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36º Encontro Anual da Anpocs

GT34 - Sociologia e antropologia da moral

Conflitos morais diante de um tabu: Negociações de sentido


quanto aos temas da pauta feminista no seriado Malu Mulher

Heloisa Buarque de Almeida


USP

1
Malu Mulher: alguns temas da pauta feminista no horário nobre

Malu: Enquanto [o aborto] não for legalizado, as infelizes das mulheres estão nas
mãos deles mesmo [médicos em clínicas clandestinas]. Todo mundo condena, diz
que é crime, diz que é pecado, mas, na hora, todo mundo fecha os olhos porque
um dia pode precisar. Isso chama-se hipocrisia. (...) se é necessário, se é uma
coisa inevitável, porque não legalizar? Por que não tornar menos sórdido, mais
civilizado?

Este é um dos diálogos conclusivos do episódio “Ainda não é hora”, exibido em


14 de Junho de 1979, no horário das 22hs (final do chamado horário nobre) da Rede
Globo. Malu é a protagonista do seriado, e neste episódio ajuda uma jovem a fazer um
aborto clandestino numa clínica. Malu Mulher visava atingir as mulheres de classe
média urbana escolarizadas, tratava da história de Maria Lucia, socióloga, 32 anos, com
uma filha, que se separa no primeiro episódio, buscando, como diz a canção da abertura,
Começar de Novo,1 encontrar-se com si mesma e libertar-se do marido e do casamento.
O ex-marido, ao longo dos dois anos do seriado e de algumas disputas, torna-se uma
pessoa comum, e mesmo um amigo de Malu. Os “vilões” centrais das narrativas, contra
os quais Malu luta e sobre os quais discute de modo discursivo e mesmo didático, eram
o machismo, os preconceitos (de vários tipos, contra negros, homossexuais,
desquitadas), a hipocrisia, o casamento tradicional, a opressão, a violência (não apenas a
dos homens contra mulheres, mas também a violência urbana, e até a violência da
polícia). Conjugalidade, autonomia feminina e sexualidade foram temas centrais, vistos
e questionados em diversos episódios. Temas centrais para grupos feministas (no Brasil,
e no mundo), particularmente na sua vertente mais de classe média, como inclusive
espelha o perfil estereotipado da socióloga Malu.
No período em que o seriado foi exibido, entre maio de 1979 e dezembro de
1980, suas referências e sua conexão com algumas pautas do feminismo2 eram
explícitas. 1975 foi o Ano Internacional da Mulher, promovido pela ONU, e a partir de
então há no Brasil uma crescente visibilidade do movimento feminista, por um lado, e
mesmo de certos movimentos de mulheres (não necessariamente “feminista” em sentido
estrito) associadas às demandas das periferias (tais como demanda por creches). Esse
movimento todo é central na concepção da personagem e das histórias contadas.

1
De Ivan Lins e Vitor Martins.
2
Evidentemente há várias correntes no feminismo, mas é possível notar uma linha geral de luta
pelos direitos das mulheres.
2
Em linhas gerais, como de fato acontecia com várias correntes do feminismo
brasileiro, vê-se Malu discutir formas de desigualdade que afetam especialmente as
mulheres; o casamento tradicional, questionando a dupla moral sexual; defender a
autonomia e a independência feminina; valorizar o trabalho feminino como realização
pessoal (uma pauta típica do movimento feminista de classe média); politizar a
violência doméstica; e defender a legalização do aborto. Ademais, assim como
acontecia com certas correntes no movimento feminista, defende outras pessoas que
sofrem preconceitos ou que lidam com as desigualdades sociais, como as domésticas,
homossexuais, negros, deficientes. De acordo com certa postura de esquerda, questiona
inclusive (ainda que indiretamente) o regime militar e clama pela abertura. Tal
associação entre feminismo e uma política de esquerda, vinculado à luta pela anistia e
contra a ditadura, é muito lembrada nos trabalhos sobre o feminismo do período no
Brasil.3 Palavras explícitas sobre certos temas – como “anistia” – não aparecem
necessariamente nos episódios. Mas há referências à tortura do regime militar, e críticas
ao “custo de vida”, entre outros. Quanto ao feminismo, alguns episódios são bastante
explícitos na sua abordagem política, como aquele que defende a legalização do aborto
e outro que busca criminalizar a violência doméstica. Outras vezes é uma concepção
essencialista de feminino e de uma sensibilidade feminina que aflora – a variação na
abordagem segue a diversidade dos escritores que participaram na produção do seriado. 4
Na visão de Mariza Corrêa (2001), o seriado teria tido o impacto de popularizar alguns
temas do feminismo de então.
Euclydes Marinho, que participou da equipe de criação (com Armando Costa 5,
Lenita Plonczynski e Renata Pallotini) escreveu o primeiro episódio da série,
considerado um guia do “clima” do seriado, conta inclusive que na época em que

3
Sobre o feminismo do período, cf. Corrêa, 2001, Gregori, 1993, Moraes, 1990, Pontes, 1986,
Sarti, 2001.
4
Explorei mais esses temas gerais de Malu em “O feminismo dos anos 1970 pela TV Globo”,
in: GOULART, Ana Paula e SACRAMENTO, Igor (orgs.): Televisão, História e Gêneros,
Editora Vozes, no prelo.
5
Armando Costa pode ser visto como um dos autores que vinha de grupos de esquerda, ligados
ao PC, que desembocaram na produção de teledramaturgia da Globo no período, companheiro
de criação de teatro de Oduvaldo Vianna Filho. Sobre o tema, cf. Ridenti, 2000. Para a
emissora, fazia também parte de sua estratégia de constituir um “padrão de qualidade” mais
elaborado na produção ficcional, apesar de por vezes tais autores também gerarem mais embates
com a censura.
3
escrevia Malu Mulher participou de inúmeras reuniões feministas a convite de Ruth
Cardoso e Rosiska de Oliveira, e diz que as feministas “estavam muito ativas”. 6
Mais do que explorar apenas essa associação entre um seriado e alguns temas do
movimento social que teve muita repercussão na época, o que me leva a estudar este
seriado é uma reflexão sobre as construções do gênero na produção de televisão.
Considero que Malu faz parte de um movimento de mudança de construções simbólicas
sobre o feminino na TV brasileira, descolando-se de “heroínas” melodramáticas mais
tradicionais, e buscando constituir imagens de uma mulher relativamente mais
“moderna” e menos submissa.
Malu Mulher é apresentado – em inúmeros depoimentos, matérias de jornal,
sites, no DVD lançado pelo Globo, em entrevistas de Regina Duarte, Daniel Filho,
Dennis Carvalho, e através das memórias oficiais, como site do Memória Globo – como
tendo uma forte relação com o momento (histórico e social) da vida “das mulheres”.
Haveria uma mudança social em curso que o seriado buscava captar e retratar. Os textos
da época de sua exibição referem-se à associação entre o seriado e o movimento
feminista. No entanto, os discursos posteriores de memória da emissora, como os do
lançamento em 2004 de um DVD comercial com 10 episódios, de entrevistas
posteriores sobre época (exceto as entrevistas de dois autores, Euclydes Marinho e
Renata Palottini) omitem especificamente o lado “feminista” do seriado, e ressaltam a
noção de uma “emancipação feminina”, ou mudanças no papel social das mulheres.
Assim como os outros seriados nacionais exibidos na mesma época, Carga
Pesada e Plantão de Polícia, muitas vezes também em Malu Mulher os autores se
apoiam em notícias de jornais e fatos da época para construir a narrativa. Assim, em
“Legítima defesa da honra e outras loucuras” (de Armando Costa) fala-se da violência
doméstica através do caso de Duca, que não apenas parece se referir ao caso de grande
repercussão daquele ano (1980) do assassinato de Angela Diniz por Doca Street, como o
título menciona o argumento usado então pelos advogados para liberarem os agressores
que estariam “defendendo a sua honra”. No episódio “Filhos, melhor não tê-los” (de
Marta Góes e Walter Negrão), através da vida de uma doméstica tematizam-se outras
questões, como a vida de uma mãe solteira que é demitida e busca emprego como
doméstica, e confundida com prostitutas em certo bairro, sofre violência direta da

