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Introdução

Entendida num sentido amplo, a justiça administrativa pode ser descrita como um
sistema de mecanismos e de formas ou processos destinados à resolução das
controvérsias nascidas de relações jurídicas administrativas.

Frequentemente, a justiça administrativa foi definida pela sua finalidade, como o


conjunto das garantias dos particulares contra as actuações ilegítimas da Administração
que ofendessem os seus direitos ou interesses. Contudo, essa identificação correspondia
à reacção contra a realidade oitocentista de uma administração centralizada, e decorria
de uma pré-compreensão liberal que considerava a protecção dos direitos dos
particulares como a finalidade exclusiva do princípio da legalidade administrativa.
Já não é possível no contexto de um estado social com administração descentralizada,
reduzir a justiça administrativa à garantia dos particulares. Verifica-se a existência de
litígios de que os particulares estão ausentes: os litígios que surgem nas relações entre
entes administrativos.
A instituição da justiça administrativa não se justifica integralmente em função da
defesa dos direitos dos cidadãos: a garantia da legalidade da administração também
serve a prossecução do interesse público, a qual constitui a finalidade própria da
actividade administrativa – essa parece ser até a concepção mais conforme aos
princípios fundamentais da A.P. tal como estão consagrados no art. 206º da CRP. Ao
definir o âmbito da justiça administrativa, a CRP opta por uma fórmula substancial, e
não finalística, referindo-se ao julgamento de todas as acções e recursos que tenham por
objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas (art. 212º/3
CRP).
A garantia das posições jurídicas subjectivas dos particulares constitui ainda o domínio
típico da justiça administrativa (art. 268º/4 e 5 CRP).

A justiça administrativa poderá apresentar-se como o conjunto institucional ordenado


normativamente à resolução de questões de direito administrativo, nascidas de relações
jurídico-administrativas, atribuídas por lei à ordem judicial administrativa, para serem
julgadas segundo um processo administrativo específico.

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Do contencioso administrativo à justiça administrativa: os
principais modelos históricos de justiça administrativa
Referir-nos-emos apenas aos modelos que têm sido adoptados no espaço euro-
continental ou latino-germânico: pressupõe-se um sistema de administração executiva
ou de acto administrativo, em que a lei regula primariamente em termos substanciais
toda a actividade administrativa e, em determinada medida, atribui à administração
autoridade para, dispondo em regra de um espaço próprio de avaliação, tomar decisões
unilaterais obrigatórias para os particulares, conformadoras da respectiva esfera jurídica,
dotadas de força executiva e susceptíveis de, salvo nulidade, adquirirem a estabilidade
de caso resolvido se não forem impugnadas dentro de certo prazo – isto é, um sistema
diferente do modelo inglês de administração judiciária.

A alternativa entre os modelos: objectivismo e subjectivismo

No contexto específico dos sistemas de administração executiva confrontam-se dois


modelos de J. A., um modelo objectivista e um modelo subjectivista.
A comparação baseia-se em dois critérios distintivos fundamentais: por um lado a
função do contenciosos – visa-se em primeira linha, a defesa da legalidade e do
interesse público? Ou a tutela dos direitos dos particulares? – e, por outro lado, no que
respeita à impugnação de decisões administrativas, o objecto do processo – é um
processo feito a actos, em que está em causa verificar a legitimidade do exercício do
poder administrativo? Ou julga-se a alegada lesão das posições jurídicas subjectivas do
administrado?

A opção actual por um modelo processual de justiça administrativa há-de referir-se ao


contexto resultante da evolução referida, visto que todos aceitam hoje:
 Que o processo administrativo é, na sua essência, um processo jurisdicional e
por isso, um litígio entre partes;
 Que a administração tem o dever de executar as sentenças dos tribunais;
 Que os modelos organizativos administrativistas estão ultrapassados – ninguém
defende que o poder de decisão em matéria de contencioso administrativo deva
caber em última instância a órgãos públicos.

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A evolução do sistema de justiça administrativa em
Portugal
A evolução do modelo processual de justiça administrativa

A primeira época vai desde 1832 até 1982/85 – todo este período corresponde à adopção
do modelo francês, em que o contencioso-regra se consubstancia no recurso de anulação
de actos administrativos, de base claramente objectivista. A jurisdição administrativa é
concebida como uma jurisdição limitada, quer numa dimensão substancial (restrição dos
meios de acesso), quer no plano processual (tutela reduzida dos particulares), quer numa
perspectiva funcional (poderes de controlo judicial diminuídos).
Quanto aos meios de acesso, valia o princípio da enumeração: o contencioso-regra era o
do recurso contra actos e havia ainda um contencioso “por atribuição”, que incluía
acções em matéria de responsabilidade civil e de contratos administrativos, quer era de
“plena jurisdição”. Se estivessem em causa direitos subjectivos dos cidadãos que não
pudessem ser tutelados pelos meios previstos, restaria a possibilidade, não havendo acto
administrativo, de recurso aos tribunais judiciais, que eram os tribunais comuns, com
competência residual.
Relativamente ao processo, os particulares defrontavam diversos obstáculos: por um
lado a desprotecção do particular resultava da posição dominante da autoridade
administrativa e por outro lado, o particular tinha de defrontar um formalismo excessivo
e desrazoável do recurso.
Do ponto de vista funcional, concebia-se a jurisdição administrativa com poderes
limitados, quer pela necessidade de decisão administrativa prévia, quer pela exclusão do
controlo judicial do uso de poderes discricionários.

Só com a revisão constitucional de 1982 e, induzida por esta, com a alteração da


legislação processual de 1984/85 (ETAF e LPTA) se passa verdadeiramente a uma
segunda fase, que podemos qualificar como transitória, em que se assiste a um
alargamento do âmbito do contencioso administrativo e a uma intensificação da
protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
A alteração do modelo exprime-se sobretudo na previsão de um novo meio de acesso à
justiça administrativa – a acção de reconhecimento de direitos ou interesses legalmente
protegidos – através da qual se consagra a necessidade de uma tutela jurisdicional
directa de posições jurídicas subjectivas dos cidadãos.

Só a revisão constitucional de 1989 começou a alterar de forma relevante o modelo de


justiça administrativa – uma fase em que se acaba por realizar uma reforma profunda do
modelo de justiça administrativa, aproximando-o do modelo alemão. Consagrava-se
assim, no entendimento da doutrina e da jurisprudência a garantia constitucional de
acesso à justiça administrativa como direito fundamental dos administrados a uma
protecção jurisdicional efectiva, direito que foi logo considerado pela doutrina como
análogo aos direitos, liberdades e garantias e, por isso, susceptível de aplicação imediata
(art. 17º e 18º CRP). Além disso, a revisão de 1989 institui a J. A. como jurisdição
comum em matéria de relações jurídicas administrativas (art. 214º e 211º CRP).

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Os tribunais administrativos passaram a ter, conforme a natureza dos processos, todos
os poderes normais de condenação e de injunção, devendo respeitar apenas a divisão de
poderes inerente à essência do sistema de administração executiva.
Verifica-se ainda a determinação expressa da possibilidade de o juiz condenar a
administração na prática de actos administrativos, se estes forem devidos, isto é,
vinculados, pelo menos, quanto ao na. A garantia foi ainda reforçada pelas alterações ao
art. 20º em cujos nº. 4 e 5 se consagram o direito a uma decisão num prazo razoável e o
direito a procedimentos céleres para defesa de direitos, liberdades e garantias pessoais.
Estas alterações constitucionais permitem-nos, pois, concluir que o sistema da J. A.
evoluiu no sentido do aperfeiçoamento das garantias das posições jurídicas substantivas
dos cidadãos e que o motor dessa evolução foi a norma constitucional.

O actual sistema de justiça administrativa

O quadro constitucional da JÁ
Apesar de a CRP pôr o acento tónico na garantia dos direitos e interesses legalmente
protegidos dos administrados tal não deve ser interpretado como imposição
constitucional de um modelo estritamente subjectivista de justiça administrativa. A CRP
quis estabelecer as garantias dos administrados mas não pretendeu impor um modelo
processual determinado. A concretização desse modelo compete ao legislador, que, no
uso da sua liberdade constitutiva, pode optar entre diversas fórmulas de instituição
constitutiva, desde que respeite o quadro constitucionalmente estabelecido.
Acresce que é a própria CRP que, ao consagrar o direito de acção popular para a defesa
de interesses colectivos, difusos ou comunitários, incluindo a defesa dos bens públicos,
impõe uma relativa objectivização do modelo.

A reforma do modelo legal


 Lei n.º 13/2002 – ETAF
 Lei n.º 15/2002 – CPTA -» entraram ambos em vigor em 1 de Janeiro de 2004.
Alguns dos aspectos mais relevantes da reforma, que altera o modelo projectado de JÁ
num sentido subjectivista, próximo do modelo alemão, embora com a manutenção ou
introdução de algumas notas claramente objectivistas:
 No que respeita ao âmbito da JÁ, atribui-se aos tribunais administrativos, nos
termos constitucionais, a competência para administrar a justiça nos litígios
emergentes das relações jurídicas administrativas (art. 1 e 4 ETAF).
 Consagra-se o princípio da tutela jurisdicional efectiva, incluindo a tutela
cautelar (art. 2º CPTA).
 Altera-se radicalmente a definição dos meios processuais principais, criando
duas formas processuais, a acção administrativa comum (art. 37º CPTA) e a
acção administrativa especial (art. 46º CPTA)
 Admite-se com grande amplitude a cumulação de pedidos, em função da mesma
relação jurídica da mesma matéria de facto ou de direito (art. 4º e 47º CPTA).
 Mantém-se um conceito muito vasto de legitimidade para a impugnação de actos
(art. 55º e 9º CPTA).
 Continua a reconhecer-se um papel processual relevante ao Ministério Público
para fiscalização da legalidade (art. 58º, 62º, 73º, 77º, 85º CPTA).
 Consagra-se o princípio da igualdade de armas entre o recorrente e a
administração no sentido da consagração de um verdadeiro “processo de partes”,
incluindo o pagamento de custas pela A.P. (art. 189º CPTA) e a possibilidade da

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sua condenação por litigância de má fé (art. 6º), além de se eliminarem as
restrições gerais à prova testemunhal.
 Alarga-se substancialmente a protecção cautelar dos administrados (art. 112º e
ss. CPTA).
 Regula-se o processo executivo no sentido do aperfeiçoamento das garantias dos
particulares e da legalidade reforçando a garantia da efectividade das decisões
judiciais (art. 157º CPTA).

Apreciação global do modelo


A reforma estabeleceu um modelo subjectivista, consagrando o processo administrativo
como um processo de partes e alargando os poderes de cognição e de decisão do juiz
perante a administração.
São, no entanto, visíveis os momentos objectivistas do regime, seja no que respeita à
legitimidade activa, seja quanto à previsão de litígios inter-administrativos,
inclusivamente entre órgãos da mesma pessoa colectiva, seja nos significativos poderes
que continuam a reconhecer-se ao Ministério público como auxiliar de justiça, em
defesa da legalidade, sobretudo no que respeita à impugnação de normas, seja ainda em
outros aspectos específicos, como o conhecimento oficioso pelo juiz das ilegalidades do
acto administrativo impugnado.

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O domínio substancial da justiça administrativa
O critério substancial de delimitação

A JÁ integra os processos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes de


relações jurídicas administrativas.
Esta noção de relação jurídica administrativa para efeitos de delimitação do âmbito
material da jurisdição administrativa, deve abranger a generalidade das relações
jurídicas externas ou intersubjectivas de carácter administrativo, seja as que se
estabeleçam entre os particulares e os entes administrativos, seja as que ocorram entre
sujeitos administrativos.
O conceito de relação jurídica administrativa pode, contudo ser tomado em diversos
sentidos:
 Sentido subjectivo – em termos de incluir qualquer relação jurídica em que
intervenha a administração, designadamente uma pessoa colectiva pública.
 Sentido objectivo – as relações jurídicas em que intervenham entes públicos,
mas desde que sejam reguladas pelo direito administrativo, a existência de um
estatuto especial do sujeito público, designadamente, a presença de elementos de
autoridade administrativa.

São relações jurídicas públicas aquelas em que um dos sujeitos, pelo menos, seja uma
entidade pública ou uma entidade particular no exercício de um poder público, actuando
com vista à realização de um interesse público legalmente definido.
Excluem-se, assim, em princípio, do âmbito substancial da JÁ as questões
administrativas de puro direito privado, isto é, as decorrentes da actividade de direito
privado da administração – quer seja a que corresponde ao mero exercício da sua
capacidade privada, quer se trate de actividades funcionalmente administrativas, quando
ou na medida em que se desenvolvam exclusivamente através de instrumentos jurídicos
privatísticos.
Poderá considerar-se substancialmente incluído na JÁ o conhecimento de certos
aspectos de direito público de uma actuação administrativa desenvolvida ao abrigo do
direito privado (por exemplo, no contencioso relativo à formação de contratos de direito
privado celebrados pela administração, quando ela siga um procedimento pré-contratual
de direito público.

Questões emergentes de actuações jurídicas privadas autorizadas ou licenciadas pela


administração – se a questão disser respeito à ilicitude da actuação privada em aspectos
que por lei pertençam ao âmbito próprio da autorização ou do juízo autorizativo da
administração, havendo decisão administrativa que permitiu tal actuação, só o tribunal
administrativo pode conhecer da legalidade da decisão, no contexto do respectivo meio
impugnatório. Todavia, podem existir questões de licitude da actuação privada
licenciada em aspectos que não decorram necessariamente da decisão administrativa,
caso em que a competência pertencerá à jurisdição comum.
Ficam igualmente fora do domínio próprio da justiça administrativa as questões
relativas à validade de actos praticados no exercício de outras funções estaduais,
estranhos à função administrativa, a função política, a função legislativa e a função
jurisdicional.

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Deve entender-se, a partir do art. 212º/3 da CRP, que as questões relativas a qualquer
actividade em matéria administrativa, mesmo que proveniente de entidades não
administrativas, integram substancialmente a JA, sem prejuízo de a lei as poder atribuir
a outra ordem judicial.

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A dimensão funcional da justiça administrativa
A JÁ não abrange todo e qualquer tipo de resolução de controvérsias emergentes das
relações jurídicas administrativas, referindo-se apenas àqueles processos que, visando
exclusivamente a solução de uma questão de direito, implicam o exercício da função
jurisdicional, isto é, aos litígios que se apresentem como questões jurídicas a solucionar,
através de um processo jurisdicional, por um tribunal.
Parte-se de uma caracterização substancial da função jurisdicional, exigindo-se a
intenção directa de resolução de uma questão de direito e a decisão por órgãos
independentes, indiferentes e inoficiosos, segundo um processo justo e através de actos
com autoridade de caso julgado.

As delimitações materiais negativas decorrentes da perspectiva funcional da JÁ

Como delimitação material negativa, a exclusão da JÁ das questões relativas a actos


internos da AP ou a litígios que relevam exclusivamente da organização ou das relações
administrativas internas.
A delimitação da JÁ pelo carácter jurisdicional da função exercida, leva a que não possa
hoje incluir a resolução de questões administrativas – quer se apresentem como questões
de mérito, quer mesmo como questões de legalidade ou de juricidade – quando esta se
realize através de meios administrativos de impugnação, seja no Âmbito do tradicional
autocontrolo, pró órgãos da administração activa, com base em petição, reclamação e
recurso hierárquico ou tutelar, seja no âmbito de um heterocontrolo, levado a cabo por
autoridades administrativas independentes.
A reclamação e os recursos administrativos permitem o exercício do direito dos
particulares de solicitarem a revisão de actos administrativos aos seus próprios autores e
podem ter como fundamento, salvo disposição em contrário, não só a ilegalidade, mas
também a inconveniência do acto impugnado.
Fica igualmente fora da JÁ a resolução de controvérsias relativas à actuação da AP por
meios políticos, na sequência do uso de instrumentos petitórios dos particulares
dirigidos ao Provedor de Justiça ou ao Parlamento.
Também não integrará a JÁ a resolução de questões administrativas através de
mecanismos, mais ou menos informais, de autocomposição de conflitos, através de
conciliação, de mediação ou de transacção, nos casos em que sejam admitidas no
âmbito de aplicação do direito administrativo. Nestes meios alternativos, a resolução de
conflitos administrativos baseia-se na vontade das partes, que são quem acaba por
decidir a controvérsia, ainda que haja a intervenção de um terceiro.

Deve considerar-se incluída na JÁ a resolução de litígios de direito administrativos por


verdadeiros tribunais arbitrais. Os tribunais arbitrais constituem, nos termos do art.
209º/2 CRP, categorias reconhecidas de tribunais, ainda que os juízes sejam cidadãos.
Os árbitro julgam em função de padrões normativos de juridicidade. Acresce ainda que
às respectivas decisões são reconhecidos o efeito de caso julgado e a força executiva
própria das sentenças judiciais.

Os limites funcionais da JÁ

Dentro do domínio material definido pelas relações jurídicas administrativas públicas, a


ordem judicial administrativa vai julgar os litígios entre os interessados dando-lhes uma
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solução de carácter jurisdicional. No entanto, essa actividade exercida pelos tribunais
administrativos sofre, em virtude da sua qualidade substantiva, limitações funcionais
específicas na medida em que se apresenta como uma actuação que envolve um juízo
sobre a legitimidade do exercício de um outro poder público: o poder administrativo
(executivo).

Limites relativos ao conteúdo da fiscalização


 Um dos limites resulta da própria distinção funcional entre autoria e fiscalização.
A função de decidir exige um conhecimento completo de todas as circunstâncias
relevantes da situação de facto e de direito, uma ponderação real entre as
alternativas e os respectivos efeitos e a escolha da solução que melhor realize o
interesse público que o agente, enquanto 1º intérprete e autor competente e
responsável pela decisão, tem a seu cargo. Para fiscalizar bem, a entidade de
controlo, enquanto 2º intérprete, sobretudo quando seja, como é o tribunal, um
órgão inoficioso e imparcial, apenas precisa de elaborar o paradigma normativo,
até onde este seja determinável na situação concreta, submeter a decisão sujeita
a controlo a testes de juridicidade considerados fundamentais, para detectar o
eventual incumprimento dos princípios que regulam a actividade decisória.
 Um outro limite decorre da autocontenção do juiz administrativo perante a
reserva de discricionariedade da administração, no quadro de uma divisão
equilibrada dos poderes. Neste tipo de sistemas, os tribunais administrativos
julgam em princípios, questões de legalidade ou de juridicidade relativas à
actuação administrativa. Não lhes compete administrar, pelo que da sua
jurisdição se excluem os poderes de decisão que englobem questões de mérito,
isto é, que impliquem a avaliação da oportunidade e da conveniência da
actividade administrativa segundo padrões ou regras de boa administração.

