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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO – UFMA

CURSO DE MEDICINA
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO MATERNO – INFANTIL
LIGA ACADÊMICA PARA ASSISTÊNCIA MATERNO FETAL -
AMAFETO

APOSTILA
PROCESSO SELETIVO 2018

SÃO LUÍS
2018
A Liga Acadêmica para Assistência Materno-Fetal – AMAFETO possui suas
ações nas áreas de atenção médica das gestantes de alto risco atendidas pelo serviço de
Toco-Genicologia do Hospital Universitário Unidade Materno-Infantil – HUUMI-
UFMA.

Os novos membros da Liga terão a oportunidade de participar dos plantões do


acolhimento, do centro obstétrico, aulas ministradas pelos próprios ligantes e
convidados, além de grandes novidades sendo planejadas para o próximo ano.

Em 2018, a Liga completa 15 anos de muito trabalho e dedicação. Exitosos nessa


caminhada, acreditamos mais ainda no futuro da Liga, renovada e ávida pela presença
dos acadêmicos comprometidos e dedicados a participar dessa nova fase e juntos
podermos dá seguimento à esse lindo trabalho.

Esta apostila contém o material referente aos conteúdos básicos e essenciais da área
obstétrica e deverão por ela basear seu estudo para as provas de conhecimento básico a ser
realizada após o curso de capacitação para admissão de novos membros da Liga.

Sejam todos bem-vindos e boa sorte !


SUMÁRIO

1. ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS NA GRAVIDEZ........................ 4

2. ANAMNESE EM OBSTETRÍCIA.................................................22

3. ESTÁTICA FETAL .......................................................................26

4. ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL ........................................................ 40

5. TRABALHO DE PARTO NORMAL ............................................51

6. ABORTAMENTO ................................................................................ 84

7. ASSISTÊNCIA AO PARTO NORMAL ............................................ 124


1. ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS
NA GRAVIDEZ

As alterações fisiológicas observadas na coluna lombar (Figura 5.1). Amplia-se a base do


gestação são decorrentes, principalmente, de fatores polígono de sustentação, os pés se afastam, e as
hormonais e mecânicos, e os ajustes verificados no espáduas se projetam para trás. Grupamentos
organismo da mulher devem ser considerados musculares que ordinariamente não têm função nítida
normais durante o estado gravídico, embora ou constante passam a atuar, estirando-se e contraindo-
determinem, por vezes, pequenos sintomas que se, e sua fadiga responde pelas dores cervicais e
afetam a saúde da paciente. lombares, queixa comum.
Para que essas modificações experimentadas
pela gestante sejam mais bem compreendidas, é
conveniente distingui-las em sistêmicas e dos
órgãos genitais.

■ MODIFICAÇÕES SISTÊMICAS

■ Postura e deambulação
A postura da gestante se altera, precedendo
mesmo a expansão de volume do útero gestante.
Quando, porém, a matriz, evadida da pelve, apoia-se
à parede abdominal, e as mamas, dilatadas e
Figura 5.1 ■ Centro de gravidade na gestante. As setas
engrandecidas, pesam no tórax, o centro de
mostram a tendência do seu deslocamento, compensado pela
gravidade se desvia para frente, e todo o corpo, em lordose.
compensação, projeta-se para trás. A atitude
adotada então é, de modo involuntário, a de quem A gestante, ao andar, lembra, com seus passos
carrega objeto pesado, mantendo-o, com as duas oscilantes e mais curtos, a deambulação dos gansos –
mãos, na frente do abdome. marcha anserina. A base de sustentação ampliada e os
Essa situação torna-se mais nítida quando a ângulos que formam os pés com a linha mediana
gestante está de pé, visto que, para manter o aumentados, principalmente à direita, por conta do
equilíbrio, empina o ventre, provocando a lordose dextrodesvio uterino, conferem peculiaridades à sua
da movimentação.
As articulações apresentam maior O consumo contínuo de glicose pelo concepto
mobilidade durante a gestação, notadamente as e seu rápido transporte através da placenta
sacroilíacas e a sínfise pubiana. Atribui-se à influenciam profundamente o metabolismo dos
relaxina, secretada pela placenta, a frouxidão dos carboidratos na gestante. Em todos os estágios da
ligamentos, especialmente da sínfise pubiana, que gestação, depois de uma noite de jejum, os níveis de
pode alargar cerca de 4 mm nas primíparas e 4,5 glicemia são 15 a 20 mg/dℓ inferiores aos sinalados
mm nas multíparas. A principal resultante dessas fora da gravidez.
modificações é o aumento da capacidade pélvica, A gravidez exibe aumento na resistência à
favorecendo a disjunção sinfisária e os movimentos insulina ao final do 2o trimestre, podendo chegar a,
de nutação do sacro. Essa crescente mobilidade das aproximadamente, 80% no termo.
articulações contribui para transformar a postura No 3o trimestre, após a administração de
materna e a sua marcha. glicose, observa-se hiperinsulinismo pós-prandial, à
conta dos fatores contrainsulares. Não há

■ Metabolismo hiperinsulinismo nas pacientes com limitada


capacidade de elaborar o hormônio e que irão
As alterações no metabolismo materno são
apresentar o diabetes gestacional.
necessárias para suprir as exigências suscitadas pelo
O efeito inibitório da insulina na lipólise é
rápido crescimento e desenvolvimento do concepto.
Na gravidez, as alterações do metabolismo significativamente reduzido durante o 3o trimestre

glicídico são notáveis Em razão de outra estrutura quando comparado ao de outras fases do ciclo
gestatório. Em resumo, a gravidez avançada
ter sido associada, o concepto, consumidor de
caracteriza-se por mudanças em seu metabolismo, no
glicose, a mãe vê-se submetida à permanente
que se refere à preservação de glicose à custa da
demanda de glicose. Diante de período prolongado
utilização dos lipídios. A liberação excessiva de
de jejum, o feto continua a extrair glicose e
ácidos graxos também contribui na redução da
aminoácidos da gestante, em taxas idênticas às
utilização da glicose materna.
observadas nos períodos de alimentação.
A fim de prover suprimento ininterrupto de
▶ Metabolismo do tecido adiposo materno
glicose e de aminoácidos para o concepto, a
gestante faz ajustes importantes: não consome mais O aumento do peso materno durante a

indiscriminadamente a glicose como antes, e, à gestação corresponde ao crescimento da unidade

medida que a gravidez se desenvolve, a sua fetoplacentária e ao acúmulo dos seus próprios

utilização periférica diminui, graças à elaboração de tecidos, especialmente o relacionado com a elevação

hormônios contrainsulares pela placenta. de lipídios nos depósitos de gordura. Esse fenômeno,
comum na gravidez humana e de alguns animais,
A glicose é transferida rapidamente ao feto,
ocorre durante os primeiros 2/3 da gestação e é
por difusão facilitada, embora seja pequeno o
responsável pela maior parte do acréscimo de peso
gradiente de concentração (os níveis fetais de
materno, excluindo o decorrente do concepto, e parece
glicose são cerca de 20 mg/dℓ inferiores aos da
mãe).
estar diretamente relacionado com a hiperfagia, pois Para conservar o sódio, quando a taxa de filtração
desaparece com a restrição alimentar. glomerular aumenta em torno de 50%, surge na

Esse aumento nos depósitos de gordura gravidez mecanismo compensatório representado pelo

maternos é especialmente decorrente da lipogênese sistema renina-angiotensina.

aumentada; ele corresponde à elevação na síntese de Aceitando-se que o ganho total de peso na

ácidos graxos e do glicerídio glicerol, indicando que gravidez seja de cerca de 11 kg, dos quais 70% são de
a formação dos triglicerídios está exaltada. água, para manter a isotonicidade, tornam-se

A tendência de acumular gordura cessa necessários 25 g de sódio ou 60 g de cloreto de sódio.

durante o último trimestre da gravidez, quando o Concluindo, o sódio deverá ser conservado

metabolismo lipídico se transmuda para estado para prover quantidade adicional indispensável à

catabólico, em virtude de diversas alterações expansão tecidual e dos compartimentos líquidos,

coincidentes que ocorrem no tecido adiposo, como durante a gestação.

o aumento da atividade lipogênica, que diminui Na verdade, a concentração de sódio no

rapidamente; e a atividade lipolítica que torna-se plasma encontra-se ligeiramente diminuída na

exaltada. gestação, assim como a osmolaridade total. A gestante


parece aceitar esse nível de osmolaridade, sem elevar
▶ Metabolismo hidroeletrolítico a diurese.

Uma das alterações sistêmicas mais notáveis Por outro lado, o limiar de sede na gravidez

observadas na gravidez é a retenção de liquido (8 a está alterado de tal sorte que a gestante sente vontade

10L), intra e extracelular, mas especialmente de ingerir liquido com nível mais baixo de

responsável pelo aumento do volume plasmático. osmolaridade do que a não gestante. Do mesmo modo,

Essa alteração hidroeletrolítica é decisiva para que há redução acentuada também da pressão oncótica

ocorram outras modificações importantes, tais como (pressão coloidosmótica) determinada principalmente

o aumento do débito cardíaco e o do fluxo pela queda na concentração de albumina plasmática

plasmático renal. de cerca de 20% (niveis gravidicos: 2,8 a 3,7 g/d.). O

Consequência direta do acúmulo do volume significado dessa alteração é o de que a pressão

plasmático é observada na interpretação dos exames oncótica é o fator mais relevante para o equilíbrio de

hematológicos na gravidez. O acréscimo do volume Starling, vale dizer, o grau de passagem de líquido

plasmático é maior na gravidez gemelar e menor através dos capilares (inclusive dos capilares

naquela complicada pelo crescimento intrauterino glomerulares).

restrito (CIR) e pela pré-eclâmpsia.


O provável mecanismo para essa adaptação
é a retenção de sódio, determinada principalmente ■ Alterações Hemodinâmicas no
pela maior secreção de aldosterona pela suprarrenal, Sistema Cardiovascular
a despeito do efeito natriurético da progesterona. As maiores alterações hemodinâmicas vistas
na gravidez incluem o aumento do débito cardíaco, do
Volume sanguíneo, por causa principalmente do posição supina (Figura 5.7). Muitas mulheres
volume plasmático, da redução da resistência experimentam, em consequência, a chamada síndrome
vascular periférica e da pressão sanguínea. Essas de hipotensão supina, às vezes apresentando até perda da
alterações já aparentes no início da gravidez consciência. Adotando o decúbito lateral esquerdo, o
alcançam o seu máximo no terceiro trimestre (28 a débito cardíaco é restaurado quase automaticamente.
32 semanas) e permanecem relativamente
constantes até o parto. Elas contribuem para o ótimo
crescimento e desenvolvimento do feto e protegem a
mãe das perdas fisiológicas de sangue no parto. O
conhecimento dessas alterações hemodinâmicas é
indispensável para prever os seus efeitos na gravida
cardiopata.
O início da gravidez é caracterizado por
vasodilatação periférica, provavelmente
consequência do aumento do óxido nítrico, fator
Figura 5.7 ■ Síndrome de hipotensão supina.
vasoativo, relaxante, elaborado pelo endotélio
vascular. O acréscimo significativo da frequência
A despeito do aumento acentuado do volume
cardíaca já pode ser observado na gestação de 5
sanguíneo e do débito cardíaco, há redução da pressão
semanas, e isso contribui para a elevação do debito
arterial, e m v i rt u d e d o d e c r é s c i m o d a
cardíaco (debito cardíaco = volume sistólico X
resistência vascular periférica. A pressão arterial
frequência cardíaca). Todavia, a elevação do
sistólica e a diastólica estão diminuídas de 5 a 10
volume sistólico apenas é observada várias semanas
mmHg no segundo trimestre, atingindo valores
depois, possivelmente pela expansão do volume
médios de 105/60 mmHg. No terceiro trimestre, a
plasmático.
pressão se eleva e se normaliza no termo. A aferição
A elevação progressiva na frequência
precisa da pressão diastólica é fundamental para
cardíaca materna prossegue até 28 a 32 semanas,
caracterizar os distúrbios hipertensivos da gravidez, e
com um acréscimo de 10 a 15 bpm (10 a 20%), se
a técnica correta é aquela que utiliza como ponto de
comparado ao ritmo existente fora da gravidez. Há
referência o desaparecimento do som (quinto som de
igualmente aumento progressivo no volume
Korotkoff). A pressão venosa nos membros inferiores
sistólico durante a primeira metade da gestação em
aumenta cercade três vezes emvirtude da compressão
razão do maior volume plasmático, como já foi
que o útero determina nas veias pélvicas, em
relatado. Em consequência, o débito cardíaco, que
particular na posição de pé, parada, quando há maior
em média era de 5 ℓ/min fora gravidez, eleva-se para
aprisionamento de sangue nas pernas e nas coxas. Há,
aproximadamente 7 ℓ/min em torno de 28 a 32
na gravidez, tendência à hipotensão, lipotimia,
semanas da gestação (acréscimo de 40 a 50%),
ortostática, edema dos membros inferiores,
estabilizando-se até o parto. A partir de 20 semanas
varicosidades e hemorroidas.
de gestação, o útero gravídico i m p e d e o retorno
venoso ao coração, quando a gestante assume a
Fala-se, inclusive, em trombocitopenia gestacional no

■ Sistema Sanguíneo 3o trimestre, com níveis de 80 a 150 mil/mm3.


Há igualmente alterações importantes na
A alteração marcante no volume plasmático
coagulação sanguínea durante a gravidez e, nesse
observada na gravidez normal causa diluição da
contexto, caracterizadas por estado de
maioria dos fatores circulantes. De particular
hipercoagulabilidade. Ocorre aumento significante de
interesse é a hemodiluição das hemácias. Embora a
diversos fatores de coagulação, notadamente do
produção de eritrócitos esteja elevada na gravidez,
fibrinogênio, que pode atingir 400 a 600 mg/dℓ no 3o
com pico de cerca de 15% em torno de 32 semanas,
trimestre e redução da atividade. Essas modificações
ela é ofuscada pela elevação de 40% do volume
são responsáveis pela hemostasia fisiológica ao tempo
plasmático. Assim, os índices hematológicos que
da separação da placenta no secundamento.
dependem do volume plasmático tendem a
Na verdade, a contração miometrial é o
decrescer: contagem de hemácias, hematócrito,
principal mecanismo de defesa, comprimindo os
concentração de hemoglobina.
vasos sanguíneos no leito placentário. Mas quase
A concentração de hemoglobina reduz de
imediatamente, há depósito de fibrina na ferida
13,3 g/dℓ, valor médio não gravídico, para 11 g/dℓ,
placentária, consumindo 5 a 10% de todo o
no terceiro trimestre da gravidez. É a clássica
fibrinogênio circulante.
“anemia fisiológica da gravidez”, confundida
Essa hipercoagulabilidade fisiológica da
frequentemente com o estado de anemia ferropriva.
gravidez, em contrapartida, é responsável pelo risco
A gestante requer maior quantidade de ferro
aumentado de trombose que a grávida apresenta.
alimentar para suprir as suas necessidades e as do
feto, e, na verdade, há aumento na absorção desse
elemento no intestino.
■ Sistema Urinário
Durante a gravidez, as necessidades de ácido
fólico estão aumentadas de 50 para 400 μg por dia. ▶ Modificações anatômicas
Há pesquisas comprovadas de que a suplementação Os rins se deslocam para cima pelo aumento
de ácido fólico antes da gravidez e no primeiro do volume uterino e aumentam em tamanho cerca de
trimestre reduz expressivamente os defeitos do tubo 1 cm em virtude do acréscimo do volume vascular
neural (DTN) e outras malformações. A renal e do espaço intersticial. Uma das mais
suplementação universal de ácido fólico também é significantes alterações do sistema urinário
proposta para prevenir a anemia megaloblástica. observadas na gravidez é a dilatação da sua porção
Ao contrário das hemácias, os leucócitos superior que já ocorre a partir de 7 semanas em até
têm a sua concentração majorada na gestação, 90% das gestantes e pode persistir até 6 semanas do
3
podendo alcançar, no termo, até 20 mil/mm . A pós-parto (Figura 5.8). Considera-se que essa
concentração de plaquetas exibe, por outro lado, hidronefrose fisiológica resulte tanto de fatores
3
pequeno decréscimo (250 para 210 mil/mm , hormonais quanto mecânicos. O útero expandido
valores médios).
diretamente comprime os ureteres, enquanto a diminuição do suporte pélvico da parede vaginal
progesterona inibe a musculatura lisa ureteral, anterior e da uretra, alterações que podem contribuir
determinando ureteroectasia. A dilatação ureteral é para a incidência elevada de incontinência urinária na
mais pronunciada à direita em virtude da gravidez.
dextrorrotação uterina, estando o ureter esquerdo
relativamente protegido pelo sigmoide. A dilatação ▶ Modificações fisiológicas
do sistema urinário superior pode aumentar a estase Com o aumento do débito cardíaco e a
urinária, predispondo a gestante a infecções diminuição da resistência vascular sistêmica
urinárias, pielonefrite e nefrolitíase. Não obstante observados na gestação, há concomitante aumento do
essa hidronefrose possa, por vezes, causar dor, fluxo plasmático renal e da TFG, que podem estar
exigindo analgésicos e até colocação de stents, ela é aumentados, respectivamente, de 50 a 85% e 40,65%,
considerada fisiológica. quando comparados a valores não gravídicos.
A elevação da TFG resulta em diminuição da
creatinina plasmática, que alcança em média valores
de 0,5 a 0,8 mg/dℓ. Isso causa repercussões
importantes, uma vez que a excreção renal de
determinados medicamentos pode estar alterada e os
valores de creatinina no soro indicativos de
insuficiência renal podem ser mais baixos.
A concentração de ácido úrico, de valores não
gravídicos de 4 mg/dℓ, cai para ≤ 3mg/dℓ no 1º
trimestre da gravidez, devido à ação uricosúrica dos
estrogênios e do aumento da taxa de FGR; eleva-se
depois, a partir do 3o trimestre, até atingir 4 a 5 mg/dℓ
no termo da gestação.
A hipercalciúria também é comum na gravidez
Figura 5.8 ■ Hidronefrose à direita. pelo aumento da absorção do cálcio intestinal.
Todavia, a taxa de formação de cálculos renais
No sistema urinário inferior, a anatomia da permanece inalterada, à medida que fatores inibidores
bexiga está distorcida pela compressão direta do na sua produção, tais como citrato, magnésio e
útero gravídico. A bexiga é deslocada glicoproteínas, também estão aumentados.
anteriormente, com expansão lateral, pari passu com A glicosúria é fisiológica na gravidez e se deve
a compressão do útero aumentado na cúpula vesical. ao aumento da TFG que excede o limite da reabsorção
Além disso, os níveis circulantes elevados de tubular da glicose. Desse modo, não é indicativa de
estrogênios determinam hiperemia e congestão da diabetes na gestação, assim como não serve para o seu
mucosa uretral e vesical. Há também redução da rastreamento.
resposta contrátil do
colo vesical a estímulos alfa-adrenérgicos e
teratogênica está disponível para sintomas
intoleráveis.
Alterações marcantes na caixa torácica e no
diafragma caracterizam a gravidez. Com o
relaxamento dos ligamentos das costelas, o ângulo
subcostal aumenta de 68 para 103°. Os diâmetros
anteroposterior e transverso do tórax aumentam 2
cm cada um, resultando na expansão da
circunferência torácica de 5 a 7 cm. Embora o
diafragma se eleve aproximadamente 4 cm pelo
aumento do útero gravídico, sua função não é
Figura 5.10 ■ Alterações respiratórias durante a
comprometida; na verdade, sua excursão está
gravidez. (Adaptada de Bonica, 1967.)
incrementada de 1 a 2 cm (Figuras 5.9 e 5.10). A
complacência da parede torácica, todavia, diminui
Estudos radiológicos realizados no início da
com o evoluir da gestação, aumentando o trabalho
gravidez já atestam essas alterações anatômicas,
da respiração. muito antes que ocorra qualquer pressão mecânica do
útero engrandecido.
Já no 1o trimestre da gestação o volume-
minuto, o produto do volume-corrente (tidal volume)
pela frequência respiratória, aumenta 30 a 40%,
refletindo a elevação do volume-corrente, pois a
frequência respiratória não se altera. A expansão da
caixa torácica e o aumento do estímulo respiratório

10
Figura 5.11 ■ Alterações fisiológicas respiratórias na gravidez.
Pela elevação da cúpula do diafragma no final da gravidez
estão diminuídos o volume residual e o volume de reserva
expiratório, o que reflete na capacidade residual funcional. O
aumento do volume-corrente (tidal volume) eleva o volume-
minuto, mas a frequência respiratória não se altera. Essa
hiperventilação é fisiológica desde o início da gravidez,
provalvemente por causa da ação da progesterona no centro
11
respiratório.

12
comparação a controles não gravídicos. Por isso,
A já referida hiperventilação da gravidez
recomenda-se reduzir a intensidade do exercício
ocasiona alcalose respiratória compensada, com
aeróbio na gravidez. Durante o parto, as contrações
2
diminuição do PCO < 30 mmHg, embora haja
uterinas dolorosas estão acompanhadas por resposta
2
modesto aumento no PO (101 a 104 mmHg). A
similar, que pode ser atenuada pela administração de
2
diminuição do PCO é compensada pelo aumento da analgésicos.
excreção urinária de bicarbonato, cuja concentração
Em decorrência do aumento do consumo de
diminui no plasma; por isso, o pH arterial não sofre
oxigênio materno e da diminuição da capacidade
alteração significativa (pH = 7,4), caracterizando a
residual funcional, gestantes com asma, pneumonia
alcalose respiratória compensada (Tabela 5.3).
ou outras doenças respiratórias estão mais suscetíveis
à descompensação rápida.
A resolução das alterações respiratórias
induzidas pela gravidez começa 24 a 48 h após o parto
e está completa com 7 semanas do puerpério.

■ Sistema Digestivo
No 1o trimestre é frequente o aparecimento de
náuseas e vômitos (50 a 90% das gestantes), levando,
em geral, à anorexia, embora uma quantidade
equivalente de mulheres relate melhora no apetite e
parcela considerável admita “desejos” por certos
alimentos.
Cerca de 60 a 70% das gestantes livres de A gengivite, no ciclo gestatório, assim como
doença respiratória experimentam dispneia. Como os fora dele, é consequente ao acúmulo da placa
o o
sintomas começam no 1 ou no 2 trimestre e se bacteriana na margem gengival, e se apresenta com
estabilizam no 3o, não é provável qualquer papel eritema, sangramento e intumescimento da zona
determinante do útero aumentado de tamanho. A afetada, bem como extremo desconforto para a
dispneia parece decorrer da percepção da paciente à paciente. Quando essas alterações periodontais são
hiperventilação da gravidez. O exercício acarreta muito intensas, podem deflagrar parto pré-termo, o
aumento compensatório na frequência respiratória, que é discutível.
volume-corrente e consumo de oxigênio. Essa As gengivas estão comumente edemaciadas,
resposta adaptativa ao aumento do trabalho hiperêmicas, e sangram com facilidade. Não se
respiratório está amortecida na gestante em provou, contudo, tendência para o aparecimento de
cáries dentárias na gestação, nem, tampouco, que a

13
14
III, também encontrada em abundância na placenta, aréolas mamárias e da face (cloasma). É habitual o
catalisa T4 em T3 reversa (rT3). aparecimento de telangiectasias, a traduzirem os altos
níveis estrogênicos. É provável que o hormônio
melanotrófico da hipófise atue também sobre os
melanoblastos epidérmicos, acentuando a
pigmentação, e o sistema nervoso autônomo
influencie a formação do pigmento nas gestantes.
A hipertricose é fenômeno fisiológico durante
a gravidez (pelos na face e em outras regiões,
crescimento mais acentuado dos cabelos), com unhas
muito quebradiças e surgimento do eritema palmar e
da hipertrofia das glândulas sudoríparas e sebáceas.

■ MODIFICAÇÕES DOS ÓRGÃOS


GENITAIS

■ Vulva e Vagina
Sob a influência dos estrogênios, o epitélio
vaginal se espessa durante a gravidez e há aumento da
sua descamação, o que resulta maior secreção vaginal.
Figura 5.13 ■ Alterações fisiológicas da tireoide na Essa secreção tem pH mais ácido do que o existente
gravidez. São eventos marcantes a elevação da concentração da na mulher não gestante (4,5 a 5,0), para proteger
globulina de ligação da tireoxina (TBG) e da gonadotrofina contra a infecção ascendente. A vagina também
coriônica humana (hCG) com sua ação tireotrófica, mas também
aumenta a sua vascularização com a gravidez.
alterações periféricas nos hormônios tireoidianos. (TRH,
A vulva e a vagina tumefazem-se,
hormônio liberador de tireotrofina; TSH, hormônio estimulante
da tireoide; T4, tireoxina; T3, triiodotironina. experimentam amolecimento e têm sua coloração
alterada. A vulva pigmenta-se e o sítio lindeiro à
▶ Pele e fâneros extremidade inferior da vagina perde o róseo
Cerca de 50% das gestantes exibem estrias no característico, tomando a cor vermelho-vinhosa,
abdome, no decurso do último trimestre, por vezes entreabertos ninfas e grandes lábios (sinal de
encontradas também nos seios (estrias gravídicas ou Jacquemier).
víbices). Inicialmente vermelhas, tornam-se, mais
tarde, brancas ou nacaradas, persistindo ■ Útero
indelevelmente. Há aumento na pigmentação da linha
alba do abdome inferior (linea nigra), da vulva, das

15
Órgão simples, na aparência, o útero apresenta
características histológicas e funcionais peculiares. ▶ Útero na gravidez
Nem é de se estranhar sua complexidade: destinado a Há imediato amolecimento na região
reter e abrigar o concepto e seus anexos; gravídico, em correspondente ao local da implantação, progredindo
pouquíssimo tempo se modifica fundamentalmente. por todo o órgão e pelas outras estruturas pélvicas. É
Com extrema sensibilidade a estímulos hormonais e a diminuição da consistência subordinada à
nervosos, é dotado da capacidade de adaptar-se a embebição gravídica e à redução do tônus,
desmesurado crescimento e de proporcionar ao ovo precocemente notadas especialmente no istmo,
considerável afluxo sanguíneo; são lhe inerentes, determinando o sinal de Hegar.
ainda, as propriedades de impedir a interrupção Simultaneamente, o órgão aumenta,
prematura da gravidez e, chegado o termo, de inicialmente de modo desigual, mais acentuada a
transformar, a curto prazo, a capacidade de retenção expansão na zona de implantação, o que lhe impõe
em eficaz motor expulsivo. forma assimétrica (sinal de Piskacek). A matriz de
Há de diferenciar-se, no útero, corpo, istmo e piriforme passa a globosa, e o toque dos fundos de
colo; a morfologia da víscera se modifica, de modo saco laterais revela essa morfologia (sinal de Nobile-
considerável nas diversas fases da vida (Figura 5.15). Budin), enquanto o pulso da artéria uterina pode ser
percebido.
De volume crescente, o corpo do útero
mantém a configuração esférica até o 4o a 5o mês,
quando o alongamento predomina sobre os diâmetros
transversos, conferindo à víscera forma cilíndrica. A
expansão do istmo, levando à incorporação de sua
cavidade à do corpo, acentua, nos últimos meses, a
cilindrificação da matriz.
Nos primeiros 2 meses o útero é órgão
exclusivamente pélvico; com 12 semanas torna-se
perceptível ao palpar abdominal, o que depende do
panículo adiposo e da musculatura da parede.
O crescimento subsequente pode ser
acompanhado, mês a mês, delimitando-se o fundus e
Figura 5.15 ■ O útero nas diversas fases da vida. A. Feto a
termo: o colo é maior do que o corpo. B. Recém-nascido e medindo-se a altura em relação à sínfise púbica.
infância; carente de estímulos hormonais, o útero regride, de O útero sofre aumento dramático no seu peso
modo mais acentuado no corpo. C. Puberdade: a atividade (de 4 a 70 g na não gestante, para 1.100 a 1.200g na
ovariana provoca o desenvolvimento de órgão. D. Menacma:
gestante a termo) e no seu volume (de 10 mℓ para 5 ℓ)
útero não gravídico de nuligesta. E. Menacma: útero não
durante a gravidez. O número de células miometriais
gravídico, de multigesta. F. Senilidade: há involução de todo o
órgão, especialmente do corpo. G. Na gestante.

