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Rita de Cássia P.

Fernandes

PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO E OS DISTÚRBIOS


MUSCULOESQUELÉTICOS

Rita de Cássia P. Fernandes*

O artigo objetiva descrever a dor musculoesquelética como expressão do desequilíbrio entre


capacidades humanas e modalidades de organização do trabalho. Através da articulação dos
resultados epidemiológicos e da Análise Ergonômica do Trabalho (AET), discute os efeitos da
precarização do trabalho, sendo a estratégia de aliar essas duas abordagens metodológicas pro-
missora para o diálogo interdisciplinar. Caracterizaram-se 14 fábricas do ramo plástico da
Região Metropolitana de Salvador, através do estudo do funcionamento e da organização da
produção e do componente epidemiológico com desenho de corte transversal e uma amostra
aleatória de 557 trabalhadores. A AET ocorreu no setor de acabamento de uma das fábricas.
Constataram-se alterações na organização da produção que ocorreram à custa da intensificação
do trabalho, com aceleração do ritmo dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que realizavam
tarefas com força, repetitividade e posturas anômalas. O uso excessivo do corpo permitiu en-
tender o surgimento e a manutenção da dor, cujas prevalências revelaram um enorme contin-
gente de trabalhadores obrigado a continuar trabalhando sob as mesmas condições geradoras
do seu sofrimento.
PALAVRAS-CHAVE: intensificação do trabalho, doenças musculoesqueléticas, dor, precarização, LER/Dort.

Um depoimento de uma auxiliar de pro- derando que se trata do adoecer no tempo e no


dução expressa as condições da precarização e curso do labor diário. Homens e mulheres tra-
de sofrimento no trabalho precarizado. Ela diz balhando com dor: é disso que se fala.
que, ao trabalhar naquelas condições, “sente o Este texto pretende trazer algumas con-
corpo” e doi o ombro, pede um analgésico ou tribuições para o estudo do trabalho e do adoe-
faz massagem, mas volta para machucar o corpo cer de homens e mulheres trabalhadores, com
no outro dia. Esse trabalho, fonte de dor e sofri- uma perspectiva interdisciplinar que promove o
mento, está distante em muito da sua capacida- diálogo entre resultados obtidos através de dife-
de estruturante e formadora de homens e mu- rentes métodos, aproximando-se de uma cons-

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lheres mais criativos para uma vida melhor. Con- trução etnoepidemiológica (Fernandes, 2003). O
traditoriamente, é nesse trabalho que homens e recorte aqui adotado focaliza os determinantes,
mulheres, caracterizando o trabalho humano, os fatores de risco e as exigências das tarefas re-
inteligente por natureza (Wisner, 1994), adotam lacionadas com os distúrbios musculoesqueléticos
estratégias que refletem as diferentes formas de (DME), em um percurso que vai dos resultados
resistência e revelam seu saber-fazer frente ao extensivos, quantitativos, aos resultados qualita-
real do trabalho. tivos, vistos em maior profundidade e na sua
Os resultados do estudo conduzido reve- singularidade.
lam a face mais difícil do cotidiano do trabalho, Tomar o caso dos DME neste artigo justi-
uma morbidade flagrantemente perversa, consi- fica-se por mais de uma razão. A morbidade
musculoesquelética vem se configurando no
* Professora Adjunto da Faculdade de Medicina da Univer- mundo inteiro como uma relevante questão de
sidade Federal da Bahia - UFBA. Doutora em Saúde Públi-
ca/Epidemiologia pela UFBA, com estágio na McGill saúde pública, representando um alto custo so-
University, Montreal, Canadá, como bolsista da CAPES. cial, econômico e humano, resultando, não
Av. Reitor Miguel Calmon, S/N. Canela. Cep: 40420-060 -
Salvador - Bahia - Brasil. ritafernandes@ufba.br. infrequentemente, em sequelas e ou incapacida-

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de para o trabalho, podendo levar a aposentado- adquiridos pelo trabalhador quando submetido
rias (Marras et al., 2009; EASHW, 2007; NRC/ a determinadas condições de trabalho. Tais qua-
IM, 2001). Além disso, os DME têm como prin- dros clínicos se caracterizam pela ocorrência de
cipal expressão a dor, sintoma que reflete, mais vários sintomas, concomitantes ou não, de apa-
do que qualquer outro, a repercussão física e psí- recimento insidioso, geralmente nos membros
quica de um sofrimento humano. O trabalho superiores, tais como dor, parestesia, sensação
precário é também um trabalho “doloroso”, ou de peso e fadiga (Brasil, 2000, 2006).
seja, penoso, que expropria a saúde, muitas ve- Embora haja uma estreita relação entre o
zes insidiosamente. E é de forma insidiosa que trabalho informatizado e o aparecimento das quei-
os DME se instalam. xas musculoesqueléticas como fenômeno contem-
Datam dos anos 1980 os estudos sobre a porâneo – resultante das mudanças impostas ao
morbidade musculoesquelética, realizados entre trabalhador nos novos postos estruturados para
os australianos, que, desde então, já alertavam o trabalho, realizado, em geral, na posição sen-
para o fato de que tada, com isolamento do corpo e uso excessivo
de alguns segmentos, a exemplo das extremida-
as alterações do sistema musculoesquelético po- des superiores distais (dedos, mãos, punhos) –,
dem se manifestar inicialmente com quadros sin-
tomáticos de dor que ocorrem durante a jornada esse adoecer não é prerrogativa da revolução de
de trabalho, desaparecendo com o repouso e, as- base eletrônica, embora venha na sua esteira. Essa
sim, mantendo a capacidade para o trabalho. Es-
ses sintomas dolorosos são potencialmente re- forma de adoecimento no trabalho guarda estrei-
versíveis. No entanto, podem evoluir, atingindo ta relação com as diferentes modalidades de ges-
estágios clínicos que são incompatíveis com o tão do trabalho e gestão da produção também na
desempenho das tarefas, obrigando ao afastamen-
to do trabalho (Browne et al., 1984). indústria, particularmente durante e após as mu-
danças introduzidas pela reestruturação produti-
No Brasil, o Ministério da Previdência Social va. As demandas sobre o corpo, sobre as capaci-
(MPS) informa que os Distúrbios Osteomusculares dades cognitivas e psíquicas, em um ambiente de
Relacionados ao Trabalho (ou Lesões por Esfor- trabalho transformado para responder às novas
ços Repetitivos) representam as doenças exigências de um mercado competitivo, podem
ocupacionais mais frequentes no país (Brasil, se expressar nas queixas musculoesqueléticas.
2010). Esses quadros, como é amplamente sabi- Evidências acumuladas de estudos
do, incluem diferentes entidades nosológicas do epidemiológicos indicam a associação entre os
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sistema musculoesquelético, a exemplo das DME e demandas físicas no trabalho, como


