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27/05/2015 Centro de Referência Virtual

Centro de referência Virtual do Professor ­ http://crv.educacao.mg.gov.br
 

Biblioteca Virtual
­ Dicion�rio da Educa��o
CRIADO EM: 10/06/2006
MODIFICADO EM: 10/06/2006
: TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS

* Marinez Fulgêncio Murta


A análise da prática pedagógica envolve referenciais amplos, como a compreensão da função social da educação escolar e a
identificação das concepções de aprendizagem e ensino que lhe dão suporte.
Como a função social atribuída à educação influencia a prática educativa?
. educar para conservar ou para transformar a sociedade faz diferença;
. educar para formar cidadãos conformados à ordem estabelecida, ou para formar cidadãos críticos, faz diferença.
Como as concepções de aprendizagem afetam a prática pedagógica?
. acreditar que a aprendizagem é um processo puramente racional, que depende apenas do exercício e amadurecimento da razão
﴾racionalismo, inatismo﴿, ou perceber a aprendizagem como uma decorrência da captação dos conhecimentos por meio da experiência
externa ﴾empirismo﴿, faz diferença no modo de organizar o ensino na escola;
. acreditar que a aprendizagem provém da atividade mental do sujeito ao interagir com a realidade, ou da atividade do sujeito mediada
por outros sujeitos socioculturais ﴾cognitivismo, interacionismo, sociointeracionismo﴿ leva as outras formas de organizar o ensino.
Ao longo da história da educação, diferentes concepções de aprendizagem e diferentes funções atribuídas à educação geraram
diferentes tendências ou teorias pedagógicas.

Função social do ensino﴾intenções educativas﴿


Correntes / Tendências /Teorias Pedagógicas
Concepções deaprendizagem

Organização do currículo Org. Tempo / Espaço Conteúdos


Ideologias subjacentes às tendências
Configuração de aspectos concretos do Relação
pedagógicas
ensino prof./alunoAgrupamentoAvaliação