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aumenta no início da gestação (hiperplasia) e, depois, de todo o órgão e afinamento do miométrio, que no
permanece estável. corpo e a termo tem somente 4 a 10 mm.
O crescimento miometrial na segunda metade Nos primeiros meses da gravidez é pequena a
da gestação resulta primariamente do aumento no participação do istmo uterino nas modificações do
tamanho da célula (hipertrofia) que ocorre sob a útero. Sua cavidade ainda é continuação direta do
influência dos hormônios esteroides, principalmente canal cervical, e o orifício interno do canal do istmo
os estrogênios. Ainda na segunda metade da gestação, é, de fato, o orifício interno anatômico. A abertura
a distensão que a matriz sofre pelo aumento do seu desse orifício e o crescente desenvolvimento do istmo
conteúdo determina afinamento gradual da parede incorporam, gradativamente, a cavidade do istmo à
uterina, especialmente no istmo, que não sofre cavidade do corpo, constituindo, o conjunto, a
hipertrofia e, então, constitui o segmento inferior do cavidade do útero. À conta disso, o orifício interno do
útero. canal cervical passa a denominar-se também orifício
O aumento do tamanho do útero é interno obstétrico. Há quem considere, no conjunto
acompanhado por elevação de 10 vezes no seu fluxo assim formado, corpo e istmo, três porções: os
sanguíneo – de 2% do débito cardíaco fora da segmentos superior, médio e inferior. O segmento
gravidez, para 17% no termo. Além disso, há superior é a porção do corpo situada acima de um
redistribuição do fluxo sanguíneo dentro do útero, plano passando pela inserção uterina dos ligamentos
antes igualmente repartido para o miométrio e o redondos. O segmento médio estende-se desse ponto
endométrio, e agora 80 a 90% dirigidos para a até o segmento inferior. O segmento inferior
placenta. Esse aumento marcante do fluxo corresponde ao istmo.
uteroplacentário é consequência da diminuição da O uso não consagrou a divisão do corpo em
resistência vascular placentária, vale dizer, segmentos superior e médio, mas sancionou, para o
remodelação das artérias espiraladas pelo trofoblasto inferior, a denominação abreviada de segmento.
extraviloso.
No início da gestação avigora-se a ▶ Miométrio
anteversoflexão, o que motiva polaciúria, elemento O miométrio é constituído, essencialmente,
semiótico no diagnóstico da gravidez. O crescimento pelo entrelaçamento de dois sistemas de fibras
subsequente ameniza e depois elimina a pressão sobre simétricas, que se correspondem, como em química,
a bexiga, substituída pelo apoio do órgão, duas substâncias estereoisômeras. As fibras circulares
engrandecido e pesado, sobre a parede abdominal. Em das tubas uterinas continuam-se pelo útero, em
80% dos casos a matriz está desviada para o lado espirais amplas, descendentes, cujo encontro se dá em
direito e torcida no mesmo sentido (dextrodesvio e ângulo aproximadamente reto na porção fúndica e, em
dextrotorção). ângulos mais abertos, nas zonas inferiores do útero.
A espessura do miométrio, de 7 a 12 mm antes As fibras alcançam o istmo e a cérvice pela porção
da gravidez, alcança nos primeiros meses cerca de 25 intravaginal (Figura 5.16).
o o
mm; assim se mantém até o 4 a 5 mês. A subsecutiva
17
ampliação da cavidade uterina dá-se por crescimento
Superficialmente, sob o peritônio, há feixes uma célula a outra, facilitando a despolarização e,
musculares, de menor importância, diferente subsequentemente, a contração miometrial.
orientação e proveniência. Alguns continuam a Inicialmente, as contrações são indolores, e as
musculatura longitudinal das tubas uterinas e da mais generalizadas são denominadas de Braxton-
vagina; outros prolongam os ligamentos, sobretudo os Hicks; posteriormente, a atividade do marca-passo
redondos e os uterossacros, não avançando além da localizado ao fundo uterino promove as contrações
linha mediana (Figura 5.16). coordenadas com dominância fúndica.
O segmento inferior contém menos músculos
e vasos sanguíneos, é fino, e é o local da incisão na
imensa maioria das operações cesarianas.

▶ Colo
Sob a influência dos estrogênios e da
progesterona, o colo torna-se amolecido durante a
gravidez. O estrogênio estimula o crescimento do
epitélio colunar (ou glandular) do canal cervical,
Figura 5.16 ■ Estrutura muscular e fibrosa do útero.
torna-se visível na ectocérvice e é denominado
Esquema de Gorttler. A. São observadas: 1, as fibras
ectrópio ou eversão. Esse epitélio mais frágil está
longitudinais que prolongam as da tuba uterina e as da vagina; 2,
as provenientes dos ligamentos redondos e uterossacros; 3, as sujeito a sangramento. O colo fica azulado na gravidez
que continuam as fibras circulares das tubas uterinas. B. Curso em razão da sua maior vascularização. As
espiralado e decrescente das fibras que constituem a maior parte prostaglandinas induzem a remodelação do colágeno
da massa miometrial.
cervical, particularmente no final da gestação,
enquanto a colagenase produzida pelos leucócitos
No início da gravidez, o crescimento do útero
também contribui para o amolecimento do colo.
é independente do feto. A medida que a gravidez
Ao colo corresponde o canal cervical, e ao
progride, as divisões das células miometriais se
istmo, o canal do istmo. Fora da gravidez, o limite
tornam menos expressivas e a musculatura cresce por
inferior do colo é o orifício externo do colo ou orifício
estiramento determinado pelo conteúdo uterino, o que
externo do útero (Figura 5.19). A extremidade
aumenta em 15 vezes o comprimento das fibras
superior do colo é o orifício interno do colo, orifício
musculares.
externo do istmo ou orifício interno histológico. O
Simultaneamente, com as alterações das
limite superior do istmo é o orifício interno do istmo
células miometriais, conexões celulares
ou orifício interno anatômico. Na gravidez, o istmo
especializadas se desenvolvem continuamente, as
desenvolvido e incorporado à cavidade do corpo
chamadas junções comunicantes. Essas junções
sinala muito bem o limite superior do colo,
comunicantes possibilitam que as alterações de
denominado orifício interno obstétrico, em
potencial da membrana se espalhem rapidamente de
contrapartida ao orifício externo obstétrico, que é o 18
orifício externo do colo (Figura 5.19).
O amolecimento, notado ao exame da genitália
interna, é precoce e constitui sinal de probabilidade no
diagnóstico da gravidez.
Modifica-se a posição do colo. Na decorrência
do crescimento do corpo, a cérvice eleva-se e se
orienta na vagina, situando-se posteriormente, em
direção ao côncavo sacro. É de difícil acesso, tanto ao
toque como ao exame especular. Quando a insinuação
da cabeça ocorre, no final da gravidez, desce o colo e
centraliza-se no eixo vaginal.
Torna-se o orifício externo, ao termo, e até na
nulípara, permeável ao dedo ou apenas à polpa digital;
na multípara e, sobretudo, quando há antecedentes de
lacerações cervicais, é, desde cedo, franqueável por
um ou dois dedos; no pré-parto dilata-se mais o
orifício externo, que costuma, na multípara, mostrar-
se entreaberto.
O canal cervical é obliterado por secreção
mucosa espessada - tampão mucoso -, dito de proteção
ao ovo (Figura 5.20). A eliminação dele, nas
proximidades do parto, à medida que o colo se
encurta, constitui o sinal de tão grande importância
clínica. Figura 5.19 ■ São sinônimos: 1, orifício interno do istmo e
orifício interno anatômico; 2, orifício externo do istmo, orifício
interno do colo, orifício interno histológico e orifício interno
obstétrico; 3, orifício externo do colo, orifício externo do útero e
orifício externo obstétrico.

O encurtamento do colo também é prenúncio


do parto, acentuando-se até o completo apagamento,
na verdade, fenômeno observado apenas em
primíparas (Figura 5.20). O apagamento do colo é
consequência da remodelação cervical, com quebra e
rearranjo do colágeno pelas metaloproteinases da
matriz, reação inflamatória mediada por citocinas e

19
21
2. ANAMNESE EM OBSTETRÍCIA

Os princípios gerais na propedêutica obstétrica são os mesmos da semiologia médica,


porém, algumas particularidades devem ser minuciadas.

2.1 IDENTIFICAÇÃO

 Idade: mesmo que o início da gestação possa ocorrer já aos 10 anos, a gravidez tem as melhores
condições, do ponto de vista biológico, a partir de 18 -20 anos. O período do mais perfeito
desempenho, dura cerca de uma década, até os 30 anos, quando os riscos para a mãe e a criança
começam a crescer.
 Profissão: As intoxicações profissionais, de ação lenta, comprometem a evolução gravídica. É o
que se dá com as produzidas pelo álcool, chumbo, fósforo, nicotina, etc. É ainda mais importante o
conhecimento da profissão da gestante quando a mesma é predisposta ao abortamento; sendo,
assim, necessária a orientação adequada quanto à abstinência de esforço físico.
 Estado civil: A influência dessa condição é notória, vez que abundam estatísticas mostrando a
maior morbidade e mortalidade materna e fetal entre as solteiras.
 Naturalidade e procedência: dado importante pois segundo a procedência da paciente, virá
orientação no sentido de rastrear a possibilidade de enfermidades que poderão influir grandemente
na gestação (áreas endêmicas de Chagas, esquistossomose, malária, etc).

2.2 ANTECEDENTES E HÁBITOS DE VIDA


 Antecedentes pessoais: Perguntar sobre doenças na infância, vacinações, cirurgias prévias e
patologias como Diabetes e Hipertensão arterial. No que tange aos antecedentes especificamente
ginecológicos, investigar a respeito da menarca, coitarca, uso de métodos contraceptivos e
características dos ciclos menstruais (regular ou irregular). Além disso, perguntar sobre doenças
ginecológicas prévias (candidíase, DST, condiloma, etc).
 Antecedentes familiares: importante perguntar sobre diabetes, hipertensão, doenças
cardiovasculares e anormalidades genéticas.
 Os hábitos da paciente, entre eles o tabagismo, alcoolismo, drogas ilícitas são importantes,
devendo criar-se empatia para obter essas informações com

22
fidelidade. Sem criar um ambiente emocional adequado, esses hábitos/costumes, geralmente, são
omitidos pelas pacientes.

2.3. ANTECEDENTES OBSTÉTRICOS


 Gesta e Para (G P A): Pesquisa-se a respeito do número de gestações, paridade e Abortos. Por
exemplo, uma representação G2 P1 A0 indica que a paciente está na sua segunda gestação, teve
um parto e não realizou aborto.
 Saber o intervalo interpartal, o número de filhos vivos, a idade na 1ª gestação, perguntar sobre a
gestação anterior: se fez pré-natal, as condições do parto, qual foi o peso RN, se foi prematuro,
se ela amamentou e por quanto tempo, e como foi o puerpério.

2.4. EXAME FÍSICO

No exame físico geral, a pesquisa de edema, varizes, icterícia, hidratação, coloração de


mucosas, peso e altura são fundamentais e servirão de base para o seguimento futuro. Dentre os
sistemas/aparelhos avaliados no exame físico especial destacamos: cárdio-circulatório,
respiratório, digestivo e endócrino. No exame obstétrico, é necessário aferir altura uterina e
circunferência abdominal. Na avaliação dos genitais externos, não há diferença da avaliação
ginecológica. No exame especular vaginal, observa-se se há lesões vaginais e cervicais, ectopia
periorificial e características do conteúdo vaginal. O exame das mamas e o toque vaginal
completam a semiologia obstétrica.

 Cabeça: Em grande número de gestantes, nota-se pigmentação difusa ou circunscrita, mais nítida
nas zonas muito expostas à luz (fronte, nariz e região zigomática), de tonalidade escura,
manchando a pele, denominada cloasma ou máscara gravídica. Essa alteração da deposição do
pigmento será abrandada poupando-se a pele da insolação.

 Mamas: Mostra as mamas aumentadas de volume, em consequência da hipertrofia e das


modificações que gradativamente vão ocorrendo para prepará- las para a amamentação. A partir de
16 semanas aparece a secreção de colostro, que pode ser percebido pela expressão da base, na
direção dos canais galactóforos. Aréola primitiva mais escura do que fora da gestação, apresenta
ao redor a aréola secundária, menos pigmentada. A melhor circulação que acompanha o desenvolvimento
das mamas deixa perceber uma trama de vasos venosos na pele: é a REDE DE HALER. Aparecem
também os tubérculos de MONTGOMERY, em número de 12 a 15, que pelo comum regridem no
puerpério, são de duas natureza: glândula mamárias, ou sebáceas. O exame das mamas além mostrar essas

23
características, deve ser feito no sentido de verificar mal formações nos mamilos, que indiquem
dificuldade ou incapacidade para amamentação.
 Abdômen: globoso ou ovóide. A cicatriz umbilical torna-se plana, e as vezes até saliente. Na
primigesta, a musculatura da parede, conservando sua capacidade de contenção, mantém o útero
em boa posição, porém nas multíparas fica comprometida a tonicidade da aponeurose e fibras
musculares o que condiciona o ventre pêndulo, causa habitual de vício de apresentação e
distorção pela falta de coincidência do eixo do útero com o do feto e da bacia. Evidencia-se a
hiperpigmentação da linha alva (linea nigra). A inspeção mostra na gestante o aparecimento de
estrias produzido pela sobre distensão das fibras elásticas.
 Membros inferiores: Com alguma frequência exibem dilatação circunscrita de vasos sanguíneos,
exagerados pela influência da gestação, ou mesmo varizes aumentadas. No final da gravidez, não
raro, observa-se o edema.
 Aparelho genital externo: pigmentação da pele mostra-se mais carregada, formando-se aréola
escura em torno do ano. A influência hormonial da gestação e, mais adiante, o fator mecânico
modificam a mucosa, que se mostra hiperpigmentada, tumefeita e transformada quanto à sua
coloração. De rosada torna-se cianosada, violácea, ou azulada. Essas alterações são percebidas
muito precocemente no vestíbulo e nas proximidades do meato urinário e se intensificam à
medida que progride a prenhez, sendo conhecidas como sinal de Jacquemier, pelos europeus, e
sinal de Chadwick entre os norte-americanos.

24
2. ESTÁTICA FETAL
REFERÊNCIAS
Rezende – Obstetrícia Fundamental
Zugaib - Obstetrícia

25
3. ESTÁTICA FETAL

Para entendermos o mecanismo de parto, é preciso compreender as relações do produto


conceptual com a bacia e com o útero constitui, o que chamamos de estática fetal. Seu estudo permite o
conhecimento da nomenclatura obstétrica. Esta orienta a documentação do parto e a comunicação entre
os profissionais para que possa haver, posteriormente, entendimento dos procedimentos e
acontecimentos. Depois de estabelecido sua posição dentro do útero, o feto apresenta quatro
propriedades cuja definição é nosso objetivo neste capítulo, sendo elas: atitude, situação, apresentação
e posição.

3.1 ATITUDE
- Durante a gestação – O espaço uterino, ao termo da gravidez, mede na maior de suas dimensões,
cerca de 30 cm. O concepto, com aproximadamente 50 cm de comprimento, deve adaptar-se a esse
continente uterino, flexionando-se. Deste modo, o eixo longitudinal fetal (do lâmbda ao coccige) fica
reduzido a 25 cm.
Atitude ou hábito fetal é a relação das diversas partes do feto entre si e depende da disposição
dos membros e da coluna vertebral.
Devido à flexibilidade da coluna vertebral e à articulação occipitovertebral, o feto se acomoda
na cavidade uterina em atitude de flexão generalizada, ou seja, a coluna vertebral encurvada,
produzindo uma concavidade voltada para a face anterior do concepto, os membros se apresentam
flexionados e anteriorizados e a cabeça com o mento aproximado da face anterior do tórax, o que lhe
confere a forma ovoide, o ovoide fetal (figura 1), apresentando então dois polos: o cefálico e o pélvico.
Ovoide córmico é a denominação do conjunto do tronco com os membros.

26
Em algumas situações, pode haver extensão da coluna com deflexão do polo cefálico, levando às
apresentações defletidas de 1º, 2º e 3º graus. A persistência da ausência de flexão de todos os membros e
anormal e pode indicar sofrimento fetal grave por perda do tônus muscular.

No parto – no início do trabalho de parto, principalmente após a amniorrexe (rotura das membranas), a
atitude do feto se modifica. Devido à expansão do segmento inferior e incorporação da cérvice, o útero
adquire forma diversa, passando de globosa à forma cilindroide, obrigando o feto a endireitar o tronco,
reduzindo sua flexão de forma a se constituir um cilindro, o cilindro fetal, formado pela cabeça fletida sobre
o tórax, com as pequenas partes a ele mais aconchegadas. Esse cilindro apresenta locais de flexibilidade
desigual: na região cervical, a movimentação é mais fácil na direção ântero-posterior, e no tronco há maior
tendência ao movimento no sentido lateral. Esses detalhes da atitude fetal durante o trabalho de parto nos
permitem entender certas fases ou movimentos na mecânica do parto.

- Cabeça – o polo cefálico é a parte fetal de grande importância obstétrica, por ser o segmento
menos redutível e desempenhar papel de muita importância no processo de adaptação ao trajeto
pelviperineal. O crânio é formado de dois ossos frontais, dois parietais, dois temporais, um occipital,
um esfenoide e um etmoide. Os ossos da abóbada craniana se acham separados por tecidos
membranosos – suturas e fontanelas – o que permite a diminuição de seu volume durante o parto.

As suturas de maior importância são:


- sutura sagital, entre os parietais;
- sutura metópica, interfrontal ou frontal média;
- sutura coronária, entre os frontais e os parietais;
- sutura lambdoide, entre os parietais e o occipital;
- sutura temporal, entre os parietais e os temporais.

As fontanelas são zonas membranosas e delas partem as suturas:


- Fontanela Bregmática (anterior ou grande fontanela): tem os lados formados pelos parietais e
frontais, de cujos vértices saem as suturas sagital, metópica e coronária. É um importante ponto de
referencia para o diagnóstico de posição, por meio do toque digital ou manual.
- Fontanela Lambdoide (posterior ou pequena fontanela): é limitada pelo occipital e parietais e de seus
vértices saem as suturas sagital ou lambdoide.
- Fontanelas Ptéricas ou Ptérios (lateroanteriores): uma de cada lado, limitadas pelo temporal, frontal,
parietal e o esfenoide.
27
- Fontanelas Astéricas ou Astérios (lateroposteriores): em número de duas, são limitadas pelo occipital,
temporal e parietal.
A média dos diâmetros cefálicos está apresentada na Figura 2, sendo: BP: biparietal; BT: bitemporal;
SOF: suboccipitofrontal; SOB: suboccipitofrontal; SMB: submentobregmático; OM: occipitomentoniano;
OF: occipitofrontal.

3.2 SITUAÇÃO
Situação é denominada como a relação entre os grandes eixos longitudinais fetal e uterino. A
situação longitudinal é quando coincidem os dois eixos; quando perpendiculares, a situação é transversa;
se cruzados, a situação é oblíqua ou inclinada. A situação longitudinal é a mais frequente, ocorrendo em
99,5% das vezes, e a situação oblíqua representa fase de transição da situação fetal, que se estabilizará
no momento do parto em longitudinal ou transversa.

3.3 APRESENTAÇÃO
Define-se como apresentação a região fetal que ocupa a área do estreito superior e nela irá se
insinuar. A apresentação só existe se o volume da região fetal for capaz de encontrar obstáculo na sua
passagem pelo canal pelvigenital; por isso, não há apresentação antes do sexto mês ou se a parte fetal é
um membro, visto que estes diâmetros são muito inferiores aos da bacia – estes constituem apenas
procidências.
Quando a situação fetal é longitudinal, temos duas possibilidades de apresentação: cefálica ou
pélvica. Nas situações transversas, temos outras duas possibilidades: apresentações córmicas (ou de
ombro), em que o dorso fetal se apresenta anterior ou posteriormente ou as apresentações dorsais
superior e inferior, em que o dorso fetal se apresenta superior ou inferiormente, sendo estas mais raras.
28
Devido fatores determinantes da adaptação fetal no continente uterino, pode-se observar a
mudança de uma apresentação por outra, ao que chamamos de mutação ou versão, fenômeno ligado à
rotação axial do feto. Aproximadamente até o sexto mês gestacional, a cabeça é encontrada no fundo
uterino e, graças a essa rotação axial, por “cambalhota”, o feto orienta o polo cefálico para as porções
inferiores do útero e aí se mantém.
Denomina-se plano de contato da apresentação o plano circunferencial da apresentação, que se
põe em relação com o estreito superior. A situação transversa corresponde sempre à apresentação
córmica. Na situação longitudinal pode ocorrer a apresentação cefálica (polo cefálico) e apresentação
pélvica.
O polo cefálico pode apresentar-se fletido – apresentação cefálica fletida – com o mento se
aproximando do tórax ou dele se afastando em graus diversos de extensão – apresentação cefálica
defletida: de 1º grau ou bregmáticas, de 2º grau ou de fronte, e na deflexão máxima, as de 3º grau ou
apresentação de face (figura 3).

Com polo pélvico no estreito superior pode ocorrer a apresentação pélvica), se as coxas e pernas
estão fletidas, e a apresentação pélvica incompleta (pélvica simples), conhecida também como modo de
nádegas, quando, fletidas as coxas contra a bacia, as pernas se acham estendidas sobre a face anterior do
tronco.

29
30
31
♦ ALTURA DA APRESENTAÇÃO

Durante a gestação, a apresentação se encontra afastada do estreito superior, não tendo


relação direta com a bacia. No inicio do trabalho de parto ou até alguns dias antes, essa relação vai
ocorrendo, permitindo-nos distinguir graus evolutivos da altura da apresentação:
- alta e móvel quando a apresentação ainda não tem contato com o estreito superior;
- ajustada se passa a ocupar esse estreito;
- fixa, quando, ao palpar, não se consegue mobilizá-la;
- insinuada se a maior circunferência da apresentação transpôs a área do estreito superior. Denomina-
se, assim, insinuação ou encaixamento a passagem, pelo estreito superior, do maior plano
perpendicular à linha da orientação, isto é, passagem do biparietal nas apresentações cefálicas e do
bitrocanteriano nas apresentações pélvicas.
A passagem dessa região estreita da bacia acontece pela redução dimensória sinalada, e por
meio do movimento de inclinação lateral da apresentação a que se denomina assinclitismo. A
ausência da flexão lateral, mantendo-se a sutura sagital equidistante do sacro e do pube, define o
sinclitismo.
Quando a sutura sagital está próxima do pube e o parietal posterior é o primeiro a penetrar na
escavação se denomina assinclitismo posterior. Chamamos de assinclitismo anterior quando a sutura
sagital está mais aproximada do sacro e o parietal anterior desce em primeiro lugar. (Figura 4)

30
Para quantificar a altura da apresentação recomenda-se adotar o critério de DeLee: o diâmetro biespinha
ciática ou linha interespinhosa corresponde ao plano de referência “0” (zero). Quando a parte inferior da
apresentação estiver 1cm acima do plano “0”, a altura é expressa como “-1”; 2 cm acima, como “-2”, e assim
sucessivamente. Quando a parte inferior da apresentação ultrapassar de 1 cm o plano “0” sua altura será “+1”,
quando de 2 cm, “+2”, e assim sucessivamente. (Figura 5).

3.4 POSIÇÃO

Segundo a escola alemã, posição fetal é descrita como a relação do dorso fetal com o lado materno.
Assim, a posição fetal é esquerda ou 1º posição quando o dorso fetalse acha voltado para o lado esquerdo
materno, e é direita ou 2º posição quando o dorso se orienta para o lado direito. O propósito da posição é buscar o
melhor local para ausculta cardíaca fetal durante o trabalho de parto, ipsilateral a seu dorso na maioria das vezes.
No entanto, nas apresentações cefálicas defletidas de 3º grau, os batimentos cardíacos fetais são audíveis com
maior nitidez na face anterior do tronco fetal.

31
♦ VARIEDADE DE POSIÇÃO

Após identificação da apresentação e da posição, devemos acrescentar ao diagnóstico a variedade


de posição, que complementa a orientação espacial do feto ao relacionar um ponto de referencia da
apresentação fetal com um ponto de referência óssea da bacia materna, levando em consideração as faces
anterior, posterior ou lateral da gestante.