sinovites e tenossinovites, das síndromes repetitividade, posturas anômalas e força. Quan-
compressivas, como a síndrome do túnel do carpo to às demandas psicossociais, as teorias correntes
e tantas outras. Essas informações do MPS dizem para explicar sua relação com os DME são aque-
respeito aos casos de trabalhadores segurados pela las que associam diretamente o estresse gerado
Previdência Social, que fazem jus ao seguro aci- por essas demandas ao aumento da atividade
dente de trabalho (SAT) e que tiveram sua doen- muscular e aquelas que admitem haver uma in-
ça reconhecida como relacionada ao trabalho pela fluência desse estresse sobre a percepção dos
perícia, representando apenas uma parcela dos DME. Ou seja, consideram que, na presença de
trabalhadores acometidos pelo agravo. condições de trabalho estressoras, haveria uma
O conceito de Lesões por Esforços Repetitivos reduzida habilidade dos trabalhadores para lidar
ou Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao com os sintomas, aumentando sua percepção. No
Trabalho (LER/Dort) adotado pelo Ministério da caso da atividade muscular aumentada, uma via
Saúde para essa morbidade ocupacional designa neuroendócrina, com elevação de epinefrina,
quadros clínicos do sistema musculoesquelético neuroepinefrina e cortisol, tem sido indicada como

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resposta às demandas psicossociais (NRC/IM, PERCURSO METODOLÓGICO


2001, Huang et al., 2002).
O modelo demanda–controle–suporte de Há um debate contemporâneo a respeito
Karasek (1998) tem sido amplamente utilizado em das diferentes estratégias e técnicas de pesquisa
estudos epidemiológicos para explicar a associa- mais adequadas para abordar os DME, em espe-
ção entre demandas psicossociais e DME (Huang cial acerca da avaliação da exposição ocupacional
et al., 2002, 2003; Devereux et al, 1999, 2002; (Stock et al., 2005). A Epidemiologia tem dado
Fonseca; Fernandes, 2010). Segundo esse mode- irrefutável contribuição ao estudo desses qua-
lo, a alta demanda psicológica – em especial, o dros, especialmente ao revelar a magnitude e a
ritmo de trabalho – determina tensão e dor mus- distribuição do problema em populações de tra-
cular. No entanto, os trabalhadores que têm alto balhadores e, especialmente, ao identificar seus
grau de controle (alto grau de latitude de decisão) fatores de risco. Mas há limites do método
podem mais facilmente escolher as tarefas, fazer epidemiológico, que, embora não constituam um
pausas e adotar posturas que sejam menos onero- problema para o conhecimento acerca da magni-
sas para o corpo, tornando o trabalho possível de tude dos DME, podem ser importantes quando a
ser realizado sem efeitos sobre o sistema produção de conhecimento objetiva subsidiar as
musculoesquelético. O suporte social, ao permi- ações de controle e de prevenção desses agravos
tir o compartilhamento do trabalho com colegas nos ambientes de trabalho. Nesse caso, essas in-
e supervisor, reduziria as demandas físicas e psi- tervenções, baseadas exclusivamente nos resulta-
cológicas (Theorell et al., 1991). Mas a alta de- dos quantitativos e extensivos, podem ser insufi-
manda, o baixo controle e o baixo suporte geram cientes. Isso porque, ao se considerar a diversida-
estresse, com os possíveis mecanismos de lesão já de de contextos e relações no mundo do trabalho
referidos sobre o sistema musculoesquelético, o e a existência do saber-fazer cotidiano, de dife-
que acarreta não apenas a impossibilidade de re- rentes modos operatórios e competências, fica
duzir a exposição às demandas físicas, mas atua difícil conceber intervenções sobre os riscos no
diretamente sobre a atividade muscular (NRC/IM, trabalho (os quais, quando implementados, in-
2001; Huang et al., 2002). terferirão no modo operatório dos trabalhadores)
Objetiva-se, no presente texto, tomar a dor que ignorem esses sujeitos na sua atividade coti-
musculoesquelética, socialmente reconhecida na diana, cuja complexidade revela a variabilidade
sua relação com o trabalho como LER/Dort, como das situações. Portanto, essa complexidade não
morbidade que representa a expressão do pode ser alcançada pelo método epidemiológico
desequilíbrio entre capacidades humanas de pro- isoladamente (Fernandes, 2003). Em concordân- CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011
dução e modalidades de organização do traba- cia com isso, identificaram-se alguns autores que
lho. Esse desequilíbrio resulta na insuficiência questionam até onde intervenções voltadas para
das estratégias de prevenção do adoecimento o controle de fenômenos complexos, como os
adotadas pelos trabalhadores. Neste texto, serão episódios de saúde, identificados sem conside-
discutidos alguns resultados epidemiológicos so- rar a singularidade do adoecer humano, pode-
bre DME e resultados baseados na Análise rão obter respostas mais satisfatórias (Sevalho;
Ergonômica do Trabalho (AET), a fim de forne- Castiel, 1998).
cer alguns elementos para as reflexões acerca da Com base nisso é que os estudos sobre os
precarização e intensificação do trabalho na in- DME podem se beneficiar ao aliar à abordagem
dústria, por meio do segmento econômico de epidemiológica a AET, corrente teórico-
material plástico. metodológica da Ergonomia, de corte etnológico.
Em função da sua conhecida faceta de dis-
ciplina aplicada, a Ergonomia tem sido hegemo-