 
Na literatura educacional, vários autores desenvolveram estudos e se posicionaram acerca das tendências educacionais, classificado‐as
segundo suas ideologias subjacentes. O conhecimento dessas propostas pode ajudar os professores na identificação de critérios de
análise e reformulação de sua prática. Entre os autores mais presentes na nossa formação podemos destacar: Palácios ﴾1979﴿, Saviani
﴾1985﴿ e Libâneo ﴾1985﴿.
Palácios ﴾1979﴿ classificou as principais tendências contemporâneas para uma escola diferente entre três grandes grupos, de acordo
com os aspectos envolvidos: aspectos didáticos ﴾Escola Nova, aspectos de relacionamento ﴾Antiautoritarismo﴿ e aspectos sociopolíticos
﴾Sócio‐Política﴿. Ao concluir o seu trabalho, o autor critica o parcialismo de cada uma dessas tendências, referindo‐se à ilusão
pedagógica da primeira ﴾redução dos problemas da escola a problemas didáticos﴿, a ilusão psicológica da segunda ﴾redução dos
problemas da educação a problemas de relações humanas no interior das instituições escolares﴿ e à ilusão sociopolítica da última
﴾tentativa de esgotar todos os problemas da escola com o conhecimento de sua função social﴿. Palácios ﴾1979﴿ sugere a busca de uma
perspectiva integradora que permita a abordagem do fator educativo como fator pedagógico de relacionamento sociopolítico ﴾propõe
uma análise dialética das questões educacionais﴿.
Saviani ﴾1985﴿ considera um primeiro grupo de teorias – pedagogia tradicional, pedagogia nova e pedagogia tecnicista – como teorias
não críticas, por desconhecerem as determinações sociais do fenômeno educativo e pela abordagem técnica e neutra com que tratam
as questões educacionais, atribuindo à escola um papel redentor de equalização social. Critica essa visão como ingênua e aponta um
grupo de teorias no extremo oposto, as teorias crítico‐reprodutivistas que atribuem à educação uma função de reprodução das
desigualdades sociais. Ou seja, de um grupo que atribui um poder ilusório à escola remete a outro que enfatiza uma situação de
impotência da mesma diante dos condicionantes sociais. Nesse impasse, posiciona‐se em relação à escola como uma realidade
histórica, isto é, suscetível de ser transformada intencionalmente pela ação humana. O desafio que apresenta é a busca de uma teoria
crítica da educação que capte a escola como um instrumento capaz de contribuir para a superação do problema de marginalidade
social.
Libâneo ﴾1985﴿, por sua vez, utiliza como critério de classificação a posição que as tendências adotam em relação aos condicionantes
sociopolíticos da escola, agrupando‐se em dois grandes blocos: pedagogias liberais e pedagogias progressistas. Entre as liberais, inclui as
tendências tradicional, renovada e tecniscista. Entre as progressistas, as tendências libertária, libertadora e crítico‐social dos conteúdos.
As pedagogias liberais, como o próprio nome indica, assumem princípios da doutrina liberal: liberdade, igualdade, respeito aos
interesses individuais. O papel que assume a educação escolar no contexto das propostas de inspiração liberal é a preparação dos
indivíduos para desempenhar diferentes papéis sociais de acordo com as suas aptidões. A função social da escola é, pois, a adaptação
dos indivíduos à sociedade num sentido conservador. A ideologia liberal não tem um projeto de transformação social no sentido da
equalização. Admite as diferenças de condições sociais como resultado das diferenças individuais inatas: diferenças de dons e aptidões.
Ocuparão as melhores posições, serão mais bem‐sucedidos na vida social, os mais talentosos, os mais bem dotados, os mais
esforçados. A tônica é posta no indivíduo e nos seus méritos pessoais ﴾meritocracia﴿.
As pedagogias progressistas, contrariamente, partem da análise critica da realidade social. Vêem a educação como um mecanismo de
transformação. A função da escola nesse contexto é a instrumentalização do educando para compreender a realidade social e atuar
sobre ela num sentido transformador. Visam à inserção crítica do educando na realidade social. As correntes pedagógicas que se situam
nessa perspectiva dão grande peso à igualdade, desenvolvendo propostas emancipatórias para todos. As diferenças invidivuais são
compreendidas numa perspectiva de diferenças de universo socioculturais, justificando a diversificação do trabalho pedagógico em
respeito às mesmas e, não, diferentes graus de aprendizagem e sucesso na escola.
Considerando as classificações de Libâneo ﴾1985﴿ e Saviani ﴾1985﴿, podemos dizer que, no sistema educacional brasileiro, até a década
70 do século XX, predominam correntes pedagógicas de inspiração liberal conservadora ou não críticas: tendências tradicional, nova e
tecnicista. Essas teorias de educação, ainda hoje, orientam e influenciam a prática pedagógica de muitos professores.
No final de 70, as teorias crítico‐reprodutivistas fizeram‐se presentes no discurso educacional brasileiro especialmente no meio
acadêmico. A década de 80 representou a reação a essa crítica extrema e a busca de alternativas para a construção deu uma educação
pública de qualidade, fazendo emergirem teorias críticas autoritárias. Ganharam relevância, nesse momento, proposta como a
pedagogia libertadora dos conteúdos socioculturais.

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O exame de algumas dessas teorias pode ser instrumental para a melhor compreensão da prática pedagógica e para a construção de
projetos de educação bem fundamentados nas escolas.
Teorias não críticas
Pedagogia Tradicional
A pedagogia tradicional baseia‐se numa visão essencialista de homem, segundo a qual, todo homem é dotado de uma essência
universal, apriorística e imutável ﴾espírito, faculdades, razão﴿, a qual deve ser realizada pela educação. Os homens são essencialmente
iguais, as diferenças sociais entre ele se devem a diferenças de destino. A idéia de uma essência universal igual justifica o
estabelecimento de esquemas lógicos predefinidos de educação, aos quais devem submeter‐se todos os alunos. Ou seja, justifica a
utilização do mesmo método, do mesmo ritmo, dos mesmos materiais e atividades para todos. As diferenças de resultados não levam
ao questionamento do método ﴾que se baseia na essência humana﴿. Os fracassos e sucessos são da responsabilidade do aluno:
decorrem de seu esforço, interesse, empenho nos estudos.
Em outras palavras, do ponto de vista político, a ideologia que orienta essa tendência é conservadora ﴾o destino é que define a posição
de cada uma na sociedade﴿; do ponto de vista da aprendizagem, a perspectiva é inatista: todos já nascem com uma essência; esta
amadurece ao ser exercitada. Portanto, as capacidades superiores da inteligência ﴾pensamento complexo, análise, síntese, julgamento﴿
não são aprendidas, mas exercitadas.
O modo de ensinar na escola tradicional reflete essas concepções: organizam‐se os conhecimentos de cada disciplina a partir de uma
lógica interna do mais simples para a mais complexo; estipulam‐se programas para serem desenvolvidos por todos os alunos, em
tempos determinados de acordo com a necessidade do professor para executá‐los. Avaliam‐se os resultados da aprendizagem com o
objetivo de classificar os alunos, exercendo a educação uma função seletiva: identificação dos mais esforçados, dos mais interessados
nos estudos, dos melhores ﴾ver também verbete Avaliação Classificação no Dicionário Avaliação﴿.
Essa pedagogia sistematizou o modo como se desenvolve o ensino tradicional, ou seja, o ensino baseado na transmissão dos
conteúdos culturais pelo professor: o método expositivo.
O método expositivo se identifica com os passos formais de Herbat, levando ao seguinte desenvolvimento da aula:
Apresentação do assunto ﴾estimulação dos sentidos ver, ouvir, sentir a realidade﴿;
Associação ﴾associar o novo com as idéias preexistentes﴿;
Sistematização ﴾generalizar, organizar os conceitos﴿;
Aplicação ﴾aplicar em situações práticas, exercitar﴿.
Os jesuítas foram os grandes difusores dessa pedagogia no Brasil. O método expositivo vulgarizou‐se nos sistemas de ensino,
reduzindo‐se à fala do professor seguida de exercícios de fixação repetitivos. Ou seja, no processo de difusão, o método perdeu as
características que lhe davam um caráter de ensino sistemático, assumindo um caráter mecânico e repetitivo de condução do ensino.