→ Referenciais maternos – o pube, as eminências ileopectíneas, as extremidades do diâmetro transverso


máximo, a sinostose sacroilíaca e o sacro. (Figura 6)

→ Referenciais fetais – variam com as apresentações:


- lâmbda nas apresentações cefálicas fletidas;
- extremidade anterior do bregma nas apresentações cefálicas defletidas de 1º grau
(bregmáticas);
- glabela ou raiz do nariz nas de 2º grau (fronte);
- mento nas de 3º grau (face);
- sacro nas apresentações pélvicas;
- acrômio na apresentação córmica.

32
→ Linha de orientação – linha fetal que se põe em relação com o diâmetro materno de insinuação, e
possibilitará acompanhar os movimentos da apresentação durante o trabalho de parto. São as seguintes:
- sutura sagital na apresentação fletida;
- sutura sagital e metópica na apresentação cefálica defletida de 1º grau;
- sutura metópica na apresentação cefálica defletida de 2º grau;
- linha facial na apresentação cefálica defletida do 3º grau;
- sulco interglúteo na apresentação pélvica.

Nas situações transversas não há linha de orientação, pois são impeditivas de expulsão
espontânea, exceto em casos especiais de fetos pequenos ou macerados.

2.5 NOMENCLATURA
Para tal definição obstétrica, convencionou-se o uso de três letras como nomenclatura definidora de
apresentação, posição e variedade de posições fetais, tendo- se perfeito conhecimento da estática
fetal.
- a primeira letra se refere ao ponto de referência da apresentação fetal: O (occipício), B
(bregma), N (nariz), M (mento), S (sacro) e A (acrômio).
- a segunda letra se refere ao lado materno para qual está voltado o ponto de referência fetal
(posição): D (direita) e E (esquerda). Essa letra é suprimida nas variedades anteroposteriores (sacral
e púbica). Geralmente, as posições esquerdas são mais frequentes.
- a terceira letra se refere à variedade de posição, conforme o feto esteja voltado para o ponto
de referência ósseo da bacia materna: A (anterior) – eminência ileopectíneas, T (transversa) –
extremidade do diâmetro transverso, P (posterior ou púbis) – sinostose sacroilíaca ou púbis, S
(sacro) – materno.

→ Nomenclatura na situação longitudinal – a primeira letra, indica a apresentação, é símbolo da


região que a caracteriza, as outras duas correspondem ao ponto de referência ao nível do estreito
superior.
Exemplo: OEA: apresentação occipital (O), o ponto de referência (lâmbda) está em correspondência
com o estreito superior, à esquerda (E) e anteriormente (A); MDP significa que a apresentação é de
face e o ponto de referência, o mento (M), está em relação com o estreito superior, à direita (D) e
posteriormente (P).

33
Usando como exemplo a apresentação cefálica fletida, em occipital, podemos ter as seguintes variedades
de posição:
OP – occipitopubiana;
OEA – occípito-esquerda-anterior; OET – occípito-esquerda-transversa; OEP – occípito-esquerda-
posterior; OS – occipitossacra;
ODP – occípito-direita-posterior; ODT – occípito-direita-transversa; ODA – occípito-direita-anterior.

→ Nomenclatura na situação transversa – na situação transversa não há uniformidade na designação.


Para a escola francesa a localização do dorso define a posição: anterior quando o dorso está voltado
para frente e posterior quando voltado para a coluna vertebral materna, e o acrômio, direito ou esquerdo,
que se põe em relação com o estreito superior, define a apresentação; para a escola alemã, define-se a
posição pela localização do ovoide cefálico nas fossas ilíacas, denominando-se primeira posição
quando a cabeça está no lado esquerdo, segunda posição quando no lado direito, diferenciando as
variedades anteriores e posteriores de acordo com a orientação do dorso, de forma idêntica à escola
francesa. Exemplo: cefálico-direita-dorso-posterior é quando a cabeça está na fossa ilíaca direita e o
dorso se acha voltado para trás.

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REFERÊNCIAS:
- MONTENEGRO C.A.B., REZENDE J.F. Rezende: Obstetrícia. 12ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2011.
- ZUGAIB M. Zugaib Obstetríca, 2ª ed, SP: Manole, 2012.

35
4. ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL

Aqui, não trabalharemos inicialmente com um conceito. Para entender em que consiste a assistência pré-
natal, é necessário ter em mente os seus objetivos principais:

1. Assegurar o nascimento de uma criança saudável, reduzindo-se tanto quanto possível os riscos para a mãe;
2. Oferecer prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado para intercorrências
clínicas e obstétricas;

Considerando-se isso, a assistência pré-natal se configura como um plano de ações e esforços empreendidos
pelo profissional de saúde, pela gestante e por seu acompanhante em busca dos objetivos acima mencionados.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu que a proteção à maternidade tem por objetivo salvaguardar a
saúde das mulheres durante a gestação e o aleitamento, ensinar a elas os cuidados a serem dispensados às
crianças, permitir o pano vaginal e dar à luz filho sadio.
Agora que você entendeu os objetivos, vamos ver o que é necessário para alcançá-los. O pré-natal é como
uma caminhada ao ar livre: admire a paisagem ao seu redor, mas nunca esqueça de manter-se devidamente
hidratado e de respirar corretamente. Vez ou outra, você precisará lembrar a si mesmo daquilo que é
fundamental em suas ações. Portanto, é indispensável:
- Realizar sempre e o mais precocemente possível a estimativa mais precisa da idade gestacional; e
- Avaliar constantemente o estado de saúde da mãe e do concepto.

Um descuido em um desses pontos pode mudar todo o curso da caminhada. Fique sempre atento.

Uma ferramenta chave nesse período especial e, muitas vezes, a única disponível é a CONSULTA PRÉ-
NATAL. Nela, além de anamnese, exame físico e exame obstétrico, são avaliados os exames trazidos pela
paciente, entre os quais deve constar, na primeira consulta, a dosagem do bHCG sérico, que comprova a
gravidez e, portanto, a necessidade de acompanhamento. A primeira consulta é crucial para o estabelecimento
do vínculo médico-paciente. É a consulta de acolhimento, onde o médico explica à paciente e seu acompanhante
o planejamento da “caminhada” e pactua com a gestante um compromisso mútuo visando à promoção da saúde
materno-fetal. Responsabilize a gestante.

40
4.1 PRIMEIRA CONSULTA:

Deve ocorrer tão precocemente quanto possível, idealmente antes da 12ª semana. Realizar uma anamnese
detalhada, principalmente as histórias obstétrica e ginecológica, visto que podem indicar a necessidade de um
acompanhamento especializado (Alto risco). Alguns pontos-chave:
 Diagnóstico de certeza da gravidez (beta-HCG sérico ou Ultrassonografia)
 bHCG: pode ser detectado no sangue periférico 8 a11 dias após a concepção;
 Ultrassonografia: o saco gestacional pode ser observado por via transvaginal com apenas 4 a 5 semanas
gestacionais e a atividade cardíaca com 6 semanas.
 Anotar a data da última menstruação (DUM), que corresponde ao primeiro dia do último ciclo ocorrido.
Se a DUM for confiável, usá-la para calcular a idade gestacional (IG) e data provável do parto (DPP);
Vale lembrar que, principalmente em multíparas, pode ocorrer um discreto sangramento após a concepção
(7-9 dias), que corresponde ao sinal placentário (ou sinal de Hartman), muitas vezes confundido com
menstruação;
 Interrogar sobre doenças de base, alergias e medicamentos em uso; avaliar se algum dos medicamentos
em uso ou doença de base pode ser causa de atraso menstrual ou de complicação obstétrica. Exemplos:
anticoncepcionais, clopromazina, fenotiazina; Anemia grave, SOP, hiperprolactinemia.
 Calcular as medidas antropométricas da gestante, registrar peso prévio;
 Informar-se sobre a situação da carteira de vacinação da gestante;
 Conhecer a situação psicossocial da gestante. Interrogar sobre uso de drogas lícitas e ilícitas, encorajar a
redução do uso/abandono do hábito.

Tendo como referência a DUM ou um US de primeiro trimestre, o médico deve calcular a IG e a DPP, para
direcionar a periodicidade e as condutas nas consultas seguintes. Regra prática para o cálculo da data provável
do parto (regra de Nagele): Soma-se 7 ao dia da última menstruação e 9 ao mês (ou subtrai-se 3 quando se faz
o cálculo retrógrado).

Por exemplo: uma mulher apresenta a data de sua última menstruação em 26 de julho de 2016. Soma-se 7 ao
dia e, dessa forma, ultrapassa-se o dia 31; nesse caso, faz-se as contas dos meses com base em agosto e não
julho. Resposta: 02/05/2017 é data provável do parto.

Sua vez. Agora a DUM é 05/04/2017. Calcule a DPP e a idade gestacional.

41
4.2 EXAME FÍSICO

O exame físico pode mostrar sinais de alterações fisiológicas da gravidez. Convém ressaltar que o exame
deve ser completo, não apenas obstétrico.

 Ectoscopia: avaliar estado nutricional, coloração das mucosas, hidratação, presença de edema.
 Aferir PA, realizar ausculta cardíaca e pulmonar, palpar abdome, tireoide, mamas.
 Palpação do útero. O útero torna-se palpável após 12ª semana, acima da sínfise púbica.
 Ausculta do BCF: passa a ser possível com o sonar doppler entre 9 e 12 semanas.

4.3 EXAMES LABORATORIAIS:

 Tipo sanguíneo ABO e fator RhD.


 Hemograma.
 Sorologia para rubéola.
 Sorologia para toxoplasmose.
 Sorologia para hepatites B e C.
 Sorologia para sífilis.
 Sorologia para vírus da imunodeficiência humana (HIV).
 Glicemia em jejum.
 Hormônio estimulante da tireoide (TSH).
 Urina tipo 1 e Urocultura.
 Protoparasitológico de fezes (três amostras). *
 Colpocitologia oncótica (Papanicolau).*
 Ultrassonografia

* O ministério da Saúde recomenda que seja feito apenas se houver indicação clínica.

PRESCRIÇÃO: Suplementação de sulfato ferroso (40 mg de ferro elementar/dia) e ácido fólico (5 mg/dia), para
profilaxia da anemia e distúrbios do fechamento do tubo neural, respectivamente;

42
4.4 CONSULTAS SEGUINTES:

Anamnese atual sucinta: deve-se enfatizar a pesquisa das queixas mais comuns na gestação e dos
sinais de intercorrências clínicas e obstétricas, com o propósito de se reavaliar o risco gestacional e de se
realizar ações mais efetivas;

Exame físico direcionado (deve-se avaliar o bem-estar materno e fetal);

Medida da altura uterina ou altura de fundo uterino (AU/AFU): A avaliação do crescimento fetal é
feita pela medida da altura uterina. A paciente deve estar em decúbito dorsal, com os membros em extensão
e a bexiga vazia. A fita métrica deve ser colocada da borda superior da sínfise púbica, passando sobre a
cicatriz umbilical, até o fundo uterino. A relação entre a AU e a Idade Gestacional é demonstrada na figura
abaixo:

Manobras de Leopold:
São quatro manobras executadas com o objetivo de determinar a posição fetal e o melhor local para posicionar
o sonar para a ausculta. A primeira manobra consiste em encontrar e palpar o fundo uterino; a segunda
determina qual a localização do dorso fetal, a região mais regular e consistente, a terceira identifica a
apresentação, ou seja, a parte fetal que se encontra no estreito superior da bacia; por fim, a quarta manobra
revela se a apresentação está fixa (encaixada) ou móvel. Veja nas figuras:

43
Posiciona-se o sonar para ausculta do mesmo lado que se percebeu o dorso, no mesmo quadrante em que
acredita-se estar a cabeça fetal. Portanto, sendo a apresentação cefálica, o BCF será melhor ouvido nos
quadrantes inferiors (abaixo da cicatriz umbilical). A frequência cardíaca fetal normal é entre 120-160
bpm, podendo aumentar durante a movimentação fetal e metrossístoles. Bradicardia é um sinal de
sofrimento fetal.

 Efetuar a aferição de PA, medida do peso e cálculo do IMC;

 Verificação do calendário de vacinação;

 Deve-se avaliar o resultado dos exames complementares;

 Devem ser feitas a revisão e a atualização do Cartão da Gestante e da Ficha de Pré-Natal.

 Pesquisa de edema;

 Avaliação dos resultados de exames laboratoriais e instituição de condutas específicas;

44
 Verificação do resultado do teste para HIV e, em casos negativos, repetir próximo à 30ª
semana, sempre que possível. Em casos positivos, encaminhar para unidade de referência;
 Ausculta dos batimentos cardíacos;
 Avaliação dos movimentos percebidos pela mulher e/ou detectados no exame obstétrico.

Nas visitas subsequentes, torna-se obrigatório medir a altura uterina, pesar a paciente,
mensurar a pressão arterial, verificar a presença de anemia de mucosas, a existência de edemas e
auscultar os batimentos cardíacos fetais. Deve-se avaliar o mamilo para lactação. A definição da
apresentação fetal deverá ser determinada por volta da 36ª semana.

O total de consultas deverá ser de, no mínimo, 6 (seis). Sempre que possível, as consultas
devem ser realizadas conforme o seguinte cronograma:

Até 28ª semana – mensalmente;

Da 28ª até a 36ª semana – quinzenalmente; Da 36ª até a 41ª semana – semanalmente.

A seguir, explicaremos alguns aspectos importantes da assistência pré-natal com as respectivas


condutas recomendadas.

 Ganho de peso: O ganho ponderal médio ideal da grávida é de aproximadamente 12,5 kg. O feto, a
placenta e o aumento uterino e das mamas representam aproximadamente 9 kg, sendo o restante
tecido gorduroso materno. O ganho ponderal máximo recomendado para as obesas é de até 9,1kg.
O ganho semanal para a gestante com peso ideal é de aproximadamente 400 g segundo e terceiro
trimestres. Ganho menor que 1 kg ou maior que 3 kg em 1 mês é sugestivo de mudanças nos
hábitos alimentares ou de outros fatores que possam contribuir para alterações no peso, como a
retenção hídrica na pré-eclâmpsia.

 Edema: Geralmente limitado aos tornozelos e decorre do aumento de pressão nos capilares dos
membros inferiores. O decúbito lateral esquerdo é uma forma de reduzir o edema pela diminuição do
útero sobre a veia cava inferior. Repouso e hidratação são recomendados. Não utilizar diuréticos,
hipotensores ou dieta hipossódica.
 Leucorreia: É comum o aumento da secreção vaginal durante a gestação. É um corrimento leitoso,
branco e que não produz irritação. Cerca de 10-30% das grávidas têm vaginose bacteriana resultante da
deficiência da flora normal e do crescimento relativo de bactérias anaeróbias. Entretanto, 50% das
45
mulheres com vaginose bacteriana são assintomáticas. O tratamento está reservado para aquelas que
apresentam sintomas.
 Sintomas urinários: A frequência e a urgência são habituais no início e no final da gestação.
 Constipação: Decorre da diminuição da motilidade intestinal pela ação dos hormônios esteroides e
pressão com deslocamento dos intestinos, pelo útero gravídico. Dieta com alimentos que formem
resíduos (rico em fibras) e ingesta liberal de água (2L por dia). Casos mais graves, pode-se utilizar
supositório glicerinado e laxantes.
 Náuseas: Estima-se que 50% a 80% das mulheres grávidas experimentem náuseas e vômitos durante a
gravidez, sintomatologia que geralmente termina entre 16-20 semanas. 1 a 3% experimentam a forma
mais grave – hiperêmese gravídica – vômito intratável associado com redução ponderal, desidratação e
distúrbio eletrolítico que obrigam a hospitalização da gestante. O melhor tratamento atual para náuseas
é a Bromoprida 10 mg (Digesan) – via oral, 1 cápsula 8/8h. Podem ser usados ainda a Metoclopramida
(Plasil) que, apesar de eficiente, tem como comum efeito colateral a estimulação da síndrome
extrapiramidal; e o Dimenidrato com Piridoxina (Dramim B6), muito utilizado no cotidiano, mas que
tem efeito sedativo maior que antiemético. A alimentação deve ser frequente, porém em pequena
quantidade, porque a náusea é comum com a gestante de estômago vazio.
 Hemorroidas: Combater a constipação é a melhor maneira de preveni-las. Muito importante o uso de
duchas higiênicas, banho de assento e, com recomendação médica, pomadas proctológicas.

 Varicosidades: Mais comum em multíparas e decorre da fraqueza congênita das paredes musculares das
veias, aumento da pressão venosa nos membros inferiores, inatividade e mau tônus muscular. Deve-se
evitar o ortostatismo prolongado, elevar as pernas acima do nível do corpo sempre que sentar/deitar e
utilizar meia elásticas de média compressão para gestantes.e utilizar meia elásticas de média compressão
para gestantes.

 Síndrome dolorosa: Pode ser abdominal baixa ou lombossacra. A primeira é descrita como uma sensação de
peso no baixo-ventre, em virtude da pressão do útero nas estruturas pélvicas de sustentação e na parede
abdominal. O segundo tipo é mais comum no último trimestre e tem origem nas alterações posturais
(lordose exagerada) que a gestante vai assumindo a medida que o útero aumenta suas dimensões.
Repouso, cintas para gestantes e analgésicos atenuam os fenômenos dolorosos.

46
 Pressão Arterial: veja o quadro a seguir, do Ministério da Saúde:

47
 Imunização: Veja as figuras a seguir;

48
49
EXAMES COMPLEMENTARES:

Forneça, para alívio das ansiedades da mulher, orientações sobre a evolução da gestação e do parto:
contrações, dilatação, perda do tampão mucoso, rompimento da bolsa, bem como sobre o pós-parto.
Prepare a gestante para o parto normal, ajudando a diminuir sua ansiedade e insegurança, assim como o
medo do parto, da dor, de que o bebê nasça com problemas, entre outras questões emocionais.
“Quatro coisas devem levar você a procurar a maternidade: dor abdominal intensa, de cinco em cinco
minutos; sangramento, perda abundante de líquido „escorrendo pelas pernas‟ e se o bebê ficar sem mexer o
dia inteiro”.

Referências:

Zugaib – Obstetrícia.
Ministério da Saúde - Caderno de Atenção Básica nº 32.

50
5. TRABALHO DE PARTO NORMAL

5.1. ASSISTÊNCIA AO PARTO

5.1.1 INTRODUÇÃO
A Organização Mundial de Saúde define parto normal como “de início espontâneo, de baixo risco ao
começo do trabalho de parto e assim permanece por todo ele até o nascimento. O bebê nasce
espontaneamente em apresentação cefálica entre 37 e 42 semanas completas de gravidez. Após o
nascimento, bebê e mãe estão em boa condição”.

5.1.2 PREPARAÇÃO
Quatro fatores são importantes na determinação da satisfação de uma mulher para com sua experiência
de parto, que são: expectativas pessoais, quantidade de apoio que ela recebe, a categoria da relação que
ela desenvolve com a equipe de saúde envolvida e seu próprio envolvimento nos processos decisórios.
Idealmente, os pais deveriam receber aulas de educação para o parto para que aprendessem o que esperar
durante o evento e para que pudessem ter mais informações para que tomem decisões mais conscientes.
Suporte individualizado realizado por Doulas durante o processo de nascimento pode diminuir aa
necessidade de analgesia intra-parto, diminuir a necessidade de instrumentalização do parto e
aumentar a satisfação da experiência do parto.

5.1.3 QUANDO UMA MULHER EM TRABALHO DE PARTO DEVE SER ADMITIDA NO


HOSPITAL
O momentos apropriado para a admissão de mulheres em trabalho de parto com gravidez não complicada
não é um consenso. Contudo, é consenso que mulheres em trabalho de parto ativo devem ser admitidas.
Comumente, os estudo mostram que mulheres com 4 ou mais cm de dilatação cervical devem ser admitidas,
considerando que a maior parte delas vai entrar na fase ativa do trabalho de parto entre os 4 a 6cm de
dilatação cervical. Como as mulheres não podem checar sua própria dilatação cervival, muitas delas vão se
apresentar no hospital antes que a dilatação atinja os 4cm. Se mãe e feto estiverem bem e o transporte para o
hospital e dele não seja uma preocupação, é razoável admitir a paciente e mantê-la em observação ou mandá-
la de volta para casa. Contudo, mulheres admitidas antes de atingirem 4cm de dilatação correm um
maior risco de sofrer algum tipo de intervenção iatrogênica. Os riscos de mandar a mãe para casa não
foram ainda estudados adequadamente. No estado de Washington, nos EUA, a "Bree Collaborative
Obstetrics Care Report” tentou influenciar a prática clínica ao recomendar que mulheres em trabalho de

51
parto espontâneo a termo oriundos de gravidez não complicada, fossem admitidas apenas quando tivesse
dilatação cervical ≥4 cm. Os médicos determinavam se a gravidez era de baixo-risco e deveriam aconselhar
propriamente e atender novamente se necessário as mulheres não admitidas. Aderência à recomendação não
era obrigatória. Um estudo de coorte retrospectivo que analisou mais de 11 mil partos de feto unico a termo
no estado supracitado após essa recomendação observou um aumento de 10 a 15% nas admissões com
dilatação cervical ≥4 cm. Mulheres admitidas com dilatação cervical <4 cm estavam mais propensas a
utilizar anestesia epidural, suplementação de ocitocina e cesarianas do que aquelas admitidas com dilatação
cervical ≥4 cm. Os autores não conseguiram identificar quais mulheres tinham sido avaliadas por alguma
equipe médica que, ao constatar que ela possuía uma dilatação cervical <4 cm enviou-a de volta para casa
para subsequentemente ser re-admitida, portanto, a segurança e eficácia dessa idéia não pôde ser checada.

5.1.4 ASSISTÊNCIA A PRIMEIRA FASE DO TRABALHO DE PARTO

• Exame inicial - Os objetivos do exame inicial da parturiente são rever o histórico do pré-natal quanto a
condições ginecológicas e obstétricas que terão alguma importância intra-parto, checar o desenvolvimento
de novas enfermidades desenvolvidas desde a última consulta do pré-natal, estabelecer a condição do colo
cervical para determinar o progresso e avaliar o estado de saúde fetal. Na admissão, os sinais vitais devem
incluir a pressão arterial materna; frequência respiratória e cardíaca; temperatura; peso;
freqüência, qualidade e duração das contrações uterinas; e freqüência cardíaca fetal. Determinar se uma
mulher está em trabalho de parto pode ser, por vezes, uma tarefa difícil, uma vez que contrações uterinas
dolorosas isoladas não são suficientes para determinar o diagnóstico de trabalho de parto. Tipicamente, o
diagnóstico é reservado para contrações uterinas que resultam em dilatação e apagamento do colo cervical
com o passar do tempo. Um histórico recente de rotura de membrana ou corrimento vaginal constituído de
sangue e muco (tampão mucoso), corrobora com o diagnóstico. O exame físico é realizado com uma
particular ênfase na avaliação do colo cervival. A examinação digital do colo é realizada após afastar as
hipóteses de placenta prévia e rotura prematura de membranas (afasta-se através do exame atento da
história e avaliações físicas, laboratoriais e ultrassonográficas, conforme for apropriado para o caso). O
propósito do exame inicial é determinar:

• Se as membranas fetais estão intactas ou rotas: se as membranas estiverem rotas, a presença de mecônio é
digna de nota devido á possibilidade de aspiração de mecônio

• Se existe sangramento uterino e se este é excessivo: Placenta prévia, Vasa prévia e descolamento de
placenta são afecções que podem causar sangramento e são potencialmente ameaçadoras à vida materna e
fetal.

• Dilatação e Apagamento cervical: em mulheres com contrações, dilatação e apagamento progressivo do


52
cérvix em exames seriados ou uma dilatação avançada e apagamento do cérvix no exame inicial é
evidência de trabalho de parto. A dilatação cervical é mais rápida uma vez que o colo encontra-se
completamente apagado.

• Altura ou Acomodação Fetal: altura ou acomodação fetal é expressa como a quantidade de centímetros da
extremidade óssea da apresentação para o nível das espinhas isquiáticas maternas; o denominador máximo
é 5 (por exemplo, 1 cm alem da espinha isquiática corresponde a +1) . Um sistema mais antigo (conhecido
como De Lee) descrevia a descida fetal a partir da divisão da distância entre as espinha isquiáticas e a
saída vaginal em três. Usando esse
sistema, +1/3 corresponde a +2/5 cm no sistema de centímetros. Esse sistema tem sido abandonado
largamente ao redor do mundo, uma vez que é muito mais subjetivo do que o sistema de centímetros e torna
difícil a documentação de pequenas contudo importantes graus de descida fetal. Se o exame cervical não
for perfurado devido a rotura de membranas ou sangramento vaginal, a descida fetal também pode ser
descrita em termos de quintos da cabeça fetal palpável acima do osso da púbis. Esse método também é útil
se existir uma mudança significativa na formação do crânio fetal ou bossa (edema em porção do couro
cabeludo fetal se sobrepondo à abertura cervical), condições que aumentam a apreensão quanto a
desproporção cefalo-pélvica.

• Situação, apresentação e posição fetal: Documentar a situação, apresentação e posição.

- Atitude se refere a relação do maior eixo fetal para com o eixo longitudinal do útero. Pode ser: longitudinal
(dois eixos coincidem) , transverso (maior eixo fetal é perpendicular ao eixo longitudinal uterino) ou
obliqua (situação transitória que evoluirá para longitudinal ou transverso.
- Apresentação de refere a parte fetal que está em contato direto com o colo uterino interno. Usualmente é
cefálico (podendo ser fletida quando tocamos o couro cabeludo fetal ao exame - forma mais comum - ou
defletida, quando podemos tocar partes da face fetal. A defletida se divide ainda em bregma de 1º grau,
quando tocamos a testa, 2º grau quando tocamos o nariz ou 3º grau, quanto tocamos o mento) ou pélvico
(podendo ser completa com pernas e coxas fletidas, o que nos permite tocar os glúteos fetais ao exame, ou
incompleto com pernas distendidas sobre o abdome), contudo também pode ser côrmica (cotovelo), ombro
ou composta (por exemplo, cefálica e mão) ou ainda cordão umbilical.
- Posição fetal é a relação de um local da anatomia da apresentação com um local da anatomia pélvica
materna, por exemplo, occipito direito anterior, onde o occipto direito do feto está voltado para a parte
anterior da pelve. Ultrassonografia pode ser útil na definição da posição fetal. Assinclitismo se refere a
apresentação obliqua da cabeça fetal onde a cabeça está inclinada em direção ao ombro e o ponto de
apresentação é o osso parietal.

