolveu sua concepção do cosmo apoiando-se inteiramente nas
proporções harmônicas dos números e da geometria, em total acordo com o
exposto por Reuchlin, Giorgi, Agrippa e inclusive Dürer, de quem Dee
extraiu sua teoria sobre ditas proporções no corpo humano. O essencial de
seu pensamento o verteu na que aparece como sua obra fundamental, a
Monas Hieroglyphica, quer dizer, a figura, gravura ou símbolo sagrado
(hieróglifo) representativo da Mônada ou Suprema Unidade. Basicamente, a
Monas Hieroglyphica explica como o Ser se desdobra, e é imanente, nos três
mundos, que por sua vez, e tomados em seu conjunto, formam uma imagem
“matemática, mágica, cabalística e anagógica”, pela qual é possível
remontar-se para a contemplação da própria Unidade, de sua transcendência.
Com efeito, é por meio da matemática pitagórica, da magia, da cabala e da
anagogia (busca e interpretação do sentido metafísico encerrado nas Santas
Escrituras) que o mistério fecundo da existência se revela em toda sua
plenitude e majestade. Para Dee, no mundo elementar as leis divinas se
expressam através da ciência matemática, entendida como tecnologia
aplicada; no intermediário, ditas leis regulam os ciclos astrológicos e astrais;
e no espiritual se manifestam como energias angélicas. Dee tampouco foi
alheio à Alquimia, especialmente à legada por Agrippa, que como sabemos
estava unida à Cabala cristã. Em Dee, Alquimia e Cabala efetuam um
sistema mágico-teúrgico, cujo principal objetivo consistia na comunicação
direta com os anjos, mediante o poder da invocação e da oração.

Neste sentido, Dee desenvolve uma Cabala de tipo “prático”, que é na


realidade uma forma cristianizada da magia Angélica, fundamentada no
conhecimento dos nomes divinos e nos princípios da cosmologia hermética e
da metafísica, pelo que não tem nada que ver com a “cabala prática” nem
tampouco com a “magia cerimonial” em uso entre os ocultistas dos séculos
XIX e XX, nascida de uma grosseira confusão entre o psíquico e o espiritual.
Dentro do período elizabetano, Dee chegou a ser um dos principais
inspiradores do movimento político-hermético que deveria conduzir à nova
ordem imperial, à frente do qual estaria a própria rainha Elizabete I. Nesta
perspectiva, deve se ver a série de viagens que Dee leva a cabo por diversas
cortes da Europa Central, onde, ao mesmo tempo que difunde a mensagem
da monarquia cristã, realiza fecundos contatos com os núcleos herméticos-
cabalistas por ali existentes. Por exemplo, reside algum tempo na corte do
imperador Rodolfo II, da Boêmia, que se rodeou sempre de mestres
cabalistas e herméticos, e a cujo serviço precisamente esteve o médico
alquimista Michael Maier. Significativamente, durante os anos em que Dee
permaneceu no continente (de 1583 a 1590) estava sendo gerado o
movimento hermético rosa-cruz, que tão destacada importância teria na
primeira metade do século XVII.

96 NOTA: DOUTA IGNORÂNCIA OU IGNORÂNCIA DOUTA?


Como já foi dito, existe uma grande diferencia entre a “douta ignorância”,
chamada assim por Nicolas da Cusa ao querer explicar aqueles estados que
tão bem descreve a “teologia negativa”; e outra por certo a simples
ignorância geral que, por ser tal como é, presta-se à cumplicidade com o
êxito, ou a hipócrita bênção oficial, ou com o que exigem a moda e o
mercado. Ambas estão invertidas, nos extremos da polaridade, e os seres
que encarnam estas realidades são opostos; os primeiros experimentam o
não saber, os segundos, os “doutores” ignorantes, não sabem do saber e,
portanto, acreditam que os outros tampouco sabem, e isso os faz capazes de
fingir saber.