Pedagogia nova ﴾ou renovadora, ou moderna﴿


A pedagogia nova baseia‐se numa visão existencialista de homem, segundo a qual, a natureza humana é moldada na existência, sendo
o homem uma “tábua rasa” ao nascer. Indivíduos essencialmente diferentes exigem uma educação diferenciada, devendo predominar
uma seqüência psicológica na organização do ensino. A abordagem dos fenômenos educacionais nessa vertente é de natureza
predominantemente psicológica. À escola cabe suprir as experiências que permitem ao aluno educar‐se, num processo ativo de
construção e reconstrução do objeto, numa interação entre estruturas cognitivas do indivíduo e estrutura do ambiente.
Essa perspectiva apresenta uma série de deslocamentos em relação à escola tradicional: do intelecto ﴾lógico﴿ para o sentimento, do
esforço para o interesse, dos conteúdos para os métodos e processos de ensino. Segundo a proposta da escola nova, a educação deve
apoiar‐se nas Ciências Sociais e Humanas ﴾Fisiologia, Biologia e Psicologia﴿ e basear‐se em princípios científicos. Educar‐se para a vida,
consistindo a educação integral do aluno no desenvolvimento de suas aptidões peculiares, de valores morais, de hábitos de higiene e
saúde, vida cívica e social, literária e artística.
O ensino é articulado com o método científico ou da descoberta, dando grande ênfase à atividade do aluno na solução de problemas.
Podem‐se identificar os seguintes passos na organização do ensino:
. atividade ﴾o ensino parte sempre de uma atividade que apresenta um desafio ao aluno﴿;
. problema a ﴾atividade inicial leva à formulação de problemas﴿;
. levantamento de dados ﴾levantamento dos dados disponíveis sobre a situação para subsidiar a formulação de hipótese de solução﴿;
. formulação de hipótese ﴾que serão objeto de estudos pelos alunos﴿;
. confirmação ou rejeição das hipóteses.

