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e n c i a i s n a A m é r i c a
Eleiç õ e s p r e s i d
e a t i v i s m o p o l í t i c o
Lat i n a e m 2 0 1 8
i c o s c o n s e r v a d o r e s
d e e v a n g é l
ariano
Ricardo M
A n d r é G erardi
Dirce u
resumo abstract
indoctrination in schools.
ideológica e de “gênero” nas escolas.
Keywords: Evangelicals; Brazil; Latin
Palavras-chave: evangélicos; Brasil; America; presidential election; politics.
América Latina; eleição presidencial;
política.
N
as últimas décadas, grupos partidária e eleitoral, na formação de ban-
evangélicos têm protago- cadas parlamentares e de partidos. Passaram
nizado cada vez mais o a demandar tratamento estatal privilegiado
ativismo político cristão a suas igrejas e a tentar modelar o orde-
conservador na Amé- namento jurídico às suas convicções bíbli-
rica Latina, em aliança, cas. Aos poucos, seus repertórios morais e
geralmente, com grupos projetos políticos alinhados com a direita
católicos carismáticos, da cristã começaram a influenciar e delimitar
Opus Dei, “pró-vida” e a linguagem e os termos da agenda polí-
“pró-família”. tica e dos debates públicos sobre união civil
Em vários países de pessoas de mesmo sexo, aborto, direitos
latino-americanos, os humanos, família, gênero, educação, laici-
evangélicos não só su- dade, entre outros temas.
peraram a condição de minoria religiosa Peter Berger (2001, pp. 11 e 13) frisa
marginal como vêm conquistando crescente que os “movimentos religiosos” que mais
visibilidade pública, poder religioso, midiá-
tico e político1. No caso do pentecostalismo,
suas autoridades abandonaram o quietismo
apolítico vigente até os anos 70 e investiram, RICARDO MARIANO é professor do
sobretudo mas não só no Brasil, no lança- Departamento de Sociologia da USP,
pesquisador do CNPq e integrante, junto
mento de candidaturas oficiais, na realiza- ao Cebrap, do projeto Temático Religião,
ção de alianças e barganhas eleitorais, na Direito e Secularismo: a Reconfiguração do
Repertório Cívico no Brasil Contemporâneo,
ocupação e instrumentalização da política financiado pela Fapesp.
plano de governo: substituiu o trecho “políti- “baixo clero”, o que se refletia na sua débil
cas de promoção da orientação sexual e iden- coligação entre PSL e PRTB. Tal condição
tidade de gênero” por “políticas de combate e as declarações polêmicas contra direitos
à discriminação em função da orientação humanos, minorias, etc., paradoxalmente, lhe
sexual e identidade de gênero”. E suprimiu permitiram investir “contra tudo isso aí”,
a proposta de descriminalizar as drogas21. representar o candidato antissistema e, para
A disputa eleitoral contou também com muitos, a “renovação” da política.
três pentecostais: Marina Silva (Rede Soli- Com apenas oito segundos na TV, prio-
dariedade), missionária da Assembleia de rizou a campanha nas redes sociais, man-
Deus; Flávio Rocha (PRB), empresário e tida por eficiente batalhão de militantes
membro da Comunidade Evangélica Sara e apoiadores, além de bots, memes, fake
Nossa Terra; Cabo Daciolo (Patriota), bom- news. Dominou de cabo a rabo a disputa
beiro e pastor assembleiano. Marina defen- no campo da direita e não deu espaço para
deu a laicidade do Estado, antecipando acu- a ascensão de Alckmin (PSDB), Meirelles
sações dos adversários, como o fizera em (MDB), Amoedo (Novo) e Dias (Podemos).
2010 e 2014. Centrista, sem base e apoios de Após receber apoio de Edir Macedo, ganhou
peso, sucumbiu ao tsunami da polarização tratamento especial na Rede Record. No
política, amargando seu pior resultado: 1% dia 4 de outubro, por exemplo, a Record
dos votos. Pré-candidato, Rocha defendeu exibiu entrevista complacente com ele,
pautas da direita cristã: agenda moral ultra- enquanto a TV Globo transmitia debate
conservadora, neoliberalismo e pró-armas, com os demais candidatos.
mas abandonou o pleito antes de formali- O grave atentado à faca que sofreu em
zar a candidatura. Famoso pelo altissonante 6 de setembro assegurou-lhe extensa cober-
“glória a Deus”, pelo corporativismo mili- tura midiática e divulgação de suas ações,
tar e pela proposição da obrigatoriedade do alianças e propostas. Ajudou, sobretudo, a
estudo da Bíblia nos ensinos fundamental e “humanizá-lo” e lhe permitiu se esquivar
médio, Daciolo protagonizou aparições fol- dos debates posteriores. Havia comparecido
clóricas em debates na TV, vigílias de oração a dois deles até então, nos quais não demons-
em montes e prometeu, se eleito, retirar os trou bom desempenho. Daí em diante, “jogou
“illuminati e a maçonaria” do país. Obteve parado”. Isto é, manteve-se nas redes sociais
1,7% dos votos. e jogou como bem quis. Deu certo: venceu
Quem mais se beneficiou do apoio evan- o pleito pela vantagem de 11 milhões de
gélico, como vimos, foi Jair Bolsonaro votos, grande parte dela, se não toda, con-
(PSL), capitão reformado e entusiasta da cedida pelos evangélicos.
ditadura militar. Apesar dos sete manda- Nas últimas legislaturas, ele, que tem
tos de deputado federal, era um outsider do esposa e filhos evangélicos, firmou sólida
relação com a bancada evangélica e passou
a integrar a tropa de choque cristã contra a
criminalização da homofobia, a união civil
21 Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1eI6Z de pessoas de mesmo sexo e em defesa
qs4v0XqzbmfHVS9NNrppNwzLJE5x/view. Acesso em:
5/10/2018. da “cura gay”, dos estatutos do nascituro
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