6
Tais reuniões lhe forneceram não apenas material apara Malu, mas também para a minissérie
“Quem ama não mata” (1982). Entrevista com o autor em Memória Globo, 2008, p. 338-9.
4
polícia. O caso faz menção a certa operação limpeza promovida pelo delegado Richetti,
em maio e junho 1980, que tentou limpar o centro da cidade. Mas na busca desesperada
da doméstica, Malu afirma que ela “tem direitos” e deve procurar o pai de criança e
pedir uma pensão.
No entanto, as escolhas das narrativas de Carga Pesada e Plantão de Polícia
parecem remeter com mais frequência a notícias de jornais, como índice de realidade,
ao passo que em Malu, embora também tenha esse recurso em termos de inspiração para
os roteiristas, a narrativa remete com maior frequência a experiência de pessoas comuns
que nem sempre viram “notícia de jornal”. Malu é recém-separada, assim como Regina
Duarte havia se separado há pouco, e os dramas pessoais de casamentos e separações,
afins não só à trajetória pessoal da atriz, mas que também são referidos pelos diretores e
alguns autores, são usados na composição das personagens das narrativas dos
episódios.7 Quando se lê alguns depoimentos e entrevistas dos autores, atores e
diretores, nota-se que o aspecto “real” de Malu refere-se não apenas à tal “emancipação
da mulher” (ou seja, o contexto social), mas também a fatos reais e até corriqueiros que
eles próprios vivenciaram: separações e desquites, certos momentos de tensão num casal
que beiram à violência doméstica, relações entre pais e filhos, fatos corriqueiros
vivenciados que permitem fazer a ponte com as histórias pessoais de Malu. Assim é que
se unem temas típicos do feminismo de então a experiências pessoais, embora nem
sempre os autores vejam essa ligação. Talvez por isso os temas mais recorrentes em
Malu Mulher tenham sido o debate sobre conjugalidade, autonomia feminina e
sexualidade – temas do feminismo que adentravam também as relações pessoais das
camadas médias urbanas a quem o seriado se destinava, assim como o contexto social
dos profissionais que trabalhavam na produção do seriado. Por outro lado, são os temas
mais afeitos a esse contexto privado, da vida íntima, que o seriado explora de modo
semelhante às telenovelas.
A produção inicial imaginara fazer de Malu um sitcom, ou seja, uma comédia de
situação, segundo Daniel Filho numa tentativa de fazer algo semelhante a Mary Tyler
Moore, considerada por ele uma das séries mais importantes da história norte-
americana, e que retrata o dia a dia, inclusive no trabalho, de uma mulher que vive

7
Há assim uma particularidade, que aproxima Malu mais do pioneiro seriado Ciranda
Cirandinha (exibido em capítulos mensais em 1978) do que das outras séries de 1979: a
proximidade social/pessoal entre personagem e seu contexto e a vida pessoal de seus
produtores/autores.
5
sozinha, não é casada nem tem filhos, e tem uma vida profissional ativa e divertida com
seus amigos e colegas de trabalho. Mas pelas entrevistas, este modelo foi rejeitado por
Boni, que indicou que haveria um abrandamento da censura, e propôs algo mais
dramático.8 Malu poderia tratar de temas mais polêmicos porque a censura parecia estar
se abrandando num contexto em que apontava a abertura política.
Apesar dessa impressão inicial, a censura se fará muito presente na produção de
Malu e dos seriados brasileiros. O fato de que a censura libera essa programação inicial
dos seriados, leva-os a ter certeza de que “o Boni tinha razão”: viria a abertura, o
relaxamento da censura. Os seriados são um sucesso, mas manter a produção de Malu
no primeiro ano resultou num longo e constante embate com a censura, e eventuais
mexidas nos textos e imagens de fato exibidos.
Tomando o primeiro episódio da série, nota-se que diversamente do imaginado,
ainda que repleto de alguns mesmos clichês narrativos e de interpretação das novelas, a
mocinha não quer mais o galã, mas quer se livrar dele e de tudo que o casamento
tradicional representa. O final feliz foi invertido – não o casamento, mas a separação.
Este episódio teve um grande impacto, num contexto de produção de televisão nacional
em que há muito pouco tempo nenhuma produção de dramaturgia nacional havia
conseguido mencionar o divórcio como tema – não porque não interessasse aos seus
autores e produtores, não porque parecesse tema de difícil aceitação do público, como o
sucesso de Malu na época comprovou, mas porque a censura não permitia.
No entanto, vários desses temas já estavam lá: as separações e recasamentos
apareciam na TV na produção importada, como filmes, seriados “enlatados”, e também
já há algum tempo no teatro e nas canções da MPB. Basta lembrar o sucesso de Chico
Buarque, “Trocando em miúdos”, no LP de 1978 (que também indica o final da ditadura
com “Apesar de Você”), que poderia muito bem estar na abertura de Malu, não fosse o
fato de que naquela época, Chico não participava das trilhas da Globo. O que pode se
notar aqui é que há, no entanto, um esforço da Rede Globo em descolar sua imagem do
regime militar, e assim começa a inovar nas temáticas, tentando aproveitar o suposto
abrandamento da censura.

8
Daniel Filho, Memória Globo, Depoimento,
http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0,27723,GYE0-5268-268478,00.html , acesso
em 30 de novembro de 2010.
6
Malu e as audiências
Além de ter que negociar com a censura, a produção teve que lidar com as
reações das audiências. O episódio que gerou mais reações negativas – segundo o que se
pode perceber pelas matérias da imprensa escrita do período – foi “Ainda não é hora”.
Este foi aprovado pela censura sem meias palavras, sem sugestões indiretas. Ele é muito
claro em seu discurso favorável à legalização do aborto, de um modo então inédito na
TV brasileira, e que ainda não vi se repetir. O aborto voluntário, como tratado aqui,
nunca mais aparece na tela da Rede Globo a partir desta abordagem de defesa de
direitos das mulheres.
Para chegar neste que foi o quarto episódio, vale relembrar o que veio antes, e
como os espectadores foram se acostumando com a performance questionadora e
alternativa de Malu. No primeiro episódio (“Acabou-se o que era doce”), os
espectadores entram em contato com a história de Malu (Regina Duarte),
acompanhando sua tentativa de conversar com o marido, Pedro Henrique (Dennis
Carvalho), para tentar renovar um casamento que lhe parece ter se tornado uma relação
formal e falsa, tendo perdido seu sentido. Para o marido, “casamento é assim mesmo”,
mas a protagonista busca uma relação mais verdadeira. Os conflitos neste episódio
mostram cenas em que Malu tenta conversar e esclarecer, diante do desinteresse do
marido. Uma destas cenas é recorrente na memória sobre o seriado, como aquela em
que Pedro Henrique joga pela janela do apartamento o texto datilografado que Malu lhe
dera poucos minutos antes. Nesse episódio, a discussão se torna cada vez mais
acalorada até acabar numa agressão física, que o espectador pelos diálogos entende não
ser a primeira. Mas agora Malu avisa: é o fim, não quer aturar as agressões, quer se opor
a uma dupla moral sexual que supõe “natural” que seu marido “dê umas transadinhas
por aí”. Ela não acredita mais, esta não é mais uma relação verdadeira, ela precisa
“respirar” e “sobreviver”.
Os dois negociam a separação diante inclusive da influência de seus pais – os
pais de Malu a aconselhando diante de seus direitos (partilha de bens, 30% do salário do
marido como pensão), a mãe de Pedro Henrique tentando incluir na discussão a herança
de seu marido falecido. Conseguir o desquite significa para Malu inclusive impor-se
diante de sua sogra, ao vincular o pedido dela à sua vontade de definir a separação:
“Assim que a gente assinar a petição para o juiz [do pedido do desquite], eu assino seu
documento [abrindo mão dos direitos de Malu à parte da herança do sogro].” Na
7
conversa entre Malu e sua amiga Vilma (Natália do Vale) depois sobre o acontecido,
novamente algumas frases reforçam ideias centrais reiteradas em todo o seriado:
Malu: Estou aprendendo a me defender, né?
Vilma: Mas é isso que eu sempre te falei. Mulher para viver sozinha tem que
saber se defender.
Malu: Engraçado que homem não tem vergonha de ser agressivo. E mulher tem,
por que ter esse pudor, né?
Elisa: Mamãe, do que é que vocês estão falando, hein?
Malu: Que mulher não tem que ser essa coisinha frágil, indefesa, não. Mulher tem
que saber ser agressiva também de vez enquanto, saber lutar para se defender,
enfim... Vai aprendendo porque a barra é pesada, minha filha.9

É preciso saber se defender, se virar, lutar, impor-se: todo o seriado voltará a


essa ideia inúmeras vezes, e em muitas delas será Malu explicitando essa noção para
Elisa ou alguma outra mulher ou jovem que precisa de sua ajuda. O feminino precisa ser
forte.
Ainda neste episódio Malu e Pedro se aproximam na hora de separarem os
discos, e acabam tendo uma relação sexual que termina melancolicamente. Depois de
finalizarem os trâmites da separação no fórum, a cena final do episódio mostra Malu
sozinha em casa, pés descalços sobre a mesa, sorridente, quando chega sua filha, e senta
ao seu lado. As duas brincam com os pés descalços, numa singela cena de proximidade
entre mãe e filha, em que a câmera mostra os pés em primeiro plano e os rostos
sorridentes das duas ao fundo, dando a sensação de muita intimidade e afeto entre mãe e
filha.10 Depois de vários conflitos para definir e conseguir realizar a separação, a
sensação é de alívio e de certa libertação, como sugere a canção tema.
No segundo episódio, “Bendito Fruto”, escrito por Lenita Ploczinsky, o roteiro
trata da situação de Malu em conflito por ter que dar conta de muitas tarefas, a difícil
relação entre ser mãe, separada, trabalhar fora, cuidar da filha, dar conta das “tarefas do
lar”. Outro tema caro ao feminismo está em jogo: a dupla jornada. Malu angustia-se por
um incidente em casa com Elisa, em que seus pais e a vizinha a socorrem: será que ela
está "abandonando" a filha por trabalhar fora? Por outro lado, tem todo o jargão
sociológico: as tarefas do lar que "não entram no circuito monetário e que portanto não