O ideário da escola nova difundiu‐se entre os educadores brasileiros no século XX, especialmente a partir da década de 20, absorvendo
sua ênfase psicológica ﴾centrada nos métodos de aprendizagem, nos testes psicométricos﴿ e sociológica ﴾dinâmicas grupais, trabalho
em grupo, agremiações, atividades sociais no interior da escola﴿ que influenciaram especialmente a escola primária.
Pedagogia tecnicista
A partir dos anos 50, ganha força entre nós a influência behaviorista americana ﴾comportamentalista﴿, introduzindo alterações na
organização da escola e o currículo, e culminando no tecnicismo que se instala oficialmente no sistema educacional brasileiro na
década de 70, com a Lei n. 5.692/71.
A intensificação da preocupação com os métodos levou à busca da eficiência instrumental. O eixo do ensino nessa perspectiva é a
organização racional dos meios. Enquanto na escola nova os meios são controlados e definidos por professores e alunos, na tecnicista o
processo racionalizado é que define o que farão professores e alunos, como e quando. Preocupação com a objetividade e a
operacionalidade do ensino.
Aqui o pressuposto é de que a maior produtividade do indivíduo ﴾capital cultural individual﴿ conduz à maior produtividade da
sociedade ﴾visão desenvolvimentista﴿. A educação subordina‐se à sociedade ﴾reduzida a mercado﴿ em sua função de formar recursos
humanos ﴾mão‐de‐obra﴿ em primeiro lugar e não seres humanos plenos, cidadãos. É o que alguns autores vão chamar de visão
produtivista da educação.
Em termos da concepção de aprendizagem, a perspectiva empirista predomina nessa proposta, tendo como postulado básico que o
conhecimento é produto da experiência exterior. Essa concepção coloca em relevo o objeto, os estímulos externos, a pressão do
ambiente e, em plano secundário, a atividade do sujeito que conhece. O behaviorismo apóia suas investigações numa base empirista e
chega a definir a aprendizagem como mudança de comportamento resultante do treino ou da experiência. Nessa perspectiva, a
aprendizagem identifica‐se com o condicionamento ﴾reações a estímulos que podem ser previstas, medidas e controladas﴿.
O sujeito que aprende é um receptáculo de informações, passível de ser moldado ﴾objeto e não sujeito﴿. A aprendizagem, resultando da
experiência externa, não precisa das significações do sujeito, nem de sua atividade organizativa. O que garante a aprendizagem é o
ensino baseado em práticas pedagógicas que submetem os alunos à autoridade do professor, dos livros, dos exercícios programados,
das avaliações.
Essa perspectiva conduz à crescente burocratização da escola, à fragmentação e à especialização do trabalho docente e ao reinado dos
materiais instrucionais, reduzindo o papel do professor à administração de um sistema de instrução concebido por especialistas.

Teorias Críticas
Teorias crítico‐reprodutivistas
O cunho economicista da abordagem educacional dos anos 70 ﴾visão produtivista da educação, propostas tecnicistas de organização da
educação﴿, gerou análises educacionais de fundamentação marxista, que colocam em discussão a relação escola‐sociedade numa
perspectiva de profunda crítica à escola como reprodutora das desigualdades sociais.
As teorias crítico‐reprodutivistas – teoria da escola/aparelho ideológico do Estado, Althusser ﴾1974﴿; teoria da violência simbólica,
Bourdieu e Passeron ﴾1975﴿; teoria da mistificação pedagógica, Charlot ﴾1979﴿; teoria da escola dualista, Baudelot e Establet ﴾1980﴿ –
preocuparam‐se em explicar o funcionamento da escola tal como este ocorre na sociedade capitalista. Não apresentaram propostas
pedagógicas, mesmo porque não viam a escola como instrumento de luta pela transformação social.
Essas teorias tiveram como principais conseqüências no meio educacional:
. colocaram em evidência o comprometimento da escola com os interesses do grupo dominante ﴾escola dual: escola de natureza e
qualidade diferenciadas para o povo e para as elites; escola excludente: instrumento de discriminação social e de legitimação do
sucesso dos já favorecidos ﴿;

