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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física

II Seminário Ibero-Americano de Geografia Física


Universidade de Coimbra, Maio de 2010

GEOSSISTEMA, TERRITÓRIO E PAISAGEM COMO MÉTODO DE ANÁLISE


GEOGRÁFICA

Nathália Prado Rosolém


Mestranda do Programa de Mestrado em Geografia
Universidade Estadual de Londrina
Email: nathalia_rosolem@hotmail.com

Rosely Sampaio Archela


Docente da Universidade Estadual de Londrina
Email: roarchela@uel.br

1 INTRODUÇÃO
Dentro do contexto histórico e epistemológico a geografia vem se desenvolvendo
como ciência e incorporando em sua evolução diferentes métodos de análise e
pesquisa.
A geografia constitui em uma ciência em que seus métodos têm como base outras
ciências associadas, pois o seu objeto de estudo se relaciona com a expressão de
valores que são aplicados ao espaço terrestre. Uma variabilidade de orientações auxilia
na pesquisa geográfica.
A unidade geográfica, segundo George (1972), caracteriza a geografia como ciência
das relações que implicam em um pensamento específico. Ela tem como ponto de
partida a descrição, que irá culminar em uma observação analítica, na detecção das
correlações e na busca das relações de causalidade.
O objeto da geografia é o estudo das relações de fatos e de movimentos cujo
conhecimento específico é da alçada de uma outra ciência. Para poder reivindicar um
objeto próprio, a geografia deverá colocar no centro dessas relações a preocupação e a
existência dos homens. (GEORGE, 1972, p. 15).
A geografia em seu contexto epistemológico apresenta a necessidade de acesso a
uma grande variedade de conhecimentos específicos que dêem conta da delimitação
de uma determinada área de estudo, para a partir daí, propor a sua caracterização ou
qualificação por meio de dados e informações de determinado espaço em uma
determinada escala de estudo.
Um dos principais instrumentos utilizados para expressar os resultados adquiridos
na pesquisa em geografia é o mapa, que segundo Martinelli (2003), é uma
representação gráfica que em seu contexto insere o objetivo da comunicação visual.

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século XXI

Envolve uma linguagem gráfica bidimensional e atemporal que demanda apenas um


instante da percepção visual.
Como a geografia possui uma preocupação intrínseca com a organização do espaço,
utiliza-se do mapa com cunho investigativo como também, para realizar constatações
dos dados representados. A interpretação do mapa compreende a distribuição e
organização da informação nos espaços representados transmitindo assim, a
informação necessária para se ter uma visão do todo, pois é através do mapa em que
se tem a leitura do espaço estudado.
A pesquisa geográfica leva em conta a especialidade do território e de seus
referentes dados, no qual serão representados pela fusão de todas as características,
em que resulta na confecção de produtos cartográficos, primeiramente em mapas
analíticos, que com a análise integrada dos elementos, resultarão em mapas de
síntese.
Contudo, a partir desta discussão, Ross (1995) enfatiza a teoria de sistemas como
um sistema aberto que permite identificar um sistema maior ou menor. A partir dos
fluxos de matéria e energia, espontâneos ou ativados pela ação humana, são regidos
pela lei da física e da química, no qual definem a funcionalidade dinâmica (estável) ou
desequilíbrio temporário (instável). O que diferencia um sistema de outro é a
intensidade dos fluxos e a intensidade da dinâmica das trocas de energia e matéria, da
atmosfera, hidrosfera, litosfera e a biosfera, incluindo também a sociedade que
interferem de alguma forma na funcionalidade de um sistema.

2 GEOSSISTEMA, TERRITÓRIO E PAISAGEM


A pesquisa ambiental em geografia objetiva a compreensão das relações entre
sociedade e natureza, no qual pode ser analisada a partir do método sistêmico, por
meio dos elementos que compõem a paisagem geográfica, em que resulta em uma
unidade dinâmica e suas inter-relações dos elementos físico, biológico e antrópico.
A teoria dos sistemas é citada, primeiramente, em 1950, por Bertanlanffy, mas no
âmbito da geografia a teoria geossistêmica é assinalada por Jean Tricart (1965) em seu
trabalho que expõe a classificação de unidades ecodinâmicas do meio ambiente.
Tricart (1977) define o conceito de sistema como um conjunto de fenômenos que se
desenvolvem a partir dos fluxos de matéria e energia, que tem origem a partir de uma
interdependência, no qual surge uma nova entidade global, integral e dinâmica,
permitindo assim uma atitude dialética, a necessidade de análise e de visão do todo,
afim de se atuar sobre o meio ambiente. A análise de sistemas vem contrapor à ciência