97 O MOVIMENTO ROSA-CRUZ
O conjunto da filosofia hermética do Renascimento encontrou sua última
expressão no que se chamou movimento rosa-cruz, ou rosacruciano, ao qual
pertenceram Robert Fludd, Michael Maier, Valentín Andreae, Enrique
Khunrath e Comenius, entre outros. Como já dissemos, este movimento
nasce em princípios do século XVII, concretamente nos países onde John
Dee dera a conhecer a mensagem da reforma universal, apoiada nos
postulados doutrinais do hermetismo alquímico e cabalístico-cristão, do qual
também é herdeiro o teósofo alemão Jacob Boehme (1575-1624), que teve
que lutar toda sua vida, como tantos outros mestres herméticos, contra a
intolerância religiosa, chegando inclusive a conhecer por algum tempo a
amargura do cárcere. Em suas obras –principalmente A Aurora que
desponta, De Signatura Rerum e Mysterium Magnum– Boehme expõe com
verbo inflamado as etapas pelas quais o homem pode recuperar seu “corpo
de luz” anterior à queda adâmica, nascendo como filho da Sabedoria Eterna.

O movimento rosa-cruz toma força com o resultado da aparição dos


manifestos entitulados Fama Fraternitatis e Confessio Fraternitatis, cuja
autoria, direta ou indiretamente, pertencia ao misterioso “Colégio Invisível
da Rosa-Cruz”, do qual os rosacrucianos obtiveram precisamente o nome.
Pela importância que reveste para compreender a história sutil da época que
estamos tratando, convém que nos detenhamos um momento no conteúdo
desses manifestos, e especialmente nos eventos acontecidos ao fundador
legendário dessa Fraternidade iniciática: Christian Rosenkreutz (literalmente
“Cristão Rosa-cruz”). Em primeiro lugar, diremos que esse nome é
simbólico, pois não designa um personagem concreto, mas sim uma
“entidade coletiva” que desempenhou uma função tradicional em um período
determinado. Diz-se que a “vida” de Christian Rosenkreutz está na transição
entre os séculos XIV e XV, quer dizer, quando se gerava a passagem da
Idade Média ao Renascimento, com tudo o que isto implicava de
reajustamento dos princípios tradicionais às novas condições históricas e
cíclicas. Como já sabemos, uma das organizações que na Idade Média
detinha o conhecimento iniciático e esotérico era a Ordem da Templo, que
além disso mantinha relações doutrinais com análogas organizações do
esoterismo islâmico, o que propiciava o vínculo espiritual entre o Ocidente e
Oriente. O cruento desaparecimento dos templários nos inícios do século
XIV, concretamente em 1314, produziu uma eventual ruptura desse vínculo,
com o que se supunha a perda para o Ocidente de uma parte essencial de sua
própria sabedoria tradicional, pois na verdade o Oriente não designa senão a
região simbólica onde reside o Centro Supremo e primordial, a fonte de todo
conhecimento metafísico e espiritual. Neste sentido, as “viagens” que
efetuou Christian Rosenkreutz por diversos países do Oriente (no transcurso
dos quais “recebeu os segredos da magia e da cabala”) tinham como objetivo
o de voltar a restabelecer o laço que se quebrara, com o fim de que o
Ocidente mantivesse a regular comunicação com o Centro Supremo. Ao
voltar para a Europa, Christian Rosenkreutz funda a “Fraternidade da Rosa-
Cruz”, de conteúdo hermético-cristão que, ao contrário de seus antecessores
templários, não conservava uma organização de tipo exterior, mas sempre
permaneceu no mais completo anonimato, passando a atuar de um plano
estritamente espiritual e invisível; por este motivo, então, a denominação de
“Colégio Invisível”.