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. disseminaram um pessimismo desmobilizador entre os educadores ﴾especialmente da escola pública﴿, levando‐os a sentirem‐se
impotentes diante dos condicionadores sociais e a descreverem da força‐educativa.
Teorias críticas emancipatórias
Se não é do interesse da classe dominante transformar radicalmente a escola, essa proposta deverá partir daqueles que lutam pelos
interesses dos dominados, e foi essa busca que movimentou os educadores na década de 80: luta contra a seletividade, a discriminação,
o rebaixamento do ensino das camadas populares.
Na busca de saídas teórico‐práticas para o impasse criado pela visão da escola como instância reprodutora da sociedade capitalista
Dermeval Saviani, Luís Antônio Cunha, Guiomar Namo de Mello e outros que se destacaram na época parecem ter encontrado em
Gramsci seu grande inspirador.
Com Gramsci, a escola recupera seu potencial da mudança como espaço contraditório em que se encontram em permanente conflito
os interesses dos grupos dominantes e a luta emancipatória dos grupos historicamente subalternizados.
A tendência democrática, intrinsecamente, não pode consistir apenas em que um operário manual se torne qualificado, mas em que cada
“cidadão” possa se tornar “governante” e que a sociedade o coloque, ainda que “abstratamente”, nas condições gerais de poder fazê‐lo; a
democracia política tende a fazer coincidir governantes e governados (no sentido de governo com o consentimento dos governados),
assegurando a cada governo a aprendizagem gratuita das capacidades e da preparação técnica geral necessárias ao fim de governar.
﴾GRAMSCI, 1979, p. 137﴿.
Neste momento, ganham espaço tendências pedagógicas impregnadas de uma visão crítica e transformadora de educação, voltadas
para o desenvolvimento humano e/ou para os interesses populares numa perspectiva emancipatória. Seus teóricos reconhecem tanto o
papel ativo do educador na transformação da sociedade quanto os condicionantes histórico‐sociais de sua prática ﴾daí sua criticidade﴿.
Educação como uma instância dialética que serve a um projeto de sociedade. Instância mediadora que pode mediar tanto a
conservação quanto a mudança. O projeto que realiza é definidor nesse sentido.
Incluem‐se nessa perspectiva progressista ou transformadora proposta não‐formais como a Libertadora ﴾Paulo Freire﴿ e a Libertária
﴾defensores da auto‐gestão pedagógica﴿. No plano da educação escolar formal, destaca‐se a proposta crítico‐social dos conteúdos que
acentua a primazia dos conteúdos no seu confronto com as realidades sociais.
Pedagogia Libertária ﴾autogestionários﴿
A pedagogia libertária espera que a escola exerça uma transformação na personalidade dos alunos num sentido libertário e
autogestionário. A escola instituirá, com base na participação grupal, mecanismos institucionais de mudança ﴾assembléias, conselhos,
eleições, reuniões, associações, etc﴿, de tal forma que o aluno, uma vez atuando nas instituições externas, leve para lá tudo o que
aprendeu. A autogestão é o conteúdo e o método. Há um objetivo pedagógico e um objetivo político.
A relação professor/aluno é de não diretividade. Educar na liberdade exige, também, a utilização de métodos de ensino‐aprendizagem
não impositivos, não coercitivos, que se baseiam nas investigações livres dos alunos, que quebrem pela raiz a velha transmissão do
saber de cima para baixo. O professor é mais um facilitador da aprendizagem e animador do grupo à disposição dos alunos.
Se a classe tradicional era a negação da palavra, da comunicação e das inter‐relações, o grupo institucional se transforma em meio de
diálogo, de mudanças e de intercâmbios, e o professor considera‐se mais um técnico em organização de atividades grupais e um
especialista em relações humanas do que um professor interessado em determinados conteúdos, em fazer adotar uma ou outra
postura.
Pedagogia Libertadora
Na perspectiva libertadora de Paulo Freire, somente o processo de conscientização pode libertar o homem da alienação, da
manipulação ideológica, da dominação de uma estrutura social determinada. A educação libertadora questiona concretamente a
realidade das relações do homem com a natureza e com os outros homens, visando a uma transformação.
A produção pedagógica de Paulo Freire apresenta dois momentos: o primeiro, de cunho idealista, acreditava na educação como o
motor de transformação social; o seguinte, mais dialético, discute social, numa perspectiva de contradição. Assume a educação como
um processo de diálogo, por meio do qual educador e educando problematizam o seu estar no mundo e suas visões sobre o mundo.
Os conteúdos do ensino, denominados temas geradores, são extraídos da problematização da prática de vida dos educandos. A forma
de trabalho educativo é o grupo de discussão, ao qual cabe gerir a aprendizagem tendo o professor o papel de animador,
problematizador e de organizador das situações de ensino e aprendizagem significativas.
Aprender é um ato de conhecimento da realidade concreta e só tem sentido se resulta de uma aproximação crítica dessa realidade.
Conhecer é um processo ativo e interativo. Educação crítica não é substituir os conceitos básicos das disciplinas por política, mas
politizar o conteúdo das disciplinas a serem ensinadas e aprendidas ﴾apropriadas﴿.
Pedagogia crítico‐social dos conteúdos ﴾ou dos conteúdos socioculturais﴿
Reconhece e afirma o papel fundamental da escola na socialização do saber, patrimônio cultural da humanidade de conteúdos
abstratos e formais, mas da socialização de conceitos significativos, concretos, ligados às realidades sociais; conteúdos escolares que
tenham ressonância na vida sociais dos alunos.
Nessa perspectiva emancipatória, reunindo elementos das diversas tendências, mais especialmente da libertadora e da crítico‐social,
podemos identificar as seguintes características nos componentes da prática educativa:
. objetivos da educação: socialização dos conhecimentos; problematização da prática;
. conteúdos escolares: conteúdos culturais relacionados à prática social, abordados de forma contextualizada, objeto de apropriação
crítica;
. metodologia: de uma visão sincrética ﴾fragmentadas, confusa﴿, por uma visão analítica ﴾mediada pelo professor﴿, para uma visão
sintética; processos que garantam uma relação de continuidade entre o universo cultural do aluno e os conteúdos do ensino;
metodologia dialética;
. professor: mediador, orientador do processo de conhecimento; sujeito que aprende no processo de ensinar; investigador,
pesquisador, ser contextualizado;
. aluno: sujeito da aprendizagem, ser sociocultural;
. relação professor/aluno: de respeito‐mútuo, dialógica; vínculo emancipatório ou libertador;
. relação professor/aluno/conteúdo: ﴾conhecimento﴿: interativa, mediana, não‐linear, dialógica;
. relação escola/sociedade: a escola reflete as contradições sociais; necessidade de explicitação das contradições para superá‐las;
. avaliação: acompanhamento do desenvolvimento do aluno; regulação do processo ensino‐aprendizagem; comprovação do progresso
do aluno na direção de um saber mais elaborado.