• Tamanho fetal e capacidade pélvica: o médico deve tentar determinar se o feto é macrssômico, o tipo de

53
pelve e se a pelve está contraída; contudo, essas determinações são pouco preditivas sobre o desfecho do
parto. Pelvimetria (que é a medida quantitativa da capacidade pélvica) pode ser feita clinicamente ou através
de estudo radiológicos (radiografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética). Valores médios
e limites críticos dos vários parâmetros da pelve óssea foram estabelecidos mas não consegue prever com
acurácia o risco de desproporção cefálo-pélvica. A pelvimentria tem sido trocada amplamente pelo teste
clinico da pelve (teste de trabalho de parto).

• Bem-estar fetal e materno: O estado de saúde fetal é medido através da freqüência cardíaca fetal. O
materno é voltado principalmente para identificar o desenvolvimento de novas complicações da gravidez
como preeclampsia ou infecção

• Testes laboratoriais: os resultados dos seguintes testes devem estar disponíveis no momento do nascimento,
mas a realização intra-parto deles nem sempre é necessária.
- Hemoglobina/hematócrito: Apesar de rotineiramente as medidas de hemoglobina e hematócrito serem
pedidas à admissão, não existe evidência que essa prática é necessária em gravidez não complicada. Se
basear em medidas de hemoglobina normal aferidas entre 26 e 28 semanas de gestação (quando a
parturiente deve ter feito rastreio para diabetes
- Tipagem sanguínea com Rh: É adequado identificar a tipagem Rh mesmo para mulheres com baixo risco
de sangramento pós-parto. É razoável pedir a tipagem sangüínea de mulheres com risco moderado risco de
precisarem de transfusão sanguínea (por exemplo, gestação múltipla, parto pós-cesárea,
preeclampsia/HELLP [hemólise, elevadas enzimas hepáticas, baixa contagem plaquetária] sem
coagulopatia, grandes multíparas, infecções intra-amnióticas, grandes fibroses), e necessário fazer a
tipagem sangüínea e localizar bolsas disponíveis para mulheres com alto risco de precisarem de transfusão
sangüínea (por exemplo, placenta prévia ou acreta, preeclampsia/HELLP com coagulopatia, anemia severa,
diátese hemorrágica congênita ou adquirida).
- Vírus da imunodeficiênciacia Humana (HIV): mulheres que não foram testadas durante a gravidez ou
aquelas cujo resultado não foi documentado devem ser oferecidas o teste rápido de HIV durante o trabalho
de parto. Se o resultado for positivo, a profilaxia antiretroviral deve ser iniciada enquanto no aguardo do
teste de confirmação.
- Hepatite B: mulheres que não foram testadas para o antígeno de superfície da hepatite B durante o pré-natal
ou aquelas que estão sob alto risco de infecção (por exemplo, ter mais de um parceiro sexual nos últimos
seis meses, avaliação ou tratamento de alguma infecção sexualmente transmitida, um parceiro sexual
positivo para antígeno da hepatite B), ou que tiveram hepatite clínica devem ser testadas à admissão. O
bebê deve receber imunoprofilaxia se o resultado for positivo.
- Sifilis: Mulheres que estão incluídas em grupos de alto risco para sífilis, vivem em áreas com alta

54
incidência de sífilis ou que não foram previamente testadas devem ser testadas ao parto.
- Streptococcus do grupo B: Se não soubermos o “status” de uma mulher quanto a streptococcus do grupo B
podemos testá-las com teste de amplificação de ácido nucléico (NAAT) como reação de polimerase para
GBS, quando disponível. Contudo, esse teste é menos confiável do que a checagem de GBS de rotina entra
35 a 37 semanas de gestação. Quimioprofilaxia é indicada se o NAAT for positivo ou se não soubermos o
“status" E forem percebidos fatores de risco para infecção GBS latente (parto com menos de 37 semanas de
gestação, temperatura ≥38.0ºC ou ruptura de membranas amnésticas por mais de 18 horas.

• Preparação da paciente: Meta-análises de estudos randomizados apoiam que se evite enema de rotina e
tricotomia, uma vez que essas intervenções não são benéficas e podem incomodar ou até mesmo lesar as
pacientes. Mulheres podem ser encorajadas a esvaziar a bexiga regularmente; um catéter vesical é
desnecessário a não ser que a mulher tenha algum impedimento para o ato miccional. Estudos disponíveis
indicam que a distensão vesical não afeta o progresso do trabalho de parto.

• Ingesta oral e administração intravenosa: historicamente, a ingesta oral tem sido restringida durante o
trabalho de parto ativo devido ao risco de pneumonia aspirava, uma grande causa de morbidade e
mortalidade relacionadas a anestesia. Contudo, o risco é muito diminuto na era atual e a restrição de ingesta
oral pode levar a desidratação e cetose. É permitido a ingesta de líquidos claros para parturientes com baixo
risco de evolução para parto cesáreo, mas é restrito consumo de comidas sólidas de acordo com os
guidelines da American College of Obstetricians and Gynecologists e da American Society of
Anesthesiologists Tais Force on Obstetric Anesthseia que assim recomendam. Se a ingesta oral for
inadequada, podemos ofertar fluidos de manutenção com 5 por cento de dextrose ou 5 por cento de
dextrose em solução salina de 0,45 por cento. A necessidade de glicose durante o parto é análoga à
observada durante a prática vigorosa de exercícios. A administração intra-parto de glicose pode ser
importante para o funcionamento ótimo do miométrio e podem diminuir a duração do trabalho de parto.

A desidratação é adversa à performance de exercício físico e pode ser um fator contribuinte para a extensão
da duração do trabalho de parto. Fisiologistas mostraram que a hidratação adequada melhora a performance
da musculatura esquelética durante a execução de exercício físico prolongado; contudo, os efeitos da
hidratação na musculatura lisa não são tão claros. Dentre as nulíparas a quem foram negadas ingesta oral
durante o trabalho de parto, uma meta-análise de dois estudos randomizados descobriu que a duração do
trabalho de parto pode ser diminuída com a administração de fluidos a 250mL/h ao invés de 125 mL/h.
Quando a ingesta oral não é restrita, o benefício do fluido venosos contendo dextrose é menos clara. Uma
revisão sistemática de 2017 de 10 estudos randomizados comparando políticas menos restritivas de ingesta
oral com políticas mais restritivas em mulheres em gestações de feto único de baixo risco, descobriu que as
políticas menos restritivas resultaram em um trabalho de parto menos duradouro (em média menos 7 a 25
minutos). Nenhum outro beneficio ou perigo foi identificado. CONTUDO, a satisfação materna não foi
55
levada em consideração.

• Antiácidos: Rotineiramente não é recomendada a administração de citrato de sódio em parturientes, mas é


recomendada a admisntração em todas as pacientes antes da realização de parto cesariana. Alguns autores
sugerem que administrar um antiácido claro (por exemplo 10 a 30 mL de citrato de sódio) para todas as
parturientes, uma vez que, se ocorrer aspiração de conteúdo gástrico, é a acidez do conteúdo que causa a
pneumonia por aspiração. Contudo, a utilidade dessa prática não foi provada.

• Administração de medicamentos: Mulheres podem tomar seus medicamentos diários usuais oralmente
durante o trabalho de parto; contudo, a absorção gástrica é imprevisível se o trabalho de parto estiver em
estágio avançado. Se o medicamento for de relevante importância clinica é preferível que se busque uma
rota alternativa de administração. Mulheres em uso de glicocorticóides em uma dose equivalente a
prednisona de 5 a 20 mg diariamente por mais do que três semanas podem ter supressão do eixo
hipotalâmico-pituitario-adrenal e devem ser testadas ou receber cobertura empírica de glicocorticóides. A
administração pré-operatória de medicações específicas, incluindo cobertura de glicocorticóides deve ser
analisada separadamente.

• Profilaxia de Infecções

• Antibióticos Sistêmicos: quimioprofilaxia intra-parto para prevenir infecção neonatal de instalação


prematura é indicada para pacientes que se encaixarem nos critérios estabelecidos. O agente de escolha é
penicilina intravenosa. Um mínimo de quatro horas de terapia intra-parto é recomendada antes do
nascimento; contudo, níveis do bactericida no cordão umbilical são atingidos após 30 minuto da
administração à mãe, logo, antibióticos devem ser administrados mesmo se o nascimento parecer iminente.
Parto vaginal não é uma indicação para profilaxia de rotina de antibiótico, mesmo em mulheres com lesões
cardíacas desde que a quantidade de bacteremia seja baixa.

• Agentes antissépticos e antibacterianos vaginais: Estudos não mostram evidência que suporte a prática de
irrigação com clorexidina intra-parto para reduzir riscos de infecção materna ou neo-natal.

• Atividade Materna e posição: a preferência materna deve guiar a atividade materna. Em um estudo
radomizado foi verificado que andar durante o primeiro estágio do trabalho de parto não melhorou ou
prejudicou o trabalho de parto ativo. mulheres em trabalho de parto devem assumir as posições em que se
sentem confortáveis, a não ser que posições específicas sejam necessárias devido ao estado de saúde
materno-fetal e necessidade de monitoramento rigoroso. Estudos randomizados não mostraram evidências
para que desencorajemos a mãe a escolher as posições que vai adotar
durante o parto. Em 2013, uma meta-análise incluindo 25 estudos, percebeu que a duração do primeiro
estágio de trabalho de parto foi reduzida em mais de uma hora em mulheres que foram randomicamente
colocadas em posições verticalizadas (em pé, sentada, de joelhos, andando) comparadas com aquelas que

56
foram randomicamente colocadas em posições passivas e repouso no leito. Mulheres em posições
verticalizadas tiveram uma redução modesta em evolução para parto cesariano contudo não houve diferença
estatística na utilização de suplementação de ocitocina, utilização de dores que requereram analgesia ou
duração do segundo estágio. Algumas limitações desses estudos inclui o risco de viés, uma vez que não foi
possível realizar um estudo duplo cego e devido à grande variedade de posições adotadas e o tempo que foi
passado em cada uma delas. Uma metanásise de 2017 de cinco estudos randomizados sobre o efeito de
posições verticalizadas versus posições horizontalizadas no segundo estágio de trabalho de parto em
mulheres em uso de analgesia epidural não encontrou evidência conclusiva que a posição afetou a
quantidade de intervenções no parto, duração do segundo estágio ou qualquer desfecho materno ou fetal.

• Controle da dor e medidas para assegurar o conforto: Inúmeras opções não- farmacológicas,
farmacológicas e anestésicas estão disponíveis para auxiliar mulheres a administrar a dor durante o trabalho
de parto. A utilização de medidas não farmacológicas podem reduzir o uso de drogas durante o trabalho de
parto e podem ter um efeito modestamente favorável na duração do trabalho de parto. Essas opções devem
ser estudadas com afinco.

• Amniotomia: não é recomendada a amniotomia de rotina uma vez que não existe evidência convincente de
benefícios em mulheres que entraram em trabalho de parto espontaneamente. Rotura de membranas
aumenta o riso de infecção ascendente e prolapso de cordão. Em 2013 uma revisão sistemática e meta-
anásise de estudos randomizados, a realização de amniotomia de rotina não diminuiu a duração do segundo
estágio do trabalho de parto ou reduziu a evolução para cesariana quando comparada com a preservação
planejada de membranas intactas. Uma limitação dessa
anelise foi a falta de consistência no momento da realização da amniotomia no que diz respeito a dilatação
cervical e corssover substancial: 20 a 60% das mulheres do grupo- controle sofreram amniotomia em algum
estágio do trabalho de parto. Embora a amniotomia permita a visualização de passagem de mecônio, essa
informação isolada tem baixo valor prognóstico e não altera a admistração do trabalho de parto. Mulheres
que estão sendo induzidas a entrar em trabalho de parto ou que estão melhorando ele com a ajuda de
agentes indutores podem se beneficiar da combinação de administração de ocitocina e amniotomia. Se a
amniotomia for realizada em mulheres com polidrâmnio ou com apresentação não encaixada, sugerimos a
utilização de agulha fina (ao invés do gancho) para perfurar a membrana em um ou mais locais; tal
procedimento deve ser realizado em sala de cirurgia. “Amniotomia Controlada” minimiza o risco de perder
muito liquido amniótico e permite a realização de uma cesariana de emergência se ocorrer prolapso de
cordão umbilical. A amniotimia deve ser evitada, se possível, em mulheres com hepatite B, hepatite C,
infecção por HIV para minimizar a exposição do feto à infecção ascedente. Ser portadoras de GBS positivo
não é contra-indicação de amniotomia.

• Monitoramento: A avaliação frequente materno-fetal é importante dado que complicações intra-parto


57
podem surgir e evoluir rapidamente mesmo em mulheres com baixo risco: 20 a 25% de todas as morbidades
perinatais ocorrem em mulheres com uma gravidez sem fatores de risco para desfecho adverso e um estudo
com 10 milhões de certidões de nascimentos nos EUA descobriu que 20% das gravidezes de baixo-risco
tiveram ao menos uma complicações inesperada que exigiu cuidados neonatais obstétricos não rotineiros.

• Frequência cardíaca fetal: apesar de controverso, o monitoramento eletrônico da freqüência cardíaca fetal
intra-parto tem se tornado o procedimento obstétrico mais comum em mulheres nos EUA devido à
tranquilidade que a normalidade nessa medida traz a médicos e pacientes e à crença em que existe
importância em detectar freqüências cardíacas fetais anormais. Em mulheres com gravidezes de risco
elevado de comprometimento fetal durante o parto (por exemplo, suspeita de restrição de crescimento fetal,
preeclampsia, placenta prévia, diabetes tipo 1), monitoramos
continuamente a freqüência cardíaca fetal, de acordo com os guidelines da American College of
Obstetricians and Gynecologists. Monitoraoms gravidezes de baixo risco continuamente pois é mais
prático do que medições intermitentes em termos recursos de enfermagem, contudo não é necessária ser
rígido nessa aferição se o paciente compreende os riscos e benefícios do monitoramento intermitente e tem
uma gravidez não-complicada, traçado normal de freqüência cardíaca fetal e não está acamada.
Monitoramento eletrônico da freqüência cardíaca fetal requer avaliação clínica contínua. No mínimo, a
American College of Obstetricians and Gynecologists sugere a revisão do traçado da frequência cardíaca
fetal em gravidezes de baixo-risco a cada 30 minutos no primeiro estágio do trabalho de parto e a cada 15
minutos no segundo estágio. Para gravidezes de maior risco é sugerido rever o traçado a cada 15 minutos
no primeiro estágio e a cada 5 minutos no segundo estágio. Avaliação mais minuciosa e intervenções
podem ser indicados quando anormalidades forem identificadas. A interpretação do agente de saúde do
traçado deve ser documentada no prontuário médico e deve incluir a descrição das contrações uterinas, a
linha base da freqüência cardíaca, a variabilidade da freqüência cardíaca, presença ou ausência de
acelerações, presença ou ausência de desacelerações periódicas (por exemplo, durante as contrações) e
mudanças na freqüência cardíaca fetal ao longo do tempo.

• Contrações Uterinas: A freqüência das contrações uterinas é documentada como o número de contrações
dentro de um período de 30 minutos dividido por 3 para ter o número de contrações em 10 minutos. Se esse
número não for inteiro, pode ser arredondado. Taquissístolia é definido como menos de 5 contrações por 10
minutos; qualquer número maior que 5 (por exemplo, 5,2) deve ser interpretado como taquissitolia.
Informações sobre freqüência, duração e força das contrações podem ajudar os médicos a determinar
causas de progressão anormal de trabalho de parto e interpretar padrões anormais de freqüência cardíaca
fetal. Tocodinamometria é uma forma não invasiva de registrar a freqüência e duração das contrações e
produz informações adequadas sobre a maioria dos partos. Se o traçado for inadequado, podemos colocar
um transdutor de pressão interno para medir a duração, freqüência e força das contrações.
58
• Progressão do trabalho de parto: alguns estudos randomizados avaliaram a freqüência e o momento ótimo
para exame cervical, posição fetal e descida fetal. Na maior parte das mulheres é recomendado realizar
exame vaginal: na admissão, intervalos de 4 horas durante o primeiro estágio do parto, antes da
administração na analgesia/anestesia, quando a parturiente sentir vontade de “empurrar" (para determinar se
o cérvix está totalmente dilatado, em intervalos de duas horas no segundo estágio do parto, se houverem
anormalidades da freqüência cardíaca fetal (para avaliar
complicações como ruptura uterina ou prolapso de cordão). O número de exames vaginais é mantido o
menor possível para conforto da paciente e minimizar exposição iatrogênica do feto à flora vaginal. Avaliar
quando o trabalho de parto está progredindo normalmente é um componente chave da atenção intra-parto,
contudo, determinar o começo do trabalho de parto, medir o progresso e avaliar os fatores (força,
passagem, pélvis) que afetam o rumo dele é uma ciência inexata.

• Trabalho de Parto Taquitócico ou Precipitado: se refere a um trabalho de parto e nascimento rápido


definido variamente como a expulsão do feto dentro de 2 a 4 horas do começo das contrações uterinas. É
raro e não muito estudado. Pode ocorrer sofrimento fetal, visto que no momento da contração o nível de
oxigênio é diminuído para o feto.

5.1.5 ASSISTÊNCIA AO SEGUNDO ESTÁGIO DO TRABALHO DE PARTO

• Persistência da borda anterior do colo uterino: na maior parte das mulheres, o último centímetro de colo
uterino entre a cavidade pélvica e a cabeça do feto desaparece rapidamente assim que o colo uterino está
completamente dilatado e a cabeça do feto desde. Ocasionalmente acontece a persistência de uma borda
anterior por maior de 30 minutos e pode indicar uma posição não favorável ou anormalidade do trabalho de
parto, especialmente se essa borda se torna edematosa. A conduta para essas pacientes é espectante e
evitamos reduzir essa borda anterior manualmente devido ao risco de laceração cervical e consequente
hemorragia. Contudo, após uma postura expectante demasiadamente longa, laceração cervical, necrose, ou
destacamento da borda podem acontecer espontaneamente. Se fora realizada uma tentativa de redução
manual, a borda cervical é empurrada para trás durante a contração até que ela deslize sobre a cabeça do feto
e sobre a borda interior da sínfise púbica O colo uterino é gentilmente segurado nessa posição até que a
cabeça do feto desça com a próxima contração.

• Cuidados com o períneo: aplicação de compressas mornas e massagem perineal com lubrificante tem sido
propostas como meios de amolecer e alongar o períneo para reduzir a incidência de trauma perineal durante
o nascimento. Em uma meta-análise de estudos randomizados, aplicar compressa morna durante o segundo
estágio de trabalho de parto reduziu lacerações de terceiro e quarto graus quando comparado à não
colocação da compressa; performar massagem também reduziu lacerações de terceiro

59
e quarto grau quando comparada à assistência usual. Massagem perineal antes do parto também pode ajudar.
Se usadas, compressas podem ser ser feitas de compressas limpas ou almofadas perineais imersas em água
morna (até 43ªC) e torcidas para liberar excesso de água. Elas são seguradas no períneo materno entre
contrações expulsivas e trocadas para mantê-las quentes e limpas. Massagem perineal é performada entre
contrações expulsivas com dois dedos enluvados e lubrificados se movendo de lado a lado dentro da vagina
da paciente e exercendo pressão moderada para baixo.
• Fazendo força expulsiva: A maior parte das mulheres começa a fazer força expulsiva quando o colo uterino
encontra-se totalmente dilatado. Contudo, se o traçado da freqüência cardíaca fetal é normal e a
apresentação está alta, ainda não está “encaixada”, nós requisitamos que as mulheres esperem para começar
a fazer força até que a apresentação esteja mais baixa para diminuir a duração de tempo de esforço materno
e não esgotá-la. Essa decisão é baseada em fatores específicos de cada paciente, como se há a necessidade
de acelerar o parto, fadiga materna e preferência materna. Não existem informações conclusivas sobre um
método ser melhor que outro. A paciente vai fazer força expulsava na posição que achar mais confortável.
Não existe evidência convicta de uma posição ótima para expulsão. Posições verticalizadas como de joelhos
ou sentada possuem vários benefícios teóricos (por exemplo aumento das dimensões pélvicas, melhor
alinhamento fetal) e a posição sulina deve ser evitada devido a possibilidade de compressão aorto-cava. A
técnica de expulsão ótima também não é muito clara. Nós aconselhamos a permitir que a mulher faça força
quando sentir necessidade (expulsão espontânea ou fisiológica) a não ser que a parturiente esteja sob o efeito
de anestesia epidural e ela não esteja apta a sentir quando deve fazer foça. Aconselhamos contra fazer força
em Valsava (fazer força com a glote fechada), uma vez que não existem benefícios clínicos significantes
para corroborar com essa técnica. Mulheres são instruídas tipicamente a puxar os joelhos em direção ao
abdome, encostar o queixo no peito, respirar fundo e empurrar no inicio da contração por 10 segundos com
o objetivo de três forças expulsavas em cada contração. Contudo, não há evidência que treinar as mulheres
dessa forma traga benefícios sobre deixá-las fazer força de acordo com seu próprio reflexo em resposta à
dor da contração e à pressão sentida da descida da cabeça do feto. Uma meta-analise de 2017 que analisou
21 estudos randomizados que estudaram diferentes abordagens sobre o período expulsivo relatou os
seguintes achados maiores:

• Não foi encontrada diferença clara na duração do segundo estágio do trabalho de parto dentre mulheres que
seguiram os próprios instintos (expulsão espontânea) versus aquelas que foram instruídas a inspirar
profundamente no início da contração e segurar o fôlego pelo máximo de tempo possível enquanto faziam
força (expulsão dirigida com manobra de valsava)
• Em mulheres submetidas à anestesia epidural, retardar o inicio da realização da força expulsiva aumentou o
segundo estágio do trabalho de parto em mais ou menos uma hora e diminuiu a duração do período
expulsivo em uma média de 19 minutos, quando comparadas àquelas que começaram a fazer a força

60
imediatamente. Essa abordagem aumentou discretamente as chances de parto vaginal espontâneo. Apesar
de ter aumento a freqüência de baixo pH do sangue do cordão umbilical, não foram observadas diferenças
em taxas de admissão em unidade de cuidado intensivo neonatal ou Apgar em 5 minutos abaixo de 7.

• A técnica de expulsão não pareceu ter grande impacto na ocorrência de desfechos adversos para mãe ou
bebê.

• Duração: Enquanto o padrão da freqüência cardíaca fetal estiver normal e algum grau de progresso for
observado, não existe um limite máximo de duração do segundo estágio (que é aquele entre a dilatação
total ao nascimento). Não existe um limiar em que os desfechos maternos ou neonatais se agravam
abruptamente, mas um segundo estágio que dure mais de quatro horas em nulíparas e duas horas em
multíparas parece estar associado com um discreto aumento na freqüência consequências maternas e
complicações neonatais potencialmente sérias, e isso deve ser uma preocupação. Em um estudo prospectivo
incluindo mais de 53 mil mulheres com gestações de feto único a termo e cefálicas, 78% das nulíparas e
82% das multíparas que continuaram a fazer força depois desses tempos, conseguiram realizar um parto
vaginal. Em nulíparas a freqüência de desfechos adversos neonatais compostos dentre aquelas que tiveram
uma segunda fase com menos de 60 minutos e aquelas que tiveram uma segunda fase com mais de 240
minutos foi de 1,3 e 2,4% respectivamente. Em multíparas, a freqüência de desfechos adversos neonatal
compostos dentre aquelas com uma segunda fase com menos de 60 minutos e aquelas com mais 240
minutos foi de 1,1 e 2,8% respectivamente. Dentre as preocupações possíveis, convulsão ou encefalopatia
isquêmica-hipóxica foram os desfechos adversos que ocorrerão em praticamente todos os casos. Um
discreto aumento de convulsões e encefalopatias isquemico-hipóxicas neonatais dentre os partos com
segundo estágio acima de 120 minutos também foi notado em multíparas.

• Posição materna para o parto: Se não existirem complicações ou manipulações fetais previstas, o parto
pode ser realizado com a mãe e praticamente qualquer posição que ela se sinta confortável. Posições
comuns incluem a posição lateral e a posição parcialmente sentada. Apoios para os pés e/ou joelhos não
são necessários. A posição de litotomia (ou ginecológica) oferece vantagens se forem antecipadas as
necessidades de manipulações fetais ou exposição ótima cirúrgica. O segundo estágio do trabalho
de parto parece ser encurtado em alguns minutos em mulheres sem o uso de anestesia epidural e mulheres
em posições verticalizadas. A posição materna no parto não parece ter efeito significante no risco de
lacerações de terceiro e quarto grau.