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nicamente identificada com o estudo de condi- sões apresentadas neste texto, é composta por tra-
ções fisiológicas e biomecânicas do trabalho físi- balhadores inseridos em indústrias produtoras de
co, na qual se reserva um importante capítulo material plástico da Região Metropolitana de Sal-
para a antropometria e para o estudo e adequa- vador (RMS). A opção metodológica de selecio-
ção de mobiliários dos postos de trabalho. Esse nar empresas de um mesmo ramo industrial, o
modelo se distancia dos propósitos da AET, que ramo plástico, ao invés da seleção de diversas
tem como objeto de estudo a atividade de traba- empresas de ramos industriais distintos, foi ado-
lho, produzindo conhecimentos relacionados tada com base na compreensão de que o acesso às
com a ação e cognição situadas. Recusa o estudo fábricas, o desenvolvimento dos estudos, bem
da situação de trabalho através dos modelos como a interlocução dos pesquisadores com os
laboratoriais e das simulações em condições ide- atores sociais organizados e interessados na con-
ais. Para os autores da AET, por exemplo, a pos- dução da pesquisa – especialmente para adoção
tura de trabalho não resulta apenas de decisões de medidas de controle e prevenção que fossem
e hábitos pessoais; ao contrário, é determinada recomendadas –, são etapas que devem envolver
pela inter-relação complexa dos múltiplos fato- empregadores e trabalhadores identificados a par-
res constituintes da situação de trabalho (Lima, tir de suas organizações representativas. Portan-
2000). Essa perspectiva – da análise situada do to, a opção pelo ramo plástico orientou-se por
trabalho – é o essencial nessa escola. Não há pa- pressupostos epidemiológicos, tecnológicos e so-
drões antropométricos ou situações ideais: há ciais. Ou seja, definiu-se pela realização de estu-
contextos de trabalho e sujeitos em atividade, dos com uma população possivelmente exposta
em relação dinâmica. aos fatores de risco para DME, o que delimitou o
A AET compartilha os princípios gerais contexto epidemiológico, considerando, no entan-
da abordagem etnográfica como estratégia do to, além disso, o processo produtivo com caracte-
estudo da atividade, e utiliza como técnica de rísticas tecnológicas próprias no qual se insere essa
estudo a observação participante, com a parti- população e a demanda social dos atores princi-
cularidade de incluir a entrevista em pais envolvidos (Pinheiro, 1996; Machado, 1996).
autoconfrontação (Lima, 2000a; Wisner, 1996).
Toma como pressuposto que, dentro dos limites
impostos pela organização do trabalho e pela di- Métodos e técnicas da pesquisa
visão social do trabalho, específicas em cada caso,
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há uma margem de manobra na qual os traba- Em uma primeira etapa da investigação,


lhadores estabelecem algumas estratégias. foi realizada a caracterização das empresas plásti-
Para realizar a tarefa (trabalho prescrito), o cas, como aproximação do campo de estudo. To-
homem desenvolve certa atividade (trabalho real), das da RMS, com mais de 35 empregados, foram
entendida como o modo pelo qual, numa situa- elegíveis. Do total de 17 empresas existentes à
ção de trabalho, ele se relaciona com os objetivos época, três se recusaram a participar do estudo.
propostos, com a organização do trabalho e com Foram feitas visitas a todas as áreas de produção
os meios fornecidos para realizá-los. Nesse con- das 14 unidades fabris que concordaram em par-
texto, o trabalhador se move, gesticula, olha, es- ticipar do estudo. Nessa etapa de visita às empre-
cuta, se comunica; organiza seu trabalho, planifi- sas, foram observados aspectos do funcionamen-
ca suas ações, raciocina, toma decisões, controla to e da organização da produção; foram registrados
os resultados; colocando em ação suas funções os resultados dessa observação de ordem geral e
fisiológicas e mentais (Guérin et al., 2001). também as informações coletadas junto aos
A população de referência para os estu- prepostos das empresas e junto aos trabalhado-
dos, cujos resultados serão a base para as discus- res. Ademais, foram feitos registros fotográficos.

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Em seguida, utilizando roteiro semiestruturado, cional, incluindo vínculos formais e informais,


realizaram-se entrevistas com diretores ou pro- jornada de trabalho diária e semanal, demandas
prietários de fábricas, encarregados de pessoal, físicas no trabalho e ambiente físico do posto de
gerentes industriais, encarregados de produção, trabalho; demandas psicossociais no trabalho; uso
representantes sindicais dos empregadores e re- de fumo, medicamentos, consumo de bebidas al-
presentantes sindicais dos trabalhadores. Duran- coólicas; e trabalho doméstico, atividades físicas,
te as entrevistas, foram obtidos dados sobre: histó- esportivas, grau de condicionamento físico. Incluía
ria da empresa e sua política de desenvolvimento ainda questões sobre DME e outras informações
(origem, estrutura administrativa, estratégias); de saúde (antecedentes de fratura, história de dia-
mercado (consumidores ou clientes, regulamenta- betes, artrite reumatoide e hipotireoidismo).
ção e concorrência); geografia da empresa (locali- Para identificar os casos de DME, foi utiliza-
zação, aprovisionamento de matérias-primas e de da uma tradução do Nordic Musculoskeletal
materiais de consumo, vias de acesso, mercado de Questionnaire - NMQ (Kuorinka; Forcier, 1995) para
mão de obra, qualidade do tecido industrial e soci- o português, feita pela autora. As questões avaliam
al de suporte); organização da produção (processo gravidade, duração e frequência dos sintomas em
produtivo, tecnologia e técnicas de produção, todas as áreas corporais, visando a melhorar a
automação); procedimentos operacionais e do fun- especificidade da sintomatologia. Definiu-se como
cionamento do setor ou serviço (em especial, as caso de DME a dor verificada nos últimos doze
exigências de produção, de qualidade e de segu- meses, com duração mínima de mais de uma
rança); regras formais da organização do trabalho semana ou frequência mínima mensal, acompa-
individual e coletivo (horários, formas de rodízio, nhada de pelo menos um dos seguintes sinais de
postos, hierarquia, grau e formas de terceirização, gravidade: grau de severidade ≥ 3, em uma esca-
divisão de tarefas, funções, formas de remunera- la numérica de 0 a 5, com âncoras nas extremi-
ção e de controle).1 dades (nenhum desconforto a desconforto insu-
Na etapa seguinte, o componente epide- portável); busca de atenção médica pelo proble-
miológico utilizou o desenho de corte transver- ma; ausência ao trabalho (oficial ou não); mu-
sal. De uma população formada por 1.177 traba- dança de trabalho por restrição de saúde.
lhadores inseridos nas 14 unidades fabris do ramo Quanto à localização da dor, foram consi-
plástico na RMS, foi retirada uma amostra aleató- deradas as seguintes áreas corporais: dedos, pu-
ria, estratificada e proporcional de 557 trabalhado- nhos, mãos, antebraços, cotovelos, pescoço,
res para estudo. ombro, região alta das costas, região lombar, qua-
Para a coleta de dados, um questionário foi dril e coxas, joelhos, pernas ou tornozelos. CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011
pré-testado e aplicado através de entrevista den- A demanda física no trabalho foi avaliada
tro de cada empresa participante, durante o ex- através de questões respondidas pelo trabalha-
pediente de trabalho, em local reservado. A equi- dor em uma escala de 0 a 5 (de duração,
pe de entrevistadores foi treinada previamente, frequência ou intensidade, a depender da variá-
incluindo esclarecimentos acerca de cada item do vel). Questões sobre movimentos repetitivos com
questionário e alternativas de resposta, participa- as mãos, força exercida com braços ou mãos,
ção em simulações de situação de entrevista e em postura no trabalho, posição sentada, em pé ou
um estudo-piloto com entrevistas a trabalhado- andando, braços elevados acima da altura dos
res durante o expediente normal de trabalho. ombros, tronco inclinado para frente e tronco
O questionário continha perguntas sobre: rodado, levantamento de carga e pressão por
condições sociodemográficas; história ocupa- contato, foram selecionadas para análise.
1
Os aspectos psicossociais do trabalho fo-
Descrição detalhada dessa etapa encontra-se em Fernandes
et. al (2010c). ram medidos através do Job Content Questionnaire

