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MARILENA CHAUI A ideologia da competéncia ESCRITOS DE MARILENA CHAUI Volume 3 ORGANIZADOR André Rocha * * , POSE RRARS — auténtica Aideologia da competéncia’ A ideologia é um conjunto légico, sistematico ¢ coerente de re- presentagdes (ideias ¢ valores) ¢ de normas ou regras (de conduta) que indicam e prescrevem aos membros de uma sociedade o que devem pensar e como devem pensar, 0 que devem valorizar e como devem valorizar, 0 que devem sentir e como devem sentir, o que devem fazer e como devem fazer. Ela é, portanto, um corpo explicativo (repre- sentagdes) € pratico (normas, regras, preceitos) de carater prescritivo, normativo, regulador, cuja fungio é dar aos membros de uma socie- dade dividida em classes uma explicagao racional para as diferencas sociais, politicas ¢ culturais, sem jamais atribuir tais diferencas 4 divisio da sociedade em classes a partir das divis6es na esfera da producao econdmica. Pelo contririo, a fungio da ideologia é ocultar a divisio Social das classes, a exploracio econédmica, a dominagio politica € a exclusio cultural, oferecendo aos membros da sociedade o sentimento da identidade social, fundada em referenciais identificadores, como a Humanidade, a Liberdade, a Justica, a Igualdade, a Nagao. Como sa lienta Marx, o primeiro a analisar o fendmeno ideolégico, a ideologia €a difusio para o todo da sociedade das ideias e dos valores da classe dominante como se tais ideias e valores fossem universais ¢ aceitos Como tais por todas as classes. 1 i Versio revist ‘4 € ampliada do texto originalmente publicado em: O que é ideolegia. Editora Bras iliense, 1981, 53 ESCRITOS DE MARILENA CHAU! como explica Claude Leg burguesa, fore? deologt4 > carate: 73 ‘ A ideo ity discurso de carater legislador, ético ¢ peat? ato ¢ i pensament © oda a sociedade © verdadsiro © 0 falbo, « (2 °8io que definia Ps jt, o justo € 0 injusto, © Normal € 6 ya,” e 4 Patolgg, ° oe Pi lizacio e a barbaric. Punha ordem no Rico, iniversal de algumas instituicge, LNdy SCO, mau licito €° ilic o belo eo feio, a Iv . si positivo € i valor posi mando o i mpresa, a escola € 0 Estado, e, com isso, deg, dcria, a er . i nos do poder € da autoridade: 0 pai, ° ‘Baya familia, 2 © Patrig 0 getentores legitir os ntistas professor, 0 0 Podemos dizer, 1 . hou nidanga no discurso ideol6gic m 0 seat freu uma modificagdo que iria espalhar-se Por toda sociedade ¢ pelas relagdes sociais: o trabalho industrial te a organizado segundo um padrio conhecido como fordismo, 0 qual ony empresa controla desde a producéo da matéria-prima (no inicig da cadeia produtiva) até a distribuigéo comercial dos produtos (no fim da cadeia produtiva). Além desse controle total da produgio, gg jntroduzidas a linha de montagem, a fabricagao em série de produtos adronizados e a ideia de que a competicdo capitalista realiza-se em fungdo da qualidade dos produtos, qualidade que depende de avancos cientificos e tecnolégicos, de modo que uma empresa deve também fi- nanciar pesquisas € possuir laboratérios. Com o fordismo, é introduzida uma nova pritica das relagdes sociais, conhecida como a Organizagio. Analisando a maneira como o modelo da Organizacio se difunde e se espalha por todas as institui¢des sociais e por todas as relacdes sociais, Lefort fala da ideologia contemporanea como a ideologia in- visivel. Ou seja, enquanto na ideologia burguesa tradicional as ideias eram produzidas e emitidas por determinados agentes sociais — 0 pai, © patrao, o padre ou pastor, o professor, 0 sibio —, agora parece nio haver agentes produzindo as ideias, porque elas parecem emanat diretamente do funcionamento da Organizagao e das chamadas “leis do mercado”. / Examinemos © que se entende por Organizago. Quais suas Ptncipais caracteristicas? oO governante. no entanto, que, a partir dos anos 1939, Iégico. Com efeito, o pr + © proc uma m do trabalho so} a ser * LEFORT, Claude. s 7 ; s. Estudos, Esbogo de uma génese da ideologia nas sociedades moder™ Sio Paulo: CEBRAP, n. 10, 1974.

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