• Episiotomia: Episiotomia de rotina não é benéfica e deve ser evitada. A episiotomia é reservada para partos
com alto risco de laceração perineal severa, excesso de tecido mole que atrapalhe o parto, ou necessidade
de facilitar o parto devido a um feto possivelmente comprometido.
• Nascimento do bebê: As responsabilidades do provedor de saúde são reduzir o risco de trauma perineal na
mãe e ferimento fetal durante o parto e prover suporte inicial ao recém-nascido. Não existe consenso quanto
61
ao melhor método de proteger o períneo durante o parto, a não ser evitar a episiotomia de rotina e pressionar
o fundo uterino. Opções incluem fazer o parto entre as contrações ao invés de durante as contrações e vários
métodos de utilizar as mãos da equipe médica para controlar a descida da cabeça fetal. Essa última técnica
pode envolver suporte perineal sem toque ("sem as mãos”), suporte perineal passivo, suporte da cabeça ao
coroar e usando dedos colocados entre o anus materno e o cóccix para ativamente levantar o queixo fetal
anteriormente (manobra de Ritgen). Compressas mornas e massagem perineal podem ser úteis em reduzir
trauma perineal. Nós utilizamos a seguinte abordagem para previnir a expulsão precipitada da cabeça de
recém-nascido, que pode lacerar o períneo e esfíncter anal: pedimos que as mulheres realizem apenas
forças pequenas de expulsão quando a cabeça está coroando e o parto é iminente. Isso previne que a cabeça
seja propelida sobre o períneo. Utilizamos uma mão para manter a cabeça em uma posição fletida e controlar
a velocidade de de descida e utilizamos a outra mão para ajudar o períneo a passar a cabeça. Alguns serviços
fazem o suporte do períneo com uma esponja aplicando pressão média. Uma vez que a cabeça fetal é
expelida, ocorre espontaneamente uma rotação espontânea externa. Uma meta-análise de três estudos que
avaliavam o suporte perineal manual encontrou que ele não reduziu significativamente traumas de
esfíncteres obstétricos, apesar de que os três estudos randomizados indicarem benefícios. Como as técnicas
para suporte pernil não foram bem descritas, é difícil interpretar esses estudos. Se o cordão umbilical estiver
envolvendo o pescoço (circular de cordão), deslizar o cordão sobre a cabeça usualmente liberta o feto com
sucesso. Se uma única circular de cordão não é redutível, nos a clampeamos em dois pontos e cortamos
transversalmente. Outra opção para um cordão que é de difícil redução mas não muito apertado inclui
deslizá-lo sobre os ombros e fazer o parto do corpo através do laço, sem reduzir o cordão (manobra de
somersault). Gentilmente retiramos muco da boca e nariz do recém-nascido. A maior parte deles não precisa
ser aspirado. Depois da passagem da cabeça, colocamos uma mão em cada lado da cabeça e o ombro anterior
é passado na próxima contração usando uma tração gentil para baixo em direção ao sacro materno em
sincronia com as forças de expulsões maternas. Dessa forma, o ombro anterior é guiado por baixo da sínfise
púbica. O ombro posterior é então desprendido com tração para cima. Esses movimentos devem ser realizado
com mínimo de força para cima e para baixo possível para evitar ferir o períneo e/ou traumatizar o plexo
braquial. O parto é então completado espontaneamente ou com uma força gentil materna.

• Atenção à orofaringe: Não existem evidências que sucção oro-faríngea é benéfica em recém-nascidos
saudáveis e, em algum estudos, a realização de sucção reduziu sutilmente a saturação de oxigênio neonatal
nos primeiros minutos de vida. Contudo, realizar sucção imediatamente após o nascimento é apropriado em
recém-nascidos com obstruções óbvias para respiração espontânea devido a secreções ou que tem tendências
a requerir ventilação de pressão positiva. A sucção é primeiro realizada na boca e depois as narinas, para
evitar o risco de aspiração (recém-nascido são
respiradores nasais por obrigação). Sucção da faringe posterior deve ser evitada pois pode estimular resposta

62
vagal, resultando em apneia ou bradicardia. Em um estudo randomização de equivalência, foi compreendido
que limpar a face, o nariz e a boca com uma toalha é equivalente à sucção. O principal objetivo do estudo era
analisar a freqüência respiratória em 24 horas após o nascimento. Recém-nascidos que não eram saudáveis
ou que nasceram envoltos em liquido amniótico com mecônio foram excluidos.

• Mecônio: a American Heart Association, a American Academy of Pediatrics, e a American College of


Obstetricians and Gynecologists recomendam contra a sucção nasofaríngea em recém-nascidos envoltos em
mecônio. Estudos randomizados demonstraram que essa abordagem não diminui a síndrome de aspiração de
mecônio ou melhoram o desfecho neonatal.

• Clampeamento do cordão umbilical: concordamos com a opinião do comitê da College of Obstetricians and
Gynecologists que recomenda retardar o clampeamento do cordão por pelo menos 30 a 60 minutos após o
parto em recém-nascidos a termo ou pré-termo. A American Academy of Pediatrics também endossa essa
abordagem. Apesar de a quantidade perfeita de tempo não ter sido estudada extensivamente, acreditamos
que a informação que temos sustenta que devemos aguarda ao menos um minuto em partos a termo e ao
menos 30 segundos em partos pré-termo. Outras informações sustentam esperar de dois a cinco minutos in
partos saudáveis e a termo (ou mais se a mãe desejar) e ao menos um minuto em partos pré-termo saudáveis
(ou mais se a mãe desejar). Aproximadamente 75% do sangue disponível para transfusão entre placenta e
feto é transfundida no primeiro minuto pós-parto. Aguardar para campear o cordão aumenta o volume de
sangue placenta transfundido para o feto e portanto aumenta o volume de sangue neonatal, aumenta o
armazenamento férrico neonatal e diminui anemia neonatal e infantil. Também facilita a transição entre feto
e recém-nascido. Clampear o cordão antes do início da respiração espontada (inicio da respiração acontece
em média de 10 a 15 segundos após a expulsão) parece afetar adversamente a hemodinâmica cardiovascular
durante a transição de feto para recém- nascido, provavelmente por remover o retorno venoso umbilical
antes da dilatação da teia vascular pulmonar. A aeração dos pulmões ocasiona um aumento no fluxo
sangüíneo pulmonar, que provem a maior parte da pré-carga para o ventrículo esquerdo; se o clampeamento
do cordão preceder o inicio da respiração, a pré-carga ventricular cai por que a perda de terno venoso
umbilical não é balanceada por um aumento no retorno venoso pulmonar. Esse pode ser o motivo de
existirem alguns dos beneficiários não-hematológicos relacionados em estudos sobre adiar o clampeamento
do cordão. Em recém-nascidos a termo, o principal benefício de adiar o clampemento do cordão é um maior
aporte férrico aos seis meses de idade, que pode ser uma vantagem particularmente quando a mãe tem um
nível de ferritina baixo ou tem planos de amamentar sem fazer suplementação de ferro ou fórmulas
fortificantes. Em recém- nascidos pré-termo as reduções de hemorragia intraventricular e enterocolite
necrotizante associadas ao clampeamento tardio do cordão são suficiente convincentes para adotar essa
intervenção. Adiar o clampeamento do cordão não deve interferir com o cuidado básico para o recém-
nascido. Por exemplo, não é apropriado adiar o clampeamento quando a mãe ou recém-nascido não estão
63
estáveis ou quando a circulação entre o recém-nascido e a placenta não está intacta (por exemplo placenta
abrupta ou prévia ou avulsão do cordão). Pode não ser apropriado no caso de restrição de crescimento fetal
com Doppler de anormal de artéria umbilical uma vez que estudos mostram que esses recém-nascidos já tem
policitemia e hiperviscosidade. Desvantagens de adiar o clampeamento do cordão incluem um aumento na
hiperbilirrubinemia no período imediatamente após o nascimento resultando em mais fototerapia e um risco
aumentado de policitemia e recém-nascidos com restrição de crescimento. Adiar o clampeamento do cordão
também reduz o volume de sangue no cordão umbilical disponível para a coleta de células tronco; portanto o
tamanho e a dose das células do sangue coletado no cordão pode não ser adequado para um futuro
transplante celular hematopoiético se o clampeamento do cordão for adiado. Isso deve ser considerado
quando se planeja coletar o sangue do cordão com esse propósito.

• Ordenha do cordão: nós não ordenhamos o cordão umbilical, contudo, essa prática é uma alternativa ao
clampeamento tardio do cordão para aumentar a transfusão sangüínea. Dependendo da técnica,
ordenhar o cordão pode ser mais eficiente do que o ordenamento tardio do cordão para aumentar o volume
sangüíneo neonatal. Um estudo randomizado em recém-nascidos pré-termo descobriu que ordenhar a parte
acessível do cordão quatro vezes a uma velocidade de 20 cm a cada dois segundos foi equivalente a adiar o
clampeamento do cordão por 30 segundos. Ordenhar o cordão, assim como o clampeamento tardio do
cordão pode ajudar a estabilizar a pressão sangüínea e aumentar o volume urinário em bebês prematuros,
mas uma preocupação teórica é que uma quantidade não contabilizáveis de sangue será dado para um bebê
imatura e de uma forma não controlada, o que pode ser danoso. Em uma meta-analise de 2015 de sete
estudos randomizados de ordenha de cordões umbilicais versus a atenção provida regularmente, a ordenha
do cordão umbilical aumentou significativamente os níveis de hemoglobina sem que aumentasse a
necessidade de fototerapia por hiperbilirrubinemia. Nos recém nascidos que nasceram com menos 33
semanas, contudo, não foi reduzida a necessidade de transfusão sanguínea e a intervenção não
necessariamente reduz as taxas de mortalidade, hipotensão que requer expansão de volume, hemorragia
intraventricular grave ou enterocolite necrotizante. Essas informações não produzem evidência convincente
a favor ou contra a ordenha do cordão umbilical. O parto não deve ser desnecessariamente adiado para a
realização da ordenha do cordão em situações onde a assistência pediátrica for necessária como em
situações de mecônio espesso ou depressão respiratória neonatal. Não deve ser realizada também se existir
a ambição de coletar sangue do cordão umbilical.

• Sangue do cordão umbilical: sangue do cordão umbilical coletado com o propósito de diagnóstico
usualmente é obtido permitindo que o sangue flua a partir do corte realizado no cordão em um vidro de
coleta antes da retirada da placenta, se possível. O sangue do cordão umbilical pode ser utilizado para testar
o tipo sanguíneo, fator Rh e para uma variedade de condições neonatais. Programas de rastreio neonatais
tipicamente usam sangue coletado do calcanhar do bebê o mais tardiamente possível (o mais proximo da
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alta hospitalar) para permitir o maior acúmulo possível de compostos anormais no sangue do bebê dando
ao teste maior chance de obter um resultado positivo se uma doença estiver presente. Quando indicada
devido a depressão respiratória neonatal, a análise ácido-básica do sangue coletado a partir de uma artéria
umbilical através de agulha e seringa para minimizar a exposição ao ar e evitar misturar sangue venoso com
arterial. Coletar o sangue do cordão para o estoque em bancos próprios para tal, é um procedimento que
pode ser feito com agulha e seringa antes ou depois da expulsão da placenta.

• Interação materno-fetal: se não existirem complicações maternas ou neonatais, um bebê a termo saudarem
pode ser seco para minimizar a perda de calor e dado para a mãe. Contato pele-a-pele pode ser benéfico
para o vinculo inicial entre mãe e bebê e desfecho da amamentação. A localização do bebê (acima ou
abaixo do nível da placenta) antes do clampeamento do cordão não apareceu afetar significativamente o
volume da transfusão placenta-recém-nascido em um estudo randomizado. Portando, preocupações quanto
o volume de tranfusão não devem influenciar a decisão de colocar o recém-nascido no abdômen da mãe.

5.1.6 ASSISTÊNCIA AO TERCEIRO ESTÁGIO DO TRABALHO DE PARTO

• Separação normal da placenta: espessamento miometrial após o parto da criança leva uma redução
substancial na área de superfície uterina, resultando em forças de cisalhamento no local de implante
placentário e separação da placenta. Esse processo geralmente começa no polo mais baixo da margem
placentária e progride ao longo dos lados adjacentes. Uma “onda de separação” se espalha para cima
até que a polo mais superior se destaque por último. Sinais de separação da placenta incluem um jorro
de
sangue, alagamento do cordão umbilical e movimento antero-cefálico do fundo uterino, que algumas
vezes pode estar firme e globular depois do destacamento da placenta. A expulsão placentária segue a
separação como resultado de uma combinação de eventos incluindo contrações uterinas espontâneas,
pressão para baixo exercida pelo hematoma retroplacentário em formação e o aumento na pressão
intra- abdominal materna. Não existe critério universalmente aceito para duração normal do terceiro
estágio. Em duas grandes séries de partos consecutivos, a duração média foi de cinco a seis minutos,
90% das placentas foi expelida dentro de 15 minutos e 97% delas dentro de 30 minutos após o
nascimento. Idade gestacional é o fator de maior influência da duração do terceiro estágio: partos pré-
termo estão associados com um terceiro estágio mais longo do que partos a termo.

• Assistência ativa e expulsão da placenta: nós assistimos ativamente o terceiro estágio pois dessa forma
reduzimos o risco de perda sangüínea severa pós-parto e necessidade de transição de transfusão
sangüínea quando comparados a conduto expectante em

estudos randomizados. Assistência tive geralmente consiste em administração profilática de um agente


65
uterotónico antes da expulsão da placenta além de tração controlada do cordão umbilical após o
clampeamento e corte do mesmo. Massagem uterina também pode ser realizada. Estudos randomizados
demonstraram que o agente uterotónico é o agente mais importante do esquema. Utilizamos tração
controlada para facilitar a separação e expulsão da placenta. Em uma meta-análise de 2014 de estudos
randomizados comparando a tração controlada com uma conduta expectante, a tração controlada
resultou em uma redução na necessidade da extração manual da placenta, assim como reduções
estatísticas discretas na duração do terceiro estágio, menor perda sangüínea e incidência de hemorragia
pós-parto; as taxas de hemorragia pós-parto severa, necessidade de uterotónicos adicionais e
transfusões sangüíneas não eram estatisticamente diferentes. Outros encontraram achados similares.
Apesar dos benefícios da tração controlada serem pequenos, não existem danos significativos se a
manobra for realizada gentilmente sem tração excessiva, que pode resultar em avulsão de cordão ou
inversão uterina. Duas manobras para manobra de cordão devem ser descritas: a manobra Brandt-
Andrews (uma mão segura o fundo uterino no abdome pata evitar inversão uterina enquanto a outra
exerce tração sustentada para baixo no cordão umbilical) e a manobra de Crede (o cordão é fixado com
a mão enquanto o fundo uterino é empurrado para baixo com a outra mão) Preferimos a manobra de
Brandt-Andrews. Se o cordão avulsionar antes da expulsão da placenta, nós esperando até 30 minutos
para que ela saia espontaneamente. Enquanto esperamos, iniciamos as preparações para caso seja
necessária uma extração manual da placenta. Intervimos prontamente se o sangramento se tornar
intenso. Assim que a placenta emerge da vagina, as membranas fluem atrás dela. Rotacionar
lentamente a placenta em círculos enquanto ela é expulsa ou agarrar as membranas com uma pinça,
ajuda a previnir que elas rasguem e possivelmente fiquem retidas na cavada uterina. A placenta, o
cordão umbilical e as membranas fetais devem ser examinadas sistemicamente. O lado fetal é avaliado
para quaisquer evidências de vasos correndo para a borda da placenta e para dentro das membranas, o
que é sugestivo de lobo placentário acessório. O número de vasos no cordão deve ser anotado.

• Sangramento: Uma média de sangue perdido pela vagina é estimada em menos de 500 mL.
Sangramentos excessivos podem estar relacionados a atonia, trauma, coagulopatia, anormalidades
placentárias ou inversão uterina. Saber os volumes de sangue em materiais de uso comum na
obstetrícia (bacias utilizadas na sala de parto) podem ajudar na hora de estimar as perdas sanguineas.

• Reparo de lacerações: O cérvix, a vagina e períneo devem ser examinados na procura de traumas
relacionados ao nascimento. Os maiores fatores de risco para lacerações perineais de terceiro e quarto
grau são nuliparidade, parto vaginal operatório, episiotomia, e parto de bebês macrossômicos. Se uma
laceração for identificada, seu tamanho e posições devem ser anotados e o reparo iniciado com
analgesia adequada. Não reconhecer e tratar uma injúria retal pode levar a morbidades sérias de longa
data, mais notavelmente incontinência fecal. Realizamos exame retal depois do reparo do
66
períneo para palpar suturas realizadas inadvertidamente através da mucosa retal dentro do lúmen retal.
Se identificadas, devemos reabordar as suturas, apesar de não haverem evidências claras de que pontos
através da mucosa aumentem o risco de formação de fístula.

5.1.7 RESUMO E RECOMENDAÇÕES

• Aulas de educação para o parto informa mulheres e seus parceiros sobre o que esperar do trabalho de
parto e ajuda a construir uma base para os planos pessoais para a experiência do parto.

• Os objetivos do exame inicial da parturiente são: rever o seu histórico pré-natal em busca de condições
ginecológicas e obstétricas que poderão ser relevantes durante o trabalho de parto, checar o
desenvolvimento de possíveis novas injurias desde a última consulta pré-natal, estabelecer a condição
do colo uterino para determinar o progresso futuro e determinar a condição fetal.

• Os resultados dos exames a seguir devem estar acessíveis no momento do nascimento, mas nem sempre
serão necessários: hemoglobina/hematócrito, tipagem sangüínea, hemograma, HIV, antígeno da
hepatite B, sífilis, streptococo do Grupo B reto-vaginal. Mulheres que não tiverem um exame de HIV
devem ser oferecidas um teste rápido durante o trabalho de parto.

• Recomendando não realizar enemas de rotina ou tricotomia do períneo de rotina.

• Não existe consenso sobre ingesta oral aceitável pela mãe ou sobre a necessidade de administração de
fluidos intravenosos. Pacientes de baixo risco de evolução para parto cesariana são permitidas a ingesta de
líquidos claros.

• O parto vaginal não é uma indicação de profilaxia de rotina com antibióticos, mesmo para mulheres com
lesões cardíacas, uma vez que a taxa de bacteremia é pequena. Quimioprofilaxia intra-parto para previnir o
inicio prematuro de uma infecção neonatal por GBS é indicada em pacientes que atingem certos critérios; o
agente de escolha é a penicilina intravenosa.

• As preferências maternas podem guiar as atividades maternas. Andar durante o primeiro estágio do
trabalho de parto não parece melhorar ou piorar o progresso do trabalho de parto. Mulheres em trabalho de
parto devem assumir as posições que para ela pareçam confortáveis a não ser que posições específicas
sejam necessárias devido a condições materno-fetais que exijam um monitoramento mais próximo.

• Vários opções não farmacológicas, farmacológicas e anestésicas estão disponíveis para ajudar as mulheres a
lidar com a dor durante o trabalho de parto.

• Sugerimos não realizar amniotomia de rotina. Não existe evidência convincente dos benefícios da técnica
em mulheres que entraram em trabalho de parto espontaneamente e a rotura de membranas aumenta o risco

67
de infecção ascendente e prolapso de cordão.

• Em mulheres com gravidezes com risco aumentado de comprometimento fetal durante o trabalho de parto, é
recomendado realizar o monitoramento eletrônico contínuo da freqüência cardíaca fetal. Também podemos
monitorar gravidezes de baixo risco por que pode ser mais prático do que o monitoramento intermitente,
mas não há necessidade de ser rígido sobre essa medida se paciente entender os riscos e benefícios do
monitoramento intermitente em gravidez não complicada, tem traçado normal de freqüência cardíaca fetal
e não está acamada. Contrações e progressão do trabalho de parto também são monitoradas.

• A posição, técnica de posição e duração perfeita do período expulsivo não estão claras. Nós sugerimos que
as pacientes façam a força expulsava na posição que eles acharem mais confortável e com a glote aberta.
Contudo, se o traçado da freqüência cardíaca fetal for normal e a apresentação estiver alta, nós
normalmente pedimos que as mulheres adiem iniciar a força de expulsão até que a cabeça do feto se
encaixe para reduzir a duração do período expulso e evitar fadiga materna.

• Recomendando não realizar episiotomia de rotina.

• Sugerimos segurar o feto durante a descida. Previnir a expulsão precipitada do recém- nascido pode reduzir
o risco de injúria obstétrica e de esfíncter anal.

• Realizar sucção oronasofaríngea de rotina em recém-nascidos não é benéfico, mesmo que haja fluido
amniótico com mecônio. Realizar sucção é apropriado para recém- nascidos com óbvia obstrução à
respiração espontânea ou que tenham grandes chances de requerer ventilação com pressão positiva

• Em partos prematuros que não necessitarem de ressuscitação, recomendamos adiar o clampeamento do


cordão. Os benefícios incluem diminuir as taxas de transfusão, hemorragia intraventricular, enterocolite
necrotizante e hipotensão. Para bebês a termo que não requererem ressuscitação sugerimos adiar o
clampeamento do cordão. Contudo, não adiar o clampeamento do cordão é razoável uma vez que os
benefícios do aumento da armazenagem de ferro precisa ser balanceado com a desvantagem que
é o quem não do risco de hiperbilirrubinemia e mais necessidade de fototerpia. Adiamos o clampeamento
ao menos 30 segundos em prematuros e ao menos um minuto em a termo.

• Ordenhar o cordão é uma alternativa ao clampeamento tardio do cordão e os resultados são mais rápidos,
importante quando tempo é uma preocupação.

• Adiar o clampeamento do cordão reduz o volume de sangue do cordão umbilical disponível para armazenar
células troco; logo, o tamanho e a dose das células coletadas podem não ser adequadas para um transplante
futuro de células hematopoiéticas se o clampeamento for adiado.

• Assistência ativa do terceiro estágio do trabalho de parto reduz a perda sangüínea materna e o risco de
hemorragia pós parto quando comparada a uma conduta expectante. Nós administramos ocitocina e

68
aplicamos força de tração controlada no cordão umbilical. A placenta deve ser examinada para garantir que
está intacta.

• É estimada uma perda inferior a 500 mL de sangue durante um parto vaginal. Sangramento excessivo pode
estar relacionado a atonia, trauma, coagulopatia, anormalidades placentárias ou inversão uterina.

• Falha em reconhecer e reparar uma injúria retal pode levar a morbidades sérias e de longo prazo, sendo a
incontinência fecal a mais notável delas.

4.2 MECANISMO DO PARTO

Sob o ponto de vista do mecanismo do parto, o feto é um móvel, que percorre um trajeto (bacia),
impulsionado por um motor (contração uterina). Na sua atitude habitual de flexão da cabeça sobre o
tronco e de entrecruzamento dos membros, que também se dobram, o móvel assemelha-se a um
ovoide – o ovoide fetal (Figura 1).

Figura 1. Ovoide fetal.

Esse, por sua vez, é composto por dois segmentos semidependentes: o ovoide cefálico (cabeça) e o
córmico (tronco e membros). Embora o ovoide córmico seja maior, seus diâmetros são facilmente
redutíveis, tornando o polo cefálico mais importante durante a parturição. O estudo da mecânica do
parto, na generalidade dos casos, e em essência, analisa os movimentos da cabeça sob ação das
contrações uterinas, a transitar pelo meio pelvigenital.

O trajeto, ou canal do parto, estende-se do útero à fenda vulvar (Figura 2). No seu percurso através do
canal parturitivo, impulsionado pela contratilidade uterina e pelos músculos da parede abdominal, o
feto é compelido a executar certos movimentos, denominados em conjunto de mecanismo do parto.
São movimentos puramente passivos, e procuram adaptar o feto às limitações e diferenças de forma
do canal. Com esses movimentos, os diâmetros fetais se reduzem e se acomodam aos pélvicos.
69
Embora os movimentos desse mecanismo sejam contínuos e entrelaçados, para facilitar sua descrição,
costuma-se dividi-los em vários tempos, com análise minuciosa de cada fase. Porém, é possível encará-
los com mais simplicidade, dividindo-os em três, segundo Fernando Magalhães: insinuação, descida e
desprendimento.

 Insinuação

 Tempo de mecanismo de parto


Embora os movimentos desse mecanismo sejam contínuos e entrelaçados, para facilitar sua descrição,
costuma-se dividi-los em vários tempos, com análise minuciosa de cada fase. Porém, é possível encará-
los com mais simplicidade, dividindo-os em três, segundo Fernando Magalhães: insinuação, descida e
desprendimento.

 Insinuação
70
A insinuação é definida como a passagem do maior diâmetro da parte apresentada, perpendicular à
linha de orientação fetal, pelo estreito superior da bacia materna. Dessa forma, nas apresentações
cefálicas, o diâmetro de insinuação corresponde ao biparietal e nas apresentações pélvicas, ao
bitrocantérico. Na maioria das mulheres, quando a parte fetal apresentada está insinuada, significa
que o ponto de referência ósseo fetal está no nível das espinhas isquiáticas maternas (plano 0 de De
Lee ou terceiro plano de Hodge).

Os autores franceses, no que têm sido seguidos pelos demais latinos, consideram a variedade de
posição mais frequente (60%) a occípito-esquerda-anterior (OEA). Seguemse, em ordem
decrescente de frequência, a occípito-direita-posterior (ODP) (32%); a occípito-esquerda-posterior
(OEP) (6%); e, bem rara, a occípito-direita anterior (1%).
A insinuação depende basicamente de dois mecanismos: flexão e assinclitismo.

 Flexão cefálica
Ocorre anterior e concomitantemente à insinuação. No início, a cabeça fetal mostra-se em atitude
indiferente ou semifletida, oferecendo o diâmetro occipitofrontal (12 cm) à passagem pelo estreito
superior da bacia. Sucedendo-se as contrações e sendo impelido de encontro ao estreito superior,

71
exagera-se a flexão e ocorre a substituição por diâmetros menores: suboccipitofrontal (10,5 cm) e
suboccipitobregmático (9,5 cm). O mecanismo de flexão cefálica é resultante da pressão axial do
feto. A articulação da cabeça com a coluna vertebral representa uma alavanca de braços desiguais:
de um lado, o occipício (braço menor); do outro, a fronte (braço maior). Pressionado o fulcro dessa
alavanca, pela contração uterina de cima para baixo, e havendo uma contrapressão representada
pela resistência da parede pélvica ou do assoalho pélvico, ocorre a Hexão (teoria de Zweifel)
(Figura 4).

Em primigestas a insinuação ocorre na maioria das vezes, por volta de 15 dias antes do parto. Já em
multíparas, a insinuação pode ocorrer a qualquer momento, desde antes do início do trabalho de parto
até após a dilatação completa do colo uterino (Segundo período). A ausência de insinuação em
nulíparas requer exame cuidadoso no sentido de descartar desproporção cefalopélvica, apresentação
anômala ou algo que possa estar bloqueando o canal de pano (tumores, placenta etc.). Na ausência
dessas ocorrências, não há motivo para maiores preocupações, uma vez que a maioria dos casos irá

72
evoluir normalmente para pano vaginal.

73
 Assinclitismo (e sinclitismo)

Considerando que a articulação entre a cabeça e a coluna vertebral do feto é bastante móvel, o polo
cefálico assume não só movimentos de flexão anteroposterior como também movi.men1os de flexão
lateral. Durante o processo de insinuação, um dos ossos parietais atravessará o estreito superior da
pelve antes do outro, aproximando a sutura sagital de um dos ossos do eixo anteroposterior da bacia
materna (púbis ou sacro).

Dessa forma, quando a sutura sagital se aproxima da pube e o parietal posterior desce até ultrapassar o
promontório materno, diz -se que há assinclitismo posterior. Ao contrário, quando a sutura sagital
está mais próxima ao sacro, mais baixo está o parietal anterior, e o assinclitismo é chamado de
anterior. Durante o trabalho de parto, existe um momento em que o parietal insinuado ultrapassa o
ponto de referência da bacia óssea e, com o aumento da área abaixo do estreito superior, é possível
mover lateralmente o polo cefálico. Isso traz a sutura sagital à mesma distância entre o púbis e o
promontório, e a cabeça fica em sinclitismo nesse momento.