Assim, pois, podem-se compreender quais foram na realidade os


“inspiradores” de virtualmente todos os movimentos esotéricos que
apareceram no Renascimento, movimentos cujo caráter hermético-cristão
não deixa nenhuma dúvida. O fato de que os manifestos Rosacruzes se
fizessem públicos em princípios do século XVII, indicava que tinha chegado
o momento de passar a uma ação muito mais direta, já que as condições
adversas que naquela época existiam no Ocidente assim o requeriam. Desta
maneira, motivados por ditos manifestos, uma série de adeptos herméticos se
agruparam para criar o movimento rosacruciano, que devia ser como uma
espécie de braço exterior, mas sem relação aparente, com o “Colégio
Invisível da Rosa-Cruz”. Esse movimento teve inclusive um alcance
político-religioso, pois também se tratava de organizar um Estado
semelhante ao que existia na cristandade medieval: o Sacro Império Romano
Germânico. Com segurança, os projetos de John Dee e dos reformistas
elisabetanos, para restabelecer uma monarquia cristã de alcance universal,
abonaram o caminho para acometer semelhante empresa, à frente da qual se
encontrava o príncipe renano Frederico V do Palatinado. Este pequeno
principado no centro da Europa foi, durante a segunda década do século
XVII um autêntico “Estado Rosa-cruz”, aonde confluiriam quase todas as
correntes herméticas do último período do Renascimento. As universidades
de Heidelberg e Oppenheim converteram-se em centros de ensino
propagadores da filosofia oculta, gerando assim uma cultura que ficou
impressa em numerosas obras arquitetônicas, científicas, artísticas e
literárias. Nesse clima de extraordinária e fecunda criatividade em todos os
campos do saber, vemos o engenheiro e arquiteto Salomão de Caus, que
desenhou jardins e monumentos mágicos e simbólicos, tomando como
referência as leis da perspectiva, das proporções e harmonias do número, da
geometria e da música. Encontramos deste modo os editores Teodoro de Bry
e Mateo Merian, que imprimiram e realizaram os emblemas e gravuras de
“As Bodas Químicas de Christian Rosenkreutz”, de Valentín Andreae; os
vários volumes da “Historia Metafísica do Macrocosmo e do Microcosmo”,
de Fludd, e “Atalanta Fugitiva” de Maier, para citar apenas alguns.

Recordemos também as gravuras alquímico-cabalísticas de Khunrath em sua


obra “Anfiteatro da Eterna Sabedoria”, e especialmente a que leva por título
“A Cova dos Iluminados”, onde se conservavam os tesouros da filosofia
rosa-cruz, herdeira do pensamento de Ficino, Pico de la Mirandola,
Reuchlin, Agripa, Giorgi, Postel, Paracelso e Dee, principalmente, embora
por razões de brevidade omitamos outros numerosos adeptos da Arte e da
Ciência Hermética. Digamos que a utilização da técnica da gravura, para
apresentar visualmente as idéias contidas nos livros herméticos, supunha não
só uma forma de embelezá-los esteticamente, mas também brindar uma
seqüência de imagens ordenadas que facilitassem o despertar da intuição
intelectual (espiritual) do leitor, quer dizer, que desempenhavam uma função
didática apta para veicular o Conhecimento. O desaparecimento do
movimento rosacruciano trouxe como conseqüência uma concepção cada
vez mais racionalista do saber científico, que desembocaria de modo
irreversível na solidificação positivista do século XIX, que supôs um limite
no descenso da degradação cíclica, dando passagem assim a esta nossa época
de completo caos e dissolução em todas as ordens da existência.
98 OS CICLOS II
Como já sabemos, a precessão dos equinócios (25.920 anos) é o número
cíclico fundamental, pois, a partir dele e de suas subdivisões, organizam-se e
se estruturam os diferentes períodos da humanidade (ver Módulo II, títulos
N.º 54 e N.º 105). A principal dessas subdivisões é justamente a metade da
precessão, quer dizer, 12.960 anos (13.000 em números redondos), módulo
de tempo que era conhecido por todos os povos da Antigüidade, alguns dos
quais, como os caldeus e os gregos, deram-lhe o nome de “grande ano”,
dando a entender assim que se trata de um ciclo completo em si mesmo.

Na tradição hindu, cinco desses “grandes anos” constituem também o


Manvántara (5 x 12.960 = 64.800), o qual acrescenta uma nova perspectiva
a nossos estudos sobre os ciclos, pois até agora tão somente tínhamos
considerado sua divisão quaternária em correspondência com as quatro
idades da humanidade. Se estas últimas assinalam as etapas do descenso
cíclico, que se acompanha por um encurtamento na duração de cada idade, a
divisão em cinco “grandes anos” de igual duração estaria em
correspondência com os períodos de tempo que dentro do Manvántara
transcorrem entre dois cataclismos geológicos, que sempre provocaram
mudanças consideráveis na geografia do planeta, sujeito indevidamente ao
ritmo marcado pela sucessão dos grandes ciclos cósmicos.