Com o objetivo de ajudar o professor a situar‐se no contexto dessas teorias educacionais procuramos traduzir, de forma esquemática
﴾QUADRO 1﴿, as configurações que assumem alguns elementos da prática educativa sob a influência das tendências mais presentes no
nosso sistema educacional ao longo do século XX.

QUADRO 1
Tendências pedagógicas X práticas educativas

Papel do Aluno
Papel do Professor Metodologia
Conteúdos Escolares
Memorizar Didática Função de Avaliação
Tendências
Implementar ações conhecimento
Tradicional Fatos e conceitos
Vigiar / Corrigir ouvir c/ Exposição oral SelecionarClassificarContabilizar
científicos das disciplinas
Aconselhar atençãoFazer pelo professor
escolares
exercícios
Participar
Facilitar a Descoberta pelo
ativamente Temas de interesse do
Renovada / aprendizagem aluno Acompanhar o processo de
Pesquisar aluno
Nova Coordenar atividade Passos do desenvolvimento do aluno
Demonstrar Temas da vida
Apoiar método científico
curiosidade

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Dar respostas
Aplicação de
Implementar ações programadas FatosConceitos
materiais Medir
Tecnicista Aplicar materiais Reagir a Princípios científicos
instrucionais pelo Controlar
instrucionaisControlar estímulos fragmentados
professor
externos
Pensar, refletir,
interpretar experiências,
vivências. Buscar
Diálogo
informações
Mediar a construção Pensar, refletir Construção Diagnosticar e regular as
Processar informações,
do conhecimento Interpretar coletiva do aprendizagens
Libertadora fatos, conceitos,
Provocar, desafiar, experiências, conhecimento Orientar as intervenções
Crítico‐ princípios, normas,
problematizar vivências Interações entre pedagógicas
social procedimentos, valores,
Criar situações de Buscar os sujeitos no Acompanhar o
atitudes
aprendizagem informações processo de desenvolvimento do aluno
Conhecimentos
conhecimento
científicos e experiências
socioculturais vistos de
forma globalizada
Fonte: elaborado pela autora do texto

Teorias “pós‐críticas”
Os anos 90 trouxeram uma nova perspectiva de abordagem das questões educacionais. Sem perder de vista a característica crítica,
foram incorporadas outras categorias de análise ao campo educacional, reconhecido como um espaço epistemológico social ﴾SILVA,
1999﴿, em que é importante identificar as conexões entre saber, identidade e poder.

Assim como as teorias críticas deslocaram a ênfase dos conceitos pedagógicos de ensino, aprendizagem, métodos didáticos, para os
conceitos políticos e conscientização, libertação, prática social, as teorias pós‐críticas vieram trazer um novo deslocamento na direção
de conceitos como subjetividade, intersubejtividade, multiculturalismo, diversidade, identidade, gênero, etnia, representação ﴾ver
Dicionário de Educação Inclusiva﴿.