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tradicional, trazendo a tona uma discussão referente à relação dialética entre sujeito-
objeto, entrelaçando o trabalho realizado em gabinete e o trabalho de campo, para
que o resultado da pesquisa incorpore tanto a questão natural, social e econômico de
forma a envolver todo o seu complexo.
O termo geossistema surgiu na escola russa, tendo como precursor Sotchava (1977)
que em 1963 remete a discussão em torno deste método, sendo que sua análise
geossistêmica esta associada aos sistemas territoriais naturais que se distinguem no
contexto geográfico, constituídos de componentes naturais intercondicionados e inter-
relacionados no tempo e no espaço, como parte de um todo, que possui sua estrutura
influenciada pelos fatores social e econômico. Na visão de Sotchava relatado por DIAS
e SANTOS (2007): “O geossistema é o resultado da combinação de fatores geológicos,
climáticos, geomorfológicos, hidrológicos e pedológicos associados a certo(s) tipo(s) de
exploração biológica. Tal associação expressa a relação entre o potencial ecológico e a
exploração biológica e o modo como esses variam no espaço e no tempo, conferindo
uma dinâmica ao geossistema. Por sua dinâmica interna, o geossistema não apresenta
necessariamente homogeneidade evidente. Na maior parte do tempo, ele é formado
de paisagens diferentes, que representam os diversos estágios de sua evolução.”
(DIAS; SANTOS, 2007).
Segundo Monteiro (2001), a aplicação do método geossistêmico auxilia nas
estruturas dos chamados subsistemas, através de uma hierarquia da dinâmica espacial
e ambiental e também natural e social, que apresentam caráter vertical e horizontal,
desempenhando a análise geográfica de forma estruturada e hierárquica.
Para este autor, o tratamento geossistêmico visa, a priori, à integração por uma
etapa de análise das variáveis naturais e antrópicas, juntamente com a segunda etapa,
de integração, em que se fundem os recursos, os usos e os problemas, que são
configurados na etapa de síntese em unidades homogêneas, que conduz assim, para a
etapa conclusiva de aplicação, no qual se esclarece a real qualidade do meio ambiente,
resultando em uma análise tempo-espacial integrada das inter-relações sociedade-
ambiente na construção da paisagem.
Contudo, Bertrand resgata o conceito de geossistema criado por Sotchava (1963),
incorporando a ele a dimensão da ação antrópica, sendo assim uma categoria espacial
de componentes relativamente homogêneos, cuja dinâmica resulta da interação entre
o potencial ecológico, a exploração biológica e a ação antrópica.
Ecossistema e Geossistema são conceitos diferentes na ótica bertrandiana, o
primeiro diz respeito ao ambiente vivido de uma espécie animal, em que esse

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século XXI

apareceu e se desenvolveu, relacionando com os demais elementos do seu ambiente,


definido seu limite para cada ecossistema. Já o segundo, relaciona elementos distintos,
que são diferentes um do outro, de forma heterogênea, formado por paisagens
desiguais que representam estágios de sua evolução.
Portanto, o geossitema condiz ao sistema de modelos de paisagem e o ecossistema
a um sistema modelo, que corresponde a parte biótica do geossistema. (DONISA, 1979
apud TORRES, 2003)
O conceito de paisagem é citado por Bertrand e Bertrand (2007) como sendo uma
determinada porção do espaço, resultado de uma combinação dinâmica, mas instável,
que é composta de elementos físicos, biológicos e antrópicos no qual reagem
dialeticamente, uns sobre os outros, e fazem a paisagem indissociável, sendo um único
conjunto que está em constante evolução.
A proposta de delimitação de Bertrand (1971) referente a escala de análise, tem
como objetivo apresentar uma tipologia dinâmica da paisagem que represente a
hierarquia de seus elementos classificando em unidades superiores (zona, domínio e
região) e unidades inferiores (geossistema, geofácies e geótopo) como sintetiza o
autor na Tabela 1.

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Tabela 1: Unidades de Paisagem


ESCALA UNIDADES ELEMENTARES
TÊMPORO-
EXEMPLO TOMADO
UNIDADES DE ESPACIAL
NUMA MESMA SÉRIE Relevo
PAISAGEM (A. Clima (2) Botânica Biogeografia Zona
DE PAISAGENS (1)
CAILLEUX J.
TRICART)
G:
Zona grandeza Temperada Zonal Bioma Zona
G. I
Domínio
Domínio G. II Cantábrico Regional Domínio região
estrutural
Região Região Quarteirão rural
G. III-IV Picos da Europa Andar série
Natural estrutural ou urbano
Geossistema
atlântico
montanhês
(calcário
Unidade Zona
Geossistema G. IV-V sombreado com Local
estrutural equipoencial
faia higrófila a
“Aspérula
adorata” em
terras fusca”
Prado da ceifa
com Molinio-
Exploração ou
Arrhenatheretea”
quarteirão
em solo lixiviado Estádio
Geofácies G. VI parcelado
hidromórfico agrupamento
(pequena ilha em
formado em
uma cidade)
depósito
morâinico
Geótipo “cadiés” de
dissolução com
“Aspidium
Biótipo Parcela (casa em
G. VII Londhitis Sw” em Microclima
biocenese cidade)
microssolo tímido
carbonarado em
bolsas
Fonte: Bertrand e Bertrand, 2007, p. 16.
Org.: Nathália Prado Rosolém.