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(JCQ), cujas questões permitiram a obtenção dos Várias unidades fabris instaladas desde a dé-
escores para demanda psicológica, controle e su- cada de 1980 foram encontradas, de pequeno ou mé-
porte social (Karasek, 1985; Araújo; Karasek, 2008). dio porte, e empresas com implantação mais recente
A análise incluiu uma etapa descritiva dos procedentes do sudeste do país. A capacidade de pro-
dados e uma análise multivariada para verificar dução das unidades mais novas, em geral, superava a
os fatores associados aos DME, conduzida através das empresas previamente instaladas no Estado
de regressão logística (RL) não-condicional (des- (Figuras 1, 2). Esse diferencial na capacidade de pro-
crição detalhada dos métodos, técnicas e instru- dução determinou alterações no panorama de
mentos em Fernandes et al., 2010a). competitividade, com mudanças na gestão dos negó-
O último componente da investigação foi cios e, consequentemente, na gestão da produção e na
desenvolvido através da AET, baseada no mode- gestão de pessoal, com novas tarefas e novas exigênci-
lo proposto por Guérin et al. (2001), em uma as postas aos trabalhadores.
das unidades fabris, no setor de acaba-
mento de embalagens plásticas.
Realizou-se uma análise do pro-
cesso técnico e das tarefas com observa-
ções globais da atividade. Uma vez feito
um pré-diagnóstico, foi definida a situa-
ção para análise, e então conduzida a
observação sistemática a partir de um
plano de observação.
Buscou-se estabelecer relações en-
tre variáveis do contexto físico e social e a
atividade situada do trabalhador, consi-
derando sua dinâmica própria, isto é, pre-
servando a organização temporal e espa-
cial (Suchman, 1994; Guérin et al., 2001).
Assumiu-se que os DME podem re-
sultar de modos operatórios adotados em
decorrência dos limites rígidos da orga-
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nização do trabalho e das condições ob-


jetivas impostas ao sujeito que trabalha
(descrição detalhada da AET em
Fernandes et al., 2010b).

DE ALGUNS RESULTADOS À DISCUSSÃO

O que o estudo do funcionamento e or-


ganização das empresas revela?

Ao estudar empresas do ramo plástico na Nessa corrida, observaram-se diversas es-


RMS, foram constatadas profundas alterações na tratégias adotadas pelas empresas, que resulta-
organização da produção e do trabalho, ressalvada ram, entre outras consequências, no fechamen-
alguma heterogeneidade entre as empresas. to de algumas unidades fabris, gerando demis-

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sões de trabalhadores em geral, e das trabalha- deu através da hipersolicitação dos trabalhado-
doras em especial, que tinham uma inserção res, que passaram a acelerar seu ritmo durante a
maior nesse ramo industrial do que em outros jornada de trabalho, ao tempo em que realizavam
(uma fábrica de embalagens que realizava exclu- tarefas com exigência de força, repetitividade e
sivamente as etapas de acabamento de embala- adoção de posturas anômalas. Essas posturas fo-
gem chegou a ter uma presença feminina de 84% ram resultantes de uma situação restritiva, em
no quadro de pessoal) (Figura 3). A reabertura de que o uso confortável do corpo, produzindo
novas unidades fabris em áreas urbanas de muni- mudanças no arranjo corporal, não era compatí-
cípios menores da RMS, com a fragmentação do vel com a execução da tarefa, conforme discute
ciclo da produção (antes realizado em uma única Lima (2000).
unidade, de maiores dimensões e maior quantida- As jornadas de trabalho também foram
de de empregos, situada em polo industrial), visou objeto de mudanças. Além do caráter sazonal
à redução do custo de produção e redução de cus- de algumas fábricas – o que implicava períodos
tos, entre outros, com a desobrigação da alimenta- de extensão de jornada para atender à demanda
ção e transporte de trabalhadores. de produção e os prazos para escoamento dos
produtos para o mercado (como é o caso
do Dia das Crianças e do Natal para a
produção de brinquedos e bonecas) –, ob-
servou-se a utilização da modalidade de
banco de horas. Nas palavras do gestor
de uma das unidades fabris, “... este sis-
tema compensa as jornadas mais longas
no período de maior produção, com féri-
as e folgas coletivas no período de menor
atividade”. Mas essa afirmação não foi
compatível com o observado: no período
que seria de baixa produção e suposta-
mente destinado às compensações, a jor-
nada nessa unidade chegou, em alguns
As mudanças constatadas neste estudo setores, a cinquenta horas por semana. Além dis-
configuram um cenário no qual, embora os tra- so, 85,4% dos trabalhadores dessa fábrica, nesse
balhadores sejam contratados formalmente pela período, trabalhavam em horas extras. A con- CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011
empresa, as características do emprego permiti- tradição entre o informado durante as entrevis-
ram identificá-lo com o que a literatura traz tas com gestores, acerca da possibilidade de com-
como emprego precário, com limitados benefí- pensação com férias e folgas, e o constatado nas
cios sociais, profunda insegurança no trabalho, observações, estava no fato de essa empresa ter
curto tempo de manutenção do emprego e bai- assumido novos contratos para a fabricação de
xos salários (Lewchuk et al., 2003, 2005) . itens no período que seria de baixa produção.
Nesse panorama da indústria de material Analisando os efeitos da precarização do traba-
plástico na RMS, o aumento de produtividade lho, Franco e colaboradoras (2010, p.232) cha-
ocorreu com a intensificação do trabalho. O rit- mam a atenção para o fato de que “os tempos
mo de produção com máquinas novas chegou a sociais do trabalho (ritmos, intensidade, regimes
aumentar em mais de 50%, ultrapassando, mui- de turnos, hora extra, bancos de horas) encon-
tas vezes, a capacidade prevista para o maquinário. tram-se em contradição com os biorritmos dos
Constatou-se que a intensificação do trabalho se indivíduos, gerando acidentes e adoecimento”.