A necessidade de decisão administrativa prévia


Uma outra limitação funcional à JÁ residia no facto de o juiz administrativo por ser um
mero fiscal, só poder ser chamado a intervir em segunda instância em face do princípio
da decisão administrativa prévia ou da reserva administrativa da primeira decisão. O
princípio porém, nunca vigorou verdadeiramente no nosso ordenamento jurídico. É
certo que normalmente a AP pela natureza das suas funções tem e deve ter oportunidade
para se pronunciar sobre as pretensões dos particulares antes de estes suscitarem em
tribunal os litígios. Mas isso não pode significar que os administrados que necessitem
de protecção jurisdicional sejam obrigados a esperar ou a provocar actos administrativos
só para poderem defender os seus direitos perante a JÁ.

Os limites à plena jurisdição do tribunal administrativo


Antigamente, também se apresentava como um limite funcional da JÁ a diminuição dos
poderes de decisão do juiz quando estivesse em causa a prática ou a omissão de actos
administrativos de autoridade. Contudo, estas limitações funcionais há já algum tempo
que deixaram de ter esse alcance inibitório e foram completamente ultrapassadas na
recente reforma da JÁ.
Desde as alterações introduzidas no art. 268º CRP pelas revisões de 1989 de 1997, que
consagraram o direito dos administrados a uma tutela efectiva dos seus direitos e
interesses legalmente protegidos, não poderiam subsistir dúvidas sobre a plenitude da
jurisdição dos tribunais administrativos.
O princípio da divisão dos poderes não implica hoje uma proibição absoluta ou sequer
uma proibição-regra de o juiz condenar, dirigir injunções ou orientações, intimar,
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sancionar, proibir ou impor comportamentos à AP. O princípio implica tão só, o que é
muito diferente, uma proibição funcional de o juiz afectar a essência do sistema de
administração executiva: não pode ofender a autonomia do poder administrativo em
especial a sua força de caso decidido, que, passado o prazo de impugnação o torna,
quanto aos seus efeitos principais, judicialmente inimpugnável, mesmo que inválido,
desde que não seja nulo.

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O âmbito orgânico da JÁ: a jurisdição administrativa
Segundo um critério orgânico, a JÁ compreende exclusivamente a resolução das
questões de direito administrativo que sejam atribuídas à ordem judicial dos tribunais
administrativos.

O alcance da reserva constitucional da jurisdição administrativa

A primeira questão que se coloca é, pois a da interpretação do actual art. 212º/3 da CRP
para saber se aí se consagra uma reserva material absoluta de jurisdição atribuída aos
tribunais administrativos, no duplo sentido de que, por um lado, os tribunais
administrativos só poderão julgar questões de direito administrativos e de que, por outro
lado, só eles poderão julgar tais questões.
Quanto ao primeiro aspecto da questão, a jurisprudência do TC, formulada a propósito
dos tribunais militares, parecia apontar para uma reserva negativa ou de exclusão
aplicável aos tribunais não judiciais – estes tribunais seriam tribunais especiais, os
sentido de que apenas poderiam julgar as questões que lhe fossem constitucionalmente
atribuídas.
As tendências doutrinárias desenvolveram-se, no entanto, em sentido inverso,
admitindo-se generalizadamente a atribuição legal aos tribunais administrativos da
resolução de litígios referentes à actividade da administração, ainda que respeitassem a
relações ou incluíssem aspectos de direito privado.
Quanto ao segundo aspecto da questão, as opiniões da doutrina dividiram-se mais
claramente. Para alguns, resulta da CRP uma reserva, perante a qual o legislador não
pode atribuir a outros tribunais, designadamente aos tribunais judiciais, o julgamento de
litígios materialmente administrativos, só sendo legítimas, nesta matéria, as devoluções
de competências em matéria administrativa para outros tribunais que forem previstas ao
nível constitucional ou, excepcionalmente, em caso de estado de necessidade.
Outros autores propõem uma posição mitigada admitindo a remissão do legislador para
a jurisdição comum de questões emergentes de relações jurídicas administrativas,
designadamente quanto estejam em causa direitos fundamentais dos cidadãos.
A posição mais razoável, entretanto sufragada pelo STA pelo TConflitos e pelo TC,
parece ser, no entanto, a que não lê o referido preceito constitucional como um
imperativo estrito, contendo uma proibição absoluta, mas como uma regra definidora de
um modelo típico, susceptível de adaptações ou de desvios em casos especiais, desde
que não fique prejudicado o núcleo caracterizador do modelo.
O preceito constitucional, introduzido na revisão de 1989, explica-se historicamente na
sequência da intenção de consagrar a ordem judicial administrativa como uma
jurisdição própria, ordinária, e não como uma jurisdição especial ou excepcional em
face dos tribunais judicias que deixou de considerar os tribunais administrativos como
tribunais facultativos.
Em resumo, a interpretação mais razoável do preceito constitucional parece ser a de que
visa apenas consagrar os tribunais administrativos como os tribunais comuns em
matéria administrativa. Diga-se no entanto que ainda que se optasse pela existência de
uma reserva material absoluta da jurisdição administrativa, o critério orgânico de
delimitação da JÁ não perderia sentido, na medida em que a própria CRP atribui a
outros tribunais o julgamento de questões emergentes de relações jurídicas
administrativas:

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 Desde logo são atribuídas pela CRP à jurisdição constitucional determinadas
competências relativa a matéria administrativa, seja no que respeita a questões
eleitorais, seja sobretudo no que concerne à fiscalização abstracta da
constitucionalidade das normas administrativas.
 Também não cabe na JÁ a resolução de questões da legalidade financeira da
actuação administrativa, tal como decorrer das contas dos entes públicos.
 Por fim poderá também considerar-se constitucionalmente atribuído, ainda de
que forma global e indirecta, pelo art. 8º/3 o conjunto de questões de direito
administrativo que pertencem à jurisdição de tribunais internacionais.

A delimitação legal do âmbito da jurisdição administrativa

No plano legal a par de normas que visam concretizar o conteúdo da cláusula geral
estabelecida pela CRP, são de destacar, por um lado, os preceitos que implicam a
diminuição, por subtracção, do âmbito da jurisdição administrativa e em contrapartida,
outros que produzem a sua ampliação, por atribuição aos tribunais administrativos do
julgamento de questões que, em princípio não lhes caberia substancialmente conhecer.

O âmbito da jurisdição administrativa segundo o ETAF


O ETAF começa por reafirmar, no art. 1º, a cláusula geral estabelecida na CRP, que
define a competência dos tribunais administrativos de um ponto de vista substancial,
referindo-a aos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas. Entendeu
determinar a competência da jurisdição administrativa, através de enumerações, no art.
4º, não só dos litígios dela excluídos, nos nº 2 e 3, mas também dos objectos dos litígios
nela incluídos logo no nº 1.
Tal não significa, porém, que não subsistam problemas quanto a esse âmbito, seja
porque as enumerações são exemplificativas, seja porque, sendo impossível uma
identificação de todos os litígios ou até à sua classificação exaustiva, utilizam conceitos
que carecem de precisão, seja ainda porque não prejudicam necessariamente a
existência de legislação especial divergente.
Concluímos, pois que o ETAF traz uma ampliação, maior ou menor da jurisdição
administrativa em matéria de contratos e de responsabilidade civil extracontratual da
administração. Lembre-se no entanto, que estas alterações legislativas têm um mero
alcance processual: não significam que essas questões passem a ser inteiramente
regulados pelo direito administrativo, mas sim que os tribunais administrativos passam
a aplicar a título principal, normas de direito privado.

Há porém preceitos que têm o alcance de restringir o âmbito da jurisdição


administrativa, tal como resulta da cláusula geral do art. 1º. São preceitos subtractivos,
que retiram à jurisdição administrativa a competência para conhecer de certas questões
de direito administrativo – nº 2 c), nº3 b) e c), d); nº1 m).
A nova legislação, tendo em conta a discussão havida e as alterações feitas à proposta
governamental, terá pretendido confirmar a subtracção aos tribunais administrativos do
julgamento das contra-ordenações e dos litígios relativos à indemnização por
expropriação e requisição por utilidade pública no entanto, não o fez expressamente e,
por isso, suscita afinal dúvidas.

A relação intra-jurisdicional entre tribunais administrativos e fiscais


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Embora exista uma relativa unidade de jurisdição entre a justiça administrativa e a fiscal
estas são distinguíveis, de modo que o critério orgânico, associado a um critério
material, tem também relevo para excluir da JÁ, em sentido estrito, a resolução de
questões administrativas que caibam aos tribunais tributários. A lei comete aos tribunais
tributários a competência para a execução de actos administrativos que determinem o
pagamento de uma quantia certa.

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A organização da jurisdição administrativa
Os tribunais administrativos e fiscais constituem, desde 1989, por decisão
constitucional, uma categoria própria de tribunais, separada dos ditos tribunais judiciais
(art. 209º) formando uma hierarquia cujo órgão superior é o STA (art. 212º).
O ETAF de 2002 mantém, no entanto, a opção anterior de constituir, ao nível da
primeira instância, duas categorias distintas de tribunais – os tribunais administrativos
de círculo e os tribunais tributários -, sujeitas a diferentes secções dos tribunais centrais
administrativos (TCA) e do STA de modo que essas sub-ordens de tribunais são
relativamente autónomas, tendo apenas, no topo da hierarquia, como órgão comum, o
Plenário do STA.

A padronização do regime da organização dos tribunais administrativos

Na reforma de 2002 altera-se radicalmente o quadro:


 Os tribunais administrativos passam a ter alçada, fixada em função da alçada dos
tribunais judiciais (art. 6º ETAF) da qual depende, em princípio a
admissibilidade de recurso jurisdicional das sentenças (art. 142º CPTA).
 A regra é a do duplo grau de jurisdição, mas para além dos limites decorrentes
da alçada, admite-se embora excepcionalmente o triplo grau (art. 24º ETAF, 150º
CPTA).
 Reduzem-se drasticamente os casos em que o STA e sobretudo os TCA
funcionam como tribunais de 1ª instância (art. 24º, 37º, 44º ETAF) e conhecem
matéria de facto.
Para além disso, em tudo o que não esteja especialmente previsto, são subsidiariamente
aplicáveis aos tribunais administrativos as disposições relativas aos tribunais judiciais,
com as devidas adaptações (art. 7º ETAF).

Os tribunais administrativos

Os tribunais permanentes previstos na lei são:


 O STA, secção do contencioso administrativo que pode dividir-se por
subsecções: funciona em dois níveis – em formação de 3 juízes ou em pleno com
juiz relator.
 Os TCA – tribunal central do norte e o tribunal central do sul – secção do
contencioso administrativo têm respectivamente sede no porto e em Lisboa e
jurisdição nas respectivas regiões. (art. 35º ETAF)
 Os tribunais administrativos de círculo (TACs) – são tribunais locais que
funcionam com juiz singular ou em formação de três juízes, nas acções
administrativas especiais de valor superior à alçada (art. 31º CPTA e art. 40º
ETAF).
Os tribunais administrativos arbitrais, numa acepção restrita a tribunais arbitrais
voluntários, constituem-se ad hoc com base em compromissos arbitrais – ou em
cláusulas compromissórias inseridas em contratos – celebrados pelas partes em conflito.
Esta preferência actual pela arbitragem decorre, de um lado, da celeridade e da
flexibilidade do processo mas também da possibilidade de escolher os juízes-árbitros
em função da sua especialização (art. 181º CPTA).

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A repartição das competências entre os tribunais administrativos

Repartição da competência em razão da matéria


Aos TCAs é atribuída uma competência-regra, cabendo-lhes conhecer, em primeira
instância, de todos os processos do âmbito da jurisdição administrativa, com excepção
daqueles cuja competência esteja reservada aos tribunais superiores.
 No art. 24º ETAF o STA continua ou passa a ser o tribunal para conhecer de
alguns processos em primeiro grau de jurisdição.
 Os TCA conhecem, em primeiro grau de jurisdição, apenas das acções de
regresso por responsabilidade funcional propostas contra juízes administrativos
de círculo e tribunais tributários e magistrados do MP em exercício de funções
junto desses tribunais (art. 37º ETAF).
 Refira-se ainda a possibilidade de o STA, em Pleno da Secção, emitir pronúncia
vinculativa sobre o sentido em que devem ser resolvidas, por tribunais
administrativos de círculo, questões de direito novas, que suscitem dificuldades
sérias e se possam vir a colocar noutros litígios, no seguimento de reenvio
prejudicial determinado pelo presidente de um TAC.

O domínio específico dos tribunais arbitrais


A constituição de tribunais arbitrais continua a ser, em geral, possível no julgamento de
questões respeitantes a contratos ou de responsabilidade civil extracontratual de pessoas
colectivas públicas, mas o art. 180º CPTA trouxe algumas importantes alterações que
implicam a ampliação do âmbito material da jurisdição arbitral.
A arbitragem é ainda admissível nos casos previstos em lei especial.

Repartição da competência em razão da hierarquia


Embora com a limitação das alçadas, em função do valor do processo, está assegurado,
em princípio, o duplo grau de jurisdição – admitindo-se mesmo, em determinados casos,
o triplo – competindo a apreciação das sentenças proferidas pelo tribunal de primeira
instância a um tribunal superior ou, dentro do STA, a uma formação de julgamento
alargada relativamente à que decidiu em primeira instância.
 Os recursos das decisões de TACs são em regra conhecidos pela secção do
contencioso administrativo dos TCA, salvo nos casos em que haja recurso per
saltum para a secção de contencioso administrativo do STA (art. 37º ETAF –
151º CPTA – 24º ETAF).
 Os recursos dos acórdãos dos TCA proferidos em primeiro grau de jurisdição
são interpostos para a Secção do contencioso administrativo do STA (art. 24º
ETAF).
 Os recursos dos acórdãos proferidos em 1º grau de jurisdição pela secção do
contencioso administrativos do STA são conhecidos pelo pleno da secção (art.
25º ETAF).
 Quanto aos recursos das decisões dos tribunais arbitrais, estabelece hoje a lei
expressamente que os recursos admissíveis se hão-de fazer para os TCA, que
funcional como uma espécie de Relação administrativa, em paralelo com a
jurisdição civil.
Actualmente é ao pleno da secção do contencioso administrativo que compete conhecer
de quaisquer recursos para uniformização da jurisprudência, quando exista contradição
entre dois acórdãos do STA, entre dois acórdãos dos TCA ou entre um acórdão dos TCA
e um dos STA.
Repartição da competência em razão de território
15
As regras sobre distribuição da competência territorial transitaram do ETAF para o
CPTA, que continua a estabelecer como regra geral a da competência do tribunal da
residência habitual ou sede do autor ou da maioria dos autores do processo (art. 16º),
visando assim, em princípio, favorecer, em termos de razoabilidade e de comodidade, os
particulares, a quem cabe, na maior parte dos casos, a iniciativa processual.
São no entanto várias as excepções (art. 20º), nomeadamente em função da matéria,
processos relacionados com bens imóveis ou com factos geradores de responsabilidade
decorram junto do tribunal do lugar da situação do bem ou da ocorrência do acto.

Apreciação global do novo regime


A reforma da justiça administrativas se propôs conferir ao STA um estatuto mais
próximo do de um tribunal supremo com competências de tribunal de revista bem como
de uniformização da jurisprudência.
Contudo, o STA mantém o carácter de tribunal de 1ª instância relativamente às
actuações administrativas dos órgãos supremos do estado, incluindo os actos do
conselho de ministros e do primeiro-ministro, no pressuposto de serem causas de grande
alcance nacional ou de grande valor financeiro, que devam ser decididas por um tribunal
mais qualificado.

A resolução de conflitos de jurisdição e de competência

Conflitos de jurisdição (entre a ordem judicial administrativa e outras jurisdições)


A regra comum para atribuição do poder de resolução destes conflitos é a de um tribunal
especial, formado por membros dos tribunais em conflito. É isso que acontece com:
 Os conflitos de jurisdição entre tribunais administrativos e tribunais judiciais
que cabem ao tribunal de conflitos.
 Os conflitos de jurisdição entre o STA e o tribunal de contas que são resolvidos
pró um tribunal dos conflitos.
No entanto os conflitos de jurisdição entre tribunais administrativos de círculo e
tribunais tributários ou entre as secções de contencioso administrativo e de contencioso
tributário dos TCA e do STA são conhecidos pelo Plenário do STA (art. 29º ETAF).

Conflitos de competência (dentro da ordem judicial administrativa)


Contrariando o princípio segundo o qual os conflitos de competência são resolvidos
pelo tribunal de menor categoria superior aos tribunais em conflito, a lei atribui à secção
do contencioso administrativo do STA a resolução de todos os conflitos de competência
entre tribunais administrativos (art. 24º ETAF).

16
A garantia da tutela jurisdicional efectiva
O direito de acesso aos tribunais administrativos e o princípio da tutela
jurisdicional efectiva

O direito à protecção judicial


O art. 20º da CPR garante, em geral, aos cidadãos o direito de acesso ao direito e aos
tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, bem como os
direitos à informação e consulta jurídica e ao patrocínio judiciário. Este direito constitui
um direito-garantia dos cidadãos.
O núcleo essencial desta garantia é constituído pelo direito à protecção pela via judicial
que a par de dimensões prestacionais típicas de direitos sociais, possui dimensões
substanciais, que compõem o direito a uma decisão em prazo razoável e mediante
processo equitativo.
É ainda reforçado pelo art. 205º que determina a obrigatoriedade das sentenças para
todas as autoridades e a imposição de legislação que garanta a sua execução efectiva.
Suscita-se a questão de saber se o direito à protecção judicial, no contexto de uma
organização judicial em várias instâncias, implica um direito à reapreciação das
decisões judicias. A maioria da doutrina e da jurisprudência inclina-se para que, fora do
âmbito penal, a CRP não assegura um tal direito, a não ser porventura quando estejam
em causa decisões que afectem directamente direitos, liberdades e garantias.