O Dilúvio bíblico se refere em realidade a um desses cataclismos, que entre


outras conseqüências, provocou o desaparecimento do continente atlante (a
Atlântida, a mítica “ilha do Ocidente”) e a civilização que se desenvolveu
dentro dele, civilização em que existiu um centro espiritual diretamente
emanado da Tradição Primordial. Esse cataclismo representou o passado do
quarto “grande ano” ao quinto, ao final do qual nos encontramos atualmente,
coincidindo portanto com o fim do Manvántara. Numerosas tradições
guardaram a memória dessa civilização, muitas das quais se consideraram
suas herdeiras, como é o caso da Tradição Hermética e de todas aquelas que
com o passar do último “grande ano” habitaram a costa oeste da Europa, a
bacia do Mediterrâneo e Oriente Médio, e é obvio as culturas da América
pré-colombiana. Recordemos que o mesmo Platão fala da Atlântida em dois
de seus “Diálogos”: Timeu e Crítias.

Se tivermos em conta que esse cataclismo, segundo os dados tradicionais,


teve lugar ao redor do ano 11.000 A. C., o anterior ocorreu em torno do ano
24.000 A. C., marcando assim o passado do terceiro “grande ano” ao quarto.
Diz-se que dito cataclismo provocou o deslocamento de um grande
continente (que recebeu o nome da Gondwana) situado nas regiões mais
meridionais da Terra. É bastante provável que a civilização que floresceu em
dito continente tivesse como descendentes a todas aquelas tradições que se
desenvolveram principalmente na África e Austrália.

Por volta do ano 37.000 A. C. temos a passagem do segundo “grande ano”


ao terceiro, marcado por um cataclismo que afetou, sobretudo, os povos que
habitavam outro grande continente localizado nas regiões extremo-orientais,
cujos restos formariam todas essas milhares de ilhas dispersas hoje em dia
pelo sudeste asiático e grande parte do Pacífico. E quanto à passagem do
primeiro “grande ano” ao segundo, pouco se sabe do cataclismo que a
marcou, embora sua data, 50.000 A. C., coincida com a que a ciência
moderna atribui à primeira glaciação, quando as regiões hiperbóreas, que até
então gozavam de uma “eterna primavera”, cobriram-se de gelo. É
interessante destacar que na sucessão das quatro idades da humanidade, os
dois primeiros “grandes anos” (de 63.000 a 37.000 A. C.) pertencem
inteiramente à Idade de Ouro que, como sabemos, cobre um ciclo completo
da precessão dos equinócios (2 x 12.920 = 25.920 anos), indicando-nos que
dentro dessa Idade há que se distinguirem também dois períodos distintos,
embora para aquela humanidade primitiva tão somente existisse uma só e
única Tradição.

99 AGARTHA
Ao longo deste Programa, referimo-nos muitas vezes a Agartha sob
diferentes formas, e acreditamos oportuno efetuar algumas elucidações sobre
este país invisível, sobre este território não localizável de maneira espacial –
mas que existe efetivamente no invisível e que todo ser humano pode
encontrar em seu interior mediante um processo ordenado e gradual– de que
este manual de introdução aos símbolos e à doutrina tradicional tomou seu
nome. René Guénon, o esoterista mais importante do século XX, referindo-
se à Agartha, disse:

“Falamos antes de alusões feitas por todas as tradições a alguma coisa que
está perdida ou oculta, e que se representa sob diversos símbolos; isto,
quando se toma em seu sentido geral –o que concerne a todo o conjunto da
humanidade terrestre– se relaciona precisamente com as condições do Kali-
Yuga. O período atual é, portanto, um período de obscurecimento e de
confusão; suas condições são tais que, enquanto persistam, o conhecimento
iniciático deve necessariamente permanecer oculto; de onde o caráter dos
“Mistérios” da Antigüidade chamada “histórica” (que nem sequer se remonta
até o princípio deste período) e das organizações que dão uma iniciação
efetiva onde ainda subsiste uma verdadeira organização tradicional, mas da
que não oferecem mais que a sombra quando o espírito desta doutrina deixou
que vivificar os símbolos, que não são mais que a representação exterior; e
isto porque, por diversas razões, todo vínculo consciente com o centro
espiritual do mundo terminou por romper-se, o que é o sentido mais
particular da perda da tradição, que concerne especialmente a tal ou qual
centro secundário, que deixa de estar em relação direta e efetiva com o
centro supremo”.