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Para entender como os trabalhadores se quado para o entendimento do uso excessivo do


relacionam com as condições reais, é necessário corpo no trabalho, nas condições de intensifica-
se apropriar da noção de estratégias de regulação ção e precarização, para o surgimento e manu-
e modos operatórios que são adotados, levando tenção dos quadros de dor músculo-esquelética.
em conta os resultados a atingir. Em situações de Evidenciou-se que a gestão da produção era ori-
trabalho sem restrições (perturbações relativas aos entada preponderantemente pela demanda de
meios e objetivos da produção), ou em situações mercado e, independentemente da infraestrutura
em que os trabalhadores detêm certa margem de disponível e da capacidade instalada, os contra-
manobra (ou autonomia), as estratégias provocam tos de venda eram efetivados. Na verdade, ao
modificação dos objetivos ou dos meios, adequan- aceitar a demanda dos clientes por produtos não-
do-os, com o fim de assegurar a conclusão da ta- previstos na linha de produção habitual, ou pro-
refa e minimizar o esforço e a fadiga. No caso em dutos com os quais a força de trabalho não vi-
estudo, por exemplo, tal margem de manobra se nha lidando mais recentemente, os gestores da
expressaria na possibilidade de descansar as es- produção estabeleciam um cenário de fortes exi-
truturas musculares uma vez que a fadiga se ma- gências cognitivas e motoras, sob pressão de tem-
nifestasse, interrompendo a tarefa, compartilhan- po. Observou-se que era gerado um ambiente
do seu cumprimento com o colega ou reduzindo improvisado, com exiguidade de recursos físicos
o ritmo de execução. No entanto, observaram-se – tais como máquinas em condições de funciona-
situações restritivas, de intensificação do traba- mento e quantidade suficiente – e ausência de
lho, com a ocorrência de grande número de per- oportunidades de aprendizagem das novas habi-
turbações no desenvolvimento das tarefas. Dian- lidades requeridas, ou oportunidades de
te disso, os trabalhadores tentavam regular essas reciclagem dos trabalhadores que lidariam de ime-
perturbações para assegurar a produção, mas a diato com as exigências impostas pela fabricação
conclusão da tarefa se impunha à custa de fadiga de novos produtos. Essa modalidade de gestão,
e desconforto, não sendo possível ao trabalhador que revela a precarização das condições de traba-
(sem qualquer grau de autonomia) agir sobre os lho, acarretou o aumento das demandas físicas e
objetivos (modificando o ritmo predefinido) ou psicossociais (baixo controle, alta demanda psi-
os meios (obtendo recursos de ajuda). Assim, cológica, baixo suporte de supervisores e colegas).
mantidas as restrições, os efeitos adversos à saú- As demandas psicossociais se expressaram, entre
de tiveram lugar (Figura 4). outros, pelo ritmo acelerado e pela impossibilida-
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Esse modelo de regulação tem sido ade- de de se fazer pausas devido à pressão temporal
para atender às exigências de produção.

Sobre a dimensão do problema

Encontraram-se elevadas prevalências


de dor, com 64% dos trabalhadores refe-
rindo-se à sua ocorrência em algum seg-
mento do corpo nos últimos doze meses.
Quando se aplicaram os critérios de dura-
ção, frequência e gravidade, a prevalência
foi de 50,1%. Essa última prevalência re-
fere-se a uma dor músculo-esquelética
com duração de mais de uma semana ou