O princípio da tutela jurisdicional efectiva em matéria administrativa


Encontra-se no art. 268º o princípio da tutela judicial efectiva dos cidadãos perante a
AP, o qual é reafirmado no art. 2º CPTA.
A tutela judicial efectiva tem de ser assegurada na sequência da determinação
constitucional, numa tripla dimensão: em primeira linha, quanto à disponibilidade de
acções ou meios principais adequados, mas também no plano cautelar e executivo,
quanto às providências indispensáveis para a garantia, respectivamente, da utilidade e
da efectividade das sentenças.
A tutela judicial efectiva em matéria administrativa não se refere apenas aos direitos dos
cidadãos mas se entende à protecção do interesse público e dos valores comunitários.

O princípio da plenidade dos poderes jurisdicionais


A tutela jurisdicional efectiva é garantida, num segundo momento, pela plena jurisdição
do tribunal que lhe permite tomas as decisões justas e adequadas à protecção dos
direitos dos particulares e assegurar a eficácia dessas decisões. A lei actual determina,
relativamente aos juízes:
 O reforço dos seus poderes de pronúncia no plano declarativo, a acrescer aos
poderes de anulação e de condenação nas acções tradicionais (art. 67º, 77º, 95º).
 O poder de adoptarem todo o tipo de providências cautelares que considerem
adequadas (art. 112º).
 O reforço dos poderes em sede de execução de sentenças (art. 157º)
 O poder de aplicação de sanções pecuniárias compulsórias.
 Os poderes de controlo da juridicidade de todas as actuações administrativas
(art. 71º, 95º, 179º).
 Poderes de substituição quando a prática e o conteúdo do acto sejam
estritamente vinculados ou haja uma decisão única possível no caso concreto,

17
embora apenas em sede de intimação para protecção de direitos, liberdades e
garantias e de execução de sentenças.

As formas de processo principal

O CPTA optou por estabelecer uma forma de processo comum e prever alguns
processos especiais, em referência aos quais agrupou as várias espécies de pedidos
susceptíveis de serem apresentados perante a jurisdição administrativa.

Processo comum
É o da acção administrativa comum, visto ser aplicável a todos os litígios cuja
apreciação se inscreva no Âmbito da jurisdição administrativa que, nem no CPTA nem
em legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial.
São reguladas pelo processo de declaração previsto no CPC.

Processos especiais
A acção administrativa especial, que engloba 3 tipos fundamentais de pedidos – a
impugnação de actos, a condenação à prática de acto legalmente devido, a impugnação
e a declaração de ilegalidade da omissão de normas pela CPTA (art. 46º e ss) e só
subsidiariamente pelo CPC.
Os processos urgentes abrangem dois tipos de impugnação urgentes – no âmbito do
contenciosos eleitoral e do pré-contratual – e outros dois de intimações – para prestação
de informações, consulta de processos ou passagem de certidões e para protecção de
direitos, liberdades e garantias – que o CPTA identifica e para os quais estabelece regras
próprias (art. 97º).
As acções administrativas avulsas são aquelas que não sejam reguladas no CPTA, mas
constituam ou venham a constituir objecto de regulação especial, em legislação avulsa.
 Um exemplo será o das acções para declaração de perda de mandato local.
 Outros exemplos são as intimações urbanísticas: a intimação judicial para a
prática de acto legalmente devido e a intimação judicial para emissão de alvará.

A acções administrativa comum e a acção administrativa especial


Apesar deste quadro complexo, verifica-se que a opção decisiva da lei é a que distingue,
ao lado da acção administrativa comum, a acção administrativa especial, concebida esta
para os litígios cujo objecto sejam pretensões emergentes da emissão ou da omissão de
actos administrativos ou de normas de direito administrativo,
O critério decisivo para a distinção entre os dois domínios de regime processual parece
ser o da existência ou não, de uma relação jurídica tendencialmente paritária entre as
partes – haverá um regime especial nos casos em que, na relação material controvertida,
se afirma a autoridade de uma das partes sobre a outra, em regra da AP sobre o
particular.
Na prática a grande maioria das acções administrativas venha a seguir a tramitação
processual da acção administrativa especial, que constitui o processo administrativo
específico, e não o da acção administrativa comum, à qual é aplicável o processo civil,
com escassas variações.

As acções populares
As chamadas acções populares não parecem ser concebidas pelo CPTA como tipos
especiais de acções, mas como espécies qualificadas relativas aos vários tipos de acções
– Lei 83/95.
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A acção popular local é uma espécie qualificada das impugnações de actos
administrativos, admissível apenas relativamente a esse pedido.
A acção popular social já pode tomar qualquer das formas e integrar qualquer dos
pedidos principais previstos no CPTA. Assim, poderão propor-se acções administrativas
especiais populares, acções administrativas comuns populares, com os diversos pedidos
designadamente, impugnações de actos ou documentos pré-contratuais e intimações
para prestação de informações. A acção popular social tanto pode ser proposta por
quaisquer cidadãos como por associações ou fundações defensoras de interesses, pelas
autarquias locais ou pelo MP.
A admissibilidade da acção não depende apenas da legitimidade, mas também do
interesse em agir próprio de cada figura.

A cumulação de pedidos

A cumulação de pedidos, que é admitida com a maior das aberturas representa uma real
transformação no sistema da justiça administrativa, visto que, superado os obstáculos da
diferença de competência ou de trâmite, permite ultrapassar, na maior parte dos casos,
as limitações e as consequência nefastas que podiam apontar-se à rigidez dos meios
processuais.
É a possibilidade de cumular pedidos, mesmo quando aos pedidos cumulados
correspondam diferentes formas de processo ou tribunais de hierarquia distinta (art. 5º)
que permite obter, por exemplo, juntamente com a anulação de um acto, não só a
condenação à prática do acto devido, mas também a reconstituição da situação
hipotética, a anulação de um contrato celebrado. Anteriormente era necessário utilizar
vários meios, em tempos sucessivos, com condições processuais diversas, pró vezes em
diferentes tribunais.
Acresce que a ideia da cumulação de pedidos não se manifesta apenas no momento
inicial da proposição da acção, também se prolonga ao longo da vida do processo,
admitindo-se a vários propósitos, a cumulação sucessiva, apesar de implicar a
modificação objectiva da instância.

O valor das causas administrativas

A toda a causa nos tribunais administrativos tem agora de ser atribuído um valor que
representa a utilidade económica imediata do pedido.
O valor dos processos releva para determinar a forma, mais ou menos solene, na
tramitação da acção administrativa comum, através da qual se formulam os pedidos
relativos a situações em que não há o exercício de poderes de autoridade.
Também é importante na acção administrativa especial, designadamente nos processos
relativos a actos administrativos, na medida em que, embora a forma seja única, serve
para determinar a formação de julgamento em primeira instância.
O valor do processo vai ser tomado em conta, em todos os casos, para efeitos da
admissibilidade de recurso da sentença final e para determinação do tipo de recurso (art.
31º CPTA).
Os processos que a lei considera de valor indeterminável não deixam de ser integrados
no sistema, sendo o seu valor tido como superior ao da alçada dos TCA (art. 34º)
Quando sejam cumulados na mesma acção vários pedidos, a determinação do valor da
causa é a quantia correspondente á soma dos valores de todos (art. 32º/7).

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A acção administrativa comum
Nos termos do art. 37º a forma de acção administrativa comum é, na pureza dos
conceitos, aplicável a todos os litígios sujeitos à jurisdição administrativa relativamente
aos quais não esteja expressamente estabelecida uma regulação especial, pelo CPTA ou
por legislação avulsa, designadamente uma acção administrativa especial ou um
processo urgente.

Objectos e tipos

Objecto
A delimitação terá de ser feita pela negativa: em geral constituirá, em regra, o meio
adequado de acesso à justiça administrativa, se não estiver em causa um litígio relativo
à prática ou à omissão de actos administrativos impugnáveis ou de normas (art. 38º).
Poderá ser utilizada em quaisquer outros processos administrativos – designadamente
processos relativos a relações jurídico-administrativas tendencialmente paritárias, seja
por a competência da administração não envolver poderes de autoridade, seja por esta
estar obrigada a um comportamento ou prestação, por força da lei ou de contrato, seja
por ser a administração a autora, seja por se tratar de litígios entre autoridades públicas
ou até entre particulares.

As acções de reconhecimento
São acções de simples apreciação. A verificação, para além da legitimidade, do interesse
processual (ou interesse em agir) é especialmente relevante nestas acções de simples
apreciação, pois que nelas predomina, em vez de uma necessidade de reacção, uma
necessidade de prevenção. Nos termos da lei (art. 39º) tal interesse implica a invocação
de uma utilidade ou vantagem imediata na declaração judicial pretendida, explicitando-
se algumas situações: a existência de uma situação de incerteza, de ilegítima afirmação
pela administração da existência de uma determinada situação jurídica ou do fundado
receio de uma conduta lesiva da AP, fundada numa avaliação incorrecta da situação
existente.

As acções impositivas e as acções inibitórias


Está em causa em geral o pedido de condenação à adopção ou abstenção de
comportamentos, que será dirigida em princípio, contra a AP, mas que também poderá
ser utilizada contra particulares.
Este pedido pressupõe a existência de actuações concretas no âmbito do direito público
que não constituam actos administrativos impugnáveis.
Especiais dúvidas suscita a permissão que constitui uma novidade no nosso regime
administrativo, de os particulares pedirem a condenação da AP à não emissão de um
acto administrativo, quando seja provável à emissão de um acto lesivo.
Este pedido de tutela preventiva pode interferir no exercício normal da função
administrativa terá de ser de utilização restrita, admissível apenas em função da
inadequação ou, quando muito, da impossibilidade ou da deficiência da tutela própria
dos particulares através da acção administrativa especial de impugnação perante o acto
que venha a ser praticado.
Nesta interpretação restritiva, a acção só deveria proceder se, nas circunstâncias do caso
concreto, a lei proibisse a prática de um acto com determinado conteúdo ou conferisse
ao particular o direito subjectivo à abstenção relativamente a uma determinada actuação
administrativa.
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As acções de restabelecimento
Dirigem-se necessariamente contra a AP e visam obter a condenação nas condutas
necessárias ao restabelecimento de direitos ou interesses violados por aquela.
Quando se trate da reconstrução da situação actual hipotética na sequência da anulação
de um acto administrativo, o pedido pode ser cumulado com o pedido impugnatório e
pode ser feito ainda em processo de execução (art. 47º/3).
Tais pedidos só serão autónomos quando o dever de restabelecimento resulte, não da
prática de um acto administrativo ilegal, mas de um outro tipo, de actuação contrária à
lei, designadamente de operações materiais, nas situações de via de facto.

As acções de prestação
A acção administrativa comum também pode ser utilizada para pedir a condenação da
AP no cumprimento de deveres de prestar que decorram directamente de normas
administrativas ou tenham sido constituídos por actos jurídicos, podendo ter por objecto
o pagamento de uma quantia, a entrega de uma coisa ou a prestação de um facto.
Este pedido também pressupõe a existência de situações em que não esteja previsto,
nem tenha de haver um verdadeiro acto administrativo, mas simples actuações públicas
no contexto de relações jurídico-administrativas em que a lei, regulamento ou acto
administrativo anterior confiram directamente direitos a prestações administrativas a
determinados particulares.

As acções de reposição
Não se devem confundir com os pedidos típicos das tradicionais acções de
responsabilidade, nem com os das acções de restabelecimento de direitos ou interesses
violados – por não estarem em causa actuações ilícitas ou ilegais.
E, apesar de pressuporem uma obrigação de prestação, têm como características própria,
comum, a circunstância de a prestação necessitar de uma concretização judicial do
respectivo conteúdo, visto que a obrigação resulta da aplicação de princípios normativos
relativamente a uma determinada situação de facto.

As acções contra particulares


A possibilidade da utilização da acção administrativa comum por qualquer pessoa ou
entidade directamente lesada, para pedir a condenação à adopção ou abstenção de
comportamentos por particulares, nomeadamente concessionários, com fundamento na
violação ou fundado receio de violação de vínculos jurídicos administrativos, quando a
AP, solicitada a fazê-lo não tenha tomado as medidas adequadas.
Os vínculos jurídico administrativos podem derivar de normas, de actos administrativos
ou de contratos, o que faz com que o alcance do preceito se sobreponha parcialmente
com outros.
A forma de acção administrativa comum, justamente pelo facto de ser a forma comum, é
também aquela que deve ser utilizada, em geral, pelas entidades públicas, quando
peçam ao tribunal providências contra particulares, seja por falta de poderes de
autoridade designadamente no domínio contratual, seja por uma opção legítima pela via
judicial quando esteja em causa uma prestação incerta ou de conteúdo indeterminado e
que não possa ser adequadamente fixada por acto administrativo.

As acções inter-administrativas
As acções são aqui definidas em função das partes e podem reportar-se a quaisquer dos
pedidos referidos – de reconhecimento, de intimação ou inibição, de condenação no
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restabelecimento de situações ou em prestações, tal como podem ser acções sobre
contratos ou responsabilidade – só se incluem aqui, de acordo com a regra geral, as
acções que envolvam a prática ou a omissão de actos administrativos impugnáveis ou de
normas administrativas, para as quais se deve utilizar a acção administrativa especial.

As acções tradicionais

Os pedidos relativos a contratos


As acções sobre contratos podem ser utilizadas para resolução de quaisquer litígios
relativos aos contratos sujeitos à jurisdição administrativa, designadamente questões de
interpretação, de validade e de execução de contratos administrativos, bem como da
responsabilidade contratual daí emergente.
A legitimidade para deduzir pedidos relativos à invalidade de contratos pertence em
primeira linha às partes. A novidade está, no entanto, em que deixou de ser limitada às
partes, e é agora significativamente alargada, para assegurar a protecção de terceiros
(art. 40º/1).
Assim, admite-se desde logo, com grande largueza, a acção pública e a acção popular
para defesa da legalidade ou dos interesses comunitários.
A estas soma-se a legitimidade dos ex-candidatos preteridos ou mesmo candidatos
virtuais, embora só relativamente a certas invalidades, derivadas ou relacionadas com a
formação do contrato com a finalidade de assegurar, de forma efectiva, o respeito pela
regras e pelos princípios concursais.
Por fim, admite-se a legitimidade impugnatória dos terceiros susceptíveis de serem
lesados pela respectiva execução.
Caso a acção seja proposta por terceiro, a legitimidade passiva pode implicar o
litisconsórcio necessário entre as partes do contrato.
O estado poderá ser representado pelo MP (art. 11º/2) pelo menos quando se trate de
acções autónomas.
O prazo dos pedidos de anulação total ou parcial de contratos, quando estes forem
anuláveis é de seis meses (art. 41º/2) para lhes assegurar a estabilidade necessária.
O CPTA não permite que a acção sobre contratos possa ser utilizada quando se pretenda
impugnar um acto administrativo praticado em execução de um contrato: nestas
hipóteses, terá de lançar-se mão da acção administrativa especial.

Os pedidos relativos à responsabilidade civil


 Objecto
Estas são as acções administrativas comuns que têm por objecto as questões
sobre responsabilidade civil extracontratual por actos do estado e dos demais
entes públicos, mas também sobre a responsabilidade dos titulares dos seus
órgãos, funcionários e agentes e demais servidores públicos, bem como a dos
sujeitos privados a quem seja aplicável o regime específico da responsabilidade
dos entes públicos.
 Legitimidade
A legitimidade activa há-de caber a quem se arrogue um prejuízo efectivo
causado pela actividade ou omissão pública.
Na sequência do art. 52º/3 CRP, há-de admitir-se a legitimidade para
apresentação de pedidos de indemnização dos lesados no Âmbito da acção
popular, quando tenham sido ofendidos determinados valores comunitários.
Já a legitimidade passiva depende do pedido: pertence ao estado quando esteja
em causa o exercício da função legislativa ou jurisdicional; pertence às pessoas
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colectivas de direito público a que pertençam os órgãos administrativos, quando
esteja em causa a responsabilidade exclusiva delas; às pessoas colectivas e aos
titulares dos respectivos órgãos ou agentes, quando haja responsabilidade
solidária; aos titulares dos órgãos ou agentes ou sujeitos privados equiparados,
quando esteja em causa a responsabilidade própria destes, designadamente nas
acções de regresso
 Prazo
As acções podem ser propostas a todo o tempo, salvo determinação legal
especial em contrário.
No entanto, o particular pode decair na sua pretensão pelo disposto na lei
substantiva, isto é, por efeito da prescrição do respectivo direito de
indemnização, que segundo o artigo 498º CC, acontece no prazo de 3 anos a
contar do conhecimento pelo lesado desse seu direito.
Este prazo interromper-se-á quando haja impugnação do acto lesivo (art. 41º/3)
ou se verifiquem outras causas suspensivas ou interruptivas, nos termos gerais
da prescrição.
 Sentença
As questões são julgadas pelos TACs, mas também eventualmente por tribunais
arbitrais (art. 180º/1 b) CPTA), tendo a sentença positiva efeitos condenatórios.
Essa condenação será, em regra, no pagamento de uma indemnização
pecuniária, na impossibilidade da reintegração natural por prestação de facto.

Os tipos de acções, segundo as formas de tramitação

A tramitação da acção administrativa comum segue os termos do processo de declaração


do CPC (art. 35º/1 e 42º CPTA) sob as diversas formas (art. 43º):
 Acção ordinária, quando o valor da causa exceda o da alçada dos TCA;
 Acção sumária, quando o valor da causa não exceda essa alçada dos TCA;
 Acção sumaríssima, quando o valor da causa seja inferior à alçada do TAC e a
acção se destine ao cumprimento de obrigações pecuniárias, à indemnização por
danos ou à entrega de coisas móveis.
Quando haja cumulação destes pedidos com outros sujeitos à acção administrativa
especial, aplica-se o regime desta, com as adaptações necessárias, que o juiz
determinará com base nos seus poderes inquisitórios, segundo o princípio da adequação
formal.

A legitimidade e o prazo

Segundo o art. 9º a legitimidade activa pertence, em regra, a quem alegue ser parte na
relação material controvertida.
Um regime especial é aplicado à acção popular quando esteja em causa a defesa de
determinados bens e valores constitucionalmente protegidos qualquer pessoa, as
autarquias locais, as associações ou fundações defensoras desses interesses e o MP,
enquanto autor popular, têm legitimidade para propor processos principais, incluindo
naturalmente as acções comuns.
A acção pode, em regra, ser proposta a todo o tempo (art. 41º).

