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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

Instituto de Ciências Humanas


Programa de Pós-Graduação em Sociologia

Desigualdades Socioeconômicas e Trabalho


Prof. A.D. Cattani

Leandro Barbosa dos Santos

Porto Alegre, 2018


Dia 25 de Julio de 2017 fui convidado por um profissional da área da construção
para estar indo como acompanhante em uma reunião com um investidor que estaria
abrindo horizontes para novos investimentos na área de turismo. O profissional da
construção havia conseguido o contato através de um fornecedor de madeira, que já
conhecia o trabalho que realizava na área de sustentabilidade. Neste encontro tive a
oportunidade de estabelecer um dialogo que foi propício a identificar algumas
percepções sobre o mesmo. A este identificarei como Interlocutor 01, reproduzindo
algumas falas sobre diálogos que foram estabelecidos diretamente.

Elementos observados no primeiro encontro:

Ele observou o tipo de carro que estávamos, destacou prestar atenção no ano e
modelo, e até possíveis avarias no carro.
“(Diálogo interlocutor 01) - Olha, eu dou muita importância aos detalhes, eu
não me importa que o carro seja velho, mas tem que no mínimo estar bem
cuidado. Eu percebo estas coisas nas pessoas!”

Demonstrou ter gostos caros por comidas e bebidas, e em sua fala evidenciou
conhecer diferentes países, inclusive ressaltou recente viagem a Europa.

Possuía formação superior na área de administração de empresas e uma pós-


graduação em marketing com ênfase no marketing digital.

Ofereceu grande destaque a questão de estereótipo, e uma preocupação


excessiva com a imagem.
“(Diálogo interlocutor 01) - Sabe que agora que você falou, te conhecendo
melhor, eu entendo melhor porque és tão diferente, com este seu cabelo e
barba (risos).”

Sobre sua percepção de pobreza as reflexões por ele apresentadas foram


exemplificadas na condição de seus empregados. Para o interlocutor 01 a pobreza é
resultado da falta de iniciativa, uma frouxidão, elemento que torna o indivíduo incapaz
de alcançar a riqueza. Para ele esta incapacidade é uma escolha, e quem não tem
iniciativa merece ter a vida dificultada.
Nos diálogos enfatizou questões que estão em voga, como empreendedorismo
de palco, destacou uma rede de autoajuda para empresários e enfatizou ser adapto de
uma linha de empreendedorismo que designou como Marketing da felicidade.
“(Diálogo interlocutor 01) - Sabe por que as pessoas não alcançam seus
sonhos? Porque não possuem verdadeiro apego a suas metas. Se você
estabelecer seus objetivos, e pagar o preço necessário por isso, com certeza
alcançará as suas metas! Claro que neste processo existem muitas coisas
importantes, uma delas é estar próximo as pessoas certas, aquelas que podem
ensinar você a ser mais eficiente, aqueles que têm a experiência necessária.”

Falas sobre sucesso, superação, capacidade individual de empreender, riqueza,


eram uma constante. Algo que contrastava com sua decepção em relação ao setor ao
qual exercia seus negócios.
“(Diálogo interlocutor 01) - Sabe a coisa não funciona assim. Chega um
ponto que o dinheiro vem em tamanha quantidade que você deixa de se
preocupar com os números. As suas preocupações são outras. Você só se
preocupa em como vai aproveitar e reinvestir o que já vem naturalmente. As
coisas vão continuar a funcionar, as empresas já dão lucro, agora o cara vai
pensar em fazer coisas que o façam feliz, eu com a minha idade penso em
como vou aproveitar. O ideal é você dos 20 aos 30 estar com alguém que o
ensine a ganhar dinheiro, dos 30 aos quase 40 se preocupar em ganhar
dinheiro, dos 40 em diante você tem que aproveitar a riqueza que acumulou.

Declarava-se como investidor, destacando que sua empresa já era


independente na produção e distribuição de alimentos. Procurava explorar novos
mercados, em especial o do turismo na região serrana.
“(Diálogo interlocutor 01) - Hoje se você consegue trabalhar menos é o ideal,
pois ai se consegue tempo para aproveitar. Não preciso ficar a vida toda só
acumulando riqueza, sofre-se menos e se aproveita mais. Eu aprendi isso com
um empresário europeu que conheci em uma viagem na Itália, ele me ensinou
a pensar assim. Hoje eu particularmente trabalho apenas três dias de minha
semana, e acho isso o ideal, pois o resto do tempo agora eu dedico as estes
meus novos sonhos. Seria bom que todos conseguissem isso né?”

O destaque para sua mudança era referenciado como um momento de


autodescoberta, parafraseado em tom de grandeza. Segundo o interlocutor 01, a crise o
levou a descobrir mais sobre as suas potencialidades enquanto empresário e seu
humano.

Após o encontro desenvolvi uma pesquisa sobre o interlocutor 01, a fins de


entender sua trajetória. Desta análise destacarei algumas conclusões:
 Mais de 100 processos referentes a causas trabalhistas.

O evento que ele se referira sobre sua empresa, foi uma grande causa
trabalhista coletiva que havia perdido, onde mais de 40 trabalhadores foram submetidos
à exploração, caracterizando trabalho escravo. Eles foram levados para trabalhar em
uma região distante da cidade, e não podia sair da propriedade. Havia apenas um
pequeno mercado cujo proprietário era o empregador, ele superfaturava os preços
fazendo com que os trabalhadores gastassem grande parte de sua renda em seu pequeno
comércio.

 Era comum a ocorrência de acordos invalidados pela justiça, por se


encontrarem irregulares. Nestes os direitos dos empregados eram sonegados, ou ocorria
o não pagamento de recisões e horas extras, trabalho irregular e desvio de função.

Também havia registro de condenações indenizatórias, onde havia ordem de


penhora. No processo constava que não foram encontrados os bens que iam ser
aprendidos.

Após outros encontros já em período de implementação do empreendimento,


identifiquei algumas práticas irregulares que eram comuns no desenvolvimento de seus
investimentos.

Nenhum bem, nem contas bancárias as quais eram utilizadas para efetuar
pagamentos estavam no seu nome pessoal. Todas as contas estavam no nome dos filhos,
esposa e irmão.

Haviam várias empresas utilizadas na efetuação de negócios com


fornecedores, estas estavam sob seu controle, e eram registradas no nome dos filhos e da
esposa.

Maquinário de propriedade da prefeitura da cidade (caminhões, tratores,


automóveis) era utilizado em sua construção particular, onde abertamente alegava ser
beneficiado por acordos de troca de favores com os secretário e prefeito.
Cria meios e recursos para evitar ter que arcar com impostos, buscando
sempre realizar as compras com o mínimo de registros.

Houve grande destruição do patrimônio histórico da região, material que pós-


destruição foi reutilizado em sua obra.

Na relação com os trabalhadores ainda mantinha praticas abusivas:

Os trabalhadores são obrigados a permanecer no local de trabalho arcando


com despesas de locomoção e alimentação. O empresário havia acordado um valor de
diária para os serventes, onde não oferecia alimentação. Eles são um grupo que varia em
torno de trinta pessoas. O empreiteiro demonstrava grande insatisfação, pois o fato de
ter que prover alimentação para o grupo acabava em reduzir em muito o saldo dos
trabalhadores.

Transferiu responsabilidades trabalhistas para o empreiteiro da obra.

 Caracterizavam os trabalhadores como maliciosos em sua grande maioria, por


se aproveitarem da lei para obter benefícios por meio da justiça prejudicando o
empregador.

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