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frequência mínima de uma vez por mês, o que tema de Informação de Agravos de Notificação),
causou alguma mudança na capacidade para o não há informação consolidada para morbidade
trabalho ou procura de médico, com gravidade ocupacional no país, incluindo os dados sobre a
três ou mais, em escala de zero a cinco. Estimar ocorrência de DME entre os trabalhadores, in-
essa prevalência trouxe como consequência a re- dependentemente de sua vinculação securitária.
flexão acerca do que ela representa, consideran- O que há disponível é constituído por dados da
do tratar-se de trabalhadores em plena ativida- Previdência Social, que se restringem à popula-
de de trabalho, com jornadas longas, e 71% de- ção com vínculo formal de emprego, beneficiária
les realizando horas extras. O achado de dor com do auxílio-acidentário. Considerando que mais
duração de mais de uma semana, ou que se re- de metade dos trabalhadores está fora desse se-
petia todo mês, determinando a busca de aten- guro social, os dados da Previdência revelam
ção médica para o problema, ou redução da ca- apenas uma parte do problema.
pacidade para o trabalho, mostrou a importân- A incidência de DME incapacitantes e que
cia dessa morbidade e o comprometimento da geraram afastamento do trabalho e benefício
saúde desses trabalhadores, que, ademais, reali- previdenciário foi de 15 casos/10.000 trabalha-
zavam tarefas com altas exigências sobre esses dores no ano de 2008 no município de Salvador,
corpos que doíam. Além da gravidade da dor segundo Souza (2010), que realizou importante
experimentada nos últimos doze meses de tra- estudo de incidência. Essa autora comparou tal
balho, mais achados corroboraram a importân- incidência àquela encontrada para casos
cia dessa morbidade no que se refere à sua si- incapacitantes da doença nos Estados Unidos
multaneidade com o exercício das tarefas: 20,6% (EUA), de 3,2 casos/10.000. Portanto, a incidên-
dos trabalhadores relataram dor em região de cia em Salvador é mais de 4 vezes maior que a
pescoço, ombro ou parte alta das costas nos últi- incidência americana. Considerando que, no Bra-
mos doze meses; essa dor tinha duração de mais sil, o benefício previdenciário apenas é recebido
de uma semana ou frequência mínima mensal, após 15 dias de afastamento e que os dados para
com redução da capacidade para o trabalho ou os EUA se referem a casos de um dia ou mais,
busca de atenção médica, ou com média a alta constata-se que a diferença acima pode ser mui-
intensidade (três a cinco). Desses trabalhadores, to maior se feita uma comparação com casos de
cerca de 65% apresentaram dor nessa região cor- incapacidade de um dia ou mais no Brasil.
poral nos últimos sete dias, e mais da metade dos Os resultados do presente estudo com tra-
que se referiram a dor em extremidades superio- balhadores industriais do ramo plástico da RMS,
res distais (punhos, mãos ou dedos) também dis- que se encontravam no seu labor diário, ou seja, CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011
seram que ela havia ocorrido nos últimos sete dias não estavam afastados do trabalho, permitem afir-
(Fernandes et al., 2011). Mascarenhas (2010), uti- mar que os dados de adoecimento por DME das
lizando o mesmo banco de dados, analisou espe- estatísticas oficiais da Previdência Social, como as
cificamente os DME em pescoço, ombro e parte referidas acima (Souza, 2010), não revelam o enor-
alta das costas, observando que, entre os traba- me contingente de homens e mulheres que se en-
lhadores expostos às demandas físicas no traba- contra trabalhando com dor músculo-esquelética.
lho, a prevalência de dor passou de 20,6% Essa pode ser a face mais perversa do fenômeno: o
(prevalência geral) para 36,7%. sujeito com dor é obrigado a seguir trabalhando
Os quadros clínicos incapacitantes de DME sob as mesmas condições geradoras da dor. Esse
em trabalhadores da indústria constituem par- quadro pode ser compreendido como expressão
cela relevante da demanda aos Serviços de Saú- da precarização da saúde dos trabalhadores e está
de do Trabalhador do Sistema Único de Saúde. diretamente ligado à precarização da organização e
Devido à incipiente estruturação do SINAN (Sis- das condições de trabalho (Franco et al., 2010).

163
PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO E OS DISTÚRBIOS ...

Para compreender a origem do problema: um dade. Observar apenas a linha de produção, ad-
olhar mais de perto mitindo-a estável ao longo do tempo, não permiti-
rá identificar perturbações que podem ser estrutu-
A dor pode ser a expressão do desequilíbrio rais em determinados cenários do mundo do tra-
entre as capacidades humanas de produção e balho e acarretarão sobrecarga para quem trabalha.
determinadas modalidades de organização do As perturbações podem ser mais facilmente
trabalho. A dor que a cada dia maltrata e que, na evidenciáveis, como no caso das insuficiências
precariedade daquela vida, já é uma velha conheci- relativas ao mobiliário e instalações físicas. Em
da, varia em intensidade, segundo as variabilida- função do mau estado de conservação das máqui-
des do sistema de trabalho. No curso da AET, hou- nas, foram frequentes seus problemas de funcio-
ve referência a uma dor habitual, aquela que inco- namento, ocorrendo, muitas vezes, interrupções
modava ao final da jornada, que melhorava com dos ciclos de trabalho, com a consequente neces-
uso de analgésico, mas reincidia (frequentemente sidade de os operários acelerarem o ritmo para
com maior intensidade) em função de perturbações compensar o tempo perdido e não comprome-
no sistema de trabalho. Um exemplo de perturba- ter as metas. Nessa situação de variabilidade do
ção evidenciada foi a presença do “saco duro”. O processo, à repetitividade de movimentos e à
“saco duro” era uma referência ao filme plástico com adoção de posturas anômalas se associava a pres-
o qual se fabrica a embalagem plástica. Quando esse são temporal para viabilizar o desenvolvimento
filme resulta de um processo industrial de extrusão das tarefas, em ciclos cuja duração variava de
plástica, no qual se misturam grânulos de 4,9 a 14 segundos. De acordo com Kilbom (1994),
polipropileno sem uso prévio (resina virgem) com trabalho cíclico é aquele que implica ciclos que
grânulos de material plástico reciclado, ocorre re- se repetem durante a realização de uma tarefa,
dução do custo de produção. Tal filme plástico é de com duração inferior a 30 segundos, ou aquele
difícil manuseio, pois não permite o livre deslizar cujo componente essencial do ciclo ocupa mais
das faces da embalagem. Essa variabilidade do sis- do que 50% do ciclo total. Assim, no trabalho
tema (relativa à matéria-prima) determinava mudan- cíclico na indústria, conjugavam-se exigências
ças no modo operatório das trabalhadoras, a fim de sobre o corpo e exigências cognitivas. Uma
lidar com uma perturbação e garantir a conclusão regulação adotada deve ser acomodada no tem-
da tarefa: em um trabalho manual cíclico, cujos ci- po mínimo possível, a fim de não comprometer
clos podiam durar menos de cinco segundos, pro- a duração dos ciclos seguintes. Se a duração to-
CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011

movia-se um enorme esforço de repetitividade com tal de um ciclo era de cinco segundos, uma
resistência. Assim, decisões da gestão visando à re- regulação para ajuste de perturbação nesse ciclo
dução do custo de produção podiam produzir, à não podia representar uma proporção significa-
jusante – no setor de acabamento da embalagem –, tiva do tempo total. Delineou-se, assim, o con-
sobrecarga física, representada pela atividade que texto favorável para instalação da dor.
demandava mais força com as mãos para superar a A noção de variabilidade é central para
resistência para separação das faces da embalagem, entender que, embora o trabalho seja repetitivo,
associada à repetitividade de movimentos com algu- ele muda (Assunção, 2002). Essa variação, em
ma precisão. Essa reunião de demandas físicas no contexto repleto de restrições e estreita margem
exercício da tarefa, sob pressão de tempo, promoveu de manobra, impõe ao trabalhador a necessidade
condições ideais para instalação da fadiga das estru- de lidar com o que varia e regular aquilo que varia
turas corporais envolvidas e surgimento de dor. (no sentido de superar as dificuldades e concluir
Situações como a que é descrita acima ape- a tarefa), sem a garantia de que isso não repercu-
nas serão evidenciadas através de uma abordagem tirá negativamente, por exemplo, em termos de
que privilegie a análise do trabalho em profundi- prejuízo de tempo na execução da tarefa.