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A acção administrativa especial
Seguem a forma de acção administrativa especial os processos relativos a pretensões
emergentes da prática ou da omissão de actos administrativos ou de disposições
normativas de direito administrativo (art. 46º/1). Admite vários pedidos cada um deles
com aspectos específicos quando ao regime processual

A cumulação de pedidos
Admite-se a conexão com qualquer dos pedidos principais de quaisquer outros que com
eles apresentem uma relação material de conexão, designadamente o de condenação na
reparação dos danos resultantes da actuação ou omissão ilegal (art. 47º/1 -» art. 4º).
A não formulação destes pedidos cumulativos não preclude, porém, a possibilidade de
essas mesmas pretensões serem accionadas no âmbito do processo de execução da
sentença de anulação justamente porque tal processo não é um mero processo executivo.

Impugnação de actos administrativos

Objecto
A função da impugnação de actos administrativos é, nos termos mais amplos, a do
controlo da sua invalidade. A lei continua a prever a utilização deste meio para obter a
declaração de nulidade ou de inexistência de actos administrativos, embora seja
provável que o pedido continue a ser, em regra, dirigido a obter a anulação de tais actos.
As sentenças de provimento serão, conforme o caso, constitutivas (sentenças de
anulação) ou declarativas (declaração de nulidade ou da inexistência).
 Conceito de acto administrativo impugnável -» este conceito começa por
pressupor um conceito material de acto administrativo que se refere, nos termos
do CPA (art. 120º), às decisões materialmente administrativas de autoridade que
visem a produção de efeitos numa situação individual e concreta. Fica de fora os
puros actos instrumentais, as operações materiais e comportamentos.
No entanto o conceito processual de acto administrativo impugnável não
coincide com o conceito de acto administrativo, sendo, por um lado, mais vasto
e, por outro, mais restrito. É mais vasto na medida em que não depende da
tradicional qualidade administrativa do seu autor (art. 51º/2). É mais restrito, na
medida em que só abrange expressamente as decisões administrativas com
eficácia externa.
Incluem-se os actos destacáveis do procedimento. Mas excluem-se os actos
internos.
O problema está em saber se são impugnáveis as decisões administrativas
preliminares (pareceres vinculantes) que determinem peremptoriamente a
decisão final. Nestes casos, embora em rigor, os actos não visem directamente
produzir o efeito que pode ser lesivo, poderá sustentar-se e aceitar-se a
impugnabilidade dessas decisões, com expressão de uma defesa antecipada ou
precoce dos interessados.
 A impugnação de acto meramente confirmativo -» o conceito de acto
confirmativo, para além da sua coerência dogmática, foi elaborado sobretudo
com a finalidade prática de evitar que, através de requerimentos sucessivos, se
pudessem permanentemente reabrir litígios, defraudando a estabilidade inerente
ao prazo de impugnação dos actos administrativos (art. 53º).

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 Impugnação de acto administrativo ineficaz -» a lei permite (art. 54º) a
impugnação de actos ainda não eficazes em duas hipóteses: quando tenha havido
início de execução; quando esteja seguro ou muito provável que o acto vá
produzir os seus efeitos, designadamente quando exista um termo inicial ou uma
condição suspensiva de provável verificação.
 Impugnação de actos de indeferimento expresso -» os actos de indeferimento
expressão são verdadeiros actos administrativos e, como tal, susceptíveis de
impugnação na medida em que têm eficácia externa, mas o legislador, quando se
trate de actos de pura recusa, formal ou substancial, prefere que o particular
utilize o pedido de condenação da AP à prática do acto devido, no pressuposto
de que esse pedido confere uma tutela mais intensa ao particular e que resolverá
de uma vez a situação (art. 51º/4).
 A causa de pedir -» a questão principal a resolver no processo é em qualquer
caso, nos termos da lei, a da ilegalidade do acto impugnado e não
necessariamente a da lesão de um direito substantivo do particular, que pode
nem seque existir no caso. Segundo o art. 95º/2 o juiz tem de conhecer de todos
os vícios invocados no processo e, além disso, deve averiguar oficiosamente a
existência de ilegalidade do acto impugnado, em clara derrogação do princípio a
limitação do juiz pela causa de pedir – este último é um aspecto claramente
objectivista do modelo legal, sobretudo na medida em que se soma à faculdade,
que o MP mantém, de invocar vícios não arguidos pelo autor na sua petição.

Legitimidade
 Activa – art. 55º
 Passiva – uma das grandes novidades do CPTA é justamente a de que, mesmo
relativamente aos meios impugnatórios a parte do processo passa a ser a pessoa
colectiva pública ou, no caso do estado, o MP, se o acto for da autoria de um
órgão integrado numa estrutura ministerial (art. 10º/2). Só assim não acontecerá,
naturalmente, no caso de impugnação do acto administrativo por outro órgão da
mesma pessoa colectiva. Importante é também a imposição legal do
litisconsórcio passivo necessário, sempre que existam contra-interessados (art.
57º).

Efeitos e prazo
A impugnação de um acto administrativo não suspende, em regra, automaticamente a
eficácia do acto, que, se não for nulo, continua a produzir os seus efeitos e a obrigar os
respectivos destinatários, sendo inclusivamente, se for caso disso, susceptível de
execução coactiva pela AP.
A suspensão da eficácia como efeito automático da impugnação judicial só se verifica
nos casos excepcionais previstos na lei e, em geral, por força do art. 50º/2 CPTA.
Ao contrário do que acontece com o pedido de declaração da nulidade, que pode ser
apresentado a todo o tempo, a impugnação do acto anulável continua sujeita a um prazo
relativamente curto de impugnação.
Mantém-se o prazo de um ano para a impugnação de actos anuláveis pelo MP, contado
globalmente a partir da prática do acto ou da publicação, se obrigatória.
Já o prazo do particular e demais impugnantes é alargado para 3 meses e passa a
sujeitar-se ao regime dos prazos processuais de modo que, embora permaneça contínuo,
deixa de correr nas férias judiciais.
O prazo para os destinatários só começa a contar a partir da notificação, mesmo que o
acto dependa de publicação obrigatória (art. 59º).
25
O efeito da impugnação administrativa
A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação
judicial do acto, mas não impede o interessado de proceder a impugnação na pendência
daquela (art. 59º).
A impugnação administrativa facultativa não suspende a eficácia do acto, pelo que o
particular terá todo o interesse em pedir a suspensão administrativa da execução ou em
solicitar ao tribunal uma providência cautelar.
Tenha-se em atenção, por outro lado, que a lei determina a suspensão e não a
interrupção do prazo judicial, que, num entendimento rigoroso da disposição legal,
retomará o seu curso depois de proferida a decisão ou de decorrido o respectivo prazo.

Sentença
As sentenças de provimento, para além dos seus efeitos directos – constitutivos, na
anulação, ou meramente declarativos, na declaração de nulidade ou de inexistência –
geram ainda, em regra, por força da retroactividade dos seus efeitos, a obrigação para a
AP de reconstruir a situação de facto de acordo com o julgado.

Condenação à prática de acto devido

Objecto
O pedido serve para obter a condenação da entidade competente à prática, dentro de
determinado prazo, de um acto administrativo que tenha sido ilegalmente omitido ou
recusado (art. 66º).
Acto devido é, portanto, aquele acto administrativo que, na perspectiva do autor, deveria
ter sido emitido e não foi, quer tenha havido uma pura omissão ou uma recusa.
Não tem de ser um acto restritamente vinculado perante a lei podendo albergar
momentos discricionários
Além de a obrigação legal abranger também, obviamente, os casos em que a imposição
decorre de uma norma constitucional, internacional ou comunitária, ou de um princípio
jurídico aplicável, deve considerar-se que serão sempre legalmente, isto é, juridicamente
devidos os actos administrativos cuja imposição resulte da prática de actos anteriores.

As situações pressupostas
O art. 67º do CPTA parece exigir sempre um procedimento prévio, da iniciativa do
interessado, em regra, um requerimento dirigido ao órgão competente, com a pretensão
de obter a prática de um acto administrativo, seguido de uma destas situações:
 Omissão da prática do acto requerido no prazo legalmente estabelecido para a
decisão.
 Recusa da prática do acto devido, isto é, indeferimento expresso, total e directo,
da pretensão substantiva.
 Recusa de apreciação do requerimento – situações em que a autoridade
administrativa se nega a sequer apreciar substancialmente o pedido.
O CPTA acaba por acolher o pedido de condenação em outros dois tipos de situações: as
de inactividade oficiosa comprovada da AP perante valores comunitários relevantes ou
direitos dos particulares, bem como, embora em cumulação com o pedido impugnatório,
as de indeferimento parcial ou indirecto da pretensão.
A legitimidade activa
Quem tenha a titularidade de direitos ou interesses legalmente protegidos dirigidos à
emissão desse acto, e, quando se trate de deveres não oficiosos, o tenha requerido.
26
O MP enquanto titular da acção pública, quando se trate de um acto legalmente devido,
desde que esteja em causa a defesa de direitos fundamentais ou de um interesse público
especialmente relevante (art. 68º).

A legitimidade passiva
A lei determina que, além da entidade competente responsável pela omissão, são
obrigatoriamente demandados os contra-interessados, determinando, também aqui, um
litisconsórcio necessário (art. 68º/2).

O prazo
O prazo de propositura da acção depende de ter havido inércia do órgão ou um
indeferimento (art. 69º).
O prazo é de um ano, em caso de omissão, contado desde o termo do prazo legal
estabelecido para a emissão do acto.
Em caso de indeferimento, porém, o prazo da acção é de 3 meses.

Alteração da instância
Quando, na pendência do processo, haja ou seja notificado um acto de indeferimento
expresso ou seja praticado um acto que não satisfaça integralmente as pretensões do
interessado, este pode, respectivamente, ampliar a causa de pedir mantendo o pedido, ou
então cumular o pedido com o da anulação ou declaração de nulidade do acto
sobrevindo.

Sentença
A pronúncia do tribunal, em caso de procedência da acção será sempre condenatória
relativamente à pretensão material do interessado, mesmo nos casos em que tenha
havido omissão ou mera recusa de apreciação (art. 71º).
A sentença condenatória suscita novos e complexos problemas de separação dos
poderes na relação entre o juiz e a AP.
O CPTA fica-se pela formulação do limite ao determinar que, quando a emissão do acto
envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa o
juiz terá de limitar-se a uma condenação genérica, com as indicações vinculativas que
puder retirar das normas jurídicas aplicáveis, sem pôr em causa a autonomia da decisão
do órgão administrativo.
A condenação à prática de acto devido há-de resolver a questão de fundo levada a juízo
pelo autor e deve estabelecer o prazo em que deve ter lugar a pronúncia administrativa,
identificando o órgão competente para a realizar.
Quando o tribunal o entender justificado, pode determinar logo na sentença
condenatória a aplicação de sanções pecuniárias compulsórias ao titular do órgão em
falta, para prevenir o incumprimento (art. 66º/3).
Em caso de incumprimento, haverá lugar a um processo de execução de sentenças (art.
167º/6).

Acções relativas a normas

A partir da revisão de 1997, passou a ter consagração expressa na CRP (art. 268º/5) o
direito de impugnação judicial directa de normas administrativas com eficácia externa,
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quando sejam lesivas de direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares,
no âmbito da garantia da respectiva protecção judicial efectiva.

A impugnação de normas
 Objecto -» pode pedir-se nestes processos, a título principal, a declaração de
ilegalidade das normas emanadas ao abrigo de disposições de direito
administrativo, com fundamento em vícios próprios ou decorrentes da
invalidade de actos praticados no âmbito do procedimento de aprovação. Resulta
dos art. 72º e 73º que se admitem dois tipos de pedidos, sujeitos a regimes
diferentes: o pedidos de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral e
o pedido de declaração de ilegalidade.
 A legitimidade e as condições de impugnação -» a legitimidade para a
impugnação de normas pertence a qualquer pessoa que alegue ser prejudicado
pela aplicação da norma ou que possa previsivelmente vir a sê-lo em momento
próximo bem como ao MP e também, em certos termos, aos autores populares,
no âmbito dos valores comunitários referidos no art. 9º.
A declaração com força obrigatória geral só pode ser pedida pelos particulares
interessados depois de anorma ter sido desaplicada em três casos concretos,
requisito que, no entanto, não é exigido se o pedido for feito pelo MP
oficiosamente ou a requerimento das entidades legitimadas para acção popular,
A declaração de ilegalidade da norma com efeitos restritos ao caso concreto
pode ser pedida pelo lesado ou pelos titulares da acção popular quando a norma
produza os seus efeitos imediatamente sem depender de um acto administrativo
ou judicial de aplicação não sendo necessária a prévia desaplicação em três
casos (art. 73º/2).
 O prazo e a cumulação de pedidos -» nos termos do art. 74º a declaração de
ilegalidade pode ser pedida a todo o tempo (pelo menos enquanto a norma
estiver em vigor).
 Algumas características das acções relativas a normas -» estas acções têm um
valor indeterminável, considerando-se, por isso, de valor superior ao da alçada
dos TCA. São, por isso, sempre julgadas em primeira instância por uma
formação de 3 juízes cujas sentenças são susceptíveis se for caso disso, de
recurso per saltum ou de recuso excepcional de revista para o STA. Há a
possibilidade actual de suspensão cautelar da eficácia das normas.
 Os efeitos da declaração de ilegalidade -» (art. 76º) os efeitos da declaração de
ilegalidade com força obrigatória geral produzem-se, em regra, ex tunc,
determinando a repristinação das normas revogadas, sem prejuízo de o tribunal
poder determinar que os efeitos se produzam apenas para o futuro, quando tal se
justifique por razões de segurança jurídica, de equidade ou de interesse público
de excepcional relevo. Em todo o caso, ressalvam-se expressamente os casos
julgados e os casos decididos administrativos, salvo decisão em contrário do
tribunal em matéria sancionatória, quando tal seja mais favorável ao particular.
Quanto aos efeitos da declaração de ilegalidade no caso concreto, embora a lei
não se refira expressamente a eles, deve entender-se que operam ex tunc e
igualmente com alcance repristinatório, embora se produzam apenas naquele
caso.

A declaração de ilegalidade por omissão

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 Os pressupostos – prevê-se no art. 77º a verificação de uma omissão de normas,
cuja adopção, ao abrigo de disposições de direito administrativo, seja necessária
para dar exequibilidade a actos legislativos carentes de regulamentação.
 A legitimidade – admite-se a acção popular e pública, relativamente aos
interesses comunitários referidos no art. 9º, bem como a legitimidade de quem
alegue um prejuízo directamente resultante da situação de omissão.
 Os efeitos – o tribunal dá conhecimento à entidade competente, mas fixa um
prazo – que não pode ser inferior a seis meses – para a emanação da norma.

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Processos urgentes
Os processos urgentes principais (art. 97º e ss.) distinguem-se, quer dos processos
principais não urgentes, quer dos processos urgentes, quer dos processos urgentes não
principais (os processos cautelares).
A ideia de processos principais urgentes, caracterizados pela sua celeridade ou
prioridade, radica na convicção de que determinadas questões ou tipo de questões, em
função de determinadas circunstâncias próprias, devem ou têm de obter, quanto ao
respectivo mérito, uma resolução definitiva pela via judicial num tempo curto.
Estas questões não devem ou não podem demorar a decidir aquele tempo que possa ser
considerado normal para a generalidade dos processos, nem para elas se revela
suficiente ou adequada uma protecção cautelar que, através de medidas conservatórias
ou mesmo antecipatórias, regule provisoriamente a situação em termos de poder
assegurar a utilidade da sentença produzida em tempo normal.
Por isso, a lei configura, logo em abstracto, como processos urgentes determinados
processos principais, isto é, processos que visam a pronúncia de sentenças de mérito,
onde a cognição seja tendencialmente plena, mas com uma tramitação acelerada ou
simplificada, tendo em consideração a natureza dos direitos ou dos bens jurídicos
protegidos ou outras circunstâncias próprias das situações ou até das pessoas das
envolvidas.
O CPTA resolveu autonomizar quatro espécies de processos.
Nos termos do art. 36º a enumeração legal não implica o estabelecimento de um
numerus clausus que exclua a possibilidade de outros processos revestirem carácter
urgente.
Deve salientar-se que a possibilidade de antecipação da decisão de fundo através da
convolação do processo cautelar em processo principal, conferida pelos art. 121º, 132º/7
constitui uma abertura do sistema para a criação ad hoc de novos processos urgentes,
sempre que tal seja necessário e possível.

Impugnações urgentes

A designação legal de impugnações aponta para processos em que estará em causa, em


primeira linha, a verificação da legalidade de pronúncias da AP, mas tal não significa
necessariamente que as correspondentes sentenças se refiram apenas à invalidade dos
actos impugnados, isto é, que sejam, por definição, declarativas o constitutivas, pois
que, seguramente no caso dos processos eleitorais, mas também nos processos pré-
contratuais, pode pedir-se e obter-se a condenação directa da AP.

Contencioso eleitoral (art. 97º)


A autonomização deste meio, como meio urgente e principal, sempre se impôs para
assegurar a utilidade das sentenças e a protecção eficaz dos interessados, e a sua
importância reforça-se perante o contexto actual de uma participação democrática mais
intensa no âmbito a organização administrativa, designadamente nas áreas da
administração autónoma.

 Objecto
As eleições a que se referem estas impugnações são aquelas através das quais se
designam os titulares de órgãos administrativos electivos de pessoas colectivas
públicas.

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Os litígios a resolver por este meio não são apenas os relativos ao acto eleitoral
propriamente dito englobam ainda as questões do respectivo procedimento.
A lei, no entanto parece limitar a sindicabilidade dos actos pré-eleitorais,
admitindo apenas a impugnação autónoma daqueles que impliquem exclusão ou
omissão de eleitores nos cadernos eleitorais ou de elegíveis nas listas eleitorais
(art. 98º/3).

 A ilegitimidade e o prazo
A iniciativa do processo cabe em exclusivo aos eleitores e elegíveis, incluindo,
nos casos de omissão nos cadernos ou nas listas, as pessoas cuja inscrição foi
omitida (art. 98º/1).
Na falta de disposição especial, o prazo é de sete dias, a contar da possibilidade
do conhecimento do acto ou omissão.