9
Não cabem neste formato de artigo descrições mais detalhadas do seriado. Algumas imagens
estão disponíveis em www.youtube.com.br. A abertura encontra-se em
http://www.youtube.com/watch?v=FCG7M-fLFHk (acesso em 17de agosto de 2011).
10
Algumas cenas deste episódio, inclusive esta cena final dos pés, podem ser vistas em
http://www.youtube.com/watch?NR=1&v=Ry203gATR-M (acesso em 17 de agosto de 2011).
8
são contabilizadas como parte do produto social", e isso é parte importante do trabalho
feminino. "Qual o ordenado de uma dona de casa?" (ainda que Malu tenha,
irregularmente, empregada doméstica ou diarista). Discute com Dra. Rute, com quem
trabalha,11 como está se angustiando com essa situação, e como se sente culpada por não
dar a devida atenção à filha. Larga o trabalho por um tempo para cuidar melhor de Elisa,
mas isso gera muitos outros conflitos entre elas, e então tenta ensinar a filha a se cuidar,
cozinhar, a arrumar a casa, para não ser "escrava" de Elisa, como a mãe dela foi. Não
quer que a filha seja uma "burguesinha incapaz" – nota-se aqui um vocabulário muito
usado pelas feministas de esquerda, e uma preocupação em fazer algo diverso do que
seria o padrão da geração anterior. Volta a procurar trabalho, e exige que Pedro
Henrique também cuide de Elisa e arrume tempo para ela. Ao final, afirma que se os
filhos são sagrados, o trabalho também é. A moral da história é que, apesar das
dificuldades, é possível fazer as duas coisas: “Se eu conseguir trabalhar e ser mãe é
porque muitas mulheres também poderão fazer o mesmo e isso quer dizer que o sonho
da mulher de ser livre e independente não precisa ser só um sonho. Pode ser verdade."
O terceiro episódio, “De repente, tudo novamente”, escrito por Armando Costa,
fala do prazer sexual e do encontro consigo mesma que o prazer pode significar. É o
episódio que tem a primeira cena de orgasmo feminino na TV brasileira, também muito
lembrado por algumas espectadoras. Neste episódio, a mãe de Malu a vê tomar pílula e
pergunta, inocentemente, porque toma se está separada. A atitude responsável de
contracepção é normalmente tratada no seriado através do uso da pílula
anticoncepcional. Nesta narrativa, Malu tem pela primeira vez uma relação sexual
depois da separação, num envolvimento afetivo que não se desdobra num namoro ou
paixão, mas que é apresentado como uma relação delicada entre dois amigos. A
primeira relação sexual entre eles não é muito boa, mas a segunda gera em Malu um
encontro de si mesma: “Hoje, com você, eu aprendi que posso ser mulher de novo.
Como eu era antes. Você foi o primeiro depois do Pedro Henrique. Eu estou leve,
voando...” É neste episódio que aparece inicialmente a noção do prazer sexual como
realização, encontro de si, como um aspecto muito importante não só na relação entre
duas pessoas, mas como um valor para o sujeito que vivencia o prazer, uma realização.
Tal concepção torna-se posteriormente algo muito reiterado na dramaturgia da Globo,
associada inclusive a certa mudança no padrão sexual, com maior “liberação

11
A menção aqui é a Ruth Cardoso, que foi inclusive consultora para a produção do seriado.
9
feminina”.12 Novamente, esse foi um dos temas caros ao feminismo na época,
particularmente o feminismo mais associadas à classe média: a noção de um direito ao
prazer, o orgasmo como um valor, uma porta de liberação. Mais ainda, neste episódio, a
relação sexual não se restringe nem a uma relação de casamento e nem a um namoro
mais estável, pode aparecer em termos de uma faceta carinhosa e “liberada” entre
amigos.

“Ainda não é hora” – a escolha pelo aborto


O quarto episódio da série, “Ainda não é hora”, escrito por Euclydes Marinho,
trata de uma história de uma gravidez “fora de hora” e do processo de uma jovem que
busca o aborto voluntário numa clínica clandestina, com a ajuda de Malu. Como já
explorado, essa história parece se basear na experiência pessoal ou pelo menos de
geração e de mesma classe social dos autores do seriado, pois relata uma trajetória bem
comum quanto à forma e o contexto que faz com que muitas jovens busquem o aborto
inseguro. Os argumentos ali usados são muito parecidos com o que mostram diversas
pesquisas empíricas sobre aborto no Brasil, no caso de mulheres de camadas médias e
com maior escolaridade, embora a personagem que aborte no seriado seja de camada
popular. É, no entanto, o argumento da escolarização, do desejo de fazer faculdade e se
profissionalizar que explica a decisão pela interrupção voluntária da gravidez. Ou seja, é
um argumento que provavelmente era socialmente próximo dos produtores do seriado.
Também a escolha por uma clínica clandestina é mais cara e elitizada do que outros
métodos ainda mais inseguros, e a narrativa combina melhor com relatos de aborto de
mulheres de camadas médias e altas.
Neste episódio, Malu apenas auxilia, mas o foco é a história de Jô (Lucélia
Santos13), filha do porteiro do prédio. Na cena inicial, Malu conversa na cozinha com
seu Moacir, que tem sotaque nordestino e faz um pequeno serviço na casa de Malu, e
logo se revela ser o porteiro ou zelador do prédio. Malu lhe pergunta o que há com sua
filha, Jô, que anda chorosa ultimamente. Ele reclama que deve ser algo com o namorado
– seu Moacir será uma voz conservadora no capítulo, e já vemos isso nessa cena, em

12
Noutro trabalho já discuti como tais ideias sobre sexualidade e prazer aparecem aqui em Malu
de modo mais didático, ao passo que 20 anos depois, na teledramaturgia, estão naturalizadas e
dadas como óbvias. Cf. Almeida, 2007.
13
Nota-se aqui uma referência na escolha de atores do extinto e então recém exibido seriado
Ciranda Cirandinha, que tratava da vida de jovens vivendo numa república no Rio de Janeiro.
10
que seu Moacir reclama do namorado de Josineide, e diz: “tem dias que eu me
arrependo de ter pelejado tanto para dar estudo para essas meninas. Mulher que pensa
muito termina não dando boa esposa.”
Na cena seguinte, Malu e Elisa estão em casa, toca a campainha, e Elisa abre a
porta para Jô que diz que anda sumida por causa das provas na faculdade. Malu
conversa com Jô no quarto, que ajuda Malu em alguns trabalhos – datilografa textos, e
Malu quer lhe oferecer agora o trabalho de datilografar uma tese de 250 páginas. Ao
longo da conversa, que se torna pessoal, Jô revela seu desespero diante da gravidez não
planejada. Logo de início, Malu refere-se à visibilidade crescente do movimento
feminista e sindical. Aos poucos, nessa cena, Jô vai abaixando a cabeça e sua expressão
torna-se cada vez mais tensa:

Jô: Malu, é daquela da tese sobre o controle da natalidade?


Malu: Não, é uma outra tese sobre mulher operária que, aliás esta dando ibope
agora: tanto mulher como operário. (Olha para Jô e pergunta) Por quê?
Jô: Por nada. É que... é que eu me lembrei de uma coisa, mas deixa para lá.
Malu: Não embroma, Jô, fala.
Jô: É que outro dia, quando eu bati, tinha um capítulo que tratava de aborto.
Malu: Jô, pelo amor de deus! Não vai me dizer que você...
Jô: Não, imagina! É uma amiga minha que está com esse problema.
Malu: É um problema! (Jô baixa a cabeça) Eu conheço ela?
Jô: Não, não conhece ela. É a Alaíde. Nem te falei nunca dela. É lá da faculdade.
Está desesperada. Coitada. (Jô senta na cama, junto à Malu, cabisbaixa)
Malu: Como é que aconteceu, realmente?
Jô: Ela descobriu que estava grávida, mas ela não pode ter esse filho de jeito
nenhum.
Malu: Não pode, por quê?
Jô (irritada, perturbada): Não pode porque não dá! Porque não é casada.
Malu: Casa, ué!
Jô: Mas, não dá para casar agora. É impossível. Não tem condição.
Malu: E o pai da criança?
Jô: É o namorado dela.
Malu: Então?
Jô: Ele nem sabe. Eles são só namorados. Nem noivos eles são. Ele também é
estudante, nem trabalha, nem nada! Nunca pensaram em casamento, que filho!
São duas crianças! (começa a se alterar)

Aqui aparece o primeiro argumento a favor da interrupção da gravidez, muito


usado de fato entre pessoas com maior escolaridade, de camadas médias e altas. Apesar
de serem namorados e de haver um compromisso, uma relação estável que justifique a
prática sexual, “ainda não é hora” para a maternidade e a paternidade. São jovens

11
demais, ainda estão fazendo faculdade, não têm trabalho, uma forma de sustento
econômico para cuidar de uma criança. O diálogo continua:

Malu (irônica): Crianças? Como? Vai dizer o quê? Que não sabiam o que estavam
fazendo? O que é que foi? Foi uma brincadeirinha de papai e mamãe? Foi
brincando de médico que aconteceu? Não sabiam da história da sementinha que
papai coloca na mamãe? Qualquer criança sabe disso. (Malu fala com sarcasmo e
juízo de valor) E a pílula, Jô?
Jô: Ela toma já há mais de um ano, mas às vezes ela esquece e deixa de tomar.
Malu: Deixa de tomar, esquece. Olhe, eu tive um professor que dizia que a gente
esquece só aquilo a que a gente não dá importância. Um terapeuta, um analista
provavelmente diria que esse... esquecimento (indica aspas com os dedos), no
fundo é um desejo inconsciente de ser mãe. (silêncio das duas. Jô fica olhando
para baixo) O velho Freud tinha razão. Ela devia estar querendo esse filho.

