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DUNKER, C. I. L. - Slavoj Zizek e a Renovação do Marxismo. Revista Cult. p.54 - 56, 2007.
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DUNKER, C. I. L. - Slavoj Zizek e a Renovação do Marxismo. Revista Cult. p.54 - 56, 2007.
prescrito e calculado pelo próprio sistema burocrático, de tal forma que toda dissidência
torna-se inócua e no fundo uma paródia. O dissidente, o “alternativo” ou aquele que se
acredita “fora do sistema” joga apenas o papel estabelecido pelo sistema que para
legitimar-se como democrático precisa tolerar e estimular a diferença. Os exemplos vão
dos expurgos periódicos à pseudo-oposição necessária para manter a burocracia como
discurso hegemônico e produzir um efeito ilusório de liberdade de pensamento. Contra
isso a estratégia de resistência adotada pelo NSK está baseada no que Žižek chamou
de.superidentificação (overdidentification). Um exemplo. O Partido Socialista
Iuguslavo propõe um concurso nacional para selecionar o cartaz em homenagem ao Dia
da Juventude (data de nascimento do general Tito). Os dissidentes decidem que não vão
participar, afinal eles repudiam o personalismo contido na idéia de Dia da Juventude. O
NSK, ao contrário, envia para o concurso um garboso ensaio fotográfico com
musculosos corpos atléticos segurando tochas no mais autêntico estilo social-realista.
De fato vencem o concurso, mas no dia da entrega do prêmio eles decidem “explicar”
sua obra. Tratava-se de um “remake” de um cartaz feito em homenagem à Hitler por
ocasião dos jogos Olímpicos de Munique. Ou seja, o prêmio não podia ser entregue,
pois tratava-se de plágio, e mais, o Dia Nacional da Juventude, junto com seus críticos,
fãs e dissidentes mostrou abertamente sua face totalitária ao lado de seu anacronismo
estético. Resultado jamais houve outro concurso de cartazes para o Dia Nacional da
Juventude Iuguslava.
Na tática da superidentificação trata-se de recusar a distância cínica entre a
cultura “oficial” e a cultura “alternativa”, distância que produz uma separação artificial
e enganosa, alienando o sujeito em uma falsa posição “externa” ao sistema. Pela
superidentificação, ao contrário, trata-se de tomar as formas simbólicas dominantes pelo
seu valor de face e a partir de sua repetição reflexiva produzir desestabilizações internas
ao sistema. Renúncia da consciência pessoal, de gostos, juízos e convicções, aceitação
voluntária e deliberada do papel da ideologia. Um exagero da falsa aparência cujo
objetivo é mostrar seu caráter insensato. A superidentificação tenta reverter, através de
intervenções pontuais, a oposição tradicional entre Estado e Sociedade Civil, tematizada
por Gramsci e amplamente explorada pela Liga Comunista Eslovena. Tal estratégia será
empregada, com inúmeras variações, nos textos, entrevistas e declarações públicas de
Žižek. São intervenções que, tomando ao pé da letra o enunciado ideológico, mostram,
em ato, a falsidade de sua enunciação. Em parte esta nova estratégia de oposição está
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Sobre o Autor:
Psicanalista, doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia da USP, realizou seu Pós
Doutorado na Manchester Metropolitan University. Atualmente é professor e Livre
Docente pelo Departamento de Psicologia Clínica do IPUSP. Autor de Lacan e a
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DUNKER, C. I. L. - Slavoj Zizek e a Renovação do Marxismo. Revista Cult. p.54 - 56, 2007.
Sobre Zizek:
Dunker, C.I.L. & Aidar Prado, J.L. – Zizek Crítico – política e psicanálise na era do
multiculturalismo, Hacker, São Paulo, 2005.
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