 A urgência e a plena jurisdição


Este processo segue a tramitação da acção administrativa especial, com
especificidades, designadamente as decorrentes do seu carácter urgente (art.
99º).
A lei determina que este processo de plena jurisdição (art. 97º/2) pretende
significar que o processo não dirige meramente à anulação ou declaração de
nulidade dos actos impugnados e engloba a possibilidade de condenação
imediata das autoridades administrativas.

O contencioso pré-contratual
Entre as impugnações urgentes inclui-se a impugnação de actos administrativos
relativos à formação de quatro tipos de contratos: empreitada, concessão de obras
públicas, prestação de serviços e fornecimento de bens (art. 100º).
A previsão de um processo autónomo e urgente resulta da necessidade de assegurar
simultaneamente duas ordens de interesses, públicos e privados: por um lado, promover
neste domínio a transparência e a concorrência, através de uma protecção adequada e
em tempo útil aos interesses dos candidatos à celebração de contratos com as entidades
públicas; por outro lado, e sobretudo, garantir o início rápido da execução dos contratos
administrativos e a respectiva estabilidade depois de celebrados, dando protecção
adequada aos interesses públicos substanciais em causa e aos interesses dos
contratantes.

 Objecto
Este meio deve ser utilizado, desde logo, quando estejam em causa quaisquer
decisões administrativas relativas à formação dos referidos contratos.
Caso seja entretanto celebrado o contrato, o objecto do processo pode ser
ampliado à impugnação do próprio contrato.
Sobra, no entanto, a dúvida sobre se poderá, ou não, obter-se, neste processo, a
condenação à prática dos actos pré-contratuais devidos.
Quanto a nós, porém, nada obsta em termos substanciais a que seja pedida e
concedida a condenação, que, pelo contrário, se insere bem no espírito do direito
reformado.

 O prazo e demais pressupostos


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O prazo para a apresentação do pedido é agora de um mês a contar da
notificação dos interessados ou, não havendo lugar a notificação, do
conhecimento do acto (art. 101º).
Se, houver lugar a impugnações administrativas, como estas, serão, em regra,
facultativas, o prazo conta-se, nos termos gerais, a partir da decisão
administrativa sobre essa impugnação ou do termo do prazo legal respectivo (art.
59º).

 Tramitação e decisão
A tramitação segue a da acção administrativa especial, com algumas alterações,
entre as quais se destaca a possibilidade da concentração numa audiência pública
sobre a matéria de facto e de direito, com alegações orais e sentença imediata
(art. 102º e 103º).
Em caso de procedência, a sentença será, em regra anulatória, ou de declaração
da invalidade do acto ou documento contratual.

Intimações

Trata-se de processos urgentes de condenação, que visam imposição judicial, em regra


dirigida à AP, da adopção de comportamentos e também, designadamente no caso da
intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, para a prática de actos
administrativos.

A intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de


certidões
É o meio adequado para obter a satisfação de todas as pretensões informativas, quer
esteja em causa o direito à informação procedimental ou o direito de acesso aos
arquivos e registos administrativos (art.104º), incluindo o acesso aos ficheiros públicos
de dados pessoais (art. 60º/2).

 Legitimidade
A intimação pode ser pedida pelos titulares dos direitos de informação ou, na
hipótese de utilização para efeitos de impugnação judicial, por todos os que
tenham legitimidade para usar os meios impugnatórios, incluindo os autores
populares, bem como o MP, para o exercício da acção pública (art. 104º/2).
A legitimidade passiva parece caber, nos termos gerais, à pessoa colectiva ou ao
ministério a que pertence o órgão em falta (art. 10º/2). No entanto, não se pode
ignorar a referência do art. 107º à autoridade requerida, o requerente deverá,
sempre que possível, identificar o órgão responsável, para que o tribunal possa
directamente citá-lo e dirigir-lhe a intimação, sem dependência da organização
interna da pessoa colectiva ou do ministério.

 Pedido prévio e prazo


A utilização deste meio pressupõe o incumprimento pela AP do dever de
informar ou de notificar, valendo, por isso, a exigência do pedido anterior do
interessado como pressuposto processual.
O prazo é de vinte dias, a partir da verificação da não satisfação do pedido, a
partir da omissão, do indeferimento expresso ou do deferimento parcial (art.
105º).

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 Tramitação e decisão
A tramitação é simples, com a resposta da autoridade no prazo de dez dias e, em
regra, decisão imediata do juiz, dado que na maior parte dos casos não serão
necessárias outras diligências (art. 107º).
Em caso de provimento, a decisão é condenatória e o juiz deve fixar um prazo
até dez dias para o cumprimento da intimação, podendo determinar a aplicação
de sanções pecuniárias compulsórias, se não houver justificação aceitável para o
incumprimento, sem prejuízo da responsabilidade civil, disciplinar ou criminal
do órgão ou do titular (art. 108º).

A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias


Esta protecção acrescida justifica-se, na sua substância, pela especial ligação destes
direitos à dignidade da pessoa humana, e, na sua oportunidade, pela consciência do
perigo acrescido da respectiva lesão, que, nas sociedades actuais, decorre sobretudo de o
seu exercício depender, de modo cada vez mais intenso, de actuações administrativas
não apenas negativas, mas também positivas.
A utilização desta acção deve, no entanto, por isso mesmo, limitar-se às situações em
que esteja em causa directa e imediatamente o exercício do direito, liberdade ou
garantia.

 Os pressupostos
Pode utilizar-se este meio quando a emissão célere de uma decisão de mérito do
processo que imponha à AP uma conduta positiva ou negativa seja indispensável
para assegurar o exercício em tempo útil de um direito, liberdade ou garantia
(art. 109º). Exige-se: a urgência da decisão para evitar a lesão; o pedido tem de
se referir à imposição de uma conduta positiva ou negativa à AP; que não seja
possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar.

 A legitimidade e o pedido
A legitimidade para esta intimação pertence aos titulares dos direitos, liberdades
e garantias, enquanto posições jurídicas subjectivas, embora se possa admitir a
acção popular.
O conteúdo do pedido será a condenação na adopção de uma conduta positiva ou
negativa por parte da AP, que pode consistir mesmo na prática de um acto
administrativo (art. 109º/1 e 3).
O pedido de intimação pode ainda ser dirigido contra concessionários ou contra
quaisquer particulares, mesmo que não disponham de poderes públicos –
embora, obviamente, se deva estar perante uma relação jurídica administrativa.
Não haverá lugar nestes processos ao pagamento de custas.

 A tramitação e a sentença
A lei prevê vários andamentos possíveis para o processo: um, para processos
simples e de urgência norma (art. 110º/1 e 2), outros para processos complexos
de urgência normal (art. 110º/3), um terceiro para as situações de especial
urgência (art. 111º), sendo que nestas situações, o juiz pode optar por uma
tramitação acelerada, com encurtamento pelo juiz do prazo de resposta do
requerido, ou então por uma tramitação simplificada, realizando uma audiência
oral de julgamento, para decisão no prazo de 48 horas.
A sentença, quando não esteja substitutiva, determina o comportamento
concreto, o prazo e, se for caso disso, o próprio órgão administrativo responsável
33
pelo cumprimento, designadamente quando implique a prático de um acto
administrativo.

 A execução das sentenças


Aplicam-se a estas intimações as regras gerais de execução de sentenças
condenatórias, incluindo as relativas à responsabilidade civil, disciplinar e
criminal.

 Os recursos jurisdicionais
As decisões de improcedência de pedidos de intimação para protecção de
direitos, liberdades e garantias são sempre recorríveis, seja qual for o valor da
causa (art. 142º/3).
Por sua vez, o recurso das sentenças que tenham proferido a intimação, quando
seja admissível, tem sempre, por determinação da lei, efeito meramente
devolutivo, independentemente da ponderação dos danos que esses efeito possa
causar.

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Elementos essenciais da causa e pressupostos processuais

Elementos essenciais da causa

Para que exista um processo ou, como outros preferem dizer, uma relação jurídica
processual, é necessária desde logo, como é óbvio, a existência das partes, às quais se
poderá acrescentar, tendo em consideração o carácter triangular da relação processual, a
existência do tribunal, independentemente da competência, não havendo processo se a
petição for dirigida a um órgão não judicial – a estes elementos se pode chamar
condições de existência da acção.
Além destas condições de existência, poderão ainda considerar-se elementos essenciais
da causa aqueles que constituem condições de validade da acção: referimo-nos ao
pedido, à causa de pedir e, de algum modo, também ao objecto (mediato), cuja
inexistência torna o processo nulo.
A falta de algum destes elementos, em regra manifestada na ineptidão da petição inicial,
justifica a recusa pela secretaria do tribunal do recebimento da petição.
Já não se admite, porém, a recusa da petição pela secretaria com fundamento na falta de
formulação do pedido ou da causa de pedir, pelo nestas situações, o processo inicia-se e
a questão só vem a ser posta ao juiz e resolvida no momento do despacho saneador (art.
87º/1, 88º e 89º), juntamente com o conhecimento da não verificação dos pressupostos.

Os sujeitos ou partes processuais

São as pessoas ou entidades que requerem e aquelas contra a qual é requerida a


providência judiciária.
Ao lado das partes principais – ao lado do autor e do rei – podem surgir, como partes
acessórias, os assistentes, ou seja, as pessoas interessadas em que o litígio seja resolvido
a favor de uma das partes, havendo ainda a considerar a posição especial do MP.
Existem os cotnra-interessados que são aqueles que tenham interesse directo e pessoal
em que não se dê provimento à acção.
Os co-interessados – terceiros que tenham interesse em que dê provimento ao pedido do
autor – quando não assumam a posição de partes principais, em litisconsórcio activo ou
coligação, devem ser tratadas como assistentes.
O MP além de aparecer como parte principal, intervém no processo como magistrado
em defesa da legalidade e do interesse público, com um estatuto próprio de amicus
curiae, que poderá configurar-se como parte acessória especial.

As situações de pluralidade de partes


Há litisconsórcio quando todos os pedidos são formulados por todas as partes (activo)
ou contra todas as partes (passivo): há uma unicidade do pedido, tal como é unitária a
relação jurídica substancial em litígio.
Há coligação quando cada um dos pedidos seja formulado pró cada um dos autores
(activa) ou contra cada um dos réus (passiva): há uma pluralidade de pedidos, havendo
varas relações jurídicas em litígio, embora conexionadas entre si.
Haverá litisconsórcio necessário, nos termos gerais, quando a lei exigir a intervenção
dos vários interessados na relação jurídica ou quando tal intervenção seja necessária,
pela própria natureza da relação, para que a decisão a obter produza o seu efeito útil
normal (art. 28º CPC).

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A lei processual administrativa parece admitir hoje em termos genéricos, a intervenção
de terceiros, nos termos do processo civil, designadamente no âmbito da acção
administrativa comum.

O pedido

O pedido é a pretensão do autor deduzida em juízo, cujo conteúdo há-de relacionar-se


com o litígio emergente de uma relação administrativa.
Tendo em consideração os efeitos pretendidos, os pedidos podem ser, tal como as
respectivas sentenças de provimento, declarativos (simples apreciação ou
reconhecimento), condenatórios (ou intimidatórios) ou constitutivos (invalidatórios ou
suspensivos).
O CPTA admite com especial generosidade a cumulação de pedidos. A admissibilidade
da cumulação de pedidos depende de uma relação material de conexão entre eles,
avaliada nos termos estabelecidos no art. 4º/1.
Não obsta à cumulação a circunstância de os pedidos cumulados corresponderem a
diferentes formas de processo, nem a de serem competentes para os conhecer tribunais
diferentes, em razão da hierarquia ou do território, desde que todos os pedidos
pertençam ao âmbito próprio da jurisdição administrativa.

A causa do pedir

A causa de pedir no processo é constituída pelos factos concretos e pelas razões de


direito em que se baseia a pretensão e há-de ser adequada a fundamentar cada acção em
concreto, variando naturalmente em função dos pedidos.
Por nossa parte, tendemos a considerar que a invocação de vícios diversos implica a
existência de várias causas de pedir, que concorrem ou até se cumulam, designadamente
quando os efeitos da procedência são qualitativamente distintos, na medida em que há
causas de invalidade que impedem ou limitam a possibilidade de renovação do acto
anulado, e outras que não.

O objecto mediato (nas acções administrativas especiais impugnatórias)

Tradicionalmente, alude-se ao objecto do processo administrativo enquanto objecto


mediato da decisão, isto é, o ente cuja validade se discute e que irá sofrer os efeitos da
sentença anulatória ou declarativa da ilegalidade.

Pressupostos processuais

É de importância capital em qualquer processo determinar as condições em que os


tribunais são obrigados a apreciar o mérito de uma causa, precisamente porque, sendo
autoridades independentes a quem compete administrar a justiça, dirimindo os litígios
que lhes são apresentados, eles não podem abster-se de decidir.
Dizem-se pressupostos processuais os elementos de cuja verificação depende, num
determinado processo, o poder-dever do juiz se pronunciar sobre o fundo da causa, isto
é, de apreciar o mérito do pedido formulado e de sobre ele proferir uma decisão,
concedendo ou indeferindo a providência requerida.
A lei de processo administrativo prefere, a este propósito, enunciar, numa perspectiva
simetricamente oposta, os fundamentos que obstam ao prosseguimento do processo (art.

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89º) e tal como a lei processual civil, designa estes obstáculos ao conhecimento do
mérito da causa por excepções dilatórias (art. 88º CPTA, 493º, 494º CPC).
A sua falta implicaria, em rigor, uma decisão de rejeição da acção, abstendo-se o juiz
em qualquer momento, de conhecer do pedido.
A decisão de forma baseada na falta de um pressuposto processual é actualmente
tomada apenas no despacho saneador e determina a absolvição (do réu) da instância ou
a remessa do processo para outro tribunal.
Os pressupostos processuais devem distinguir-se de outras figuras próximas: das
condições de procedência – que se referem aos requisitos substanciais que sustentam o
pedido formulado na petição inicial; das questões prejudiciais – que são questões de
direito substantivo, normalmente da competência de outro tribunal, cuja resolução é
pressuposta na decisão da causa, mas que não impedem uma sentença de mérito.

Tipos

O poder legislativo goza de uma ampla liberdade de conformação, que inclui a


possibilidade de submeter o acesso aos tribunais ao preenchimento de determinados
pressupostos formais, que condicionam o exercício do direito.
Este poder legislativo está, contudo, sujeito a limites, não sendo admissíveis
pressupostos que dificultem o acesso aos tribunais de forma intolerável ou injustificada.
Os pressupostos processuais são os estabelecidos na lei processual administrativa, mas
também podem decorrer de normas processuais especiais ou do CPC, aplicável
subsidiariamente, nos termos do art. 1º CPTA.

O regime da falta de pressupostos processuais

Sem prejuízo do caso especial da incompetência, a consequência típica da falta de um


pressuposto processual é a absolvição da instância, que, no entanto, não obsta a que se
proponha nova acção com o mesmo objecto.
Contudo, relativamente à acção administrativa especial, a fim de evitar que os processos
terminem por decisões de mera forma, determina-se, na linha do regime estabelecido
para a recusa da petição pela secretaria, a correcção oficiosa da petição pelo juiz ou o
despacho de aperfeiçoamento destinado a permitir o suprimento ou a correcção pelo
autor das excepções dilatórias.

Pressupostos quanto ao tribunal

O único pressuposto processual relativo ao tribunal é o da sua competência


A competência absoluta e a competência relativa: a primeira refere-se ao âmbito da
jurisdição e existe sempre que a questão seja de competência de tribunais
administrativos nacionais; a segunda refere-se à competência dentro da jurisdição
administrativa e existe quando o tribunal em que foi proposta a acção é o tribunal
competente em razão da matéria, da hierarquia e do território.
No processo administrativo, diferentemente, do que acontece no processo civil, só a
incompetência absoluta produz os efeitos típicos da falta de um pressuposto processual,
isto é, a absolvição da instância, embora, mesmo nesse caso, o interessado tenha o
direito de requerer a remessa do processo tribunal competente no prazo de 30 dias.
Em caso de incompetência relativa, certamente porque estão em causa tribunais da
mesma espécie ou categoria, a falta de competência apenas determina a remessa
oficiosa do processo para o tribunal competente.
37
Também a preterição e tribunal arbitral, que existe quando se propõe uma acção
directamente num tribunal permanente, em violação de um compromisso ou de uma
cláusula compromissória que obrigava à intervenção do tribunal arbitral poderá ser vista
como uma forma de incompetência, já que o tribunal arbitral é um verdadeiro tribunal.
Quanto ao momento da determinação da competência, vale no processo administrativo
princípio da perpetuação do foro, nos termos do qual a competência se fixa no momento
da propositura da causa, sendo irrelevantes as modificações de facto ou de direito
posteriores.

Pressupostos quanto aos sujeitos

Personalidade judiciária
A personalidade judiciária é tradicionalmente definida como a susceptibilidade de ser
parte no processo e corresponde, em regra, à personalide jurídica.
Assim, actualmente, mesmo no âmbito das acções impugnatórias, são, em regra, sujeitos
processuais as pessoas colectivas públicas a que pertencem os órgãos autores dos actos
ou normas impugnados.
No entanto, há ainda a considerar a posição especial já referida do MP, enquanto parte
principal no âmbito da acção pública, bem como a circunstância específica no processo
administrativo de ser atribuída personalidade judiciária aos ministérios (art. 10º/2).

Capacidade judiciária
É a susceptibilidade de uma pessoa estar por si em juízo, um pressuposto cuja
autonomia relativamente à personalidade judiciária decorre, em regra, para os
particulares, da existência de restrições à capacidade de exercício de direitos.
No que respeita às entidades públicas, a capacidade judiciária é determinada pela
competência do órgão para representar a pessoa colectiva, designadamente no que
respeita ao poder de iniciativa processual.
Quanto ao estado-pessoa colectiva, a lei continua a prever a sua representação pelo MP
nas acções relativas a contratos e a responsabilidade.

O patrocínio judiciário
O princípio geral que vale no processo administrativo é o da obrigatoriedade de
constituição de advogado para o uso de poderes processuais (art. 11º).
É óbvio que a obrigatoriedade de patrocínio não se aplica à intervenção do MP, seja
quando represente o estado, seja em geral, no âmbito da acção publica ou da acção
popular.