As unidades superiores são definidas como zona, que é reservado aos conjuntos de
primeira grandeza, definidos primeiramente pelo seu clima e biomas; como domínio,
conjunto de segunda grandeza; e região natural, denominadas de terceira e quarta
grandeza.
Já as unidades inferiores são classificadas em geossistema, definidos como unidades
fisionômicas homogêneas, sendo um complexo geográfico e a dinâmica do conjunto;
as geofácies que representa uma subdivisão destas unidades com seus aspectos
fisionômicos; e o geótopo, a menor unidade geográfica homogênea classificada e o
último nível de escala espacial.
Para melhor compreensão sobre as relações das unidades de paisagem no âmbito
do geossistema, Bertrand e Bertrand (2007) apresentam um diagrama em que se

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representa a associação dos elementos e suas relações, como pode ser visto na Figura
1.

Figura 1: Modelo do Geossistema


Fonte: Bertrand e Bertrand, 2007, p. 18.
Org.: Nathália Prado Rosolém, 2010.

Segundo os autores, as unidades de paisagem resultam da combinação local dos


fatores que atuam na respectiva área de estudo, como o sistema de declividade, clima,
rocha, manto de decomposição, hidrologia das vertentes, e estão associadas a uma
dinâmica comum combinadas a fatores químicos, físicos e antrópicos.
Em 1997, Bertrand cria um novo conceito mais amplo para o geossitema, chamado
por eles de GTP (Geossistema, Território e Paisagem), que pode ser compreendido
pelas três vias interdependentes que trabalham cientificamente na construção do
espaço geográfico, tendo como interesse epistemológico e metodológico a
preocupação de preservar a complexidade e a diversidade do ambiente, na tentativa
de auxiliar na superação da ruptura entre sociedade e natureza. (Figura 2)

Figura 2: Representação do sistema tripolar proposto por Bertrand, 1997.


Fonte: Bertrand, 1997 apud TORRES, 2003, p. 44.
Org.: Nathália Prado Rosolém, 2010.

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O geossistema constituído pelos elementos geográficos e sistêmicos no qual são


compostos por elementos abióticos, bióticos e antrópicos, em que abrange também os
conceitos espacial, natural e antrópico.
O território é a entrada em que permite analisar as ações e o funcionamento da
questão social e econômica no espaço, considerando o tempo para relatar o recurso, a
gestão, a redistribuição, a poluição e a despoluição.
A paisagem que abrange não somente o visível, mas também a construção cultural
e econômica de um espaço geográfico. Nela contém o território, sua organização
espacial e seu funcionamento, e se reproduz nos elementos do geossistema.
A meta do GTP segundo PISSINATI e ARCHELA (2009) é a reaproximação desses três
conceitos para se analisar o funcionamento de um determinado espaço geográfico de
forma holística, atingindo as interações dos elementos para melhor visualizar e
compreender a dinâmica da área estudada.
A metodologia do GTP serve não só para a delimitação e representação cartográfica
das áreas, mas também para detectar os problemas existentes e o grau de
responsabilidade da ação antrópica sobre os mesmos, para planejar estratégias para
conter, reverter ou amenizar os impactos existentes. Pode ser utilizada pelo geógrafo
para revelar as formas de criação, de reprodução e de transformação das estruturas.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A abordagem geossistêmica em geografia auxilia na produção do diagnóstico e na
realização da análise ambiental do objeto de pesquisa, contribuindo também para o
planejamento territorial e como instrumento de gestão ambiental.
A metodologia bertrandiana apresenta uma perspectiva dinâmica, que com seus
métodos de análise e suas subdivisões das unidades inferiores, geossistema, geofácieis
e geótopos possibilitam um maior entendimento da estrutura e da dinâmica das
unidades de paisagem.
Entender a complexidade dos sistemas ambientais é um desafio, no qual as
metodologias propostas com a visão sistêmica e geossistêmica contribuem para um
entendimento completo de todos os elementos e variáveis representados na escala do
geossistema.
A metodologia geossistêmica proporciona uma visão global em que permite aplicá-
la em diferentes escalas, buscando assim entender o funcionamento dos ambientes e
suas interrelações.

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Contudo, esta é uma importante proposta metodológica para a realização de


análise e dinâmica da paisagem, que pode ser aplicada a diferentes objetos de estudo
que tenha como objetivo a descrição e análise do espaço geográfico.

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