“Deve-se falar, então, como já o dizíamos precedentemente, de algo que está


mais oculto que verdadeiramente perdido, pois não está perdido para todos, e
alguns o possuem ainda integralmente; e, se for assim, outros têm sempre a
possibilidade de voltar a encontrá-lo, contanto que o busquem como
convém, quer dizer, que sua intenção esteja dirigida de tal modo que, pelas
vibrações harmônicas que desperta segundo a lei das “ações e reações
concordantes”, possa pô-los em comunicação espiritual efetiva com o centro
supremo”.

E adiciona:
“Trata-se sempre de uma região que, como o paraíso terrestre, torna-se
inacessível para a humanidade ordinária, e que está situada fora do alcance
de todos os cataclismos que transtornam o mundo humano no final de certos
períodos cíclicos”.

Quanto à introdução que procura o Programa Agartha, relaciona-se


fundamentalmente com a Cosmogonia, como suporte imediato do Ser, e com
a Metafísica. Nesse sentido, assinalamos determinadas vias iniciáticas para
aqueles que tenham afinidade com elas como o islã, o judaísmo, o budismo
mahayana, o zen budismo, etc., em particular para os que necessitam
prementemente do rito exotérico comunitário, ou da emoção religiosa. Só
queremos advertir aos estudantes a respeito de certas seitas que existem em
todo mundo; mas acreditam que depois de ter seguido o Programa o leitor
estará capacitado para distinguir entre o joio e o trigo. Entretanto este
manual está dirigido para o ocidente, e se refere mais particularmente à
Tradição Hermética. Se alguma instituição iniciática moderna e internacional
poderia adotar o direito de representar essa Tradição, esta é a Maçonaria, que
até tendo perdido em geral o sentido dos mitos e dos ritos que ela conserva e
que ainda continuam vivos em algumas de suas lojas maçônicas, está
capacitada para transmitir o influxo espiritual que representa. E por certo que
está igualmente viva a Tradição Cristã, cujo esoterismo nos deu a maior
parte do pouco que temos e pela qual também podemos recuperar o muito
que tivemos. De todas maneiras, insistimos em que o estudante da Tradição
Hermética pode trabalhar sozinho; embora deste modo, sublinhamos que é
conveniente assimilar-se uma forma Tradicional, quando se adverte da grave
responsabilidade que se deposita sobre nossos débeis ombros, e
simultaneamente admitimos a inconveniência de alimentar nossos egos. Uma
sentença islâmica assegura que no começo de um ciclo ao aprendiz se lhe
exige pelo menos o conhecimento de nove das dez partes da totalidade, mas
que nos últimos tempos só com uma décima parte poderá ser salvo, o que
não deixa de ser reconfortante para nós, ignorantes atuais, e o que, além
disso, deve ficar em relação com o Evangelho cristão que afirma que, para o
fim deste ciclo, até os próprios meninos poderão ver e ser transfigurados na
luz eterna, o que constitui, sem dúvida nenhuma, uma imensa esperança
também para nossos filhos. Tomando devida nota de que este Programa é
muito mais para aqueles que estão desiludidos de suas ilusões que para
iludidos.