A legitimidade das partes


A legitimidade activa, que implica a titularidade do direito (potestativo) de acção e a
legitimidade passiva, relativa à entidade contra quem se formula o pedido ou que seja
prejudicada pela sua procedência.
No processo administrativo, a lei define agora um conceito-regra de legitimidade activa
directa, considerando o autor como parte legítima quando alegue ser parte na relação
jurídica controvertida, isto é, em função da titularidade de um direito ou interesse
legalmente protegido.
A lei admite genericamente a acção popular social, isto é, a legitimidade de qualquer
cidadão, das autarquias locais, do MP, de associações ou fundações para,
independentemente de qualquer interesse pessoal, promoverem judicialmente a defesa
de determinados valores e bens constitucionalmente protegidos.
38
Além disso, ressalva expressamente o regime próprio da acção administrativa especial,
quando está em causa a prática ou a omissão de um acto administrativo impugnável ou
de uma norma dispensando até, na acção popular local, o interesse pessoal, bastando a
mera pertinência à respectiva comunidade.
De salientar ainda a legitimidade reconhecida a terceiros, por serem concorrentes no
concurso de formação de um contrato.
A legitimidade passiva caberá em princípio à parte que seja titular do dever na relação
material controvertida, em regra, uma pessoa colectiva pública, e também aos terceiros
cntra-interessados, enquanto prejudicados directos com a procedência do pedido.

A aceitação do acto
Trata-se de um pressuposto negativo e especial, nos termos do qual a aceitação de um
acto administrativo pelo particular interessado exclui a possibilidade de ele o impugnar
judicialmente.
A aceitação pode ser expressa ou tácita, resultando esta da prática, espontânea e sem
reserva, de facto incompatível com a vontade de recorrer.
Estamos perante uma aceitação voluntária do resultado.
Nessa medida, a aceitação do acto deve ser vista como um pressuposto processual
autónomo, distinto da ilegitimidade e da falta de interesse em agir.
A aceitação não se pode confundir com a perda dos requisitos de legitimidade e de
interesse em agir, pois que, se implicasse sempre uma ilegitimidade superveniente.

Pressupostos relativos ao processo

A existência e a admissibilidade da forma processual utilizada


Em consequência da diversidade das formas processuais exige-se que o autor utilize o
meio adequado para obter a protecção judicial que necessita, havendo lugar à absolvição
da instância em caso de impropriedade do meio escolhido.

A necessidade de tutela judicial


Normalmente designada por interesse processual ou interesse em agir, este pressuposto
exige a verificação objectiva de um interesse real e actual, isto é, da utilidade na
procedência do pedido e constitui um pressuposto comum, directamente decorrente da
ideia de economia processual.

A tempestividade
É um pressuposto típico dos processos que envolvam directa ou implicitamente a
impugnação de actos administrativos com fundamento na sua anulabilidade, mas vale
também noutras acções ou processos, sempre que a lei fixar um prazo para a respectiva
proposição.
A lei admite a impugnação para além do prazo de 3 meses, quando se demonstre que a
apresentação tempestiva da petição não era exigível a um cidadão normalmente
diligente em três situações (art. 58º/3).
O prazo de impugnação do particular constitui, pois, um prazo de caducidade especial,
susceptível de suspensão e de interrupção.
Pode acontecer que a acção seja intempestiva por ter sido proposta antes do início do
prazo legal de impugnação. Nesse caso, também poderá haver lugar a absolvição da
instância, mas, de acordo com o princípio do favorecimento do processo, só se
entretanto não se tiver iniciado esse prazo.

39
A interpelação administrativa prévia
A lei, por vezes, a fim de evitar intervenções desnecessárias dos tribunais, condiciona o
acesso aos tribunais a uma pronúncia administrativa prévia específica ou à oportunidade
de uma tal pronúncia.
A hipótese mais comentada diz respeito à tradicional imposição de uma impugnação
administrativa necessária relativamente a certos actos antes da proposição da respectiva
acção judicial, impugnatória ou condenatória.
Há de resto, no CPTA diversos outros casos em que aparece um pressuposto deste tipo:
art. 67º/1, art. 37º/3, art. 109º/2, art. 104º e 60º/2 e art. 162º e 164º.

A cumulação ilegal de pedidos, a litispendência e o caso julgado


Trata-se de pressupostos processuais negativos comuns.
A cumulação ilegal de pedidos resulta da não verificação dos requisitos da cumulação
de pedidos estabelecidos no art. 4º CPTA.
A litispendência e o caso julgado, que são de conhecimento oficioso, verificam-se
sempre que haja repetição de uma causa quanto aos seus elementos essenciais. Se uma
acção é proposta estando pendente perante tribunal nacional uma outra acção idêntica,
há litispendência; se a primeira causa já tiver sido decidida por sentença que não admita
recurso ordinário, verifica-se o caso julgado.

40
A tramitação dos processos administrativos
A tramitação da acção administrativa comum

A acção administrativa comum segue o processo de declaração do CPC, com algumas


poucas, especificidades.
Os momentos fundamentais da marcha do processo de declaração ordinário (art. 467º e
CPC) que é aplicável quando o valor da causa exceder a alçada dos TCA:
 Pagamento prévio da taxa de justiça inicial (art. 467º/3).
 Petição inicial do autor (art. 467º)
 Contestação do réu e contra-interessados (art. 486º.)
 Eventuais réplica e tréplica (art. 502º)
 Audiência preliminar e saneador (art. 508º a 512º-A)
 Instrução do processo (art. 513º a 645º)
 Discussão e julgamento da causa (art. 646º)
 Sentença (art. 658º).
O processo de declaração sumário está regulado nos artigos 783º e seguintes e o
processo de declaração sumaríssimo nos art. 793º e ss. do CPC.

As especificidades da acção administrativa comum em comparação com o processo


civil
No que respeita à formação de julgamento, a lei determina que só em processo ordinário
há lugar a julgamento por tribunal colectivo da matéria de facto, a requerimento de
qualquer das partes (art. 42º/2 CPTA).
Quando a acção deva ser julgada por tribunal singular, a sentença é sempre proferida
pelo juiz do processo, mesmo quando a matéria de facto tenha sido julgada por um
colectivo.
O CPTA admite excepcionalmente a modificação objectiva da instância.
Trata-se da possibilidade de o juiz, num processo dirigido contra a AP, quando se
verifique uma situação de impossibilidade absoluta ou de prejuízo excepcional para o
interesse público no cumprimento dos deveres a que deveria ser condenada a entidade
administrativa, julgar improcedente o pedido e convidar as partes a acordarem numa
indemnização e, na falta de acordo, a fixar tal indemnização, a pedido do autor.
Deve reconhecer-se, no entanto, que a faculdade aqui prevista apresenta algumas
ambiguidades: será um poder oficioso do juiz ou será necessária a invocação pela AP?
Como poderá o particular reagir, se não concordar com a decisão do tribunal?
A lei tem ainda o cuidado de prever expressamente a faculdade de o tribunal, nas
sentenças que imponham o cumprimento de deveres à AP, fixar um prazo para tal
cumprimento e, quando se justifique, determinar logo uma sanção pecuniária
compulsória destinada a prevenir o incumprimento.

A tramitação da acção administrativa especial

Fase dos articulados – iniciativa e primeiro contraditório

1. Petição inicial art. 78º e 79º


Da petição há-de constar, desde logo, os elementos essenciais da causa – a
identificação do tribunal, das partes, e se for caso disso, do acto impugnado, a

41
formulação do pedido e da causa de pedir – e, bem assim, outros dados, como o
valor da causa, a forma do processo e a indicação dos factos probatórios.
Na petição pode requerer-se a dispensa da produção de prova e de alegações (art.
78º/4).

2. Intervenção da secretaria (art. 80º)


A petição é examinada pela secretaria, que recusa o recebimento quando se
verifiquem os factos previstos no art. 80º.
Da recusa da petição pode haver recurso para o juiz, tendo em qualquer caso o
autor a possibilidade de apresentar no prazo de 10 dias nova petição, com a
mesma data de entrada da primeira petição.
É a secretaria que promove oficiosamente a citação da entidade demandada e
dos contra-interessados (art. 81º).
A citação dos contra-interessados pode ser feita através da publicação de
anúncio, quando sejam em número superior a 20 (art. 82º), tendo os interessados
o ónus de se constituírem como contra-interessados no prazo de 15 dias, findo o
qual começa a correr o prazo para a contestação.
No mesmo momento em que efectua as citações, a secretaria envia ao MP uma
cópia da petição e dos documentos, excepto na acção pública, quando o MP for
o autor (art. 85º).

3. Contestação da entidade administrativa e dos contra-interessados (art. 83º)


A entidade demandada, através dos serviços do órgão competente, deve enviar,
juntamente com a contestação ou dentro do respectivo prazo, o processo
administrativo (art. 84º). Na falta injustificada de envio, o juiz pode determinar a
aplicação de sanções pecuniárias compulsórias, sem prejuízo do apuramento de
responsabilidades.
As contestações devem ser notificadas ao autor, nos termos do art. 492º CPC tal
como devem ser notificadas ao MP, para que este possa exercer plenamente as
suas competências.

4. Intervenção do MP
O MP, tendo recebido cópia da petição, intervém se e quando entender, no prazo
limite de dez dias depois da junção aos autos do processo administrativo ou
(quando esta não tenha lugar) da apresentação das contestações (art. 85º).
Os seus poderes de intervenção, processuais e sobre o mérito, permitem-lhe
intervir apenas em defesa de determinados valores – dos direitos fundamentais,
de interesses públicos especialmente relevantes ou de valores comunitários que
lhe caiba defender como autor popular – cabendo-lhe:
 Em geral, pronunciar-se sobre o mérito da causa e solicitar a realização
de diligências instrutórias.
 Nos pedidos impugnatórios, apresentar novas causas de invalidade.
Note-se ainda que, nos processos impugnatórios, o MP pode suscitar quaisquer questões
que determinem a nulidade do acto ou da norma, independentemente dos valores ou
bens em causa.
Aqui termina a participação do MP no processo, que não é mais chamado a intervir –
uma limitação que nos parece excessiva, sobretudo tendo em conta os poderes de
substituição sucessiva que o MP detém nos processos de impugnação de actos.

5. Articulados supervenientes
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Na acção administrativa especial não há lugar a réplica ou tréplica, mas tal não
prejudica a possibilidade de, até à fase das alegações, haver dedução articulada,
por qualquer das partes, de factos supervenientes ou de conhecimento
superveniente comprovado (art. 86º).

Fase de saneamento, instrução e alegações


1. O despacho pré-saneador e o despacho saneador
Findo os articulados, o processo é conclusão ao juiz ou relator que, no
cumprimento do dever de suscitar e resolver as questões em que possam obstar
ao conhecimento do objecto do processo, deve verificar a regularidade das peças
processuais e procurar corrigi-las oficiosamente, quando enfermem de
deficiências ou irregularidades meramente formais, ou então proferir despacho
de aperfeiçoamento, convidando a parte a corrigir a deficiência, designadamente
no que respeita aos pressupostos processuais (art. 88º e 89º). Nos termos do art.
87º o juiz ou relator profere despacho saneador em 3 situações.
É muito importante esta subfase de saneamento, porque nessa primeira
intervenção obrigatória do juiz se concentram três tipos de juízo e de decisão:
em primeiro lugar a resolução das questões formais; em segundo lugar, a decisão
de condensação e de abertura da instrução, através da determinação dos factos
assentes e da fixação dos factos controvertidos que hão-de constituir a base
instrutória; em terceiro lugar, a decisão sobre o mérito da causa, enquanto
momento de antecipação da sentença final.
Deve sublinhar-se especialmente a importância do despacho saneador como
momento único e limite temporal do conhecimento dos pressupostos processuais
ou de quaisquer excepções dilatórias.
O objectivo deste caso julgado formal é evitar a prática anterior de reposição em
momentos sucessivos de questões formais, mas a lei terá ido longe demais.
Não parece que possa obstar-se ao posterior conhecimento oficioso do caso
julgado ou da litispendência.
E perguntamos se o juiz não poderá, na sentença final, nos termos do art. 660ºº/1
CPC, determinar a absolvição da instância, pelo menos quando conclua que a
sentença de mérito seria manifestamente inútil.
A possibilidade de renovação da instância representa, no âmbito do processo
administrativo, um avanço decisivo no sentido de combater o número exagerado
de decisões de mera forma, favorecendo uma justiça material efectiva (art. 89º/2
e 3).

2. A instrução do processo
Vale aqui plenamente o princípio do inquisitório, podendo o juiz ou o relator
ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da
verdade, bem como indeferir as diligências requeridas que considere claramente
desnecessárias (art. 90º/1).

3. Discussão da matéria de facto e alegações facultativas


Uma das novidades do processo administrativo respeita à introdução de um certo
grau de oralidade, que se manifesta aqui no poder de o juiz ou relator ordenar
uma audiência pública para discussão oral da matéria de facto (art. 91º/1 e 2).

Fase do julgamento
1. O julgamento
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Nos casos típicos há, por fim, lugar ao julgamento, proferindo-se uma sentença
fundamentada de facto e de direito, a qual, se houver lugar a uma decisão por um
colectivo de juízes (acórdão), pressupõe a vista aos juízes adjuntos, salvo
dispensa por simplicidade evidente da causa (art. 92º).
A lei prevê situações especiais para o julgamento em 1ª instância nos TACs, em
que podem ou devem intervir no julgamento todos os juízes do tribunal (art. 93º
CPTA e 41º do ETAF e 48º/4 CPTA).
Também aqui se admite que o juiz, me vez de proferir a sentença requerida,
convide as partes a acordarem numa indemnização, nos termos do art. 45º, ou,
caso de condenação da AP, fixe um prazo, com a imposição imediata de sanções
pecuniárias compulsórias, segundo o art. 44º.

2. A publicidade
A sentença ou o acórdão são notificados às partes, sendo os acórdãos finais do
STA e dos TCA publicados em apêndice ao DR, salvo os repetitivos de outros
anteriores (art. 30º/4).
Serão sempre objecto de publicação oficial, por extracto, as sentenças que
declarem a ilegalidade de normas com força obrigatória geral ou concedam
provimento à impugnação de actos que tenham sido publicados (art. 30º/7 e 8º).

O caso especial dos processos em massa

A previsão legal (art. 48º) das situações de processos em massa, isto é, quando sejam
intentados mais de 20 processos relativos à mesma relação jurídica material ou
susceptíveis de serem decididos com base na aplicação das mesmas normas a idênticas
situações de facto.
Nesta situação, o presidente pode determinar, ouvidas as partes, que se escolha um
processo-modelo, suspendendo-se a tramitação dos restantes.
A escolha do processo-modelo deve garantir que nele se debatam todos os aspectos de
facto e de direito da questão e que não se limite o âmbito da instrução.
A tramitação é a dos processos urgentes e a formação de julgamento é constituída por
todos os juízes do tribunal, com o objectivo de conseguir uma decisão rápida e bem
fundamentada daquele tipo de questões.

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Os processos cautelares
Características da tutela cautelar

O processo cautelar é um processo que tem uma finalidade própria: visa assegurar a
utilidade da lide, isto é, de um processo que normalmente é mais ou menos longo,
porque implica uma cognição plena.
Pode dizer-se que os processos cautelares visam especificadamente garantir o tempo
necessário para fazer justiça. E é precisamente para esses casos, para aqueles processos
em que o tempo tem de cumprir-se para que se possa julgar bem, que é necessário
assegurar a utilidade da sentença que, a final, venha a ser proferida.
Em virtude dessa função própria de prevenção contra a demora, as providências
cautelares têm características típicas: a instrumentalidade – isto é, a dependência, na
função e não apenas na estrutura, de uma acção principal, cuja utilidade visa assegurar;
a provisoriedade – pois que não está em causa a resolução definitiva de um litígio; e a
sumaridade – que se manifesta numa cognição sumária da situação de facto e de direito,
própria de um processo provisório e urgente.
Os processos cautelares distinguem-se, por isso dos processos urgentes autónomas, que
são processos principais e visam a produção de decisões de mérito.

A plenitude da protecção: a universalidade das providências admitidas

A lei, em cumprimento estrito da garantia constitucional, admite providências de


quaisquer tipos, desde que sejam adequadas a assegurar a utilidade da sentença a
proferir num determinado processo (art. 112º/1).
Considerando os grandes tipos de providências cautelar, o processo administrativo não
dispõe agora apenas de providências conservatórias, mas também de providências
antecipatórias.
Quanto aos conteúdos, sãos susceptíveis de serem decretadas quaisquer providências
que se revelem adequadas, embora haja uma enumeração exemplificativa no art. 112º/2.

A decisão sobre a concessão da providência cautelar

O requisito da perigosidade (periculum in mora)


O próprio conceito de providência cautelar, ao visar a garantia da utilidade da sentença,
pressupõe a existência de um perigo de inutilidade, total ou parcial, resultante do
decurso do tempo e, especialmente no direito administrativo, da adopção ou da
abstenção de uma pronúncia administrativa.
O juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma
hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que
tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto
incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para
quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera
jurídica.
Neste juízo, o fundado receio há-de corresponder a uma prova, por regra a cargo do
requerente.

A juridicidade material como padrão decisório


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O juiz tem agora o poder e o dever de, ainda que em termos sumários, avaliar a
probabilidade da procedência da acção principal, isto é, em regra, de avaliar a existência
do direito invocado pelo particular ou da ilegalidade que ele diz existir, ainda que esteja
em causa um verdadeiro acto administrativo.
O papel que é dado à aparência do direito é decisivo, desde logo, porque parece ser o
único facto relevante para a decisão de adopção da providência cautelar, em caso de
evidência da procedência da pretensão principal, designadamente por manifesta
ilegalidade do acto.
O critério legal é o do carácter evidente da procedência da acção.
Nos casos de evidência da legalidade ou da ilegalidade da pretensão, o fumus boni iuris
ou o fumus malus funcionam como o fundamento determinante da concessão ou da
recusa da providência.
Nas situações intermédias, que corresponderão à grande maioria dos casos, quando haja
uma incerteza prima facie relativamente à existência da ilegalidade ou do direito do
particular, a lei opta por uma graduação, em função do tipo de providência requerida.
A lei basta-se com um juízo negativo de não-improbabilidade para fundar a concessão
de uma providência conservatória, mas obriga a que se possa formular um juízo positivo
de probabilidade para justificar a concessão de uma providência antecipatória.
A referência ao fumus, ou seja, à aparência do direito visa justamente exprimir que a
convicção prima facie do fundamento substancial da pretensão é bastante e é adequada à
decisão cautelar, ao contrário do que se exige nos processos normais.