Em jovens primíparas, a cabeça fetal mostra-se mais frequentemente em assinclitismo posterior, uma
vez que as contrações uterinas e a contenção da prensa abdominal levam o corpo do feto em direção
posterior. Com a progressão fetal, mudanças sucessivas de assinclitismo posterior à anterior vão
facilitando a descida, permitindo à cabeça tomar vantagem nas áreas mais amplas da cavidade
pélvica. Nas multíparas, sobretudo em portadoras de musculatura abdominal flácida, o útero
permanece em anteversão acentuada e ocorre assinclitismo anterior, tão logo se inicie a insinuação
(Figura 5).

74
Figura 5. Mecanismos de assinclitismo posterior (A), sinclistismo (B) e assinclitismo anterior (C).

 Descida

A descida ou progressão, também considerada segundo tempo do mecanismo de parto, é o momento


definido pela passagem do polo cefálico (ou da apresentação fetal em geral) do estreito superior para o
estreito inferior da pelve materna. A definição e o estudo desse momento do pano têm meramente fins
didáticos, já que sempre ocorre de forma sincrônica com o primeiro tempo, o terceiro tempo ou ambos.
Por essa razão, é de suma importância ter em mente que enquanto a descida está ocorrendo, a
insinuação pode não ter ocorrido ainda e a rotação interna está acontecendo concomitantemente. Como
esse movimento é harmônico e complexo, acredita-se que a divisão desse tempo facilita o
entendimento. Na prática clínica, usa-se o esquema de De Lee (Figura 3), com os planos ditos em
centímetros, a partir das espinhas isquiáticas:

 Móvel: > -3 cm.


 Ajustada ou fixada: -3, -2 ou -1 cm.
 Insinuada: 0 cm.
 Fortemente insinuada: +1, +2 ou +3 cm.
 Baixa: +4 ou +5 cm (já aflorando na vulva).

O canal de parto (Figura 2) não é um cilindro regular, possuindo uma curvatura em sua porção mais
inferior. Assim, o feto tem que atravessar esse canal de modo a adaptar-se ao cilindro contingente, cujo
75
eixo possui forma de “J”. Para isso, ocorrem movimentos de flexão (anteroposterior e lateral, para
reduzir os diâmetros), rotação e mecanismos de cavalgamento ósseo (fenômeno que reduz as
dimensões do polo cefálico, posto que o maciço frontal e o occipital se locam por baixo dos parietais;
do mesmo modo, a borda interna de um dos parietais se sobrepõe à outra).

Em primíparas, ainda que a insinuação possa ocorrer antes do desencadeamento do trabalho de parto, a
descida pode não ocorrer até a cervicodilatação se completar. Em multíparas, por sua vez, a descida
usualmente começa com a insinuação. Contribuem para a descida um ou mais dos seguintes elementos:
contração uterina, contração dos músculos abdominais, pressão do líquido amniótico e extensão do
ovoide fetal, que se transformem cilindro.

 Rotação interna

O objetivo da rotação interna é coincidir o diâmetro anteroposterior do polo cefálico com o maior
diâmetro da bacia materna. Os diâmetros com maiores proporções variam, dependendo do estreito em
que se encontra a cabeça fetal. Assim, o estreito superior apresenta maior dimensão no sentido
transverso; no estreito médio, o sentido anteroposterior é maior ou eles têm iguais proporções; e no
inferior, o anteroposterior é maior.

Durante a descida do feto, ocorre movimento de rotação para locar o polo cefálico sob o púbis.
Descreve-se assim um movimento de espira. A linha de orientação (sutura sagital) fica orientada na
direção do maior o diâmetro do estreito inferior (anteroposterior) ao terminar a descida.

A rotação normalmente traz o ponto de referência fetal para a frente, junto ao púbis, o que é
denominado rotação anterior (ou púbica}. Quando, excepcionalmente, o feto roda para trás, diz-se que
ocorreu rotação posterior (ou sacra). O grau de rotação varia conforme a variedade de posição. Nas
apresentações cefálicas fletidas, o occipício é o ponto de referência que irá percorrer a distância de um
arco de circunferência, necessária para sua locação no subpúbis. Dessa forma, será observada a rotação,
em graus, conforme as seguintes variedades (Figuras 6 e 7):

76
Figura 6. Rotação interna em apresentação cefálica fletida (A) para variedade de posição occipitopúbica (B).

Figura 7. Rotação interna de posição posterior (A), transverso (B) e anterior (C) para variedade de
posição occipitopúbica (D).

 45° nas anteriores (occipitoesquerda anterior occipitodireita anterior).

 90° nas transversas (occipitoesquerda transversa occipitodireita transversa).

 135° nas posteriores (occipitoesquerda posterior occipito direita posterior).

Nas variedades de posição posteriores (occipitoesquerda posterior e occipitodireita posterior) é


possível a ocorrência mais frequente de rotação posterior, em comparação com as variedades
anteriores e transversas, descrevendo um arco curto de circunferência de 45°. Nessa condição, o
occipício (ponto de referência) encontra-se na região sacral da bacia materna, tornando o
desprendimento cefálico mais difícil e lento (Figura 8).
77
Figura 8. Evolução do trabalho de parto com rotação posterior. A: posição fetal no começo do trabalho de
parto, com dilatação e esvaecimento cervical ainda discretos. A cabeça está alta; B: próximo ao final da fase de
dilatação, o colo está esvaecido e quase todo dilatado. Iniciou-se a descida da apresentação fetal; C: no período
expulsivo, forma - se o canal de parto, o polo cefálico desce e completa a rotação interna; neste caso,
posicionando o occipício junto ao sacro materno; Desprendimento da apresentação letal; E: após o
desprendimento do polo cefálico, ocorre a rotação externa.

78
Durante a rotação, o dorso fetal mantém-se a 45° da linha de orientação cefálica. Por essa razão,
observa-se rotação do diâmetro biacromial de 90° nas variedades posteriores e 45° nas transversas. Nas
variedades de posição anteriores, não há necessidade de rotação, já que as espáduas se encontram a 45º
da sutura sagital.

A rotação interna é essencial para que ocorra ultimação do parto, exceto quando o feto é muito
pequeno. Em aproximadamente dois terços das mulheres, a rotação interna completa-se no tempo que
a cabeça chega ao assoalho pélvico e, em aproximadamente um quarto, é completada pouco depois,
podendo não ocorrer em 5% das vezes. Os principais fatores que impedem que essa rotação ocorra são
contrações de baixa intensidade ausência de flexão cefálica e fetos grandes. A analgesia peridural pode
predispor às rotações incompletas, por diminuir a força da musculatura abdominal e relaxar a
musculatura pélvica.

 Desprendimento

O desprendimento cefálico ocorre com a descida final da cabeça fetal em posição occipitopúbica, até
que seja possível a locação do suboccipício no subpúbis materno. Como o polo cefálico está em flexão,
é necessário que ocorra movimento de deflexão ou extensão da cabeça para ocorrer exteriorização do
maciço frontal. Dessa forma, o diâmetro suboccipitobregmático (9,5 cm) ocupa o diâmetro
anteroposterior do estreito inferior e a fronte do feto rechaça o cóccix, aumentando esse diâmetro de 9
para 11 cm, o que se denomina retropulsão coccígea. A região que se fixa ao subpúbis como ponto de
apoio para o movimento de expulsão, também chamada hipomóclio, é o suboccipício, que se localiza 7
cm abaixo da fontanela lambdoide.

Por meio de duas forças antagônicas (contração uterina e resistência perineal), o feto é impulsionado
para baixo e para fora do canal de pano. Ao vencer tal resistência, a cabeça fetal desfere movimento
abrupto de extensão, externando os diâmetros anteroposteriores do polo cefálico na sequência:
suboccipitobregmático (9,5 cm), suboccipitofrontal (10,5 cm) e suboccipitomentoniano (9,5 cm).
Ocorre, portanto, a exteriorização do bregma, da fronte, do nariz e do mento do feto, sucessivamente
(Figura 9).

80
Figura 9. Desprendimento cefálico nas apresentações de vértice que realizaram rotação interna anterior: movimento
de deflexão ou extensão do polo cefálico.

Nas rotações posteriores, em que o occipício se alinha com o sacro materno, a extensão a ser vencida
pelo occipício é a parede posterior da pelve, que mede 10 a 15 cm, muito maior quando comparada à
parede anterior (púbis), que mede 4 a 5 cm. Além disso, o diâmetro cefálico que solicita e comprime a
fenda vulvar é o suboccipitofrontal, que mede 10,5 cm. Por esse motivo, o desprendimento cefálico em
posição occipitossacra é lento, por vezes necessitando de auxílio instrumental com fórcipe.

Nesses casos, a flexão cefálica acentua-se para que haja desprendimento do occipfcio com pos1erior
deflexão do polo cefálico na direção do dorso matemo, o que resulta no desprendimento do maciço
frontofacial. O hipomóclio é o ângulo anterior do bregma e, por veres, é impossível distinguir tal
mecanismo com o desprendimento cefálico das apresentações defletidas de 1° grau (Figura 10).

81
Figura 10. Desprendimento cefálico nas apresentações posteriores de vértice que realizaram rotação interna posterior:
movimento de flexão seguido de extensão do polo cefálico.

 Rotação externa

A rotação externa da cabeça fetal, também denominada movimento de restituição, leva o occipício a voltar-
se para o lado materno que ocupava no interior do canal de parto. A sutura sagital apresenta-se em sentido
transversal ao da fenda vulvar ao fim desse tempo. Nessa ocasião, as espáduas, que se insinuaram no
diâmetro oblíquo oposto ao da cabeça fetal, rodam, trazendo o diâmetro biacromial para o diâmetro
anteroposterior do estreito inferior. Esse movimento que ocorre com os ombros se deve, aparentemente, aos
mesmos fatores que determinam a rotação interna da cabeça.

82
 Desprendimento do ovoide córmico
O desprendimento do ovoide córmico caracteriza-se pela exteriorização das cinturas escapular e pélvica
do feto. São mecanismos associados porque um se segue ao outro, diferentemente de quando se considera
o polo cefálico em relação às espáduas, em que o mecanismo é bem dissociado por ser a região cervical
do feto dotada de grande flexibilidade.

Após a rotação das espáduas, o ombro anterior fixa-se no subpúbis, apresentando a inserção braquial do
deitoide como ponto de apoio, e desprende-se por movimento de abaixamento. Desprende-se então o
ombro posterior por movimento de elevação e, em seguida, completa-se a expulsão da cintura escapular
(Figura 11).

Posteriormente ao desprendimento dos ombros, o resto do ovoide é prontamente expelido, não apresentando
maior resistência. Pode-se auxiliá-lo, se necessário, com inflexão lateral (em sentido ventral) e abaixamento
e elevação dos quadris anterior e posterior. Anormalidades de rotação e flexão do polo cefálico resultarão
em apresentações cefálicas posteriores e defletidas, respectivamente.

83
6. ABORTAMENTO

6.1 Definição

Considera-se abortamento a interrupção da gestação antes que o produto conceptual tenha


alcançado a viabilidade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define abortamento como a
expulsão ou extração do feto antes de 20 semanas ou pesando menos de 500 g.

6.2 Classificação

Quanto à intenção e cronologia, o abortamento pode ser classificado da seguinte forma:

♦ Quanto à intenção: o abortamento pode ser espontâneo, se ocorrer sem ação


deliberada de qualquer natureza, ou induzido (provocado), caso a interrupção da gestação
seja resultante de interferência intencional antes de alcançadas as condições mínimas de
sobrevivência extrauterina do produto conceptual.
♦ Quanto à cronologia: o abortamento é denominado como precoce se a perda
gestacional ocorrer até 12 semanas e tardio, se ocorrer entre 12 e 20 semanas de gestação.

6.3 Incidência

O abortamento representa a complicação mais frequente da gravidez. Aproximadamente


uma em cada 4 mulheres terá um abortamento espontâneo durante sua vida reprodutiva. Ainda que
a real incidência do abortamento seja desconhecida, entre 15 e 20% das gestações clinicamente
diagnosticadas terminarão em abortamento.

6.4 Etiologia

6.4.1 Alterações cromossômicas

A maioria dos abortamentos ocorre nas primeiras 12 semanas de gravidez e 50 a 80%


apresentam alterações cromossômicas. A proporção de perdas fetais consequentes às alterações
cromossômicas diminui com a evolução da gestação.

84
A trissomia autossômica é a alteração mais frequentemente ligada ao abortamento
espontâneo de primeiro trimestre e representa 50% dos abortamentos de causa genética.
Erros na meiose II são a principal explicação para a ocorrência das trissomias e
relacionam-se com a idade materna avançada e com a diminuição ou ausência de recombinação
meiótica.
A monossomia do cromossomo X é a segunda causa de alteração cromossômica mais
comumente relacionada ao abortamento. Essa alteração cromossômica geralmente ocorre pela falta
de um cromossomo sexual paterno, não havendo correlação com a idade materna.
A triploidia encontra-se associada à mola parcial e os achados patológicos frequentemente
encontrados incluem saco gestacional desproporcionalmente grande, degeneração hidrópica
parcial das vilosidades coriônicas e hiperplasia do trofoblasto. Os fetos triploides podem
apresentar defeitos do tubo neural, onfalocele, dismorfismo facial, fenda labial e sindactilia. Os
abortamentos triploides são geralmente relacionados a cariótipos do tipo 69,XXY ou 69,XXX, e
originam-se da fecundação por dois espermatozoides (dispermia) ou por um espermatozoide que
duplica seu genoma.
A ocorrência de tetraploidia é rara e, portanto, a observação de abortamentos decorrentes
de tetraploidia é incomum, sendo que a gestação raramente evolui além da terceira semana.
Em relação ao abortamento habitual, cerca de 3 a 5% dos casais apresentam alterações
cromossômicas. A alteração cromossômica mais frequentemente encontrada é a translocação
balanceada. Esse tipo de alteração estrutural do cromossomo é cerca de duas vezes mais frequente
na mulher, e a maioria dos indivíduos portadores dessa alteração cromossômica apresenta fenótipo
normal.
Uma outra causa cromossômica envolvida na gênese do abortamento habitual é a presença
de aneuploidia recorrente em conceptos de casais com cariótipo normal.
A avaliação do cariótipo com bandeamento cromossômico do casal e do aborto deve ser
realizada em casos de abortamento habitual em que as perdas recorrentes são precoces. Em relação
ao tratamento do fator cromossômico, de acordo com o diagnóstico propõe-se a fertilização in
vitro, podendo-se utilizar o diagnóstico genético pré- implantação ou, ainda, a doação de gametas.

85
6.4.2 Alterações endócrinas

6.4.2.1 Defeitos da fase lútea

A implantação ovular em endométrio pobremente preparado, em consequência à produção


deficiente de progesterona pelo corpo lúteo, foi aventada no passado como causa de abortamento
espontâneo e habitual. Atualmente, os defeitos da fase lútea são considerados causa pouco
provável de abortamento e sua pesquisa não faz mais parte da rotina diagnóstica do abortamento
habitual. O diagnóstico é baseado sobretudo na biópsia endometrial e na dosagem sérica de
progesterona, e ambos os métodos apresentam deficiências.

6.4.2.2 Diabetes mellitus

A taxa de abortamento encontra-se aumentada em mulheres com diabetes mellitus tipo 1


que não estão metabolicamente controladas no início da gravidez. Em contrapartida, aquelas que
se encontrem adequadamente controladas ou que apresentem diabetes mellitus subclínico não
apresentam maior risco de perda fetal ou de malformação.

6.4.2.3 Tireopatias

A incidência de abortamento mostra-se aumentada em pacientes com evidente tireopatia.


Alguns estudos têm demonstrado que pacientes com abortamento apresentam maior incidência de
anticorpos antitireoidianos, mesmo na ausência de doença tireoidiana. Por outro lado, outros
estudos não encontraram relação causal entre a taxa de abortamento e a presença desses anticorpos.
Em relação ao abortamento habitual, o papel dos anticorpos antitireoidianos é controverso.
Atualmente, a solicitação desses anticorpos na rotina diagnóstica para casos de abortamento
habitual não encontra embasamento científico.

6.4.2.4 Síndrome dos ovários policísticos:

A síndrome dos ovários policísticos afeta cerca de 10% das mulheres em idade reprodutiva e tem
sido considerada causa de abortamento, inclusive de abortamento habitual. Os possíveis
mecanismos responsáveis pelo abortamento em pacientes com síndrome dos ovários policísticos
são: maior resistência à insulina, com consequente hiperinsulinemia e elevação do hormônio
luteinizante, obesidade e hiperandrogenismo.
110
6.4.2.5 Infecções

Teoricamente, as infecções maternas (bacterianas ou virais) podem ocasionar abortamento por


lesões da decídua, da placenta, das membranas ovulares e do produto conceptual.
A relação entre abortamento tardio e infecção materna pelo Treponema pallidum é bem
estabelecida, entretanto, para microrganismos como Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae,
Streptococcus agalactiae, herpes-vírus, citomegalovírus e Listeria monocytogenes, embora sejam
implicados na gênese do abortamento espontâneo, não há uma relação causal bem estabelecida.

6.4.2.6 Causas uterinas

6.4.2.6.1 Sinéquias intrauterinas (Síndrome de Asherman)

As aderências intrauterinas, geralmente secundárias a curetagens pós-abortamento infectado,


podem interferir no processo de implantação ovular. Estima-se que entre 15 e 30% das pacientes com
aderências intrauterinas desenvolvem abortamento de repetição. Geralmente, essas mulheres apresentam
diminuição do fluxo menstrual ou amenorreia. O diagnóstico é realizado por histerossalpingografia ou
histeroscopia, e o tratamento consiste na lise das aderências sob visão histeroscópica. Para se evitar a
formação de novas aderências, preconiza-se a inserção de dispositivo intrauterino (DIU) ou de cateter de
Foley insuflado. A administração de estrógeno também é recomendada, com o objetivo de provocar
proliferação endometrial e proporcionar a reepitelização do endométrio.

6.4.2.6.2 Miomas

A associação entre mioma uterino e gravidez é relativamente comum e varia de 0,1 a 3,9%. Na
maioria das vezes, não existe uma relação causal entre abortamento e miomatose uterina. A localização
do mioma é mais importante que seu tamanho, sendo os miomas intramurais e principalmente os
submucosos que distorcem a cavidade uterina os mais relacionados aos casos de abortamento.
Em consequência do mioma, podem ocorrer deciduação deficiente na região de implantação do
ovo e rápido crescimento tumoral, resultado dos hormônios produzidos na gestação. Além de
prejudicar o desenvolvimento do produto conceptual, em consequência do rápido crescimento tumoral,
o mioma pode ter seu suprimento sanguíneo comprometido e sofrer necrose tumoral com liberação de
citocinas e, consequentemente, provocar contratilidade uterina e abortamento.

111
6.4.2.6.3 Incompetência cervical

A incompetência cervical é uma condição que se caracteriza por perda fetal recorrente no
segundo trimestre da gravidez, em consequência de insuficiência do sistema de oclusão do colo uterino.
Essa inabilidade do colo uterino em manter-se convenientemente ocluído pode ser consequente a um
defeito estrutural ou funcional. O diagnóstico clínico de incompetência cervical geralmente é
retrospectivo e depende fundamentalmente de uma cuidadosa anamnese obstétrica. Geralmente, ocorre
dilatação cervical indolor, ausência de sangramento, protrusão das membranas ovulares na vagina e
posterior rotura de membranas, seguida de expulsão fetal, na maioria das vezes com produto
conceptual ainda vivo. A incompetência cervical é responsável por 10 a 20% dos abortamentos de
repetição.
Entre os fatores etiológicos da incompetência cervical destacam-se as causas traumáticas, como
dilatação e curetagem; laceração cervical pós-parto traumático ou pós- abortamento; amputação ou
conização do colo uterino. Pode ser ainda de origem congênita, por alteração do colágeno, ou em
consequência à exposição intrauterina ao dietilestilbestrol.
O diagnóstico clínico de incompetência cervical é baseado fundamentalmente na história
obstétrica de perdas fetais recorrentes no segundo trimestre da gravidez (entre 12 e 20 semanas de
gravidez) ou partos prematuros extremos (entre 21 e 32 semanas de gestação). Fora da gestação, o
diagnóstico é realizado principalmente pela histerossalpingografia durante a fase lútea do ciclo
menstrual. A largura da região istmocervical superior a 8 mm é altamente sugestiva de incompetência
cervical. Ainda fora da gravidez, a falta de resistência à passagem pelo colo uterino de vela de Hegar

no 8, na segunda fase do ciclo menstrual, também denota a insuficiência do sistema oclusivo do canal
cervical.
O tratamento clássico da incompetência cervical é a realização da cerclagem do colo uterino. O
principal objetivo dessa cirurgia é prevenir o encurtamento e a abertura prematura do colo uterino por
meio de sutura circular no nível de seu orifício interno. A cerclagem cervical é realizada
preferencialmente pela via vaginal. As principais técnicas empregadas são a de Shirodkar e a de
McDonald. Previamente à cerclagem, preconiza-se a realização de ultrassonografia morfológica de
primeiro trimestre, com a finalidade de afastar possíveis malformações do produto conceptual, avaliar
a medida da translucência nucal e assegurar sua vitalidade. É importante que se faça, previamente à
cirurgia, o tratamento de infecções cervicovaginais, e recomenda-se ainda a abstinência sexual.
A cerclagem é denominada profilática se realizada antes da ocorrência da cervicodilatação,
sendo o período ideal entre 12 e 16 semanas de idade gestacional. Denomina-se cerclagem de
emergência aquela realizada no segundo trimestre da gestação, com a paciente apresentando
modificações do colo uterino como dilatação acima de 3 cm, esvaecimento cervical pronunciado e
112
membranas ovulares protrusas através do canal cervical. O limite para realização de cerclagem de
emergência geralmente não deve ultrapassar 26 semanas de gravidez; contudo, o consenso clínico para
realização de cerclagem emergencial recomenda a análise individualizada de caso.
A cerclagem também pode ser efetuada pela via abdominal em casos de impossibilidade técnica
de realização de cerclagem pela via vaginal, consequente a defeitos anatômicos do colo uterino ou,
ainda, após falha de cerclagem pela via vaginal, em gestação prévia. Os avanços da cirurgia
minimamente invasiva têm permitido a realização da cerclagem abdominal também por via
laparoscópica.
Os fios da cerclagem devem ser removidos após 36 semanas de gravidez ou em qualquer
momento da gestação, na presença de trabalho de parto prematuro não inibível, rotura prematura das
membranas ovulares (RPMO), corioamnionite e óbito fetal. As complicações mais frequentes da
cerclagem são afrouxamento da sutura, ocorrência de RPMO, corioamnionite, trabalho de parto
prematuro e maior incidência de operação cesariana.

6.4.2.6.4 Malformações uterinas

Defeitos da fusão dos ductos de Müller: As malformações uterinas, como útero unicorno, didelfo,
septado, bicorno e arqueado são consequentes às anomalias de fusão dos ductos de Müller, também
denominados paramesonéfricos. O útero, as tubas uterinas, a cérvix e parte da vagina originam-se da fusão
desses ductos. A mais comum anomalia mülleriana de causa iatrogênica deve-se à exposição intrauterina
ao dietilestilbestrol. Os defeitos da fusão dos ductos de Müller são aventados como causa de abortamento
habitual (tardio), restrição do crescimento fetal, prematuridade, apresentações anômalas e hemorragia pós-
parto. A falta de estudos prospectivos e bem controlados, no entanto, não permite estabelecer uma forte
relação causal entre essas anomalias e os efeitos adversos na gravidez. A indicação de cirurgia para correção
de malformações uterinas em pacientes com abortamento de repetição é tema controverso e não há
evidências do benefício da reconstrução cirúrgica na prevenção de novos abortamentos.

6.4.2.7 Fatores imunológicos

As causas imunológicas relacionam-se com abortamentos de repetição. Elas podem ser divididas
em autoimunes e aloimunes.

6.4.2.7.1 Causas autoimunes

Os anticorpos antifosfolipídicos, em especial o anticoagulante lúpico e a anticardiolipina, estão


113
implicados em várias complicações obstétricas, como abortamento habitual, restrição do crescimento
fetal (RCF), prematuridade, doença hipertensiva específica da gestação (DHEG), descolamento
prematuro de placenta (DPP) e óbito fetal. Os anticorpos antifosfolipídicos são famílias heterogêneas de
imunoglobulinas G (IgG) e M (IgM) e, menos frequentemente, imunoglobulina A (IgA), que reagem
contra fosfolípides de membrana carregados negativamente ou contra as proteínas ligadas a fosfolípides
envolvidos com a coagulação. Os anticorpos antifosfolipídicos são responsáveis por fenômenos
trombóticos, tanto arteriais como venosos, e encontram-se presentes entre 15 e 20% das mulheres com
abortamento habitual. O mecanismo exato pelo qual esses anticorpos causam abortamento ainda não
está completamente esclarecido.
Trombose e infartos placentários, com consequente hipoxia fetoplacentária, têm sido descritos
em pacientes com perdas fetais no segundo trimestre da gestação e presença de anticorpos
antifosfolipídicos. Mais recentemente, esses anticorpos também têm sido relacionados a perdas
gestacionais nas primeiras semanas de gravidez, por seus efeitos deletérios no trofoblasto humano e,
dessa forma, causando prejuízos na implantação ovular e no desenvolvimento embrionário.
O diagnóstico laboratorial baseia-se na detecção desses anticorpos por meio de imunoensaios e
testes funcionais de coagulação.
Em razão dos fenômenos tromboembólicos envolvidos, a administração de heparina não
fracionada (5.000 a 10.000 UI a cada 12 horas por via subcutânea) ou heparina de baixo peso molecular
(enoxaparina, 40 mg/dia ou, ainda, 1 mg/kg/dia; dalteparina 5.000 UI/dia ou, ainda, 100 UI/kg/dia)
associada a baixas doses de ácido acetilsalicílico (AAS – 100 mg/dia por via oral) representa o
tratamento-padrão para pacientes com abortamento de repetição e positividade para anticorpos
antifosfolípides. Apesar dos bons resultados obtidos por vários estudos com a associação de heparina e
baixas doses de AAS, são frequentes complicações como restrição do crescimento fetal, hipertensão
arterial e parto prematuro.