Nota-se que a personagem de Malu não é de início favorável aos argumentos de


Jô, e a postura da personagem vai se modificando, tornando a decisão do aborto algo
que vai sendo explicado paulatinamente na narrativa. Vê-se aqui outro ponto que será
muito recorrente neste seriado e mais disseminado na teledramaturgia posterior: certa
popularização de uma visão psicanalítica. O “esquecimento” é revelador – por trás dos
atos e dos pensamentos conscientes (no caso, não querer ter filhos ainda), há sempre um
inconsciente, outra verdade mais profunda. Ao longo desse diálogo que se torna cada
vez mais tenso, veem-se outros pontos que aproximam o caso de Jô das formas de
decisão pelo aborto em mulheres de camadas médias e altas escolarizadas (cf. Ramírez,
2000).
Jô pede que Malu mantenha segredo – “ninguém pode saber”. Outro ponto
comum em narrativas sobre aborto: quando a mulher já está decidida a abortar, a certeza
é que ninguém mais deve saber, para que não haja uma gravidez socialmente
reconhecida. A relação de Jô com o pai a faz ter certeza de que é preciso manter um
segredo – tanto da gravidez, como da sua já inferida decisão de não levá-la adiante. Ela
teme que seu pai reaja de modo violento. Malu insiste então para que ele pense melhor.
Jô tem, portanto, mais um problema a enfrentar: a moralidade sexual e o
conservadorismo de seu pai. Aos poucos, os motivos que justificam uma decisão pelo
aborto tornam-se mais evidentes.
No limite, o episódio coloca a posição feminista e mais associada aos discursos
sobre aborto em camadas médias de alto capital cultural: só a mulher pode decidir, e
essa decisão, pessoal, é algo complexo, que envolve diversas questões. Mas é uma

12
decisão individual, que a mulher deve tomar. Mesmo assim, Malu retoma noutra cena a
ideia de que Jô deveria discutir o tema com o namorado, mas é dissuadida pela
explicação de Jô de que os pais de Jorginho não aceitam o namoro, porque ela é apenas
a filha do porteiro.
Predominam as gírias da época, e Jô diz que Jorginho “enfrenta uma barra” com
seus pais. A ideia de que a situação é uma “barra” serve para tratar de diversos temas e,
neste caso, para revelar o preconceito que o casal enfrenta. Na verdade, pessoas
mesquinhas, hipócritas, o machismo, os preconceitos (de vários tipos) são sempre os
principais “vilões” dos dramas vividos por Malu e por outras mulheres com quem ela se
solidariza no seriado. Além disso, Jô explica que os pais do namorado acham que ela
quer dar o “golpe do baú” casando-se com ele, e que ele, por reação, pode querer casar
apenas para “agredir a família”. A ideia de um casamento “antes da hora certa” também
parece um problema, inclusive problema que Malu viveu (e apareceu no primeiro
episódio que ela casou-se por ter engravidado), e o caso de Malu serve de mais uma
justificativa para que Jô decida pelo aborto:
Malu: E se ele quiser casar, meu Deus? Qual é o grilo?
Jô: Malu, olha para mim. Eu tenho cara de mãe?
Malu: E para ser mãe precisa ter cara? Eu fui mãe com a tua idade. Eu tinha 19
anos. O que é que é? Você já está com 18?
Jô: Mas era diferente. Você já estava casada, você queria ter um filho e o teu
marido já estava formado, trabalhava.
Malu: O quê? A Elisa nasceu três semanas antes do Pedro Henrique se formar. Foi
aí que ele começou a vender apartamento.
Jô: E foi também, segundo o que você mesma me contou, que começou toda a
frustração porque ele deixou de batalhar em economia, que era o que ele curtia,
para sustentar a mulher e o filho. Ah, não, muito obrigada. Sabe o que é, Malu?
Eu não posso obrigar Jorginho a abandonar o curso de arquitetura, que é a paixão
da vida dele, para arranjar um emprego e amanhã ser um cara infeliz. Ah, não, de
jeito nenhum.
Malu: Faz sentido, está certo. Faz sentido. De qualquer forma, é tão complicado...
Um cafezinho para levantar?

A convenção de “normalidade” do contexto do Malu: um cafezinho, uma


conversa na cozinha, onde Jô conta que ela também não está preparada para ser mãe e
tem outros planos antes de se casar, afinal “as coisas têm o seu tempo”. Mesmo assim,
Malu insiste “Tá. Eu concordo. Eu só não entendo como você pode ser tão objetiva,
racional. Não te toca? Não te emociona saber que tem uma vida que está se
desenvolvendo dentro de você?” Jô chora, não é uma decisão fácil:

13
“E você pensa que para mim é fácil? Você pensa que eu também não queria ter o
meu canto, ter um cara dividindo a vida comigo? Os meus filhotes brincando com
as galinhas no quintal, tapetinho no banheiro... Só que ainda não é hora. Eu sei
que não é. Sabe o que é Malu? A vida já me deu muito cacete. Meu pai já me deu
muito cacete. Tudo que eu consegui foi com muito esforço e eu não quero perder.
Eu não quero perder agora. Eu não quero perder o Jorge e também não quero que
ele se perca por causa de um esquecimento meu. (...) Por isso é que eu preciso que
você me ajude.”

E assim Malu leva Jô na sua consulta ao seu ginecologista, mas Dr. Pompeu não
apenas se recusa a ajudar no aborto, como avisa do perigo do procedimento e ainda
aconselha Jô a aceitar a maternidade, como “a função psico-biológica da mulher.” Este
personagem permite certo debate ao tema, e traz o outro ponto de vista, os argumentos
opostos ao de Malu, a visão mais tradicional quanto ao tema. Depois revela seus
princípios católicos: “A vida é uma dádiva de Deus e dela só ele pode dispor”, e
desconversa lembrando suas outras pacientes que o esperam. Ainda afirma que se ela
levar a gravidez adiante pode contar como ele como obstetra.
Jô conta que sua prima conhece uma clínica que não deve ser tão cara, pois a
prima também é “dura” como ela. Não é Malu que conhece esses meandros da
ilegalidade – embora ele ajude a amiga, sua ingenuidade em alguns momentos será
destacada, e é parte central na construção de um personagem “do bem”. Jô precisa que
alguém venha junto, e pede a Malu que a acompanhe. Na entrada na clínica, um lugar
apertado, vários casais, todos tensos, as mulheres são chamadas pelo número da ficha –
umas entram, outras saem. Ouvem-se conversas em off, com closes em Malu e Jô,
dando a impressão que, para algumas mulheres que esperam na sala, o aborto virou um
procedimento corriqueiro.
Jô tem medo do que pode acontecer, mas não hesita na decisão. O diálogo com o
médico (Cecil Thiré), o tom da conversa, as instruções – as falas curtas parecem dizer
muito, são bastante verossímeis no contexto das clínicas. Vê-se Jô na sala, deitando na
maca, pronta para a intervenção. O médico, enquanto seca as mãos, lhe diz: “Você tem
certeza que você quer desistir dessa coisa maravilhosa que é ser mãe?” Jô sempre com
ar preocupado, ansioso, afirma que sim e ele diz que entende, pois cada um tem suas
razões, em seguida, aconselha e indica o remédio que ela deve tomar depois.
O médico dá as instruções para que Jô se deite na maca, e ela se coloca em
posição ginecológica. O enfermeiro se aproxima para dar anestesia. Nessa parte não há
fala, só uma música, como de suspense. Passa a imagem do enfermeiro ou anestesista
14
apertando o braço com um elástico para procurar a veia, e aplicando a injeção. O
enfermeiro: “Respira fundo. Agora você vai contar de 10 para 0, de trás para frente.
Vamos, vai... 10, 9...” e Jô começa a contar. Malu espera, aparentemente preocupada
(ou aflita?) na sala de espera.
Jô está adormecida na sala de intervenção. O médico coloca uma pinça com
sangue, junto com o instrumental usado – o único objeto ensanguentado é a pinça que
deixa, o resto está limpo. Há uma música de suspense. Vê-se o médico (da cintura para
cima) num movimento como de curetagem, mas olhando para o rosto de Jô, não para a
área genital. Enquanto isso Malu espera, fuma um cigarro ao lado de um homem
nervoso que também fuma, e como Jô demora a sair, se aflige. Entra de repente uma
mulher vestida de branco e pergunta quem está com a moça 20. Malu vai aflita,
encontra Jô meio sonolenta ainda, e acaba tendo uma discussão com o médico, que
explica que Jô está bem, mas que teve que tomar mais anestésicos, por isso, demorou
mais a acordar. Malu acaba discutindo com o médico, exigindo quase de modo ingênuo
que ele se responsabilize pelo estado da amiga.
Malu (irritada): Esta pensando que é assim? Faz barbeiragem com a menina e
depois vai mandar embora, assim chutando? A gente só sai daqui depois que o
senhor se responsabilizar pela saúde dela.
Jô: Deixa para lá, Malu.
Malu: Como deixa? com essas coisas a gente não pode brincar. Não se pode
brincar com isso.
Médico (também irritado, interrompe Malu): Onde é que você pensa que está?
Malu: Eu pensava que estava diante de um médico, mas agora estou vendo que
não, embora sua consulta tenha preço de catedrático.
Médico (sorrindo de modo irônico): Você é engraçada. (muda a expressão, passa
para a irritação) Veio aqui porque ninguém aí fora quis resolver teu problema,
ninguém quis fazer o serviço sujo. OK, eu faço. Eu corro o risco, mas as regras do
jogo são estas.
Malu: O que é que o senhor esta pensando?
Médico: Espera aí, que ainda eu não acabei! Você acha caro 2.500 cruzeiros para
livrar sua amiga de uma situação penosa? Tem gente que cobra menos, tem gente
que cobra mais. Eu já ouvi falar em 20.000 para moças da nossa sociedade. Meu
preço é esse. O preço do risco, ou você pensa que a impunidade lhe vai sair de
graça? (o médico sai)
Malu: Devia chamar a polícia.
Médico (voltando): Devia, mas não vai. Sabe por quê? Porque diante a lei, a sua
amiga é tão culpada quanto eu. De um a três anos de cadeia. Só por isso! (vai
embora)