100 O ESOTERISMO CONTEMPORÂNEO


A presença da Tradição Hermética não se esgotaria com o desaparecimento
do movimento rosa-cruz em meados do século XVII, mas sua influência
seguiria sendo decisiva em todas aquelas correntes esotéricas e iniciáticas
que surgiriam ao longo dos séculos XVIII e XIX, como é o caso, por
exemplo, da Maçonaria moderna. Na verdade, a energia espiritual do Deus
que é Triplo em sua Sabedoria não deixou de se manifestar nunca no
Ocidente até nossos dias, embora tenha havido momentos em que, devido às
dificuldades do meio profano e dessacralizado, esse influxo tão somente
fecundasse o coração de uns poucos, os quais, entretanto, têm feito possível
a continuidade da transmissão da Ciência Sagrada, adaptando-a à
mentalidade de seus contemporâneos e às circunstâncias especiais deste final
de ciclo. Este é o caso de René Guénon (1886-1951), considerado, como já
se disse, o maior metafísico e esoterista do século XX, e cuja obra representa
a síntese mais completa da doutrina tradicional realizada em nosso tempo e
nesta parte do mundo, e que foi também decisiva para validar os estudos e as
investigações sobre os símbolos, considerados como os veículos do
Conhecimento, atuando neste sentido seu autor como um verdadeiro
hermetista, pois a revivificação dos símbolos, portadores das idéias da
Sabedoria Perene, foi sempre uma das funções mais importantes dos mestres
herméticos em todo tempo e lugar. Uma obra que em definitivo serviu, e
servirá, como guia intelectual a numerosos homens e mulheres que procuram
sua realização interior mediante o aprofundamento na Via Simbólica, que é
precisamente uma das formas que tomou hoje em dia o esoterismo
contemporâneo no Ocidente, e portanto a Tradição Hermética, ao
compreender todas aquelas disciplinas que fazem referência direta à
Cosmogonia e à Ontologia, ou seja, ao conhecimento do Ser e dos diferentes
planos de sua manifestação, cujo conjunto compreende a totalidade do que
antigamente se chamou os “Pequenos mistérios”. Mas estes, longe de
representarem a totalidade do Conhecimento, constituem tão somente um
suporte (mas, este sim, imprescindível) para aceder ao “Grandes Mistérios”,
quer dizer, à Metafísica, cujos princípios gerais foram também expostos por
Guénon, e que completariam, coroando-os, seus estudos sobre a Ciência
Sagrada.

Recordemos que a Metafísica se refere a tudo aquilo que está mais à frente
do edifício cósmico, e inclusive além de seu princípio criador, que não é
outro que o Ser, ocupando-se exclusivamente do conhecimento
transcendente do Não-Ser, por cima do qual tão somente se encontra a Não-
Dualidade ou Perfeição Infinita da Suprema Identidade. O Ser, a Unidade, é
o Não-Ser afirmado e, portanto, representa já uma primeira determinação,
que embora seja a mais primordial de todas, está ainda condicionada com
relação a aquelas outras possibilidades, verdadeiramente infinitas, que não se
manifestarão jamais por sua natureza inefável e incondicionada, e que
pertencem inteiramente ao Não-Ser, o qual, por conseqüência, contém tanto
o que será manifestado através do Ser como o que nunca se manifestará.
Assim, distinguir entre o Ser e o Não-Ser, entre Kether e En Sof, é essencial
para quem empreende o caminho da verdadeira Gnose, que sempre têm que
ter como referência permanente o supra-cósmico e as idéias e princípios
mais universais, embora os interessados estejam recém iniciando esse
caminho e ainda tenham que complementar suas primeiras transmutações
alquímicas. Ou talvez por isso mesmo é que devam ser advertidos e
conhecer essa diferença no começo, evitando assim posteriores confusões
que lhes impediriam de ultrapassar as condições que lhe prendem a seu
estado individual e contingente.

O mesmo podemos dizer da confusão entre metafísica e religião, que é outra


das questões que Guénon procurou sempre clarear, como também o tem
feito nosso Programa em várias oportunidades (ver, sobretudo, o Módulo II,
título N.º 99). Essa confusão é bastante comum hoje em dia, inclusive entre
alguns dos que se nutriram da obra do Guénon, à qual, por este motivo,
distorceram, quando não simplesmente manipularam e traíram. É necessário
distinguir nitidamente entre o metafísico e o ponto de vista religioso, entre
outras razões porque este se limita sempre ao mais exterior, considerando ao
elemento sentimental e devocional acima do verdadeiramente intelectual e
espiritual, com o que esse ponto de vista não contempla a idéia de uma
Cosmogonia, e em conseqüência a possibilidade da iniciação nos mistérios
da vida e do Ser, ante-sala dos grandes mistérios da Metafísica. Confundir o
metafísico com o religioso supõe a inversão total das relações hierárquicas
entre o exotérico e o esotérico e, mais ainda, entre o psíquico e o espiritual.