A proporcionalidade na decisão da concessão


Trata-se de uma característica nuclear do novo sistema de protecção cautelar que
implica a ponderação de todos os interesses em jogo, de forma a fazer depender a
própria decisão sobre a concessão, ou não, da providência cautelar dos interesses
preponderantes no caso concreto, sempre que não seja evidente a procedência ou
improcedência da pretensão formulada.
Está em causa a possibilidade de, mesmo que se verifiquem os dois requisitos
fundamentais o juiz dever recusar a concessão da providência cautelar, quando o
prejuízo resultante para o requerido se mostre superior ao prejuízo que se pretende
evitar com a providência.
O que está em causa não é ponderar valores ou interesses entre si, mas danos ou
prejuízos, e portanto os prejuízos reais, que numa prognose relativo ao tempo previsível
de duração da medida, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultariam
da recusa ou da concessão da providência cautelar.

A convolação do processo cautelar em processo principal

A possibilidade de convolação do processo cautelar em processo principal, permitindo-


se ao juiz uma antecipação do juízo de fundo caso haja manifesta urgência na resolução
definitiva do caso.
Deve haver uma interpretação exigente dos pressupostos legais e uma grande prudência
por parte do tribunal, que só excepcionalmente deve decidir-se pela convolação quando
os interesses envolvidos sejam de grande relevo e esteja seguro de possuir todos os
elementos de facto relevantes para a decisão.

O decretamento provisório da providência cautelar

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Este preceito integra as disposições particulares, mas constitui um aspecto suplementar
do regime cautelar, valendo para qualquer providência em situações de especial
urgência.
O art. 131º/3 deverá entender-se com base no princípio da tutela judicial efectiva, que o
juiz, pelo menos quando esteja em causa a lesão iminente e irreversível de direitos,
liberdades e garantias, deve poder decretar provisoriamente a providência requerida ou
outra julgue mais adequada, mesmo que o decretamento provisório não tenha sido
pedido.
Nestas situações o periculum in mora reporta-se ao retardamento do próprio processo
cautelar: visa-se evitar a lesão iminente e irreversível do direito fundamental ou outra
situação de especial urgência e a decisão pode ser tomada no prazo de 48 horas.
Isto não excluirá, porém, a possibilidade de o juiz tomar, se tiver condições para isso,
uma decisão cautelar definitiva, que, no entanto, a ser proferida, terá de obedecer aos
critérios normais de decisão do art. 120º (art. 103º e 111º).

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Os efeitos e a força jurídica das sentenças
As sentenças no processo administrativo

Nos termos do art. 156º/2 CPC, cabe a designação de sentença ao acto pelo qual o juiz
decide a causa principal ou algum incidente que apresente a estrutura de causa.
A distinção mais relevante é a que as distingue quanto ao conteúdo, isto é, aos efeitos
que produzem.
Assim classificadas, as sentenças correspondem, em face do princípio do pedido, às
espécies de acções quanto ao fim: teremos, portanto, entre as sentenças declarativas, as
sentenças de simples apreciação (ou declarativas em sentido estrito), as sentenças de
condenação e as sentenças constitutivas.
As sentenças de simples apreciação contêm uma declaração de existência ou
inexistência de um direito ou de um facto (art. 4º/2 a) CPC), caracterizando-se por não
implicarem, por si, a alteração de relações jurídicas substantivas.
As sentenças condenatórias estabelecem o dever de prestação de um facto, positivo ou
negativo, de uma coisa ou de uma quantia, pressupondo o respectivo direito do
demandante. As sentenças podem ser de condenação genérica, quando não seja possível,
no momento da decisão, a concretização da prestação ilíquida em falta.
As sentenças constitutivas produzem ou autorizem uma alteração na ordem jurídica
existente, criando, modificando ou extinguindo uma relação ou situação jurídica ou um
status.
Para além disso, independentemente agora da espécie de acção, todas as sentenças
negativas ou de improcedência do pedido podem ser consideradas como sentenças
meramente declarativas, visto que não alteram as relações ou situações jurídicas
existentes.
Diga-se, por fim, que não se pode falar propriamente de sentenças executivas, dado que,
nestas acções, a pronuncia final do juiz se limita a declarar encerrado o procedimento
material de execução, em que se tomam as providências destinadas à reparação efectiva
do direito ou do preceito violado.
As sentenças administrativas podem hoje ser reconduzidas a estes tipos gerais, mas
apresentam várias particularidades.
O processo administrativo continua a oferecer a especialidade tradicional das acções
constitutivas, em que a sentença pode determinar a invalidação retroactiva de actos de
autoridade, concretos ou normativos, que, como veremos, geram obrigações,
designadamente a de restabelecimento da legalidade.
No que respeita às sentenças simplesmente declarativas, deve lembrar-se que, na acção
administrativa especial, enquanto haja pedidos impugnatórios, o juiz, em caso de
provimento, declara a invalidade de uma decisão da AP, sentença que também pode
implicar obrigações específicas para a AP.
Quanto às sentenças condenatórias, há a considerar as hipóteses peculiares de a
condenação implicar a intimação de uma autoridade pública para a adopção ou a
abstenção de comportamentos e, sobretudo, a de poder haver a condenação à omissão
ou mesmo à prática de um acto administrativo.
Há a considerar ainda situações singulares, como, por exemplo a de as sentenças
administrativas poderem ter efeitos substitutivos de uma actuação administrativa, bem
como o caso especial das sentenças de declaração da ilegalidade por omissão de normas
regulamentares, que, sendo na aparência simplesmente declarativas, fixam um praxo
para o suprimento da omissão declarada.

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Têm de ser consideradas, como categoria autónoma, as sentenças de execução, que,
embora proferidas no decurso de processos executivos, têm efeitos declarativos; podem
ser condenatórias, quando especificam os actos ou operações que devem ter lugar para
execução de uma sentença ou determinam a entrega de uma coisa ou o pagamento de
uma quantia; declarativas, designadamente quando determinam a nulidade de actos
administrativos contrários à sentença ou declaram a existência de uma causa legítima de
inexecução; constitutivas, quando anulam actos cuja manutenção seja ilegal; ou
substitutivas, quando produzam os efeitos de um acto administrativo devido e
vinculado.

Os efeitos das sentenças de anulação de actos administrativos

O efeito directo da sentença de provimento do pedido de anulação é o efeito


constitutivo, que se traduz na invalidação do acto impugnado, eliminando-o desde o
momento em que se verificou a ilegalidade, isto é, em regra ressalvados os casos de
ilegalidade superveniente, desde a sua prática – eficácia ex tunc da sentença.
Reconheceu-se e definiu-se a existência de um efeito repristinatório ou, mas
amplamente, de um efeito reconstitutivo ou reconstrutivo da sentença, que impõe, na
medida em que tal for necessário e possível a reconstituição da situação que teria
existido se não tivesse sido praticado o acto ilegal ou se o acto tivesse sido praticado
sem a ilegalidade – princípio da reconstituição da situação hipotética actual.
Por outro lado, ressalta ainda o dever para a AP, de respeitar o julgado, conformando-se
com o conteúdo da sentença e com as eventuais limitações que daí derivam para o
eventual exercício futuro dos seus poderes – isto é, reconhece-se um efeito
conformativo ou preclusivo da sentença.
É assim que a doutrina e a jurisprudência passam a referir os chamados efeitos ultra-
constitutivos.
O CPTA vem agora determinar em que consiste o dever de execução de sentenças de
anulação de actos administrativos – art. 173º/1.
Mesmo quando há cumulação dos pedidos anulatório e reconstitutivo e o juiz vai decidir
logo no momento declarativo toda a questão, a lei confere uma relativa autonomia
processual aos momentos em que se julga da validade do acto, relativamente àqueles em
que se especificam os actos e operações necessários à reconstituição da situação.
No processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos, o juiz não
se limita a reafirmar o que já tinha sido decidido no processo de impugnação, mas, sim,
define a solução jurídica do caso, tendo em conta a posição administrativa que poderá
até ter entretanto alterado significativamente a situação.
Nos termos do art. 128º/1 b) CPTA, têm eficácia retroactiva os actos que executem
sentenças anulatórias de actos, salvo se estes actos forem renováveis, parecendo que
assim se pretendo conferir eficácia retroactiva, ou não, conforme se trate de um acto de
execução favorável ou desfavorável ao impugnante.
Só que esta indicação normativa da lei do procedimento não é suficiente e nem sempre
corresponderá à melhor solução no caso concreto.
Por isso mesmo, o CPTA, no art. 173º/2 esclarece que a AP pode ficar constituída no
dever de praticar actos dotados de eficácia retroactiva - mas só desde que não envolvam
a imposição de deveres, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses
legalmente protegidos.
A doutrina tradicional considerada actos consequentes os actos praticados ou dotados de
certo conteúdo em virtude da prática de um acto administrativo anterior.

49
Mas, actualmente, o CPA ao elencar entre os actos nulos os actos consequentes de actos
anteriormente anulados ressalva a hipótese de haver contra-interessados com interesse
legítimo na manutenção do acto consequente (art. 132º/2 i)).
Serão nulos apenas os actos consequentes cuja manutenção seja incompatível com a
reconstituição da situação hipotética exigida pela anulação (art. 173º/2 CPTA).
Mesmo quando se trate de actos nulos por essa razão, os seus efeitos (putativos)
poderão manter-se em face da existência de interesses legítimos de contra-interessados.

Os limites subjectivos do caso julgado nas acções administrativas

Trata-se de saber se algumas sentenças administrativas, em especial as proferidas em


processos impugnatórios, não terão eficácia geral, erga omnes.
As sentenças, em regra, produzem os seus efeitos apenas entre as partes. E essa regra é
axiomática, quando estejam em causa obrigações decorrentes da sentença, em face do
princípio do contraditório e dos direitos fundamentais de audiência e de defesa.
No que respeita aos processos de impugnação de actos administrativos, não se pode
esquecer que as sentenças de anulação são sentenças constitutivas, que produzem a
eliminação do acto da ordem jurídica. Ora, o efeito constitutivo, enquanto efeito de
facto da sentença, vale naturalmente erga omnes, na medida em que ninguém pode
pretender que, relativamente a si, o acto não foi anulado.
Relativamente aos efeitos desfavoráveis da sentenças anulatória, desde logo, quanto aos
prejudicados pela anulação do acto, tem de se concluir, em geral, que apenas se
produzem inter partes.
No que respeita aos efeitos favoráveis da sentença anulatória a regra parece ser também,
entre nós, a produção dos efeitos inter partes, ainda que se admita a decisão de extensão,
desses efeitos a outras pessoas.
No processo administrativo, existe, porém, uma verdadeira excepção à regra que limita
os efeitos das sentenças às partes: as sentenças de declaração de ilegalidade de normas,
no caso de impugnação abstracta, têm força obrigatória geral (art. 76º CPTA).
Deve ser visto como um caso especial o dos efeitos das sentenças nas acções populares.
Em função da iniciativa e da finalidade de defesa de valores comunitários, percebe-se
que as sentenças tenham, em princípio, eficácia geral, sem prejuízo do direito de auto-
exclusão da representação que pode ser exercido pelos titulares de direitos ou interesses
legalmente protegidos.

A extensão dos efeitos das sentenças

Segundo o art. 161º/1 CPTA, a extensão pode ser pedida relativamente aos efeitos de
sentenças que tenham anulado um acto administrativo desfavorável ou reconhecido uma
situação jurídica favorável.
A extensão pode beneficiar outras pessoas, que se encontrem na mesma situação
jurídica, quer tenham recorrido ou não à via judicial, a não ser que haja contra-
interessados (nº5).
A extensão só é permitida quando haja vários casos perfeitamente idênticos,
nomeadamente no domínio do funcionalismo público e no âmbito de concursos, e só
quando tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado, ou três
sentenças, se proferidas em processos formalmente seleccionados nas situações de
processos em massa, nos termos do art. 48º.

50
Processos executivos
A obrigatoriedade das sentenças: a execução espontânea e as causa legítimas de
inexecução

A lei processual reafirma, no art. 158º a obrigatoriedade das decisões dos tribunais
administrativos, retirando daí a consequência lógica do dever de cumprimento
espontâneo das sentenças pela AP, dentro de um prazo, salvo ocorrência de causa
legítima de inexecução.
O interessado não tem o ónus de requerer à AP a execução da sentença, para a colocar
em mora: findo o prazo estabelecido – 30 duas, para pagamento de quantia certa; 3
meses, nos restantes casos – o particular tem o direito (e o ónus) de iniciar o processo de
execução.
As autoridades administrativas apenas podem deixar de cumprir integralmente a
sentença se ocorrer uma causa legítima de inexecução, que, nos termos da lei, serão só a
impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público na execução da
sentença – sendo certo que uma tal causa não pode ser invocada quando se trate de
pagamento de uma quantia certa.
Em princípio, o órgão competente para a execução deverá fundamentar e notificar o
interessado dentro do prazo de cumprimento espontâneo e o exequente, caso não
concorde deve, na petição de execução dizer as razões da sua discordância.
A causa legítima de inexecução específica da sentença pode ser invocada na fase pré-
executiva de cumprimento espontâneo (art. 163º), bem como durante o processo
executivo, em oposição (art. 165º), ou, na execução de sentenças anulatórias, na
respectiva contestação (art. 177º).
A causa legítima de inexecução terá, nos termos legais, de reportar-se a circunstâncias
supervenientes ou que a AP não estivesse em condições de invocar no momento
oportuno no processo declarativo (art. 163º), salvo quando esteja em causa a execução
de sentenças anulatórias, onde tal limitação, em princípio não existe (art. 175º/2).
A lei prevê, no art. 45º, a hipótese de um conhecimento antecipado, pelo juiz, ainda no
processo declarativo, de causas legítimas de inexecução, permitindo que ele julgue
condenatória. Mas só o faz no caso de o cumprimento do dever pela AP ser
absolutamente impossível ou ocasionar um excepcional prejuízo para o interesse
público.
Se o exequente concordar com a invocação pela AP da causa legítima de inexecução,
pode requerer ao tribunal a fixação da indemnização devida (art. 164º/6).
A indemnização respeita aos danos que decorrem do não cumprimento da sentença e
visa compensar o sacrifício do direito do particular reconhecido pelo tribunal, não se
confundido com a indemnização por responsabilidade civil em caso de inexecução
ilegítima.

A execução de sentenças de anulação de actos administrativos

A lei não obriga à cumulação dos pedidos de anulação de actos positivos com os de
condenação À prática do acto devido ou ao restabelecimento da situação hipotética, a
não cumulação preclude a faculdade de as pretensões serem accionados no âmbito do
processo de execução da sentença de anulação (art. 47º/2 e 3).
A execução espontânea pela AP da sentença anulatória rege-se tal como a sentença que
eventualmente se venha a produzir no processo de execução, pelos preceitos de direito

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substantivo que determinam o conteúdo do dever de executar, em função do regime da
anulação de actos administrativos.
Num processo em que a sentença é fundamentalmente constitutiva, a execução forçosa
pode consistir nas mais variadas pronúncias e providências judiciais.
Assim, o tribunal poderá, quando julgue procedente a pretensão do autor, num primeiro
momento:
 A especificar o conteúdo dos actos e operações necessários à execução da
sentença, identificando o órgão responsável e fixando o prazo para a respectiva
prática, cominando, se for caso disso, uma sanção pecuniária compulsória para o
caso de incumprimento;
 Fixar o prazo de 30 dias para pagamento de quantias devidas;
 Declarar a nulidade de actos desconformes a situação ilegal.
Em caso de incumprimento dentro do prazo estabelecido, o juiz poderá:
 Quanto a quantias devidas, decretar a compensação ou promover o pagamento
pró conta da doação orçamental;
 Quanto a actos administrativos de conteúdo vinculado que tenha especificado
como devidos, emitir uma sentença substitutiva.
 Quando a factos infungíveis, fixar a requerimento do autor, a indemnização
devida por inexecução ilícita da sentença.
Poderá o juiz ordenar a entrega de coisa certa ou a execução subrogatória de operações
materiais que constituam factos fungíveis.

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Os princípios gerais do processo administrativo
O sistema dos princípios processuais

São duas as ideias estruturantes dos processos. Por uma lado, vale a ideia de que o
processo serve fundamentalmente os interesses das partes litigantes, de modo que às
entidades públicas e, especificadamente, ao juiz cabe primacialmente uma função de
árbitro, que só actua mediante pedido e se limita a verificar o cumprimento das regras
do jogo para assegurar um processo justo – esta ideia exprime-se, normalmente pelos
princípios do dispositivo ou da autoresponsabilidade das partes.
Por outro lado, o processo judicial, tendo em conta a proibição de autodefesa, é visto
como uma forma de realização de interesses públicos, que são exteriores e transcendem
os interesses dos litigantes e que, por isso, implicam um envolvimento e impõem uma
intervenção autónoma das autoridades judiciárias, em especial do juiz – a ideia exprime-
se, em regra, pelos princípios do inquisitório, da oficiosidade ou oficialidade.
Teremos em conta apenas os princípios processuais num sentido estrito, embora não se
esqueça que, além deles e através deles, relevam na justiça administrativa como padrões
de conduta e critérios de decisão, os princípios da juridicidade substancial, que estão
explicitados na lei e na CRP.

Os princípios relativos à promoção ou iniciativa processual

Princípio da necessidade do pedido


Este princípio decorre de uma característica estrutura-funcional do poder judicial,
enquanto poder do estado – os tribunais são órgãos indiferentes, imparciais e inoficiosos
quando dirimem um litígio.
Assim, o tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem
que a resolução lhe seja pedida por uma das partes.