6.4.2.7.2 Causas aloimunes

O termo aloimune diz respeito a diferenças genéticas entre indivíduos da mesma espécie. A
teoria aloimune para abortamentos de repetição baseia-se em resposta materna anormal para antígenos
paternos, ou do trofoblasto. Partindo-se do princípio de que a desigualdade antigênica entre mãe e feto é
fundamental para o progredir da gestação, na presença de histocompatibilidade materno-fetal exagerada
pode ocorrer uma resposta imunológica alterada e paradoxal (agressora), ocasionando rejeição materna
aos tecidos fetais, semelhante ao observado em transplantes. Esse descontrole do mecanismo imune
normal provavelmente ocorre na interface materno-fetal, podendo envolver aumento de atividade de
células natural killer uterinas, que regulam o crescimento da placenta e do trofoblasto, a
114
imunomodulação local e o controle da invasão trofoblástica. O diagnóstico do fator aloimune se baseia
no tipo do antígeno leucocitário humano (HLA) do casal, na detecção in vitro do fator bloqueador da
mulher (cultura mista de linfócitos) e na atividade das células natural killer.
A utilização de imunoterapia para tratar casais com abortamento de repetição de causa aloimune
tem como objetivo suprimir a atividade das células natural killer. A imunoterapia pode ser passiva
(imunoglobulina intravenosa) ou ativa (injeção intradérmica de linfócitos paternos). A maioria dos
estudos prospectivos e bem controlados tem falhado em demonstrar os benefícios da imunoterapia em
mulheres com abortamento de repetição.

6.4.2.8 Trombofilias hereditárias

Trombofilia é um termo utilizado para descrever alterações que predispõem à ocorrência de


trombose. Consistem em trombofilias hereditárias as deficiências da antitrombina e das proteínas C e S e
as mutações do gene da protrombina, do fator V de Leiden e dos genes da enzima
metilenotetraidrofolato redutase.
Existem também muitas dúvidas a respeito do tratamento das pacientes com abortamento de
repetição e positividade para trombofilias hereditárias. Três estudos não controlados evidenciam bons
resultados com o emprego de heparina de baixo peso molecular em mulheres com abortamento de
repetição e positividade para trombofilia hereditária.

6.4.2.9 Drogas e agentes nocivos

6.4.2.9.1 Tabagismo

A associação entre tabagismo e abortamento tem sido admitida por muitos estudos; contudo, a
maioria não depura adequadamente algumas variáveis de confusão. Mulheres que fumam mais que 10
cigarros/dia apresentam maior risco de abortamento. Vasoconstrição e danos placentários podem estar
implicados na gênese do abortamento em fumantes.

6.4.2.9.2 Álcool

Estudos observacionais têm relatado, ainda que de forma inconsistente, que o consumo
moderado ou excessivo de álcool na gestação se relaciona com maior risco de abortamento. Apesar da
difícil interpretação desses estudos, uma vez que existem variáveis de confusão, as gestantes deveriam
115
evitar o consumo habitual de álcool por seu efeito teratogênico e pelo pouco conhecimento a respeito do
nível de segurança da ingestão de álcool na gestação.

6.4.2.9.3 Cafeína

Alguns estudos relatam que mulheres que consomem pelo menos 500 mg/dia de cafeína
apresentam maior risco de abortamento. Por outro lado, em revisão de 15 artigos a respeito da relação
entre cafeína e abortamento os autores concluíram, com base nos dados atuais e em função de erros
metodológicos apresentados na maioria das pesquisas analisadas, que não se pode estabelecer uma
relação causal entre a cafeína e a ocorrência de abortamentos.

6.4.2.10 Trauma

Frequentemente, atribui-se a ocorrência de abortamento a algum tipo de trauma, como queda ou


trauma abdominal direto. No início da gestação, no entanto, o produto conceptual se encontra bem
protegido dos traumas abdominais. Parece, assim, não haver evidências para se atribuir o abortamento a
traumas de menor gravidade. No trauma grave, o produto conceptual pode sofrer trauma direto ou, ainda,
sofrer consequências danosas em função do estado hemodinâmico materno.

6.5 Formas clínicas de abortamento

6.5.1 Ameaça de abortamento

A ameaça de abortamento é complicação frequente e ocorre em 15 a 20% das gestações


clinicamente diagnosticadas. O quadro clínico caracteriza-se por sangramento vaginal em pequena
quantidade, acompanhado ou não de dor em cólica na região hipogástrica. No exame ginecológico, o
colo uterino encontra-se fechado e o tamanho do útero é compatível com o atraso menstrual. O exame
ultrassonográfico evidencia atividade cardíaca do produto conceptual ou, se a idade gestacional for
inferior a 6 semanas, a presença de saco gestacional regular denota boa evolução da gestação. A
presença de hematoma subcoriônico é observado, à ultrassonografia, entre 4 e 40% dos casos de
ameaça de abortamento.
Aproximadamente 40 a 50% das mulheres que apresentam sangramento vaginal no início da
gestação irão abortar. A taxa de abortamento cai consideravelmente, para 4 a 10%, se a ameaça de
abortamento ocorrer após a visualização de atividade cardíaca do produto conceptual à
ultrassonografia.
116
Ainda que muito utilizada na prática clínica, não há evidências de que a recomendação de
repouso no leito e a prescrição de progesterona melhorem o prognóstico das gestações com ameaça de
abortamento.
A utilização de imunoglobulina anti-D, na prevenção de aloimunização Rh, para mulheres com
fator Rh negativo e não sensibilizadas, e que apresentam abortamento, deve fazer parte da prática
clínica. Contudo, o emprego dessa profilaxia em mulheres com ameaça de abortamento é controverso.

6.5.2 Abortamento em curso

O abortamento em curso é caracterizado clinicamente por sangramento moderado ou intenso,


acompanhado de dor abdominal em cólica, geralmente de forte intensidade. No exame físico,
dependendo da intensidade da hemorragia, pode-se evidenciar anemia, taquicardia e hipotensão
arterial. No exame especular, observa-se sangramento ativo proveniente do canal cervical, geralmente
com presença de restos dos produtos da concepção. O orifício interno do colo uterino encontra-se
dilatado no exame de toque vaginal. A ultrassonografia pode evidenciar o descolamento ovular com
saco gestacional em posição baixa e dilatação cervical.

6.5.3 Abortamento completo

Quando o abortamento ocorre no primeiro trimestre da gravidez, principalmente nas 10


semanas iniciais, é comum a expulsão completa dos produtos da concepção. Rapidamente, o útero se
contrai e o sangramento, juntamente às cólicas, diminui de intensidade. O orifício interno do colo
uterino tende a fechar-se em poucas horas. Ao exame ultrassonográfico, pode não haver evidência de
conteúdo uterino; algumas vezes, porém, observa-se mínima quantidade de conteúdo heterogêneo e
líquido. Apesar da falta de consenso, a medida da espessura endometrial inferior a 15 mm ao corte
longitudinal mediano do útero à ultrassonografia transvaginal tem sido considerada indicativa de
abortamento completo por vários autores.

6.5.4 Abortamento incompleto

O abortamento incompleto é mais frequente após 10 semanas de gravidez. Nesses casos, ocorre
a eliminação parcial dos produtos da concepção. O sangramento vaginal persiste e, por vezes, torna-se
intermitente. O volume uterino é menor que o esperado para a idade gestacional e, no exame de toque,
o orifício interno do colo uterino geralmente se encontra pérvio; contudo, algumas vezes pode se
apresentar fechado, sendo o diagnóstico realizado pelos achados ultrassonográficos. À
117
ultrassonografia, observa-se a presença de conteúdo intrauterino de aspecto amorfo e heterogêneo, com
presença ou não de líquido. A medida da espessura endometrial ao corte longitudinal mediano do útero à
ultrassonografia acima de 15 mm tem sido considerada indicativa de abortamento incompleto.
Classicamente, o tratamento de escolha é o esvaziamento cirúrgico do conteúdo uterino, por curetagem
ou aspiração manual intrauterina.

6.5.5 Aborto retido

Denomina-se aborto retido (em inglês, missed abortion) a ocorrência de morte embrionária ou
fetal antes de 20 semanas de gravidez, associada à retenção do produto conceptual por período
prolongado de tempo, por vezes dias ou semanas. Geralmente, as pacientes relatam cessação dos
sintomas associados à gravidez (náuseas, vômitos, ingurgitamento mamário). Pode ocorrer
sangramento vaginal, na maioria das vezes em pequena quantidade, de forma semelhante ao observado
nos casos de ameaça de abortamento. O volume uterino é menor que o esperado para a idade
gestacional e o colo uterino encontra-se fechado ao exame de toque. À luz da moderna obstetrícia, a
ultrassonografia tem contribuído de forma importante no diagnóstico de morte do produto conceptual
nos casos em que ela não se manifestou clinicamente. Por meio de ultrassonografia transvaginal,
denominase morte do produto conceptual a ausência de atividade cardíaca em embriões com
comprimento cabeça-nádegas superior a 5 mm.
Atualmente, os casos de aborto retido podem ser conduzidos de maneira expectante ou tratados
de forma medicamentosa ou cirúrgica. A ocorrência de coagulopatia de consumo é um evento raro,
sendo mais observada após óbito fetal (morte do produto conceptual após 20 semanas de gravidez).
Em alguns casos, ocorre a reabsorção do embrião antes da confirmação ultrassonográfica ou o
desenvolvimento deste não chega a ocorrer. Essa situação recebe o nome de gestação anembrionada.
Os principais critérios, por meio de ultrassonografia transvaginal, são ausência de vesícula vitelínica
com diâmetro interno médio do saco gestacional superior a 8 mm, não visualização de embrião, com
diâmetro interno médio do saco gestacional acima de 16 mm, ou, ainda, a medida isolada do maior
diâmetro do saco gestacional acima de 20 mm com ausência de visualização de embrião.
Muitas vezes, para confirmação diagnóstica, tanto nos casos de aborto retido quanto naqueles
de gestação anembrionada, torna-se necessária a repetição do exame ultrassonográfico no prazo de
uma semana.

6.5.6 Abortamento habitual

O abortamento habitual, também denominado recorrente, classicamente é definido como a


118
ocorrência consecutiva de três ou mais abortamentos espontâneos e incide em cerca de 1 a 2% das
mulheres.
As causas do abortamento habitual são várias e podem ser divididas em genéticas, anatômicas,
endócrinas, infecciosas e imunológicas.
Cerca de 75% dos casais com abortamento habitual apresentam pelo menos um fator etiológico.
O ACOG sugere, com base em evidências científicas disponíveis até o momento, que somente as
pesquisas de alteração cromossômica no casal e a presença de anticorpos antifosfolipídicos
(anticardiolipina e anticoagulante lúpico) apresentam forte evidência de relação com abortamento
habitual.

6.5.7 Abortamento infectado

O abortamento infectado, principalmente em países em que a lei proíbe a interrupção da


gestação, muitas vezes encontra-se intimamente ligado à ilegalidade, sendo sua prática realizada em
condições inadequadas.
As bactérias envolvidas no abortamento infectado são aeróbias e anaeróbias, e merecem
destaque: estreptococos beta-hemolíticos, Enterococcus spp., Escherichia coli, Peptostreptococcus
spp., Bacteroides fragilis e Clostridium spp. A infecção que se inicia no útero (endomiometrite) pode
se propagar para os anexos (anexite), p eritônio pélvico (pelviperitonite), cavidade peritoneal
(peritonite generalizada) e, ainda, disseminar-se por via hematogênica (sepse).
O quadro clínico depende do grau de comprometimento da paciente. Nos casos de
endomiometrite, geralmente se observam hipertermia, sangramento vaginal discreto (que pode ser
acompanhado de saída de material purulento oriundo do canal cervical), dores abdominais em cólica e
útero doloroso à palpação. No toque vaginal, o colo uterino apresenta-se geralmente pérvio e doloroso à
mobilização. No exame especular, observa- se saída de material purulento proveniente do canal cervical
e podem estar presentes lacerações cervicais denunciadoras de abortamento provocado de forma
clandestina. Nos casos mais graves, a paciente pode apresentar peritonite generalizada, sepse,
insuficiência renal e coagulopatia.
O tratamento é clínico e cirúrgico e consiste, principalmente, em tratar a hipovolemia, combater
a infecção e reparar cirurgicamente as lesões e lacerações decorrentes do método utilizado para o
abortamento.
Na presença de sangramento vaginal moderado ou intenso decorrente de hipotonia ou atonia
uterina, devese realizar cateterização de veia calibrosa e infusão de Ringer lactato ou solução salina a
0,9%. Administra-se ocitocina em altas doses (50 U) em 500 mL de solução salina (125 mL/h). Se
necessário, administra-se também metilergonovina na dose de 0,2 mg por via intramuscular.
119
A antibioticoterapia deve ser abrangente, uma vez que na maioria das vezes a infecção é polimicrobiana,
com bactérias aeróbias e anaeróbias provenientes das floras intestinal e genital. As combinações mais
comumente utilizadas são ampicilina ou penicilina associada à gentamicina e ao metronidazol, ou
clindamicina em associação com gentamicina. Em pacientes com comprometimento da função renal,
pode-se substituir a gentamicina por uma cefalosporina de terceira geração (ceftriaxona) ou por
aztreonam.
Em casos de endometrite não complicada, principalmente na ausência de manipulação
intrauterina, a antibioticoterapia parenteral deve ser administrada até a paciente encontrar-se afebril e
assintomática por pelo menos 48 horas. Após esse período, não há necessidade de manutenção de
antibióticos, sequer por via oral, tampouco de internação, podendo a paciente ser liberada para controle
ambulatorial. Por outro lado, em casos de sepse o tempo de tratamento será de pelo menos 14 dias.
O tratamento cirúrgico está indicado nas seguintes condições:
♦ A demonstração de restos ovulares pela ultrassonografia impõe a necessidade de
esvaziamento uterino por meio de curetagem ou aspiração manual intrauterina. n
♦ Nos casos de laceração cervical, pratica-se a sutura do colo uterino e faz-se revisão dos
fórnices e das paredes vaginais.
♦ Diante da evidência de perfuração uterina, impõe-se a laparotomia exploradora para
completo inventário do útero e das vísceras abdominais e correção cirúrgica das lesões encontradas. A
presença de perfuração uterina com infecção, em regra, é indicação de histerectomia.
♦ A histerectomia será indicada nas formas disseminadas ou nas localizadas refratárias ao
tratamento clínico. Deve ser realizada, sempre que as condições técnicas permitirem, de forma total e, se
necessário, radical, com retirada dos anexos e paramétrios caso estejam comprometidos.

120
6.6 Tratamento

6.6.1 Conduta expectante

A alteração do perfil dos abortamentos, sobretudo em países desenvolvidos, fez com que crescesse
o interesse por métodos não cirúrgicos de tratamento. A conduta expectante tem sido utilizada em casos
selecionados de perda gestacional precoce, com taxas variadas de sucesso, dependendo principalmente do
tipo de abortamento e dos sintomas das pacientes.
Em casos de abortamento incompleto, esse tipo de conduta tem sido empregado há alguns anos e
mostra resultados estimulantes.
Por outro lado, em casos de aborto retido ou gestação anembrionada, os resultados obtidos com a
conduta expectante parecem ser menos animadores que os observados no abortamento incompleto.
A conduta expectante tem sido bem tolerada pelas mulheres, desde que devidamente esclarecidas
sobre os riscos e benefícios desse tipo de tratamento. Geralmente, a eliminação do produto conceptual
ocorre nas primeiras semanas de acompanhamento. Estudos observacionais apresentam taxa de sucesso
entre 25 e 90%, dependendo do tipo de abortamento, do critério de falha e do tempo de seguimento.

6.6.2 Tratamento medicamentoso


121
O tratamento medicamentoso do abortamento, especialmente o de primeiro trimestre,
representa uma nova alternativa para aquelas mulheres que não querem ser submetidas ao tratamento
cirúrgico. O misoprostol, um análogo sintético de prostaglandina E1, foi originalmente comercializado
para tratamento e prevenção de úlcera péptica em pacientes que fazem uso crônico de anti-
inflamatórios não hormonais. Entretanto, por seus efeitos na contratilidade uterina e no esvaecimento
cervical, esse medicamento tem sido utilizado na prática obstétrica em várias situações, como no
esvaecimento cervical pré-curetagem, no tratamento medicamentoso do abortamento e do óbito fetal, na
indução do trabalho de parto e na hemorragia pós-parto. Em consequência de sua efetividade, da
excelente relação custo-benefício, da facilidade de armazenamento e dos seus poucos efeitos colaterais,
o misoprostol tem sido empregado com sucesso no tratamento do abortamento precoce.
Após a absorção, o misoprostol é transformado em seu metabólito farmacologicamente ativo, o
misoprostol ácido. Ocorre metabolização hepática e menos de 1% de sua forma ativa é excretada pelos
rins. As concentrações plasmáticas de misoprostol ácido aumentam rapidamente após administração
oral, atingindo o pico máximo 30 minutos após a ingestão e depois declinando rapidamente. O pico
máximo plasmático, quando aplicado na vagina, é inferior ao da administração oral; porém, a
concentração plasmática do misoprostol é sustentada por período superior a 4 horas.
Os principais efeitos adversos do misoprostol, que costumam ser dose- dependentes, são
náuseas, vômitos, diarreia, hipertermia e tremor. A dose tóxica de misoprostol ainda não foi
determinada; contudo, doses cumulativas de até 2.200 µg administradas por período de 12 horas têm
sido bem toleradas, sem efeitos adversos importantes.
Para o tratamento da perda gestacional precoce, a maioria dos estudos preconiza a
administração de 800 µg de misoprostol por via vaginal a cada 24 horas, por até 2 dias, com taxa de
sucesso (abortamento completo) superior a 80% nos casos de aborto retido e gestação anembrionada.

O uso do misoprostol no tratamento do abortamento de primeiro trimestre tem se mostrado


efetivo e seguro. Existem dúvidas, no entanto, principalmente a respeito da segurança do emprego
dessa medicação no segundo trimestre da gravidez, sobretudo nas pacientes com cicatriz uterina prévia,
uma vez que existem relatos de rotura uterina nessas situações. Alguns estudos evidenciaram resultados
animadores com o emprego desse fármaco no segundo trimestre da gravidez, mesmo em pacientes
com antecedente de operação cesariana.

6.6.3 Tratamento cirúrgico

O tratamento clássico para abortamentos, tanto de primeiro quanto de segundo trimestres, é a

122
curetagem uterina, com eficácia próxima a 100%. A complicação mais frequente é a infecção,
atingindo até 10% dos casos, seguida de esvaziamento uterino incompleto (2 a 3%). Complicações
com menos de 1% incluem laceração cervical, perfuração uterina, lesão de órgãos pélvicos e
hemorragia. A conduta cirúrgica está indicada nas situações de urgência, como nos casos de
sangramento moderado ou intenso, na presença de infecção e ainda para aquelas mulheres que não
desejam esperar a eliminação espontânea ou medicamentosa dos produtos da concepção.
Nas últimas décadas, como tratamento alternativo à curetagem uterina e à aspiração elétrica a
vácuo, tem-se preconizado a aspiração manual intrauterina em casos de abortamento de primeiro
trimestre. A aspiração representa um sistema de tecnologia simples, com material de baixo custo, que
pode ser reutilizado após esterilização. O instrumental é composto por uma seringa de 60 mL de
válvula simples ou dupla, que é acoplada à cânula de plástico flexível de espessura variável (3 a 12
mm).

REFERÊNCIAS
Zugaib- Obstetrícia
123
7. ASSISTÊNCIA AO PARTO NORMAL

Contexto
Se por um lado, o avanço da obstetrícia contribuiu com a melhoria dos indicadores de
morbidade e mortalidade materna e perinatais, por outro permitiu a concretização de um modelo que
considera a gravidez, o parto e o nascimento como doenças e não como expressões de saúde, expondo as
mulheres e recém-nascidos a altas taxas de intervenções, que deveriam ser utilizadas de forma
parcimoniosa e apenas em situações de necessidade, e não como rotineiras. Esse excesso de
intervenções deixou de considerar os aspectos emocionais, humanos e culturais envolvidos no processo,
esquecendo que a assistência ao nascimento se reveste de um caráter particular que vai além do processo
de parir e nascer. Quando as mulheres procuram ajuda, além da preocupação sobre a sua saúde e a do
seu bebê, estão também em busca de uma compreensão mais ampla e abrangente da sua situação, pois
para elas e suas famílias o momento da gravidez e do parto, em particular, é único na vida e carregado
de fortes emoções. A experiência vivida por elas neste momento pode deixar marcas indeléveis,
positivas ou negativas, para o resto das suas vidas.

Nas mulheres em trabalho de parto a termo, espontâneo ou induzido, com


complicações da gestação, tais como desordens hipertensivas, diabetes, gravidez
múltipla, restrição de crescimento fetal, etc., estas Diretrizes também podem
servir de referência já que algumas práticas e intervenções podem ser
semelhantes. Para efeito destas Diretrizes entende-se como parto normal ou
espontâneo aquele que não foi assistido por fórceps, vácuo extrator ou cesariana,
podendo ocorrer intervenções baseadas em evidências, em circunstâncias
apropriadas, para facilitar o progresso do parto e um parto vaginal normal, tais
como:

 estimulação do trabalho de parto com ocitocina; ruptura


artificial de membranas;
 alívio farmacológico da dor (peridural, opióides, óxido nitroso);
 alívio não farmacológico da dor; ou
 manobra ativa no terceiro período.

A prática obstétrica tem sofrido mudanças significativas nos últimos 20-30 anos, com uma
maior ênfase na promoção e resgate das características naturais e fisiológicas do parto e nascimento.
Com isso, vários procedimentos hospitalares têm sido questionados pela carência de evidências
científicas que os suportem, a existência de evidências que os contra-indiquem e por trazerem
desconforto à mulher. Também os ambientes onde o nascimento tem lugar têm sofrido modificações,

124
tornando-se mais aconchegantes e com rotinas mais flexíveis, permitindo que a mulher e sua família
possam participar e expressar livremente suas expectativas e preferências. Surgem também, como
opção, modalidades de assistência em ambientes não hospitalares, como o parto domiciliar e em
centros de nascimento dentro ou fora dos hospitais. Questiona-se também o predomínio do
profissional médico na assistência, com o fortalecimento das enfermeiras obstétricas e obstetrizes
como atores importantes no processo assistencial.

Objetivos
Como profissionais da área médica, baseados na Diretriz Nacional de Assistência ao Parto,
nossos objetivos são:

 Promover mudanças na prática clínica, uniformizar e padronizar as práticas mais


comuns utilizadas na assistência ao parto normal;
 Diminuir a variabilidade de condutas entre os profissionais no processo de assistência
ao parto;
 Reduzir intervenções desnecessárias no processo de assistência ao parto normal e
consequentemente os seus agravos;
 Difundir práticas baseadas em evidências na assistência ao parto normal; e
 Recomendar determinadas práticas sem, no entanto, substituir o julgamento individual
do profissional, da parturiente e dos pais em relação à criança, no processo de decisão
no momento de cuidados individuais.

Sumário de Recomendações
A seguir são apresentadas as recomendações de acordo com as seções das Diretrizes
Nacionais de Assistência ao Parto Normal.

1. Local de assistência ao parto

Informar às gestantes de baixo risco de complicações que o parto normal é


geralmente muito seguro tanto para a mulher quanto para a criança.
Informar às gestantes de baixo risco sobre os riscos e benefícios dos locais de parto
(domicílio, Centro de Parto Normal extra, peri ou intra hospitalar, maternidade).

Multíparas de baixo risco

Nulíparas de baixo risco

125
As mulheres nulíparas ou multíparas que optarem pelo planejamento do parto em
Centro de Parto Normal (extra, peri ou intra-hospitalar), se disponível na sua área de
abrangência ou próximos dessa, e cientes dos riscos e benefícios desses locais, devem
ser apoiadas em sua decisão.
Informar a todas as gestantes que a assistência ao parto no domicílio não faz parte das
políticas atuais de saúde no país.
Informar às nulíparas de baixo risco de complicações que o planejamento do parto no
domicílio não é recomendado tendo em vista o maior risco de complicações para a
criança. Informar também que as evidências são oriundas de outros países e não
necessariamente aplicáveis ao Brasil.
Informar às multíparas de baixo risco sobre complicações que, tendo em vista o
contexto brasileiro, o parto domiciliar não está disponível no sistema de saúde, por
isso não há como recomendar. No entanto, não se deve desencorajar o planejamento
do parto no domicílio.
As mulheres devem receber as seguintes informações sobre o local de parto:
- Acesso à equipe médica (obstetrícia, anestesiologia, pediatria);
- Acesso ao cuidado no trabalho de parto e parto por enfermeiras obstétricas ou
obstetrizes;
- Acesso a métodos de alívio da dor, incluindo os não farmacológicos
(banheira, chuveiro, massagens, etc.), analgesia regional e outras substâncias
analgésicas;
- A probabilidade de ser transferida para uma maternidade (se esse não for o
local escolhido), as razões porque isso pode acontecer e o tempo necessário
para tal;
- Assegurar que todas as mulheres que optarem pelo planejamento do parto fora
do hospital tenham acesso em tempo hábil e oportuno a uma maternidade, se
houver necessidade de transferência;
- Discutir os riscos e os cuidados adicionais que podem ser oferecidos em uma
maternidade para que as mulheres possam fazer uma escolha informada sobre
o local planejado para o parto.