Neste sentido, e para concluir, eis aqui o que diz a respeito o próprio
Guénon: “A metafísica e a religião não estão, nem estarão jamais, no mesmo
plano; disso resulta, por outra parte, que uma doutrina puramente metafísica
e uma doutrina religiosa não podem competir nem entrar em conflito, posto
que seus domínios são claramente diferentes”. (Oriente e Ocidente, 2ª parte,
Cap. IV). E do mesmo modo: “Pretender que a iniciação pudesse ter nascido
da religião [...] é inverter todas as relações normais que resultam da natureza
própria das coisas; e o esoterismo é verdadeiramente, com respeito ao
exoterismo religioso, o que é o espírito em relação com o corpo, tanto é
assim que, quando uma religião perdeu todo ponto de contato com o
esoterismo, não fica nela mais que 'letra morta' e formalismo
incompreendido, porque o que a vivificava era a comunicação efetiva com o
centro espiritual do mundo, e esta somente pode ser estabelecida e mantida
conscientemente pelo esoterismo e pela presença de uma organização
iniciática verdadeira”. (Apreciações sobre a Iniciação, cap. XI).

101 FIM DE CICLO


A velocidade com a qual transcorrem os acontecimentos do mundo, e a
crescente sensação de instabilidade que se deriva de tudo isso, é uma das
características principais do fim de ciclo que estamos vivendo. O tempo está
a ponto de esgotar-se por sua própria aceleração, fazendo com que a
humanidade se encontre hoje em dia mais afastada que nunca de seu
Princípio. Neste sentido, poderia se dizer que o desenvolvimento cíclico e
temporário supõe um afastamento gradual e paulatino do pólo essencial da
manifestação, que é a Unidade primordial, e inversamente uma cada vez
mais progressiva queda no pólo substancial, ao qual pertence o reino da
quantidade e da multiplicidade. Em analogia com isto, dito afastamento
provocou também que o ser humano fosse perdendo, pouco a pouco,
consciência de suas realidades superiores, vendo-se exposto finalmente a
desenvolver aquilo que nele existe de mais inferior e superficial. Esta é a
tendência geral, aquela que marca o tom de nossa época terminal,
considerada como a fase mais escura da “Idade Sombria” (o Kali-Yuga ou
Idade de Ferro), e que por isso mesmo reveste um caráter anômalo e
invertido com respeito ao que foi a história da humanidade em épocas
anteriores, e não muito longínquas.

De uma ou outra maneira, quase todas as tradições mencionaram em suas


profecias e textos sagrados as características com que se revestirá o fim de
ciclo, e que se ajustam inclusive nos detalhes ao que estamos vivendo na
atualidade. Mas por cima dos horrores e tristezas que trazem os sinais deste
tempo, abre-se para todos os homens e mulheres de coração reto a esperança
de um mundo verdadeiramente novo, onde “já não haverá noite, nem se terá
necessidade de luz de tocha, nem de luz do sol”, pois a roda terá deixado de
girar e o tempo se absorveu na Realidade de seu centro imutável.

“Quando reinam o engano, a mentira, a inércia, o sonho, a maldade, a


consternação, a aflição, a confusão, o medo, a tristeza: isto se chama a Idade
Kali, que é tenebrosa”. Bhagavata Purana. Livro XIII.

“Na Idade Kali a riqueza, entre os homens, substituirá em muito a nobreza


de origem, a virtude, o mérito; o direito e a regra estarão determinados pela
força”. Ibid.

“... agora existe uma estirpe de ferro. Nunca durante o dia se verão livres de
fadigas e misérias nem deixarão de consumir-se durante a noite, e os deuses
lhe procurarão ásperas inquietações (...). O pai não se parecerá com os filhos
nem os filhos ao pai; o anfitrião não apreciará a seu hóspede, nem o amigo a
seu amigo, e não se quererá ao irmão como antes. Desprezarão a seus pais
apenas se façam velhos e lhes insultarão com duras palavras, cruelmente,
sem advertir a vigilância dos deuses (...). Nenhum reconhecimento haverá
para o que cumpra sua palavra nem para o justo e o honrado, mas sim terão
em mais consideração ao malfeitor e ao homem violento. A justiça estará na
força das mãos e não existirá pudor; o malvado tratará de prejudicar o varão
mais virtuoso com retorcidos discursos e, ademais, valer-se-á do juramento.
A inveja murmuradora, apreciadora do mal e repugnante, acompanhará a
todos os homens miseráveis”. Hesíodo, Os Trabalhos e os Dias, versos 174-
195.