Estrito senso, o médico é mais criminalizado do que a mulher, a pena é maior


para ele. 1 a 3 anos seria a pena dela. Mas a fala dele explicita: é crime, tem pena, ela
15
também é culpada perante a justiça. As mulheres são portanto criminalizadas e esse é
um ponto que deixa Malu indignada.
Jô sente-se mal na casa de Malu, reencontra o namorado (Fábio Jr.), para quem
conta toda a verdade. Jô diz que “tirou” um filho deles – ele pergunta por que ela não
lhe contou, e diz que vai lhe dar todo o apoio, é carinhoso e gentil, mostra-se
preocupado com ela. Enquanto Malu deixa os namorados conversando, em seu quarto, o
pai de Jô, o zelador Moacir, toca a campainha para pedir a chave do carro de Malu, mas
ela entende mal a chegada de seu Moacir e acaba contando que Jô está no seu quarto,
Moacir entra no quarto e fica espantado com a cena, sua filha sentada na cama ao lado
do namorado, e reage de acordo com sua moral, falando com sotaque nordestino:
“Joseneide! Mas, que pouca vergonha é essa! Levante dessa cama!” Malu explica que
ela não está bem que já chamou o médico, mas mesmo assim seu Moacir tenta agredir
Jorginho, perguntando o que ele fez com sua filha. Volta-se e segura os braços da filha:
Jô: Me larga, me larga, porque eu não sou cachorra. Sou sua filha e o senhor não é
dono de mim. (se solta com força das mãos dele) Me larga, me larga!
Moacir: Mas o que foi que ele fez com você?
Jô: O Jorginho não fez nada comigo. Nada que eu não quisesse. Eu não sou a
menininha indefesa que eu senhor quer que eu seja. Não! Não sou uma panaca que
nem minhas irmãs, que o senhor transformou em escravas. Não. Não senhor! Eu
tenho vontade própria. O meu mundo não é seu mundo.

Há aqui um evidente conflito de gerações em torno de construções e normas de


gênero, família e moral sexual, do tipo que foi mais explorado em Ciranda Cirandinha,
aliás, com estes mesmos atores, Lucélia Santos e Fábio Júnior. Diante da cena dramática
que se montou no quarto de Malu, Jô resolve então “contar tudo” ao seu pai, numa
postura muito semelhante à sinceridade da própria Malu: “Não, espera aí. É melhor o
senhor ficar sabendo de tudo, porque assim a gente não tem nada que fingir.” É uma
posição muito semelhante à de Malu em termos de ser uma pessoa sincera e
transparente, que não tem sentimentos fingidos, que é franca e honesta. Esse tipo de
franqueza e honestidade das personagens é muito usado na oposição maniqueísta entre
personagens que são do “bem” por oposição àqueles cujas intenções e interesses são
dissimulados, configurando certa matriz melodramática que permeia as narrativas da
mídia contemporânea.14

14
Discuti mais longamente esse tema em Almeida, 2007. Retomo esta temática abaixo.
16
Malu tenta adiar a tal conversa, mencionando que não é o melhor momento, que
Jô não está bem. Mesmo assim Jô insiste, e a reação de seu pai é agressiva – tenta bater
nela, Jorginho se interpõe, Jô ameaça agredir o pai. Jorginho e Malu tentam acalmar a
situação. A chegada do Dr. Pompeu rompe a cena um tanto melodramática, mas que dá
o tom que parece surgir ao final quanto à história de Jô. Depois de fazer o aborto
escondido inclusive por temor desta reação do pai, Jô rompe com o pai, o enfrenta
abertamente – prefere a sinceridade ainda que isso lhe custe ter que sair da casa paterna.
É como se o episódio inteiro fosse o processo de afirmação de Jô enquanto adulta – uma
espécie de rito de passagem, com marca corporal. A gravidez e o aborto clandestino
aparecem como decisões de um processo de amadurecimento.
O médico afinal diz, depois de examinar Jô, que está tudo bem, e que ela vai
ficar bem. Mas adverte que o que elas fizeram é uma loucura e muito arriscado, e então
Malu dá o seu recado:
Médico: Não foi por falta de aviso. Essas clínicas, se é que se pode chamar de
clínicas, são espertos, um bando de irresponsáveis.
Malu: Mas o que é você pode fazer? Enquanto não for legalizado, as infelizes das
mulheres estão nas mãos deles, mesmo. Todo mundo condena, diz que é crime,
diz que é pecado, mas, na hora, todo mundo fecha os olhos porque um dia pode
precisar. Isso chama-se hipocrisia.
Médico: O chamado mal necessário.
Malu: Mas, então, se é necessário, se é uma coisa inevitável, porque não legalizar?
Por que não tornar menos sórdido, mais civilizado? Ah!

Ainda há uma cena em que Jô conta a Malu seus planos de se casar e ter filhos,
“como todo mundo”. Jô cozinha delícias e associa o fato de cozinhar à maternidade, a
alimentar outra pessoa, e sonha em ter muitos filhos e cuidar deles. O fato de abortar
significa apenas adiar a maternidade. O que permite certo tipo de discurso que aparece
muito no seriado, e pode ser lido como menção à abertura e a alguma mudança política:
Jô: Eu sempre gostei muito de cozinhar. Eu não sei se é porque minha mãe morreu
logo, e logo menina fiquei sendo a cozinheira da família, mas cozinhar é uma
coisa que me dá muito prazer, sabe? Assim... alimentar as pessoas. Eu acho que é
uma coisa meio de mãe. Acho uma coisa da mulher, né? De alimentar as crias.
Malu: Cuidado hein? Se as patrulhas feministas te ouvem...
Jô: Feminista, eu também sou. Aliás, qual é o cara sensato que não é, né? Só que
sem essa de cortar meu barato de mulher. Claro que eu vou querer cozinhar para
meu homem, só que por obrigação é que fica chato. Lá em casa vai ser tudo
dividido, todo mundo vai fazer todo: mãe, pai, os filhos.
Elisa: Ué! Eu pensei que não queria ter mais filhos!
Jô: Eu quero no mínimo seis, mas não agora.
Elisa: Nossa tudo isso? Tudo com Jorginho?
17
Malu: Eu acho que é isso aí. Tem mais é que ter muito filho, sabe? Este país é
muito grande, tem muito lugar para plantar... E sem essa de fome. Não me
venham com o fantasma da fome. Agora vai ter que abrir, vai ter que abrir,
mesmo. Vai ter que dividir. Mas aí é fogo. Enquanto isso não acontece, tome o
controle da natalidade.