164
Rita de Cássia P. Fernandes

Um diferencial de gênero setores de acabamento de produtos. Constatou-


se a prática de contratação de mulheres com títu-
Tanto resultados epidemiológicos quanto os los de ocupação inferiores aos dos homens para
resultados obtidos através da AET revelaram dife- funções equivalentes; além disso, a elas eram re-
renças entre homens e mulheres na distribuição servadas as tarefas que implicavam alta
da exposição às demandas físicas e, particular- repetitividade aliada à precisão de movimentos
mente, aos gestos repetitivos. Tais gestos, embo- (Fernandes et al., 2010c).
ra presentes em quase todas as tarefas, foram No processo de precarização do trabalho,
constatados predominantemente no trabalho fe- as diferenças de gênero se explicitam. A incorpo-
minino. A situação das mulheres no trabalho ração da força de trabalho feminina no mercado
nessa indústria foi fortemente marcada pela sub- de trabalho ocorre à custa, muitas vezes, da sub-
missão, sem escolha, às condições adversas de missão de mulheres a situações desvantajosas
contratação e de manutenção do trabalho. A força quanto à carreira, ao tipo de inserção e nível sala-
de trabalho feminina podia ser “muito farta” em rial. Além disso, o lugar destinado às mulheres
alguns municípios da RMS, nos dizeres de um tem sido marcado pela presença de fatores de ris-
dono de fábrica. A maior disponibilidade dessas co para a saúde, como são os trabalhos que se
mulheres acarretava uma condição desfavorável caracterizam pela repetitividade das tarefas. Dis-
para essa força de trabalho na sua interlocução cute-se, assim, a maior vulnerabilidade das mu-
com os empregadores, ou seja, havia o corres- lheres nesse processo (Brito, 2000).
pondente a um “exército de reserva”. Entre os trabalhadores que estavam em ati-
Além da inserção desvantajosa das mu- vidade, não-afastados, trabalhando com dor, a
lheres nas fábricas, as exigências das tarefas im- maior proporção era de mulheres. Elas apresen-
punham uma situação que resultava na sobre- tavam prevalências superiores às dos homens para
carga física e psíquica. Considerando as condi- quadros de DME em membros superiores, três
ções adversas em que o trabalho se dava, a ne- vezes o valor de prevalência para os homens nas
cessidade de regulação das perturbações impli- extremidades superiores distais (34,6% e 11,6%,
cava a aceleração da execução das tarefas. No respectivamente) e 1,5 vezes o valor na região de
caso das mulheres, essa aceleração era mais que pescoço, ombro ou parte alta do dorso (27,4% e
uma exigência de produtividade, passando a ser 17,6%, respectivamente) (Fernandes et al., 2011).
uma habilidade necessária para manutenção do Além dos resultados descritivos, os resul-
emprego. O medo de perder o emprego provo- tados analíticos exploratórios revelaram que as
cava, nessa força de trabalho feminina, uma mí- mulheres apresentaram, de forma consistente, CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011
nima vocalização no ambiente de trabalho e a uma maior prevalência de DME em extremida-
submissão incondicional às precárias condições. des superiores distais (dedos, mãos e punhos),
Segundo Franco e colaboradoras (2010, p.231), com 2,25 vezes o valor da prevalência para os
essa é uma característica marcante do processo homens, mesmo após considerar as demais vari-
de precarização, ou seja, “a forte pressão de tem- áveis, em análises multivariadas (Fernandes et
po, somada à intensificação do controle ou da al., 2010a). Ou seja, embora a maior prevalência
instrumentalização do medo à demissão, con- fosse parcialmente explicada pela maior exposi-
duzem à intensificação do trabalho”. ção das mulheres à repetitividade, o efeito resi-
As mulheres estavam presentes no ramo dual, ou seja, o obtido após ajuste para as demais
plástico na RMS em proporção pouco usual em variáveis, incluindo a exposição ocupacional, foi
outros ramos industriais, representando 30% da um resultado independente dessa exposição.
população, e estavam engajadas principalmente Outros autores têm encontrado elevadas
nas atividades operacionais e, dentre essas, nos prevalências de DME em extremidades superio-

165
PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO E OS DISTÚRBIOS ...

res para mulheres em vários grupos ocupacionais. extras, mais frequentes entre as mulheres. A exi-
Entretanto, a explicação para essas diferenças gência de horas extras para as mulheres pode
entre os sexos ainda é controversa (Strazdius; indicar também a submissão da força de traba-
Bammer, 2004; De Zwart et al., 2001; Kelsh; Sahl, lho feminina às imposições do empregador.
1996; Silverstein et al., 1986, 1987). É importante ressaltar que a maior
A despeito da segregação de homens e mu- morbidade entre as mulheres, encontrada em
lheres no trabalho, com tarefas diferentes, embora uma população que estava em plena atividade
sob títulos de ocupação iguais, resultando em ex- nas fábricas de plástico, foi também encontrada
posição distinta para as demandas físicas no tra- entre os casos de incapacidade que geraram be-
balho, os resultados epidemiológicos mostraram nefício, segundo estudo de Souza (2010), que
que a maior ocorrência de DME em extremidades mostra três vezes mais doença entre mulheres
superiores distais entre as mulheres não foi do que entre os homens que receberam benefí-
explicada apenas pela sua maior exposição à cio por DME. Entre as mulheres com renda men-
repetitividade. sal de um salário mínimo, a incidência de DME
Quando Almeida (2010), utilizando o sobe para 123 casos/10.000 (de uma incidência
mesmo banco de dados epidemiológicos, testou geral de 15/10.000) (Souza, 2010); esses núme-
a hipótese de associação entre sexo feminino e ros já ajudam a evidenciar parte do problema e
DME nessa região corporal, após análise de constatar a desigualdade no adoecer, na depen-
interação estatística e de confundimento (análi- dência da posição socioeconômica, e a desigual-
se para controlar ou ajustar o efeito de outras dade de gênero.
variáveis, ditas de confusão, a exemplo da expo-
sição ocupacional), manteve-se a associação en-
tre sexo feminino e DME e ainda observou-se ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
que, entre os indivíduos que referiam estar com
melhor condicionamento físico, após ajuste para O processo de precarização social e do tra-
demandas psicossociais, as mulheres apresenta- balho tem engendrado um cenário determinante
ram 3,4 vezes o valor de DME para os homens. dos DME, com a intensificação do trabalho. Nesse
Outros resultados epidemiológicos obti- cenário, tomam lugar os fatores de risco, como o
dos neste estudo no ramo plástico permitem dis- aumento das demandas físicas (repetitividade,
cutir o papel das mulheres frente ao trabalho trabalho com força e em posturas anômalas) e
CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011