“Cuidei que ninguém vos engane, porque virão muitos em meu nome e
dirão: ‘Eu sou o Messias', e enganarão a muitos. Ouvireis falar de guerras e
rumores de guerras, mas não vos turveis, porque é preciso que isto aconteça,
mas não é ainda o fim. Levantar-se-á nação contra nação e reino contra
reino, e haverá fome e terremotos em diversos lugares. Mas isto será o
começo das dores do parto (...) Então se escandalizarão muitos e uns aos
outros se farão traição e se aborrecerão; e se levantarão muitos falsos
profetas, e pelo excesso de maldade se esfriará a caridade de muitos, mas o
que perseverar até o fim, esse será salvo”. Mateus 24, 4-13.

102 ALQUIMIA: A REMINISCÊNCIA


A reminiscência é recordar a Origem e por isso penetrar no Eterno Presente.
Assim, a reminiscência atualiza o que sempre foi, ou seja, o que é (e o que
dá a vida) e o conhecimento de outra realidade multi-dimensional, e o
espaço em que ela se produz. É necessário advertir que nesse outro âmbito
se compreende –ainda que seja nebulosamente– a presença de uma ampla
cadeia de testificação, das origens, incluindo deuses, heróis ou personagens
incríveis que transmitiram estas energias que se recebem mediante operações
de alquimia, manifestam-se sempre pela dualidade de opostos solve-coagula,
dissolver e coagular, graças ao fogo do coração que preside toda a Obra e se
conjugam sempre no Presente, que outorga a autêntica maestria aos Adeptos
ao Conhecimento.

A anamnese, ou seja, a Recordação, adquire muitas instâncias que se


transformam em reminiscências. O déjà vu é uma delas, assim como a
recuperação da identidade que pressupõe o ingresso num plano diferente,
mercê a desvelar a Potência, superior à soma de todos os atos. A
Antigüidade, o país dos ancestrais, é agora. O que algumas civilizações
nomearam como o reino dos mortos é a matéria atual da Obra e indica que o
nigredo foi assimilado. Então, o Adepto deixa o luto e luze uma nova
vestimenta caracterizada pela perenidade, assim que se encontre embelezado
com uma serena alegria, ou consumido na agonia sacrifical do suicídio
reiterado, ou alternando ambas as situações.

Quem cruza o umbral guarda em silêncio o Segredo de algo que se revela


em sua consciência, mas que não se manifesta de modo ordinário. Bem-
vindos à Certeza e aos Grandes Mistérios.

Tudo isto já aconteceu. O fim do mundo já foi.

Fim do Módulo III


INTRODUÇÃO À CIÊNCIA SAGRADA
Programa Agartha
Federico González
e colaboradores

ÍNDICE DE FIGURAS

Frontispício: Alciato, Emblemas, Milão, c. 1522.


1. F. Gaffurius, Theorica Musicae. Milão 1492.
2. Hércules romano.
3. Cornelio Agrippa, De Occulta Philosophia.
4. Paulus Ricius, Portae Lucis. Milán 1516.
5. S. F. Fischer, Kurtzer... Den Fratribus Crucis Rosatae. 1618.
6. Casa de Lucrécio, Pompéia. De: Paolo Santarcangeli, El libro de los
laberintos (il. nº 23). Siruela, Madrid 1997.
7. Gaspar Schott, Technica curiosa..., 1664.
8. J. D. Mylius, Philosophia Reformata. Francfort 1622.
9. William Blake, 1794.
10. Cesare Ripa, Iconología. Roma 1593.
11. Robert Fludd, Philosophia sacra.... Francfort 1626.
12. Nativität Kalendrier. Nürnberg 1515.
13. Avienus, Arati Phœnomena. Veneza 1448.
14. Praetiosissimum Donum Dei, ed. s. XVII.
15. Michel Maier, Atalanta fugiens. Francfort 1617.
16. Detalhe do Mapamundi de Richard de Haldingham, s. XIII.
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