As teorias educacionais, sustentadas tradicionalmente pela Biologia e pela Psicologia ﴾final do século XX, início do século XXI﴿, passaram
a receber influência também da Sociologia e, no período de 50 a 70 do século XX, sofreram significativo viés desenvolvimentista e
economicista, chegando nos anos 80, e mais especificamente na década de 90, a rever suas disposições em função de uma visão
antropológica. É sobretudo a antropologia que vem obrigar os educadores a pensar os alunos como sujeitos socioculturais, portadores
de subjetividades construídas no entrecruzamento de influências globais e particulares, devendo ser as diferenças objeto de respeito e,
por outro lado, de questionamento em função de suas condições de produção numa sociedade desigual.

Nesse contexto de influências de múltiplos campos do saber é que hoje pensamos a educação.

Tendências / teorias pedagógicas x Práticas escolares

O modo como os professores realizam o seu trabalho, selecionam os conteúdos das disciplinas, organizam os tempos e os espaços
escolares, orientam as atividades dos alunos e definem instrumentos de avaliação indicam as intenções educativas e as concepções de
aprendizagem que os orientam.
Observando nossas práticas escolares, encontraremos evidências da presença de elementos das várias teorias pedagógicas nas mesmas,
nem sempre inseridos de forma coerente à intencional: resultam daquilo que incorporamos em nossa passagem pela escola como
alunos, das trocas com os colegas de profissão, de prescrições dos livros didáticos, dos cursos de formação e de soluções empíricas
geradas no dia‐a‐dia da sala de aula.
Identificar as ideologias subjacentes às próprias práticas, posicionando‐se coletivamente sobre elas, é um passo importante no processo
de autoconhecimento das escolas que desejam construir seu próprio caminho. Construir o seu Projeto Político Pedagógico é o grande
desafio das escolas hoje e este projeto não se constrói sem uma consciência crítica e coletiva da direção que se deseja tomar. Educar
para conservar ou transformar? Formar cabeças cheias ou cabeças bem feitas? A reflexão conjunta sobre questões dessa natureza é
fundamental à organização curricular. A ﴾re﴿ construção da escola interpenetra o processo de formação sem serviço do seu grupo de
educadores.
Inúmeros professores da escola pública que se ocupam hoje de uma pedagogia e conteúdos socioculturais, articulada com a adoção de
métodos que garantam a participação do aluno em um processo de aprendizagem significativa, avançam na construção de uma nova
escola.
Projetos de educação pública como a Escola Plural da PBH, a Escola Cidadã da Prefeitura de Porto Alegre, a Escola Sagarana do Estado
de Minas Gerais, inserem‐se numa perspectiva de educação democrática e inclusiva, pelo seu comprometimento com a construção de
um ensino de qualidade para todos. Coerentes com esse propósito, buscam formas alternativas de desenvolver o processo ensino
aprendizagem, fundamentadas em teorias da aprendizagem de base construtivista, interacionista e sociointeracionista ﴾ver também
verbete Aprendizagem, Dicionário Avaliação﴿, de forma a garantir a todos os alunos o lugar de sujeitos do processo de conhecimento,
promovendo o desenvolvimento de sua criticidade e de sua autonomia moral e intelectual, necessárias à construção de identidades
cidadãs, conscientes de seus direitos e deveres.
* Mestre em Educação pela FAE/UFMG.

PARA SABER MAIS...


LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública. São Paulo: Loyola, 1985.
No capítulo Tendências Pedagógicas na Prática Escolar, o autor buscar mostrar como a prática dos professores é influenciada por
determinadas teorias de educação, devendo as mesmas ser desveladas para que estes assumam escolhas conscientes.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. São Paulo: Cortez, 1985. 95 pp.
Esta foi uma leitura fundamental nos anos 80 e, ainda hoje, oferece um boa síntese para os educadores que desejam uma compreensão
mais sistemática e crítica das diferentes teorias da educação. Ajuda especialmente na discussão das relações entre educação e
sociedade.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
Abordagem atual das teorias que fundamentam a organização curricular, situando‐as no seu processo evolutivo até as grandes
transformações que vêm ocorrendo na década de 90, com as teorias pós‐críticas. Avança em relação à abordagens da década anterior,
em que predominam as contribuições de autores com Libâneo e Saviani.
Outras Fontes Consultadas:
GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. Porto Alegre: Civilização Brasileira, 1979.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da educação. São Paulo, Cortez, 1992.

PALACIOS, Jésus. Tendências contemporâneas para uma escola diferente. Cadernos de Pedagogia, Barcelona, v. 5. 5 mar. 1979.

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