doméstico, que é admitido, muitas vezes, como das demandas psicossociais (ritmo acelerado, fal-
traço da cultura nacional, mas que, nesse caso, ta de controle dos trabalhadores sobre seu fazer
chamou a atenção especialmente por elas terem cotidiano, baixo suporte social). A análise
jornada de trabalho nas empresas um pouco mais ergonômica do trabalho permitiu compreender
longa do que a dos homens. Portanto, não se como são gerados os fatores de risco nas situa-
tratava da dedicação diferenciada ao trabalho ções restritivas de trabalho. A repetitividade ou
doméstico entre mulheres sem atividade de tra- a postura anômala, como fatores de risco, so-
balho externa à sua casa e homens inseridos no mente se expressam no quadro de pressão tem-
mercado de trabalho. Nesse caso, além de traba- poral, em que a pausa, a interrupção do traba-
lharem em média 45,5 horas semanais na em- lho, a recuperação das estruturas corporais em
presa (contra 43,1 horas dos homens), as mu- uso não podem acontecer. Advêm daí o uso ex-
lheres trabalhavam, em média, 17 horas sema- cessivo do corpo e a instalação dos efeitos sobre
nais em casa (contra 5,0 horas dos homens) o sistema músculo-esquelético, cuja principal
(Fernandes et al., 2010a). À jornada regular de expressão é a dor.
trabalho na empresa eram acrescidas as horas Considerando o cenário difícil de precarização

166
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Rita de Cássia P. Fernandes

PRECARIZATION OF LABOR AND LA PRÉCARISATION DU TRAVAIL ET LES


MUSCULOSKELETAL DISORDERS TROUBLES MUSCULOSQUELETTIQUES
Rita de Cássia P. Fernandes Rita de Cássia P. Fernandes
This paper aims to analyze musculoskeletal Cet article traite de l’analyse de la douleur
pain as an expression of the imbalance between musculosquelettique en tant qu’expression du
human capabilities and methods of work déséquilibre entre les capacités humaines et les
organization. Through the combination of méthodes d’organisation du travail. Grâce à la
epidemiological results and Ergonomic Work combinaison des résultats épidémiologiques et
Analysis (EWA) this paper discusses the effects de l’Analyse Ergonomique du Travail (AET), on
of labor precarization, using the strategy to com- peut discuter des effets de la précarisation du
bine these two methodological approaches, travail. La stratégie consiste à allier ces deux
promising to interdisciplinary dialogue. 14 plastic approches méthodologiques prometteuses pour
factories in the metropolitan region of Salvador un dialogue interdisciplinaire. Un relevé des
were characterized, through the study of their caractéristiques de 14 fabriques de plastique de
functioning and production organization; the la Région Métropolitaine de Salvador a été réalisé
epidemiological component in a cross section à partir de leur fonctionnement et de l’organisation
used a random sample of 557 workers in the de la production ; la composante épidémiologique
sector and EWA ocurred in the finishing sectonr avec un croquis de coupe transversale part d’un
of one of the factories. One noticed changes in échantillonnage de 557 travailleurs et l’AET a été
the organization of production that occurred at faite dans le département des finitions de l’une
the expense of work intensification, with des fabriques. On a pu constater des changements
acceleration of the rhythm of workers, while they dans l’organisation de la production dus à
performed tasks with strength, repetition and l’intensification du travail et à l’accélération du
abnormal postures. Excessive use of the body rythme des travailleurs qui doivent en même
allowed to understand the emergence and temps utiliser la force pour réaliser des tâches
maintenance of pain, which prevalence revealed répétitives et dans des postures inadaptées. L’usage
a huge number of workers required to continue excessif du corps permet de comprendre pourquoi
working under the same conditions that les douleurs apparaissent et persistent et l’on a
generated their suffering. pu constater que de nombreux travailleurs doivent
continuer à travailleur dans ces mêmes conditions
qui provoquent leur souffrance.
KEYWORDS: intensification of work, musculoskeletal MOTS-CLÉS: intensification du travail, maladies
disorders, pain, precarization, RSI musculosquelettiques, douleur, précarisation, TMS.

CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. spe 01, p. 155-170, 2011

Rita de Cássia P. Fernandes - Professora Adjunto da Faculdade de Medicina da Universidade Federal


da Bahia - UFBA. Doutora em Saúde Pública/Epidemiologia pela UFBA, com estágio na McGill University,
Montreal, Canadá, como bolsista da CAPES. Tem experiência na área de Saúde Coletiva com ênfase em
Saúde do Trabalhador e Epidemiologia Ocupacional, atuando principalmente nos seguintes temas: vigi-
lância em saúde do trabalhador, distúrbios músculo-esqueléticos relacionados com o trabalho (LER e
lombalgias), ergonomia e acidente de trabalho. É autora de capítulos de livros e artigos em diversos
periódicos (Cadernos de Saúde Pública, ENSP; Ciência & Saúde Coletiva; Revista Brasileira de
Epidemiologia; Scandinavian Journal of Work and Environmental Health; Occupational Medicine,
Oxford).

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