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É o ano de 1703, era uma noite fria e húmida de inverno, o vento cuspia uma

bruma carregada pelo mar bravio e gelado trazido pelas correstes do norte. Meu nome
é Elijah Crowe. Para muitos eu era apenas mais um vagabundo desafortunado que
mendigava nos salões de jogos desta cidade fedorenta. Se me perguntares quem eu
sou? Realmente nem eu ainda descobri. O fato é que nesta noite moribunda, mal eu
sabia que meu destino seria marcado por uma infortuna maldição das trevas, sim ele
mesmo, o demônio. Marchava eu como uma alma temerosa em tormento, sentindo
furtivamente os meus lábios sendo rasgados pela brisa frígida que vinha do mar odioso
e salgado. Em um tom ofegante em passos largos, seguia pisando pesado sobre o cais
de madeira do porto fétido da cidade de Southampton. O ranger ruidoso, anunciava a
chegada de meu vulto em meio à névoa assombrosa da madrugada. As ruas de
Southampton no inverno eram gélidas e fediam horrivelmente a peixe podre. À
distância podiam-se ouvir os risos das vadias embaladas pela musica mal tangida dos
botequins, esta que embora fosse excessivamente alta, era ofuscada pelas risadas
esculachadas de marinheiros banguelas cercados por gritos das prostitutas dos cabarés
que divertiam estes marujos pestilentos que abarcavam naqueles bares sujos.

Sentia-me extremamente culpado por haver acabado de sair às pressas de uma


fabrica que era propriedade de sir Robert Swanpton, devido há uma confusão pueril,
onde eu bêbado, fui avidamente tomado por um pulso sádico e sem piedade na ira
esfaqueei prazerosamente o filho bastardo do reverendo August. O ódio que sentia foi
tão violento, que com uma faca de limpar peixe fiz um talho lateral em seu abdômen
gordo, algo tão profundo ao ponto de expor as suas sujas vísceras de larapio em meio
a sua esparramada gordura. Tudo por causa de uma pequena divergência sobre as
cartas que o gorducho escondia na sola falsa de sua bota. O efeito do rum barato
estava definitivamente afetando minha percepção, mas não ao ponto de saber que em
pouco tempo estaria sendo levado pelos policias a forca, devido ao crime que
cometera.

Corri em desespero até o fundo de um trapiche de madeira escorregadio, sentia um


misto de ódio e desespero por ver tamanha a miséria de minha vida, estava consciente
de que desta, só me restava o triste fim da morte. Caminhei vagarosamente ao lado
de uma caravela negra de hastes longas que estava ancorada ao lado da plataforma,
por alguns momentos esqueci meu infortúnio, pois me impressionara o imenso dragão
esculpido junto à náu do navio. Ele estava com sua bocarra dentada vociferando,
imponente, com suas asas abertas como que se quisera acolher-me em seu sombrio
seio. Seus olhos eram tenros, pensei que talvez o refletir dos lampiões não possuíssem
força o suficiente para alumiar tão assustadora carranca. Percebi que a mesma estava
como que abandonada e silenciosa, perdida, lúgubre, diante da densa névoa que
insistia em cercar o ancoradouro. Não sei se não vai ser corrido agora na quarta por
causa desta parada do evento...

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