O termo “controle de natalidade” destoa aqui, está mal colocado: Malu deveria
falar em planejamento familiar, e não “controle”. Mas veem-se aí as entradas em que as
personagens se afirmam como feministas, mas negociam com certas construções de
gênero mais tradicionais: a mãe que alimenta, “coisa de mulher”, inclusive
essencializando a característica. Mas com ressalvas que demandam a divisão do
trabalho doméstico.
O episódio termina com Jô saindo do apartamento de Malu decidida a conversar
com seu pai para conversar, explicar, tentar reatar. Se ele a aceitar de volta, ela volta a
morar com ele. Quer fazer as pazes, pois ainda não queria ter que sair de casa, afinal,
por isso inclusive fez o aborto. Mas se não der certo, terá que “encarar”. Não se sabe,
ainda neste episódio, o que aconteceu, ele termina em aberto. O público só saberá ao
longo dos episódios que depois seu Moacir e Jô reataram. Nessa tomada de posição
favorável à legalização do aborto, o seriado foi de fato bastante ousado e talvez único na
história da TV brasileira. O “crime” é a legislação restritiva.
Como em outros episódios, a narrativa tem um tom moral, e há certa
discursividade tanto nas falas de Malu como no desdobramento das cenas, com um tom
consideravelmente pedagógico. Como já mencionei noutros trabalhos, a narrativa
melodramática parece se adequar muito bem a estes estilos de narrativas que parecem
visar um aspecto quase didático, de expor e defender certas posturas políticas.
Uso o termo melodrama a partir das contribuições de Peter Brooks (1976) e da
forma que sua reflexão sobre a literatura é transposta para o cinema e a televisão na
análise feita por Ismail Xavier (2000 e 2003). Brooks propõe uma análise da literatura
que percebe uma “imaginação melodramática” por trás de narrativas consideradas
“realistas” (especificamente de Henry James e Balzac). Para este autor, o melodrama é
um formato com certo caráter pedagógico típico de uma sociedade pós-sagrada
(moderna). Outras análises sobre o melodrama (cf. Thomasseau, 1989 e Meyer, 1996) já
ressaltaram seu caráter pedagógico, e como neste formato podem caber ideologias
distintas, no aspecto político, por exemplo, podendo tender tanto à direita como à
esquerda. Para Brooks, a base do melodrama consiste num drama moral, que toma o
18
comum, o ordinário e a vida privada como tema, classifica entre o bem e o mal, e faz
uma narrativa de embates cuja moral final traz uma “cola social” necessária, repõe
valores comuns. Nas palavras de Ismail Xavier:
"Vale mais, para Brooks a constatação de que o melodrama substitui, digamos
assim, o gênero clássico porque a nova sociedade demanda outro tipo de ficção
para cumprir um papel regulador exercido agora por esta espécie de ritual
cotidiano de funções múltiplas. Se a moral do gênero supõe conflitos, sem
nuanças, entre bem e mal, se oferece uma imagem simples demais para os valores
partilhados, isto se deve a que sua vocação é oferecer matrizes aparentemente
sólidas de avaliação da experiência num mundo tremendamente instável, porque
capitalista na ordem econômica, pós-sagrado no terreno da luta política (sem a
antiga autoridade do rei ou da Igreja) e sem o mesmo rigor normativo no terreno
da estética. Flexível, capaz de rápidas adaptações, o melodrama formaliza um
imaginário que busca sempre dar corpo à moral, torná-la visível, quando esta
parece ter perdido seus alicerces. Provê a sociedade de uma pedagogia do certo e
do errado que não exige uma explicação racional do mundo, confiando na
intuição e nos sentimentos ‘naturais’ do indivíduo na lida com dramas que
envolvem, quase sempre, laços de família." (2003: 91, itálicos no original)

Todavia Xavier destaca que ao longo do século XX as mudanças sociais


promoveram um imaginário marcado pela psicologia moderna e pela lógica de uma
sociedade capitalista e de consumo. Em muito da produção cultural contemporânea, o
conflito entre bem e mal é explicitado na oposição entre pessoas autênticas e hipócritas.
Estas convenções narrativas acerca da oposição entre bem e mal em seus novos e
discretos formatos que Xavier destaca é evidente em Malu Mulher.15

Reações – negociando os sentidos morais das narrativas


Este foi o episódio que parece ter gerado mais polêmica na imprensa escrita,
mesmo no caso de jornalistas que se demonstravam admiradores declarados do seriado,
como o colunista do Jornal do Brasil Artur da Távola. Este chocou-se com o episódio
sobre o aborto, no qual “teria ocorrido um erro grave e um retrocesso”. 16 No seu ponto
de vista, o erro grave teria sido por parte de Euclydes Marinho (o autor) em tratar o
problema do aborto “de forma superficial e juvenil”, fazendo uma “apologia do aborto
legal”. Távola diz ser contra o aborto, embora o respeite como um assunto sério. O que
o incomoda foi uma “trama incoerente e absurda”, que mistura boas ideias e tomadas de
posição românticas. Para ele, houve apenas um “proselitismo do aborto legal”. O lado

15
Cf. Almeida, 2007.
16
Matéria publicada em 19 de junho de 1979, sob o título “Maluranda, malurandinha”, fazendo
referência ao seriado Ciranda Cirandinha exibido em 1978.
19
positivo foi a denúncia contra as clínicas brutais e ilegais e o fato de a televisão estar
discutindo um tema como esse, o que um ano antes teria sido impossível.
Na Folha de São Paulo uma crítica sobre esse episódio, “Malu Mulher” provoca
polêmica (publicada em 17/06/1979), traz uma postura favorável ao episódio e outro
comentário indignado pela defesa da legalização, trazendo dois pontos de vista opostos.
No Jornal do Brasil, uma carta de uma leitora17 que se mostra indignada e chocada com
o episódio o qualifica como uma “propaganda do aborto”, que iria contra o “Ano
Internacional da Criança”, e estaria desafiando o amor mais puro (o amor materno),
defendendo um ato que vai “contra os planos de Deus”.
Há também uma reação indireta positiva. Não explicitando nenhum comentário
ao seriado, uma ampla matéria da Folha de São Paulo sobre abortos no Brasil é
publicada pouco depois desse episódio (em 29 de julho de 1979). Com a chamada
Brasil, mais de 3 milhões de aborto por ano, tenta trazer um panorama sobre as clínicas,
as consequências e sequelas da proibição, abrangendo vários aspectos do tema.
Indiretamente, a matéria parece favorável à legalização, ou pelo menos à
descriminalização. Diversamente do seriado, cujo conteúdo foca numa história
particular e discute de modo pessoalizado a temática, o jornal enfatiza os temas mais
associados à saúde pública e às consequências sociais da proibição, associando a
legislação restritiva às mortes maternas (cerca de 340 mil ao ano) e ao custo do aborto
ilegal em clínicas clandestinas.
Os profissionais da produção são cobrados publicamente por este episódio, e
tentam relativizar a postura que parece predominar na narrativa. Quando Daniel Filho é
perguntado diretamente por um jornalista18 como tivera a coragem de colocar no ar um
episódio que fazia uma “apologia ao aborto”, ele nega, dizendo que Malu seria contra o
aborto e que, se entenderam isso, não houve essa intenção. No entanto, é evidente que
no episódio Malu defende a legalização, embora tenha inicialmente questionado Jô se
ela não queria mesmo ter o filho e se não deveria contar ao namorado sobre a gravidez
antes de tomar uma decisão. O entrevistador pergunta por que não foi a própria Malu a
viver o problema do aborto. Daniel Filho responde que a personagem da Malu tem um
tipo de consciência que a impediria de ficar grávida e de ter que fazer um aborto. Ela
tem uma consciência racional, e dá exemplos de falas da Malu nos episódios. O

17
“Aula de egoísmo”, 22 de junho de 1979, escrita por Cláudia Beatriz Agueda.
18
“‘Malu Mulher’ em debate”, O Globo, 19/07/1979
20
entrevistador pergunta se não foi por medo do que iriam pensar da ‘namoradinha do
Brasil’ fazendo um aborto. Daniel filho responde que não, pois Malu é contra o aborto.
Neste ponto, como em outros episódios, é evidente que o seriado permite certa
negociação de sentidos: o texto da personagem Malu é direto e favorável a uma
“legalização”. Mas quem “fala” também através de Malu é outra persona pública:
Regina Duarte. Esta atriz representa também uma persona pública, típica das “estrelas”
e celebridades. A imagem pública da doce e bela mocinha foi predominante na carreira
da atriz, que veio de uma de família sem recursos do interior de São Paulo, entrou para a
televisão através da publicidade para a Kibon, estreando em novelas com 18 anos como
uma das protagonistas, em Véu de Noiva (1965), de Ivani Ribeiro na TV Excelsior.
Regina que havia sido a ingênua e doce Ritinha em Irmãos Coragem (1970), par
romântico do então galã Claudio Marzo, havia personificado também a Patrícia, de
Minha Doce Namorada (1971), de onde ganhara o apelido de “namoradinha do Brasil”,
então promovido pela indústria cultural e seu star system.19 Some-se a estes
personagens, a sofredora Simone de Selva de Pedra (1972), a meiga Cecília de
Carinhoso (1973) e a pacificadora Bárbara de Fogo sobre Terra (1974-75), sempre a
boa moça e par romântico de atores-galãs. Em 1977, a atriz tenta, aos poucos, mudar um
pouco sua imagem pública, vivendo a personagem título questionadora e quase
feminista de Nina, novela das 22hs. Sua persona pública era, apesar de Nina, ainda a de
“namoradinha” – boa e bela moça, sempre do lado do bem nas tradicionais oposições
maniqueístas das telenovelas. De certa forma, me parece que essa imagem de Regina
Duarte, que tanto permeia Malu, só muda um pouco a partir da viúva Porcina, em
Roque Santeiro (1985).
Inclusive, tenho argumentado que é só porque Regina Duarte tinha essa imagem
que tal discurso abertamente feminista sobre o aborto – tema ainda tabu – pôde ser feito,
e inclusive foi “liberado pela censura”. É importante ver que o público também interpeta
o seriado de seu próprio modo, assim como lembra e remete à imagem pública de

