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Coluna do Jornal Boa Vista, 23 de fevereiro de 2018.

Luís Fernando Santos Corrêa da Silva


E-mail: lfscorrea@gmail.com

Em busca da felicidade partilhada: proteção social e dinamismo econômico

I – A ONU divulgou em 2017 um relatório com o ranking dos países segundo a


felicidade da população. Para efeito de composição de um índice de felicidade foi
considerado o PIB per capita e a expectativa de vida da população, bem como a
percepção dos cidadãos de 155 países sobre apoio social da comunidade, confiança nas
instituições, liberdade para tomar decisões e generosidade. Nas cinco primeiras posições
encontram-se Noruega, Dinamarca, Islândia, Suíça e Finlândia, todos esses países
europeus e quatro dos quais situados no norte desse mesmo continente. Tais países
possuem singularidades culturais e formações históricas particulares, mas há também
aquilo que os une: todos possuem uma economia complexa e dinâmica que se combina
com elevada proteção social.

II – Segundo o próprio relatório das Nações Unidas, “os países mais felizes são aqueles
em que há um equilibro saudável na prosperidade e um alto capital social, o que leva a
uma confiança na sociedade, baixos níveis de desigualdade e confiança no governo”.
Isso significa que não basta produzir riqueza para construir uma nação feliz. Mais que
isso, é fundamental que essa riqueza seja distribuída da forma mais justa possível e que
um sentimento de solidariedade e confiança esteja presente nas relações
interinstitucionais e interpessoais. Parece relativamente simples chegar ao patamar
atingido pelos países nórdicos, mas se trata de uma equação complexa, que se resolve ao
longo do tempo, mediante o empenho do Estado, do mercado e da sociedade civil.
Torna-se imperativo uma economia dinâmica, com nível elevado de investimento em
ciência e inovação, aliado a um sentido de justiça que reforce a equidade social.

III – Mas e a posição do Brasil nesse ranking? Pois bem, nosso país ocupa o 22º lugar,
uma posição relativamente bem situada, apesar de todas as mazelas sociais que nos
tornaram um dos países mais desiguais e injustos do mundo. É verdade que esse se trata
de um ranking geral, que considera o país como um todo. Entretanto, imagine um índice
dessa natureza que tratasse de medir o índice de felicidade comparando regiões do país,
dos Estados ou mesmo os bairros e as regiões de uma mesma cidade. Não é possível
imaginar que os moradores de uma comunidade de periferia, feita refém pelo tráfico, ou
mesmo ocupada pelo exército (como é o caso do Rio de Janeiro na atualidade), sejam
tão felizes quanto aqueles que habitam condomínios de luxo nas regiões nobres da
cidade. Há diferenças profundas na renda, na expectativa de vida e na forma como esses
cidadãos acessam os serviços públicos. Do mesmo modo, as percepções sobre a
felicidade também são condicionadas pela posição que os indivíduos ocupam na
estrutura social.

IV – Nós, como nação, ainda procuramos por um caminho para a felicidade socialmente
partilhada (mesmo que alguns sequer considerem que a felicidade deva ser um bem
socialmente partilhado). Enquanto isso, nós continuamos apostando em soluções
individuais e pensando o mundo ao redor do nosso umbigo, como se tudo que está
distante de nós não nos afetasse. Isso se manifesta na forma como compreendemos as
políticas sociais, no modo como tratamos o meio ambiente e no valor que atribuímos à
vida. Nossas necessidades pessoais e imediatas estão sempre em posição privilegiada,
em detrimento dos interesses coletivos. O primeiro movimento para nos tornarmos um
país mais feliz deve residir na busca por um maior equilíbrio entre o indivíduo e a
sociedade. Precisamos de uma sociedade justa que não sufoque o indivíduo, e de um
indivíduo livre que não pense o mundo exclusivamente a partir de si.

Outras palavras:

 Escrevo minha coluna desse mês em deslocamento de trem de Lisboa para


Coimbra. Como todos sabem, o trem é um meio de transporte econômico, seguro,
confortável e sustentável. Faz tempo que Portugal entendeu isso. Por outro lado, o
Brasil preferiu investir em carros, ônibus e estradas, assumindo com isso todas as
consequências dessa escolha. Fica a pergunta: quantas vidas seriam poupadas
anualmente se tivéssemos um sistema de transportes por trens no país?
 Há uma tranqüilidade em Portugal que não se encontra no Brasil, mesmo em
cidades menores do interior. A isso se soma a generosidade das pessoas. Quando
cheguei a Lisboa, no metro, um senhor que aparentar aproximadamente 80 anos quis me
ajudar com as malas. Agradeci, porque não estavam tão pesadas, e o senhor parecia
frágil, mas entendi esse gesto como uma recepção de boas vindas. E que bela recepção.
 “A língua que menos se ouve em Lisboa é o português”. Entenda isso como um
exagero, mas que se aproxima bastante da realidade. Percebi uma grande diferença
comparativamente à primeira vez que estive aqui, no ano de 2014. Há muito mais
estrangeiros na cidade, alguns vieram para morar, outros estão a passeio, e isso fez com
que Lisboa se tornasse uma grande torre de babel.

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