2. Cuidados gerais durante o trabalho de parto


a. Informações e comunicação
Mulheres em trabalho de parto devem ser tratadas com respeito, ter acesso
às informações baseadas em evidências e serem incluídas na tomada de
decisões. Para isso, os profissionais que as atendem deverão estabelecer
uma relação de confiança com as mesmas, perguntando-lhes sobre seus
desejos e expectativas. Devem estar conscientes da importância de sua
126
atitude, do tom de voz e das próprias palavras usadas, bem como a forma
como os cuidados são prestados.
Para estabelecer comunicação com a mulher, os profissionais devem:

- Cumprimentar a mulher com um sorriso e uma boa acolhida, se apresentar


e explicar qual o seu papel nos cuidados e indagar sobre as suas
necessidades, incluindo como gostaria de ser chamada;
- Manter uma abordagem calma e confiante, demonstrando a ela que tudo
está indo bem;
- Bater na porta do quarto ou enfermaria e esperar antes de entrar,
respeitando aquele local como espaço pessoal da mulher e orientar outras
pessoas a fazerem o mesmo;
- Perguntar à mulher como ela está se sentindo e se alguma coisa em
particular a preocupa;
- Se a mulher tem um plano de parto escrito, ler e discutir com ela, levando-
se em consideração as condições para a sua implementação tais como a
organização do local de assistência, limitações (físicas, recursos) relativas
à unidade e a disponibiidade de certos métodos e técnicas;
- Verificar se a mulher tem dificuldades para se comunicar da forma
proposta, se possui deficiêcia auditivia, visual ou intelectual; perguntar
qual língua brasileira (português ou libras) prefere utilizar ou, ainda, para
o caso de mulheres estrangeiras ou indígenas verificar se compreendem
português;
- Avaliar o que a mulher sabe sobre estratégias de alívio da dor e oferecer
informações balanceadas para encontrar quais abordagens são mais
aceitáveis para ela;
- Encorajar a mulher a adaptar o ambiente às suas necessidades;
- Solicitar permissão à mulher antes de qualquer procedimento e
observações, focando nela e não na tecnologia ou documentação;
- Mostrar à mulher e aos seus acompanhantes como ajudar e assegurar-lhe
que ela o pode fazer em qualquer momento e quantas vezes quiser.
Quando sair do quarto, avisar quando vai retornar;
- Envolver a mulher na transferência de cuidados para outro profissional,
tanto quando solicitar opinião adicional ou no final de um plantão.

b. Apoio físico e emocional


Todas as parturientes devem ter apoio contínuo e individualizado durante
o trabalho de parto e parto, de preferência por pessoal que não seja
membro da equipe hospitalar.
Uma mulher em trabalho de parto não deve ser deixada sozinha, exceto
por curtos períodos de tempo ou por sua solicitação.
As mulheres devem ter acompanhantes de sua escolha durante o trabalho
de parto e parto, não invalidando o apoio dado por pessoal de fora da rede
social da mulher.

c. Dieta durante o trabalho de parto


Mulheres em trabalho de parto podem ingerir líquidos, de preferência
soluções isotônicas ao invés de somente água.
Mulheres em trabalho de parto que não estiverem sob efeito de opióides
ou não apresentarem fatores de risco iminente para anestesia geral podem
ingerir uma dieta leve.
127
Os antagonistas H2 e antiácidos não devem ser utilizados de rotina para
mulheres de baixo risco para anestesia geral durante o trabalho de parto.
As mulheres que receberem opióides ou apresentarem fatores de risco que
aumentem a chance de uma anestesia geral devem receber antagonistas
H2 ou antiácidos.

d. Medidas de assepsia para o trabalho de parto vaginal


A água potável pode ser usada para a limpeza vulvar e perineal se houver
necessidade, antes do exame vaginal.
Medidas de higiene, incluindo higiene padrão das mãos e uso de luvas
únicas não necessariamente estéreis, são apropriadas para reduzir a
contaminação cruzada entre as mulheres, crianças e profissionais.

e. Avaliação do bem-estar fetal


A avaliação do bem-estar fetal em parturientes de baixo risco deve ser
realizada com ausculta intermitente, em todos os locais de parto:

Utilizar estetoscópio de Pinard ou sonar Doppler:

- Realizar a ausculta antes, durante e imediatamente após uma


contração, por pelo menos 1 minuto e a cada 30 minutos,
registrando como uma taxa única;
- Registrar acelerações e desacelerações se ouvidas;
- Palpar o pulso materno se alguma anormalidade for suspeitada
para diferenciar os batimentos fetais e da mãe.

3. Alívio da dor no trabalho de parto


a. Experiência e satisfação das mulheres em relação à dor no trabalho de parto

Os profissionais de saúde devem refletir sobre como suas próprias


crenças e valores influenciam a sua atitude em lidar com a dor do parto
e garantir que os seus cuidados apoiem a escolha da mulher.

b. Estratégias e métodos não farmacológicos de alívio da dor no trabalho de parto

- Sempre que possível deve ser oferecido à mulher a imersão em água para alívio da dor
no trabalho de parto.
- Se uma mulher escolher técnicas de massagem durante o trabalho de parto que tenham
sido ensinadas aos seus acompanhantes, ela deve ser apoiada em sua escolha, bem
como técnicas de relaxamento.
- A injeção de água estéril não deve ser usada para alívio da dor no parto.
- A estimulação elétrica transcutânea não deve ser utilizada em mulheres em trabalho de
parto estabelecido.
- A acupuntura pode ser oferecida às mulheres que desejarem usar essa técnica durante o
trabalho de parto, se houver profissional habilitado e disponível para tal.
- Apoiar que sejam tocadas as músicas de escolha da mulher durante o trabalho de parto.
- A hipnose pode ser oferecida às mulheres que desejarem usar essa técnica durante o
trabalho de parto, se houver profissional habilitado para tal.
- Por se tratar de intervenções não invasivas e sem descrição de efeitos colaterais, não se
deve coibir as mulheres que desejarem usar audio-analgesia e aromaterapia durante o

128
trabalho de parto.
- Os métodos não farmacológicos de alívio da dor devem ser oferecidos à mulher antes
da utilização de métodos farmacológicos.
c. Analgesia inalatória
O óxido nitroso a 50% em veículo específico pode ser oferecido para alívio da
dor no trabalho de parto, quando possível e disponível, mas informar às
mulheres que elas podem apresentar náusea, tonteiras, vômitos e alteração da
memória.

d. Analgesia intramuscular e endovenosa


Os opióides não devem ser utilizados de rotina, pois estes oferecem alívio
limitado da dor e apresentam efeitos colaterais significativos para a mulher
(náusea, sonolência e tonteira) e para a criança (depressão respiratória ao
nascer e sonolência que pode durar vários dias) assim como interferência
negativa no aleitamento materno. Diante da administração de opióides (EV ou
IM) utilizar concomitantemente um anti-emético.
Analgesia com opióides é acompanhada de aumento na complexidade da
assistência ao parto, como por exemplo: maior necessidade de monitorização e
acesso venoso.
Uma vez que a segurança da realização de analgesia farmacológica no
ambiente extra-hospitalar ainda não foi estabelecida, esta é restrita ao
complexo hospitalar.

e. Analgesia regional
A analgesia regional deve ser previamente discutida com a gestante antes do
parto, e seus riscos e benefícios devem ser informados.
As seguintes informações devem ser oferecidas à mulher:

- A analgesia regional só está disponível no ambiente hospitalar;


- É mais eficaz para alívio da dor que os opióides;
- Não está associada com aumento na incidência de dor lombar;
- Não está associada com primeiro período do parto mais longo ou aumento
na chance de cesariana;
- Está associada com aumento na duração do segundo período do parto e na
chance de parto vaginal instrumental;
- Necessita de nível mais elevado de monitoração e a mobilidade pode ser
reduzida.

A solicitação materna por analgesia de parto compreende indicação suficiente


para sua realização, independente da fase do parto e do grau de dilatação. Isto
inclui parturientes em fase latente com dor intensa, após esgotados os métodos
não farmacológicos.
A analgesia peridural e a analgesia combinada raqui – peridural (RPC)
constituem técnicas igualmente eficazes para alívio da dor de parto. A escolha
entre elas será influenciada pela experiência do anestesiologista com a técnica.
Quando se utilizar a RPC, adequar a dose ao momento do parto: - fase não
avançada do parto (doses próximas a 15 mcg de fentanila intratecal ou outro
opióide lipossolúvel em dose equivalente); - fase avançada do parto
(bupivacaína 1,25 mg intratecal ou outro anestésico em dose equivalente,
associada ao opióide lipossolúvel).
Não se recomendam rotineiramente altas concentrações de soluções de

129
anestesia local para estabelecer ou manter a analgesia peridural.
Antes da realização da analgesia regional de parto deve haver acesso venoso
pré-estabelecido.
Pré-hidratação não deve ser utilizada de forma rotineira mas apenas em casos
selecionados.
Toda gestante após analgesia regional deve ser avaliada quanto à ocorrência de
hipotensão arterial, sendo a necessidade de hidratação ou suporte com
substâncias vasoativas avaliada individualmente
A gestante sob analgesia peridural, quando se sentir confortável e segura, deve
ser encorajada a deambular e adotar posições mais verticais.
O cateter peridural, instalado durante o parto, poderá ser utilizado no
terceiro estágio do parto, como, por exemplo, na reparação perineal.
Após confirmados os 10 cm de dilatação, não se deve incentivar a gestante a
realizar puxos, exceto se tardiamente (sugere-se no mínimo após 1 hora de
dilatação total) ou quando a cabeça fetal se tornar visível.
Os puxos devem ser sempre durante a contração.
Após constatado 10 cm de dilatação, devem ser estabelecidas estratégias para
que o nascimento ocorra em até 4 horas, independente da paridade.
A administração de ocitocina após analgesia regional não é recomendada de
rotina e deve obedecer às recomendações referentes ao uso de uterotônicos
expostas nas seções específicas.
A técnica de analgesia no parto deve visar o controle adequado da dor com o
menor comprometimento possível das funções sensoriais, motoras e
autonômicas.
Uma vez realizada analgesia de parto, ainda que não ocorram doses de resgate,
o anestesiologista deverá acompanhar a parturiente, com avaliação horária, até
o terceiro período.

4. Assistência no primeiro período do parto


a. Diagnóstico do início do trabalho de parto e momento de admissão para
assistência ou início da assistência no domicílio
- indagar à mulher como ela está e sobre os seus desejos, expectativas e preocupações;
- indagar sobre os movimentos da criança, incluindo qualquer mudança nos mesmos; -
oferecer informações sobre o que a mulher pode esperar na fase de latência do
trabalho de parto e o que fazer se sentir dor;
- oferecer informações sobre o que esperar quando procurar assistência;
- estabelecer um plano de cuidados com a mulher, incluindo orientação de quando e
com quem contatar posteriormente;
- oferecer orientação e apoio para o(s) acompanhante(s) da mulher.

Se uma mulher busca orientação ou assistência em uma maternidade ou


unidade de parto extra, peri ou intra-hospitalar:

E não está em trabalho de parto estabelecido (≤ 3 cm de dilatação cervical):


- ter em mente que a mulher pode estar tendo contrações dolorosas, sem
mudanças cervicais, e embora ainda não esteja em trabalho de parto
ativo, ela pode sentir que está pela sua própria definição;
- oferecer apoio individual e alívio da dor se necessário;
- encorajar e aconselhar a mulher a permanecer ou retornar para casa,
130
levando em consideração as suas preocupações, a distância entre a sua
casa e o local do parto e o risco deste acontecer sem assistência.

Estar em trabalho de parto estabelecido (≥ 4 cm de dilatação cervical):


- Admitir para assistência

b. Definição e duração das fases do primeiro período do trabalho de parto


Utilizar as seguintes definições de trabalho de parto:
Fase de latência do primeiro período do trabalho de parto – um período não
necessariamente contínuo quando:
- há contrações uterinas dolorosas E
- há alguma modificação cervical, incluindo apagamento e dilatação até
4 cm.
Trabalho de parto estabelecido – quando:
- há contrações uterinas regulares E
- há dilatação cervical progressiva a partir dos 4 cm.

c. Observação e monitorização no primeiro período do parto

Registrar as seguintes observações no primeiro período do trabalho de parto:

- frequência das contrações uterinas de 1 em 1 hora;


- pulso de 1 em 1 hora;
- temperatura e PA de 4 em 4 horas;
- frequência da diurese;
- exame vaginal de 4 em 4 horas ou se houver alguma preocupação com o progresso do
parto ou em resposta aos desejos da mulher (após palpação abdominal e avaliação de
perdas vaginais).

Um partograma com linha de ação de 4 horas deve ser utilizado para o registro
do progresso do parto, modelo da OMS ou equivalente.

OBSERVAÇÕES DA MULHER OBSERVAÇÕES FETAIS


pulso >120 bpm em 2 ocasiões com qualquer apresentação anômala,
30 minutos de intervalo; incluindo apresentação de cordão;
PA sistólica ≥ 160 mmHg OU PA
diastólica ≥ 110 mmHg em uma única situação transversa ou oblíqua;
medida;
Temperatura de 38ºC ou mais em
uma única medida OU 37,5ºC ou mais apresentação cefálica alta (-3/3 De
em 2 ocasiões consecutivas com 1 Lee) ou móvel em uma nulípara;
hora de intervalo;

qualquer sangramento vaginal, exceto suspeita de restrição de crescimento


eliminação de tampão; intra-uterino ou macrossomia;
suspeita de anidrâmnio ou
presença de mecônio significativo;
polihidrâmnio;

131
dor relatada pela mulher que difere da
frequência cardíaca fetal (FCF) <
dor normalmente associada às
110 ou > 160 bpm;
contrações;
progresso lento confirmado do
desacelerações da FCF à ausculta
primeiro e segundo períodos do
intermitente.
trabalho de parto

mecônio significativo (verde escuro


solicitação da mulher de alívio da dor
ou preto, grosso, tenaz, contendo
por analgesia regional;
grumos)
emergência obstétrica - hemorragia anteparto, prolapso de cordão,
convulsão/colapso materno ou necessidade de ressuscitação neonatal
avançada

d. Intervenções e medidas de rotina no primeiro período do parto

O enema não deve ser realizado de forma rotineira durante o trabalho de parto.
A tricotomia pubiana e perineal não deve ser realizada de forma rotineira durante o
trabalho de parto.
A amniotomia precoce, associada ou não à ocitocina, não deve ser realizada de rotina
em mulheres em trabalho de parto que estejam progredindo bem.
As mulheres devem ser encorajadas a se movimentarem e adotarem as posições que
lhes sejam mais confortáveis no trabalho de parto.

e. Falhas de progresso no primeiro período do trabalho de parto


Se houver suspeita de falha de progresso no primeiro estágio do trabalho de
parto levar em consideração o ambiente onde a mulher está sendo assistida; a
atitude da mulher, se postura mais ativa ou não; estado emocional; o tipo de
apoio e suporte físico e emocional que a mulher estiver recebendo; paridade;
dilatação e mudanças cervicais; contrações uterinas; altura e posição da
apresentação; necessidade de referência ou solicitação de assistência
profissional apropriada. Reavaliação do quadro clínico.

Se houver suspeita de falha de progresso na fase ativa do trabalho de parto


considerar também para o diagnóstico todos os aspectos da evolução do
trabalho de parto, incluindo:

- dilatação cervical menor que 2 cm em 4 horas para as primíparas;


- dilatação cervical menor que 2 cm em 4 horas ou um progresso lento do
trabalho de parto para as multíparas;
- descida e rotação do pólo cefálico;
- mudanças na intensidade, duração e frequência das contrações uterinas.

Diante da suspeita de falha de progresso no primeiro estágio do trabalho de


parto, considerar a realização de amniotomia se as membranas estiverem
íntegras. Explicar o procedimento e avisar que o mesmo irá diminuir o trabalho
de parto por cerca de 1 hora e pode aumentar a intensidade e dor das
contrações.

132
Se a amniotomia for ou não realizada, realizar um exame vaginal após 2 horas
e confirmar falha de progresso se a dilatação progredir menos que 1 cm.
Oferecer apoio e controle efetivo da dor a todas as mulheres com falha de
progresso no primeiro estágio do trabalho de parto.

5. Assistência no segundo período do parto


a. Ambiente de assistência, posições e imersão em água
Deve-se desencorajar a mulher a ficar em posição supina, decúbito dorsal
horizontal, ou posição semi-supina no segundo período do trabalho de parto. A
mulher deve ser incentivada a adotar qualquer outra posição que ela achar mais
confortável incluindo as posições de cócoras, lateral ou quatro apoios
Informar às mulheres que há insuficiência de evidências de alta qualidade,
tanto para apoiar como para desencorajar o parto na água

b. Puxos e manobra de Kristeller


Deve-se apoiar a realização de puxos espontâneos no segundo período do
trabalho de parto em mulheres sem analgesia, evitando os puxos dirigidos. Caso o
puxo espontâneo seja ineficaz ou se solicitado pela mulher, deve-se oferecer
outras estratégias para auxiliar o nascimento, tais como suporte, mudança de
posição, esvaziamento da bexiga e encorajamento.
Em mulheres com analgesia regional, após a confirmação da dilatação
cervical completa, o puxo deve ser adiado por pelo menos 1 hora ou mais, se a
mulher o desejar, exceto se a mulher quiser realizar o puxo ou a cabeça do bebê
estiver visível. Após 1 hora a mulher deve ser incentivada ativamente para
realizar o puxo durante as contrações. A manobra de Kristeller não deve ser
realizada no segundo período do trabalho de parto.
Manobra de Kristeller é uma manobra obstétrica realizada
durante o parto que consiste na aplicação de pressão na
parte superior do útero. Atualmente não é recomendada.

c. Definição e duração do segundo período do trabalho de parto


 fase inicial ou passiva: dilatação total do colo sem sensação de puxo
involuntário ou parturiente com analgesia e a cabeça do feto ainda
relativamente alta na pelve;
 fase ativa: dilatação total do colo, cabeça do bebê visível, contrações de
expulsão ou esforço materno ativo após a confirmação da dilatação
completa do colo do útero, na ausência das contrações de expulsão.

A distribuição dos limites de tempo encontrados nos estudos para a duração


normal da fase ativa do segundo período do trabalho parto é a seguinte:
 primíparas: cerca de 0,5–2,5 horas sem peridural e 1–3 horas com
peridural.
 multíparas: até 1 hora sem peridural e 2 horas com peridural.

Para a conduta na falha de progresso do segundo período deve-se considerar a


paridade, da seguinte maneira

na maioria das mulheres o parto deve


NULÍPARAS ocorrer no prazo de 3 horas após o início da
fase ativa do segundo período;

133
a confirmação de falha de progresso no
segundo período deve ser feita quando este
durar mais de 2 horas e a mulher deve ser
encaminhada, ou assistência adicional
solicitada, a médico treinado na realização
de parto vaginal operatório, se o
nascimento não for iminente.

na maioria das mulheres o parto deve


ocorrer no prazo de 2 horas após o início da
fase ativa do segundo período;

A confirmação de falha de progresso no


MULTÍPARAS segundo período deve ser feita quando este
durar mais de 1 hora e a mulher deve ser
encaminhada, ou assistência adicional
solicitada, a médico treinado na realização
de parto vaginal operatório, se o
nascimento não for iminente.

d. Falha de progresso no segundo período do trabalho de parto

Se houver prolongamento do segundo período do trabalho de parto, ou se a


mulher estiver excessivamente estressada, promover medidas de apoio e
encorajamento e avaliar a necessidade de analgesia/anestesia.
Se as contrações forem inadequadas no início do segundo período, considerar
o uso de ocitocina e realização de analgesia regional.
Para as nulíparas, suspeitar de prolongamento se o progresso (em termos de
rotação ou descida da apresentação) não for adequado após 1 hora de segundo
período ativo. Realizar amniotomia se as membranas estiverem intactas.
Para as multíparas, suspeitar de prolongamento se o progresso (em termos de
rotação ou descida da apresentação) não for adequado após 30 minutos de
segundo estágio ativo. Realizar amniotomia se as membranas estiverem
intactas.
Considerar o uso de parto instrumental (vácuo-extrator ou fórceps) se não
houver segurança quanto ao bem-estar fetal ou prolongamento do segundo
período.
Orientar a mulher e realizar uma cesariana se o parto vaginal não for possível.

e. Cuidados com o períneo

Não se recomenda a massagem perineal durante o segundo período do parto.


Considerar aplicação de compressas mornas no períneo no segundo período do
parto. Não se recomenda a aplicação de spray de lidocaína para reduzir a dor
perineal no segundo período do parto.

Tanto a técnica de „mãos sobre‟ (proteger o períneo e flexionar a cabeça fetal)


quanto a técnica de „mãos prontas‟ (com as mãos sem tocar o períneo e a cabeça
fetal, mas preparadas para tal) podem ser utilizadas para facilitar o parto
espontâneo.
134
Se a técnica de „mãos sobre‟ for utilizada, controlar a deflexão da cabeça e
orientar à mulher para não empurrar nesse momento.

Não realizar episiotomia de rotina durante o parto vaginal espontâneo.

Se uma episiotomia for realizada, a sua indicação deve ser justificada,


recomendando-se a médio-lateral originando na fúrcula vaginal e direcionada
para o lado direito, com um ângulo do eixo vertical entre 45 e 60 graus.
Assegurar analgesia efetiva antes da realização de uma episiotomia.

6. Assistência no terceiro período do parto

Reconhecer que o período imediatamente após o nascimento é um período


bastante sensível, quando a mulher e seus acompanhantes vão finalmente
conhecer a criança. Assegurar que a assistência e qualquer intervenção que
for realizada levem em consideração esse momento, no sentido de
minimizar a separação entre mãe e filho.

O terceiro período do parto é o momento desde o nascimento da criança até a


expulsão da placenta e membranas.

CONDUTA ATIVA CONDUTA FISIOLÓGICA


uso rotineiro de substâncias
sem uso rotineiro de uterotônicos;
uterotônicas
clampeamento e secção precoce do clampemento do cordão após
cordão umbilical; e parar a pulsação;
tração controlada do cordão após expulsão da placenta por esforço
sinais de separação placentária materno
Considerar terceiro período prolongado após decorridos 30 minutos.

Manter observação rigorosa da mulher, com as seguintes avaliações:


- condição física geral, através da coloração de pele e mucosas, respiração e
sensação de bem-estar;
- perda sanguínea.
Se houver hemorragia, retenção placentária, colapso materno ou qualquer outra
preocupação quanto ao bem-estar da mulher:
- instalar acesso venoso calibroso e informar a puérpera sobre a situação e
os procedimentos previstos;

Explicar à mulher, antes do parto, as opções de conduta no terceiro período, com


os riscos e benefícios de cada uma. Explicar à mulher que a conduta ativa:
- encurta o terceiro período em comparação com a conduta fisiológica;
- está associado a náusea e vômitos em cerca de 100 mulheres em 1.000;
- está associado com um risco aproximado de 13 mulheres em 1.000 de uma
hemorragia de mais de 1 litro; e
- está associada com um risco aproximado de 14 em 1.000 de uma
transfusão de sangue.

Explicar à mulher que a conduta fisiológica:


135
- está associada a náusea e vômitos em cerca de 50 mulheres em 1.000;
- está associada com um risco aproximado de 29 mulheres em 1.000 de uma
hemorragia de mais de 1 litro; e
- está associada com um risco aproximado de 40 mulheres em 1.000 de uma
transfusão de sangue.

A conduta ativa é recomendada na assistência ao terceiro período do parto pois


está associado com menor risco de hemorragia e transfusão sanguínea. Se uma
mulher com baixo risco de hemorragia pós-parto solicitar conduta expectante, apoiá-
la em sua escolha.
Não realizar a secção do cordão antes de 1 minuto após o nascimento, a
menos que haja necessidade de manobras de ressuscitação neonatal.
Pinçar o cordão antes de 5 minutos após o nascimento para realizar a tração
controlada do cordão como parte da conduta ativa. Se uma mulher solicitar
o clampeamento e secção do cordão após 5 minutos, apoiá-la em sua
escolha.
Após a secção do cordão, realizar tração controlada do mesmo.

a. Retenção placentária

Explicar para a mulher o que está acontecendo e quais serão os procedimentos


necessários. Providenciar um acesso venoso calibroso. Realizar exame vaginal
minucioso. Oferecer analgesia para este procedimento e providenciar, se a mulher
demandar. Não realizar remoção manual ou cirúrgica sem analgesia adequada.

Observar e examinar a placenta e seus anexos para afastar a retenção de restos.

7. Cuidados maternos imediatamente após o parto


a. Observação e monitoração da mulher imediatamente após o parto

Realizar as seguintes observações da mulher logo após o parto:


- temperatura, pulso e pressão arterial;
- lóquios e contrações uterinas;
- examinar a placenta e membranas: avaliar suas condições, estrutura, integridade e
vasos umbilicais;
- avaliação precoce das condições emocionais da mulher em resposta ao trabalho
de parto e parto;
- micção bem sucedida.

Situações consideradas alarmantes:


- pulso >120 bpm em 2 ocasiões com 30 minutos de intervalo;
- PA sistólica ≥ 160 mmHg OU PA diastólica ≥ 110 mmHg em uma única medida;
- PA sistólica ≥ 140 mmHg OU diastólica ≥ 90 mmHg em 2 medidas consecutivas
com 30 minutos de intervalo;
- proteinúria de fita 2++ ou mais E uma única medida de PA sistólica ≥ 140 mmHg
ou diastólica ≥ 90 mmHg;
- temperatura de 38°C ou mais em uma única medida OU 37,5°C ou mais em 2
ocasiões consecutivas com 1 hora de intervalo;
- bexiga palpável e ausência de micção 6 horas após o parto;
- emergência obstétrica – hemorragia pós-parto, convulsão ou colapso materno;
- placenta retida ou incompleta;
136
- lacerações perineais de terceiro e quarto graus ou outro trauma perineal
complicado.

b. Cuidados com o períneo

O trauma perineal ou genital deve ser definido como aquele provocado por
episiotomia ou lacerações, da seguinte maneira:
lesão apenas da pele e
PRIMEIRO GRAU
mucosas
lesão apenas da pele e
SEGUNDO GRAU
mucosas
lesão do períneo
envolvendo o complexo
do esfíncter anal:
3a – laceração de menos
de 50% da espessura do
TERCEIRO GRAU esfíncter anal
3b – laceração de mais de
50% da espessura do
esfíncter anal
3c – laceração do
esfíncter anal interno.
lesão do períneo
envolvendo o complexo
QUARTO GRAU do esfíncter anal
(esfíncter anal interno e
externo) e o epitélio anal
Antes de avaliar o trauma genital:

- explicar à mulher o que será realizado e o porquê;


- ofereça analgesia adequada;
- assegurar boa iluminação;
- posicionar a mulher de maneira confortável e com boa exposição das
estruturas genitais.

Realizar o exame inicial de maneira gentil e sensível. Isto pode ser feito
imediatamente após o parto. Se for identificado trauma perineal, uma avaliação
sistemática do mesmo deve ser realizada, e após a avaliação, se necessário for, a
realização da episiorrafia.

137

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