19
O nome star system vem da produção de um sistema de promoção de certas personalidades
públicas, principalmente atores, que foi muito explorado pelos grandes estúdios de Hollywood
nos anos 1930 e 40. Evidentemente toda indústria cultural com base comercial faz isso, e no
Brasil, desde os grandes sucessos do rádio, também a vida pessoal das estrelas (cantores) era
objeto de fofoca pública e promovida pela imprensa escrita. Por vezes, através de seus dramas
pessoais, como separações e recasamentos, a imprensa promovia tanto as estrelas como os
produtos culturais dos quais tais atores participavam. Sobre o star system de Hollywood, cf.
Schatz, 1991; sobre o efeito de tal sistema na promoção dos filmes de Hollywood no Brasil, cf.
Almeida, 1995.
21
Regina Duarte. Algumas entrevistadas, todas mulheres de camadas médias e populares
urbanas, quase todas afirmando-se contra o aborto inclusive por motivos religiosos,
interpretam, numa entrevista individual em suas residências, essas imagens.
A ideia inicial era entrevistar pessoas, especialmente mulheres, que pudessem ter
assistido ao seriado na época de sua exibição (1979-1980), e que revissem um ou dois
episódios em entrevistas consecutivas. Como o seriado foi reprisado em outras ocasiões
(o primeiro episódio foi reprisado em 1985, e em 1995, no Festival 30 Anos da Rede
Globo, foram reexibidos vários episódios), e como as entrevistas com mulheres mais
jovens pareciam render também uma boa discussão, ampliei o recorte. Comento aqui
algumas entrevistas nas quais além de discutir a trajetória pessoal e as lembranças
eventuais que tinham de Malu Mulher, há uma discussão mais aprofundada sos
episódios “Acabou-se o que era doce” e “Ainda não é hora”.20
O objetivo dessas entrevistas é tentar me aprofundar nos sentidos produzidos
pelo seriado e como circulam socialmente. Como já se sabe, a partir de vários estudos
de recepção, inclusive a minha própria pesquisa, o contexto e a trajetória do espectador
informam sua interpretação dos bens culturais, especialmente no caso das narrativas
dramáticas.21 Mas a análise deve levar em conta a relação intersubjetiva criada no
próprio contexto da entrevista.22 Algumas vezes, a entrevistada tenta dizer o que parece
que a entrevistadora espera dela, e por outro lado, sua reflexão é promovida pelas
perguntas e pelo arranjo da entrevista, além de evidentemente ser provocada pelo
episódio assistido na segunda parte da entrevista. Nesse sentido, por exemplo, é preciso
entender o esforço de algumas entrevistadas em explicar, especialmente quando quem
entrevista são as jovens bolsistas de cerca de 20 anos, como tudo era diferente “na sua
época”. Alguns comentários abaixo serão feitos considerando muitas vezes a
expectativa que a entrevistada imagina que se tenha. Tal processo foi mais marcante na
segunda rodada de entrevistas, sobre o episódio do aborto, que é o trecho que enfatizo
aqui. Nesta segunda rodada, foram feitas por enquanto apenas 4 entrevistas.