Princípio da promoção alternativa, particular ou pública


No processo administrativo, a iniciativa cabe normalmente aos particulares.
Contudo, a esta iniciativa particular soma-se a iniciativa popular, seja individual, seja
colectiva, para defesa de determinados valores, bens ou interesses comunitários, bem
como, no que respeita aos processos mais típicos, o poder geral de iniciativa do MP, na
sua veste de magistratura encarregada da defesa da legalidade administrativa.
A iniciativa dos processos pode pertencer ainda às entidades e aos órgãos
administrativos, que podem surgir nos processos na qualidade de autores, quer para
defesa dos direitos e interesses que lhes cumpra defender, quer como autoridades
fiscalizadoras da legalidade.
Nos processos iniciados pelos particulares, vale o princípio da liberdade de iniciativa,
visto que o direito de acção é uma liberdade ou, em todo o caso, um direito disponível.
Podemos falar de um princípio de liberdade e de um direito fundamental de acção,
quando esteja em causa a acção popular.
Já não será bem assim, quando se trate da iniciativa das pessoas colectivas públicas ou
de órgãos administrativos, onde aí o exercício de direito de acção deve entender-se
funcionalizado à realização desses interesses, no âmbito do correcto desempenho das
suas atribuições e competências.
Os problemas mais complexos são, porém, os que respeitam à intervenção do MP. O
princípio da legalidade é estritamente aplicável sempre haja uma imposição legal
expressa ou inequívoca de promoção pelo MP.
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Fora desses casos, a iniciativa do MP dependerá de saber se na propositura da acção está
em causa a defesa da legalidade, a salvaguarda de valores comunitários, a protecção de
direitos, liberdades e garantias ou a promoção de interesses públicos.
A lei nada diz sobre o assunto, mas não parece razoável que o MP seja obrigado a
promover um processo sempre que seja levado a seu conhecimento uma situação em
que haja dúvidas, mesmo que só quando fundadas, sobre a legalidade de um acto ou de
uma norma.
De acordo com circulares internas, os delegados do MP têm tido instruções para
impugnação de actos apenas em caso de actos nulos por determinação da lei ou de actos
que violem direitos fundamentais, afectem interesses difusos ou colectivos ou infrinjam
os princípios da justiça e imparcialidade da actividade administrativa.

Os princípios relativos ao âmbito do processo (ou à deerminação do thema


decidendum et respondendum)

Princípio da resolução global da situação litigiosa


Uma das preocupações normativas do processo administrativo reformado é a de, na
perspectiva de uma tutela judicial plena, permitir que sejam considerados no mesmo
processo todos os aspectos de uma situação litigiosa, mesmo que complexa, a fim de
assegurar uma decisão que satisfaça inteiramente os interesses das partes.

Princípio da vinculação do juiz ao pedido (pedido da congruência ou da


correspondência entre a decisão e o pedido)
Este principio clássico pretende assegurar a correspondência entre o pedido e a decisão
que vai ser tomada, num duplo sentido: o tribunal não pode apreciar ou decidir no
processo senão aquilo que lhe é solicitado pelas partes, devendo, por outro lado,
apreciar todas as questões pertinentes que as partes submetem à sua apreciação.
Actualmente, uma compressão clara a este princípio decorre da possibilidade de o juiz,
no âmbito de um processo cautelar, não estar adstrito à providência concretamente
requerida, podendo decretar outra, em cumulação ou em substituição dela, desde que
satisfaça os interesses do requerente e agrave menos os interesses contrapostos.
E podemos mesmo configurar uma excepção ao princípio na circunstância de a lei
permitir ao juiz antecipar a decisão sobre a causa principal no âmbito do processo
cautelar respectivo, operando assim uma convolação processual (art. 45º CPTA).

Princípio da limitação do juiz pela causa de pedir (princípio da substanciação)


A limitação do juiz pela causa de pedir, de modo que o tribunal só possa basear a sua
decisão em factos invocados no processo como fundamentos concretos do efeito
jurídico pretendido.
Este princípio não vale, porém, hoje nos processos administrativos de impugnação, em
virtude da relevância do interesse público na fiscalização da legalidade das normas e
actos administrativos.
Não vale nos processos de declaração de ilegalidade de normas e nos pedidos de
impugnação de actos.

Princípio da estabilidade objectiva da instância


É uma manifestação tradicional do princípio do dispositivo, segundo o qual o pedido e a
causa de pedir são, em regra, determinados no inicio do processo, designadamente na

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petição inicial, mantendo-se a partir do despacho liminar de aceitação até à decisão
final.
Este princípio tal como não é um princípio absoluto no processo civil, também não vale
inteiramente no processo administrativo, sofrendo limitações importantes:
 É a própria lei a determinar, que quando tenha sido pedida a estrita anulação de
um indeferimento, o juiz convide o autor a substituir a petição inicial para
formular o pedido de condenação do acto devido (art. 51º/4).
 Permite-se com grande largueza a ampliação ou substituição do pedido
inicialmente formulado nos processos de impugnação de actos (art. 63º, 64º).
 Nos casos de condenação à prática de acto devido, também se pode alterar a
causa de pedir, quando haja um indeferimento expresso na pendência do
processo (art. 70º).
 Para além destes casos, na acção administrativa especial, admite-se, em geral, a
alteração da causa de pedir (art. 86º e 91º/5).
 Na impugnação de normas ou de actos, prevê-se a arguição, pelo MP, de
quaisquer vícios que determinam a nulidade ou inexistência do acto impugnado
(art. 85º/2, 3 e 4).
 Art. 45º e 49º.
Trata-se de saber em que medida o juiz pode considerar, na sentença relativa a um
determinado processo, os factos jurídicos supervenientes que sejam susceptíveis de
influírem na decisão do litígio.
A resposta a esta questão vai depender do tipo de acção e de sentença pretendida, e, no
caso de impugnações de actos, do tipo de acto impugnado, bem como do tipo de
modificação operada.
O problema põe-se com particular acuidade no domínio das sentenças constitutivas, em
especial quando esteja em causa a anulação de actos administrativos.
Esta regra da não atendibilidade das novas circunstâncias de facto e de direito parece ser
incontestável quanto a actos administrativos de eficácia instantânea ou que já tinham
produzido, no momento da proposição da acção, todos os seus efeitos.
Porém, tal inatendibilidade não será uma imposição necessária quanto aos actos de
eficácia duradoura ou aos actos ainda não executados. Nesses casos, poderá ser
processualmente conveniente a atendibilidade das novas circunstâncias.
Deverá porventura distinguir-se entre as situações em que a mudança levaria a
considerar válido um acto originariamente inválido e aquelas em que as novas
circunstâncias importam a invalidade de acto originariamente válido. No primeiro grupo
de situações ainda se pode defender a não atendibilidade das novas circunstâncias. No
segundo grau de situações, de invalidade supervenientes do acto, é, regra geral mais
defensável a atendibilidade das modificações de facto ou de direito, pois que o princípio
da economia processual e, em regra, também o da protecção efectiva dos interessados
desaconselham a que se obrigue o particular a esperar ou a requerer à AP a revogação
do acto ou a propor nova acção com esse objectivo.
Isto deve ser assim quando se possa afirmar com segurança que é ilegal a manutenção
dos efeitos do acto em face das novas circunstâncias, isto é, que a AP tem o dever de
revogar.
Já quando essa certeza não exista o juiz não deve anular o acto, remetendo o interessado
para o requerimento e eventualmente para nova acção.
Os princípios relativos à prossecução processual (decurso, condução e extinção do
processo)

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Princípios da tipicidade, da compatibilidade processual e da adequação formal da
tramitação
O princípio da tipicidade dos trâmites processuais impondo que os trâmites e a
respectiva sequência sejam fixados por lei, diferentemente do que é característico do
procedimento administrativo, em regra mais flexível.
A lei de processo administrativo, ao pretender facilitar a cumulação de pedidos,
determina a compatibilidade entre as diversas formas de processo, que não obstam a tal
cumulação (art. 5º/1).
Deve considerar-se aplicável ao processo administrativo, nos termos do art. 1º do
CPTA, o princípio da adequação formal contido no CPC, nos termos do qual quando a
tramitação prevista na lei não se adequar às especificidades da causa, deve o juiz
oficiosamente, ouvidas as partes, determinar a prática dos actos que melhor se ajustem
ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações.

Princípio dispositivo ou da auto-responsabilidade das partes


Este princípio determina, no que respeita à condução do processo, que compete às
partes interessados a dinamização do processo. (art. 88º/4, 62º, 159º CPTA e 293º CPC).
O princípio está sujeito, porém a limitações:
 O princípio é limitado nas impugnações de actos, bem como na acção popular
social, pelo princípio da oficialidade, na medida em que o MP dispõe, nos
processos iniciados pelos particulares, da possibilidade de requerer o
prosseguimento do processo que tenha terminado por desistência do autor (art.
62º CPTA).
 Parece que não se deve admitir a confissão do pedido pela AP como forma de
pôr termo ao processo de impugnação de actos.
 Art. 95º/2.
 Actualmente, em face da tendência para a acentuação dos poderes do juiz de
direcção do processo (art. 265º CPC), tem de considerar-se que o princípio do
inquisitório, sobretudo quando associado ao princípio do favorecimento do
processo, constitui um limite intrínseco da auto-responsabilidade das partes,
plenamente aplicável no processo administrativo.

Princípios da igualdade das partes, da cooperação e da boa fé processual


A lei determina que o tribunal assegure um estatuto de igualdade efectiva das partes no
processo, tanto no que se refere ao exercício de faculdades e meios de defesa, como no
plano da aplicação de cominações ou de sanções processuais (art. 6º).
O CPTA formula ainda em geral, o princípio da cooperação de todos os interventores no
processo a fim de se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio (art.
8º), a fim de se realizar o desiderato enunciado no art. 20º CRP.
Na mesma linha de igualdade de tratamento entre as partes, afirma-se também o
princípio da boa fé, devendo elas abster-se de requerer diligências inúteis e de adoptar
expedientes dilatórias (art.8º/2).

Princípio da audiência e do contraditório


O princípio do contraditório impõe, em geral, que seja dada oportunidade de
intervenção efectiva a todos os participantes no processo, com a finalidade de permitir
ao juiz uma decisão imparcial e fundada, atendendo às razões de ambas as partes
litigantes.
O princípio significa também, e talvez sobretudo, em especial no processo
administrativo, a garantia de que não sejam admitidas provas, nem proferidas pelo
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tribunal quaisquer decisões desfavoráveis a um sujeito processual sem que este seja
ouvido sobre a matéria, em termos de lhe ser dada previamente ampla e efectiva
possibilidade de a discutir – corresponde nessa medida, ao direito de audiência quando
esteja em causa a aplicação de uma sanção pessoal. (art. 57º, 68º/2, 85º, 95º/2, 131º/4
CPTA e 385º/1 CPC).

Princípio da devolução facultativa ou da suficiência discricionária


Nos processos administrativos, o juiz em face de uma questão prejudicial que seja da
competência de um tribunal de outra jurisdição, pode escolher livremente entre
sobrestar na decisão até que o tribunal competente se pronuncie (devolução facultativa),
ou então decidir a questão com base nos elementos de prova admissíveis e com efeitos
restritos àquele processo (suficiência discricionária). (art.15º CPTA)
Também se entendido, conjugando o princípio da suficiência com o princípio da
economia processual, que o juiz deve optar por decidir a questão prejudicial se esta for
simples e existirem no processo todos os elementos necessários à formação do juízo
respectivo.

Princípio do favorecimento do processo (ou princípio pró actione)


Trata-se de uma concretização do princípio constitucional do acesso efectivo à justiça
que aponta para uma interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de
favorecer o acesso ao tribunal ou de evitar as situações de denegação de justiça,
designadamente por excessivo formalismo. (art. 7º CPTA, 288º/3 CPC)

Princípios da economia e da celeridade processual


Segundo o princípio da economia processual, entendido no seu sentido mais amplo, o
processo há-de ser, tanto quanto possível, em função do seu objectivo, eficiente e célere,
devendo evitar-se trâmites desnecessários ou excessivamente complicados,
comportamentos dilatórios e decisões inúteis. (art. 20º/4 CRP, 97º, 78º/4, 83º/2, 91º, 87º,
90º/2, 91º, 121º e 132º/7, art. 161º CPTA)

Os princípios relativos à prova (ou à instrução)

Princípio da investigação (do inquisitória ou da verdade material)


O princípio vale logo na aquisição dos factos necessários para a decisão, de modo que
os fundamentos da decisão do juiz não têm de se limitar aos factos carreados pelas
partes.
Para além da possibilidade de o MP solicitar ao juiz as diligências de instrução que
entenda convenientes (art. 85º/2) vai-se além do princípio da oficialidade, e permite-se
um verdadeiro inquisitório, ao autorizar o próprio juiz a ordenar as diligências de prova
que considere necessárias para o apuramento da verdade.
A procura da verdade material pelo juiz tem como fronteira natural o âmbito do
processo, determinado pelo pedido e pela causa de pedir, e há-de respeitar ainda a
tipicidade da tramitação.

Princípio da universalidade dos meios de prova


O princípio da verdade material só sofre no processo administrativo a limitação dos
meios de prova decorrente das proibições de prova determinadas por normas
constitucionais, designadamente pelas relativas aos direitos, liberdades e garantias. (art.
92º/6 CRP)
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Relativamente à prova, aplicam-se as disposições gerais do CPC (art. 513º e ss.), seja no
âmbito da acção administrativa comum, seja no que respeita à acção administrativa
especial (art. 90º/2).

Princípio da aquisição processual


Trata-se de uma decorrência normal do princípio da verdade material, em cujos termos
o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, de modo que as
emanadas de uma das partes podem aproveitar à parte contrária, sendo os factos
considerados adquiridos para o processo, mesmo que operem consequências
desfavoráveis para quem os alegou (art. 515º/ CPC).

Princípio da livre apreciação das provas


É o princípio fundamental em matéria de prova e estabelece que o que torna provado
um facto é a intima convicção do juiz, formada de acordo com a sua experiência da
vida, e não a aplicação de tábuas de valores pré-fixadas na lei.
A livre convicção do julgador na avaliação dos factos não representa, porém, um
arbítrio ou um puro subjectivismo, já que para além da força probatória legal de
determinadas provas, essa convicção ou certeza prática tem como pressuposto
valorativos os critérios da experiência comum e da lógica do homem médio, havendo de
ser racional e susceptível de motivação, em termos de se lhe reconhecer uma capacidade
de convencionamento objectiva e controlável.
O princípio é ainda limitado pelo princípio do contraditório, na medida em que não
pode ser proferida decisão com base em factos probatórios sobre os quais algumas das
partes, em especial a parte que por eles é desfavorecida, não tenha tido oportunidade de
se pronunciar.
A lei determina algumas compressões a estes principio:
 Art. 84º/5
 Art. 118º/1

Princípio da repartição do ónus da prova objectivo


Não vale no processo administrativo um ónus da prova subjectivo, formal ou de
produção, pelo menos no seu sentido mais rigoroso, que implicaria que o juiz só
pudesse considerar os factos alegados e provados por cada uma das partes interessadas.
Mas há sempre um ónus da prova objectivo, na medida em que se pressupõe uma
repartição adequada dos encargos de alegação, de modo a repartir os riscos da falta de
prova – a decisão há-de naturalmente desfavorecer quem não veja provados os factos
em que assenta a posição por si sustentada no processo.
O ónus da prova, entendido neste sentido objectivo, vai depender da situação processual
das partes mas terá de determinar-se, na ausência de norma expressa, de acordo com um
quadro de normalidade concreto ou típico, construído com base nas regras específicas
do domínio da vida em causa e nos princípios próprios do direito administrativo.
A regra geral, nos termos da qual quem invoca um direito tem o ónus da prova dos
respectivos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos,
modificativos ou extintivos (art. 342º CC) pode entender-se aplicável, em princípio, no
processo administrativo, mas aqui não é suficiente para a resolução de todos os tipos de
situações.
Não pode ser, em especial, formalmente aplicada aos meios impugnatórios de actos e de
normas, até porque pode não estar em causa directamente um direito substantivo do
recorrente.

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Deve ser a AP a suportar a desvantagem de não ter sido feita a prova da verificação dos
pressupostos legais que permitem à AP agir com autoridade; deve ser o particular a
suportar a desvantagem de não ter sido feita a prova de que, no uso dos poderes
discricionários, a AP actuou contra princípios jurídicos fundamentais.
No que toca aos aspectos discricionários das decisões, a AP ainda deveria, em rigor,
suportar a desvantagem da falta de aparecia de razoabilidade, de imparcialidade, de
igualdade, de justiça e de proporcionalidade dessas decisões, incumbindo ao particular
provar o mau uso dos poderes discricionários se a decisão aparentemente não for
desrazoável.
Na aplicação destes princípios gerais, há que tomar em consideração o meio processual
em causa, bem como o caso ou o tipo de caso em litígio, avaliando os dados normativos
que regulam a situação e procurando extrair deles argumentos para o necessário juízo
sobre o quadro de normalidade.
Deve concluir-se que a repartição do ónus da prova, para além dos casos em que o
legislador opte por regras estritas, constituirá, também ela, um problema normativo, a
decidir em última análise pelo juiz, a partir da aplicação das regras processuais básicas,
de maneira que pode até representar, afinal, um aspecto diferenciado e susceptível de ser
motivado no processo de formação da convicção íntima do juiz.

Os princípios relativos à forma processual

Princípio da forma escrita e princípio da oralidade


Tradicionalmente, o processo administrativo organiza-se através de peças escritas, não
valendo aqui os princípios da imediação e da oralidade, típicos dos outros processos
concretizados designadamente na audiência de discussão e julgamento.
A situação altera-se agora, desde logo no que respeita à acção administrativa comum,
que segue a tramitação do CPC, de modo que há lugar a audiência de discussão e
julgamento, que é oral, quer relativamente aos aspectos de facto, quer relativamente aos
aspectos jurídicos da causa.
Há algumas manifestações de oralidade no CPTA – art. 91º/1 a 3, 111º/1.

Princípio da publicidade das decisões


Além da notificação às partes, estão sujeitas a publicação no DR, as sentenças que
declarem a ilegalidade de normas com força obrigatória geral ou concedam provimento
à impugnação de actos aí publicados (art. 30º/7 e 8).

Princípio da fundamentação obrigatória das sentenças


As sentenças administrativas também carecem de fundamentação contextual, que há-de
discriminar as razões de facto e de direito da decisão, isto é, os factos provados e a
indicação, interpretação e aplicação das normas jurídicas correspondentes (art. 94º
CPTA, 158º CPC e 205º/1 CRP).
A indicação dos fundamentos da decisão é especialmente importante nas sentenças
constitutivas, dado que o alcance da sentença e o âmbito do caso julgado não dependem
apenas do dispositivo anulatório, mas da motivação da sentença.

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