20
Essas entrevistas estão sendo feitas por mim e por bolsistas de graduação, com apoio da bolsa
“Ensinar com pesquisa” (USP). São conversas de cerca de 2hs, ou mais, com roteiro, gravadas,
e nas quais se assiste e discute um episódio. Agradeço às bolsistas, Crisliane Falchetti e Mariana
Chamorro, ambas alunas de Ciências Sociais da USP.
21
Conferir Almeida, 2003; Abu-Lughod, 2005; Ang, 1990 e 1996; Hall, 1980; La Pastina, 1999;
Leal, 1986; Mankekar, 2002; Prado, 1987; Tufte, 1992.
22
Sobre essa questão, e uma reflexão metodológica sobre o trabalho etnográfico, cf. Rabinow,
1984.
22
Muitas das entrevistadas já se lembravam de Malu Mulher ou de ter assistido
algum episódio, e por isso foram selecionadas. Variam entre as faixas etárias de 35 a 64
anos, com renda familiar entre 2 mil a 8,5 mil reais mensais. Uma delas é solteira, todas
as outras já se casaram pelo menos uma vez. Quase todas têm filhos, exceto a mais
jovem, que se casou grávida, perdeu esse filho, e depois se separou. Ainda assim, há
alguns pontos em comum, e é possível fazer algumas generalizações. A maior parte das
entrevistas estão sendo feitas na casa da entrevistada e muito de sua vida pessoal e estilo
está sendo considerada na análise, numa perspectiva etnográfica. Os contextos serão
apenas mencionados na medida em que ajudam a elucidar algumas tendências mais
gerais ou que explicam a forma de interpretar o seriado da entrevistada.
Uma delas é mãe solteira, outra é viúva, quatro estão casadas e quatro são
separadas (usam as palavras separada, divorciada ou desquitada). Quatro delas contam
que se casaram porque engravidaram, duas delas sentiram-se “forçadas” a casar pela
situação da gravidez e a reação de suas famílias. Nenhuma delas teve informações sobre
sexualidade dentro de sua família, sempre foi fora de casa, com amigas, leituras
(enciclopédia, livros, revistas), rádio ou TV. Algumas das que têm mais de 40 anos
afirmam que qualquer coisa relacionada a sexo era uma “vergonha”, ou que não se
falava jamais nisso em casa.
Todas estudaram em escolas públicas, e das que fizeram universidade, a
graduação sempre foi feita em faculdades privadas (mesmo para as duas que fizeram
pós-graduação). Em todos os casos, os pais tiveram menos estudo do que elas,
mostrando uma notável diferença geracional em termos de estudo. Há arranjos
domésticos bem variados. Das quatro que se casaram grávidas, duas delas o fizeram em
situação de hipergamia social, e foram acusadas pela família do marido de terem dado
(ou tentar dar) “o golpe do baú”. Nenhuma delas relaciona tal fato ao casamento de
Malu, que é mencionado no seriado como tendo sido impulsionado pela gravidez.
Destas que se casaram grávidas, duas se separaram, uma ficou viúva e outra permanece
casada ainda que destaque com veemência na entrevista que lutou muito para mudar o
estilo do casamento, afirmando que não teve coragem de se separar por motivos
financeiros.
Filhos são amados, mas são fonte de preocupação e trabalho. Separar-se e ter os
filhos mais velhos pode gerar um momento de maior “libertação”, não só do marido,
mas dois cuidados com as “crianças”. Uma delas chega a afirmar que se pudesse voltar
23
atrás, só teria tido o primeiro filho – mas ela tem 4 filhos e foi a única que se declarou
favorável a uma legislação mais liberal quanto ao aborto. Três delas perderam algum
bebê – uma teve um aborto espontâneo, outra acusa um mal-atendimento durante o 6º
mês de gestação, e outra perdeu de modo trágico um filho no parto. As que nunca
engravidaram ou perderam filhos são as que se declaram mais contrárias ao aborto –
mas nem todas elas viram o episódio.
Algumas ideias são consensuais e mencionadas por todas ou quase todas, de
modo muito recorrente. Todas destacam, no momento em que a entrevistada pergunta se
ela assistiu a Malu Mulher, ou depois, na hora em que assistem ao episódio, como ser
“desquitada” era foco de preconceitos e dificuldades extremadas naquela época, mas
que hoje tudo mudou muito e já é “corriqueiro” que um casamento infeliz seja desfeito.
É inicialmente nesse sentido que o seriado surge como algo “corajoso”, que trata de
“tabus” na época, ou de coisas que eram “proibidas”. Todas também destacam que já se
tornou “corriqueiro”, “normal”, comum a separação e a decisão feminina dessa
separação – mas isso não impede que os processos pessoais de separação vividos por
elas sejam apresentados como complexos e difíceis.
A autonomia ou independência feminina é algo positivo, “maravilhoso”,
“necessário”, o que é afirmado mesmo por mulheres que nunca se sustentaram
economicamente sozinhas. É senso comum que a mulher deve ter ou buscar uma
profissão, e uma forma de renda que lhe dê autonomia diante do companheiro. Algumas
delas só terminaram a escola depois de adultas, fazendo supletivo, ou fizeram faculdade
depois de casadas e com filhos. Destacam a educação como um valor, todas tendo tido
mais educação formal do que seus pais. Muitas revelam que tiveram que lutar contra o
controle do marido para estudar, e algumas afirmam que tiveram que lutar contra seus
pais para estudar um pouco mais. Duas delas deixaram a casa dos pais ainda
adolescentes para trabalhar como domésticas, em casa de família, numa situação que
hoje lhes parece análoga à escravidão, já que muitas vezes sequer recebiam algum
salário, trocando serviço por moradia.
Todas consideram que a divisão do trabalho doméstico, do cuidado com os
filhos e sustento da casa deve ser dividida igualmente, numa relação ideal. Isso quase
nunca ocorre, a maior parte dos relacionamentos é lembrada como sendo desigual nesse
aspecto. Uma boa relação ou a fase boa de um casamento já desfeito são mencionadas
como tendo um companheiro que não só “ajuda”, mas divide tais tarefas. Nesse sentido,
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quase todas afirmam que hoje em dia é possível sair do arranjo “mulher dona de casa” e
marido que só trabalha e não ajuda dentro de casa. Uma delas é o sustento de casa, ao
passo que o marido cuida da casa, e outra afirma que “já viveu essa fase”, e duas
mencionam o casamento de uma filha e um genro em que ele fica em casa, cuida das
crianças, e a filha trabalha fora, o que consideram “normal” e “bom”. Ser o sustento da
casa e ter um marido que faz as tarefas domésticas e cuida das crianças é positivo, um
bom complemento.
Celina tem 56 anos, casou-se aos 28, teve duas filhas (com as quais mora hoje),
é bancária aposentada, mas ainda trabalha, e faz faculdade à noite. Expressa uma
opinião e comum às outras entrevistadas quando se discute aborto – são contra, exceto
nos casas reconhecidos por lei como estupro e risco de vida. Como outras, conta casos
de mulheres que foram mães muito jovens, resolveram ter, e não “se arrependem”.
Aborto é tirar uma vida que de certa forma não lhes pertence: “O direito à vida não
pertence nem à mãe e nem a ninguém, pertence a Deus”. Mas os casos de estupro ou
risco de vida não são discutidos do mesmo modo.
Todas as entrevistadas que viram este episódio numa segunda entrevista, já
tinham um pouco mais de familiaridade com a entrevistadora. Duas delas afirmam que
Jô não deveria ter tirado, que vai ter que sair da casa dos pais de qualquer modo, que ela
não foi firme e que errou em não contar ao namorado. Mas também acabam
encontrando alguma brecha para dizer que o episódio mostra também os aspectos ruins,
e algumas, como Celina, até consideram que Jô se “arrependeu”. Para Celina, inclusive
Malu agiu mal, mas “compreende” a atitude das personagens na medida em que agiram
“por desespero”. Como tenho reiterado, as pessoas interpretam por vezes de modo
particular, mas não aleatório – é como se aproveitassem as brechas e ambiguidades do
próprio texto, e também como se negociassem com a opinião contrária que por vezes
parecem imaginar que a jovem entrevistadora tem. O final em aberto do episódio deixa
algumas espectadoras em suspenso, e lhes permite supor finais futuros distintos da
interpretação que eu fiz acima. Do meu ponto de vista, o episódio não é tão aberto, não
parece nem um pouco “arrependida” a cena de Jô sorridente dizendo que ainda quer ter
filhos, mas de modo mais planejado.
Como tenho mostrado em outros trabalhos, é comum que os espectadores
busquem enfatizar ou mesmo interpretar a história de modo bem particular, fazendo
pontes entre sua história pessoal e a narrativa. No caso de Celina é sua dificuldade de
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engravidar que é mencionada – ou seja, Celina nunca engravidou sem querer, muito
pelo contrário, teve muita dificuldade e esperou mais de 3 anos pela primeira gravidez.
Assim, ela não encontra nenhum ponto de identificação com Jô, o que é diverso nas
entrevistadas que tiveram alguma gravidez não planejada, e mesmo para aquelas que
engravidaram cedo e acabaram casando. Assim, como parece ter ocorrido com a figura
de Regina Duarte/Malu “negociam” um pouco entre o sentido mais explícito do
episódio e a sua própria visão moral quanto ao tema, mas essa visão moral relaciona-se
também com suas experiências pessoais quanto à reprodução.
Ainda pretendo verificar melhor esta hipótese com mais entrevistas, mas outros
dois casos demonstram bem essa relação entre a vida da entrevistada e o modo como
lida com o episódio. Irene tem 40 anos, casou-se grávida aos 20 anos, teve três filhos
não planejados do primeiro casamento, e um quarto filho do namorado atual. Mora na
Zona Leste, na escola onde trabalha como zeladora, e quer muito fazer faculdade. Irene
teve inúmeros planos de vida mudados por causa dos filhos e inclusive revela que
tentou fazer um aborto com remédio (menciona explicitamente Cytotec), que não deu
certo, e sentiu o fato como uma “besteira”. No limite, lembra que “criança é uma
bênção”, e que como ela já tinha outros filhos e já não era mais muito jovem, não
deveria mesmo ter tirado. Gosta do episódio “Ainda não é hora”, acha que Malu tem
razão quando diz que deveria ser legalizado, considera que Malu foi uma boa e leal
amiga de Jô. Para ela, Jô estava certa: o melhor era mesmo tirar e fazer a faculdade e se
preparar melhor para a maternidade. Mas ainda acha que não deve ser liberado
totalmente, mas que cada caso deve ser analisado – e assim se diz favorável quando é
uma menina muito jovem que ainda é muito “criança”, assim como era o seu namorado.
Ela não associa o caso do episódio com sua trajetória, e se identifica mais com Malu –
casou grávida, mas não era mais tão “criança” e quis assumir os filhos.
Por fim, para efeitos deste texto, gostaria de mencionar uma terceira
entrevistada, que trabalha como governanta há muitos anos numa casa de família, e é
muito “noveleira”. Como Celina acima citada, tem uma ampla memória sobre novelas e
personagens. Luzia indica ter 45 anos, mas a entrevistadora, Crisliane Falchetti, conta
que ela parece ser mais velha e que a entrevistada que a indicou revela que ela “mente”
sua idade, e tem ensino fundamental completo. Luzia é a única entrevistada que não
gosta de Malu, pois a considera “chata” e no primeiro episódio identificou-se com a
situação da filha de Malu, pois perdeu a mãe muito jovem e não gostou de viver com a
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madrasta, que brigava muito com seu pai. As brigas de Malu com o marido lhe fazem
relacionar a personagem à figura de sua madrasta. Aos 15 anos saiu de casa para vir
morar com sua madrinha. Foi casada, embora afirme que não casou por amor, mas
porque temia nunca se casar. Não pode ter filhos e o casamento acabou não dando certo.
Afirma-se católica e radicalmente contra o aborto, em qualquer situação:
“Eu acho que não há humanidade em matar um ser, sou contra mesmo. Nem em
caso de estupro eu sou a favor que se faça aborto. Só em casos extremos, de
anencefalia, mas de resto sou contra. Mesmo em caso de estupro, vá ver que
aquela criança que nasceu vai ser uma bênção no futuro.”

Ainda assim, Luzia tenta de algum modo entender a personagem Jô, dia que
gosta dela, e que “o problema foi ela ter procurado as pessoas erradas para se
aconselhar.”
Ainda preciso ter mais entrevistas deste tipo para poder indicar o que de fato
parece ser mais determinante na leitura deste episódio, e a faixa etária é algo que
também deve ser considerada. No entanto, me parece importante destacar esta hipótese
de que são as identificações e aproximações afetivas entre a vida pessoal do
entrevistado e o caso narrado que parece afetar de modo mais determinante a
interpretação do seriado. Já sabemos que em pesquisa de opinião sobre o aborto a
primeira opinião costuma ser um chavão: quase todos se declaram inicialmente
contrários ao aborto nesse tipo de pesquisa no Brasil. Mas ainda assim considero que o
seriado permita discutir o tema de outra forma, saindo de um genérico “contra X favor”,
para uma situação específica. Evidentemente não pretendo aqui avaliar a opinião sobre
o aborto em si, mas entender as formas de negociação e possibilidades de interpretação
que se dão diante do seriado, levando em conta as particularidades de Malu Mulher.

Considerações Finais
Este não é ainda um texto conclusivo, mas visa debater no processo de pesquisa
algumas ideias em construção, e outras retomadas de minhas pesquisas anteriores. Aqui,
ele visa contribuir de certa forma na noção de levar em conta a mídia no processo de
constituições de posições morais e políticas. Mas numa “política” que é vista como da
esfera do “feminino” – dos sentimentos, da vida privada e familiar, como tratam tais
tipos de narrativas televisivas que podem ser classificadas como melodramáticas (se o
melodrama for tomado numa definição mais ampla como a que citei de Brooks e
Xavier).
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Escolhi exatamente debater aqui o tema que gera mais polêmica, e nem tanto o
que se tornou mais consensual no país, como a valorização do trabalho e da autonomia
feminina muito recorrente também nas novelas dos anos 80 e 90. De certo que
transparece – e talvez coubesse deixar mais explícita – minha postura favorável à
legalização do aborto, e daí meu encanto com este episódio. Mas ele também decorre de
um esforço em entender essa teledramaturgia feita para o público feminino que é grande
parte do sustento econômico da TV comercial aberta. E no estudo sobre essa ampla
produção cultural, este episódio destoa completamente – e considero que por isso ainda
gera polêmica. Ele parece mais surpreendente ainda por ter sido exibido numa época em
que tais temáticas sofriam forte censura. Considero que é nas suas ambiguidades que se
pode entender melhor sua veiculação na época, e é diante da reação pública negativa a
ele que se explica porque o tema não volta à pauta na mídia contemporânea.

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